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O Conto da Aia
O romance O Conto da Aia, publicado em 1985, é considerado o romance mais celebrado da escritora canadense Margaret Atwood. Margaret nasceu em 18 de novembro de 1939 na cidade de Ottawa, Canadá, começou a escrever aos seis anos de idade e aos dezesseis anos já decidira tornar-se escritora profissional. Graduou-se em 1961 na Universidade de Toronto em Artes e Inglês, mas também estudou filosofia e francês. Tornou-se Mestra pela Radcliffe College de Harvard em 1962, lecionou língua e literatura inglesas na Universidade de British Columbia em 1965.
A obra da qual nos referimos, desde que foi lançada, nunca deixou de ser publicada, vendeu milhões de cópias no mundo inteiro e foi traduzida em diversas línguas. Recebeu o Prêmio Arthur C. Clarke Award em 1987 e foi nomeado ao Nebula Award em 1986 e ao Prometheus Award. Foi adaptado como filme, série e até ópera. The Handmaid’s Tale, foi um dos fatores que corroborou para a ascensão da autora ao mais respeitado e conceituado nível do cenário literário contemporâneo da América do Norte. 
Para continuarmos a inserção na obra, se faz necessário entender o contexto histórico do processo de luta pelos direitos das mulheres da época. A chamada segunda onda do feminismo surgiu com o intuito de criticar a função da mulher e seu lugar na sociedade patriarcal. Teve início na década de 1960, e confirmou e expandiu os debates trazidos pela primeira onda, entre os temas abordados estavam o aborto, o papel da mulher na sociedade e a falta de liberdade sexual.
Com isso, a obra, tornou-se um símbolo da literatura feminista, ainda que esse não tenha sido o desejo da autora, esse fato é bastante compreensível considerando que obras escritas durante a segunda onda do feminismo levantaram questões relevantes para a luta feminista da época. A obra também é conhecida por estimular debates enérgicos dentro e fora da academia. No entanto, Margaret não considera a obra como uma distopia feminista.
Para além destes fatos, consideramos importante citar que, pouco antes da criação dessa obra, o mundo ocidental se deparava com uma das situações mais chocantes da época a Revolução Iraniana, em 1979, em que o país passou de um Estado considerado relativamente moderno para uma República Islâmica Teocrática sob o comando do aiatolá Ruhollah Khomeini, considerado um líder religioso. Todos os cidadãos sofreram conseqüências dessa mudança, mas em especial a realidade das mulheres do Irã se tornou muito mais difícil, as liberdades foram muito reduzidas. Conseqüentemente, podemos confirmar que Atwood, criou em sua distopia uma mesma revolução teocrática, porém cristã, no ocidente, especificamente dentro dos limites do que seria os Estados Unidos da América. 
Mediante a exposição de tais fatos, iniciaremos a análise da obra a partir de seu gênero, O Conto da Aia é classificado como uma obra de ficção científica, especificamente concernente ao gênero da distopia. Durante o texto, é apontado que a ficção científica parte de uma mistura da previsibilidade com a subjetividade da ciência contemporânea. A combinação desses dois fatores abre espaço para a imaginação literária, que vislumbra a possibilidade do futuro a partir das características do presente.
O gênero distópico se dedica à imaginar uma sociedade falha, geralmente localizada em um futuro próximo, que vive sob algum tipo de opressão seja ela governamental, tecnológica ou religiosa, derivada das aflições trazidas pelas mudanças sociais, avanços tecnológicos descontrolados, ou até mesmo de catástrofes naturais ou provocadas pelo próprio homem. 
Seguindo a linha de raciocínio de obras distópicas da época, podemos analisar que até 1985, as obras mais conhecidas dessa categoria como 1984 de George Orwell e Admirável mundo novo de Aldous Huxley eram obras que narravam a os fatos de uma perspectiva masculina, em que os personagens principais eram homens, e a perspectiva feminina não existia. O romance realiza sua função distópica de imaginar futuros possíveis a partir de uma visão crítica da sociedade, de uma perspectiva inteiramente feminina.
