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173 ObjetIvOs de aprendIzagem Após estudar este capítulo, você estará capacitado para: »» Definir desenho, análise, descrição e especificação de cargos. »» Entender como o desenho do trabalho afeta as práticas da gestão de pessoas (GP). »» Descrever os métodos de obter e coligir informações sobre os cargos. »» identificar as cinco dimensões profundas do trabalho. »» Comparar as várias abordagens do desenho dos cargos. »» Descrever a gestão de carreira e o trabalho em equipe. O Que será vIstO adIante »» Conceito de cargo. »» Desenho de cargos. »» Modelos de desenho de cargos. »» Descrição e análise de cargos. »» Métodos de coleta de dados sobre cargos. »» Gestão da carreira. »» Trabalho em equipe. ModelaGeM do tRabalho CaPítulo 7 CasO IntrOdutórIO: a mesmice dos cargos: a tintas abC Mário Esteves tinha 12 anos de casa na Tintas ABC. Havia ingressado na empresa como supervisor de rela- ções humanas (RH) e promovido para gerente de RH. Na realidade, seu cargo apenas tinha mudado de nome, pois nada havia sido acrescentado a suas antigas res- ponsabilidades. Fazia as mesmas coisas e se reportava ao diretor-geral, como antes. Olhando ao seu redor, na empresa, Mário percebia que nada tinha mudado nela naqueles 12 anos. Todos os seus colegas e subordinados faziam exatamente o mesmo – ou algo menos – do que haviam aprendido quando ingressaram na empresa. O mundo havia mudado, mas a Tintas ABC continuava a mesma empresa, com algumas denominações diferen- tes para as mesmas coisas. Era uma empresa estática, parada no tempo, conservadora e intraorientada. E as pessoas faziam sempre as mesmas coisas, ocupando os mesmos cargos, realizando as mesmas tarefas e as mesmas responsabilidades. Mário pensava que, se as empresas concorrentes também fizessem o mesmo, tudo seria uma maravilha. Ainda mais se o mercado permane- cesse sempre o mesmo. No entanto, lia nos jornais que as demais empresas seguiam disparadas na frente, com inovações nos produtos, elevada qualidade nos serviços e com intensa participação dos funcionários. Mário não se conformava com a mesmice e o bitolamento na com- panhia. Como ajudá-lo? O trabalho organizacional não é feito ao acaso. A maneira como as pessoas trabalham nas organizações depende basicamente de como seu trabalho foi plane- jado, modelado e organizado. Em suma, como foi feita a distribuição das tarefas. Em geral, as tarefas estão conti- das em cargos. A estrutura de cargos é condicionada pelo desenho organizacional em que está contida. Os cargos fazem parte do formato estrutural da organização. Este condiciona e determina a distribuição, configuração e o grau de especialização dos cargos. O desenho organiza- 174 parte III – apLICando pessoas cional representa a arquitetura da organização: como os seus órgãos e cargos estão estruturados e distribuídos, as relações de comunicação entre eles, como o poder está definido e como as coisas deverão funcionar. Se a estru- tura organizacional for rígida e imutável, os cargos tam- bém serão fixos, permanentes e definidos, fechados, in- dividualizados e delimitados. Se for flexível e adaptável, os cargos também serão maleáveis, ajustáveis e abertos, com elevado índice de interação com o ambiente que a circunda. Quanto mais maleável e flexível a estrutura organizacional, mais os cargos e tarefas serão mutáveis e mais forte a presença de equipes multidisciplinares e autogeridas no lugar de órgãos permanentes e definiti- vos. Hoje, a modelagem do trabalho requer flexibilidade e intensa participação das pessoas envolvidas. Para os autores clássicos, a estrutura organizacional nada mais é do que a arquitetura de cargos e as ati- vidades dispostas de uma maneira racional e lógica a fim de proporcionar adequação entre a especialização vertical (níveis hierárquicos) de um lado e a especiali- zação horizontal (departamentalização) de outro. Cada departamento ou divisão é formado por um conjunto de cargos, como em uma montagem de blocos. Para se analisar uma organização, deve-se decompor cada ór- gão em seus cargos constitutivos. Essa visão tradicional, linear e cartesiana – típica do modelo burocrático – está sendo substituída por uma visão sistêmica e contingen- cial, que procura mais integrar e juntar do que separar e fragmentar as tarefas e atividades (Figura 1). conceIto de caRgo O conceito de cargo é uma