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ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 2Medgrupo - CiClo 2: M.E.D VÍDEO DE INTRODUÇÃO Síndrome IctérIca clínica médica - VOlUmE 1 Diagnóstico Diferencial (Hypothesis) A SínDrome IctérIcA Fisiologia Etiologia Quadro Clínico Exames Laboratoriais Abordagem da Icterícia Seção 1: LeSÃo HepAtoceLuLAr (HepAtopAtIAS AguDAS) 1) Hepatites Virais Agudas - de “A” a “e” Hepatite Viral B Aguda A História Natural e os “Marcadores” O Diagnóstico: A Interpretação dos Marcadores Diagnóstico: Situações Especiais Manifestações Clínicas Complicações Tratamento Transmissão Profilaxia Hepatite Viral D (Delta) Hepatite Viral A Prevenção da Hepatite A Hepatite Viral E Hepatite Viral C Aguda 2) Hepatite Alcoólica Conceitos Gerais Manifestações Clínicas Tratamento Prognóstico 3) Hepatite medicamentosa Diagnóstico e Tratamento 4) Hepatite Autoimune Conceitos Gerais, Manifestações Clínicas e Laboratoriais Tipos de Hepatite Autoimune Diagnóstico Tratamento Evolução e Prognóstico 5) Hepatites Isquêmica e congestiva Hepatite Isquêmica Hepatite Congestiva 6) Insuficiência Hepática Aguda (Hepatite Fulminante) Seção 2: VISÃo cIrúrgIcA: coLeStASe (VIAS BILIAreS) 1) Doenças Litiásicas da Via Biliar A) Colelitíase Etiologia Manifestações Clínicas e Diagnóstico Tratamento B) Complicações da Colelitíase Colecistite Aguda Calculosa Síndrome de Mirizzi Coledocolitíase Colangite Bacteriana Aguda 2) neoplasias do Sistema Biliar e periampulares A) Neoplasias do Sistema Biliar Pólipos da Vesícula Biliar Carcinoma de Vesícula Biliar Colangiocarcinoma B) Neoplasias Periampulares Carcinoma de Cabeça de Pâncreas Carcinoma da Ampola de Vater Colangiocarcinoma Distal Carcinoma Periampular de Duodeno 3) Doenças Não Litiásicas, Não Neoplásicas das Vias Biliares Colecistite Aguda Acalculosa Colangite Esclerosante Primária Colangite Biliar Primária (Cirrose Biliar Primária) Cistos Biliares (Doença de Caroli) Outras Causas de Colestase Não Neoplásica e Não Litiásica 4) Laparoscopia e suas repercussões Sistêmicas Seção 3: DIStúrBIoS prImárIoS Do metABoLISmo DA BILIrruBInA Predomínio de Bilirrubina Indireta Síndrome de Gilbert Síndrome de Crigler-Najjar Predomínio de Bilirrubina Direta Síndrome de Dubin-Johnson Síndrome de Rotor Síndrome Ictérica x prova de pediatria m.e.D r3 – clínica médica m.e.D r3 – cirurgia geral Área de Treinamento M.E.D QueStõeS De concurSoS comentárIoS tõe 3 – M.E.D - 2019 2019 http://#scrolldown http://#videomiolo=intro_13707 http://#page=3 http://#page=22 http://#page=29 http://#page=76 http://#page=140 http://#page=174 4 Caso 1 Início de ano, promessas feitas, gás total, tudo é felicidade!!! Esse ano não tem carnaval, não tem feriado... é só estudar – você vai repetindo, meio que tentando se convencer! A caminho do MED, nota logo na entrada um simpático funcionário, aparentando uns 20 anos e que chama a atenção por apresentar a pele e a esclera discretamente amareladas. “Nossa, até nisso o Medgrupo pensou, um personagem para representar a primeira aula!” – você esbraveja. Nesse instante, sua namorada o belisca for te pedindo para falar mais baixo. O rapaz é vizinho dela e não anda nada feliz com essa alteração de coloração. Aparentemente era saudável, não tinha qualquer problema de saúde e tudo começou quando passou a acordar mais cedo para malhar. “Pelo físico contido, não deve ser anabolizante” – você debocha! Sua namorada o belisca mais for te ainda! Irritada, diz que ele chegou a pedir sua opinião, mas que não conseguia entender, pois os exames que tinha visto eram todos normais (função renal, hepática, hemograma etc), exceto por um aumento da bilirrubina. No papel, estava escrito também que havia predomínio da fração indireta, mas como não se lembrava do significado desse dado, falou para o rapaz que era “até melhor assim”. Hoje, durante a aula, ela espera entender melhor o que ele deve ter... Cite o provável diagnóstico deste paciente e que fatores podem servir como precipitantes. Que recomendações devem ser dadas após o reconhecimento diagnóstico? O que mudaria no nosso raciocínio se o paciente também apresentasse anemia? http://#scrolldown http://#page=254 http://#page=255 http://#page=256 5 Caso 2 Pedro é um menino de 10 anos, que acaba de ser internado em função de queda impor tante do estado geral, associada a náuseas e vômitos persistentes. Sua mãe relata que o quadro já durava mais de 10 dias. Numa abordagem inicial, alguns exames foram solicitados: hemograma completo, sódio, potássio, ureia, creatinina e glicose, mas todos se revelaram dentro dos limites da normalidade. No segundo dia de internação, observa-se que os olhos de Pedrinho ficam amarelados... Bingo! Deve ser hepatite viral! Solicitados novos exames, desta vez mais específicos: Bt: 8 mg/dl (ref: 0,3-1,2 mg/ dl), Bd: 6,8 mg/dl (ref: 0 - 0,2 mg/dl), FA: 320 U /L(ref: 25-100 U /L), GGT: 90U /L (ref: 2-30U /L), AST: 680 U /L(ref: 10-30 U /L), ALT: 920 U /L (ref: 10-40U /L). anti-HAV IgM(+), HBsAg(-), anti-HBc(-), anti-HBS(+), anti-HCV(-). Pedro recebeu alta com orientação de repouso e 4 suspiros de 6/6h. A mãe do menino foi orientada sobre o diagnóstico e tranquilizada de que, em mais alguns dias, ele já estaria melhor… Passadas duas semanas, o estado geral de Pedro era realmente bem melhor! No entanto, ele se mantinha amarelado e um cer to grau de cansaço que limitava suas peripécias diárias. Com uma mistura de preocupação e raiva do diagnóstico errado, a mãe do garoto volta ao hospital e adentra esbaforida no consultório médico. – Dotô, aquilo não era hepatite, meu filho continua com “Ctiriça”!! Como não havia vagas nas enfermarias, Pedro permaneceu ali mesmo no corredor dos ambulatórios, enquanto aguardava alguns exames solicitados pelo plantonista. Os resultados até que não demoraram: Bilirrubina total: 6 mg/ dl (ref: 0,3-1,2 mg/dl), Bd: 5,2 mg/dl (ref: 0 - 0,2 mg/dl), FA: 870 U/L (ref: 25-100U/ L), GGT: 430 U/L (ref: 2-30U /L), AST: 180 U /L (ref: 10-30 U/ L), ALT: 220 U /L (ref: 10-40U /L), anti-HAV IgM (+)/ IgG (+), HBsAg (-), anti-HBc (-), anti-HBS (+), anti-HCV (-). Qual(is) é(são) a(s) sua(s) principal(is) hipótese(s) diagnóstica(s) para o caso de Pedrinho? Justifique. Qual o prognóstico que você daria para ele? CONTINUA http://#scrolldown http://#page=257 http://#page=258 6 Qual seria sua melhor hipótese para o achado de anti-HBs(+) ? Caso 3 João Antônio, um estudante de 18 anos, queixa-se de febre não aferida (“interna” - SIC), associada a edema perimaleolar ++/4+ e procura atendimento médico no posto de saúde mais próximo a sua residência. Na consulta, alega ter percebido o “inchaço” há 6 dias. O clínico solicita alguns exames de sangue e urina e remarca uma nova consulta em uma semana. No retorno, o estudante agora se queixa de dor impor tante nas ar ticulações das mãos e punhos. No exame físico, já não se mostra mais ictérico, mas apresenta edema discreto em punho esquerdo e uma “ponta” de baço palpável.. . Os resultados dos exames laboratoriais solici tados na primeira consulta revelam: Ht: 5.000.000/mm3; Hb:13 g/dl; Leuc.: 10.000/mm3 (bastões 5%); Plaq.: 200.000/ mm3; EAS: hematúria, cilindros hemáticos e leucoci tários. Sem rumo diagnóstico, o “clínico” do posto de saúde (na verdade, ginecologista de formação) orienta o estudante a procurar atendimento médico em um Hospital Universitário. Após dias de labuta para conseguir a bendita consulta, João finalmente é atendido. Assim que a por ta do ambulatório é aber ta, João se surpreende e tranquiliza: - Valeu à pena tanto sacrifício, pois olha só... Esse hospital é bom mesmo. Agora vou ser atendido não apenas por um, mas por dois doutores! Lá estavam eles em sua frente, de pé, ambos com jaleco branco, impecáveis, com um escudo imponente bordado em suas mangas - Pedro (R1) e Mariano (Interno). João põe-se a relatar toda a sua ladainha e mostrar os resultados dos exames já realizados. As dores ar ticularese o edema de punho já não existiam mais, e o baço, segundo os novos doutores, não se encontrava mais palpável. Apenas a coloração mais amarelada da esclera e uma dor à palpação do hipocôndrio direito permaneciam. Novos exames são solicitados e revelam: AST 470 U/L, ALT 690 U/L, FA e Gama-Gt no limite superior da normalidade; Bilirrubina total: 8 mg/dl (predomínio da fração direta); anti-HVA IgG (+)/IgM (-); HBsAg (+); anti-HBc IgM (+); HBeAg (-); anti-HBs (-); anti-HCV (-). CONTINUA http://#scrolldown http://#page=259 7 Qual o diagnóstico de João Antônio? Como você justificaria os achados clínicos e laboratoriais da primeira consulta? Como você justificaria o desaparecimento dos achados clíni- cos e laboratoriais da primeira consulta? Caso 4 Numa bela manhã de segunda-feira, ainda recuperando-se das aventuras do final de semana, ao adentrar na enfermaria, você se surpreende com um rosto desco- nhecido no seu leito... A paciente que ocupava aquele espaço faleceu no sábado à noite e Dona Cráudia foi internada em seu lugar. Isso mesmo, Dona Cráudia, uma senhora de 55 anos, tão simpática quan- to ictérica... Tudo nela combinava... a pele, a esclera e os cabelos louros. Ao colher a anamnese e exame físico de internação, você percebe que os únicos sintomas são o intenso prurido e a fadiga, que já duram 4 meses, e que o único achado ao exame físico é um pequeno aumento, indolor, do fígado. Como o tirocínio diagnóstico é o seu for te, você logo objetiva: é colestase ou lesão he- patocelular? O prurido fala a favor de colestase... mas vamos confirmar: Exames laboratoriais: Bt: 12 mg/dl (ref: 0,3-1,2 mg/dl); Bd: 10,5mg/dl (ref: 0 - 0,2mg/dl); FA: 1100 U /L (ref: 25-100U /L); GGT: 350 U /L (ref: 2-30U /L); AST: 50 U /L (ref: 10-30 U /L); ALT: 70 U /L (ref: 10-40U /L). Próximo exame? USG abdominal = fígado discretamente aumentado de tamanho; vias biliares intra e extra-hepáticas visualizadas e sem alterações. Qual a sua principal hipótese