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Índice 
 
1.Intoxicação Exógena: histórico toxicológico 
 
2. Exame físico da Intoxicação Exógena 
 
3.Intoxicação Exógena: Toxíndromes 
 
4.Síndrome serotoninérgica 
 
5.Síndrome neuroléptica maligna (SNM) 
 
6.Diagnósticos diferenciais da intoxicação exógena 
 
7.Manejo do paciente intoxicado 
 
8.Descontaminação 
 
9.Intoxicações por drogas ilícitas e álcool 
 
10.Intoxicação Exógena: quadro clínico cocaína e derivados 
Índice 
 
A Intoxicação exógena pode ser definida como um conjunto de efeitos 
nocivos ao organismo produzidos pela interação de um ou mais agentes 
tóxicos com o sistema biológico, representados por manifestações clínicas ou 
laboratoriais que revelam desequilíbrio orgânico. 
A gravidade das intoxicações é determinada por diversos fatores, dentre 
eles, o grau de toxicidade do agente, a quantidade de substância a que o 
paciente foi exposto, o tempo decorrido entre o acidente e a intervenção 
médica, além de fatores do próprio indivíduo, como idade e competência 
imunológica. 
A maioria dos pacientes intoxicados atendidos no departamento de 
emergência são adultos com overdose intencional por drogas orais. 
Outros cenários clínicos comuns incluem a intoxicação acidental em crianças, 
que representam a maioria das chamadas para os centros regionais de 
controle de intoxicação. 
Drogas de abuso ilícitas; intoxicação crônica a partir de agentes farmacêuticos 
em doses supraterapêuticas; exposições químicas ambientais, industriais e 
agrícolas; e interações medicamentosas, são outras causas de intoxicação. 
No departamento de emergência, é importante avaliar e reconhecer cenários 
onde pode haver toxicidade imediata ou retardada, bem como iniciar a 
descontaminação, aumentar a eliminação das drogas e realizar estratégias 
mais focadas com antídotos, quando indicados. 
Intoxicação Exógena: histórico toxicológico 
Muitas vezes, o paciente intoxicado pode estar alterado ou torporoso, ou ainda 
não cooperativo com o examinador. Isso limita a história ao que pode ser 
obtido a partir de testemunhas, como socorristas ou familiares, e a informação 
gerada pelo exame físico se restringe às funções sobre as quais o paciente não 
possui controle consciente. 
Informações em relação a quais medicamentos ou substâncias estavam 
disponíveis para o paciente e a hora da ingestão também são importantes. 
SE LIGA! Os socorristas rotineiramente trarão todos os frascos de 
medicamentos presentes na cena, não apenas os medicamentos prescritos 
para o paciente ou com relato de ingesta. Um paciente tentando suicídio pode 
enganar intencionalmente a equipe do departamento de emergência, 
armazenando essas medicações em recipientes mal identificados. Outras 
fontes de informações potencialmente úteis incluem registros estatais de 
substâncias controladas, registros de farmácia e prontuários médicos 
anteriores. O acesso ao histórico de mensagens de texto do paciente também 
pode ser útil se o paciente ou o responsável concordarem com isso. 
Exame físico da Intoxicação Exógena 
 
Os pacientes intoxicados frequentemente não estão dispostos ou são 
incapazes de colaborar com um exame físico participativo. O exame físico 
toxicológico, portanto, se baseia em dados observacionais que não necessitam 
de cooperação para serem obtidos. 
Muitos agentes ingeridos podem causar alteração do pulso, da frequência 
respiratória e pressão arterial (PA), bem como do estado mental. Assim, o 
registro rápido e preciso dos sinais vitais do paciente pode fornecer pistas 
valiosas para descoberta do agente envolvido, e permitem a classificação do 
paciente em um estado de excitação fisiológica ou depressão. 
A excitação fisiológica é caracterizada por: 
Taquicardia; 
Elevação de PA; 
Hipertermia; 
Aumento da profundidade respiratória. 
É mais comumente causada por agentes anticolinérgicos, 
simpatomiméticos ou alucinógenos centrais, ou por estados de abstinência 
de drogas. 
A depressão fisiológica, por sua vez, é caracterizada por: 
Estado mental deprimido 
Hipotensão 
Bradicardia 
Diminuição da frequência respiratória 
Diminuição da temperatura 
É mais comumente precipitada pelo etanol, outros agentes sedativos-
hipnóticos, opiáceos, agentes 
colinérgicos (parassimpaticomiméticos), simpatolíticos ou álcoois 
tóxicos (metanol ou etilenoglicol). 
O nível de consciência, tamanho pupilar e presença ou ausência de atividade 
convulsiva podem sugerir um agente em particular. Um exame neurológico 
cuidadoso com foco na intensidade do tônus muscular, clônus ou hiperreflexia 
pode auxiliar no diagnóstico da síndrome serotoninérgica ou síndrome 
neuroléptica maligna (SNM). 
O exame da pele e das membranas mucosas, com especial atenção para a 
coloração e o grau de umidade, pode sugerir a intoxicação por algum entre 
vários agentes. Também pode revelar evidências de abuso de drogas 
injetáveis, como “track marks” (marcas que indicam o uso prolongado e 
repetido no mesmo local de injeção de drogas) ou ulcerações de skin 
popping (geralmente, é uma injeção de depósito subcutânea ou intradérmica e 
não uma injeção intramuscular). 
 
