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Geografia - Livro 2-139-141

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Agricultura camponesa
Atualmente, o fundamento da agricultura camponesa é o trabalho não assalariado. As relações de trabalho podem se dar de diversas formas: pe-
quenas propriedades, parcerias e arrendamento. E isso não significa que seja um sistema atrasado, extensivo e com pouca produtividade.
Na maior parte dos países do mundo, a agricultura realizada em pequenas propriedades ainda é importante, principalmente na produção ali-
mentícia para o mercado interno. Nesse caso, a própria família cultiva a terra e tem acesso direto  riqueza por ela produzida.
A parceria é uma forma de acordo entre o produtor e o proprietário da terra. Uma família de camponeses trabalha a terra, geralmente pertencente a
um médio proprietário, e, quando chega a época da colheita, a produção é dividida entre este e o produtor Quando a divisão se baseia na metade
da produção para cada parte, dizemos que os trabalhadores são meeiros. No entanto, os percentuais dessa divisão podem variar bastante.
Há ainda a possibilidade de se fazer um arrendamento da terra, que é quando o proprietário não está utilizando toda a extensão de sua propriedade
e decide alugar parte dela para que uma família produza ali o que desejar. A diferença do arrendamento em relação  parceria é que, nesse caso,
o valor a ser pago ao proprietário é acertado anteriormente  plantação, e o pagamento pode ocorrer até mesmo em dinheiro.
Em todos esses casos, pode haver uma grande variação do tipo de técnica utilizada. Contudo, geralmente os pequenos produtores, sejam eles
proprietários ou parceiros, tm grande dificuldade de vender seus produtos a preços justos de acordo com seu trabalho, sobretudo por conta dos
intermediadores. Dessa forma, a lucratividade, de modo geral, não é muito alta nesse ramo da agricultura, o que impossibilita um grande investi-
mento em tecnologia.
Na maior parte dos países centrais, principalmente na Europa, os pequenos proprietários recebem ajuda governamental, que pode vir na forma de
empréstimos a juros especiais ou subsídios propriamente ditos. Assim, é possível que, nesses países, os camponeses tenham melhores condições
socioeconômicas. Ao mesmo tempo, em países periféricos, como os da América Latina, o mais comum é a falta de estímulo ao pequeno produtor rural.
Saiba mais
Sistemas coletivistas
Com a modernização da produção agrícola, os sistemas coletivistas foram perdendo espaço na organização do campo, contudo há alguns casos
que merecem destaque.
A maior parte das experincias desse tipo de sistema nos tempos modernos ocorreu em países socialistas, como a União Soviética e a China. No
caso do primeiro país, houve uma tentativa de criar uma agricultura socialista por meio dos kolkozes, fazendas comunitárias nas quais as famílias
trabalhavam e destinavam parte da produção ao Estado; e dos solvkozes, fazendas estatais, ou seja, os trabalhadores eram empregados do
Estado, como em qualquer outra atividade econômica existente naquele país até a década de 1980.
Israel é um caso interessante por, entre outros fatores, ser um país capitalista que adotou sistemas coletivistas de produção agropecuária em grande
parte de seu território. Amoderna e produtiva agricultura do pas  organizada em comunidades agrcolas, denominadas kibutzim, e outras chamadas
de moshavim (no singular, kibutz e moshav), ambas com diferentes graus de coletivismo.
Atualmente, a maioria dos kibutzim israelenses abriu mão de grande parte dos ideais coletivistas originais, passando a contratar pessoas de fora da
comunidade para realizarem trabalhos menos qualificados e a atuar no mercado internacional de produtos agrícolas e industriais. Contudo, mesmo
assim, continua existindo algum grau de coletivismo, o que permite classificá-los como cooperativas de trabalhadores rurais.
Os moshavim, por sua vez, sempre tiveram um grau de coletivismo menor que os kibutzim. Neles, cada família tem posse de uma parcela específica
da terra, mas a propriedade é estatal Os ganhos são independentes, no entanto também há divisão dos custos de manutenção de infraestruturas
comuns (como arruamentos, galpões e máquinas) entre os membros da comunidade.
Atenção
Um problema do domínio europeu sobre os territórios tropicais foi a aplicação de suas técnicas de cultivo em um
meio natural totalmente diferente. Essas técnicas, desenvolvidas durante centenas de anos (que consistiam em aprender
a selecionar plantas e sementes e compreender os ritmos naturais de clima mais frio, ou temperado, com grande varia-
ção de calor e umidade ao longo das estações), nem sempre eram adequadas aos tipos de solo que se formaram em
ambientes tropicais nem às demais características desse clima, com médias elevadas de temperatura e com uma estação
seca e outra úmida.