decorrência da divisão do trabalho imposta pelo velho e tradicional modelo bu- rocrático. Da mesma forma como o velho e o tradicio- nal organograma – com seus departamentos e divisões também decorrentes do modelo burocrático – está sendo substituído por novos formatos organizacionais, também os cargos estão sendo gradativamente transformados em atividades conjuntas por meio de equipes. Contudo, em muitas organizações ainda permanece intacto o conceito de cargo, e muitos órgãos de RH ainda estão analisando e descrevendo cargos como no passado. As pessoas trabalham nas organizações desem- penhando determinado cargo. Em geral, quando se pretende saber o que uma pessoa faz na organização pergunta-se qual é o cargo que desempenha. Com isso, sabe-se o que ela faz na organização e se tem uma ideia da sua importância e do nível hierárquico que ocupa. Para a organização, o cargo constitui a base da aplicação das pessoas nas tarefas organizacionais. Para a pessoa, o cargo constitui uma das maiores fontes de expecta- tivas e motivação na organização. Quando as pessoas ingressam na organização e por toda a sua trajetória profissional, elas sempre são ocupantes de algum cargo. O cargo é uma composição de todas as atividades desempenhadas por uma pessoa – o ocupante – que pode ser englobado em um todo unificado e que figura em certa posição formal do organograma da empresa. fIgura 1 Novas tendências quanto ao trabalho.1 Os velhos meios Aspectos Os novos meios Altas, com muitos níveis administrativos ß Estruturas à Achatadas, com poucos níveis administrativos Centralizada na cúpula da administração ß Autoridade à Descentralizada em todos os níveis: empowerment Amplo e diversificado ß Papel do staff à Pequeno e concentrado Simplificada e estreita. Os gerentes pensam e as pessoas fazem e executam ß Modelagem do trabalho à Multifuncional e ampla. As pessoas pensam e melhoram continuamente Importantes apenas como unidades administrativas formais ß Grupos de trabalho à Como sistemas sociotécnicos integrados e com ampla utilização de equipes Salário fixo conforme a classificação do cargo e o desempenho individual ß Compensação à Salário flexível definido por metas e pelo desempenho individual e grupal Limitado apenas ao cargo. Ocupante é descartável ß Treinamento à Amplo e conceitual. Ocupante é valioso e é encorajado a aprender novas habilidades e competências CapÍtULo 7 – ModeLageM do traBaLHo 175 Assim, para desempenhar as suas atividades, a pessoa que ocupa um cargo deve ter uma posição definida no organograma. A posição do cargo no organograma de- fine o seu nível hierárquico, a subordinação (a quem presta responsabilidade), os subordinados (sobre quem exerce autoridade) e o departamento ou a divisão nos quais está localizado. Por essa razão, os cargos são re- presentados no organograma por retângulos, cada qual com dois terminais de comunicação: o superior, que o liga ao cargo acima e define sua subordinação; e o inferior, que o liga com os cargos abaixo e define seus subordinados. Sob o prisma horizontal, cada cargo está emparelhado a outros cargos do mesmo nível hierár- quico que, em geral, recebem titulagem equivalente (como diretores, gerentes, chefes, operadores, etc.). Sob o prisma vertical, cada cargo está incluído em alguma unidade (departamento) da empresa, e daí se compõe o organograma de cargos. Assim, os cargos não exis- tem ao acaso. Eles são intencionalmente desenhados, projetados, definidos e estabelecidos em certa raciona- lidade: a busca da eficiência da organização. A Figura 2 fornece uma ideiado posicionamento de um cargo no organograma da empresa. jetivos individuais. Em resumo, os cargos representam a pedra de toque entre a organização e as pessoas que nela trabalham (Figura 3). fIgura 2 Posicionamento do cargo no organograma. Responsabilidade Autoridade Níveis hierárquicos Cargo áreas de atuação Cargo Funções Tarefas Pesquisar preços, condições de pagamento e prazos de entrega Comparar as ofertas de fornecedores Decidir sobre a oferta mais favorável Negociar a compra com o fornecedor escolhido Comprador Pesquisar e desenvolver fontes de suprimentos Programar requisições de compras Coordenar pesquisas de suprimentos Efetuar as compras requisitadas fIgura 3 Exemplo do desdobramento do cargo em funções e tarefas. avalIaçãO CrítICa: enxugando a organização 2 As empresas precisam manter uma relação