Imagem: Track marks e skin popping, respectivamente. Fonte: Google 
imagens. 
Intoxicação Exógena: Toxíndromes 
As toxíndromes são conjuntos de sinais e sintomas baseados em processos 
autonômicos e neuroquímicos que podem sugerir uma classe particular de 
exposição e direcionar o manejo e o tratamento. 
As cinco entidades tradicionalmente descritas incluem as 
toxíndromes simpatomiméticas, anticolinérgicas, colinérgicas, 
sedativas/hipnóticas e opioides. Além disso, a síndrome serotoninérgica e 
a síndrome neuroléptica maligna foram bem descritas. 
Simpatomimética 
Esta toxíndrome é definida por um estado de excesso simpatomimético, 
tipicamente causando os efeitos esperados da reação de “luta ou fuga”. Os 
pacientes estão frequentemente alterados e podem estar delirantes, 
especialmente com a ingestão de derivados das anfetaminas, como a N-metil-
3,4-metilenodioxianfetamina (MDMA). 
Os sinais vitais estão tipicamente elevados e apresentam hipertensão, 
taquicardia e taquipneia. Eles também podem estar hipertérmicos, como 
consequência da elevação da taxa metabólica, midriáticos e diaforéticos. 
SE LIGA! Em intoxicações graves, alterações do débito cardíaco podem 
ocorrer por diminuição do tempo de enchimento diastólico, juntamente com 
a arritmogênese, resultando em colapso circulatório e choque, que podem 
ser refratários à ressuscitação volêmica e aos agentes vasopressores. 
Anticolinérgica 
Muitos fármacos possuem propriedades antimuscarínicas e, portanto, esta 
toxíndrome é comumente encontrada. Ao bloquear o tônus colinérgico 
normal, ocorre uma alteração no equilíbrio homeostático normal entre os 
braços simpáticos e parassimpáticos do sistema nervoso autônomo. Isso 
permite que o componente simpático funcione sem oposição, gerando um 
estado simpatomimético relativo. 
Portanto, muitos dos sintomas atribuíveis à toxíndrome anticolinérgica, 
incluindo delírio, hipertermia, midríase e rubor cutâneo, compartilham 
semelhanças. Em contraste, como as glândulas secretoras da pele e das 
membranas mucosas são colinergicamente inervadas, esses sistemas estão 
tipicamente secos e não diaforéticos, como se encontram na toxíndrome 
simpatomimética. 
Os sinais e sintomas típicos podem ser lembrados pelo mnemônico “louco 
como um chapeleiro, quente como uma lebre, cego como um morcego, 
vermelho como uma beterraba e seco como um osso”. 
Colinérgica 
A toxíndrome colinérgica resulta da superestimulação da porção 
parassimpática do sistema nervoso autônomo, que realiza as funções 
de “descanso e digestão”. 
Esses pacientes tipicamente têm “fluidos provenientes de todos os 
orifícios”, como consequência do aumento da secreção glandular, e se 
apresentam com diaforese, perda de urina, miose, broncorreia, êmese, 
lacrimejamento, letargia e salivação. 
Os agentes causadores são principalmente anti-colinesterásicos, como 
inseticidas organofosforadose carbamatos. Estas substâncias são 
facilmente disponíveis como pesticidas, mas também foram projetadas como 
armas de destruição em massa. 
É importante reconhecer rapidamente esta toxíndrome porque os pacientes 
morrem frequentemente de broncorreia excessiva, efetivamente se afogando 
nas próprias secreções, a não ser que possa ser administrado o tratamento 
com antídoto e regeneradores da colinesterase. 
Sedativa/hipnótica 
A marca dessa toxíndrome é a sedação. Isso geralmente ocorre em um 
espectro dependendo do agente específico ingerido, da via e sua potência. É 
bem conhecido no departamento de emergência, porque a intoxicação por 
etanol ocorre frequentemente. 
Outros agentes, como os barbitúricos e os benzodiazepínicos, também 
causarão um quadro similar, assim como substâncias ilícitas, como o gama-
hidroxibutirato (GHB). A concomitância de lesões traumáticas pode ser alta. 
SE LIGA! Em ingestões graves, um estado de anestesia geral pode ser 
