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cadernos
da oficina social
Rio de Janeiro
2002
9
cadernos
da oficina social
O Planejamento de Projetos Sociais:
dicas, técnicas e metodologias
2
Centro de Tecnologia, Trabalho e Cidadania – Oficina Social
Centro de Tecnologia, Bloco I - 2000 MT-05 COPPE/UFRJ
Ilha do Fundão – 21945-970 Rio de Janeiro-RJ
Telefax: (21) 2562-8074
www.coepbrasil.org.br
oficinasocial@coppetec.coppe.ufrj.br
P 712 O planejamento de projetos sociais : dicas, técnicas e metodologias.—
Rio de Janeiro : Oficina Social, Centro de Tecnologia, Trabalho e
Cidadania, 2002.
58 p.; 19 cm. — (Cadernos da Oficina Social ; 9. ISSN 1518-4242).
Inclui bibliografias.
1. Planejamento social – projetos. I. Série.
 CDU 361.301
Edição
Oficina Social
Coordenação
André Spitz, Gleyse Peiter
Equipe técnica
Amélia Medeiros, Sarita Berson
Adaptação do projeto gráfico para edição e capa
Ednéa Pinheiro da Silva
Apoio
COEP
Foto capa
J.R. Ripper (arquivo Furnas)
A reprodução dos artigos é permitida desde que citada a fonte.
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Mensagem da Direção
Há 09 anos atrás, em 1993, em meio ao maior exemplo de mobilização da sociedade frente ao
quadro inaceitável de pobreza vigente no país, temas como ética, cidadania, ciência,
tecnologia, políticas públicas passaram a ser amplamente debatidos.
Nesse cenário, um grupo de trabalho reunido no Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ
discutia o papel das empresas em relação à questão da fome e da miséria. O sociólogo
Herbert de Souza – Betinho - e o prof. Luiz Pinguelli Rosa, numa ação incomum, convocaram
dirigentes de organizações para um encontro tendo como foco a inserção dessas entidades em
um grande projeto nacional de promoção do desenvolvimento social.
A reunião, realizada no Fórum de Ciência e Cultura, em maio de 1993, contou com a
participação de 30 dirigentes que, reconhecendo a importância do movimento e assumindo a
responsabilidade dessas empresas frente à problemática social no país, formaram o COEP -
Comitê de Entidades no Combate à Fome e pela Vida.
Ao longo desses anos, o COEP foi crescendo e se consolidando como uma grande Rede Nacional
de Mobilização Social que incentiva e articula ações e projetos inovadores em benefício de
população excluída. Atualmente, são 38 associadas em âmbito nacional e 24 Comitês Estaduais,
reunindo mais de 700 organizações, públicas e privadas, trabalhando por uma causa comum –
a conquista da cidadania para todos brasileiros.
Comemorando essa trajetória de sucesso, realizamos, em maio de 2002, o Encontro Nacional
do COEP, reunindo representantes de entidades associadas de todo o país para um importante
processo de capacitação no campo do desenvolvimento humano e social, através de palestras
e do Curso “Elaboração de Projetos Sociais”, ministrado por equipe do Laboratório de
Tecnologia e Desenvolvimento Social – LTDS/ COPPE/UFRJ.
Elaboração de Projetos Sociais: dicas, técnicas e metodologias, volume 9 da série Cadernos
da Oficina Social, traz o material didático apresentado no Curso. Ampliando o universo de
pessoas com acesso a esse conhecimento, esperamos estar contribuindo para a melhoria das
práticas na área social.
Queremos registrar nossos agradecimentos especiais a Luís Henrique Abegão, Arminda Eugênia
Marques Campos e Maurício César Delamaro, autores desse material, e ao professor Roberto
Bartholo - do Programa de Engenharia de Produção da COPPE/UFRJ e coordenador do LTDS -
que, com sua experiência, enriquece a Página Livre, com o texto “a democracia possível”.
Nosso reconhecimento, ainda, a todos, pessoas e instituições, que nesses 09 anos de
atuação do COEP, acreditando na existência de caminhos para a construção de um país com
menos desigualdades sociais, muito contribuíram para o sucesso do COEP - um projeto
coletivo de combate à fome e pela vida.
André Spitz
Sumário
Página Livre , 7
Apresentação , 11
O Planejamento de Projetos Sociais
dicas, técnicas e metodologias , 13
1 Projeto: planejamento para solucionar problemas , 17
1.1 Etapas do planejamento , 19
2 Sobre metodologias participativas , 21
2.1 Metaplan , 22
2.2 ZOPP, 23
3 Identificação do problema , 27
4 Proposição de soluções , 29
4.1 Análise de viabilidade , 31
4.2 Seleção de alternativas , 31
5 A dimensão lógica do projeto , 33
5.1 Indicadores de desempenho , 36
6 A dimensão comunicativa do projeto , 41
6.1 Título do projeto , 41
6.2 Sumário da proposta , 42
6.3 Apresentação da entidade , 42
6.4 Justificativa , 42
6.5 Público-alvo , 43
6.6 Objetivos e metas , 43
6.7 Metodologia , 43
6
6.8 Plano de ação, 44
6.9 Orçamento, 44
6.10 Sistema de acompanhamento e avaliação, 44
6.11 Perspectivas futuras, 44
6.12 Anexos, 45
7 Um exemplo de proposta técnica , 47
Referências , 57
7
Página Livre
A Democracia Possível
Roberto Bartholo*
Seja realista. Queira o impossível.
