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Vias Biossintética - Secretora e Endocítica SUMÁRIO 1. Introdução ...................................................................................................... 3 2. Transporte Vesicular ...................................................................................... 6 3. Vias Secretoras ............................................................................................ 15 4. Vias Endocíticas ........................................................................................... 22 5. Funcionamento dos Endossomos ................................................................... 27 6. Funcionamento dos Lisossomos .................................................................... 29 7. Revisão ........................................................................................................ 33 8. Extra: Vesículas Sinápticas ........................................................................... 33 Referências ..................................................................................................................... 37 Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 3 1. INTRODUÇÃO As membranas celulares são camadas seletivamente permeáveis e, como tal, são capazes de regular o transporte da maior parte das moléculas que permeiam entre o citoplasma e o meio extracelular. Através da membrana plasmática, solutos e pequenas moléculas conseguem facilmente ser transportados, uma vez que são difundidos de forma livre pela bicamada lipídica ou têm seu deslocamento facilita- do por proteínas carreadoras. Contudo, para um transporte em larga quantidade e escala, esses mecanismos não são suficientes. Por isso, a célula utiliza-se de seus compartimentos membranosos para formar pequenos sacos, que são as vesículas. O tráfego de vesículas representa uma das principais rotas de entrada (endocitose) e saída (exocitose) de grandes volumes de material de uma célula. Normalmente, a rota do transporte vesicular secretor inicia-se pela produção de proteínas ou lipídios no Retículo Endoplasmático (RE) e, por meio do contínuo brotamento e fusão de vesículas, o destino final é o Aparelho de Golgi (AG). Lá, muitas dessas moléculas sofrem diversos tipos de modificações em suas estruturas químicas, como a adição de carboidratos em suas cadeias (glicosilação) e a formação de pontes dissulfídicas (que estabilizam a estrutura proteica). Ainda nessa organela, esses compostos são empacotados e podem ser direcionados aos lisossomos, à membrana plasmática ou ao meio externo por meio das vesículas secretoras. Figura 1. Vias de Transporte Celular Seta azul – vias de recuperação; Seta vermelha – via secretora; Seta verde – via endocítica. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 4 O aparelho de Golgi é uma estrutura formada pela conjugação de sacos (vesícu- las) e membranas (cisternas) achatadas que se organizam de maneira empilhada entre si. Essa organela normalmente está situada próximo ao núcleo, apresenta ta- manho variado e tem como principal função a formação de vesículas de transporte. O AG apresenta duas faces: uma cis, voltada para o Retículo Endoplasmático, e uma trans, voltada para a membrana plasmática. As vesículas vindas do RE fusionam com a membrana da face cis do AG, enquanto as vesículas que saem do AG são for- madas em sua face trans. Há uma grande discussão na comunidade científica quanto ao surgimento e à origem das cisternas do Golgi, mas ainda não há nada definido. Existem, no entanto, duas teorias: • A do modelo de transporte vesicular, que afirma que o Golgi é formado pela recepção e junção de vesículas advindas do RE (ganha membrana pela face cis e cede pela face trans); e • A da transitoriedade das cisternas de Golgi, como em uma maturação (o que era em algum momento a face cis do Golgi, se torna a face cis do Golgi inter- mediário e depois vira a cisterna trans etc., como se fossem degraus de uma escada rolante). Há ainda uma terceira corrente científica que diz que o Golgi é um sistema transi- tório, em que as cisternas vão se transformando umas nas outras, mas também so- frem a influência do tráfego vesicular (além de contribuírem para o mesmo). Figura 2. Teorias do Surgimento do Aparelho de Golgi. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Existem duas rotas principais na via biossintética-secretora, a anterógrada e a retró- grada. A anterógrada consiste na produção das proteínas no RE com posterior direciona- mento da vesícula à membrana plasmática ou a algum endossomo, enquanto a retrógrada consiste no retorno das proteínas do Aparelho de Golgi ao Retículo Endoplasmático. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 5 A contramão da rota secretora é a via endocítica, que se caracteriza pela ingestão de material através de uma invaginação da membrana plasmática para o interior da célula, formando uma vesícula endocítica. Comumente, essa captação de material líquido (pinocitose) ou sólido (fagocitose), através dos endossomos, tem como des- tino os lisossomos, onde serão digeridos e terão seus subprodutos liberados para o citoplasma. Figura 3. ???????? Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Hora da revisão! A formação dos lisossomos requer uma série de etapas diferentes de amadurecimento dos endossomos. De forma geral, o endossomo jovem recebe hidrolases ácidas (enzimas) vindas do Aparelho de Golgi (AG), o que leva ao seu amadurecimento (forma o endolisossomo). Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 6 2. TRANSPORTE VESICULAR Cada um dos compartimentos intracelulares membranares delimitam um es- paço interno (ou lúmen) que é topologicamente equivalente ao meio extracelular. Frequentemente, esses compartimentos e o meio externo comunicam-se entre si por meio do transporte vesicular. De dentro para fora, existem as vias secretórias, as quais transportam moléculas do retículo endoplasmático, passando pelo aparelho de Golgi, até a membrana plasmática ou (por meio dos endossomos) aos lisossomos. De fora para dentro, temos as vias endocíticas, nas quais fluidos ou macromolécu- las são interiorizados por meio de vesículas derivadas da membrana plasmática e, então, direcionados aos endossomos iniciais, tardios e, por fim, aos lisossomos. Figura 4. Equivalências Topológicas da Célula. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Saiba mais! De acordo com certas teorias da evolução, determinadas células procarióticas ancestrais teriam sofrido uma invaginação da membrana plasmática em direção ao seu genoma celular, encobrindo-o de forma a circundá-lo (atual carioteca). A partir daí, o retículo endoplasmático teria se desenvolvido por uma evaginação da carioteca - um processo de dentro para fora, que teria dado origem às atuais organelas membranosas das nossas células. Geralmente, duas estruturas são necessárias para a formação das vesículas: os receptores específicos de proteínas e as proteínas de recobrimento (formadoras da capa proteica). As membranas não são capazes de formar vesículas sozinhas – uma proteína auxiliadora é necessária para distorcer a estrutura da membrana biológica de modo que promova a evaginação. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 7 Se liga! Normalmente, as vesículas que brotam das estruturas membranosas da célula apresentam uma capa proteica em sua face citosólica. Após esse brotamento, contudo, esse revestimento proteico é perdido, o que viabiliza a interação das vesículas com a membrana que irá se fusionar. Existem 3 tipos principais de proteínas de recobrimento: • Clatrina: participa da formação de vesículas na face trans contendo hidrolases ácidas para encaminhamento a endossomos (via anterógrada) e da formação devesícula endocítica na MP. • COP I (overcoat protein I): participa da via retrógrada (Golgi Cis RE). • COP II (overcoat protein II): participa da via anterógrada secretora (RE Golgi Trans - Membrana Plasmática). Figura 5. Atuação das Proteínas de Revestimento. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 8 Saiba mais! A clatrina apresenta formato característico nomeado pelos pesquisadores como “triskelion”. O triskelion é um símbolo cujo formato remete ao da clatrina. Figura 6. Triskelion. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Dentre esses variados tipos de capas proteicas, destacam-se aqueles constituí- dos pela proteína clatrina. As vesículas revestidas por clatrina podem ser formadas tanto na via secretória (no sentido Complexo de Golgi Endossomo Tardio) quanto na via endocítica, e seu processo de formação depende da montagem dessas mo- léculas em uma rede em forma de cesta na superfície citosólica das membranas celulares. Saiba mais! Essas vesículas são menores e mais densas do que as formadas por COP I ou COP II, e formam uma esfera semelhante a uma bola de golfe. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 9 Figura 7. Estrutura do Revestimento por Clatrina. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. A captura das moléculas para o empacotamento, contudo, é realizado por uma uma classe de proteínas adaptadoras - no caso do revestimento por clatrina, as adaptadoras em questão são as chamadas “adaptinas”. Essas proteínas selecionam os produtos a serem transportados através do aprisionamento dos receptores espe- cíficos ao tipo da molécula que deve ser empacotada. Desse modo, um conjunto es- pecífico de moléculas de carga são acumuladas no lúmen de cada vesícula. Após se ligarem a esses receptores, as adaptinas recrutam as clatrinas que, à medida que vão se agregando e formando ligações, vão deformando a membrana da organela. Quando o broto vesicular é formado (estrutura similar a uma vesícula, mas que permanece ligada à membrana lipídica pelo “pescoço”), entra a atuação de uma pro- teína chamada “dinamina”, que associa-se como um anel ao redor dessas fossas invaginadas e promove constrição. Quando as membranas de cada lado do “pes- coço” lipídico ficam suficientemente próximas, a vesícula é liberada no citosol pela propriedade de auto selagem das membranas biológicas. Se liga! Após o brotamento das vesículas estar completo, suas proteínas de revestimento são removidas, de modo que ela se torne capaz de se fusionar com a sua membrana-alvo. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 10 Hélice de dinamina e proteínas associadas Figura 8. Ação da Dinamina. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Para que a capa de clatrina seja liberada da vesícula de forma a permitir que ela se funda com sua membrana alvo, um processo ativo (com gasto de energia) deve acontecer. Por isso, anteriormente à formação do broto vesicular, uma proteína Rho chamada ARF I - GDP é mantida no seu estado inativo ligado ao GDP. Ao formar o broto, o ARF tem o seu GDP trocado por GTP mediante ação da proteína fator GEF chamada ARF-GEF (não é uma fosforilação). Esse ARF-GTP, agora ativo, participa da formação do broto ao se conectar com um adaptador para ajudar no processo. Após formação da vesícula, o mecanismo de desmonte da capa é a hidrólise do GTP liga- da ao ARF I, que cede a energia para que a capa seja desmontada. Finalmente, com a remoção da capa, a membrana está pronta para ser entregue, faltando apenas fa- zer a vesícula ir para o destino correto. Figura 9. Revestimento por Clatrina. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 11 Se liga! As proteínas da classe GEF (guanine exchange factor) são responsáveis por fazer a ativação de diversas outras proteínas mediante troca da molécula de GDP (guanina difosfato) por uma molécula de GTP (guanina trifosfato). No esquema da COP II, outra proteína Rho atua na montagem da capa no lugar de ARF I - é a Sar-I-GDP, que se encontra solúvel no citoplasma. Em seu estado solúvel, a região anfipática em forma de hélice da proteína fica escondida dentro dela própria (glóbulo). Uma proteína fator GEF chamada Sar-I-GEF troca o GDP por GTP modifica a estrutura tridimensional do glóbulo, que passa a expor a hélice anfipática. A parte hidrofóbica da alfa hélice anfipática vai se inserir no interior da membrana, introdu- zindo a Sar-I-GTP na bicamada lipídica. A partir daí, ela começa a recrutar as pro- teínas que compõem o revestimento do tipo COP - inicialmente a SEC23 e a SEC24. A SEC23 reconhece a estrutura do Sar-I-GTP, que então recruta a SEC24 (o qual, por sua vez, reconhece o receptor de carga). Se liga! As proteínas SEC23 e SEC24 servem como adaptadores - apresentam ação semelhante à das adaptinas com a clatrina! Figura 10. Fase Inicial da Montagem por COP. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 12 Essas primeiras SEC vão chamar outras duas SEC (13 e 31), o que promove, por fim, a distorção da membrana para formar o broto vesicular por COP II. A vesícula final vai se destacar da organela também através da atuação da dinamina. Figura 11. Finalização da Capa de Revestimento por COP II. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. A vesícula de transporte liberada de um compartimento membranoso é direciona- da para o seu destino final, na maioria das vezes, por proteínas motoras do citoes- queleto. Antes de se fundir com a membrana-alvo e liberar seu conteúdo, entretanto, essa vesícula precisa identificar e se fixar em seu alvo. Esse processo de reconheci- mento depende de uma classe de proteínas chamadas de “proteínas RAB”. As proteínas RAB estão presentes na superfície da vesícula de transporte e são prontamente identificadas por proteínas de aprisionamento situadas na face citosó- lica da membrana-alvo. Cada tipo de organela e de vesícula possuem um conjunto próprio de RAB e, por isso, esse processo tem um elevado grau de especificidade. Se liga! As RAB são um tipo de proteína Rho. Elas são incorpora- das durante a formação do broto e, após o desmonte da capa proteica de reves- timento, continuam ligadas à vesícula. Também apresentam sua forma inativa ligada ao GDP e, mediante ação da RAB-GEF, têm seu GDP trocado pelo GTP e ficam ativadas. É nesse estado que as RAB se associam às membranas. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 13 Um reconhecimento complementar é realizado por uma classe de proteínas transmembrana denominas de SNARE. Quando as proteínas de aprisionamento fir- memente retêm sua proteína RAB correspondente, as SNARE da vesícula (v-SNA- RE) interagem com as SNARE da membrana- alvo (t-SNARE) por meio de um forte entrelaçamento. Figura 12. Atuação das Proteínas RAB. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. A fusão entre as membranas, contudo, requer uma aproximação ainda maior para que os lipídios das bicamadas possam se misturar. As próprias SNARE apresentam um importante papel nesse mecanismo, através de seu enroscamento após a fase de ancoragem da vesícula transportadora. Com o enrolamento das v-SNARE e t-S- NARE, há a geração de uma força que empurra as moléculas de água entre as vesí- culas e permite a união entre as bicamadas lipídicas (auto selagem). Com isso, há a fusão entre a vesícula e seu compartimento-alvo, o que, por fim, promove a libera- ção da carga transportada para o seu destino. Vias Biossintética- Secretora e Endocítica 14 Figura 13. Auto-selagem mediada pelas proteínas SNARE. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. A maioria das proteínas SNARE nas células já participou de múltiplas fusões de vesículas no transporte vesicular e, algumas vezes, estão presentes na bicamada lipídica das organelas membranosas como complexos estáveis com outras SNARE parceiras. Esses complexos devem ser desmontados antes que as SNARE possam mediar novas fusões, muitas vezes desnecessárias. É aí que entre a atuação de uma proteína crucial, chamada de NSF, que alterna-se entre as membranas e o cito- sol e catalisa o processo de desmonte (inativação) das SNARE. Se liga! A necessidade da reativação das SNAREs mediada por NSF pela desmontagem dos complexos de SNAREs ajuda a evitar que as mem- branas se fundam indiscriminadamente. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 15 Saiba mais! A comunidade científica ainda não descobriu como a atividade da NSF é controlada de forma que as SNARE sejam ativadas com localidade e temporalidade corretas. Também não se sabe como as v-SNARE são seletivamente recuperadas e devolvidas ao seu compartimento de origem de forma a serem reutilizadas em novas vesículas transportadoras. Figura 14. Regulação da inativação das proteínas SNARE pela NSF. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. 3. VIAS SECRETORAS O tráfego de vesículas não é limitado ao interior das células, mas se estende para além e a partir da membrana plasmática. Biomoléculas (proteínas, lipídios e carboidratos) estão frequentemente sendo distribuídas entre as organelas membra- nosas até a superfície celular através do transporte vesicular. Essas vesículas, então, se fundem à membrana plasmática e liberam seu conteúdo para o ambiente extra- celular, em um processo denominado de exocitose. Figura 15. Exocitose. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 16 O movimento de saída de material começa no retículo, que produz tanto molé- culas lipídicas (pelo retículo endoplasmático liso) quanto proteicas (pelo retículo endoplasmático rugoso). A maioria das proteínas que percorrem o RE (retículo en- doplasmático) sofre algum tipo de alteração química em seu trajeto, e dentre elas destacam-se: • Pontes dissulfídicas: Formadas como consequência da oxidação de pares de cadeias laterais de cisteínas. O objetivo delas é contribuir na estabilização da estruturade proteínas que podem lidar com modificações de pH e com enzimas catalíticas no exterior da célula. • Glicosilação: Processo caracterizado pela adição de oligossacarídeos na es- trutura polipeptídica, originando as glicoproteínas. Tais sacarídeos possuem uma larga contribuição na proteção da proteína contra a degradação e na sua retenção no RE até seu processo de enovelamento, além de funcionar como um sinal para o empacotamento das proteínas em vesículas transportadoras. Se expostos na membrana plasmática, esses resíduos glicosilados formam uma camada celular de carboidratos, o que tem particular importância no processo de reconhecimento celular. A adição de um oligossacarídeo no RE é apenas o primeiro passo de uma série de modificações sofridas pela glicoproteína até que ela seja secretada ou aderida à membrana plasmática. Esse processo apenas tem início no RE, mas continua no aparelho de Golgi. Cada subcompartimen- to do AG terá enzimas especializadas a determinado tipo de modificação - finalmente, a escolha do caminho das proteínas será baseada na condição final que essa glicosilação assume. Por exemplo, aquelas proteínas que são destinadas a irem para o sistema endossomo-lisossomo apresentam um determinante espacial que é reconhecido pela proteína responsável pela fosforilação das proteínas que vão para lá - é por isso que sua sexta manose é fosforilada (manose-6-fosfato). Posteriormente, na face trans do AG, essa manose-6-fosfato será reconhecida por um receptor específico, o que promove a ligação da proteína com esse re- ceptor e a aglomeração dos mesmos para formação da vesícula. Se liga! A manose-6-fosfato (M6P) é uma região do esqueleto de açúcar associado às hidrolases ácidas, enzimas específicas das organelas lisossomais. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 17 Saiba mais! A enzima que adiciona a M6P (N-acetilglicosamina fos- fotransferase) apresenta um domínio que reconhece a estrutura tridimensional das hidrolases ácidas. Ela possui também o domínio catalítico de fosforilação, onde vai haver a junção da sexta manose da hidrolase ácida com o N-acetilglicosamino que contém o íon fosfato. O receptor de reconhecimento da sexta manose fos- fatada é chamado de receptor de manose-6-fosfato, que irá ajudar a empacotar todas as hidrolases ácidas (proteases, lipases, nucleases, fosfatases, sulfatases, fosfolipases e glicosidases). Figura 16. Síntese e Transporte de Hidrolases Ácidas. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Nem todas as proteínas produzidas no RE são destinadas à secreção, mas algu- mas funcionam dentro da própria organela. Tais moléculas dependem de um sinal de retenção, uma sequência de aminoácidos reconhecida por proteínas receptoras do RE, para permanecerem nesse compartimento membranoso. No entanto, a maior parte das proteínas possuem outros destinos, sendo empacotadas em vesículas que brotam do RE e se fusionam com o aparelho de Golgi. Essa saída, contudo, é extremamente seletiva. As proteínas que não passaram por um adequado processa- mento são ativamente retidas no RE pela atuação das chaperonas. A interação das chaperonas com proteínas malformadas ou parcialmente montadas as mantém no RE até que passem pelos processos apropriados de formação ou, em última instân- cia, sejam degradadas. Dessa forma, o RE consegue controlar finamente a qualidade das moléculas que exporta para o Aparelho de Golgi. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 18 Figura 17. Seleção das Proteínas para Transporte no RE. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. A proteína e seus receptores possuem alta afinidade de se ligar no ambiente do RE (pH neutro) e uma baixa afinidade por permanecerem ligados no ambiente do AG, que apresenta pH baixo - dessa forma, o receptor libera a carga. A escala de pH determina a concentração de H+ no meio, e é justamente a presença dessas cargas no ambiente que interfere na afinidade entre o receptor e a sua proteína-carga. A interferência dos íons ajuda ou dificulta a ligação entre eles, o que ajuda a organizar o transporte da proteína. Se liga! Em ambiente neutro (RE), o receptor está com alta afini- dade para se ligar com a sua proteína, enquanto em ambiente ácido (AG) há o favorecimento da entrega da proteína que está sendo carregada. No entanto, mesmo com tamanha precisão de todo esse mecanismo, às vezes acontece de proteínas próprias do Retículo Endoplasmático serem exportadas pa- ra o Aparelho de Golgi, onde não apresentam função alguma. Para resolver essa Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 19 situação, existe uma sequência de aminoácidos chamada de “sinal KDEL” que é adicionada nas proteínas reticulares. Esse sinal é reconhecido por receptores especí- ficos localizados no Aparelho de Golgi, os quais mobilizam uma via de retorno (retró- grada) a partir da face cis dessa organela. Se liga! Lembre-se que a formação de vesículas na via retrógrada se dá pelas proteínas de revestimento do tipo COP I. As proteínas malformadas são capazes de se ligar a receptores presentes na membrana do retículo endoplasmático e, dessa forma, estimular um vasto programa de transcrição: a resposta de proteína desenovelada (UPR). Tal cascata induz re- guladoresde transcrição a adentrarem no núcleo e ativarem a expressão dos genes das chaperonas e de outros componentes do RE, de modo, inclusive, a aumentar o tamanho do RE se necessário. Dessa forma, são estimulados o enovelamento e o processamento adequado dessas proteínas. Saiba mais! Existem situações que esse controle de qualidade do RE pode não ser benéfico ao organismo. Um exemplo disso é observado em indivíduos com fibrose cística. Nessa comorbidade, uma mutação genética é capaz de produzir uma proteína de transporte da membrana plasmática de for- ma inapropriada. Contudo, apesar de haver uma pequena má formação, essa proteína ainda seria capaz de atuar como um canal se alcançasse a superfície celular. Diante disso, como consequência do nosso RE reter a proteína mutante e degradá-la antes que consiga ser externalizada, há drásticas sintomatologias. As moléculas de secreção advindas do RE pelas vesículas de transporte entram no aparelho de Golgi pela cisterna cis e, então, são difundidas pela extensão da orga- nela por meio de um processo sequencial de brotamento e fusão de vesículas até a cisterna trans, onde serão destinadas para: • Outro compartimento celular: Por exemplo, os lisossomos, que recebem ve- sículas contendo hidrolases ácidas (enzimas que trabalham em um ambiente ácido para degradar compostos orgânicos para a célula). Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 20 • O exterior da célula (exocitose): • Por meio da via secretora constitutiva. • Por meio da via secretora regulada. Se liga! Vale ressaltar que o Aparelho de Golgi não é uma organela que tem sua funcionalidade restrita ao transporte de vesículas, mas, durante a sua extensão, o conteúdo delas pode sofrer diversas modificações, como a finalização do processo de glicosilação, por exemplo. Figura 18. Vias Secretoras Constitutiva e Regulada. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Em todos os tipos celulares eucarióticos, são realizadas vias constitutivas de se- creção. Elas são caracterizadas por funcionarem de maneira contínua, logo, estabe- lecem uma corrente fixa de liberação de vesículas ricas em proteínas e lipídios para a superfície celular ou para o meio externo. Sendo assim, os principais destinos dos produtos de secreção dessa via são: a incorporação na membrana plasmática (com Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 21 função estrutural, de transporte ou de sinalização, por exemplo) e a liberação para a matriz extracelular (sendo elementos de nutrição ou sinalização de outras células, por exemplo). Diante disso, a via constitutiva apresenta grande relevância para a re- novação da quantidade e dos tipos lipídicos e proteicos da membrana plasmática, além de representar uma via de excreção para os compostos que não mais são de interesse para a célula. Se liga! A rota constitutiva de exocitose é a via pela qual a mem- brana plasmática se expande quando as células aumentam seu volume antes do processo de divisão celular. Conceito: Excreção é diferente de secreção! Produtos excretados são os que devem ser eliminados por não serem de interesse do organismo, enquanto os secretados apresentam função fisiológica. Em contraste com a rota constitutiva, há vias reguladas de exocitose, que fun- cionam apenas em células que são especializadas na secreção de um produto em particular, como hormônios, muco ou enzimas digestivas. Uma característica fun- damental da via regulada é que seus produtos de secreção são armazenados em vesículas até que um estímulo (a regulação) estimule a liberação desse material. Essas vesículas são originadas por brotamento a partir da cisterna trans do aparelho de Golgi e costumam formar aglomerações próxima à membrana plasmática. Nesse local, elas aguardam a chegada de um sinal que desencadeará respostas no interior da célula e estimulará a secreção de seu conteúdo no meio externo por meio de sua fusão com a membrana plasmática. Uma característica de destaque das proteínas nas vias secretórias reguladas é a capacidade de agregação sob certas condições iônicas (pH ácido e alta concentração de cálcio), o que as permite permanecer na rede trans do aparelho de Golgi. Em certo momento, esses agregados proteicos são empacotados em vesículas secretórias, destacam-se da cisterna trans e, próximo à membrana plasmática, aguardam algum sinal para a sua secreção. As proteínas da via de secreção constitutiva, contudo, não possuem essa propriedade de agregação, logo, são prontamente carregadas por ve- sículas até a membrana plasmática, onde são incorporadas ou secretadas. Quando uma vesícula secretora se une à membrana plasmática para liberar seu conteúdo, sua membrana passa a fazer parte dela. Embora esse processo devesse Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 22 causar um enorme aumento da área de superfícieda membrana plasmática, ele não o faz. Isso ocorre porque porções da membrana são removidas de outras regiões de sua superfície por meio do processo de endocitose quase com a mesma taxa em que são adicionadas por exocitose. Desse modo, há certo equilíbrio quanto a adição e remoção de componentes da superfície celular, o que torna muito improvável a ocorrência de aumentos ou reduções expressivas (e não programadas) de sua exten- são. Tal remoção, então, promove o retorno de lipídios e proteínas da membrana das vesículas de volta ao aparelho de Golgi, onde poderão ser novamente utilizadas para o empacotamento de novos produtos de secreção. Figura 19. Reciclagem de Membrana. Seta azul – vias de recuperação; Seta vermelha – via secretora;- Seta verde – via endocítica. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. 4. VIAS ENDOCÍTICAS A via endocítica é representada pela entrada de uma expressiva quantidade de material para o interior da célula. Esse tráfego, contudo, não é mediado por proteí- nas de transporte da membrana plasmática, uma vez que elas não têm capacidade Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 23 demovimentar grandes volumes de partículas. Diante disso, a fim de captar extensas quantidades de material sólido ou líquido em suspensão na matriz extracelular, as células mobilizam modificações em suas membranas plasmáticas, englobando es- se material e formando grandes vesículas endocíticas em seu citoplasma. Figura 20. Endocitose. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Existem dois tipos principais de endocitose: a fagocitose (captação de grandes partículas sólidas) e a pinocitose (ingestão de líquidos e solutos). Além disso, há um processo muito peculiar realizado pelas células que merece destaque: a autofagia, uma rota de obtenção de energia principalmente utilizada quando a célula se encon- tra em um ambiente desfavorável no ponto de vista nutricional. Sendo assim, a fim de produzir substrato orgânico e energético para o seu metabolismo, ela precisa con- sumir seus próprios componentes. Conceito: A Pinocitose é uma palavra derivada do grego e signi- fica o “beber” da célula, isto é, designa o englobamento de partículas líquidas. A Fagocitose possui a mesma origem e remete ao “comer” da célula, ou seja, o englobamento de partículas sólidas. Fagocitose A fagocitose é a forma com a qual células ingerem grandes partículas, formando extensas vesículas em seu citoplasma denominadas de fagossomos. Os fagosso- mos, então, são direcionados aos lisossomos, onde, após a fusão entre suas mem- branas, terão seus componentes digeridos e absorvidos. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 24 Se liga! Em organismos multicelulares, poucas são as células capazes de realizar a fagocitose em larga escala e quantidade. A maioria das células depende da atuação de enzimas extracelulares para clivar grandes par- tículas antes que sejam absorvidas pelas células. Um exemplo de células fagocitáriassão os macrófagos, células do sistema imu- ne que estão vastamente distribuídas pelos tecidos do corpo e têm como principal função a defesa contra infecções através da ingestão de microrganismos invaso- res. Para ser fagocitado por um macrófago (ou outro leucócito, como os neutrófi- los), o material ou micro-organismo a ser ingerido deve interagir com receptores de superfície da sua membrana plasmática. Essa ligação, normalmente, estimula o macrófago a emitir projeções em sua membrana plasmática (os pseudópodes), que englobam as partículas de interesse e se fusionam em suas pontas de modo a formar uma vesícula de ingestão (o fagossomo). O fagossomo formado, por sua vez, destina-se aos lisossomos, onde seu conteúdo será digerido. Saiba mais! Existem microorganismos que são capazes de corrom- per o bom funcionamento do sistema fagocitário. Um exemplo é a Mycobacterium tuberculosis, uma bactéria responsável por desencadear a tuberculose e que pode coibir a fusão entre a membrana do fagossomo e a do lisossomo. Desse modo, esse patógeno, ao invés de ser digerido, garante sua sobrevivência no meio intracelular. Uma função de especial relevância das células fagocitárias é a sua atuação na remoção e reciclagem de células senescentes, defeituosas ou mortas dos mais diversos tecidos. Os próprios macrófagos também auxiliam nessa função