diagnóstica? Justifique. Continua http://#scrolldown http://#page=260 http://#page=261 http://#page=262 http://#page=263 8 Qual exame deveria ser solicitado para corroborar com a sua hipótese? Qual o prognóstico da sua principal hipótese? Caso 5 Mais uma tarde de ambulatório se inicia e, entre a pilha de prontuários sobre a sua mesa, você decide começar atendendo uma paciente de 31 anos, cuja queixa principal era cansaço. Prontamente, abre então a por ta da sala e a chama: - Dona Heloisa! Lá do fundo do corredor, você ouve uma voz rou- ca: “Sou eu doutor”. Neste momento, uma pessoa de aproximada- mente 150 kg, branca, sudoreica e mal cuidada se levanta... Ainda ofegante pelo esforço, Dona Heloísa puxa uma toalha que trouxe presa ao sutiã, limpa o suor da face manchada por vitiligo e queixa-se: “Doutor, eu vim aqui porque tenho me sentido muito cansada, com dores nas juntas, e minha menstruação está atrasada há 3 meses. Eu não bebo e não fumo, e com cer teza não estou grávida, pois há 5 anos que não faço saliência”. Pensando que todas estas queixas estejam associadas ao generoso IMC e por uma síndrome de ovário policístico, você par te rapidamente para o exame físico, pre- meditando o encaminhamento ao ginecolo- gista. Entretanto, um fato lhe chama a aten- ção: icterícia e abdome doloroso à palpação em hipocôndrio direito. A palpação das demais estruturas é afetada pela adiposidade. Há alopécia, pele seca e edema de MMII em bota +++/4+ (mole, frio e indolor). PA: 120 X 80 mmHg e FC: 50bpm. Sra. “Heloisa”, retira de uma sacola de plástico, alguns exames amassados, realizados semanas antes no PS. Neste momento, qual a sua principal hipótese diagnóstica? Justifique. Continua http://#scrolldown http://#page=264 http://#page=265 http://#page=266 9 AST: 300 U/L ALT: 400 U/L FA: 120 U/L GGT: 40 U/L HB: 12 g/dl Leuco: 8.000/mm³PQT: 155.000/mm³Albumina: 3,0 g/dlProteínas totais: 8,5 g/dl INR:1,0 Sorologia Viral: anti-HAV IgG positivo/IgM negativo; HBs.Ag negativo; anti-HBc negativo; HBeAg negativo; anti-HBs positivo; anti-HCV negativo. Qual exame laboratorial poderia ajudar no diagnóstico? Qual seria o tratamento mais adequado para este caso? Caso 6 Qual o provável diagnóstico? Domingo 7h da manhã, você acaba de assumir o plantão na emergência do hospital da sua residência. Na “passagem” dos casos, o plantonista o avisa sobre uma paciente que chegara há cerca de 1h e ainda não tinha sido avaliada. Com a prestatividade irradiante de quem acaba de iniciar um plantão, você se dirige à paciente. Trata-se de uma mulher de 42 anos, ictérica e com dor abdominal. Segundo relato, o quadro teve início há 2 dias, no momento exato em que ela assistia à novela das 9h da rede Globo. – Doutor, na horinha em que o galã ia dar o grande beijo, eu comecei a ter crises de calafrios que não queriam mais parar... Logo depois senti febre. Coloquei o termômetro e estava com 39˚C. Aí, veio a dor na barriga. No começo era em toda a barriga, mas depois foi ficando mais for te aqui (apontando para o flanco direito). E quem percebeu que meus olhos estavam amarelos foi a minha vizinha, que veio me socorrer. HPP: “colesterol” e “pedra na vesícula”. Ao exame, paciente lúcida e orientada, PA: 120 x 80 mmHg, Temp: 39˚C, FC: 110bpm e FR: 18irpm. Icterícia +++/4+. Abdome difusamente doloroso, principalmente em flanco e hipocôndrio direitos, sem sinais de irritação peritonial. Vesícula biliar não palpável. Exames de admissão: Leuc. 18.000 mm3 com 22% de bastões. Bt: 12 mg/dl (ref: 0,3-1,2 mg/dl); Bd: 10,5 mg/dl (ref: 0 - 0,2 mg/ dl); FA: 670 U/L (ref: 25-100U/L); GGT: 180 U/L (ref: 2-30U/L); AST: 50 U/L (ref: 10-30 U/L); ALT: 70 U/L (ref: 10-40U/L). Continua http://#scrolldown http://#page=267 http://#page=268 http://#page=269 10 Você procedeu à internação da paciente (dona Raimunda), prescreveu hidratação venosa e sintomáticos e solici tou um USG abdominal para melhor elucidação do caso. Como o movimento no hospi tal estava acima do normal, você deixou para rever a Dona Raimunda à tarde... No entanto, as horas voam e só no dia seguinte, na hora de “passar” o seu plantão para o próximo plantonista, você se lembra da paciente e se apressa em revê-la. Neste momento, para a sua surpresa, ela apresentava-se desorientada, com PA:80X50 mmHg, FC: 125bpm e temp: 40oC. Há relação do quadro atual com alguma condição de base antiga? O que aconteceu com a paciente? Qual seria o tratamento neste momento? http://#scrolldown http://#page=270 http://#page=271 http://#page=272 11 Caso 7 Eu estava voltando do almoço com o chefe da minha enfermaria de clínica médica, meu ídolo maior, Mestre de todos os Mestres... Já no hall do Hospital (Memorial Hospital of Por to Seguro City), nos unimos a um grupo que aguar- dava a chegada do elevador. Uma senhora obesa, um chinês alto e esguio, uma atraente estagiária de auxiliar de enfermagem e um paciente de cadeira de rodas, recém chega- do ao hospital. Este último era o famoso Sir. Filipe Morrison, um Conde de 71 anos, tabagista inveterado, que veio se internar para investigação de um quadro ictérico recém desenvolvido. As por tas do elevador se abrem e todos entram, cordialmente. Assim que tem início o trajeto as- cendente, silêncio... O chinês observa, atentamente, o indicador luminoso dos andares, a mulher obesa abaixa a cabeça e brinca com um molho de chaves que trazia entre seus dedos roliços. Eu estava desatento, embrenhado em pensamentos nobres, totalmente enfeitiçado pela beleza da estagiária, quando uma voz rasga o silêncio lúgubre e assusta a todos. Era o meu Mestre! Estáva- mos passando pelo 3o andar quando ele, em alto e bom tom, se dirige ao enfermo: - Com licen- ça, senhor... e coloca sua mão na barriga do Conde, com um golpe tão rápido quanto suave. To- dos no elevador se assustaram. – O que é isso doutor? Perguntou o nobre paciente. O Mestre retornou com uma nova pergunta: para qual andar o senhor vai? - Para o 12o andar, setor de clínica médica,respondeu o Conde. Com outro golpe rápido e cer teiro, o Mestre atinge o botão do 8o andar. Como estávamos passando por ele, o elevador parou e as por tas se abriram. Desça aqui, meu senhor, este é o seu andar. Sem entender direito, mas constrangido com a determina- ção do doutor, o Conde deixa o elevador, ajudado pela estagiária. Antes mesmo de formular qualquer pergunta, sentiu seu estômago gelar assim que viu a placa in- dicativa do setor: Depar tamento de Cirurgia... Ainda no elevador, surpreso, indaguei: - Mestre, o que fizestes? Serenamente ele me respondeu: - Tu estavas tão absorvido pelas madeixas da menina, que não observastes o prontuário que ela carregava? Não percebestes os níveis de BD? Não atentastes para o aumento por demasia da FA e Gama-GT e apenas discreto da TGO e TGP? Isto é colestase, meu rapaz! E com aquela vesícula palpável... Qual a sua hipótese diagnóstica para o Conde Filipe Morrison? Justifique. Continua http://#scrolldown http://#page=273 12 Qual o primeiro exame a ser solicitado para elucidação diagnóstica? Confirmada a sua hipótese, responda às seguintes perguntas: a - É provável que o tratamento cirúrgico curativo seja viável? b - Que complicação é esperada e temida na evolução do quadro? c - Qual a opção paliativa para a icterícia? Caso 8 Vanessa Cruz, 26 anos, em uma linda e ensolarada manhã de domingo, passeia com Antônio, 50 anos, seu noivo, por uma trilha no parque da cida- de. Uma gostosa brisa embalava os seus cabelos compridos quando Vanessa se aproxima para beijá-lo. Ao inclinar a cabeça, um fio de sol rompe as folhagens e rasga a sombra da mata, deitando-se sobre o rosto do seu amor. Subitamente, o clima mágico de ternura é rompido pelo intenso brilho amarelo que reluziu de ambos os olhos de Antônio. – Meu neném, o que houve com os seus olhos? O que, meu chuchu, eu não sinto nada... An- tônio ainda não sabia, mas estava ictérico, apesar de não apresentar nenhum outro sinal ou sintoma. No mesmo dia, o casal procurou atendimento em um hospital par ticular. Exames de sangue foram colhidos de Antônio: Exames Ht Hb Leucócitos Fosfatase alcalinaAmilase AST ALT Bilirrubina totalFração DiretaFração Indireta Resultados 42% 14 g/dl 8.000 (0/0/1/0/5/60/5/35) 643U/lL 173 U/L 51 U/L 47 U/L 7,1 mg/dl 6,0 mg/dl 1,1 mg/dl Solicitado USG Abdominal: • Fígado discretamen te aumentado de vo lume • Vesícula biliar de tam anho reduzido, sem cálculos em seu interior • Colédoco visualizado , de calibre normal • Não foram detect adas massas ou e xpansões viscerais. Continua http://#scrolldown http://#page=274 http://#page=275 13 Indique sua hipótese diagnóstica para o quadro de Antônio, justificando-a. Qual complicação deve ser esperada como agravante da evolução da doença de Antônio? Que alteração foi omitida da ultrassonografia? Qual o prognóstico de Antônio (caso sua hipótese seja confirmada)? http://#scrolldown http://#page=276 http://#page=277 http://#page=278 http://#page=279 14 Caso 9 Você é o novo plantonista de uma emergência no subúrbio de sua cidade. Às 04:45 h você é acordado pela enfermeira, pois chegou mais um paciente... Ela, que já trabalha no hospital há 25 anos, vai logo avisando que o paciente é o Seu Zé da Feira, já conhecido no hospital, pois aparece sempre no final da madrugada alcoolizado querendo um analgésico para curar sua “ressaca”. Sra. Odete, a enfermeira, avisa que já puncionou um acesso venoso com um jelco “bem calibroso” e iniciou uma hidratação com soro glicosado associado a algumas ampolas de glicose hiper tônica. Você chega à sala de atendimento e vê um homem de aproximadamente 40 anos de idade, com desnutrição evidente e má higiene. Seu Zé diz que está sem fome e com náuseas, porém não vomitou. Ao exame, você nota icterícia e discreta ascite. Ele diz que o aumento de volume abdominal é recente, bem como o “amarelão”. A pele está quente ao toque e o auxiliar de enfermagem logo fala: “Doutor, essa febre é falta de vergonha na cara. Já