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Exu Pisa no Toco de um Galho Só performance e performatividade em Exu

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E-ISSN 2237-2660 TEMAS CONTEMPORÂNEOS III 
 
 
Genilson Leite da Silva, Mirian Bárbara Miralles Torres, Simonne Silva Alves, Tiago Sá Leitão dos Santos e Mirta Bárbara Torres 
Berdeguez – Exu Pisa no Toco de um Galho Só: performance e performatividade em Exu 
Rev. Bras. Estud. Presença, Porto Alegre, v. 12, n. 2, e119278, 2022. 
Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/2237-2660119278> 
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Exu Pisa no Toco de um Galho Só: perfor-
mance e performatividade em Exu 
Genilson Leite da SilvaI 
Mirian Bárbara Miralles TorresI 
Simonne Silva AlvesI 
Tiago Sá Leitão dos SantosI 
Mirta Bárbara Torres BerdeguezI 
IUniversidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Rio de Janeiro/RJ – Brasil 
RESUMO – Exu Pisa no Toco de um Galho Só: performance e performatividade em Exu– Este artigo 
discute performatividade e performance através da analogia com o orixá Exu e as entidades Exus. A pesquisa de 
campo e a observação participante no candomblé e nas giras de Exus permitiram aprofundar as reflexões. Através de 
experiências como um omorixá Exu, projeta-se o terreiro e a encruzilhada como espaço de produção de conheci-
mento. Alargando o entendimento de performance tendo a diáspora africana como contribuição e influência. Con-
clui-se que performatividade/Exu e performance/Exus não podem ser subjugados a olhares universalistas e padroni-
zadores. A encruzilhada é um espaço capaz de apontar caminhos que contribuem para a compreensão das perfor-
mances e corporeidades negras. 
Palavras-chave: Exu. Exus. Performance e Performatividade. Performance Afro. Corpo Encruzilhada. 
ABSTRACT – Exu Steps on the Single-Branch Stump: performance and performance in Exu – This 
paper discusses performativity and performance through an analogy with the orixá Exu and the Exus entities. The 
field research and participant observation in Candomblé and giras of Exu allowed for an in-depth reflection. Experi-
ences as an Omorixá Exu allows us to approach the terreiro and the crossroads as a knowledge production space. 
Our understanding of performance is broadened due to the contributions and influences of the African diaspora. 
We conclude that performativity/Exu and performance/Exus cannot be subjugated to universalist and standardizing 
views. The crossroads is a space with the capacity of pointing out paths that contribute to the understanding of Black 
performances and corporealities. 
Keywords: Exu. Exus. Performance and Performativity. Afro Performance. Crossroads Body. 
RÉSUMÉ – Exu Étapes sur le Moignon d’une Seule Branche: performances et performativité dans Exu 
– Cet article discute de la performativité et performance par le biais de l’analogie avec l’orisha Exu ainsi que les entités 
Exus. La recherche de terrain et l’obseration participante au sein du Candomblé et dans les rouages de Exu ont per-
mis d’approfondir les réflexions. A travers des expériences telles que Omorixá Exu, le temple et le carrefour se projet-
tent comme des espaces de production du savoir. La compréhension de la performance s’élargit grâce aux influences 
et contribuitions de la dispora africaine. Il en découle que la performativité/Exu et la performance Exu ne peuvent se 
réduire exclusivement à la vision occidentale. Le carrefour est un espace capable de montrer le chemin qui contribue 
à la compréhension des performances et esprits corporels noires. 
Mots-clés: Exu. Exus. Performances et Performativité. Performances Afro. Corps Carrefour. 
E-ISSN 2237-2660 
 
 
 
 
Genilson Leite da Silva, Mirian Bárbara Miralles Torres, Simonne Silva Alves, Tiago Sá Leitão dos Santos e 
Mirta Bárbara Torres Berdeguez – Exu Pisa no Toco de um Galho Só: performance e performatividade em Exu 
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Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/presenca> 
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Exu pisa no toco de um galho só 
Exu pisa no toco e pisa no galho 
O galho balança Exu não cai ô ganga1 
 
O referido ponto faz menção à capacidade dos Exus de serem maiorais, 
a sua forma de lidar com as situações e a como causam o caos para promo-
ver a ordem na controversa do esperado. Este artigo flerta com os conceitos e 
concepções de performance e performatividade como quem anda na corda 
bamba, ciente de que a qualquer momento pode tropeçar nas armadilhas, as 
quais os autores referenciados caíram na tentativa de engessar o que é fluido 
e dinâmico. Este trabalho promove reflexão sobre os conceitos de performa-
tividade e performance através de diálogo e aproximação com Exu e Exus. 
Para tal, arriscamos recorrer a algumas disciplinas, como a antropologia, a 
arte e a filosofia, atreladas às experiências dos terreiros de candomblé, nas 
encruzilhadas e nos centros de umbanda para servir como aporte na cons-
trução de reflexões que possam contribuir com o debate acerca dos Estudos 
da Performance. Debruçamo-nos também sobre performances afro a fim de 
compreender sobre os aspectos similares entre as diversas performances de 
matriz africana. 
Para isso, recorremos à encruzilhada como lugar de criatividade e pro-
dução de epistemes que proporcionam outras possibilidades estéticas e expe-
riências corporais para expressar a performance e a corporeidade negra. Mi-
nha experiência enquanto candomblecista e omorixá Exu também participa 
desse “[...] ebó epistêmico” (Rufino, 2016, p. 23). Esta pesquisa floresce 
junto à necessidade de nos conscientizarmos sobre a importância de valori-
zar e conhecer outras formas de produção de conhecimento, da expressão de 
corpos há muito silenciados e por apresentar outras perspectivas, as quais as 
artes podem fluir. Promove contribuições significativas para os Estudos da 
Presença, das Artes Cênicas, da Performance e da Cultura Afro-Brasileira. 
Assim para que o xiré, a festa, ocorra a contento de Exu ofertamos esse padê 
conceitual, minha farofa amarela, para referenciar aos ancestrais no estudo 
da performance. 
Embora artistas futuristas, dadaístas e surrealistas já tenham realizado 
intervenções que buscavam romper com os dogmas e paradigmas da arte 
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tradicional e no meio social da década de 1950, 1960 e 1970, (Goldberg, 
2007) assinala que a performance só ganha notoriedade e reconhecimento 
enquanto gênero e expressão artística independente na década de 1970. 
Momento em que as obras de arte eram reconhecidas apenas como algo su-
pérfluo e comercial. A arte conceitual desfrutava de forma plena os salões 
nobres de artes, museus e galerias, impulsionando as obras enquanto mer-
cadoria a ser comercializada. 
Marcel Duchamp (1913) apud (Goldberg, 2007) critica o fato de uma 
elite de artistas terem poder para chancelar e definir o que poderia ser con-
siderado obra de arte. Assim, como num passe de mágica, qualquer objeto 
cotidiano tocado por um artista e chancelado pela elite, seria, por essência, 
considerado uma obra de arte, mais uma obra disponível à venda nos salões 
nobres (Salgado, 2014). A arte dessa época estava voltada a valorizar o pro-
duto em detrimento do processo. É nesse cenário que a performance surge 
como catalisador, demolidor contra a categorização, onde o performer não 
só a usava para atrair publicidade para si, mas também como estratégia para 
pôr em prática, para materializar, dar corpo às ideias e aos diversos conceitos 
sobre a criação artística rompendo com a ideia de que a arte estava aprisio-
nada a um conceito único. Logo, as “[...] demonstrações ao vivo sempre fo-
ram usadas como arma contra os convencionalismos da arte estabelecida” 
(Goldberg, 2007, p. 7). 
Com isso, os artistas canônicos tiveram que repensar suas abordagens, 
voltando uma atenção maior para os processos, o que lhes permitiutrans-
gredir os limiares de uma arte elitista através da performance enquanto uma 
disciplina maleável e aberta a promover diálogos entre as linguagens e cam-
pos diversos como: literatura, artes, ciências sociais. É inquestionável que 
sua origem tenha se dado nas artes visuais e que foi por meio desses diálogos 
que a performance ganhou fôlego para se expandir por diversos campos co-
mo já citados e diversos setores da vida humana. Tornando-se assim um 
campo fértil de produção em arte e sem fronteiras – o que possibilita troca e 
contato entre as linguagens artísticas, gerando um universo de diversas 
abordagens, além das artísticas, nas esferas da antropologia, sociologia, his-
tória e dos esportes (Ligiéro, 2010). 