The Handmaid’s Tale conta a história da República de Gilead, um Estado totalitário implantado por fundamentalistas cristãos de extrema direita, que após ataques que levaram às mortes do presidente e dos membros do congresso norte-americano, efetuaram um golpe que revogou a Constituição dos Estados Unidos, com isso grande parte dos direitos dos cidadãos foram eliminados. 
Uma sociedade que, em conseqüência de diversas epidemias graves, desastres ecológicos e acidentes nucleares, teve parte da população dizimada e boa parte dos sobreviventes ficou estéril, fato este que causou uma grave queda na taxa de natalidade. A história é contada pela narrativa específica de Offred, ela é a principal fonte de informação do romance, sua ótica rege o conto.
 A principal preocupação do novo governo é a reversão de sua baixa taxa de natalidade. Dessa forma, os fundamentalistas implantaram políticas radicais para incentivo à elevação dessas taxas. A sociedade então, torna-se dividida e classificada, as mulheres separadas em castas, sendo elas, de forma hierárquica, as Tias, as Esposas, as Marthas, as Econoesposas, as Aias e as Não-Mulheres. Nessa sociedade, tudo é pensado e organizado para que as mulheres realizem suas respectivas funções, sua rotina, dieta, vestimentas e comportamentos de forma controlada. Caso as regras de conduta não sejam obedecidas, as mesmas estão sujeitas à punições severas, das quais, iremos abordar no decorrer da presente resenha.
Cada casta exerce uma função específica, Offred faz parte da casta das Aias, ou seja, mulheres consideradas férteis. Sua única função é gerar filhos saudáveis, que serão confiscados pelas famílias da elite do regime teocrático, formados por casais estéreis. O nome dado a essas mulheres, remete diretamente ao episódio bíblico em que, Raquel, não sendo capaz de gerar filhos para Jacó, entrega a ele sua aia para que ele a fecunde. Deste modo, as Aias são designadas a um dos Comandantes e sua esposa, titulares do poder em Gilead, e têm como obrigação gerar filhos saudáveis para a sociedade por meio de uma cerimônia, realizada no seu dia fértil, onde a aia se deita ao colo da esposa e segura suas mãos enquanto o marido se relaciona sexualmente com ela, sem sua vontade.
As cores também são usadas como objeto de separação entre as mulheres em Gilead, fato este que tornava o sentimento de inveja constante entre as mesmas. As Aias vestiam vermelho, a cor da luxuria e paixão, muito embora elas não façam nada daquilo por opção, são obrigadas a cumprir esse papel. As Marthas usavam a cor verde, a cor das empregadas domésticas, assim como as Esposas usavam azul, apenas as esposas ricas, pois as esposas pobres, as chamadas Econoesposas usavam as três cores, vermelho, azul e verde, pois essas cumpriam as três funções. 
É importante salientar que nenhuma dessas mulheres é livre, nem mesmo as Esposas, que supostamente têm alguns privilégios, também estavam submetidas à seus maridos, e passavam freqüentemente por situações de violência e humilhação, até mesmo a cerimônia de reprodução já é um fato humilhante para as Esposas, tendo em vista que são obrigadas a segurar a mão das Aias no momento em que são “fecundadas” pelos maridos. 
A desigualdade fica clara perante a divisão social estabelecida pelo alto comando da República de Gilead, a divisão por castas com funções e privilégios específicos para homens e mulheres, favorece o controle da mesma forma em que poucos detêm o poder, com isso, a injustiça prevalece não só na forma como são divididos, mas também pela forma como as categorias são tratadas.
As semelhanças entre a vida real e o romance é um dos fatores que corroboram para a fama dessa história que sempre foi cenário para discussões abrangentes desde publicada. Desse modo, temos como justificativa principal para a classificação da obra no referido gênero, a presença de elementos essenciais como o poder totalitário e suas conseqüências, que são amplamente expostasdurante a obra. 
Diante de todos os aspectos negativos intrínsecos nas histórias distópicas, se faz importante lembrar que, apesar de ser considerada uma obra de ficção, muitos aspectos da obra são inspirados em situações reais. Desse modo, fica evidente que as narrativas distópicas não se constituem apenas com uma visão futurista, mas também nos faz refletir sobre atos passados assim como repensar atos do presente.