adequa- da entre o tamanho da estrutura de cargos e o volume de negócios. Ou seja, uma proporção adequada entre as operações e a estrutura organizacional para realizá- -las. Essa proporção corresponde à razão entre estatura e peso que as pessoas precisam manter para conservar sua saúde e bem-estar. A década de 1990 trouxe uma série de imposições externas que pressionaram as em- presas a serem mais leves, ágeis e enxutas por meio da reengenharia e do downsizing. Produzir cada vez mais com cada vez menos para ser competitivo em um mercado global é um desafio extremamente difícil. Para tanto, as empresas reduziram suas estruturas tanto no sentido horizontal, pela fusão ou Olhando sob outro prisma, o cargo é uma unidade da organização e consiste em um conjunto de deveres e responsabilidades que o tornam separado e distinto dos demais cargos. Na realidade, os cargos são os meios pelos quais a empresa aloca e utiliza as competências das pessoas para alcançar objetivos organizacionais por meio de determinadas estratégias. Na outra ponta, os cargos constituem os meios pelos quais as pessoas executam suas tarefas para alcançar determinados ob- 176 parte III – apLICando pessoas extinção de departamentos, quanto no sentido vertical, pela redução de níveis hierárquicos. Peter Drucker já tinha observado que cada nível adi- cional de gerência tende a cortar pela metade a possibili- dade de as informações serem transmitidas corretamen- te, enquanto tende a dobrar a quantidade de ruído no sistema. Observou que os níveis gerenciais constituem elos de uma cadeia: cada um acrescenta certo reforço, mas infelizmente todos são fontes de inércia, atrito e relaxamento. Uma faca de dois gumes, sem se saber qual corta mais. Por outro lado, W. Edwards Deming, o guru dos métodos estatísticos de qualidade, do alto de sua ex- periência, notou que 80% dos gerentes norte-americanos não conseguem responder com o mínimo de confiança a três questões extremamente simples: 1. Qual é o meu trabalho? 2. O que realmente importa nele? 3. Como o estou desempenhando? Se assim trabalham e agem os gerentes, o que dizer dos seus subordinados? O importante é perguntar a cada pessoa o que ela realmente faz para criar valor agregado e abrir a gerência para torná-la mais democrática e consultiva. Muitas em- presas reforçaram seus programas de treinamento para ensinar habilidades necessárias ao trabalho e acrescentar uma cultura forte e compartilhada em substituição a uma gerência estreita e fechada. Foi o caso da Disney University, da McDonald’s Hamburger University e dos programas de treinamento da IBM, em que os funcionários apren- dem não apenas o que fazer, mas como fazer segundo as normas da empresa. O objetivo é substituir os controles explícitos (como supervisão, manuais de procedimentos, organização e métodos, manuais de regras e regulamen- tos, rotinas e procedimentos, auditorias) por controles im- plícitos do treinamento (conhecimento). São empresas que tornam o treinamento obrigatório e não uma recom- pensa ou algo eventual. Outras empresas enxugaram a organização para reduzir o inchaço e aproximar o nível operacional do nível institucional e dar mais responsabi- lidades às pessoas para comprometê-las com o negócio. Planos de carreira ascendentes e sistemas de remu- neração concentrados na gerência constituem as cau- sas do inchaço da média gerência na maior parte das empresas. São polarizadores do aumento de volume de pessoas nos níveis hierárquicos intermediários. Se não houver uma mudança na maneira como as empresas são administradas, elas retornarão ao inchaço da média gerência e à tendência de verticalização hierárquica. E esse é um dos assuntos de gestão de pessoas que exige uma função de RH bastante fortalecida. isso não significa um departamento de RH (DRH) maior, mas sim que os altos executivos e os gerentes de linha devem dedicar mais atenção à gestão dos seus subordinados. desenHo de caRgos O desenho de cargos (job design) envolve a especifica- ção do conteúdo, dos métodos de trabalho e das relações com os demais cargos. dICa: definições de desenho de cargos •» desenho de cargos é o processo de organizar o traba- lho por tarefas que são necessárias para desempenhar um cargo específico 3. •» desenho de cargos envolve o conteúdo do cargo, as qualificações do ocupante e as recompensas no senti- do de atender às necessidades dos empregados