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Relato de Mãe sobre Microcefalia

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RESULTADOS
ENTREVISTA 1
Entrevistada: Byanka Silva Passos, 26 anos, negra, dona de casa, residente em Jequié-Bahia, tem renda familiar mensal equivalente a 1 salário mínimo e meio e estudou até o 2º ano do ensino médio.
Mãe de Diana Clara da Silva Passos, 6 anos e 11 meses, portadora da Síndrome Congênita do Zika vírus.
PERGUNTA: Como você se sentiu com o recebimento do diagnóstico de sua filha?
MÃE 1: “É, eu tive Zika com 3 meses de grávida... Tive sintomas, mas não me preocupei e não foi nada nos olhos, né? De ver que era grave... Aí com 6 meses descobri que Diana tinha má formação na cabeça; só que até então os médicos não sabia explicar, falava que era Hidrocefalia. Com 8 meses de grávida eu internei pra ser, (eu moro em Jequié, né? aqui não tinha suporte pra mim ter ela cesárea como eles relatava que era hidrocefalia, tinha que fazer uma cirurgia após o nascimento) aí com 8 meses de grávida eu internei só que aí fazendo outras ultrassons os médicos relatou que não era hidrocefalia, era microcefalia! mas até então não sabia explicar o que era microcefalia que foi no surto que teve”
MÃE 1: “Aí fiquei até os 9 meses internada porque não conseguiu vaga por causa do surto, muita criança nascendo, né, em Salvador... Acabei tendo Diana parto normal aqui na cidade mesmo”
MÃE 1: “Meu sentimento quando eu descobri na gravidez eu não acreditava... não fiquei triste, não fiquei feliz, não fiquei confusa, só não acreditava no que tava acontecendo... é, pra mim, primeira filha, tinha 19 anos, pra mim era mentira dos médicos, não dava pra ele vê uma criança totalmente se tinha alguma coisa ou não dentro da barriga e tudo o mais... Mas o susto veio na hora que nasceu! Me desesperei bastante, mas tava com minha mãe do meu lado que me deu apoio e depois quando eu começava amamentar eu comecei a aceitar e até hoje aceito de boa, ela é tudo pra mim, é tudo que eu tenho na vida, mesmo eu tendo outra, mas Diana eu não largo por nada.“
PERGUNTA: Você sentiu que sua classe econômica interferiu no ocorrido? Caso sim, como? / Você sentiu que seu gênero interferiu no ocorrido? Caso sim, como? / Você sentiu que sua idade interferiu de alguma forma no ocorrido? Caso sim, como?
MÃE 1: “Não, eu acho que não. Nenhum desses fatores interferiu não.”
PERGUNTA: Sua rotina mudou após o diagnóstico? Se sim, como?
MÃE 1: “Mudou literalmente. É.. Eu morava com minha mãe ainda, né? Então... não era dona de casa, não tinha casa própria... mas aí fui viver em questão pra Diana. Tudo que eu fazia, literalmente, tinha que pensar em Diana primeiro.”
MÃE 1: “E já são quase 7 anos nessa luta, né? Fisioterapia a semana toda, fono... viagens pra Salvador pra passar por ortopedista, neuropediatra... e tudo isso. Mas... a vida mudou literalmente. Mesmo que eu era jovem ainda, não trabalhava, só estudava, e morava com minha mãe... Mas, depois que Diana nasceu, teve um novo recomeço, né? Uma nova história, uma nova vida.”
PERGUNTA: Seu filho recebeu atendimento de saúde? Como foi a busca pelo atendimento? 
MÃE 1: “Ó, Diana com dois meses de idade teve a primeira consulta com a neuropediatra, em Salvador, que corremos atrás e conseguimos, que até então ela tinha tido alta da maternidade como se fosse uma criança normal. Tava no pico do surto de microcefalia, ninguém sabia o que era microcefalia, pelo menos aqui na minha cidade... então eles não sabiam pra que médico encaminhar a criança e tudo mais. Mas aí eu juntamente com minha mãe corremos atrás e conseguimos marcar um neuropediatra, que aqui na cidade não tinha, só tinha em Salvador. Com dois meses de idade ela passou pela neuropediatra e aí a neuropediatra encaminhou tudo que ela tinha que fazer, os exames, fisio, T.O, fono... a gente já saiu de lá com todos os encaminhamentos. 