alcançado com perda do tônus e reflexos de proteção das vias aéreas. Além 
disso, pode causar hipotermia através da supressão do metabolismo muscular. 
A hipotermia pode ser tratada com aquecimento externo passivo. 
Zolpidem 
O zolpidem é um sedativo-hipnótico não benzodiazepínico usado para tratar a 
insônia. Ele promove o sono aumentando a atividade do ácido GAMA-
aminobutírico, e foi inicialmente promovido como uma melhoria em relação aos 
benzodiazepínicos para o tratamento da insônia. 
Ele deveria ser mais seguro, produzir menos comprometimento psicomotor 
com doses terapêuticas e não ser aditivo, além de não estar associado a um 
estado de abstinência. 
No entanto, cursa com tolerância e dependência a seus efeitos e está 
associado a estados de abstinência caracterizados por insônia, ansiedade, 
agitação e delírio. Por causa do comprometimento psicomotor ocasional, os 
indivíduos não devem dirigir ou participar de atividades perigosas no dia 
seguinte ao uso de zolpidem. 
Existem inúmeros relatos de sonhos vívidos após o seu consumo. Podem 
ocorrer, na intoxicação, sedação (incluindo coma) e vômitos. Óbito é descrito 
com coingestões e não com zolpidem isoladamente. 
Opioide 
Semelhante aos sedativos/hipnóticos, a toxíndrome opioide também envolve 
miose, sedação e drive respiratório diminuído. O diagnóstico é confirmado 
observando uma resposta à naloxona, um antagonista direto dos receptores 
opioides. 
No entanto, como certos opioides possuem potências mais altas, a falta de 
resposta não exclui a intoxicação por opioides. Além disso, este é um 
diagnóstico clínico porque nem todos os opioides serão detectáveis pela 
triagem toxicológica padrão. 
SE LIGA! A toxíndrome por opioide provoca, na maioria das vezes, miose 
pupilar, mas existe uma notável exceção da pentazocina e do propoxifeno, 
que podem se manifestar com midríase. 
Síndrome serotoninérgica 
Um estado de excesso serotonérgico define esta toxíndrome, e muitas vezes é 
precipitado pela adição de um novo agente serotoninérgico ou uma substância 
que interfere com o metabolismo de um agente previamente tolerado. 
Tipicamente descrita com os inibidores seletivos da recaptação da 
serotonina (ISRS) e inibidores da monoamina oxidase (IMAOs), ela vem 
sendo relatada com antidepressivos tricíclicos e antipsicóticos atípicos. 
Consequentemente, a síndrome serotoninérgica geralmente ocorre dentro de 
horas a dias da introdução de uma nova medicação, embora venha sendo 
descrita como forma tardia devido às meias-vidas prolongadas de alguns 
antidepressivos. 
As manifestações da síndrome serotoninérgica incluem rebaixamento do nível 
de consciência, hipertermia e agitação, bem como hiperreflexia, clônus e 
diaforese. 
Síndrome neuroléptica maligna (SNM) 
Semelhante à síndrome serotoninérgica, a SNM também apresenta 
rebaixamento do nível de consciência, hipertermia e agitação; no entanto, 
diferentemente da síndrome serotoninérgica, os efeitos musculares 
periféricos tendem a ser rigidez e hiporreflexia, ao invés de clônus e 
hiperreflexia. Isto ocorre devido a depleção dopaminérgica pelo uso de 
antagonistas da dopamina, como antipsicóticos. 
Diagnósticos diferenciais da intoxicação exógena 
Frequentemente, os pacientes intoxicados têm algum grau de delírio como 
parte de sua apresentação. Desta maneira, deve ser considerado excluir 
outras causas de rebaixamento do nível de consciência ao iniciar o 
tratamento toxicológico apropriado. 
Qualquer paciente que se apresente intoxicado na emergência deve ter as 
causas reversíveis de rebaixamento do nível de consciência excluídas, 
como hipoglicemia e deficiências nutricionais. 
O trauma é frequentemente concomitante com a intoxicação, portanto, um 
exame cuidadoso com o paciente despido, procurando-se por evidência de 
lesão traumática, também deve ser realizado. 
Testes diagnósticos 
 