Posto isso, podemos intensificar a discussão da representatividade feminina nessa obra, por ser contada por uma mulher, o assunto descrito pela personagem principal é a situação em que as mulheres se encontram após essa revolução, elas perderam o direito de trabalhar, de estudar, o direito à própria identidade, perderam os poderes políticos, perderam sua independência e autonomia, elas passaram a ser propriedades de seus maridos. Isso somente sendo possível caso essas mulheres tivessem maridos, e caso antes da revolução elas tivessem relações tidas com ilegítimas de acordo com o que a teocracia considerava como relacionamentos homossexuais, se tivesse se relacionado com homens divorciados, se fossem divorciadas ou mães solteiras, elas não seriam mais consideradas dignas de serem esposas, sendo assim encaminhadas para as tarefas domésticas, se houvesse indício de fertilidade elas se tornariam Aias.
A categoria das esposas perdura o princípio antigo de que a função da mulher está ligada diretamente à sua relação com o homem. Dessa forma, as mulheres são carregadas pelo estigma cultural de que uma esposa deve servir ao seu marido, sendo uma mulher submissa, ficando em casa e se relacionando apenas com mulheres da mesma categoria social. E como descrito ao papel da Aia, a mulher ainda sofre pressão social da obrigatoriedade de ser mãe. Em O conto de Aia, a mulher só em valor real caso possa ser mãe. As que não podem ter filhos perdem até seu direito de se assumir como mulher e são caracterizadas literalmente como Não-Mulheres.
Sendo assim, as Aias são descaracterizadas como mulheres e como seres humanos, esse sentimento de perda de subjetividade e individualidade para se tornar apenas um objeto reprodutor, é expresso na narração de Offred em sua função como Aia. “Somos úteros de duas pernas, apenas isso [...]” (ATWOOD, 2017, p 165).
Todo o sistema de Gilead é feito para que as mulheres odeiem umas às outras, desconfiem umas das outras, do mesmo modo EM que tudo é pensado para que elas não criem conexões umas com as outras, com certeza um fator importante para que o Estado mantenha o controle absoluto, e evitar possíveis revoltas. Diante disso, é importante destacar que, dentro da obra, a presença masculina não é a única a assegurar a estrutura patriarcal, mas também é conservada por algumas personagens femininas.
A perda gradual dos direitos e a divisão de mulheres em castas não gerou um sentimento de revolta nem resultou em sororidade entre elas, ao contrário disso, surgiu um sentimento de disputa e rivalidade entre as mulheres, como permeia no mundo real. 
A partir desse ponto, podemos iniciar a análise da problematização da obra, a história escrita por Atwood evidencia o sufocamento do feminismo e as tentativas de resistência por parte da protagonista, contra as políticas opressoras do Estado.
O romance ganhou, em 2017, um novo fôlego com a adaptação para série de televisão. A obra ganhou grande notoriedade enquanto Donald Trump presidiu os EUA, trazendo a tona ansiedades e inquietações para a sociedade americana. 
Temas dessa ficção que ainda são relevantes nos dias atuais, como opressão feminina e o fundamentalismo cristão na política, sobretudo entende-se que a distopia apresentada por Atwood não é apenas uma ficção, ainda ocorre em nossa sociedade. Reforça-se o alerta sobre a fragilidade das conquistas femininas que sempre podem ser retiradas das mulheres se não se mantiverem em vigília, sempre firme em suas lutas por direitos. Pois um dos principais motivos do sistema patriarcal prevalecer é o fato de as mulheres não estarem, como um todo, unidas contra ele.
Todavia, a narrativa de Offred não é o único componente marcante do livro, a obra trás em sua segunda parte um epílogo no qual a narrativa de Offred é na verdade uma recomposição de várias fitas gravadas pela mesma após seu resgate. Nomeada de Notas Históricas sobre o Conto da Aia, a segunda parte se passa em 2195, em um simpósio sobre estudos Gileadeanos, na Universidade de Denay Nunavit, onde o responsável pela reconstituição das gravações, Professor Piexoto age de forma irônica e nos faz repensar nossa própria leitura da obra.