Exemplo disso é a prática de revolver o solo com arado, técnica bastante útil para promover sua oxigenação e
bem comum em áreas de climas temperados, mas que deve ser evitada ou executada com muito cuidado em regiões
de climas tropicais. Nessas regiões, é mais recomendado o plantio direto, a associação de culturas ou o sistema
agroflorestal, pois os solos desprotegidos ficaram sujeitos à lixiviação e à erosão, dependendo do gradiente de
declividade do terreno.
Assim, durante muito tempo, o uso de técnicas europeias no cultivo e o manejo inadequado em ambientes tropicais
foram responsáveis por grandes danos ambientais, não apenas pelo desmatamento, mas também pela perda de solos,
como aconteceu em grande parte de onde estava localizada, originalmente, a Mata Atlântica no Brasil, devastada pelo
avanço do café.
GEOGRAFIA Capítulo 4 Geografia Agrária140
Produção e produtividade
Produção e produtividade são conceitos bastante diferentes. O
primeiro termo refere-se ao total produzido, sem considerar o ren-
dimento da atividade produtora e se houve eficincia ou não no
processo produtivo. Já avaliar a produtividade significa relacionar o
total produzido a algum outro elemento, ou seja, mensurar o rendi-
mento da produção. O mais comum na agricultura é a relação entre
o total produzido e a área utilizada. Se um produtor conseguir elevar
a produção sem aumentar a área, significa que, em relação ao fator
área, a produtividade cresceu. Empreendimentos agropecuários que
apresentam alto rendimento em relação  área utilizada são chama-
dos de intensivos, ao contrário dos extensivos, que apresentam
baixa produtividade por área.
Entretanto, outros fatores podem e devem ser considerados, uma vez
que a agricultura é uma atividade que depende de muitos insumos
para continuar sendo praticada.  fundamental, por exemplo, rela-
cionar o total produzido  água consumida e aos fertilizantes e aos
agrotóxicos aplicados na plantação. Também não deixa de ser interes-
sante relacionar a produção  quantidade de energia consumida ou
aos gases de efeito estufa liberados. São diferentes elementos que
mostrarão se a atividade agrícola está sendo mais ou menos eficiente.
Atenção
Insumos agrícolas: recursos para viabilizar ou potencializar a
produção. Podem ser químicos, como fertilizantes e agrotóxicos;
mecânicos, como tratores e máquinas; e biológicos, como adubo
animal e vegetal.
A produção agrícola após a Segunda
Revolução Industrial
A industrialização e as transformações do sistema
capitalista provocaram grandes mudanças no campo. Os
avanços técnicos e científicos proporcionaram o aumento
da produção ao mesmo tempo que reduziram a necessida-
de de mão de obra nas práticas agrárias. Grande parte da
população rural migrou para as cidades e deixou de pro-
duzir seu próprio alimento, passando a comprá lo. Desde
então, o espaço rural foi se submetendo, cada vez mais,
às demandas do espaço urbano-industrial.
A Segunda Revolução Industrial aumentou o núme-
ro de empresas que investem grandes somas de capital
na produção rural e alteram as técnicas e os processos de
produção, estabelecendo sistemas patronais (patrão e
empregado assalariado), intensa mecanização e uso de
variados insumos, com o intuito de maximizar seus lu-
cros.A produção agrícola passou a servir de matéria-prima
para a indústria, por exemplo, na produção de sucos de
laranja, milho e ervilha enlatados, óleo de soja, açúcar e
álcool/etanol (com a cana-de-açúcar), cigarros (tabaco),
têxtil (algodão), lácteos (como manteiga, queijos e leite
processados), carnes variadas e muitos outros gêneros
agropecuários Consolidou se, então, a agroindústria e o
agronegócio, sobretudo em grande parte do campo dos
países com economias desenvolvidas – Estados Unidos,
Canadá, Austrália e alguns países da Europa – em um
primeiro momento, e, posteriormente, expandiu-se para
economias ditas emergentes – como Argentina, Brasil,
México e Indonésia Como resultado, ocorreram a espe
cialização produtiva e a concentração de terras, visíveis
na formação de latifúndios monocultores mecanizados e
de grande volume de produção.
Revolução Verde
O conjunto de mudanças na agricultura que aconteceu
após a Segunda Guerra Mundial, mais especificamente nos
anos 1950, ficou conhecido como Revolução Verde e ado-
tou, nas atividades agrícolas, as inovações das indústrias
química (agrotóxicos e fertilizantes) e mecânica (tratores,
colheitadeiras, sistemas de irrigação) e os avanços em bio-
tecnologia (seleção de sementes).
Ao término da Segunda Guerra Mundial, o modelo já
estava consolidado nos Estados Unidos e passou a ser
implementado em outros países. Esse processo contou
com a iniciativa de empresas e do governo americano, em
conjunto com a ONU, para propor e executar um proje-
to de alteração das técnicas agrárias voltadas aos países
subdesenvolvidos com o intuito de aumentar a produção
e acabar com o risco da fome, que assolava parte da po-
pulação em países da África e da Ásia Vale ressaltar que
se trata do período da Guerra Fria, e os Estados Unidos
temiam que problemas sociais servissem de combustível
para movimentos socialistas.