chamamos Dona Amélia, sua esposa, para levá-lo para casa”. Além disso, há hepatomegalia dolorosa, ginecomastia, aranhas vasculares e atrofia testicular. Você decide colher um hemograma e provas de função hepática. O resultado vem a seguir: Hb: 13 g/dlLeucócitos: 20.000/mm³ (0/4/0/0/2/40/48/5) Plaquetas: 155.000/mm³ AST: 400 U/LALT: 199 U/LFA: 120U/L GGT: 40U/LBilirrubinas totais: 5 mg/dl Bilirrubina direta: 4 mg/dl Quais os principais diagnósticos diferenciais? De acordo com os dados acima, qual a sua principal hipótese diag- nóstica? Justifique. Continua http://#scrolldown http://#page=280 http://#page=281 15 Qual o prognóstico? Qual o tratamento que comprovadamente diminui a mor talidade neste caso? Sra. Mir tes, 80 anos internada para avaliação de icterícia e cálculos em vesícula biliar. Há 20 dias, apresentou quadro de icterícia colestática complicada com um episódio de colangite bac- teriana. Foram realizadas TC de abdome e CPRE que evidenciaram cálculo impactado no ducto cístico, realizando efeito de massa sobre o ducto hepático. Caso 10 De acordo com os dados acima, qual o diagnóstico sindrômico que a Sra. Mir tes apresenta? Continua http://#scrolldown http://#page=282 http://#page=283 http://#page=284 16 Há associação com câncer? Justifique. Qual a impor tância desta síndrome durante uma colecistectomia? Caso 11 Sr. Célio, 40 anos é acompanhado no ambulatório de doenças inflamatórias intestinais há 10 anos por Retocolite Ulcerativa. Em uma consulta de rotina, você nota icterícia e solicita exames laboratoriais. Ele retorna apresentando aumento de bilirrubina direta, FA e GGT. Traz, em anexo, uma CPRE solicitada por um amigo médico. Qual marcador sorológico está associado a esta condição? Qual seria o tratamento definitivo para este caso? De acordo com o caso acima, cite sua principal hipótese diagnóstica. O que revelaria a C P R E caso sua hipótese fosse confirmada? http://#scrolldown http://#page=285 http://#page=286 http://#page=287 http://#page=288 http://#page=289 http://#page=290 17 JPS, 45 anos, sexo masculino, é trazido à unidade de emergência torporoso, desidratado e com pele de coloração notavelmente amarelada. O acompanhante refere que há duas semanas o mesmo paciente esteve na unidade queixando-se de astenia e dor abdominal. Na época, o diagnóstico foi de hepati te pelo vírus B e o paciente foi liberado para casa com sintomáticos. No entanto, nos últimos dias, o quadro piorou, ficando o paciente mais restri to ao lei to e sonolento. Por último, quando questionado, o acompanhante negou que JPS utilizasse qualquer tipo de medicação. Após a internação hospi talar e considerando o diagnóstico de hepati te fulminante para esse paciente, quais seriam suas recomendações para a prescrição? Prescrição Preencha abaixo a prescrição que você faria na sua enfermaria. Em seguida, anote na próxima folha o gabari to fornecido no si te pela Equipe Acadêmica. Para o seu treinamento, é fundamental que você não pule etapas, desenvolvendo um pensamento crítico sobre o passo-a-passo da prescrição médica e não apenas anotando o gabari to. Ficamos à disposição para suas dúvidas. http://#scrolldown http://#videomiolo=PRESCRICAO_MEDICA_MEDCLM01_2017 http://#page=291 18 ANAMNESE: ID: Umbina, 28 anos, sexo masculino, negro, solteiro, jogador de futebol, proveniente de Itarimbezinho da Serra. QP: “Dor abdominal e coloração amarelada da pele” HDA: Há cerca de duas semanas deu entrada no PS queixando-se de mal-estar e indisposição, associados a desconfor to no hipocôndrio direito. Foi liberado com sintomáticos, porém quatro dias depois, notou que a pele ficou mais amarelada e que, em seguida, sua urina escureceu. Preocupado com esses achados, procura agora atendimento que esclareça melhor seus achados. H.P.P: há 1 mês voltou da China, local de seu antigo clube, de onde par tiu alegando incompatibilidade climática e gastronômica. Não faz usoregular de medicação. Tonsilectomia aos 15 anos. H. Familiar: Não conheceu os pais biológicos. Tem um irmão de 32 anos com hiper tensão controlada. H. Social: nega ser etilista, tabagista ou usuário de drogas IV. Revisão de sistemas: Perda ponderal de 5 kg no último mês com alguns episódios de cólica abdominal e diarréia sem muco, sangue ou pus. Notou ainda fezes de coloração mais clara que o habitual. EXAME FÍSICO: Ectoscopia: Lúcido, bom estado geral, deambulando, hipocorado +/4+, hipohidratado +4/4+, ictérico ++/4+, afebril, acianótico, perfusão periférica adequada. Cabeça e Pescoço, ACV e AR: Sem alterações significativas Neurológico e Osteoar ticular: Não avaliados Abdome: Atípico, peristáltico, timpânico, doloroso à palpação profunda do hipocôndrio direito, sem sinais de irritação peritoneal. Ausência de massas palpáveis. Membros inferiores: Sem edema palpável. Pulsos amplos bilateralmente. EXAMES DA ADMISSÃO: De acordo com estes resultados iniciais, o médico achou prudente a realização de USG de abdome que revelou: fígado homogêneo e vesícula biliar distendida, de paredes finas, sem coleção perivesicular, contendo em seu interior alguns focos ecogênicos flutuantes. Dilatação da via biliar intra e extra- hepática sem visualização de cálculo impactado. Pâncreas bem visualizado e sem alterações anatômicas. - Hto = 35% - Leucócitos 4.500/mm3 (diferencial com eosinofilia de 10%); - Plaquetas 200.000/mm3 - Glicose 88 mg/dl; - Ureia 26 mg/dl; - Creatinina 1,0 mg/dl; - AST 55 U/L; - ALT 60U/L; - Fosfatase alcalina 350 U/L - Gama-GT 150 U/L - Bilirrubina total = 6 mg/dl; fração indireta 0,8 mg/dl; fração direta 5,2 mg/dl http://#scrolldown http://#videomiolo=DESAFIO_DIAGNOSTICO_MEDCLM01_2017 19 Qual o diagnóstico sindrômico deste paciente? Qual o próximo passo na investigação diagnóstica? Persistindo na investigação, foi realizada TC de abdome que não adicionou qualquer informação à USG. Colangiografia, além da dilatação das vias biliares, mostrou apenas falhas alongadas no enchimento. Sem terem muita ideia do diagnóstico, o quadro só começou a ficar mais claro quando esta imagem foi visualizada à microscopia de material colhido com aspirado duodenal (figura que está apontada pela seta). Qual diagnóstico e tratamento devem ser estabelecidos para Umbina? Quais os riscos existentes a longo prazo para este paciente? http://#scrolldown http://#page=292 http://#page=293 http://#page=294 20 TreinamentoVisual Abaixo está um esquema da árvore biliar, desde o fígado até o duodeno, representando uma colelitíase. Muito bem, agora reproduza o mesmo desenho para cada uma das situações listadas a seguir. O objetivo é tentar expor de forma gráfica, o mais detalhadamente possível, as condições apresentadas. Não esqueça as alterações no tamanho da vesícula (incluindo sua parede) e do calibre dos ductos biliares... Coleli tíase Crônica Colecisti te Para Memorizar... Resumo do quadro clínico: Há Icterícia? A vesícula é palpável? Há dilatação da árvore biliar? Coledocoli tíase Para Memorizar... Resumo do quadro clínico: A vesícula é palpável? Há dilatação da árvore biliar? http://#scrolldown http://#page=310 http://#page=311 http://#page=295 http://#page=296 http://#page=297 http://#page=298 http://#page=299 http://#page=300 21 Síndrome de Mirizzi Para Memorizar... Resumo do quadro clínico: A vesícula é palpável? Há dilatação da árvore biliar? Tumor de Klatskin Para Memorizar... Resumo do quadro clínico: A vesícula é palpável? Há dilatação da árvore biliar? Tumor de Cabeça de Pâncreas Para Memorizar... Resumo do quadro clínico: A vesícula é palpável? Há dilatação da árvore biliar? http://#scrolldown http://#page=312 http://#page=313 http://#page=314 http://#page=301 http://#page=302 http://#page=303 http://#page=304 http://#page=305 http://#page=306 http://#page=307 http://#page=308 http://#page=309 ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 22Medgrupo - CiClo 2: M.E.D A Síndrome IctérIcA aros alunos, nos últimos anos, a nossa equipe acadêmica passou um bom tempo atuando no desenvolvimento da fórmula mais agradável e eficiente de trabalhar os grandes conteúdos médicos. Principalmente para aqueles que já haviam passado pelo Medcurso e que se viam desejosos de lapidar os conhecimentos adquiridos no último ano. Sejam bem-vindos então ao M.E.D! Ao longo deste ano, organizaremos toda nossa bagagem médica de forma prática, objetiva e direcionada para as provas. Isso porque tem sido cada vez mais importante para os concursos de Residência o entendimento das “síndromes” e não apenas das doenças em si. Há muito pouco tempo, as questões vinham em sua maioria assim: Qual a principal causa disso; qual o autoanticorpo mais frequente daquilo – perguntas objetivas, claras. Ou se sabia a resposta ou não, e pronto! Hoje em dia as questões (de vários concursos) têm aparecido com enunciados enormes, revelando casos clínicos complexos e cheios de sinais, sintomas e armadilhas... Isto sem falar nas provas práticas! Há uma nítida tendência em valorizar o conhecimento médico básico, pautado na correta interpretação dos “conjuntos de sinais e sintomas”. Mas não se preocupem – agora vocês já têm conhecimento de base suficiente para trabalharmos com muita facilidade. Estamos apenas começando o M.E.D! C Fisiologia Em praticamente todos os cursos de Medicina, quando começamos a ter o primeiro contato com os pacientes e suas doenças, a síndrome ictérica é uma das primeiras a ser estudada. Quem não se lembra daquele paciente de co- loração estranha em um leito de enfermaria, rodeado por internos a examiná-lo? Naquele momento, você começou a estudar o tema e é, desde essa data, por exemplo, que sabe que a icterícia é a coloração amarelada de pele e mucosas (principalmente esclera e frênulo da língua) e que ela ocorre devido ao aumento da bilirrubina no plasma e nos tecidos. Hoje você talvez já tenha se esquecido (se ainda se lem- bra, ótimo!), mas naquela época estudou tam- bém que esta síndrome pode ocorrer por au- mento de uma bilirrubina “direta” ou “indireta”. Bom, o que queremos mostrar é que, como muitos conceitos na vida médica, por mais que já tenham sido estudados exaustivamen- te, temos que estar constantemente em revi- são e praticando para deixá-los ativados na nossa mente. Ainda mais num ano de provas como este! E escolhemos iniciar com a sín- drome ictérica não por acaso, mas por ser uma das mais clássicas e ilustrativas do fas- cinante raciocínio médico. Mas para começarmos, você se lembra de onde vem a bilirrubina??? Cerca de 85% da bilirrubina produzida no cor- po tem origem na degradação de hemácias senis. O restante é originário de outras proteí- nas que contenham o pigmento “heme”, como o famoso citocromo P450 e a mioglobina. 