Em uma palestra sobre o trabalho historiográfico com gravações em fitas cassetes que Offred havia deixado, Pieixoto nomeia seu trabalho como “O conto da serva”. O acadêmico coletou, organizou, interpretou e apresentou os relatos de Offred, mostra seu caráter extremamente sexista ao objetificar completamente a presidente do simpósio:
“Obrigado. Tenho certeza que todos nós tivemos grande prazer em apreciar nossa encantadora truta do Ártico ontem à noite no jantar, e agora estamos tendo grande prazer em apreciar nossa igualmente encantadora presidente do Ártico. Emprego aqui a palavra “apreciar” em dois sentidos distintos, excluindo, é claro, o terceiro, obsoleto.” (Risos.) (ATWOOD, 2017, p. 353)
A partir de então fica claro – não só pela “piada” feita pelo professor, mas também pelo fato de a plateia ter rido – que o caráter sexista e patriarcal das sociedades de antes e durante Gilead permanece na sociedade pós-Gileadeana. Pieixoto não mostra preocupação em tratar a violência perpetrada pelo regime gileadiano como, de fato, uma violência, não há, para Pieixoto, um cuidado em observar e entender a dor e a violência vividas por uma mulher como tais, como dor e violência de fato.
Contudo, o posicionamento de Pieixoto tenta nos levar ao questionamento sobre a veracidade dos fatos expostos na história de Offred, visto que toda a narração da primeira parte do livro é, na prática, uma remontagem feita pelo professor, não é possível ter certeza de que a mesma não tenha sida alterada por ele. A presente dúvida é também acentuada pela própria narradora quando fala: “Eu sabia que este último eles tinham inventado, sabia que estava errado, e que tinham excluído partes também, mas não havia nenhuma maneira de verificar.” (ATWOOD, 2017, p.109), insinuando que um discurso bíblico havia sido alterado pelo Estado.
Eventualmente, percebemos que a linguagem é encarada pela personagem como uma forma de humanização, desse modo podemos observar que Offred se utiliza de sua subversão para gravar as fitas após sua fuga, uma forma de manter seu direito à se expressar mais uma vez e manter sua subjetividade. Ironicamente, quem dá voz à Offred no mundo acadêmico são dois homens, que propositalmente mostram desdenho não levam tão à sério a crueldade da era Gileadeana. 
A trama narrada por Atwood conta experiências reais, vividas. Sua ficção nos comunica sobre o mundo histórico. Nesse ponto, é imprescindível mencionar que a autora estabeleceu uma regra enquanto escrevia o livro, na qual todos os fatos da obra tinham que ter um antecedente histórico real. Segundo Atwood, com isso, ela foi capaz de combinar eventos históricos únicos de maneiras plausíveis, as referências estão presentes nas vestes, cores, cerimônias, não obstante de outros elementos essenciais para o sucesso dessa distopia. 
De início, mencionamos as referências da separação por cor realizada em Gilead, a autora disse em entrevista que “Organizar as pessoas de acordo com o que elas vestem é uma vocação humana muito antiga. Remonta ao primeiro código legal conhecido, o Código de Hamurabi, que afirmava que apenas damas aristocratas tinham permissão para usar véu”. Em 1978, Margaret Atwood viajou ao Afeganistão, onde precisou usar um xador, e diz que naquele momento o Afeganistão não impunha obrigatoriedade de uso à todas, mas o fizeram mais tarde. Ainda em entrevista, a autora explica que a cor atribuída à serva (vermelho) foi usada pelos prisioneiros de guerra no Canadá,por aparecer facilmente diante da neve, assim como está representado na icnografia cristã através do simbolismo em que a Virgem Maria usava azul, enquanto Maria Madalena usava apenas a cor vermelha.
Do mesmo modo, as referências aparecem de uma forma intensa nas cerimônias da trama, entre elas, uma para punir inimigos políticos ou movimentos destrutivos em relação ao sistema, o ritual é chamado na história de “particicution”, junção das palavras “participation” e “execution”. Nessa cerimônia, as mulheres formam um círculo em volta do acusado e o executam simultaneamente com violência e as próprias mãos. Segundo Atwood, o ritual foi inspirado nas histórias dionisíacas da Grécia.