 Nascida de um cenário de pós guerra fria, a performance é também 
produto dos diversos levantes sociais e disciplinares que no final da década 
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1960 estremeceram a Europa e os Estados Unidos, rompendo radicalmente 
com as noções de comportamentos normativos promulgados pela sociolo-
gia. Reduziu as divisões disciplinares entre antropologia e o teatro (Taylor, 
2003; 2013). 
 Ressalto que nos Estados Unidos as décadas de 1960 e 1970 compre-
enderam importantes momentos marcados histórica e socialmente pelos 
crescentes questionamentos direcionados à Arte clássica. Essas décadas tam-
bém foram conhecidas como virada performativa ou giro da performance 
consolidada como linguagem para questionar valores e estruturas políticas e 
culturais, pondo a Arte e o artista em xeque. Há nesse momento uma busca 
por abolir toda forma de pensar arte que se distancie da vida. 
O comprometimento dos estudos da performance com a reflexão e a 
análise dos objetos de arte são formas de intervir na relação do homem com 
seu meio social e no seu corpo através da tenuidade entre interfaces da arte 
com a vida cotidiana (Zenicola, 2014). Para a pesquisadora, a performance 
resulta da possibilidade de permitir que se tornasse aplicável e funcional o 
diálogo entre as diversas esferas da vida. Nei Lopes (2010, p. 09), no prefá-
cio do livro Corpo a corpo: estudo das performances afro-brasileiras, assinala 
que a performance é uma disciplina “[...] atraente e misteriosa [...]” – há na 
sua percepção a ideia de superação da dicotomia entre arte e vida, onde am-
bas se mostram atraente e misteriosa para o homem. 
Seria essa capacidade da performance de relacionar, de forma intrínse-
ca, os mistérios da arte com os mistérios da vida que permite e/ou provoca 
na performance um distanciamento e/ou fuga do teatro. Por mais que Carl-
son (2009) busque refutar essa ruptura, ela não é possível de ser negada, vis-
to que a performance vem para dar ênfase à presença física do sujeito, bus-
cando romper com a distância entre artista e público. As personagens fictí-
cias saem de cena para dar lugar ao sujeito; o performer não representa ne-
nhuma personagem a não ser a si mesmo, não há domínio dos aconteci-
mentos, o roteiro não é uma prisão como no teatro clássico. A performance 
dá ao performer a potencialidade de ser, ao mesmo tempo, criador e criatu-
ra, uma vez que não há a separação entre artista e obra de arte, arte e vida 
vibram num lapso tempo-espacial onde ambos são sendo no aqui e agora. 
A literatura aponta que a performance floresce do futurismo, do dada-
ísmo, surrealismo, dos happenings e das pinturas poemas, onde o corpo e a 
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presença física assumem o centro da ação por meio de comportamentos e 
gestualidades (Goldberg, 2007; Carlson; 2009; Salgado, 2014). 
Kaprow trabalha com a perspectiva de que o espetáculo ao vivo (desempe-
nho) aproximava-se da vida social, ou seja, a vida em si oferece conteúdo à 
arte e pode ser vivida como arte. Tal aproximação entre arte e vida presente 
nas obras de Kaprow é bastante influenciada pelo pensamento de Erving 
Goffman (Toro, 2010 apud Salgado, 2014, p. 8). 
Arte e vida estão associadas de forma complementar, num processo de 
inter-nutrição, onde a arte floresce da vida ao mesmo tempo em que a ali-
menta, conotando assim, uma relação de reciprocidade indissociável. Den-
tre os artistas que desenvolveram seus trabalhos com uma perspectiva que se 
aproximasse ou fosse geratriz da performance, ganha destaque Allan Ka-
prow, que em 1950 concebeu obras que mesclavam diversas linguagens ar-
tísticas, as quais não era possível identificar e/ou classificar como sendo dan-
ça, música, teatro, pintura ou escultura, e suas práticas artísticas eram muito 
ligadas à Installation Art e aos Happenings. 
São de notória importância para o surgimento e o fortalecimento da 
performance, artistas como “Ana Mendieta, Chris Burden, DanGraham, 
Gina Pane, Joan Jonas, John Cage, Lao Tzu, Laurie Anderson, Marina 
Abramovic, Vito Acconci, Stelarc” (Salgado, 2014, p. 81), que desenvolve-
ram suas obras artísticas de forma interserccional, rompendo barreiras entre 
gêneros e os campos de conhecimento, buscando a superação da dicotomia 
vida e arte. 
Por mais que Carlson (2009) aponte a impossibilidade de conceituar 
performance, atrever-me-ei a tecer algumas reflexões a caminho de um con-
ceito que contemple e auxilie essa escrita. Para tal, recorrerei também à re-
flexão sobre o conceito e a presença da performatividade desenvolvida pelo 
orixá Exu e as entidades Exus brasileiros. Crio uma analogia entre os dois 
conceitos, performance e performatividade, como Exu e Exus, não respecti-
vamente. Debruço-me sobre a complexidade que é refletir conceitualmente 
sobre esses quatros elementos: Performance, Performatividade, Exu e Exus. 
Performance/Exus e Performatividade/Exu de forma análoga. Parto da per-
formatividade/Exu como ponto inicial, como quem faz de trás para frente, 
como quem nega para afirmar. Assim deixo os conceitos centrais Perfor-
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mance/Exus dentro de minha moringa para acessar em um momento opor-
tuno, como quem espera sorrateiramente pelo momento certo de atacar. 
Os Exus estão para o orixá Exu como a performance está para a per-
formatividade: ambos surgem para ratificar a presença de sua matriz, seja na 
forma de anunciação ou na própria forma de agir, de entrar em ação. Taylor 
(2013) assinala performance e performatividade como falsos cognatos; eu 
ouso, aqui, dizer que Exu e Exus também os são na mesma medida – eles 
contraditoriamente são tão parecidos quanto diferentes. Os Exus brasileiros, 
entidades da umbanda, são elementos que conotam a presença, a fisicalida-
de do orixá. Em outras religiões que não o candomblé, eles surgem e se for-
talecem na relação que o candomblé traça com outras culturas. Por sua vez a 
performatividade surge através de pesquisadores vindos da retórica e da filo-
sofia, como Derrida, Foucault, Lacan e Butler (Taylor, 2003; 2013); (Carl-
son, 2009) e (Lopes, 2010), todos creditando à ação, à enunciação, seja 
através de gestos, comportamentos preestabelecidos por símbolos, códigos 
ou fala, o que nos remete à relação de interação no campofísico que os exus 
têm com os devotos por meio da bebida, cigarro, da comida, da fala, da 
dança e das vestimentas. A performance está para a ação tanto quanto a per-
formatividade está para o enunciado, a energia, a força do discurso que pre-
sentifica o orixá. 
Outro elemento que permite flertar nessa encruzilhada conceitual 
Exu/performatividade e Exus/performance é a afirmativa de Schechner 
(2003; 2006; 2012), quando o mesmo aponta que nem tudo é performan-
ce, mas tudo pode ser estudado, visto enquanto performance. Logo, se a per-
formance está no intermédio do performer, a ação e a audiência, a perfor-
matividade é o discurso que amarra o sentido, contexto, ou o não sentido. A 
performatividade é composta por micro performances que proporcionam ao 
performer a sensação de alcançar, ou não, os objetivos a que se propôs, ex-
pandindo assim os sentidos dos códigos e símbolos. 
Se emergirmos no campo místico e mítico para observar e relacionar 
esses aspectos, perceberemos que quando Exu se faz presente no terreiro, 
mesmo na expressão das entidades Exus, seu enunciado se faz pela fisicali-
dade expressa no salão. Assim como, no campo energético que envolve o 
imaginário dos devotos acerca da divindade, seja através das cores, dos ele-
mentos usados para adornar o ambiente, das bebidas, das músicas, toques e 
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danças executadas no ritual. Exu/performatividade e Exus/performance se 
fazem presença de forma simultânea, inter-relacional e/ou interdependente. 
 Porém, encontramos na figura de Zé Pelintra um enigma que nos co-
loca de volta na encruzilhada conceitual sobre o ser Exu/performatividade e 
o ser Exus/performance. Zé Pelintra é entidade do catimbó, que uns apon-
tam como não sendo um Exus, e outros como sendo um espírito desencar-
nado, egun, que é invocado na quimbanda, na umbanda nas giras para Exus. 