A então recém-criada ONU manteve em seu escopo
ações para promover a redução da pobreza no mundo.
Portanto, não é de se estranhar seu engajamento em um
projeto de combate à fome, principalmente por meio da
Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO). As
grandes empresas também perceberam o potencial de
expansão para seus negócios nos novos mercados atra-
vés do fornecimento de máquinas, sementes, fertilizantes,
agrotóxicos, sistemas de manejo, gerenciamento, estoca
gem e transporte, entre muitos outros produtos e serviços
associados.
Nos anos 1960, a pesquisa agrícola desenvolvida no
âmbito da Revolução Verde tornou-se efetivamente inter-
nacional, com diversos centros especializados instalados
nos países envolvidos, iniciativa que contou com o financia
mento de grupos como a Fundação Rockefeller, a Fundação
Ford e o do Banco Mundial.
Com todos esses incentivos e investimentos, o mundo
testemunhou um verdadeiro salto na produção de alimen-
tos, em especial com o desenvolvimento de variedades
híbridas de cereais (como trigo, milho e arroz), que, por
serem cruzamentos artificiais, produziram sementes que
forneciam espécies de grande produtividade e resistentes
às pragas. Assim, passaram a ser largamente cultivadas em
países como Índia, Paquistão e China.
Tendo seu início nos países desenvolvidos e se
disseminado nos países subdesenvolvidos, a chamada mo-
dernização agrícola é a principal responsável pelo aumento
do poder das grandes corporações sobre os processos de
produção de alimentos em todo o mundo, assim como pelo
salto produtivo que possibilitou a passagem da população
mundial de dois para sete bilhões de habitantes.
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Revolução
agrícola
dos Tempos
Modernos
(Hidrorrizicultura)
Revolução agrícola
neolíticaPaleolítico
superior
Escala de
população x 20
Revolução
agrícola
da Idade
MédiaCivilizações
hidroagrícolas
(Nilo, Mesopotâmia, Indus)
População humana
total em milhões
6 000
2000 d.C.1000 d.C.3000 a.C.8000 a.C.40000 a.C. 0
500
250
100
50
Fonte: MAZOYER, M.; ROUDART, L. História das agriculturas no mundo: do Neolítico  Crise Contemporânea. FALLUH, C. F. (Trad.). São Paulo: Editora Unesp; Brasília: Nead, 2010. p. 89.
Fig. 4 A progressão da população humana em relação ao desenvolvimento dos sistemas agrários do mundo.
Contudo, durante a década de 1980, esse modelo passou a apresentar limites em seu crescimento em razão da queda
no ritmo de inovações e do aumento dos custos com pesquisa e desenvolvimento, além dos impactos ambientais. Apesar
de seus avanços, a Revolução Verde suscita, até os dias atuais, algumas críticas associadas ao consumo intenso de água,
energia, agrotóxicos e fertilizantes. Outros problemas comuns são o desmatamento, a contaminação do solo e dos recursos
hídricos, o desgaste do solo devido à opção pela monocultura, a geração de gases de efeito estufa e a contaminação de
trabalhadores. Assim, é possível afirmar que há um risco de que a agricultura moderna se torne, em muitos casos, cada
vez menos sustentável e renovável.
Outra questão preocupante é a priorização dos produtos mais lucrativos em detrimento daqueles que, mesmo sendo
socialmente mais relevantes, oferecem mais riscos comerciais e menor retorno financeiro. Atualmente, esse problema fica
evidente na polêmica expansão da produção de biocombustíveis e de soja para ração animal, a qual pode vir a tomar o
lugar da produção de alimentos em diversos países.
Por fim, há a questão da concentração fundiria, bastante favorecida pelo modelo de expansão do agronegócio.
A tendência é que empresas agrícolas se expandam por meio da compra de terras que, anteriormente, pertenciam a
pequenos e médios agricultores. Um processo quase irreversível, uma vez que a modernização da atividade agrícola
exige altos investimentos em insumos agrícolas, os quais, diversas vezes, são inacessíveis ao pequeno produtor.
Como decorrência dessa concentração fundiária, surgem dois grandes problemas: o primeiro consiste na diminuição
da agricultura camponesa, principal produtora de alimentos básicos; e o segundo se encontra no aumento do êxodo
rural em consequência da elevação do desemprego no campo, o que acaba se tornando um vetor de problemas
sociais. Além desse contexto de críticas à Revolução Verde, deve-se considerar a queda no incremento produtivo,
mesmo com a utilização crescente de tais insumos. Entre 1960 e 2000 a taxa de incremento de insumos caiu para
1/5 do que era inicialmente.

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