Sobre a natalidade, a autora menciona que em algumas culturas não é preciso criar leis sobre tal assunto, mas em outras, necessita-se de opressão para obter resultados. Adolf Hitler e Nicolae Ceausescu foram alguns dos ditadores que freqüentemente determinavam os termos de fertilidade passíveis de punição, caso não fossem obedecidos. Outro fato histórico que fez parte das inspirações de Margaret sobre a natalidade foi em 1976 na Argentina, após uma junta militar assumir o poder, cerca de 500 crianças e recém-nascidos foram tidas como desaparecidas e na verdade, haviam sido “adotadas” pelos casais de militares e policiais. 
Uma das referências comportamentais do livro advém da história de colonização dos Estados Unidos da América, no século XVII, puritanos migraram para o interior do país, inclusive para o estado da Nova Inglaterra, onde se passa a história desse livro. Os puritanos eram uma vertente do protestantismo, eram radicais e tinham uma estrutura patriarcal, submetiam as mulheres à autoridade dos maridos e suprimiam boa parte dos direitos e independência delas. É importante lembrar que os puritanos também participaram de um triste episódio histórico chamado As Bruxas de Salem, em 1693 em Massachusetts, no qual ocorreram acusações de bruxaria, em sua maioria mulheres que não se encaixavam nos padrões puritanos de comportamento adequado para uma mulher além de acreditarem que as mulheres eram pecadoras inerentes. Esse movimento matou vinte pessoas e condenou cerca de duzentas. 
Por fim, sobre as inspirações, Margaret Atwood menciona os movimentos de resistência, em especial os que ocorreram no período da Segunda Guerra Mundial, como parte da pesquisa realizada para composição da história. A autora possuía um amigo que era membro da Resistência Francesa que saltou de pára-quedas atrás das linhas inimigas para ajudar aviadores britânicos a fugir da França. Ela também cita o encontro com membros poloneses holandeses de movimentos de resistência como fontes para criação de parte de sua obra.
A familiaridade dessa ficção com a nossa realidade é possível pela existência de diversos componentes extratextuais na leitura, porém a autora os apresenta em uma disposição diferente da que conhecemos, relacionando esses fatos com aspectos da realidade como a violência de gênero, a homofobia, o patriarcado, a escravidão, misoginia e racismo, possibilitando novas vias de discussão sobre determinados assuntos.
É perceptível também no decorrer da obra, assim como em muitas realidades das sociedades que os direitos das mulheres geralmente são os primeiros a serem comprometidos diante de crises ou mudanças de forma de governo. Sua obra é, assim, uma reflexão em forma narrativa sobre a condição e a experiência humana no tempo – em vários tempos –, sobretudo no que diz respeito às mulheres. A obra instigante e contagiante desperta medo, revolta para o mundo feminino, escrita no século anterior, porém completamente coerente com a cultura atual, a obra mostra quão profunda está fincada a raiz do patriarcado, “O Conto da Aia” se apresenta como uma lição sobre sororidade e sobre os perigos de sua ausência, palavra tão usada na ultima década.
A problematização desse conto é então retratar e reforçar a reflexão sobre até que ponto estamos perpetuando uma cultura que prega o patriarcado, que silencia mulheres, que as julgam, objetificam, as comparam e as fazem inimigas de si mesmas. Uma cultura de desvalorização e apropriação do sexo feminino, onde o machismo e o autoritarismo colocam em risco seus direitos. 
O livro O Conto da Aia se tornou tão popular não por acaso, ele conta uma narrativa atraente e em diversos momentos cumpre aquilo que lhe foi proposto, tornando-se uma história assustadora, não só pelos fatos narrados, e sim por ser uma narrativa tão atual, fazendo total sentido no século XXI. As mulheres ainda sofrem os efeitos de uma sociedade machista e patriarcal muito inserida tanto no Brasil como em outros países por uma sociedade muitas vezes pautada na religião, moral e bons costumes, o que torna a obra de Margaret Atwood, um livro atemporal.

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