Sua enunciação é da falange das almas, mas sua presença se faz no campo 
representativo e simbólico de Exus. As entidades são vistas enquanto Exus, 
logo sua performance é permeada por cantigas, danças, bebidas e vestimen-
tas que expressam performatividade que possibilita compreendê-lo como 
Exus, conotando a energia enunciativa do orixá Exu. Isso nos posiciona no 
meio da encruzilhada Schechneriana do enquanto. Zé Pelintra é visto en-
quanto egun, assim atuaria na falange das almas, porém atua enquanto Exus 
na falange de Exu no culto da umbanda. Performance e performatividade 
em uma só entidade. Assim a performatividade compõe um conjunto de 
movimentos, gestos, falas, símbolos culturais que podem ser estudados en-
quanto performance, mas não é performance. Há na performatividade 
grande presença de teatralidade, o que lhe aproxima e quase a deixa íntima 
do teatro, porém ela também não é teatro (Féral, 2015). Logo a performan-
ce pode ser entendida como uma encenação da vida vivida, enquanto a per-
formatividade uma análise, estudo sobre a vida. 
Performatividade é um falso cognato da performance, não de forma 
semântica, mas a performatividade expressa um vasto domínio cultural, não 
estando, como a performance, relacionada e voltada a uma questão e/ou 
preocupação puramente estética, como aponta (Féral, 2009) ao abordar o 
tema performance e teatro performativo. A autora aponta duas perspectivas 
para performance: a primeira expande e amplia o conceito de performance 
aos campos da antropologia, ciências sociais, voltados aos estudos de rituais 
e dramas sociais pautados por Turner e Schechner; a segunda, do professor 
Huyssen, que busca expressar as perspectivas artísticas que valorizam as 
questões estéticas em detrimento às sociológicas e antropológicas, uma visão 
que distancia a arte das demandas socioculturais. Assim aponta a perfor-
mance cultural e a performance artística: 
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Sua visão trata da performance no seu sentido puramente artístico - e não 
antropológico. Ele se coloca numa visão essencialmente estética que conti-
nua a dominar nas artes do espetáculo. A performance, no sentido, é a per-
formance arte, uma arte que abalou nossa visão de arte nas décadas de 70 e 
80 (Féral, 2009, p. 199). 
A performatividade é um dos tentáculos centrais da performance que a 
possibilita se expandir e ser multifacetária. A performatividade está na ins-
tância que atua sobre a cultura. Assim como os Exus demarcaram a presença 
do orixá Exu nos cultos afro-brasileiros, onde se resguardaram alguns aspec-
tos do orixá em cada fragmento seu lançado aos nove Orun, em cada um 
dos Exus, da mesma forma o conceito de performatividade desloca o olhar 
do enunciado e de seu conteúdo para os modos de enunciação discursiva, 
desconstruindo e ressignificando símbolos e signos, criando uma fricção en-
tre vida e arte, a realidade e o imaginário. 
A compreensão desses termos, Performatividade/Exu e Performan-
ce/Exus, será desnecessária caso também não compreendamos sua essência. 
Assim, é sabido que ambos são elementos multifacetários e complexos para 
serem apreendidos em uma concepção que se diga purista e conservadora. 
Contudo essa busca se faz legítima por demonstrar como eles estão associa-
dos à vida de forma inseparável. Performatividade/Exu, Performance/Exus 
têm seu cerne na ação, no corpo presente, na fisicalidade. Seria muito sim-
plista buscar um campo semântico para dar conta de temas tão ambíguos. 
Nessa perspectiva, Carlson (2009) aponta a futilidade na perseguição por 
compreensão e a apreensão semântica sobre performance: 
Se considerarmos a performance como um conceito essencialmente questio-
nado, isso nos ajudará a compreender a futilidade de procurar algum campo 
semântico inclusivo para cobrir os usos díspares como a performance de um 
ator, de uma escola, de um automóvel (Carlson, 2009, p. 16). 
Assim Exu e a performatividade têm a capacidade de dialogar e pro-
mover diálogo entre diversas linguagens artísticas e em diferentes esferas da 
vida. As diferentes perspectivas da performance como prática ou objeto de 
estudo que dificultam precisar sua conceitualização, se considerarmos que 
ela, como Exu, está presente em todas as culturas e que pode ser tomada 
como ações que se realizam em contextos diversos. A performance, na fala 
de Schechner (2003; 2006), serve como um guarda-chuva onde se resguar-
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dam variadas manifestações artísticas e culturais. Quanto a esse aspecto da 
performance importa assinalar que: 
A performance sempre afixou uma multiplicidade de inspirações e de for-
mas, que nenhuma outra arte pôde preservar com a mesma intensidade. 
Vindo a performance de horizontes muito diferentes (música, pintura, dan-
ça escultura, literatura, teatro) (Féral, 2015, p. 136). 
Esses aspectos, como outros da performance, também são identificados 
nos Exu/Exus: maleabilidade, capacidade de transmutação e adaptação no 
tempo e no espaço. Não se prendem aos espaços físicos e nem ao tempo; 
sendo elas capazes de jogar com os dois, impõem sua temporalidade própria 
e suas própriasimagens e projeção, jogando com o espaço, ora o expandin-
do, ora o retraindo. A performance dobra o tempo como Exu o faz com o 
seu ogô – porrete mágico – que lhe permite se transportar no tempo-espaço. 
A capacidade de manipular o corpo no espaço, dilatando-o em possibi-
lidades não é uma característica de existência e permanência inerente tanto à 
divindade e entidades, quanto às linguagens aqui invocadas. O corpo é o 
cordão umbilical que conecta Exu ao universo, expressando sua performati-
vidade enquanto Elegbara, o senhor do corpo, e é através desse mesmo cor-
po que ele, o Exu umbilical, conecta todos os seres viventes aos deuses, ao 
Orun, mundo dos não viventes. E não por coincidência é através do corpo, 
a partir do processo de incorporação ou corporificação, que as entidades 
Exus performatizam todas as mazelas e dramas socioculturais em forma de 
dança, música, cânticos, baforadas e gargalhadas. É por meio dessas ações, 
atos, gestos performativos que Exus espalham pelo universo físico e metafí-
sico seu ebó simbólico. 
Quando os Exus expressam sua performance nos centros, invocam de 
forma mística a performatividade de Exu. O rodar da saia da pombagira 
manipula o tempo-espaço e projeta o axé, a energia essencial do Orixá, fa-
zendo com que esse seja reverenciado e presentificado nas mensagens inscri-
tas nos corpos e no imaginário dos presentes. As gargalhadas das Pombagi-
ras, o riscado do Zé Pelintra e as baforadas do charuto de Tranca-ruas são 
ebós simbólicos, performatizados para invocar nos sujeitos e para os sujeitos 
toda potencialidade de subversão inscrita no/pelo senhor do corpo, Orixá 
Exu Bara, para anunciar a rua e a encruzilhada como lugar de possibilidades 
epistêmicas diversas e variadas. Para tanto, o performer/sacerdote precisa co-
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locar seu corpo em jogo, à risca, tendo consciência de que a mutilação, o fe-
rimento e o desequilíbrio em algum momento podem ser uma realidade e 
que essa mutilação não ocorrerá, como pensa o senso comum, como uma 
forma de negação ou punição ao performer ou ao corpo. Será uma forma de 
reafirmá-lo cura que purifica, que permite brotar corpo do corpo, afirman-
do a certeza de presença, a entrega da alma. Mutilação que abre o corpo, 
mas que também fecha, protege e prepara. Deixar com que a plateia mani-
pule seu corpo ou algo nele possibilita ressignificação e dilatação, o expan-
dindo para uma pluralidade e diversidade de sentido. 
Outros aspectos que legitimam e são basilares para as analogias aqui 
desenvolvidas são as capacidades dos elementos aqui envolvidos de manipu-
lar e transformar, tanto o espaço quanto a realidade que os envolvem. Para 
sustentar tal hipótese invoco e corporifico aqui neste texto Exu personifica-
do em Enugbarijó, que na fala de Santos (2008) e Santos e Santos (2014) 
também é conhecido como o primeiro ser vivente, Exu Ianguí, sendo ele o 
intérrete e o linguista do sistema iorubá, conectando o Orun ao Aiê. Essa 
faculdade se dá pelo fato de que: 
[...] todos os quatrocentos irumilés decidiram dar um pedaço de suas pró-
prias bocas para Exu, no dia em que ele deveria representá-los aos pés de 
Olorum. Exu pegou esses pedaços e os colocou na própria boca; desde então 
ele fala por todos eles e sua boca os representa (Santos; Santos, 2014, p. 
108). 