MÃE 1: “Mas, primeiramente, a gente tinha que fazer os exames pra ver se a saúde dela tava tudo ok. Aí fizemos os exames, levamos o resultado, aí com 6 meses ela começou a fazer fisioterapia. Aqui na cidade ela faz fisioterapia na UESB e faz fisioterapia na APAE. É... fazia no centro UNISEG na Santa Casa e fazia ecoterapia. Só que infelizmente teve luxação no quadril, aí foi desligada do centro UNISEG e da ecoterapia.”
PERGUNTA: Como você faz o deslocamento entre as clínicas?
MÃE 1: “Aqui na cidade, o deslocamento pra fisioterapia... É, quer dizer, todos os médicos que ela precisa ser encaminhada, tanto aqui na cidade como em Salvador... ser acompanhada, quer dizer... a prefeitura que fornece o transporte. Então... pra ir pra Salvador só fico com a alimentação e aqui pra fazer a fisio, fono, é... todos os tratamentos que ela faz durante a semana tem o carro que vem pegar na porta de casa e deixa na porta.”
PERGUNTA: Quais as maiores dificuldades que você sentiu no pós-parto?
MÃE 1: “É... após o nascimento dela, a maior dificuldade, pra mim, até hoje é o preconceito. A rotina você acostuma. Aprendizado, cada dia ela me ensina uma coisa diferente, o diagnóstico é o mínimo. É... como eu falo, não anda com as pernas dela, não fala, sua boca, e hoje em dia eu não questiono por que ela veio ao mundo assim, não questiono. Ela veio ao mundo porque Deus quis que ela viesse assim. Então... só o que eu peço pra ele é pra deixar ela comigo. Somente. Mas a maior dificuldade é o preconceito, é você sair na rua e os olhares tortos, é você sair na rua e o questionamento... é... achar que a criança é coitada, sabendo que a criança é ótima de saúde, tem apenas um diagnóstico... mas... uma coisa que dói muito é isso.”
MÃE 1: “E... eu falo pra minha mãe, pro meu esposo, pra minha família direto. Se o meu sonho era ter uma filha que andasse, que falasse... que fazia tudo isso, que traquinasse, que... é... me tirasse do sério, que eu desse um grito, Deus me livre. Que hoje eu tenho Melinda Cristal que é irmã de Diana Clara, 1 ano e 1 mês. Então... não falta mais nada na minha vida. Diana não precisa andar, Diana não precisa falar, Diana só precisa estar com a gente aqui na Terra, somente.”
PERGUNTA: Você buscou algum plano de saúde? Se sim, como foi sua experiência?
MÃE 1: “Não, não. Desde quando ela começou a fazer foi pelo SUS, e fomos bem acolhidas pelo SUS, então não vi nenhuma necessidade de buscar plano de saúde não.”
PERGUNTA: Você tem uma rede de apoio que te ajude?
MÃE 1: “Ó, quando Diana nasceu, até os oito meses de idade dela, é... eu morava com minha mãe. Então... essa questão de eu morar com minha mãe, minha mãe não trabalhava, eu tinha muito suporte dela. Quando eu não podia ir pras terapias ela ia, ela me acompanhava ao médico, é, eu podia sair pra resolver alguma coisa e deixar Diana com ela, me ajudava bastante. Mas quando eu sai da casa dela, que ela mudou pra um local distante, e pra levar Diana pra fisioterapia ficava muito ruim o local que ela mudou, aí eu tive que sair da casa dela e morar com o pai de Diana, aí foi morar nós três. Aí... de lá pra cá, é só eu. Não tem apoio nenhum. Suporte nenhum. É... tenho... tô tendo um suporte agora, depois que a irmã nasceu, né? Que minha irmã me dá suporte com a menor, mas em questão de Diana é só eu pra tudo.
MÃE 1: “Aí, é assim, se eu adoecer Diana não vai pra terapia. É... se eu precisar ir na rua, Diana não vai pra terapia. É... tenho que ir na rua de pulo, porque só come comigo... E o que mais? E essa é a questão. Sou eu pra Diana, pra tudo.”
PERGUNTA: Você separa um tempo para o autocuidado?