22 http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 23Medgrupo - CiClo 2: M.E.D Sendo assim, podemos dizer que tudo come- ça geralmente pela captura e destruição de hemácias velhas pelo baço... O produto final desta destruição de hemácias idosas é a liberação de Hemoglobina (Hb). Mas a Hb não é desperdiçada. Constante- mente o corpo produz novas hemácias e, por isso, precisa aproveitar o ferro que ela contém. Então, Hb é quebrada em duas par- tes: globina e heme. Aí chegamos ao “heme” que, por sua vez, ainda pode ser quebrado em duas partes: ferro e protoporfirina. Agora que o corpo conseguiu reaproveitar o ferro, sobra a protoporfirina. Ela será inicialmente transformada em biliverdina que rapidamente é reduzida à bilirrubina. Heme protoporFIrInA BILIVerDInA BILIrruBInA Esta bilirrubina se liberta do interior dos macró- fagos e chega ao plasma. Mas por ser insolúvel neste meio, ela precisa “caminhar” pelo plasma ligada a uma proteína solúvel. Esta proteína é a albumina, um verdadeiro barco para trans- porte de várias substâncias no plasma. Com a bilirrubina não seria diferente! E como ela não se encontra diretamente no plasma,mas ligada à albumina, chamamos de bilirrubina indireta. Agora que você recordou que a bilirrubina indireta tem origem na degradação da he- moglobina ao passar pelo baço e sistema retículo endotelial, consegue entender me- lhor por que a hemólise aumenta a produção de bilirrubina indireta! A bilirrubina indireta ainda passa por um longo caminho. Ela segue em direção ao fígado, onde sofre três processos: captação, conjugação e excreção (FIGURA 1). O que significa isso? Significa que, num primeiro momento, os he- patócitos irão captar a BI disponível no sangue. Em seguida, já dentro do hepatócito, ela sofre a transformação em um composto solúvel através da enzima glucuroniltransferase, num processo que chamamos de conjugação. Mas por que a bilirrubina precisa ser transformada de indireta em direta? Entendam: no sangue a bilirrubina indireta (que é insolúvel) ganha solubilidade, pois está no barco (a albumina). Mas na bile não será excretada albumina para manter a bilirrubina solúvel. Essa proteína é muito preciosa. Então o fígado se encarrega de transformar a BI em um composto solúvel chamado Bilirrubina Direta (BD), para então ser excretado. Agora você já entendeu a terceira fase: excreção. Após se transformar em BD o fígado tem que excretar a bilirrubina na bile. E o que acontece depois que ela sai na bile? Ao ser excretada no lúmen intestinal e atingir o íleo terminal e cólon, uma parte é metabo- lizada por bactérias. Nesse caso, forma-se um novo composto (ufa!), o urobilinogênio. Uma parte deste urobilinogênio é absorvida e retorna à circulação para ser excretado na urina. E como não poderia deixar de ser, quando está na urina ele se chama urobi- lina. O restante que não foi capturado pelas bactérias “amigas” sai nas fezes e passa a se chamar estercobilina, sendo o responsável pela coloração fecal. Fig. 1 Atentem aqui para um fato interessante. Você já viu alguns resultados de EAS com positi- vidade para urobilinogênio, não é? Qual a doença que proporciona isso? Nenhuma!!! Você acabou de ver que isso é normal. Só não confunda com bilirrubinúria, pois nesse caso o que temos é um excesso de bilirrubina direta na circulação. Fechando conceitos: - Bilirrubina insolúvel = indireta = não conjugada - Bilirrubina solúvel = direta = conjugada Etiologia Nesse momento fica muito mais simples fa- lar das causas de icterícia! E para facilitar o diagnóstico diferencial desta manifestação, vamos começar dividindo a icterícia em dois grupos: com predomínio da fração indireta e com predomínio da fração direta. A) Hiperbilirrubinemia Indireta Quem é que pode causar aumento da fração indireta? Uma vez que só existem três proces- sos entre a BI e a BD, só teremos aumento de BI se houver alteração em um deles. Logo, as principais causas são: - Superprodução de bilirrubina indireta: he- mólise. - Diminuição da captação: medicamentos (ex.: rifampicina), jejum prolongado, infecções. - Diminuição na conjugação: síndromes gené- ticas (ver no final da apostila) e imaturidade do sistema de conjugação (recém-natos). http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 24Medgrupo - CiClo 2: M.E.D Para facilitar: Na prática clínica do adulto (e para as provas...), ao encontrarmos um paciente com aumento predominante de BI, vamos pensar sempre assim: o distúrbio ou foi causado por Hemólise ou por distúrbios primários (síndro- mes genéticas). Uma pausa para as anemias hemolíticas! Conforme vai ocorrendo a hemólise (congê- nita ou adquirida), a medula óssea vai ten- tando compensar produzindo mais células jovens (reticulócitos). Mas isso tem um limite! Quando a capacidade da medula se esgota, predomina a hemólise e surge então o sinal clássico que é a anemia. Cuidado: na prova, o que vai chamar a sua atenção para esta condição, além da ictérica obviamente, é a presença da AnemIA! Aborda- remos este tema com mais detalhes na apostila de Síndromes Anêmicas. Por enquanto, vamos apenas recordar outros achados associados: - medula óssea hiperproliferativa (para compensar a hemólise): reticulócitos eleva- dos, aumento do VCM. - Dano à hemácia: aumento do LDH, hiper- bilirrubinemia indireta. - Hemólise intravascular: redução da hap- toglobina, hemoglobinúria, hemossiderinú- ria, hemoglobinemia. Obs.: pacientes portadores de doenças hemo- líticas crônicas ainda podem fazer icterícia por colestase a partir da formação de cálculos de bilirrubinato de cálcio (veremos adiante). B) Hiperbilirrubinemia direta Considere agora que a bilirrubina já passou pelas fases de captação e conjugação e se en- contra em sua forma solúvel (bilirrubina direta). O que poderia levar ao acúmulo desta forma (BD)? Simples... Ou os hepatócitos estão lesa- dos e não conseguem excretar bilirrubina para os canalículos biliares ou há alguma obstrução que não permite que a bile chegue ao intestino. Percebeu? Aqui vamos nos confrontar, na ver- dade, com um grande “divisor de águas”: será síndrome colestática ou síndrome de lesão hepatocelular??? Observe algumas definições: SínDrome HepAtoceLuLAr = HepAtI- te. Isso mesmo, Hepatite! É o conjunto de sinais e sintomas – e, principalmente, acha- dos laboratoriais – que surgem quando os hepatócitos estão sendo lesados em grande escala. Veja, não necessariamente hepatite viral, mas qualquer forma de agressão ao parênquima hepático. SínDrome coLeStátIcA = oBStru- çÃo BILIAr. É o conjunto de sinais e sintomas – e, principalmente, achados la- boratoriais – que surgem quando a árvore biliar é obstruída, seja dentro do fígado (nas pequenas vias biliares) ou não (ductos he- páticos / colédoco). Você pode estar se perguntando neste momento: não é o hepatócito quem conjuga a BI em BD?? Assim, é o Hepatócito quem produz a BD, não é?? Na lesão hepatocelular eu não tenho des- truição dos hepatócitos?? Pois bem, se eu estou destruindo os responsáveis pela formação de BD, o esperado não seria que a icterícia surgisse à custa de BI? Cuidado! Este raciocínio é tão lógi- co quanto equivocado. Mas onde está o erro??? Acabamos de ver que o metabolismo das bilir- rubinas inclui três fases principais: captação da BI, conjugação da BI em BD e excreção da BD para o canalículo biliar. Mas existe um “porém” nessa tríade. A etapa “limitante” do metabolismo da bilirrubina – ou seja, aquela que é mais sen- sível, mais facilmente abalável, é a terceira (ex- creção da BD formada para o canalículo biliar). Isto porque se trata de uma fase que ocorre por um processo ativo dependente de ATP. E quando há lesão hepática esse é o primeiro processo a limitar o metabolismo da bilirrubina. Ou seja, em condições adversas, os hepatócitos con- seguem captar, conjugar, mas têm dificuldade em excretar! E é por esse motivo que na lesão hepatocelular o fígado acumula BD. Entenderam? Como a BD continua sendo for- mada, mas não consegue passar para o ca- nalículo biliar, acaba acumulando no interior do hepatócito e “refluindo” para a circulação. Conclusão: Hepatite aumenta BD no sangue. Observe a tabela a seguir com as principais causas de icterícia. Por enquanto é só uma extensa lista... Ao final da apostila, todas estas condições farão muito mais sentido e você não precisará gravá-las. causas de Hiperbilirrubinemia Hiperbilirrubinemia Indireta HemÓLISe (Superprodução) • Imune. • Não imune: hereditária (esferocitose, elip- tocitose, falciforme, talassemia...); adquirida (anemia microangiopática, hemoglobinúria paroxística noturna, deficiência de B12- -intramedular, ribavirina...). cAptAçÃo preJuDIcADA • ICC, shunt portossistêmico, drogas (rifam- picina, probenecida). conJugAçÃo preJuDIcADA • Condições hereditárias: síndrome de Gilbert e Crigler-Najjar. • Neonatal (fisiológica; do leite materno). • Outras: hipertireoidismo, doença hepática avançada, drogas (gentamicina, cetocona- zol, inibidor de protease, etinilestradiol). Hiperbilirrubinemia direta ISoLADA • Condições Hereditárias: síndrome de Du- bin-Johnson e síndrome deRotor. pADrÃo HepAtoceLuLAr • Hepatite viral (A, B, C, D, E, EBV, CMV, herpes-simplex). http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 25Medgrupo - CiClo 2: M.E.D • Álcool. • Drogas (paracetamol, isoniazida, etc) e toxinas (cloreto de vinila, cogumelos Amanita). • Hepatite autoimune. • Doença de Wilson. • Febre amarela. pADrÃo coLeStátIco – IntrA- -HepátIco • Hepatite viral (principalmente A), alcoólica e algumas drogas (esteroide, clorpromazina). • Cirrose biliar primária. • Síndrome do desaparecimento de ductos biliares – vanishing bile duct syndrome. • Hereditária (colestase recorrente benigna; colestase intra-hepática familiar progressiva). • Outros: gravidez, NPT, sepse de origem não biliar; colestase pós-operatória; síndrome paraneoplásica; doença veno-oclusiva; doença enxerto versus hospedeiro; infiltrativa (TB, linfoma, amiloidose); leptospirose. pADrÃo coLeStátIco – eXtrA- -HepátIco Benigna: • Coledocolitíase • Síndrome de Mirizzi • Estenose biliar pós-operatória • Colangite esclerosante primária • Pancreatite crônica • Colangiopatia associada à AIDS • Ascaridíase e outros parasitas Maligna: • Colangiocarcinoma • Câncer de cabeça de pâncreas • Câncer de vesícula biliar • Câncer periampular • Acometimento de linfonodos hepáticos Saiba MaiS! Leptospirose x Febre Amarela Ao final desta apostila, estaremos direciona- dos para considerar que todo paciente com as síndromes ictérica e febril (isto é, combinando icterícia e febre) seja portador de colangite infecciosa. No entanto, outras lesões devem ser levadas em consideração como a própria hepatite viral, abscesso hepático, pneumonia de lobo inferior e, especialmente para as pro- vas, duas condições infecciosas: leptospirose e febre amarela. Algumas dicas: Leptospirose = Padrão colestático, história epidemiológica, insuficiência renal aguda com hipocalemia, icterícia rubínica, leucocitose, hemorragia pulmonar. Febre Amarela = Padrão Hepatocelular, sinal de Faget, leucopenia. Quadro Clínico Como o estado hemolítico costuma ser facil- mente identificado pelos quadros clínico e la- boratorial típicos e as doenças do metabolismo das bilirrubinas são em geral raras e observa- das mais em crianças, o maior cuidado que você vai precisar tomar na prática é realmente a distinção entre a Síndrome Hepatocelular e a Síndrome Colestática! O problema é que os sinais e sintomas clí- nicos de ambas as síndromes podem até ser importantes, mas mesmo assim ajudam pouco na sua diferenciação. Tanto na lesão hepatocelular quanto na colestase existe ic- terícia, colúria e acolia fecal, fadiga, anorexia, náuseas, vômitos e dor no hipocôndrio direito. O único sinal clínico que pode efetivamente ajudar nesta diferenciação (guardem isto) é o prurIDo, que, embora possa surgir na lesão hepatocelular, ocorre de forma muito mais ca- racterística na síndrome colestática e resulta do acúmulo de ácidos e sais biliares na pele. • coLúrIA: Coloração acastanhada-escura da urina (cor de coca-cola). Acontece pela presença de BD na urina. Veja: somente as condições que aumentam a BD podem originar colúria. Ao contrário da BI, que não é solúvel e ainda circula ligada à albumina, a BD é solúvel e não ligada a proteínas plasmáticas. Assim, quando elevada no sangue, a BD consegue ser filtrada pelos glomérulos, aparecendo na urina. • AcoLIA FecAL: Coloração esbranquiça- da das fezes. Sabemos que, normalmente, parte da bilirrubina é lançada nos intestinos junto com a bile. Lá chegando, as bactérias intestinais metabolizam a BD originando os urobilinogênios e, consecutivamente, a es- tercobilina, substância que dá a coloração acastanhada das fezes. No entanto, qual- quer condição que reduza a presença de BD na bile, como é o caso da colestase, pode originar fezes pálidas, esbranquiçadas. Para uma prova prática... - O grau de hiperbi- lirrubinemia pode ser estimado pelo exame físico. O primeiro local em que a icterícia apa- rece é na esclera devi- do à afinidade da bilirrubina pela elastina e isso ocorre quando a bilirrubina é de 2,5-3 mg/dl. O segundo local é abaixo da língua e só depois é que se deposita na pele (5 mg/dl). A icterícia não é vista com iluminação fluorescente. - Outras condições podem dar cor amare- lada. São elas: o carotenoderma (ingestão excessiva de vegetais contendo caroteno como a cenoura; não pega esclera); utiliza- ção de quinacrina (droga para giardíase) e exposição excessiva a fenóis. Esta ocorre através da respiração ou contato dérmico, em ocupações como a dos trabalhadores da indústria do petróleo e de fábricas de nylon, resinas epóxi e policarbonatos. No início do século 20, quando a diferencia- ção laboratorial dos tipos de icterícia ainda era uma realidade distante, Theodor Brugsch, famoso médico alemão, descreveu os três grandes tipos de icterícia: Icterícia flavínica: a pele assume uma cor amarelo pálido. Estaria relacionada à hiperbilirrubinemia indireta, geralmente de estados hemolíticos. http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 26Medgrupo - CiClo 2: M.E.D Icterícia verdínica: a cor predominante seria um amarelo esverdeado. Associada à intensa hiperbilirrubinemia direta, ou seja, estados colestáticos francos. Icterícia rubínica: causada pela hiperbilir- rubinemia direta junto a certo grau de va- sodilatação cutânea, promovendo um tom alaranjado da pele. Foi descrita inicialmente nas síndromes hepatocelulares devido à va- sodilatação promovida pelo hiperestrogenis- mo. Atualmente, o termo ainda é utilizado na descrição de alguns casos de leptospirose. Exames Laboratoriais Valores normais: Bilirrubina total (até 1,0 mg/dl); Bilirrubina direta (0,3 mg/dl); Bilirrubina Indireta (0,9 mg/dl) Como a clínica por si só não é capaz de dife- renciar as duas principais causas de icterícia (hepatocelular x colestática), sobrou para os exames laboratoriais a responsabilidade desta distinção. Mas então como vamos diferenciar estas síndromes laboratorialmente? Resposta: através da observação do fenô- meno “gangorra” (FIGURA 2), que envolve quatro enzimas hepáticas: (1) Alanina Aminotransferase (ALt) = Transaminase Glutâmico-Pirúvica (tgp) (2) Aspartato Aminotransferase (ASt) = Transaminase Glutâmico-Oxalacética (tgo) (3) Fosfatase Alcalina (FA) (4) Gamaglutamil Transferase (gama gt) Vamos relembrar alguns conceitos: Existem diversas enzimas no interior dos he- patócitos, mas as principais são duas transa- minases (ou aminotransferases): (1) a Alanina Aminotransferase (ALT), também chamada de Transaminase Glutâmico-Pirúvica (TGP) e (2) a Aspartato Aminotransferase (AST), tam- bém chamada de Transaminase Glutâmico- Oxalacética (TGO). Um pequeno “escape” fisioló- gico dessas transaminases dos hepatócitos para a circulação explica uma concentração sérica de até 45 U/L (valor de referência). Entretanto, as con- dições que promovem lesão dos hepatócitos ge- ralmente determinam um grande extravasamen- to dessas enzimas para a corrente sanguínea. A ALT é mais específica do fígado – prati- camente só encontrada nos hepatócitos. A AST pode ser encontrada no fígado, mas também em outros tecidos, como miocár- dio, musculoesquelético, rins e cérebro. A Fosfatase Alcalina (FA) é formada pelo he- patócito e pode ser encontrada tanto em seu interior quanto nos canalículos biliares. Sua produção aumenta em duas situações: (1) quando a pressão no interior do sistema biliar é elevada, extravasando para a corrente sanguí- nea durante o processo de colestase (retenção biliar); e (2) nas doenças infiltrativas hepáticas, como neoplasias e granulomas. Como existe também a fosfatase alcalina óssea, sempre quando encontramos a FA sérica elevada, precisamos confirmar se realmente a sua origem é hepática. Fazemos isso, solicitando pelo menos mais uma enzima que se eleva na coles- tase... Pode ser a gama-glutamil trans- ferase (Gama GT) ou a 5’-nucleotidase (5’-NT), ambas produzidas e liberadas pelas células epiteliais dos dúctulos biliares. Os níveisde referência das enzimas FA, Gama GT e 5’-NT variam muito conforme o laboratório e o método de dosagem; por exemplo, encontramos valores de referência da FA de 35 U/L até 120 U/L. Além disto, esta enzima ainda costuma ser bem maior em crianças e adolescentes do que em adultos, refle- tindo a formação óssea característica da faixa etária. Na presença de metástases osteoblásticas, caracterizadas por neo- formação óssea (ex.: Ca de próstata), também pode haver aumento da FA. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2011 SECRETARIA ESTADUAL DE SAÚDE – SES/ RJ Um famoso médico recebeu, em seu consultó- rio, o pai de colega de faculdade que clinicava no interior. Este, em seu encaminhamento, dizia não dispor de exames para esclarecer se estava diante de doença óssea ou hepáti- ca, dúvida nascida da análise de uma rotina laboratorial. O próprio médico colheu amostra de sangue para estudos adicionais, tendo um dos resultados apontado para hepatopatia, pois havia aumento significativo de: a) Deoxipiridinolina. c) Hidroxiprolina. b) 5´nucleotidase. d) Telopeptídio C. Qual desses é um marcador de doença hepá- tica? É a 5’-nucleotidase, uma enzima respon- sável por reações de hidrólise de nucleotídeos como a adenosina 5-fosfato e a inosina 5-fosfa- to. Está presente no fígado, cérebro, intestino, coração e no pâncreas, mas não se encontra nos ossos. No fígado, assim como a fosfatase alcalina, eleva-se em doenças colestáticas. Te- lopeptídeo C, hidroxiprolina e deoxipiridinolina são marcadores de doença óssea. Resposta: B. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2010 UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – UERJ Um lacônico pedido de parecer, enviado por colega de outro hospital público, traz a você um comerciário de 29 anos. A razão do en- caminhamento foi “aumento da AST (TGO)”. Não há história anterior de doença do fígado e, no hepatograma, a ALT (TGP) está normal. A origem desse aumento da AST deve ter, como primeira hipótese, vínculo com: a) Coração. c) Hemácias. b) Músculos. d) Canalículos biliares. http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 27Medgrupo - CiClo 2: M.E.D Nessa questão, considerando-se um aumen- to isolado da AST (TGO), podemos dizer que o processo não seja hepático em sua origem, já que a ALT (TGP) seria uma enzima muito mais específica para o fígado. Qual seria então a origem da elevação da AST? Se pegarmos ao pé da letra, poderia ser até do músculo car- díaco... Mas em um paciente assintomático, sob acompanhamento ambulatorial, devemos obrigatoriamente pensar no mais comum: na origem muscular. Resposta: B. Agora você pode estar questionando – mas por que na síndrome colestática há aumento das transaminases, se não existe lesão dos hepatócitos? Na verdade existe sim, embora em pequena escala. Imagine a obstrução de algum ponto da árvore biliar – do colédoco, por exemplo – a bile continua sendo produzida a despeito da obstrução e o que acontece é o represamento retrógrado originando hiperten- são de todo o sistema. Se pensarmos bem, as vias biliares intra-hepáticas também estão sob pressão aumentada. E qual é a menor das vias biliares? Lembram? É o canalículo biliar, que nem tem parede própria – ele é um espaço virtual formado pelas paredes dos hepatócitos (FIGURA 3). A hipertensão do leito biliar pode determinar graus variáveis de “sofrimento” destes hepatócitos e justificar a elevação discreta de TGO e TGP. Fig. 2: Lesão Hepatocelular x Síndrome Colestática: O Fenômeno “Gangorra”. Fig. 3 ReGRA pRátIcA 1 - Se o aumento das Transaminases for maior que dez vezes o valor de referência (alguns falam > 300 U/L), a síndrome é com certeza Hepatocelular. ReGRA pRátIcA 2 - Se o aumento da Fosfatase Alcalina exceder 4x o valor de referência, a síndrome é com certeza colestática. ReGRA pRátIcA 3 - Níveis de Tran- saminases superiores a 1.000 U/L, com tGp > tGO são bastante sugestivos de Hepatite Viral Aguda!!! Outras causas são: intoxicação por paracetamol, isque- mia hepática grave. ReGRA pRátIcA 4 - Nas hepatites em geral, os níveis de TGP costumam ser superiores aos de TGO – a inver- são deste padrão clássico, em especial quando tGO > 2x tGp, sugere bastante a Hepatite Alcoólica como responsável pelo quadro. Nestes casos, a gama GT costuma estar bem elevada (por um me- canismo diferente da colestase). Veja estas questões. primeiro a regra: RESIDÊNCIA MÉDICA – 2014 HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DE JUNDIAÍ – SP Qual é o padrão bioquímico de uma icterícia obstrutiva, de origem pós-hepática? a) Bilirrubina total: 8,0 mg/dl, bilirrubina dire- ta: 6,8 mg/dl, TGO: 56 U/L TGP: 80 U/L, gama GT: 286 U/L, fosfatase alcalina: 706 U/L. b) Bilirrubina total: 7,0 mg/dl, bilirrubina direta: 4,4 mg/dl, TGO: 280 U/L, TGP: 500 U/L, gama GT: 300 U/L, fosfatase alcalina: 200 U/L. c) Bilirrubina total: 2,4 mg/dl, bilirrubina dire- ta: 0,4 mg/dl, TGO: 26 U/L, TGP: 30 U/L, gama GT: 86 U/L, fosfatase alcalina: 104 U/L. d) Bilirrubina total: 4,6 mg/dl, bilirrubina direta: 2,0 mg/dl, TGO: 1804 U/L, TGP: 2020 U/L, gama GT: 140 U/L, fosfatase alcalina: 146 U/L. e) Bilirrubina total: 4,2 mg/dl, bilirrubina dire- ta: 1,3 mg/dl, TGO: 42 U/L, TGP: 26 U/L, gama GT: 52 U/L, fosfatase alcalina: 96 U/L. Se o paciente tem icterícia obstrutiva, nada mais justo que imaginarmos a bilirrubina to- http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 28Medgrupo - CiClo 2: M.E.D tal elevada à custa da fração direta (letras C, D e E erradas). Como existe uma transmis- são da pressão dos grandes ductos biliares obstruídos à parede dos hepatócitos, pode haver elevação discreta (geralmente não é uma elevação gritante) das transaminases. Além disso, enzimas canaliculares como a fosfatase alcalina e a gama GT deverão marcadamente elevadas. Resposta: A. Depois a exceção: RESIDÊNCIA MÉDICA – 2008 UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – UERJ Um paciente de 62 anos, etilista contumaz, com história prévia de litíase biliar iniciou trata- mento com carbamazepina para neuralgia do trigêmeo. Uma semana depois, apresentou dor no hipocôndrio direito, procurando atendimento na manhã seguinte, sendo constatados: TGO = 1.360 U/L, TGP 1.266 U/L; fosfatase alcalina 206 U/L. Três dias depois, já com melhora da dor, tinha TGO = 368 U/L; fosfatase alcalina 645 U/L. O diagnóstico mais provável é: a) Hepatite A. b) Hepatite alcoólica. c) Cálculo de colédoco. d) Hepatite medicamentosa. Como não há história de risco para hepa- tite A, dá uma vontade enorme de marcar a opção D, não? Deu tanta que você marcou... E errou! Nas versões anteriores do MED co- locávamos assim “existem exceções a estas regras, mas é muito pouco provável que sejam cobradas”. Parece que alguém leu o trecho e resolveu cobrar. Vamos voltar então: existe uma exceção à regra prática 3. Ocorre na coledocolitíase aguda, quando o cálculo biliar entra no colédoco e o obstrui, mesmo que parcialmente. Logo que isto acontece, o paciente desenvolve dor no hipocôndrio direito, icterícia, colúria e as transaminases podem elevar-se transitoriamente para valo- res entre 1.000-2.000 U/L. Dias depois, estas enzimas caem rapidamente para abaixo de 300 U/L. Um dado a favor de colestase no caso clínico é o aumento pronunciado da fosfatase alcalina (206 para 645 U/L). Como o diagnóstico de coledocolitíase é provável, mas não confirmado, o próximo passo é con- tinuar a investigação (solicitando CPRE ou colangiorressonância...). Resposta: C. outras “pegadinhas” que podem ocorrer: (1) Hepatite viral aguda com padrão colestático (mais frequente na hepatite A). (2) Hepatite medicamentosa colestática. (3) Hepatite viral em paciente com obstrução prévia da árvore biliar. (4) Hepatite viral ou colestase em pacientes portadores de hemólise crônica. Os primeiros três casos aparecem com labora- tório dúbio, revelando síndrome hepatocelular (transaminases > 300 U/L) e de colestase (FA > 4x valor de referência). O quarto exemplo virá com padrão de bilirrubina confuso, reve- lando elevação importante da BI eda BD. Abordagem da Icterícia Veja a seguir o algoritmo adaptado do Harrison (Tratado de Medicina Interna) para a investi- gação dos quadros ictéricos: http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 29Medgrupo - CiClo 2: M.E.D LeSÃo HepAtoceLuLAr (HEPAtOPAtIAS AGuDAS) “Síndrome Hepatocelular”, como o próprio nome já indica, pode ser considerada como o conjunto de sinais e sintomas que surgem quando existe sofrimento e destruição dos hepatócitos. De uma forma geral, estas lesões são divididas em agudas ou crônicas (> 6 meses). Das hepatites agudas, alguns autores ainda definem o subtipo “fulminante” quando se desenvolve encefalopatia nas primeiras oito semanas. Neste bloco vamos nos reportar muito mais ao acometimento agudo do hepatócito. É claro que, por não ser a Medicina uma ciência exata, nada impede que algumas condições que veremos agora também levem com o passar do tempo a um quadro crônico, culminando com cirrose hepática. No entanto, as manifestações crônicas caracterizadas pelos “estigmas hepáticos” (telangiectasias, ginecomastia, etc.) e suas causas são diferenciadas e ficarão para outra apostila mais adiante: Insuficiência Hepatocelular e Hipertensão Porta. A Algumas noções básicas... Diversas condições podem determinar a des- truição deste tecido “mágico”, apesar de, em grande parte delas, isto ocorrer de forma se- cundária a um distúrbio ainda maior. Nestes ca- sos, a lesão hepática costuma ser de pequena monta e a síndrome hepatocelular pode passar despercebida, clínica e laboratorialmente... Tome como exemplo uma infecção fúngica sistêmica grave ou um quadro bacteriano sép- tico com envolvimento de múltiplos órgãos e sistemas (incluindo o fígado). Entretanto, o que mais nos interessa agora (e para as provas) são as condições que se caracterizam principalmente pelo sofrimen- to e destruição dos hepatócitos. Este é o evento que as origina e classifica. É o caso das Hepatites Virais, da Hepatite Tóxica e Medicamentosa, da Hepatite Alcoólica, das Hepatites isquêmica e congestiva e da Hepatite Autoimune. Mas antes de des- crevermos cada doença especificamente, gostaríamos que você guardasse uma vi- são geral, panorâmica, das “preferências” de algumas destas condições, ou seja, dos padrões histopatológicos que elas “adotam” para lesar o fígado. Como você já deve ter percebido, subestimar a importância do real entendimento dos eventos microscópicos, em se tratando de rim e fígado, não é uma boa ideia. Fig.1: (A) Necrose Periportal; (B) Necrose em “ponte”. A B Hepatites Virais A agressão viral ao tecido hepático (ativa ou passiva) determina hepatite, ou seja “inflama- ção” do fígado. Mas o que significa, histologi- camente, o termo “inflamação”? Invasão por leucócitos... Nas hepatites virais, qualquer que seja o vírus em questão, temos uma verda- deira infiltração do parênquima hepático por células inflamatórias (leucócitos) mononucle- ares (linfócitos e monócitos). O padrão que se estabelece é panlobular, ou seja, todas as partes de cada um dos lóbulos hepáticos estão envolvidas. Com a evolução do processo ocorre sofrimento dos hepatócitos, o que leva, muitas vezes à sua destruição. Nas hepatites virais, em geral, esta destruição tem início nos hepatócitos próximos aos espaços-porta: é o padrão periportal (FIGURA 1A). Em quadros graves, a destruição dos hepatócitos pode seguir um padrão que chamamos “em ponte” ou “necrose subaguda”, estendendo-se do espaço-porta para a veia central (FIGURA 1B), ou mesmo de uma veia central para outra. Hepatite Alcoólica Sabe como os hepatócitos reagem aos es- tímulos tóxicos (incluindo o álcool)? Abarro- tando-se de gordura! Infiltração gordurosa centrolobular é observada em quase todos 29 http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 30Medgrupo - CiClo 2: M.E.D aqueles que bebem mais de 60 g de etanol/ dia. Entretanto, o grande marco da Hepatite Alcoólica, que a diferencia da simples