Assim sendo, Enugbarijó seria a boca coletiva do universo, logo a boca 
que tudo come e que junto a sua competência de intérprete, aquele que tor-
na tudo palatável, compreensível a seu modo ou não. Seria ele a expressão 
do dinamismo, manipulação e transformação. Para Simas e Rufino (2018, 
p. 51), Enugbarijó é a boca “[...] que tudo come, é a mesma que devolve o 
que engoliu de forma restituída [...]”, transformada, processada, modifica-
da. Traga-se as mazelas, a fome, bebe-se as desgraças, as mágoas de mal de 
amor. As baforadas, as gargalhadas e as requebradas que os Exus performati-
zam nos centros de umbanda e quimbanda são a devolutiva, a restituição 
em resposta às demandas por eles engolidas e processadas, são anunciação 
de boas novas, ou não. 
Nesse jogo de analogia trago Féral (2009) ao analisar a relação da per-
formance e da performatividade no seu diálogo com o campo representativo 
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e a capacidade em jogar com os signos, códigos e símbolos, em engolir a 
realidade de uma forma e devolver de outra, de ser intérprete e decodifica-
dor dos códigos, implantando certa ambiguidade à cena, que tira o especta-
dor do seu lugar de passividade tal qual faz Enugbarijó ao fazer sua devolu-
tiva em forma de enigma: 
A performance toma lugar no real e enfoca essa mesma realidade na qual se 
inscreve desconstruindo-a, jogando com os códigos e as capacidades do es-
pectador... Essa desconstrução passa por um jogo com os signos que se tor-
nam instáveis, fluidos forçando o olhar do espectador a se adaptar incessan-
temente, a migrar de uma referência à outra, de um sistema de representação 
a outro... O performer instala a ambiguidade de significação, o deslocamen-
to dos códigos, os deslizes de sentido. Trata-se, portanto, de desconstruir a 
realidade, os signos, os sentidos e a linguagem (Féral, 2009 p. 203-204). 
O corpo do performer é um corpo camaleão que se adapta a diversos 
ambientes através da manipulação e da metamorfose; o performer trabalha o 
corpo como um pintor trabalha a tela (Féral, 2015, p. 151). O corpo, tanto 
na performance/Exus enquanto na Performatividade/Exu, assume o papel 
de lócus de produção de conhecimento e de vida e, por consequência, é pela 
ação que a performance se revigora e se permite manifestar, uma ação que 
parte do eu performer para outro audiência. Para Salgado (2014, p. 86), “O 
corpo é o lugar privilegiado em que a performance se realiza e, para tanto, 
convoca uma audiência em torno da qual o ato é exibido”. 
A performance é intersticial (Lopes, 2010, p. 8), ela não é o performer 
nem a audiência. Ela está no meio, no entre, o performer e a audiência, e o 
performer assume o papel de provocador. Igual a Exu que se localiza exata-
mente entre Olorum e o homem. Logo ambos, a performance e o Exu, pre-
existem ao enunciado performativo, ou seja, como uma ação que se dá no 
corpo a partir de sua expansão entre os diversos gêneros e linguagens artísti-
cos, assim como na literatura, nas ciências sociais, na antropologia e na et-
nologia. Ela joga com o acaso e busca o romper com o distanciamento entre 
artista e público. A performance modifica a relação do artista com o públi-
co. 
Ainda no período do futurismo, Goldberg (2007, p. 20) assinala que a 
performance-arte servia para deslocar a plateia preguiçosa de seu lugar de 
comodismo, onde o objetivo das performances futuristas era fazer com que 
os artistas saíssem de suas zonas de conforto e que o público abrisse mão do 
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lugar de passividade e do eterno estado de inércia intelectual. A participação 
da audiência é algo essencial para a performance, sua existêncianão está 
nem no performer e nem na audiência, está no entre-lugar, na vinculação, 
no compromisso e responsabilidade entre performer e audiência de forma 
interdependente (Salgado, 2014). 
O performer controla, escolhe o que revelar de si, e como parte de si 
pode afetar a audiência; ele gerencia o que deve ou não ser exposto e, mes-
mo que não tenha controle sobre a ação e reação da audiência, o performer 
deve estar aberto a liberar a verdade de si. A performance tem capacidade de 
desvendar e revelar ambos, tanto a verdade da performance quanto da audi-
ência, seja ela verdade verdadeira, ou seja, ela verdade inventada, no pulso 
do momento como um propulsor efêmero. A refletividade e consciência de 
apresentação de si mesmo frente ao outro se dá por uma linha tênue entre o 
“[...] não-eu [e o] não não-eu, [entre a] pessoa [e o] personagem” (Sche-
chner, 1985 apud Salgado, 2014, p. 88). 
Importa destacar que tanto Performatividade/Exu e Performance/Exus 
são a expressão direta do empoderamento, da subversão do subalternizado. 
Ambos têm caráter intervencional, questionando veementemente as regras 
que se dão como estabelecidas, seja no campo social ou das artes, literatura, 
história, entre outros. Dessa maneira, buscam romper com os cânones das 
sociedades e servem como ferramentas que formam sujeitos críticos, para 
superar os recalques produzidos por ideologias que logram a superioridade 
de uma cultura e/ou um povo sobre a outra. 
Richard Schechner, junto a Victor Turner, estruturou conceitos e pro-
cedimentos que auxiliam o investigador da performance a compreender e 
apreender demandas sociais. Ambos se puseram a refletir sobre as experiên-
cias na encruzilhada das artes, antropologia e sociologia, para compreender 
a performance como uma relação intrínseca entre essas instâncias. É inspi-
rado nas pesquisas de Turner sobre ritual que Schechner vai fazer uso da 
proposta de drama social para estruturar seu estudo sobre a performance e 
vai fundar o conceito de comportamento restaurado ou comportamento du-
plamente exercido baseado na tragédia grega (Salgado, 2014), conceito esse 
que para Schechner é primordial na compreensão da performance. Assim, 
para ele, na arte, algo é performance quando é feito para um show ou espe-
táculo de teatro, de dança, de música, ou seja, para ser exibido a alguém. No 
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cotidiano se dá no seu contexto histórico-social, quando há uma dinâmica 
social que a aponta enquanto performance (Schechner, 2003; 2006; 2012). 
Assim sendo, a performance acontece na relação entre arte e vida de forma 
indissociável. 
 Schechner compreende que performances são ações físicas e verbais 
que são preparadas e/ou ensaiadas, que estão sendo exercidas pela segunda 
vez e que de certa forma são importantes na transmissão, transformação 
e/ou manutenção e conhecimentos culturais de determinada sociedade 
(Taylor, 2003; 2013). 
Nessa perspectiva é importante salientar que devido a sua expansão 
enquanto ação, seu caráter multifacetário, interfaces diversas e os conflitos 
em sua complexidade conceitual, a performance tem amplos e diversos 
campos de atuação, sendo então importante trazer ao conhecimento alguns 
de seus aspectos. Primeiro o ser, que está atrelado à existência como uma 
questão e problemática que se funda nas reflexões filosóficas sobre o sujeito. 
Em seguida o fazer, que está relacionado à ação, ao movimento promovido 
pelo sujeito, assim o sujeito é porque se movimenta, é dono da ação. E por 
terceiro, o mostrar fazendo – toda performance é inerente à audição, toda 
performance precisa da audiência por essência e por existência, esse é o fator 
que a liga ao espetáculo, à espetacularização. Ou seja, há entre esses três 
pontos um elo que os torna interdependentes: o sujeito é através da ação, do 
fazer que por sua vez está diretamente conectado ao se mostrar, ser visto fa-
zendo. Esses aspectos apontados são pilares na constituição da performance. 
Com isso, expande-se o conceito de performance para campos diversos, 
ampliando cada vez mais sua inclinação de gênero inter e multidisciplinar. 
Carlson (2009, p. 15) invoca Herbert Blau para assinalar que o fato de 
nossa vida ser baseada em conjuntos de movimentos, comportamentos e 
gestos socialmente estabelecidos possibilita que toda atividade humana pode 
ser considerada performance, e o que diferencia o fazer do performar diz 
respeito à atitude, à ação e não à relação que o teatro traça com a vida. Cor-
roborando com Schechner (2003; 2006), a ação passa a ser ou pode ser con-
siderada como/enquanto performance quando surge nela uma consciência 
do comportamento, assim tudo pode ser estudado, observado enquanto per-
formance, bastando aplicar a essa uma ideia e/ou propósito, onde essa pos-
sibilidade parte mais do observador que do praticante. Porém, no campo 
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conceitual, esse enquanto corresponde potencialmente à performatividade. 
Nesse aspecto a performance atua sobre a égide de um padrão preestabeleci-
do. Performance vira sinônimo de desempenho ou, como aponta Sche-
chner, uma ação desempenhada com êxito e que está relacionado ao outro, 
mostrar-fazendo e o fazer. 