Na maioria dos casos, a provável exposição do paciente a algum tóxico 
geralmente é conhecida e as toxinas já foram suspeitadas ou identificadas, 
mas no cenário de uma overdose ou exposição desconhecida, uma ampla 
gama de exames laboratoriais é frequentemente usada para detectar 
anormalidades e potencialmente elucidar o quadro clínico. 
As investigações diagnósticas rotineiramente realizadas são: hemograma, 
bioquímica sérica com função renal, provas de função hepática, exame de 
urina (com teste de gravidez, se pertinente), triagem toxicológica de urina, 
concentração de álcool sérico, lactato sérico e glicemia. 
Com base nestes resultados, ou quando se sabe o que foi ingerido, outros 
testes podem ser obtidos, tais como dosagens séricas específicas. Quando 
exames para um agente específico não estão disponíveis ou não são 
realizados no local, o tratamento empírico geralmente começa antes que 
estes resultados estejam disponíveis. 
Manejo do paciente intoxicado 
Inicialmente, é importante avaliar em que fase da toxicose o paciente se 
encontra. 
Fase pré-clínica: É a fase que ocorre imediatamente após as superfícies 
externa ou interna do organismo entrarem em contato com o toxicante, mas 
ainda não há sinais ou sintomas. O objetivo da abordagem nesta fase é reduzir 
a toxicidade. 
Fase tóxica: Estende-se do início dos sintomas até o pico das manifestações. 
O objetivo aqui é estabilização. Garantir vias aéreas, ventilação, 
hemodinâmica, além de fornecer antídoto específico, quando houver 
disponibilidade. 
Fase de resolução: Pico dos sintomas. O objetivo neste caso é o 
acompanhamento até recuperação completa do paciente. 
De maneira geral, devemos tratar pacientes com intoxicação aguda da mesma 
maneira que outras doenças ameaçadoras à vida, sendo que o principal foco é 
seguir os “ABCs” básicos da ressuscitação, assegurando a proteção das vias 
aéreas e a adequação da ventilação, mantendo o estado circulatório do 
paciente com ressuscitação hídrica e suporte vasopressor. 
Se a via aérea estiver comprometida ou em risco de comprometimento, ou 
ainda se o esforço respiratório for insuficiente para manter a ventilação 
adequada, a intubação geralmente é a conduta de escolha. 
Deve-se obter acessos venosos, com cateteres periféricos e centrais já 
conhecidos pelos profissionais. Os acessos intraósseos também são locais de 
acesso viáveis a partir da perspectiva toxicológica, porque não existem 
contraindicações conhecidas para o tratamento com antídoto através desta via. 
Uma vez que o tratamento de suporte tenha sido iniciado e a ameaça imediata 
para o ABC tenha sido estabilizada, deve-se então progredir para uma 
avaliação sistemática das estratégias de descontaminação, aumento da 
eliminação, terapia focada (antídotos) e obtenção de ajuda do especialista. 
Descontaminação 
A descontaminação é o processo de prevenção da absorção sistêmica. Se a 
intoxicação ocorreu através da pele, devem ser retiradas todas as roupas do 
paciente, removidos todos os resíduos e ter a pele lavada copiosamente. Se foi 
por via ocular, com auxílio de anestésico tópico, deve-se lavar os olhos com 
soro fisiológico e solicitaravaliação imediata do oftalmologista. 
A maioria das intoxicações no departamento de emergência, contudo, envolve 
o trato gastrointestinal, e as medidas possíveis são: carvão ativado, lavagem 
gástrica, irrigação intestinal, hiper-hidratação e alcalinização da urina. A 
indução de vômitos não é mais recomendada no departamento de emergência 
(p. ex., xarope de ipeca). 
Carvão ativado 
O carvão ativado (CA) é um pó altamente adsorvente feito de partículas 
porosas superaquecidas e com alta área superficial, produzidas por pirólise de 
material orgânico. Sua extensa área de superfície é coberta por uma rede 
baseada em carbono que também inclui grupos funcionais (por exemplo, 
carbonil, hidroxila) que adsorvem produtos químicos em poucos minutos após o 
contato, impedindo a absorção gastrointestinal e a subsequente toxicidade. 
É mais provável que o CA beneficie os pacientes quando administrado 
enquanto a toxina permanece no estômago. Tradicionalmente, acredita-se que 
esse período esteja dentro de uma hora após a ingestão de veneno. O 
carvão reduz, em média, em 69% a absorção de substâncias tóxicas quando 
administrado até trinta minutos após a ingestão. Essa redução foi de 34% 
quando o carvão foi usado na primeira hora da ingestão. Geralmente, após 
duas horas da ingestão, o carvão é ineficaz. 
O carvão ativado tem sido administrado com maior frequência em uma dose de 
25 a 100 gramas (10 a 25 gramas ou 0,5 a 1,0 g/kg em crianças menores). 
Deve-se diluir o carvão em água, soro fisiológico ou catárticos (manitol ou 
sorbitol), geralmente 8 mL de solução para cada grama de carvão. Este último 
é o mais recomendado, não por aumentar a eficácia do carvão, mas por evitar 
constipação. Quando indicado em múltiplas doses, recomenda-se 0,5g de 
carvão/kg, a cada 4 horas, mas recomendamos a individualização da dose de 
acordo com a dose do agente ingerido, através da administração de carvão 
ativado em uma proporção de 10:1 (proporção de carvão ativado em relação ao 
agente). 
Se o paciente está sedado, não protege a via aérea ou não está disposto a 
beber a suspensão de carvão ativado, a administração é contraindicada. 
Isso pode ser particularmente verdadeiro para crianças pequenas com 
capacidade limitada para beber a pasta. Além disso, não se deve colocar uma 
sonda nasogástrica exclusivamente para administrar carvão ativado, porque o 
risco de aspiração ou instilação direta de carvão ativado nos pulmões aumenta 
nesses pacientes, reduzindo assim a relação risco-benefício. 
SE LIGA! O agente ingerido deve ser passível de adsorção por carvão ativado. 