Este- atose, é, certamente, a lesão real e concreta do tecido hepático. Na Hepatite Alcoólica – revisaremos bem este conceito mais adiante – o tecido hepático “inflama”, ou seja, sofre uma “invasão”, uma infiltração de leucócitos, exatamente como nas hepatites virais. E existem duas características marcantes que diferenciam a lesão hepática causada por ví- rus da alcoólica, e gostaríamos que você as memorizassem desde já: (1) Na Alcoólica, a inflamação (infiltração) acontece nas regiões centrolobulares (FI- GURA 2); (2) Na Alcoólica, a inflamação acontece por leucócitos polimorfonucleares (infiltração neutrofílica) e não por mononucleares (linfó- citos/monócitos) como na viral. E isto está de acordo com outro achado pitoresco no hemo- grama desta entidade: a reação leucemoide (leucocitose)! Fig. 2: Padrão de lesão centrolobular: Hepatites Alcoólica e Isquêmica. Hepatite Isquêmica A isquemia do tecido hepático determina classicamente um padrão de lesão centro- lobular, e a razão para tal achado é de fácil entendimento. Basta nos lembrarmos de como acontece a circulação dentro dos lóbulos he- páticos... Não é da periferia para o centro? Nas situações de pouco aporte sanguíneo, os hepatócitos que mais sofrerão serão os últimos da “linha”, próximos às veias centrolo- bulares (FIGURA 2). Neste aspecto, o padrão é o mesmo da Hepatite Alcoólica. Fig. 4: Representa- ção esquemática: Le- são Hepática Peri- portal X Centrolobu- lar. Eventualmente você pode encontrar uma referência numé- rica a determinadas “Regiões Hepáticas”: região 1 = peripor- tal; região 3 = cen- trolobular; região 2 = Intermediária, “no meio” do lóbulo. Lesão Hepatocelular por colestase (FIGURA 3) Você já se perguntou o porquê da elevação das transaminases, mesmo que discreta (cerca de duas a três vezes os valores de referência), nas condições que originam apenas colestase? Uma coledocolitíase, por exemplo. Por que aparecem no sangue enzimas que são encon- tradas apenas dentro dos hepatócitos, se estes não estão sendo lesados pelo processo bási- co? A resposta é simples e interessante. Veja, partindo do princípio de que a produção da bile pelos hepatócitos não para nunca; a interrupção do fluxo biliar culmina num represamento retró- grado de bile a partir do ponto de obstrução. Este represamento é sentido em todo o sistema biliar, incluindo o intra-hepático. E qual é o ducto biliar mais distal de todos? O menor de todos? É o dúctulo biliar dos Espaços-Porta – lembra? Cada espaço-porta contém um ramo terminal da veia Porta, um ramo terminal da artéria he- pática e um dúctulo biliar (dúctulo de Hering). Este dúctulo está em contato íntimo com os hepatócitos dos espaços-porta. Se a obstrução biliar for severa, eles acabam ingurgitando e espremendo os hepatócitos ao seu redor. Além disso, costuma haver transbordamento de bile para os espaços-porta... Conclusão? Sofrimen- to e lesão dos hepatócitos periportais. Como este processo em geral é leve, a elevação das transaminases também é. Mas não se engane, este é o mesmo mecanismo responsável pelo desenvolvimento de cirrose(!) nas situações de obstrução biliar crônica. Fig. 3: Lesão por colestase: destruição dos hepatócitos periportais pelo ingur- gitamento dos ductos de Hering e extra- vasamento de bile. http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 31Medgrupo - CiClo 2: M.E.D 1) HEPaTiTES ViRaiS aGUDaS – DE “a” a “E” DeFInIçÃo: Infecção aguda por vírus hepatotrópicos, de- terminando inflamação e necrose do tecido hepático. QuAIS VíruS? Vírus da hepatite A, B, C, D ou E. Este último não tem importância em nosso meio. Mais comuns: hepatite A (crianças) e hepatite B (adultos). ApreSentAçÃo: O quadro clínico é muito semelhante entre os diversos tipos de vírus, o que muda é o período de incubação de cada um deles. A apresentação clássica é Trifásica: - Fase prodrômica (dias): síndrome gripal leve incluindo febre (que pode chegar a 39oC) + sintomas gastrointestinais inespecíficos (fa- diga, anorexia,náuseas, vômitos, perversão do paladar) + desconforto no quadrante supe- rior direito + manifestações imunomediadas (mais comuns na hepatite B: glomerulonefrite, rash, esplenomegalia). - Fase Ictérica (semanas): icterícia + colúria + acolia fecal + melhora dos sintomas prodrômicos (à exceção dos gastrointestinais). obs.: existe hepatite viral aguda sem icterícia? Sim! Aliás, é o mais comum. - Fase de convalescência (semanas): me- lhora clínica lenta e progressiva de todos os sinais e sintomas. LABorAtÓrIo: Elevação acentuada das transaminases – em geral mais de dez vezes o valor de referência (frequentemente > 1.000 U/L), predominando a ALT (TGP). Icterícia à custa de BD e bilirrubinúria. Hemograma: normal ou com leucopenia discreta e linfocitose (compatível com infecção viral). pAtoLogIA: A biópsia hepática não está indicada. Caso fosse realizada, mostraria: infiltração mononuclear (lin- fócitos) panlobular e dos espaços-porta, dege- neração eosinofílica apoptótica de hepatócitos (corpúsculos de Councilman). Na dependência da gravidade, podem ocorrer diversos graus de necrose: em “saca-bocado” (piecemeal/hepatite de interface), “em ponte” ou maciça. trAtAmento: Suporte – repouso relativo, aumento da in- gestão calórica. Terapia específica indicada sempre na hepatite C aguda (interferon ± ribavirina) e nos casos graves de hepatite B (drogas orais como a lamivudina ou tenofovir). compLIcAçõeS: (1) Hepatite fulminante (2) Cronificação (3) Manifestações extra-hepáticas autoimunes (4) Hepatite recorrente (5) Síndrome colestática Alguns detalhes sobre epidemiologia: Hepatite A: sabe-se ter alta prevalência nos países com condições sanitárias ruins e baixo nível socioeconômico. Para o Brasil, dados atuais mostram uma redução no número de casos anualmente a partir de 2005. Tais nú- meros classificariam o Brasil numa endemici- dade intermediária a baixa e se devem à me- lhoria do sistema de saneamento básico e oferta de água tratada no país. As regiões Norte e Nordeste apresentam o maior número de casos. Hepatite B: classicamente, desde o final dos anos 80, foram definidos três padrões de dis- tribuição da hepatite B no Brasil: alta endemi- cidade presente na região amazônica, alguns locais do Espírito Santo e oeste de Santa Catarina; endemicidade intermediária, nas regiões Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste e baixa endemicidade, na região Sul do país. No entanto, este padrão já vinha se modifican- do com o suporte mais intensivo à política de vacinação contra o HBV. Na região Norte, por exemplo, apenas a região sudeste do Pará permanecia como de alta endemicidade. Da- dos mais recentes mostram um avanço ainda maior, colocando o país como endemicidade baixa e transmissão estável. Hepatite c: até então, tínhamos poucos dados disponíveis e eram principalmente da rede de hemocentros de pré-doadores de sangue. Os valores mais atuais revelaram também uma endemicidade baixa. As regiões Sudeste e Sul concentram 86% dos casos notificados de hepatite C no Brasil. Hepatite D: concentra-se na Amazônia Oci- dental, que apresenta uma das maiores taxas do mundo! Todo paciente HBsAg+ que reside ou esteve em área endêmica para o vírus D deve realizar exames para a pesquisa deste agente. Hepatite e: apesar de condições sanitárias potencialmente favoráveis ao vírus, ainda não foi descrita nenhuma epidemia por ele, apenas alguns casos isolados. Alguns detalhes importantes sobre o perí- odo de incubação: O tempo de incubação depende do agente etiológico. Para facilitar, vamos gravar os agentes do menor para o maior tempo de in- cubação: - Hepatite A: 4 semanas (5-45 dias) - Hepatite E: 5-6 semanas (14-60 dias) - Hepatite C: 7 semanas (15-160 dias) - Hepatite B e D: 8-12 semanas (30 dias-6 meses) 31 http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 32Medgrupo - CiClo 2: M.E.D Alguns detalhes importantes sobre a FASe pRODRÔMIcA: O pródromo é curto: dias (em geral dois a sete dias), caracterizado por leves sintomas gripais (mal-estar, mialgias, artralgias, febre) e gastrointestinais. A febre é observada em 75% dos casos, principalmente nas hepatites A e E; pode ser precedida por calafrios, mas raramente é uma febre alta (39,5-40oC). Ano- rexia, náusea e vômitos são muito comuns – o paciente possui aversão a alimentos gorduro- sos e ao tabaco, ficando nauseado. Os vômi- tos, quando presentes, não são proeminentes (ao contrário da pancreatite aguda...). Alguns pacientes referem tosse seca e coriza, simu- lando ainda mais um quadro gripal corriquei- ro. Cefaleia e fotofobia também podem estar presentes nesta fase. Na hepatite B (como veremos adiante), um quadro tipo “doença do soro” pode ocorrer, com febre, poliartrite simétrica distal e rash eritematopapular. Alguns detalhes importantes sobre a FASe IctÉRIcA: A colúria precede a icterícia, geralmente por um a cinco dias e frequentemente vem acom- panhada de acolia fecal. A icterícia é nota- da na esclera, mucosa e pele; varia desde branda a acentuada. Em até 50% dos casos, surge prurido, geralmente leve. Cabe lembrar que um número significativo de pacientes não chega a desenvolver icterícia. Nesta fase, os sintomas gripais e a febre desaparecem, mas os sintomas gastrointestinais podem per- manecer e até se agravar. Náusea e fadiga podem piorar. O paciente apresenta perda ponderal, fadiga e indisposição. Surge dor no hipocôndrio direito e hepatomegalia do- lorosa. A borda hepática pode atingir até 15 cm do RCD em adultos!! Achados incomuns ao exame: aranhas vasculares (telangiecta- sias), adenopatia cervical, esplenomegalia (10-20% dos casos). A maioria dos pacien- tes não consegue ir ao trabalho nesta fase, que dura em média duas a seis semanas nos adultos (em crianças, cerca de duas semanas). Depois desse tempo, os sinais e sintomas vão desaparecendo lentamente (fase de convalescência). Alguns detalhes importantes sobre a FASe De cONVALeScÊNcIA: Este período