A performance conota a exibição de uma habilidade específica para 
além da qualidade. Está relacionada com a realização e ou repetição de um 
gesto, movimento ou comportamento. As performances são acontecimen-
tos, experiências efêmeras, visto que elas acontecem minimamente na rela-
ção entre dois sujeitos. Tendem a não se repetir devido à relação espaço-
temporal, ação e reação dos sujeitos envolvidos, entre outros fatores. A per-
formance tem em seu cerne a interação e sobre essa o performer não tem 
controle pleno. Uma performance pode ser realizada exatamente igual, po-
rém o fator interação determinará outros acontecimentos como chuva ou 
falta de luz, eventos que estão fora do controle do performer. Como aponta 
Schechner (2003; 2006; 2012), a interatividade é fluida, assim como o ser 
não é permanente. 
 Schechner (2003; 2006) destaca oito situações onde para ele pode 
ocorrer a performance. Primeiro na vida diária, as práticas cotidianas estu-
dadas enquanto performance; segundo nas artes, onde o comportamento é 
ensaiado, treinado com o intuito de ser exibido, a exemplo: espetáculo de 
dança, música, e teatro; terceiro nos esportes e em entretenimentos popula-
res, vinculados a desempenho e resultados; quarto nos negócios, a exibição 
está baseada em exibir qualidade ou estética que conote vantagens para o 
cliente; quinto na tecnologia, que se funda na capacidade de realização com 
o tempo e qualidade de execução; sexto também corporifica desempenho, 
estética e rendimento; sétimo nos rituais, diz respeito ao sagrado e secular; 
oitavo na brincadeira, capacidade de envolvimento, a capacidade de jogar. 
Importa observar que essas situações podem acontecer de formas tanto iso-
ladas quanto simultâneas, tornando imensuráveis as formas de ocorrências. 
Dessa forma, um jogo de futebol pode desenvolver grande plasticidade e ser 
considerado arte, assim como também uma competição culinária ganha as-
pecto esportivo exaltando seu caráter performativo. 
Essas ações cotidianas elevadas à categoria de performance também 
podem ser listadas como pontos de congruência de estudo e investigação en-
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tre as ciências sociais e nos levam a compreender a reflexão sobre a ritualiza-
ção de comportamento cotidiano, ir ao trabalho, ir à escola, almoço em fa-
mília, comemoração de aniversário. A ritualização se consolida através da 
repetição de comportamento, sobre o que, para Schechner (2003; 2006), 
nem sempre há consciência. Com isso, como caminho para compreender-
mos performance, se faz necessária antes a apropriação do que o autor de-
nominou de “[...] comportamento restaurado [...]”(Schechner, 2003, p. 
36), que para ele está presente nas nossas rotinas, hábitos e ritualizações, 
onde o que é considerado novidade e/ou inédito, na verdade, é a recombi-
nação e combinação dos comportamentos restaurados. A performance tam-
bém resulta dessas combinações de comportamentos duplamente executa-
dos. 
Sobre esse aspecto e importância do estudo dos comportamentos para 
a investigação e análise da performance, Carlson (2009) atenua o consenso 
que existe sobre a performance para a sociedade, manutenção e/ou processos 
de transformações culturais: 
Existe um consenso difundido entre os teóricos de performance de que toda 
performance é baseada em modelo, roteiro, ou padrão de ação preexistente. 
Richard Schechner, numa fase bastante útil e sempre citada, chama a per-
formance de ‘comportamento restaurado’. Jhon MacAloon também afirmou 
que ‘não há performance sem performance’. Por outro lado, muito da análi-
se antropológica recente de performance tem enfatizado como ela pode ope-
rar dentro de uma sociedade precisamente para solapar a tradição, a fim de 
propiciar um local para a exploração de estruturas e modelos de comporta-
mento alternativos e novos. A importância da performance dentro de uma 
cultura, se para reforçar as suposições dessa cultura ou para fornecer um lo-
cal possível de suposições alternativas, é um debate em curso, capaz de for-
necer um exemplo particularmente claro da qualidade contestada da análise 
da performance (Carlson, 2009, p. 24-25). 
Nesse aspecto chego à abordagem sobre a performance que, em partes, 
contempla essa pesquisa, o estudo das performances culturais voltado para 
investigação do ritual. Taylor (2013, p. 33) assinala o rompimento da per-
formance com as teorias estruturalistas do sociólogo Émile Durkheim, que 
traz a ideia de comportamento normativo, postulando que os comporta-
mentos e as crenças humanas são pautados pela sua condição social. A auto-
ra aponta antropólogos que contrapõem Durkheim, como Turner, Milton 
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Singer, Erving Goffman e Clifford Geertz, que passam a teorizar e investi-
gar os sujeitos como agentes de seus próprios dramas. 
Schechner (2012) vai fazer uso da teoria de Turner sobre drama social, 
buscando lapidá-la e extrair desta os aspectos universalistas. Enquanto fato-
res constituintes para o estudo da performance cultural na compreensão do 
drama social e do comportamento, Singer (1959), citado por Carlson 
(2009, p. 25), sugere que o conteúdo cultural de uma tradição era transmi-
tido por meios específicos, assim como pelos mensageiros humanos. O es-
tudo do funcionamento de tais meios, em ocasiões particulares, poderia 
prover a antropologia com “[...] uma particularização da estrutura de tradi-
ção complementar à organização social”. E relata a importância dos estudos 
da performance junto à cultura, seja por sua capacidade de transmitir, ar-
mazenar, subverter ou manter as memórias e relações sociais e culturais 
construídas. 
Para Taylor (2003; 2013) a performance funciona como atos de trans-
ferência, transmissão e manutenção do conhecimento, da memória e do 
sentimento de identidade social, sendo ao mesmo tempo ontológica e epis-
temológica, dialogando entre o real e o construído. Ela apresenta uma abor-
dagem pós-colonial para a funcionalidade e investigações sobre as perfor-
mances desenvolvidas nas Américas e enfatiza a importância de identificar 
um termo que contemple as demandas e concepções de vida e cultura dos 
latinos, ratificando assim que a performance tem capacidade de dobrar o 
tempo, moldar identidades, remodelar e adornar o corpo e contar história 
(Schechner, 2003, p. 27). 
Fischer-Lichte (2005) chama atenção para a necessidade de compreen-
der o corpo, a fisicalidade como forma de dar conta da compreensão de per-
formance cultural. 
Não são as ideias, os conceitos, nem os sentidos que devem ser examinados 
em primeiro lugar para dar visibilidade ao caráter performativo da cultura, 
mas sim os corpos físicos particulares, através dos quais e entre os quais se 
produz o espetáculo – o corpo do actor que ao aplicar algumas técnicas e 
práticas, consegue ocupar o espaço e chamar toda a atenção dos espectadores 
sobre si, a sua presença física, assim como o corpo dos espectadores, que res-
pondem de forma particular a uma experiência de presença como esta (Fis-
cher-Lichte, 2005, p. 76). 
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A autora ratifica a importância do corpo físico como elemento de co-
presença na performance cultural destacando alguns pontos que para ela são 
fundamentais para o estudo da cultura como performance. São eles: 
1. Uma performance ocorre pela co-presença física de actores e espec-
tadores, pelo seu encontro e interação. 
2. O que nela acontece é transitório e efêmero. Apesar de tudo, o que 
quer que ocorra durante a sua realização, manifesta-se como hicet 
nunc, e é experienciado como presente de uma forma particular-
mente intensa. 
3. Uma performance não transmite significados predeterminados. Pelo 
contrário. É ela que suscita os significados que surgem durante a sua 
realização. 
4. As performances caracterizam-se pela sua qualidade de “aconteci-
mento”. O modelo específico de experiência que permite é uma 
forma particular de experiência liminar (Fischer-Lichte, 2005, p.73-
74). 
Os pontos levantados por Fischer-Lichte (2005) corroboram com as 
teorias postuladas por Schechner (2003; 2006), que enfatizam a presença fí-
sica como determinante para a realização da performance e suas característi-
cas como o fato das experiências efêmeras, que acontecem no aqui e agora, 
tendo a interação e a relação com o outro-audiência como norteadora dos 
acontecimentos, assim como também o desapego de uma história ou enredo 
que aprisione o performer. A performance não transmite significado prede-
terminado, ela transmite discursos que produzem significados diversos, lo-
go, o performer não precisa representar nenhum personagem. É a fisicalida-
de da performance quem modifica, adorna, molda e emoldura o espaço 
através de sua exposição e deslocamento. 