e da organização.4 •» desenho de cargos é a informação utilizada para es- truturar e modificar os elementos, deveres e tarefas de determinados cargos.5 •» desenho de cargos é a organização das tarefas e atividades repetitivas de um cargo e as qualificações necessárias ao ocupante, bem como sua posição na organização do trabalho como um todo. Para ser bem desempenhado, cada cargo exige cer- tas competências do ocupante, que variam conforme o cargo, o nível hierárquico e a área de atuação. Elas exigem que o ocupante saiba lidar com recursos, rela- ções interpessoais, informação, sistemas e tecnologia em diferentes graus (Figura 4). O desenho de cargos é a maneira como cada cargo é estruturado e dimensionado. Desenhar um cargo sig- nifica definir quatro condições básicas: 1. Conteúdo do cargo: é o conjunto de tarefas ou atri- buições que o ocupante deve desempenhar. CapÍtULo 7 – ModeLageM do traBaLHo 177 2. Métodos e processos de trabalho: como as tarefas ou atribuições devem ser desempenhadas. 3. Responsabilidade: a quem o ocupante do cargo deve se reportar, isto é, quem é o seu superior ime- diato. 4. Autoridade: quem o ocupante do cargo deve super- visionar ou dirigir, isto é, quem são seus subordina- dos ou as pessoas que dele dependem para trabalhar. O desenho do cargo é a especificação do conteúdo, dos métodos de trabalho e das relações com os demais cargos, no sentido de satisfazer requisitos tecnológi- cos, organizacionais e sociais, bem como requisitos pessoais do ocupante. No fundo, o desenho dos cargos representa o modo pelo qual os gestores projetam os cargos individualmente e os combinam em unida- des, departamentos e organizações. Nesse sentido, o desenho de cargos define o grau de responsabilidade ou de liberdade concedido ao ocupante: se o cargo oferece compromisso pessoal com o negócio ou com o cliente ou se o cargo amarra o indivíduo a condições humilhantes ou a regras burocráticas. avalIaçãO CrítICa: quem desenha os cargos da organização? O desenho dos cargos nas organizações não tem um dono definido. Na maior parte das vezes, fica nas mãos do órgão de engenharia industrial (que desenha os car- gos fabris) ou de organização e métodos – o tradicional fIgura 4 As cinco competências básicas necessárias no local de trabalho.6 Recursos Identificar, organizar, planejar e alocar recursos Tempo: selecionar atividades relevantes aos objetivos, priorizar, alocar o tempo, preparar e seguir programas Dinheiro: preparar e utilizar orçamentos, fazer previsões, fazer registros e ajustamentos para alcançar os objetivos Materiais e instalações: obter, guardar, alocar e utilizar materiais ou espaço com eficiênciaRecursos humanos: ensinar habilidades e distribuir o trabalho, avaliar o desempenho e assegurar a retroação Relações Trabalhar com outras pessoas Participar como membro de uma equipe: contribuir para o esforço grupal Ensinar novas habilidades aos outros Servir clientes/consumidores: trabalhar para satisfazer as expectativas dos clientes Exercitar liderança: comunicar ideias, persuadir e convencer os outros, assumir desafios Negociar: trabalhar com acordos envolvendo trocas de recursos, resolver interesses vários Trabalhar com diversidade: junto a homens ou mulheres de diversas procedências Informação Obter e utilizar a informação Obter e avaliar a informação Organizar e manter a informação Utilizar computadores para processar a informação sistemas Compreender as inter- -relações complexas Compreender os sistemas: saber como funcionam os sistemas sociais, organizacionais, tecnológicos e como operá-los eficazmente Monitorar e corrigir o desempenho: distinguir tendências, prever impactos sobre as operações, diagnosticar desvios nos sistemas e corrigir erros ou solucionar problemas Melhorar ou desenhar sistemas: sugerir modificações nos sistemas atuais e desenvolver sistemas novos ou alternativos para melhorar o desempenho tecnologia Trabalhar com variedades de tecnologias Selecionar tecnologia: escolher procedimentos, ferramentas ou equipamentos, inclusive computadores ou tecnologias relacionadas Aplicar tecnologia às tarefas: compreender os objetivos e ajustar os procedimentos ou operações do equipamento Manter o equipamento: prevenir, identificar e resolver problemas com equipamentos, inclusive computadores e tecnologias relacionadas Parte III - Aplicando Pessoas Capítulo 7 – Modelagem do Trabalho