Buscar

onde nos juntaríamos a equipes de outros consultores para resolver todos os problemas que os clientes pusessem diante de nós. Logo descobri que o s...

onde nos juntaríamos a equipes de outros consultores para resolver todos os problemas que os clientes pusessem diante de nós. Logo descobri que o serviço básico da McKinsey nada tinha de complicado. Por uma astronômica quantia mensal, qualquer empresa pode contratar uma equipe da McKinsey com o objetivo de resolver problemas demasiado espinhosos para serem tratados pelos próprios funcionários da firma. No fim dessa “missão”, como a chamávamos, deveríamos elaborar um relatório muito mais perspicaz do que qualquer coisa que eles mesmos poderiam ter gerado. Enquanto eu preparava slides que sintetizavam recomendações ousadas e radicais para um conglomerado empresarial multibilionário de produtos médicos, ocorreu-me que, na realidade, eu não fazia ideia sobre o que estava falando. Havia na equipe consultores mais antigos que talvez soubessem mais do que eu, mas também havia consultores mais jovens que, recém-saídos da faculdade, com certeza sabiam menos ainda. Então, por que nos contratar a um custo tão exorbitante? Bem, para começar, tínhamos a vantagem de sermos observadores externos imaculados pelas políticas internas das empresas. Tínhamos também um método para solucionar problemas empresariais com base em hipóteses e dados. Provavelmente havia muitas e excelentes razões para que diretores-presidentes de grandes empresas recorressem à McKinsey. Porém, entre elas, acredito, estava o fato de sermos considerados mais inteligentes do que as pessoas que já trabalhavam nessas empresas. Contratar a McKinsey significava contratar os “melhores e mais brilhantes” — como se sermos os mais brilhantes nos tornasse também os melhores. Segundo o relatório “A guerra pelo talento”, as empresas que se destacam são aquelas que promovem agressivamente os funcionários mais talentosos, ao mesmo tempo em que, com a mesma energia, se desfazem daqueles menos aptos. Em tais empresas, enormes disparidades salariais não só se justificam como também são aconselháveis. Por quê? Porque um ambiente competitivo, no qual o vencedor fica com todos os louros, incentiva os mais talentosos a permanecer na empresa e os menos talentosos a buscar outro emprego. Segundo o jornalista Duff McDonald, autor da pesquisa mais completa já realizada sobre a McKinsey, seria mais correto chamar essa filosofia empresarial de “A guerra contra o bom senso”. McDonald observa que as empresas destacadas no relatório original da McKinsey como modelos de estratégia a serem seguidos não se saíram tão bem nos anos que se seguiram à publicação do relatório. Outro jornalista, Malcolm Gladwell, também criticou o relatório da McKinsey, observando que a empresa de energia Enron foi o símbolo máximo da “mentalidade do talento” na administração de empresas defendida pela McKinsey. E, como se sabe, a história da Enron não teve final feliz. Classificada pela revista Fortune como a empresa mais inovadora dos Estados Unidos por seis anos consecutivos, a Enron já foi a maior empresa de energia do mundo. No entanto, no fim de 2001, quando a companhia decretou falência, já era evidente que seus imensos lucros decorriam de fraudes contábeis generalizadas e sistemáticas. Com o colapso da Enron, milhares de funcionários que nada tinham a ver com os desmandos da companhia perderam o emprego, o seguro-saúde e a aposentadoria. Na época, a falência da Enron foi a maior na história dos Estados Unidos. Não se pode pôr a culpa pelo ocaso da Enron no excesso de QI nem na falta de garra. Entretanto, Gladwell mostra, de forma convincente, que o fato de a Enron exigir que seus funcionários provassem ser mais inteligentes do que todo mundo inadvertidamente contribuiu para uma cultura narcisista, com um excesso de trabalhadores presunçosos que, levados por uma profunda sensação de insegurança, se exibiam o tempo todo. Era uma cultura que incentivava o desempenho a curto prazo e desencorajava o aprendizado e o crescimento a longo prazo. A mesma ideia transparece no documentário sobre a Enron lançado após a falência que recebeu um título bastante apropriado: Enron: Os mais espertos da sala. Durante o apogeu da empresa, seu CEO foi Jeff Skilling, um brilhante e arrogante ex-consultor da McKinsey. Skilling criou para a Enron um sistema de avaliação anual de desempenho, no qual os funcionários recebiam notas e os 15% com pontuações mais baixas eram sumariamente demitidos. Em outras palavras: qualquer que fosse o nível absoluto de desempenho de um funcionário, ele era demitido se sua pontuação fosse inferior à de outros colegas. Dentro da empresa, essa prática era conhecida como “rank and yank”, ou seja, “avaliar e demitir”. Skilling considerava esse sistema uma das mais importantes estratégias da empresa. No fim das contas, porém, o sistema pode ter contribuído para um ambiente de trabalho que premiava a fraude e desencorajava a integridade. Ser talentoso é ruim? Será que todos nós temos o mesmo nível de talento? A resposta para ambas as perguntas é não. É claro que é ótimo conseguir aprender qualquer habilidade com rapidez, e, queiramos ou não, algumas pessoas são melhores nisso do que outras. Nesse caso, então, por que é ruim dar preferência a pessoas “naturalmente talentosas” em detrimento de pessoas “esforçadas”? Qual é o lado ruim de programas de televisão como America’s Got Talent, The X Factor e Child Genius? Por que não devemos separar crianças de sete ou oito anos em dois grupos: o das poucas que têm “dotes naturais e talento” e o das muitas que não os têm? Aliás, que mal há em chamar um show de talentos de “show de talentos”? Na minha opinião, a principal razão pela qual a valorização do talento pode ser nociva é simples: ao focarmos apenas no talento, nós arriscamos deixar tudo o mais fora do nosso campo de visão. Sem querer, passamos a mensagem de que esses outros fatores — como a garra — são menos importantes.

Essa pergunta também está no material:

Grit: O Poder da Paixão e da Perseverança
314 pág.

Recrutamento e Seleção Universidade Salgado de OliveiraUniversidade Salgado de Oliveira

Respostas

User badge image

Ed Verified user icon

Você tem que criar uma nova pergunta.

0
Dislike0

✏️ Responder

SetasNegritoItálicoSublinhadoTachadoCitaçãoCódigoLista numeradaLista com marcadoresSubscritoSobrescritoDiminuir recuoAumentar recuoCor da fonteCor de fundoAlinhamentoLimparInserir linkImagemFórmula

Para escrever sua resposta aqui, entre ou crie uma conta

User badge image

Mais conteúdos dessa disciplina