varia entre 2-12 semanas. He- patomegalia e alterações laboratoriais podem permanecer neste período. A regressão clini- colaboratorial completa é esperada após um a dois meses nos casos de hepatite A e E e três a quatro meses após o aparecimento da ictérica nos casos autolimitados de hepatite B e C. Alguns detalhes importantes sobre o LABORAtÓRIO: Como já estudamos, a elevação acentuada das aminotransferases (transaminases) é o marco das hepatites agudas virais. Estas enzimas começam a se elevar antes da fase ictérica, atingindo seu pico máximo na pri- meira ou segunda semana de doença. Todos já memorizamos, este pico frequentemente ultrapassa 1.000 U/L e, numa minoria de casos, vai além de 4.000 U/L (há relatos de até 20.000 U/L!). O predomínio é sempre da ALT (TGP). Tipicamente, as transaminases vão reduzindo seus níveis paulatinamente, normalizando-se durante a fase de convales- cência, em média três a quatro semanas após o início dos sintomas. Mas lembre-se: não há uma correlação adequada entre transamina- ses e grau de lesão hepática. A hiperbilirrubinemia da fase ictérica varia em média entre 5-20 mg/dl, com predomínio da BD, embora em alguns casos o perfil seja 50% BD e 50% BI (Harrison última edição). A bilirrubinúria é a regra. A persistência de níveis elevados de bilirrubina ao longo da doença é um sinal de mau prognóstico. As demais en- zimas hepáticas elevam-se discretamente. O hemograma, tal como qualquer virose comum, costuma ser normal, embora possa ocorrer discreta leucopenia e linfocitose (relativa ou absoluta). Até 20% de linfócitos atípicos po- dem ser encontrados no sangue periférico. Hipergamaglobulinemia discreta é um evento comum, com elevação principalmente de IgG e IgM. A IgM está caracteristicamente mais elevada na hepatite A. Alguns autoanticorpos também podem ser encontrados durante a fase aguda, entre eles: antimúsculo liso, fator reumatoide, FAN, anti-LKM1 (hepatite C), anti- -LKM3 (hepatite D). Diagnóstico e tratamento: O diagnósticode uma hepatite viral aguda exige a sorologia viral para os principais vírus hepatotrópicos. A biópsia só é realizada se o diagnóstico permanecer incerto ou for neces- sário alguma decisão terapêutica. Detalhes sobre o diagnóstico sorológico serão deta- lhados mais adiante, quando falarmos sobre cada vírus. O tratamento, na grande maioria dos casos, é apenas de suporte. Repouso relativo e dieta hipercalórica são as medidas recomendadas. É claro que o paciente deve evitar qualquer tipo de droga ou substância hepatotóxica (álcool, paracetamol etc.). As únicas situações que exigem terapia espe- cífica são (1) a hepatite C aguda, para pre- venir a sua evolução para hepatite crônica e (2) as formas graves de hepatite B aguda. Quais são as complicações? Diversas complicações podem ocorrer. A fre- quência de algumas delas depende do tipo de vírus: 1- Hepatite colestática – Hepatite A: síndro- me colestática prolongada. 2- Hepatite fulminante – Hepatite A (Incid. = 0,3%, maior nos adultos), Hepatite B (Incid. < 1%, embora represente > 50% das hepatites http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 33Medgrupo - CiClo 2: M.E.D VIRAIS fulminantes), Hepatite E (sobretudo em gestantes). 3- Hepatite recorrente – Hepatite A, B ou C. 4- Hepatite crônica – Hepatite B (1-5% em adultos), Hepatite C (80-90%). o ALuno perguntA... O que é a necrose em saca-bocado que é descrita nas hepatites virais?? Saca-bocado é um instrumento idealizado para cortar e fazer buracos de várias formas em couro ou pano (ver foto). O aspecto conhecido como necrose em saca- -bocado (piecemeal necrosis) se refere à agressão na placa limitante (interface entre o pseudolóbulo e o tecido fibroso circunjacente), quando células inflamatórias literalmente vão penetrando entre os hepatócitos da periferia, resultando em necro- se de alguns deles. 5- Fenômenos autoimunes – Hepatite B: poliartrite, glomerulonefrite, urticária e angio- edema; Hepatite C: crioglobulinemia, líquen plano. 6- complicações raras – Anemia aplásica, mielite transversa, síndrome de Guillain-Barré. Hepatite Viral Aguda B VIroLogIA: é o único vírus DNA dos cinco. Os demais são todos RNA. DIAgnÓStIco: através dos “Marcadores Sorológicos”. HBsAg = é o primeiro marcador, também chamado de antígeno Austrália. Na hepatite aguda, ele cai a níveis indetectáveis em até seis meses. Quando > seis meses = hepatite crônica. Anti-HBc total = marcador presente nas infecções agudas pela presença de IgM e crônicas pela presença de IgG. Representa contato prévio com o vírus. Anti-HBc Igm = marcador de infecção recen- te, encontrado no soro até 32 semanas após a infecção. HBeAg = marcador de replicação viral. Sua positividade indica alta infecciosidade. Anti-HBe = surge após o desaparecimento do HBeAg, indica o fim da fase replicativa. Anti-HBs = único anticorpo que confere imu- nidade ao HBV. Está presente no soro após o desaparecimento do HBsAg, sendo indica- dor de cura e imunidade e, isoladamente, em pessoas vacinadas. TRANSMISSÃO: sexual, perinatal (vertical) e percutânea. compLIcAçõeS prIncIpAIS: cronificação (principalmente em recém-nascidos) e hepa- tite fulminante. trAtAmento: veremos com mais detalhes na hepatite crônica. Na fase aguda, só nos casos mais graves com drogas orais. proFILAXIA (ver indicações no texto) - pré-exposição = Vacina (HB). - pós-exposição = Imunoglobulina Hiperimu- ne (IGHAHB) + Vacina (HB). Sem sombra de dúvida, de tudo o que fala- remos neste tópico sobre “Hepatites Virais”, o tema mais cobrado em provas será Diag- nóstico sorológico da Hepatite B. Por esta razão, ao terminar este capítulo, faça para si mesmo uma pergunta: “eu tenho completa segurança para interpretar as várias com- binações entre HBsAg, Anti-HBs, Anti-HBc IgG, Anti-HBc IgM, HBeAg e anti-HBe ???” Não basta ter uma noção... Você DOMINA este assunto? Se a resposta for não, volte e estude tudo de novo! Hepatite viral costuma “cair” todo ano e em todos os concursos... O restante das questões sobre este tema aponta basicamente para (1) profilaxia e (2) tratamento (mais importante nas hepatites crônicas e, por isso, abordado com mais detalhes no módulo de Insuficiência Hepa- tocelular e Hipertensão Porta). A História Natural e os “Marcadores” Veremos agora o curso completo de uma he- patite B aguda ictérica, ressaltando as relações cronológicas de cada fase clínica com o surgi- mento no soro das alterações laboratoriais e dos antígenos e anticorpos característicos, tão importantes para formulação do diagnóstico e abordagem do paciente. http://#scrolldown ClíniCa MédiCa - VoluMe 1 34Medgrupo - CiClo 2: M.E.D 1) ApArecImento Do HBsAg O surgimento do primeiro e mais importante marcador da hepatite B, o antígeno de su- perfície HBsAg (antígeno Austrália) limita o “período de soroconversão”. Após o contágio, este antígeno pode ser detectado no soro den- tro de poucas semanas, antes da existência de qualquer sintomatologia. Assim, quando o paciente desenvolve os primeiros sintomas inespecíficos da fase prodrômica, já é possível o diagnóstico sorológico da hepatite B. 2) o períoDo De IncuBAçÃo O período de incubação da hepatite B costu- ma ser de 30 dias-6 meses (média de 8-12 semanas), podendo variar em função da car- ga viral recebida durante o contágio. Quando se iniciam os primeiros sinais e sintomas da hepatite B, dois importantes eventos sorológi- cos costumam se tornar evidentes: o aumento das transaminases e o aparecimento do an- ticorpo contra o Core: anti-HBc (lembrar que o antígeno “c” não é detectado no soro pelos métodos usuais). 3) AS trÊS FASeS cLínIcAS Inicia-se pela fase prodrômica, que costuma durar por uma a duas semanas. Em geral, todas as três fases clínicas, cada uma, costu- mam durar por vários dias a poucas semanas. O anti-HBc Igm aparece no soro logo após o HBsAg (um a duas semanas), juntamente com os sintomas da hepatite. Este anticorpo permanece positivo por quatro a cinco meses. Em conjunto com o HBsAg, compõe os dois marcadores sorológicos mais importantes da hepatite B aguda. O anti-HBc Igg aparece pouco tempo depois do IgM, permanecendo positivo indefinidamente, mesmo após a cura da hepatite B (cicatriz sorológica). Com o surgimento do anticorpo contra o antí- geno de superfície – anti-HBs, inicia-se a fase de convalescência, marcada pela queda pro- gressiva das transaminases hepáticas, e re- dução progressiva da icterícia e dos sintomas sistêmicos. Este anticorpo surge em média um a dois meses após o início dos sintomas, logo depois ou algumas semanas depois da negativação do HBsAg. Este período é cha- mado de “janela imunológica”, justificando um pequenino grupo de pacientes com hepatite B aguda HBsAg negativo. A melhora do quadro agudo da hepatite B e a evolução para a cura dependem fundamental- mente da capacidade do indivíduo em produzir de forma satisfatória o anti-HBs. Se não houver a produção deste anticorpo pelo menos após seis meses de evolução, o paciente não se livra- rá do HBV, tornando-se portador crônico assin- tomático ou desenvolvendo hepatite B crônica. e o antígeno “e”? O antígeno “e” (HBeAg) é produzido quando o vírus se replica intensamente, durante a fase sintomática da hepatite B e durando um período um pouco inferior ao HBsAg. Quanto maior for o estado de replicação viral, mais facilmente se encontrará este antígeno, e também mais infectividade terá o soro que o contém. Com o passar do tempo o organismo tende a suprimir a replicação viral, e passa a ser detectado no soro o anticorpo contra o antígeno “e” (anti-HBe). Se houver cura do quadro de hepatite B, o anti-HBe permanece no soro, evidenciando um passado de replica- ção viral. Se o paciente desenvolver hepatite B crônica, sempre que houver piora do quadro (agudização) por retomada da replicação viral, aparecerá novamente no sangue o HBeAg. Para manejo diagnóstico de um paciente ic- térico, quando o objetivo é a interpretação de um quadro