(muros de 1968)
Hoje, talvez mais que nunca, alguns setores da esquerda vêm sucumbindo a uma lógica esterilizante: a
adesão à proposição falsa de que a política é a arte do possível, como se ela fosse uma verdade firme e
inabalável. Creio identificar nessa adesão duas faces contemporâneas daquilo que, já em 1574, em obra de
publicação póstuma, o filósofo francês Etienne de La Boétie (1530 – 1565) chamou de Discurso da Servidão
Voluntária. A primeira é a adaptação oportunista à correlação de forças vigentes, que parece tornar vã
qualquer alternativa às sociedades capitalistas de mercado da modernidade globalizada contemporânea. A
segunda é a renúncia a fazer política. E seu corolário: ser um consumidor/espectador dos frutos da ação
politicamente eficiente de outros.
Quem ainda acha que vale a pena o velho significado da palavra esquerda precisa romper com essa pers-
pectiva. E reafirmar, com Marta Harnecker, que a política é a arte de tornar possível o impossível. E
isso implica servir de parteiro das potencialidades latentes nas situações cotidianas, ser disponível para as
surpresas e os riscos da descolonização de nossos futuros. Significa, em suma, recuperar a capacidade de con-
frontação com nossos destinos, sem nos iludirmos em tomar os poderes dos poderosos de hoje como
uma fatalidade que nos determina o modo de vida. Dito de modo mais simples: é fazer possível amanhã
o que hoje parece impossível.
Mas nosso percurso tem como ponto de partida um reconhecimento penoso. O século XXI nos lança
em meio a um mundo violento, que nos confronta com imensos desafios para os quais estamos
despreparados. Nossa crise é profunda, tanto teórica como prática. E arriscamos nos resignar a querer
apenas administrar tão bem quanto possível nossa crise de cada dia, apoiados nas aparentes certezas dos instru-
Docente do Programa de Engenharia de Produção – COPPE/UFRJ e coordenador do LTDS
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mentos formais da mega-estrutura de poder em gestação no mundo globalizado, que M. Hardt e A. Negri
designaram como o novo Império emergente.
É fundamental superar o esquecimento de que tornar possível o impossível é também recuperar nossa capa-
cidade de encontro, diálogo e solidariedade. E dela fazer força vital transformadora, em meio a uma
realidade social onde impera a fragmentação e se disseminam do modo mais irrestrito os valores do
individualismo possessivo e consumista. É preciso ter a ousadia de crer e agir no amplo terreno do alegal
(do que não é objeto de regulamentação institucionalizada, mas que não é por isso um mal), nos libertando
das algemas mentais que fixam nossas crenças e condutas na ilusão cínica de que porque algo está sendo assim,
ele deve continuar assim sendo. Diplomatas e gestores movem-se nos limites da realidade efetiva. Mas os
verdadeiros políticos devem conhecê-la, para explorar as condições de sua ultrapassagem no aprendizado
da vida e no compromisso com a vida.
Hoje vivemos uma época de vertiginosa concentração e centralização de capitais. A globalização neoliberal
assegura aos grandes grupos capitalistas a liberdade de se implantarem onde quiserem, para produzir o
que quiserem, aprovisionando-se e vendendo onde quiserem, e suportando o mínimo de limitaçõesquanto
aos direitos trabalhistas e as convenções e priorizações sociais. O projeto social do neoliberalismo implica
a máxima fragmentação da sociedade, não apenas dos trabalhadores sindicalizados. A sociedade fragmentada
resulta da produção social de um somatório de minorias, mantidas em condição de isolamento e relações
conflitivas com seus contextos, impossibilitadas de exercer qualquer nova hegemonia, num processo
onde povos inteiros são desenraizados da idéia de uma causa nacional. Prevalece nesse quadro geral uma
política de desorientação social, que atua no sentido de: i. atomizar a sociedade em grupos com escassa
capacidade de poder, ii. dirigir a ação de tais grupos para fins que lhes sejam exclusivos e parciais, e iii.
anular-lhes a capacidade para celebrar pactos.
Como afirma Noam Chomsky, os neoliberais impõem uma única condição para aceitarem o jogo demo-
crático: que possam domesticar o rebanho perplexo controlando os meios para fabricar o consenso. Transformando a
política num mercado de idéias, o mercado livre não leva, como querem fazer crer seus apologistas
contemporâneos, à opinião livre. A mais eficaz e duradoura doutrinação política é a que se realiza nas
experiências de segunda mão disseminadas pelos meios de comunicação de massa, onde um consumismo
perverso emergiu como um dos pilares da domesticação neoliberal da condição humana.