Recomenda-se consultar um centro de intoxicação regional ou médico 
toxicologista se houver incerteza quanto as indicações para o uso do carvão 
ativado. 
Lavagem gástrica 
A lavagem gástrica consiste na passagem de uma sonda nasogástrica de 
grosso calibre. Deve-se colocar o paciente em decúbito lateral esquerdo 
com a cabeça em nível levemente inferior ao corpo. Através da sonda 
administram-se pequenos volumes de soro fisiológico (100 a 250 mL), 
mantendo-se a sonda aberta, em posição inferior ao paciente. 
Existem poucos dados ou evidências que mostram sua eficácia e não deve ser 
realizada rotineiramente para o tratamento de pacientes intoxicados. Devido 
aos riscos de aspiração e trauma esofágico, a American Association of Poison 
Centers sugere que apenas seja realizada dentro de uma hora após a ingestão 
de um agente tóxico potencialmente ameaçador à vida, que não se adsorve ao 
carvão ativado ou para o qual não existe antídoto e, mesmo assim, em um 
centro com experiência suficiente para executar o procedimento com 
segurança. Raramente uma intoxicação atenderá a todos esses critérios, 
portanto, apesar de seu uso antes difundido, a lavagem gástrica é praticamente 
apenas de interesse histórico. 
Alcalinização sérica 
Se o sangue for suficientemente alcalinizado, certas substâncias hidrossolúveis 
ingeridas, tais como salicilatos, metotrexato e fenobarbital, serão 
submetidas a aprisionamento de íons e a aumento da eliminação urinária. 
Isto é especialmente importante em intoxicações por salicilato, porque a 
alcalinização não só promove a eliminação, mas também evita que o salicilato 
atravesse a barreira hematoencefálica no sistema nervoso central (SNC). 
Deve-se monitorar o pH sérico e o nível de bicarbonato, bem como o pH 
urinário, com o objetivo de se obter um pH sérico de aproximadamente 7,5 e 
um pH urinário de aproximadamente 8,0. 
Certifique-se também de que o nível de potássio sérico está normal, porque a 
alcalinização causará uma alteração intracelular do potássio e, 
consequentemente, aumentará a sua reabsorção urinária, excretando íons de 
hidrogênio na urina, diminuindo o gradiente de pH e eliminando os benefícios 
desse processo. 
Para que isso seja alcançado, prepare uma solução com 850 mL de soro 
glicosado a 5% + 150 mL de bicarbonato de sódio a 8,4% (150 mEq de bic). 
Essa solução alcaliniza a urina e tem concentração fisiológica de sódio (0,9%). 
Se não houver contraindicação, infundir um litro dessa solução a cada seis a 
oito horas e monitorizar o pH urinário. 
Métodos dialíticos 
Acidentes agudos de evolução desfavorável podem exigir o uso de medidas de 
aumento da excreção renal, dentre estas a diálise, para remoção das 
substâncias tóxicas. Em certos casos, a falência renal aguda secundária a 
intoxicação pode ser o próprio fator determinante do emprego de diálise. 
No entanto, poucos estudos mostram que métodos de aumento de eliminação 
realmente encurtam a duração do quadro clínico toxicológico ou melhoram os 
desfechos clínicos. 
A hemodiálise clássica é o método dialítico mais usado e disponível. Ela 
consiste em uma membrana sintética semipermeável que substitui os 
glomérulos e túbulos renais e atua como filtro para os rins deficientes. Tem-se 
ainda outro modo dialítico que pode ser utilizado na intoxicação exógena, 
a hemoperfusão. 
A hemoperfusão difere da hemodiálise convencional pelo uso de hemofiltros 
com carvão ativado, os quais possuem efeito de absorção, ou seja, de aderir 
a substancias tóxicas para que estas sejam eliminadas do sangue. 
Intoxicações por drogas ilícitas e álcoois 
Cocaína e derivados 
A cocaína, supostamente o estimulante mais potente de origem natural, é 
extraída das folhas da planta de coca (Erythroxylum coca), originária das terras 
altas dos Andes da América do Sul. Os nativos dessa região mastigam ou 
preparam folhas de coca em um chá para refrescar e aliviar a fadiga, 
semelhante aos costumes de mascar tabaco e beber chá ou café em outras 
culturas. 
A pasta de cocaína não purificada é convertida em formas mais utilizáveis de 
cocaína. A base livre cristalizada do alcaloide da cocaína é conhecida 
como crack, o qual é inalado com o uso de um “cachimbo de crack” 
especialmente projetado para tolerar a alta temperatura necessária para 
volatilizar a cocaína pura. 
A alta solubilidade lipídica e o transporte rápido dos pulmões para o cérebro 
contribuem para o início rápido da ação do crack. Os sais solúveis em água da 
cocaína (cloridrato e sulfato de cocaína) estão disponíveis como um pó 
cristalino branco que é utilizado pela via intranasal ou dissolvido e injetado por 
via intravenosa. A administração oral é rara, exceto para os pacientes que 
estão contrabandeando ou escondendo drogas. 
O uso agudo da cocaína causa liberação de dopamina, epinefrina, 
norepinefrina e serotonina. Estes neurotransmissores atuam em diferentes 
subtipos de receptores, causando diversos efeitos, entretanto o mais 
importante é a estimulação adrenérgica pela norepinefrina e epinefrina. 
A norepinefrina causa vasoconstrição por estimulação dos receptores alfa-
adrenérgicos no músculo liso vascular, enquanto a epinefrina aumenta a 
contratilidade miocárdica e a frequência cardíaca mediante a estimulação dos 
receptores beta1-adrenérgicos. 
Além da liberação de catecolaminas, a recaptação desses neurotransmissores 
estimulantes a partir da fenda sináptica é inibida,alterando o equilíbrio normal 
entre os tônus excitatório e inibitório no SNC. Uma estimulação subsequente 
propaga a liberação de catecolaminas periféricas. A recaptação da serotonina 
também é inibida de forma semelhante e pode levar ao aumento da resposta 
serotoninérgica. 
Intoxicação Exógena: quadro clínico cocaína e derivados 
 