Diante de toda complexidade que é conceituar performance e perfor-
matividade em suas diferentes e variadas esferas, fica aqui o levantamento de 
alguns pontos de concordância entre os diversos teóricos da performance, 
tanto da área das artes quanto da antropologia e ciências sociais – o que 
demonstra quão ampla e abrangente é sua área de atuação, possibilitando a 
esta pesquisa criar e/ouassinalar encruzilhadas/encruzamentos de epistemes 
para traçar diálogos com os agentes sociais, a fim de compreender as per-
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formances culturais no ritual do candomblé voltado ao orixá Exu, assim 
como também com seus interlocutores. 
Com isso, Performatividade/Exu e Performance/Exus são fenômenos 
que ocorrem de forma indissociável da vida e que apresentam tantas ambi-
guidades que os tornam complexos demais para serem apreendidos em um 
conceito ou em uma disciplina. Suas capacidades de subversão os tornam 
atraentes a todos que veem no universalismo um obstáculo para as diversas 
possibilidades de expressão artística, social e cultural. O sujeito e o corpo 
são lugares importantes por ser por meio deles que os rituais, as ações e os 
comportamentos se dão de forma concreta, efêmera, isolada ou combinada. 
A performance está no intermédio da ação com o agente, espaço/tempo e 
audiência, enquanto a performatividade está nas instâncias operantes que es-
truturam e/ou determinam os aspectos sociocultural, histórico, político e 
econômico das diversas sociedades. 
 
Performance Afro 
 
Com isso, faz-se necessário e é o desejo estudar performance afro, por 
este ser um tema pouco explorado no campo dos estudos da performance 
no Brasil, assim como também, pela familiaridade do autor com as práticas 
afro-brasileiras abordadas neste trabalho. Concordo com Frigerio (2003) 
quando aponta que para a compreensão das dinâmicas performáticas afro e 
afrodiaspóricas faz-se necessário abrir mão de toda visão colonizadora e bus-
car dialogar com uma “[...] perspectiva afrocêntrica” (Frigerio, 2003, p. 51). 
Sendo assim, além da pesquisa bibliográfica, recorro ao que Rufino (2016, 
p. 58) denominou de “exusíaco” e Santos (2014, p. 22) chamou de “bara-
perspectiva”, para chancelar todo conhecimento que reconhece o corpo co-
mo lugar epistemológico de produção de conhecimento científico, todas as 
possibilidades de diálogo e interseccionalidade creditadas ao corpo através 
de Exu/Bara. Apoiamo-nos nos autores, dado que ambos dialogam em nú-
mero e gênero com a proposta metodológica da afrocentricidade, que busca 
desconstruir e/ou reformular o que é produto da colonização, que tem a 
África, o africano e/ou o afrodiaspórico como referência, como lugar, centro 
de produção de conhecimento (Asante, 2009). Nesta investigação, a experi-
ência dos autores, negros afrodiaspóricos, candomblecistas, performers, ar-
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tistas e investigadores de danças afro-brasileiras também são postas à dispo-
sição como ferramenta de acesso à memória corpórea e oral, marcante e im-
portante nas performances afro (Martins, 2003a). 
O estudo das performances afro é necessário também porque o termo 
afro, em questão, está relacionado a uma grande variedade de grupos étni-
cos, culturais e linguísticos distintos, porém de um mesmo continente. O 
que busco nesta reflexão é explanar os aspectos similares entre as diversas 
performances de matriz africana (Frigerio, 2003), assim como refletir sobre 
as “[...] motrizes culturais [...]” apontadas por Ligiéro (2010, p. 107) como 
“[...] um conjunto de dinâmicas culturais utilizadas na diáspora africana pa-
ra recuperar comportamentos ancestrais africanos”, que através dos diversos 
processos, mecanismos e estratégias permitem que essas performances se 
adaptem e resistam às adversidades, às quais foram e são submetidas. Para 
isso, faz-se necessário pensar o corpo negro afrodiaspórico a partir de suas 
referências. Assim tomaremos o terreiro de candomblé e os centros de um-
banda como referências para estruturar um pensamento sobre esse corpo. 
Contudo, isso não será feito por crer que todos os negros professem ou de-
vam professar essas religiões ou forma de fé, mas por acreditar que a ances-
tralidade é um ponto comum à construção e afirmação dessa identidade ne-
gra. 
O corpo negro é uma encruzilhada por natureza e o negro faz dela lu-
gar de produção, seja de estratégia de sobrevivência ou de fluxo e armaze-
namento de conhecimento e de memória. Os mecanismos que permitem 
que a performance afro codifique e assimile diferentes sistemas culturais 
nascem e também têm sentido na encruzilhada, firmando assim, a perfor-
mance afro e as práticas performativas enquanto uma questão ontológica e 
epistêmica. A encruzilhada é lugar tanto de encontro quanto de passagem, é 
dinâmica e sobre ela passam culturas e etnias diversas. Figura como espaço 
de interseção cultural, porém, nada passa por ela sem deixar um pouco de 
si, sem pagar pedágio a Exu o que faz dela lugar de troca, “[...] a cultura ne-
gra é lugar das encruzilhadas” Martins (2013b, p. 70). Zenicola (2014, p. 
91) destaca que o corpo humano para o iorubá é onde se concentram e se 
processam de forma harmoniosa “[...] todas as forças da natureza [...]” o que 
explica, em parte, sua mitologia, uma vez que o corpo é o centro de toda 
energia que existe no mundo. 
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O corpo encruzilhada é reino de Exu. É onde os caminhos se imbri-
cam e se processam, pelo e no corpo encruzilhada que as intermediações en-
tre homens e deuses acontecem com a chancela de seu guardião Exu – o se-
nhor dos caminhos e das encruzilhadas. Lá o movimento se dá ora na estru-
tura circular, ora espiralada ou de forma simultânea. Assim, o corpo encru-
zilhada tem por essência a potencialidade de ser centrífugo e centrípeto, ou 
seja, de dentro para fora e de fora para dentro. Essa é a essência que permeia 
as performances afro. Performances que se inscrevem em uma esfera de difí-
cil compreensão devido a sua complexidade, mas também é essa característi-
ca que garante a longevidade, lhe permitindo transmutar, se adaptar, frutifi-
car e florescer em campos hostis. 
A cultura negra nas Américas é de dupla face, de dupla voz, e expressa, nos 
seus modos constitutivos fundacionais, a disjunção entre o que o sistema so-
cial pressupunha que os sujeitos deviam dizer e fazer e o que, por inúmeras 
práticas realmente diziam e faziam. Nessa operação de equilíbrio assimétri-
co, o deslocamento, a metamorfose e o recobrimento são alguns dos princí-
pios e táticas básicos operadores da formação cultural afro-americana, que o 
estudo das práticas performáticas reiteram e revelam. Nas Américas, as artes, 
ofícios e saberes africanos revestem-se de novos e engenhosos formatos 
(Martins, 2003b, p. 69). 
Essa ambivalência pertencente à cultura negra, onde leio africana, 
apontada por Martins (2003b), são na verdade os dois lados da mesma mo-
eda. Para sobreviver aos sistemas de escravidão, os africanos tiveram de ca-
muflar seus desejos e vontades, o que irá refletir de forma direta nas práticas 
performáticas artístico-culturais e no corpo dos africanos e seus descenden-
tes. Ligiéro (2010) ressalta a importância do corpo para as práticas perfor-
mativas de origem africana, exaltando suas qualidades e assinalando sua atu-
ação efetiva na vida do africano e afrodescendente: 
Nas performancesde origem africana hoje, podemos observar: o corpo é o 
centro de tudo. Ele se move em direções múltiplas, ondula o torso e se deixa 
impregnar pelo ritmo percussivo. A dança que subjuga o corpo nasce de 
dentro para fora e se espalha pelo espaço em sincronia com a música sinco-
pada típica do continente africano. De tão insistente e envolvente, ela faz 
parte tanto do festivo, do religioso, como do cotidiano do povo brasileiro; 
das celebrações católicas aos folguedos e ritos afro, como o candomblé e a 
umbanda (Ligiéro, 2010, p. 131). 
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As práticas performáticas afro apresentam peculiaridades a observar na 
performance e sua origem. Uma das características principais que marca a 
performance em sua origem nos anos 1960 é sua capacidade de ser permea-
da pelo encontro de linguagens artísticas (Carlson, 2009). Assim sendo, as 
artes visuais, dança, música, arquitetura e outras linguagens compunham 
um complexo que vai de encontro ao teatro e aos seus dogmas. Na cultura 
africana esse amálgama de linguagens, que caracteriza a performance nos 
modos ocidentais sempre fez parte do cotidiano de forma indissociável. A 
fala de Frigerio (2003) ao abordar as performances afro-americanas assinala 
que para a performance acontecer é necessário dominar não só um código, 
pois há todo um sistema composto por códigos corporais – gestos, movi-
mentos, formas de andar, se vestir, falar, cantar, contar – que fazem com 
que as práticas sejam dinâmicas. 