de “lim- peza”, uma vez que fagocitam e degradam hemácias senescentes (que, muito prova- velmente, já exauriram sua funcionalidade biológica). Pinocitose A pinocitose é o processo de ingestão contínua de partículas líquidas (e de pe- quenas porções da superfície celular) do meio externo para o meio intracelular. Tal processo é principalmente conduzido pela formação de vesículas revestidas de cla- trina devido à invaginação da membrana plasmática, o que forma fossas que retém Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 25 o líquido extracelular. Após o fechamento dessas fossas, as vesículas recém-forma- das se destacam da membrana plasmática e prontamente perdem seu revestimento para se fundir com um endossomo. Desse modo, fluidos e seus solutos são internali- zados e podem ser aproveitados pelo metabolismo celular. Saiba mais! Tendo em vista que parte da membrana plasmática está constantemente sendo endocitada pelo processo de endocitose, seria esperado que a sua área de superfície fosse reduzida. Contudo, essa entrada de substâncias e membrana é normalmente balanceada pela secreção de vesículas durante as vias de exocitose. Por isso, a área de superfície e o volume celular permanecem pra- ticamente inalterados no decorrer das vias biossintética-secretora e endocítica. Endocitose Mediada por Receptores O processo de pinocitose funciona de maneira indiscriminada, isto é, as vesículas endocíticas apenas apreendem quaisquer moléculas que estejam em suspensão no líquido extracelular. Na maioria das células animais, no entanto, existe também uma eficiente rota de captação de macromoléculas específicas, haja vista que tais par- tículas são capazes de interagir com receptores da superfície celular e adentrar na célula na forma de complexos de receptor-macromolécula em vesículas revestidas de clatrina. Tal processo é denominado de endocitose mediada por receptor e for- nece à célula a propriedade de aumentar a eficiência da internalização de partículas específicas sem, contudo, ingerir grandes volumes de fluido extracelular, como ocor- re na pinocitose clássica. Um relevante exemplo de endocitose mediada por receptor está nas vias de cap- tação do colesterol das células animais. O colesterol é uma molécula indispensável para a manutenção da vida, uma vez que, dentre outras funções, é um importante componente das membranas plasmáticas. Ele possui uma estrutura extremamente hidrofóbica (insolúvel), logo, para circular na corrente sanguínea, precisa estar asso- ciado às lipoproteínas. As lipoproteínas de baixa densidade (LDL) são as principais responsáveis pelo tráfego do colesterol entre seus locais de síntese até os tecidos periféricos, onde ele será liberado. O LDL, após interagir com receptores na superfície celular, é internalizado na forma de complexo receptor-LDL por meio de uma endocitose mediada por recep- tor. No interior da célula, sua vesícula é direcionada aos endossomos, onde encon- tra um ambiente mais ácido que o seu meio de origem. Nesse ambiente ácido do endossomo, o LDL perde afinidade com o receptor e se dissocia. Após sua libera- ção, o receptor é reciclado de volta à membrana plasmática por meio de vesículas Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 26 transportadoras enquanto o LDL será direcionado aos lisossomos. Nos lisossomos, ele será degradado pela ação de enzimas hidrolíticas, liberando colesterol no citosol. No citoplasma, esse colesterol pode possuir diversos destinos, mas, de modo geral, é utilizado para sintetizar produtos lipídicos que têm essa biomolécula como precur- sora (como hormônios esteroides) ou para compor a membrana plasmática. Figura 21. Endocitose de LDL. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Se liga! Os receptores de LDL são continuamente internalizados e reciclados, independentemente da interação com o LDL, uma vez que existem outros processos de mobilização de modificações na membrana plasmática que podem levar esses receptores para o meio intracelular. Saiba mais! Em indivíduos que apresentam mutações no receptor de LDL ou não expressam esse receptor, a captação dessa lipoproteína e, por conse- guinte, do colesterol fica comprometida. Diante disso, o colesterol se acumula no sangue, o que aumenta o risco desses indivíduos de desenvolverem aterosclerose (placas de gordura nas artérias). O nome dessa doença é Hipercolesterolemia Familiar (congênita). Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 27 O receptor de transferrina segue uma via de reciclagem semelhante à do receptor de LDL, mas, ao contrário deste, o seu ligante também é reciclado. Os receptores de transferrina da superfície celular entregam a transferrina com o seu ferro ligado para os endossomos primários por meio da endocitose mediada por receptores. O bai- xo pH do endossomo induz a transferrina a liberar o seu ferro ligado, mas a própria transferrina sem o ferro (chamada de apotransferrina) permanece ligada ao seu re- ceptor. A transferrina é uma proteína solúvel que carrega o ferro no sangue. O complexo receptor-apotransferrina entra nas extensões tubulares do endossomo primário e dali é reciclado de volta à membrana plasmática. Quando a apotransferrina retorna ao pH neutro do líquido extracelular, ela se dissocia do receptor e fica livre para captar mais ferro e iniciar o ciclo novamente. Assim, a transferrina realiza um movimento de vaivém entre o líquido extracelular e os endossomos primários. Saiba mais! Outros metabólitos essenciais para o organismo humano também se utilizam da endocitose mediada por receptor para sua captação. O ferro e a vitamina B12 constituem grandes exemplos, uma vez que as células não são capazes de adquiri-los por mecanismo convencionais de transporte de membrana. Por outro lado, essa via de endocitose também pode ser aproveitada por certos micro-organismos patogênicos. O vírus Influenza e o vírus do HIV, por exemplo, têm sua entrada na célula mediada por esse tipo de processo. 