O efeito clínico primário da cocaína é a excitação do sistema nervoso 
simpático. Pacientes com toxicidade moderada estão alertas e acordados, mas 
podem ter diaforese, taquicardia, midríase e hipertensão, sem danos aos 
órgãos. Um paciente mais severamente intoxicado pode estar agitado, 
combativo e hipertérmico. 
O dano aos órgãos é raro, mas pode se manifestar como uma emergência 
hipertensiva. O uso agudo de cocaína está associado a vasoconstrição 
arterial e a formação aumentada de trombos. A taquicardia e a 
hipertensão aumentam a demanda miocárdica de oxigênio e promovem 
aumento das forças de cisalhamento vascular. 
Em altas concentrações sanguíneas, os efeitos inotrópicos negativos da 
cocaína podem causar depressão aguda da função ventricular esquerda e 
insuficiência cardíaca. A cocaína pode causar disritmias supraventriculares 
e ventriculares através de ações diretas nos receptores do miocárdio ou como 
complicação da isquemia do miocárdio. 
SE LIGA! Todos os pacientes jovens com síndrome coronariana aguda (SCA), 
particularmente aqueles com os sintomas citados acima, devem ser 
cuidadosamente questionados sobre o uso de cocaína. 
SAIBA MAIS: O uso crônico de cocaína pode causar aterogênese acelerada e 
hipertrofia do ventrículo esquerdo (VE), o que aumenta o risco de isquemia ou 
infarto do miocárdio. Isso ocorre devido a quantidade de catecolaminas 
circulantes, levando ao aumento de radicais livres que predispõem ao 
desenvolvimento e formação aterosclerótica. A cocaína está associada a 
isquemia cardíaca em 5 a 6% dos pacientes com visitas relacionadas a cocaína 
no departamento de emergência. A cocaína ainda pode ocasionar outras 
condições, como aneurisma da artéria coronária e cardiomiopatia dilatada. 
A cocaína pode causar uma variedade de complicações no sistema nervoso 
central (SNC), incluindo agitação psicomotora, convulsões, coma, cefaleia, 
hemorragia intracraniana e sintomas neurológicos focais. 
A agitação psicomotora ocorre através de vários mecanismos, como aumento 
nos aminoácidos excitatórios glutamato e aspartato do SNC, e liberação dos 
neurotransmissores excitatórios noradrenalina, serotonina e dopamina. 
Esta agitação psicomotora induzida por cocaína pode causar 
hipertermia quando a vasoconstrição periférica impede o corpo de dissipar o 
calor gerado pela agitação persistente. A mortalidade pode chegar a 33% 
quando a hipertermia se desenvolve no cenário de intoxicação por 
cocaína. As convulsões ocorrem em aproximadamente 3 a 4% das consultas 
de emergência relacionadas à cocaína após o uso agudo ou crônico. 
Os pacientes com toxicidade à cocaína podem apresentar um espectro de 
complicações músculo-esqueléticas. Os sinais podem variar de elevação da 
creatina fosfoquinase e da mioglobina a alterações eletrolíticas (hipercalemia, 
hipocalcemia) observadas na rabdomiólise. Pacientes com rabdomiólise 
grave podem ter acidose láctica, hipercalemia e insuficiência renal 
potencialmente fatais. 
 