O autor aponta seis principais pontos similares entre as performances 
afro-americanas, às quais eu credito também a África por ser matriz dessas 
práticas e aplico o conceito de motrizes culturais cunhado por Ligiéro 
(2010). 
A performance artística afro-americana é caracterizada por ser multidimen-
sional, participativa, onipresente no cotidiano, basicamente conversacional, 
para destacar o estilo individual de cada participante e para sempre cumprir 
claramente umas funções sociais (Ligiéro, 2010, p. 64). 
Primeiro aspecto da performance afro apontado por Frigerio (2003) é 
seu multidimensionalismo, pois as práticas artísticas afro ou de matriz afri-
cana não são construídas com base em uma relação hierarquizada, classifica-
da ou separada uma da outra. Um praticante deve conhecer todo seu siste-
ma prático, cultural e simbólico. Observa-se exemplo disso no candomblé, 
onde o neófito, apontado pelo orixá através do jogo de búzios, passará por 
todas as possíveis funções necessárias – da cozinha ao salão, da faxina no ter-
reiro aos rituais mais complexos – para se tornar um babalorixá. Ele apren-
derá a cozinhar, a costurar, trançar, cantar, dançar, jogar búzios, gerir o es-
paço, liderar e conduzir os rituais. Assim, seu aspecto multidimensional é 
uma das características principais e mais importantes da arte negra, e essas 
características são observadas em manifestações artísticas, religiosas e profa-
nas. 
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Esse potencial também ganha destaque nas escritas de Ligiéro (2010), 
quando o mesmo recorre ao filósofo congolês Busenki. Kia Fu-Kiau, para 
destacar a capacidade multidimensional e multidisciplinar do performer 
afro através de um conjunto de técnicas aplicadas simultaneamente nas per-
formances, ao qual denominou three powerful (poderoso trio): cantar, dan-
çar e batucar. 
Ao considerar a junção das artes corporais às músicas e, sobretudo, acrescido 
do uso do canto como algo simultâneo e percebido como uma unidade den-
tro da performance africana, Fu-Kiau destaca um dispositivo que, sem dúvi-
da, continua sendo característico das performances da diáspora africana nas 
Américas – não é possível existir performance negra africana sem este pode-
roso trio, e o mesmo é aplicável em relação às performances afro-brasileiras 
(Ligiéro, 2010, p. 109). 
Outro aspecto da performance afro que merece o destaque é seu cará-
ter participativo, uma vez, que nela não há uma nítida separação entre o 
público e o performer, sendo essa relação circunstancial. Em sua maioria, 
essas performances constroem jogos que rompem com essa dicotomia (pú-
blico x performers). Desse modo um repentista nordestino, ao tocar seu 
pandeiro, constrói seu repente improvisando com o suposto público, que a 
qualquer momento pode interferir na construção da estrofe ou no show. Ao 
observar um samba de roda, não é possível distinguir sambadores e público, 
já que todos cantam, batem palma, gesticulam e dançam em uma mesma 
vibração. Ligiéro (2010) destaca a vocação de associar de forma concomi-
tante jogo e ritual em uma mesma dinâmica; em suma, as performances 
mesclam esses elementos para refletir e reverberar questões do cotidiano dos 
praticantes. 
Porém, Frigerio (2003) alerta para a profissionalização desses artistas 
que fazem com que essa relação passe a incutir em suas apresentações uma 
perspectiva espetacular característica do Ocidente nas performances afro. 
Estas passam a criar uma separação entre performers e público. Considera-se 
plausível essa preocupação, contudo, minhas vivências com grupos tradicio-
nais ou de pesquisa em cultura popular, me fazem acreditar na necessidade 
de uma abordagem mais aprofundada, visto que a relação com o público é 
uma busca inerente da performance e que as performances afro não fazem 
uso do conceito de quarta parede, tal qual uma apresentação cênica num 
palco tradicional italiano. 
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Observamos que nos grupos profissionais de dança popular e dança 
afro-brasileira de que participo e/ou participei sempre havia um elemento 
ou momento em que os performers rompem essa separação com o público, 
que pode ser mais presente, mas se dilui facilmente. No grupo de samba de 
roda ReconcaRio, performei como boiadeiro – entidade do panteão da um-
banda, que retrata a forma rústica e a vida dura do sertanejo – cuja função 
era puxar as pessoas para dentro da roda e mediar a relação dos brincantes 
buscando intervir na forma de cantar e dançar de todos. Na Companhia 
Folclórica do Rio – UFRJ os espetáculos e performances são interativos, e o 
público tem participação efetiva dançando, cantando ou traçando diálogo 
com os performers. Tudo isso nos faz refletir sobre o fato de que, mesmo no 
palco, essas relações acontecem de forma interdependente e estão associadas 
diretamente com o cotidiano de seus praticantes. 
A importância da conversa entre as linguagens na performance afro 
também é algo que merece ser exaltado. Seja no exemplo do repentista nor-
destino, do jongueiro do sudeste que versa com o tambor, numa roda de 
samba ou na conversa entre os tambores sagrados que invocam os deuses. É 
sabido que essa potencialidade de promover trocas direta entre plateia e per-
former se dá, também, por meio da forma de sua exposição circular. Se Exu 
faz seu tempo (Sodré, 2017) é no círculo que as performances afro o do-
bram. O círculo para a cultura afro é uma das estratégias de acelerar, retro-
ceder ou parar o tempo e nele subverter, mesmo que no imaginário,os pa-
péis sociais e rememorar tempo, se conectando com o ancestral. 
 Outra peculiaridade desses diálogos é que de forma alguma a perfor-
mance afro apaga a personalidade do performer, pelo contrário, afirma 
identidade e promove encontro do sujeito consigo mesmo. Contudo domi-
nar as técnicas corporais e verbais não é o suficiente para realizar uma per-
formance densa como a afro (Frigerio, 2003, p. 59). Para Frigerio (2003), é 
preciso ter personalidade para ser um performer pleno, ter um estilo próprio 
é fundamental para o desenvolvimento da cultura e performance afro. Essa 
é uma das características mais acentuadas no repertório de conhecimento do 
mestre ou líder. Para Ligiéro (2010) este é responsável pela sobrevivência, 
manutenção e difusão das performances afro e afrodiaspórica. O mestre é o 
detentor e guardião dos conhecimentos necessários para a continuidade e 
resistência, seja transmitindo, codificando ou adaptando as informações pa-
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ra torná-las legível às novas gerações. É importante ressaltar que não neces-
sariamente ter o domínio de todo o sistema simbólico credita ao indivíduo 
o lugar de liderança ou maestria único, e que é possível haver vários líderes 
em um mesmo sistema. Contudo é inegável que um bom performer reúne 
em si o domínio de várias qualidades, compreende o sistema simbólico ex-
presso nas manifestações e tem como qualidade maior a capacidade de im-
proviso, além de ser conhecedor das questões sociais que envolvem o gru-
po. 
É no improviso que a criatividade é colocada à prova e é nele que se 
constitui campo fértil na criação, o que possibilita à atividade performática 
se propagar e/ou se ressignificar. Um bom dançarino de kuduro é aquele 
que tem a capacidade de improvisar em cima da batida e das nuances da 
música, tem movimentos próprios, através dos quais expressam e constrói 
sua identidade, sua marca. Da mesma forma que uma passista de samba tem 
e se expressa por meio de seu repertório de movimentos próprios criados pe-
la variação de dinâmica exigida pelo repique e aceleração da bateria. 
 Os movimentos, gestos e comportamentos (jeito de andar, vestir, fa-
lar, se expressar corporalmente para enfatizar a fala) compõem um sistema 
que neste trabalho se denomina como um repertório ancestral. Acreditamos 
na memória corporal deixada pelos nossos ancestrais. Um dos autores deste 
trabalho foi abordado por um aluno de dança pedindo conselhos sobre qual 
atividade seria boa para seu filho de quatro anos que era muito criativo e in-
ventava movimentos. Então, pediu que a criança mostrasse, ela realizou 
uma sequência de movimentos muito similares aos do repertório da capoei-
ra mesmo sem nunca ter visto. Eram saltos, giros e quedas muito complica-
das para serem aprendidas sem um desenvolvimento técnico e progressivo. 
Experiências como essa fazem pensar de onde vêm esses movimentos, esse 
conhecimento, essa inteligência cognitiva e motora se não de uma memória 
corpórea ancestral? 