MÃE 1: “Não. Desde o nascimento de Diana eu não sei o que é isso. Isso aí, sem Diana, não sei o que é isso. É... se for convidada pra uma festa e tiver som alto... é... não vou, porque Diana, é, sente... tem muita sensibilidade a som alto, é... se tiver uma festa pra “mim” ir, e ela não poder ir, eu não vou, só vou se ela for, então... desde o nascimento dela, desde 6 anos atrás, eu não sei o que é sair sem Diana atrás.”
PERGUNTA: Você foi instruída acerca dos seus direitos como mãe de uma criança com Síndrome Congênita do Zika?
MÃE 1: “Depois do retorno com a neuro, o pediatra, é... com seis meses também, que ela fechou o diagnóstico, né? Que fez todos osexames pra ver se Diana não tinha mais nada além da microcefalia, aí ela deu o laudo falando sobre a microcefalia e falou que a gente tinha direito ao benefício, né? O BPC. É... mas de benefício mesmo, nessa época, só foi esse que falou que a gente tinha direito. Que a gente soube. O único benefício que a gente soube que a gente tinha direito foi esse.”
MÃE 1: “É... é tanto que aqui o município não fornece o remédio que ela toma, não fornece o suplemento e não fornece uma cadeira adaptada. É... tentei conversar, tentei pedir pra fornecer, é... com o secretário de saúde e tudo mais, mas se alega que não tem direito, que sobre o medicamento que é... é coisa de marca, sobre o suplemento também, que a gente tem que aceitar o que eles fornecem, então... entrei na Justiça pra conseguir. E hoje eu recebo o medicamento e o suplemento, e o carrinho adaptado tá em processo ainda.”
PERGUNTA: Você entrou na Justiça com advogado próprio ou pela Defensoria Pública?
MÃE 1: “Não, pela defensoria mesmo.”
PERGUNTA: Sua criança fica aos cuidados de quem? (Creche/berçário, escola, babá...)
MÃE 1: “Ó, ela até... ela até foi matriculada, foi... é... algum tempo antes da pandemia pra escola, só que... Diana tá com o quadril luxado. E... a questão do quadril luxado dá muita dor. E ela não tem uma cadeira adaptada. Então neste momento, neste momento, até eu conseguir a cirurgia ou conseguir um carrinho adaptado pra ela, ela não tá indo. Só vai pras terapias mesmo.”
PERGUNTA: Onde você busca respostas para suas dúvidas acerca dos cuidados com seu filho?
MÃE 1: “É... eu pergunto aos profissionais que atende ela, fisio, fono... é, neuropediatra, ortopedista... eu saio perguntando pros profissionais que já são acostumados com ela, né? É... a questão de, tipo assim, é, da alimentação, eu pergunto pra fono, da questão da luxação no quadril, ortopedista, aí eu vou... como é que fala... é, depende do que ela tá sentindo...”
PERGUNTA: Qual é a sua relação com o pai da criança? (Casados, amigos, sou casada com outra pessoa...)
MÃE 1: “Não, eu estou junto com o pai de Diana mesmo. É... tipo assim, ele... não sei, eu não entendo, na verdade, a cabeça dele, que ele não demonstra. Pra ele, Diana é uma criança normal. É... não fala sobre diagnóstico, não fala sobre as terapias, não gosta de conversar sobre esse assunto... eu não sei, sinceramente, eu não sei descrever o que é que passa na cabeça dele não. Desde quando Diana nasceu ele trata Diana como se fosse uma criança normal. Como pra ele... É tanto que temos outra agora, né? Melinda. Pra ele não tem diferença não. Entre Melinda e Diana, é... não tem diferença nenhuma.”
PERGUNTA: Você contou com a presença e apoio do pai da criança?
MÃE 1: “Não, no começo da correria mesmo, é... foi eu e minha mãe. Eu morava com minha mãe ainda. Mas depois só foi eu. Ele desde sempre trabalhou, nunca deixou de trabalhar e desde sempre só era eu. Ele nunca acompanhou não. Tipo assim, é um parceiro presente dentro de casa, agora da porta pra fora, nessa questão de acompanhamento... recentemente ele começou a me acompanhar nas viagens pra Salvador, pra me ajudar com Diana. Como Diana tá crescendo, tá ficando pesada, tá difícil viajar com ela sozinha. Só que... só nas viagens mesmo. Esse negócio de ir pra consulta, de fisio, fono, não. Não é tão presente assim não.”