Chumbinho: como o veneno age no organismo (e o que fazer) 
O chumbinho é uma substância granulada de cor cinza escuro, que 
contém aldicarb e outros inseticidas. O chumbinho não tem cheiro, nem sabor 
e, por isso, é frequentemente usado como veneno para matar ratos. Embora 
ele possa ser comprado de forma ilegal, seu uso é proibido no Brasil e em 
outros países, porque não é seguro como raticida e tem grandes possibilidades 
de envenenar pessoas. 
Quando uma pessoa ingere chumbinho acidentalmente, a substância inibe uma 
enzima muito importante do sistema nervoso que é essencial para a vida e que 
é conhecida como "acetilcolinesterase". Por esse motivo, pessoas com 
intoxicação por chumbinho geralmente apresentam sintomas como tonturas, 
vômitos, excesso de suor, tremores e sangramentos. Se isto acontecer, deve-
se chamar o SAMU, através do número 192, explicando onde se está e como 
está a pessoa que tocou ou ingeriu a substância. 
Se a vítima não estiver respirando ou se o seu coração não estiver batendo, 
deve-se realizar a massagem cardíaca, para manter a oxigenação do sangue e 
do cérebro, a fim de salvar sua vida. É importante lembrar que a respiração 
boca-a-boca não deve ser feita, já que, se o envenenamento tiver acontecido 
por ingestão, existe risco de a pessoa que está prestando o auxílio ficar 
também intoxicada. Confira como fazer a massagem cardíaca corretamente. 
 