[...] o corpo em performance é, não apenas, expressão ou representação de 
uma ação, que nos remete simbolicamente a um sentido, mas principalmen-
te local de inscrição de conhecimento, conhecimento este que se grafa no 
gesto, no movimento, na coreografia; nos solfejos da vocalidade, assim como 
nos adereços que performativamente o recobrem. Nesse sentido, o que no 
corpo se repete não se repete apenas como hábito, mas como técnica e pro-
cedimento de inscrição, recriação, transmissão e revisão da memória do co-
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nhecimento, seja este estético, filosófico, metafísico, científico, tecnológico, 
etc. (Martins, 2003a, p. 66). 
O corpo encruzilhada é memória fecunda onde, e por onde, se inscre-
ve e armazena o conhecimento vindo do continente africano. Essa particula-
ridade do corpo negro tem diferentes níveis e formas de ser acessada e é 
através da autonomia, da sagacidade e da personalidade que o performer 
processa e adapta as informações decodificadas para o espaço contemporâ-
neo. Desse modo, a performance afro se faz presente no cotidiano do afri-
cano e afrodescendente sendo de grande relevância social e cultural. Sche-
chner (2003, p. 32) classificou de “[...] comportamento restaurado [...]” a 
potencialidade de repetição, combinação e/ou reconfiguração no tem-
po/espaço. Para o autor “[...] os indivíduos que recebem os créditos por in-
ventar os rituais ou os jogos, normalmente acabam sendo os sintetizadores, 
os decodificadores, os compiladores ou os editores de ações que já foram 
praticadas [...]” e que, “[...] um comportamento pode ser restaurado a partir 
de ‘mim mesmo’ em outro tempo ou estado psicológico [...]” Schechner 
(2003, p. 34). Refletindo o corpo como principal mediador entre o natural 
e o sobrenatural como pensa o iorubano e na perspectiva aqui tratada (Exu-
síaco e baraperspectiva), teremos o corpo como principal portal de acesso às 
memórias ancestrais através da espiritualidade expressa nos comportamen-
tos. 
A onipresença da performance no cotidiano do africano é um tópico 
pontuado por Frigerio (2003) considerado por ele um diferencial que faz 
com que cada indivíduo nessa sociedade domine os códigos necessários para 
integrar as performances: 
Nas culturas onde não existe uma separação rígida entre as formas artísticas, 
onde todo canto implica em música, e esta em dança (que também inclui 
elementos de mímica), onde tampouco existe uma rígida separação entre 
performers e o público e onde não há uma separação muito marcada entre 
situações de representação e da vida cotidiana, não haveríamos de estranhar 
que cada indivíduo seja um performer em potencial, e cada situação da vida 
cotidiana seja a possibilidade de ser uma pequena performance (Frigerio, 
2003, p. 56). 
É de se esperar que as tensões, problemas e questões sociais hão de se 
fazer presente nessas performances, seja na demanda do ponto do jongo, no 
funk brasileiro ou no rap americano, como forma de denunciar os descasos 
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dos governantes com a população menos abastada. Por estar tão inserida no 
cotidiano dos cidadãos, a performance afro também atua a serviço da socie-
dade – assim as performances em sua maioria buscam questionar, subverter 
ou modificar a realidade, baseando-se no cotidiano. A performance afro tem 
em seu cerne o caráter de ser comunitária. Sendo assim, tende a valorizar e 
atuar a serviço do coletivo, a exemplo da puxada de rede no litoral nordesti-
no, as quebradeiras de coco, as cirandas e outras expressões que também 
surgem do trabalho comunitário onde são agregados os seis aspectos levan-
tados por Frigerio (2003). 
A capacidade multidimensional, a participação, a onipresença no coti-
diano, o caráter conversacional, o estilo individual do participante e as fun-
ções sociais que se fazem presentes nas performances afro são parte de um 
complexo de relações e interações que compõem o repertório dos compor-
tamentos e forma de vida do africano e seus descendentes.O que possibilita 
pensar se existe um prazo de validade para as performances afro? Elas são 
verdadeiramente efêmeras? A respeito de sua perenidade recorro a Lévi-
Strauss (1977), quando postula que os mitos não morrem, eles se fragmen-
tam e se modificam para dar origem a outro mito com o mesmo contexto 
narrativo. Assim é a performance afro, a exemplo dos mitos, também se res-
significa e adota outras roupagens, mas não perde sua natureza. Sua capaci-
dade de resistir está associada aos processos de colonização, os quais a África 
e os africanos foram submetidos. Essa relação intrínseca entre a arte e a vida 
na performance diz respeito à forma de vida e à visão de mundo dos africa-
nos e seus descendentes. Esse corpo sincopado que o performer de origem 
africana tem lhe possibilita se envolver em diversos encruzamen-
tos/encruzilhadas sem se perder de sua origem, pois como já dito, a cultura 
africana tem seu potencial na encruzilhada, e são processados no corpo, am-
bos os reinos de Exu, que se unificam, constituindo o uno no universo, um 
universo próprio. 
 
Considerações Finais 
 
Tendo em vista os aspectos observados através das analogias e dos diá-
logos aqui propostos, considera-se que a performance dos Exus promove 
uma atmosfera que enuncia a presença do orixá Exu. Seja através da inges-
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tão de bebida alcoólica e sua possibilidade alucinógena, pelas combinações 
de cores, pela capacidade de comunicação, pela movimentação e gestos exa-
gerados, assim como também pela dinâmica. Exu e Exus se fundem. Por is-
so causam embaraço na cabeça dos fiéis e dos leigos que se perdem na linha 
tênue entre divindade e entidade, restando apenas viver as experiências, sen-
tir a energia e se deixar embriagar, se deixar ser tocado pela energia dos seres 
sobrenaturais. Quanto ao caráter interacional da performance compreende-
se que por mais que o artista esteja treinado para lidar com os eventos que 
possam ocorrer durante sua execução há um momento em que ele é forçado 
a romper com os limites que o separa do público. De forma intencional ou 
não, esses eventos desestruturam e reestruturam a performance cabendo ao 
performer se deixar envolver nas propostas perdendo, parcialmente, o con-
trole sobre as ações e interações. 
Performatividade e performance se unem a Exu e Exus de forma cola-
borativa, sendo ambas mediadoras dos acontecimentos num processo de re-
troalimentação. Junto às perspectivas desenvolvidas, observamos que estão 
mais envolvidas com o acontecimento no tempo e espaço do que com a 
forma, o como, adaptando-se às subjetividades advindas do acontecimento 
do aqui e agora, traçando relação direta com a audiência. Assim, por seu ca-
ráter dinâmico metamórfico, adaptável e relacional são difíceis, senão im-
possíveis, de serem compreendidas em sua totalidade. 
Os argumentos alicerçados nesta pesquisa que pensa Performan-
ce/Exus e Performatividade/Exu de forma complementar às práticas cultu-
rais afro brasileira, expressam-se através de ebós e pontos riscados devotados 
a Exu nos corpos Negros, corpos encruzilhadas. Ambos se processam em 
encontros e desencontros para produzir conhecimento em forma de resis-
tência, frutificando presença, seja ela em performance arte ou em perfor-
mance social. Essa presença transmite ecos ancestrais, sendo Exu o umbigo 
do universo, tal qual o sujeito negro em qualquer sociedade que habita. Exu 
é a natureza em trânsito, é o dinamizador entre os meios (visíveis e invisí-
veis) e todas as formas de vida existentes. Sua performance está em constan-
te transmutação e percorre tanto no mundo tangível, quanto no mundo não 
tangível. Suas características são complexas e seus campos de atuação são ex-
tensos e enigmáticos, sendo essa complexidade que o torna passível de dife-
rentes e variadas interpretações. 
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Quanto à análise das performances afro conclui-se, por meio dos ter-
reiros de candomblé e os corpos encruzilhada, que Exu constitui um para-
digma. O corpo encruzilhada é firmado como possibilidade expressiva de 
criatividade e potencialidade enquanto existência e expressão da fisicalidade. 
É presente nas performances que se fundem e confundem com a vida dos 
sacerdotes/performers, tanto nas práticas performativas culturais e religiosas, 
quanto nas performances artísticas. Os terreiros de candomblé e os centros 
de umbanda firmam-se como solo fértil para produção e difusão de conhe-
cimento. Solo esse que é adubado e dinamizado por Exu e Exus em suas es-
feras física e metafísica que atua de forma efetiva nas relações e interações 
desenvolvidas pelos sacerdotes/performers. Diante desses desdobramentos, 
as performances aqui pautadas adotam hábitos e comportamentos também 
mediados pelo orixá e entidade, a fim de expressar sua identidade e sua ne-
gritude. 
 
Notas
 
1 Ponto cantado para Exu nos centros de umbanda. 
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