Nos anos 20 do século passado houve uma verdadeira revolução na identidade cultural dos Estados
Unidos da América. A emergência aparentemente irresistível do consumismo introduziu uma mudança
radical nos fundamentos psicossociais da nação americana. A ação combinada de propaganda e crédito
ao consumidor possibilitou efetivar com sucesso a transformação do supérfluo em necessidade. A siste-
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mática confusão entre desejo e necessidade, instrumentalizada pelo marketing, revelou-se desde então um
poderoso dispositivo de integração social. O mais poderoso dispositivo da fragmentada sociedade do espetá-
culo, descrita com acuidade profética nos idos de 1968 por Guy Debord e os situacionistas de Nanterre,
uma sociedade onde a publicidade e persuasão mercadológica nos instruem o que cremos querer, e
transformam as campanhas eleitorais em ocasião de lançamento de produtos especiais, as imagens de
candidaturas a serem consumidas.
Na fabricação do consenso na sociedade fragmentada a indústria cultural é o elemento decisivo, uma
situação que vem a ser potencializada ao extremo no mundo da Internet. Contrapor-se às estruturas espeta-
culares, mediáticas e virtuais, de fabricação do consenso requer uma atitude de confrontação contracultural.
Não se trata de um fechamento ao mundo ou uma atitude reacionária e regressista. Trata-se de radicalizar
uma atitude de inclusão. Trata-se nas condições específicas brasileiras de sermos herdeiros do modernis-
mo de 22, atualizando para os desafios do novo século sua proposta fundamental: “[...] nenhuma fórmula
para a contemporânea expressão do mundo. Ver com os olhos livres”. (Oswald de Andrade, Manifesto da
Poesia Pau Brasil).
A confrontação crítica que nos desafia, como apontam Michael Hardt e Antonio Negri, se dá dentro do
Império. Trata-se de afirmar uma atitude dissidente, que não se exclui dos novos horizontes abertos pela
globalização contemporânea, mas que os transfigura. Essa é certamente uma atitude que, como diz Noam
Chomsky, só logra efetivar quem não fica simplesmente agarrado ao televisor. E isso implica: ousarmos o
compromisso pessoal com as experiências de primeira mão e o sentido da vida. Ousarmos dar primazia na
condição humana às relações que Martin Buber, em livro notável publicado em 1921, definiu como do
tipo Eu –Tu.
Na relação Eu – Tu se dá a vida dialógica e interpessoal. Na relação Eu – Isso, o eu é um sujeito que se
defronta com um objeto (de conhecimento, de requisição utilitária, de controle). Para Buber, ser um Nós
é reconhecer que a responsabilidade pelo outro é a face ética do diálogo. Somente os que são capazes de dizer
um ao outro: tu, esses podem dizer um com o outro: nós. E tornar a democracia possível é enraizar a política
nas relações Eu – Tu, e na experiência dos limites que os vínculos de convivência afirmam.
Referências
BARTHOLO, Roberto. Presença palavra. Rio de Janeiro: Garamond, 2001.
BOÉTIE, Etienne de La. Discurso da servidão voluntária. São Paulo: Brasiliense, 1987.
BUBER, Martin. Eu e tu. São Paulo: Moraes, 1977.
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CHOMSKY, Noam. Ilusiones necesarias: control del pensamiento en las sociedades democráticas. Madri:
Ediciones Libertarias/Prodhufi, 1992.
DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.
HARNECKER, Marta. Tornar possível o impossível: a esquerda no limiar do século XXI. São Paulo: Paz e
Terra, 2000.
NEGRI, Antonio; HARDT, Michael. Império. São Paulo: Record, 2001.
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Apresentação
Com o volume 9 da série Cadernos da Oficina Social “O Planejamento de
Projetos Sociais: dicas, técnicas e metodologias”, a Oficina Social dá conti-
nuidade ao processo de capacitação que vem desenvolvendo, com o com-
promisso de incentivar a geração e a qualificação de práticas voltadas para
a melhoria das condições de vida das comunidades de baixa renda.
A publicação faz parte do material didático utilizado no Curso “Elabora-
ção de Projetos Sociais”, realizado em maio de 2002, no Rio de Janeiro, por
ocasião do Encontro Nacional do COEP. O Curso ministrado por equipe
do Laboratório de Tecnologia de Desenvolvimento Social – LTDS;
COPPE/UFRJ, tendo como público representantes de associadas do COEP
de todo o território nacional, teve como principais objetivos:
- aprimorar as práticas sociais implementadas no âmbito da rede do COEP
e por cada associada em particular;
- fortalecer a cultura da responsabilidade social e da ação cidadã voluntá-
ria nas diversas instituições
- ampliar a gama de ações desenvolvidas pelas associadas.
Neste volume são contemplados os elementos mais importantes na for-
mulação de um projeto na área social, assim como algumas das técnicas e
metodologias utilizadas em sua estruturação. Integrando teoria e prática, é
apresentado um caso fictício, exemplificando a construção de uma pro-
posta de projeto.
Os autores destacam a questão da participação popular no processo de
desenvolvimento do projeto, desde sua elaboração até a etapa de avaliação.
Aliando o compromisso ético à dimensão técnica, busca-se resultados mais
efetivos de modo que as ações sejam realmente transformadoras das con-
dições sociais.

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