Quando suspeitar de envenenamento 
Os sinais e sintomas de envenenamento com chumbinho demoram cerca de 1 
hora para se manifestar, mas é possível suspeitar do contato ou ingestão de 
chumbinho quando surgem sinais como: 
Existência de resíduos de chumbinho nas mãos ou boca da pessoa; 
Hálito diferente do habitual; 
Vômito ou diarreia, que pode conter sangue; 
Lábios pálidos ou arroxeados; 
Ardência na boca, garganta ou estômago; 
Sonolência; 
Dor de cabeça; 
Mal estar; 
Aumento da salivação e do suor; 
Dilatação da pupila; 
Pele fria e pálida; 
Confusão mental, que se manifesta por exemplo quando a pessoa não 
consegue dizer o que estava fazendo; 
Alucinações e delírios, como ouvir vozes ou achar que está falando com 
alguém; 
Dificuldade para respirar; 
Aumento da vontade de urinar ou urina ausente; 
Convulsões; 
Sangue na urina ou nas fezes; 
Paralisia de parte do corpo ou completa impossibilidade de se mover; 
Coma. 
Em caso de suspeita de envenenamento, deve-se levar a vítima para o hospital 
o mais rápido possível e ligar para o Disque-Intoxicação: 0800-722-600. 
O que fazer em caso de intoxicação com chumbinho 
Em caso de suspeita ou ingestão de chumbinho, é aconselhado ligar 
imediatamente para o SAMU, discando o número 192, para pedir socorro ou 
levar a vítima imediatamente para o hospital. 
Se a pessoa não estiver respondendo nem respirando 
Quando se observa que a pessoa não está respondendo nem respirando, é 
sinal de que está entrando em parada cardiorrespiratória, o que pode levar à 
morte em poucos minutos. 
Nessas situações, o indicado é chamar a ajuda médica e iniciar a massagem 
cardíaca, que deve ser feita da seguinte forma: 
Deitar a pessoa de barriga para cima e sobre uma superfície dura, como o 
chão ou uma mesa; 
Posicionar as mãos sobre o peito da vítima, com as palmas viradas para 
baixo e dedos entrelaçados, no ponto médio da linha entre os mamilos; 
Empurrar as mãos com força contra o peito (compressão), utilizando o peso 
do próprio corpo e mantendo os braços esticados, contando, no mínimo, 2 
empurrões por segundo. A massagem deve ser mantida até a chegada do 
serviço da equipe médica e é importante deixar que o tórax volte à posição 
normal entre cada compressão. 
A vítima pode não acordar mesmo quando recebe a massagem cardíaca 
corretamente, porém, não se deve desistir até à chegada da ambulância ou dos 
bombeiros para tentar salvar a vida da vítima. 
No hospital, se for confirmada a intoxicação por chumbinho, a equipe médica 
poderá fazer uma lavagem gástrica, usar soro para eliminar o veneno do corpo 
mais rápido, e remédios contra hemorragia, convulsões e carvão ativado para 
evitar a absorção das substâncias tóxicas que ainda estão no estômago. 
Veja com maior detalhe como fazer a massagem cardíaca corretamente. 
O que não se deve fazer 
Em caso de suspeita de envenenamento com chumbinho, não é aconselhado 
oferecer água, suco ou qualquer líquido ou alimento para a pessoa ingerir. 
Além disso, também não se deve tentar provocar vômito colocando o dedo na 
garganta da vítima. 
Para proteção própria, também se deve evitar fazer respiração boca-a-boca à 
vítima, já que isso pode causar intoxicação em quem está fazendo o 
salvamento. 
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Bibliografia 
CENTRO DE INFORMAÇÃO E ASSISTÊNCIA TOXICOLÓGICA DO 
HOSPITAL INSTITUTO DOUTOR JOSÉ FROTA/IJF- PREFEITURA DE 
FORTALEZA. Intoxicações agudas: guia prático para o tratamento. 2017. 
Disponível em: 
<https://saude.fortaleza.ce.gov.br/images/Manuais_saude/Guia_IJF_Intoxicaco
es.pdf>. Acesso em 25 fev 2020 
SILVA, Ana Carolina Sousa et. al.. Intoxicação exógena por “chumbinho” como 
forma de autoextermínio no Estado de Goiás, 2003 - 20071. Rev. Eletr. Enf. 
Vol.12. 4.ed; 686-691, 2010 
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