5. FUNCIONAMENTO DOS ENDOSSOMOS Assim que o material extracelular é captado pelas células, ele é transferido aos endossomos. Os endossomos são compartimentos formados pela união de vesí- culas e, assim que são formados, são classificados em endossomos iniciais, que gradualmente amadurecem e formam endossomos tardios conforme se fusionam com outras vesículas preexistentes no meio intracelular. O interior do compartimento endossômico possui um pH ácido (na faixa de 5 a 6), característica que é mantida por bombas de prótons () dependentes de ATP presentes na membrana dessas ve- sículas. Da mesma formaque a cisterna Trans do aparelho de Golgi funciona como uma estação de distribuição de vesículas para as vias de exocitose, os endossomos agem de modo a distribuir os componentes advindos das vias endocíticas. O am- biente ácido do compartimento endossômico possui fundamental importância para essa função, haja vista que promove a dissociação entre os receptores e seus ligan- tes. De modo geral, os endossomos podem encaminhar os receptores: Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 28 • De volta à membrana plasmática, retornando ao seu domínio de origem (reci- clagem), como ocorre com os receptores do LDL. • Aos lisossomos, onde serão degradados e terão seus subprodutos reaproveita- dos pelo metabolismo celular • Para um domínio distinto da membrana plasmática, possuindo a funcionalida- de de transferir moléculas de um espaço para o outro, em um processo deno- minado de transcitose. Figura 22. Destino dos Receptores. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. As moléculas endocitadas, por sua vez, após a dissociação com o receptor, são destinadas aos lisossomos para a sua degradação juntamente com quaisquer ou- tros componentes presentes no lúmen do endossomo. As duas formas principais de lidar com os receptores são por meio de degradação ou reciclagem. Um terceiro tipo de controle de receptor é a transcitose, a exemplo da incorporação dos anticorpos no leite durante a lactação. Os anticorpos maternos que vem da corrente sanguínea são capturados do domínio basolateral da glândula mamária e a secreção do leite é realizada pelo domínio apical. Esses receptores do domínio basolateral formam vesículas, as quais passam por um sistema de endossomo e finalmente chegam no domínio apical. Lá, os anticorpos são secretados no lúmen da glândula junto com as proteínas do leite para nutrição do bebê. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 29 6. FUNCIONAMENTO DOS LISOSSOMOS Os lisossomos são sacos membranosos (vesículas) ricos em enzimas hidrolíti- cas, as quais são responsáveis pela digestão controlada de materiais extracelulares endocitados e de organelas senescentes. Existem mais de 40 tipos diferentes de enzimas hidrolíticas nos lisossomos, mas, de modo geral, elas são capazes de digerir proteínas, lipídios, ácidos nucleicos e carboidratos. O ph ótimo está na faixa de 5 (isto é, de melhor atuação dessas en- zimas), condição que é mantida pelas bombas de prótons dos lisossomos. Assim, esses sacos membranosos possuem um pH cerca de 100 vezes mais ácido que o do citoplasma (que está em torno de 7,2). Essa característica é de grande importância, uma vez que as enzimas hidrolíticas dependem de um pH ácido para agir, o que pro- tege o meio intracelular de sua ação discriminada na ocasião de algum vazamento. Se liga! Por serem dependentes de um meio ácido para operar, as enzi- mas hidrolíticas dos lisossomos são comumente denominadas de hidrolases ácidas. Os lisossomos, contudo, não se reduzem a um acervo único de enzimas, mas também são delimitados por uma membrana circundante singular. Essa membrana contém transportadores que tornam possível o transporte dos produtos finais da degradação das macromoléculas endocitadas para o citosol. Além disso, também possui em sua extensão bombas de dirigidas por ATP, as quais bombeiam esses ío- ns para o interior do compartimento lisossômico a fim de mantê-lo em um pH ácido. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 30 Figura 23. Hidrolases Ácidas. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Se liga! Uma outra característica de destaque da membrana dos lisossomos são as suas proteínas glicosiladas, que envolvem boa parte da super- fície do lúmen e protegem outras proteínas incrustadas na membrana de serem digeridas pelas proteases lisossômicas. As proteínas do lisossomo (seja as de função enzimática, seja as de função es- trutural) são produzidas no RE e direcionadas até o aparelho de Golgi. Durante seu trajeto pelo RE e pela cisterna cis do aparelho de Golgi, as hidrolases ácidas têm um açúcar (a manose 6-fosfato) adicionado em sua extensão. Ao chegar na cisterna Trans do Golgi, o receptor da manose 6-fosfato a reconhece e, por conseguinte, dis- tribui as hidrolases empacotadas em vesículas de transporte para os lisossomos ou para os endossomos tardios. A depender da sua origem, os materiais seguem vias diferentes em direção aos lisossomos. As partículas extracelulares sólidas, capturadas por fagocitose, são dire- cionadas aos lisossomos por fagossomos. Os fluidos extracelulares e as macromolé- culas específicas, por sua vez, direcionam seu conteúdo primeiro para o endossomos, os quais são responsáveis por se fusionar aos lisossomos. No entanto, ainda existe uma outra rota de suprimento de materiais para os lisossomos: a autofagia. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 31 Figura 24. Sistema Endossomo-Lisossomal. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Se liga! Os endossomos tardios já apresentam alguma carga de enzimas lisossomais, por isso, é ainda nesse compartimento que a digestão das macromoléculas se inicia. Assim, à medida em que o endossomo sofre maturação em lisossomo, a digestão é apenas continuada. Diante disso, é errôneo afirmar que a degradação do conteúdo endocitado só tem início nos lisossomos. Saiba mais! Os melanossomos são lisossomos especializados que armazenam pigmentos que devem ser liberados por exocitose. Uma vez liberados, várias células, como as da pele e do cabelo, capturam esses pigmentos, que serão responsáveis pelas pigmentações características de cada região do corpo. Mutantes de camundongo que possuem melanossomos defeituosos frequentemente possuem cores pálidas ou incomuns de pelagem. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 32 Autofagia A autofagia é uma rota muito utilizada pelas células para degradar suas organe- las senescentes a fim de renovar o conteúdo intracelular, contudo, também pode ser utilizada em situações extremas de privação de nutrientes, de modo que a célula precisa consumir seus próprios componentes para obter energia. Se liga! Esse processo é frequentemente observado em células he- páticas, por exemplo, nas quais lisossomos costumam digerir mitocôndrias que já não mais funcionam da maneira ideal A autofagia inicia com o englobamento da organela a ser digerida, formando uma membrana dupla e criando o autofagossomo. Essa vesícula recém-formada, então, se fusiona com o lisossomo, o qual degrada esse material e libera seus constituintes para serem reutilizados pelo metabolismo celular, inclusive, para a formação de uma nova organela. Figura 25. Mecanismo da Autofagia. Fonte: Alberts, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 7ª Ed., Artmed Editora, 2017. Se liga! O mecanismo de autofagia é um processo conservado evolutivamente e que é realizado de maneira constitutiva (contínua), sendo de extrema importância para uma fina regulação do bom funcionamento de todas as organelas celulares. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 33 7. REVISÃO A via biossintética secretora tem início no RE, encaminha seus produtos ao Golgi e, por fim, por meio dessa organela, direciona vesículas secretórias à membrana plasmática, ao meio extracelular ou aos lisossomos. No RER há a síntese proteica e no REL há a síntese lipídica. Esse material produzido pelos retículos é enviado por vesículas até o Golgi. No Golgi, pode haver uma glicosilação desse material, que, na última cisterna dessa organela, são empacotados e direcionados para os lisosso- mos, para a via secretora constitutiva ou para a via secretora regulada. A contramão dessa rota é a via endocítica, ou seja, o percurso de material do meio externo para o meio intracelular. Ela é representa pela ingestão de matéria orgânica ou fluido em grandequantidade, o que a torna incapaz de ser mediada por simples proteínas transportadoras da membrana plasmática. Entre as vias endocíticas, temos: • Fagocitose: Ingestão de grandes partículas sólidas; • Pinocitose: Ingestão de fluidos; • Endocitose mediada por receptor: Ingestão de macromoléculas específicas. 8. EXTRA: VESÍCULAS SINÁPTICAS As células nervosas (e algumas células endócrinas) contêm dois tipos de vesí- culas secretoras: as de núcleos densos e outra classe especializada de vesículas minúsculas chamadas de “vesículas sinápticas”. Elas armazenam pequenas molécu- las neurotransmissoras como acetilcolina, glutamato, glicina e ácido - aminobutírico (GABA), que atuam como mediadoras de sinalização rápida entre o neurônio pré-si- náptico e sua célula-alvo uma vez lançadas nas sinapses químicas. Quando a onda despolarizante do potencial de ação atinge o terminal axonal das células nervosas, canais de Ca2+ dependentes de voltagem se abrem e promovem o influxo desse íon em direção ao citosol, fomentando a fusão das vesículas sinápticas com a membra- na plasmática e a posterior liberação de seu conteúdo no espaço extracelular. Se liga! Alguns neurônios disparam mais de mil vezes por segundo, liberando neurotransmissores a cada vez! Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 34 Figura 26. Liberação de Neurotransmissores. Fonte: https://www.khanacademy.org/science/biology/human-biology/neuron-nervous-system/a/the-synapse. A velocidade da liberação dos neurotransmissores nas sinapses indica que as proteínas que medeiam a reação de fusão das vesículas com a membrana plasmá- tica não sofrem rearranjos complexos e de múltiplas etapas. Em vez disso, após as vesículas terem se ancorado à membrana plasmática pré-sináptica, elas sofrem uma etapa de preparação, que as apronta para a rápida fusão. No estado de preparação, as SNARE estão parcialmente pareadas. Proteínas chamadas complexinas fixam os complexos SNARE nesse estado. O congelamento imposto por essas proteínas é liberado por outra proteína de vesícula sináptica, a sinaptotagmina, que contém domínios de ligaçãoao Ca2+. Um aumento no Ca2+ ci- tosólico desencadeia a ligação de sinaptotagminas aos fosfolipídeos e às SNARE, deslocando as complexinas. À medida que as proteínas SNARE vão se torcendo e fechando, um “furo” feito pela fusão das membranas vesicular e plasmática se abre e os neurotransmissores podem, então, ser liberados. Em uma sinapse típica, apenas um pequeno número de vesículas ancoradas são preparadas para a exocitose. Se liga! O uso de somente um pequeno número de vesículas a cada vez permite que cada sinapse dispare várias vezes em rápida sucessão. A cada disparo, novas vesículas sinápticas se ancoram e ficam preparadas para substituir aquelas que se fundiram e liberaram seu conteúdo. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 35 Para que a terminação nervosa responda rápida e repetidamente, as vesículas sinápticas precisam ser reabastecidas muito rápido depois que elas descarregam. Portanto, a maioria das vesículas sinápticas são geradas não a partir da membrana de Golgi no corpo da célula nervosa, mas pela reciclagem local da membrana plas- mática pré-sináptica nas terminações nervosas. Similarmente, componentes de membrana recém-sintetizados das vesículas sinápticas são inicialmente entregues à membrana plasmática pela via secretora constitutiva e então recuperados por endo- citose. Nesse caso, porém, em vez de se fusionarem com os endossomos, a maioria dessas vesículas endocíticas é imediatamente preenchida com neurotransmissores para se tornarem vesículas sinápticas e agilizarem o processo. Os componentes de membrana de uma vesícula sináptica incluem transportado- res especializados na captação de neurotransmissores do citosol, onde as peque- nas moléculas neurotransmissoras mediadoras da rápida sinalização sináptica são sintetizadas. Uma vez cheias de neurotransmissores, as vesículas sinápticas podem ser utilizadas. Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 36 Fonte: Elaborado pelo autor. 33 FLUXOGRAMA – MAPA RESUMO Aparelho de Golgi (maturação dos produtos e endereçamento celular) Retículo Endoplasmático (produção) Sistema Endossomo - Lisossomal Vesículas Secretoras Endossomo Tardio Endossomo Primário Lisossomo Autofagia Organelas mal- funcionantes Exterior da Célula Excreção Secreção Incorporação na Membrana Pinocitose Fagocitose Vias Biossintética - Secretora e Endocítica 37 REFERÊNCIAS ALBERTS, Bruce (et al.). Fundamentos da Biologia Celular. 3 ed. Porto Alegre: Artmed, 2011. ALBERTS, B.; Johnson, A. & Walter, P. Biologia Molecular da Célula. 5ª Ed., Artmed Editora, 2010. sanarflix.com.br Copyright © SanarFlix. Todos os direitos reservados. Sanar Rua Alceu Amoroso Lima, 172, 3º andar, Salvador-BA, 41820-770