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Semiótica no Design: Repertório e Comunicação

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SEMIÓTICA APLICADA AO 
DESIGN 
AULA 2 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prof. Suzie Nascimento 
 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
Anteriormente, expliquei que este conteúdo não pretende ser exaustivo 
na teoria, mas sim apresentar alguns conceitos estudados em Semiótica que 
podem ajudá-lo a produzir artefatos, produtos e serviços mais significativos. 
Nesta etapa, quero convencê-lo de que a questão do repertório, seu e do 
cliente, é muito importante. Mas quero também tranquilizá-lo antecipando que 
alguns conhecimentos requerem prática, profissional e de vida. Você verá que é 
possível aumentar seu repertório de experiências por meio da Arte, assim como 
você pode permitir que pessoas tenham experiências novas por meio das coisas 
que você criará como designer. Para isso, precisa investir nos significados. 
Vamos lá? 
CONTEXTUALIZANDO 
Quando um músico ou artista deseja apresentar seu repertório, ele 
escolhe uma série de exemplares daquilo que sabe fazer. Quando um aluno vai 
fazer uma redação, busca em seu repertório de leituras argumentos que possam 
ser utilizados, almejando receber uma boa nota. Da mesma forma, o designer é 
refém do próprio repertório quando se vê desafiado em um novo trabalho. Quem 
tem pouco repertório acaba tendo que correr atrás do prejuízo. Cada atividade 
exige um repertório específico, por isso o encontro entre profissionais de 
diferentes áreas é tão rico, justamente porque permite criar maneiras de 
significar, permitindo uma intersemiose. 
Se liga 
Na definição de Santaella, utilizar linguagens distintas, formando com isso 
uma unidade coesa, é fazer “intersemiose” (Ramos, 2008, p. 32). 
 
Histórias e casos 
O movimento artístico brasileiro chamado Tropicália foi uma experiência 
com repertórios diferentes. Na ocasião, vários artistas se empenharam em 
romper as barreiras entre o que era considerado erudito e o que era considerado 
expressão popular. Assim, poetas concretos e compositores baianos produziram 
uma expressão artística única. 
 
 
3 
Santaella, ao estudar e escrever sobre a Tropicália, enfatizou que aquela 
era uma expressão artística inovadora, consistente, produto do encontro entre 
correntes distintas. Isso só foi possível porque cada uma daquelas correntes, 
notadamente uma popular, vinda da Bahia, e uma erudita, vinda da Arte 
Concreta tipicamente paulistana, possuía repertórios qualificados. Para 
complementar o raciocínio de Santaella, trago agora exemplos do meu próprio 
repertório de memórias. Quem foi jovem nos anos 80 lembrará das bandas 
roqueiras nascidas em Brasília, que misturavam o português bem falado a um 
humor tão ousado que hoje faria corar. Letras longas, quase sem refrão, que 
contavam verdadeiras histórias, muitas delas trágicas, outras tragicômicas. 
Aquela expressão artística, de grande apelo popular, não seria possível se seus 
criadores não tivessem o respaldo de um bom acervo de livros em casa e um 
vasto repertório de leitura. 
Saiba mais 
Quer saber mais sobre os aspectos semióticos do movimento Tropicália? 
Leia o capítulo “O hibridismo semiótico da Tropicália”, em: RAMOS, F. B. 
Tropicália: gêneros, identidades, repertórios e linguagens. 
Do ponto de vista da Semiótica, o repertório de quem produz é apenas 
uma parte do problema. Lembra que mencionei na etapa anterior que, para 
Nietzsche, Arte é prazer comunicado? Pois bem, um bom repertório precisa 
garantir a comunicabilidade. Isso quer dizer que o designer precisa se ocupar 
também com o repertório do outro, daquele a quem ele deseja oferecer seu 
produto. Agora, o maior desafio, sem dúvida, é desempenhar o papel de criador 
de signos, ou seja, inventar novas maneiras de comunicação. Você verá, nesta 
etapa, que uma das tarefas do designer é aumentar o repertório do cliente e, 
ainda assim, garantir uma boa comunicação. 
TEMA 1 – O REPERTÓRIO DO EMISSOR 
Para os fins práticos deste estudo, proponho uma analogia. Suponha que 
você tem uma caixinha onde guarda suas ferramentas de trabalho. Se elas são 
suas, fazem parte do seu acervo. Mas se você tem uma maneira particular de 
produzir alguma coisa com elas, então elas estão no seu repertório. No meu 
caso, a prática como professora para cursos de Design me levou a ter um 
pequeno repertório de filmes exemplares para o uso da Semiótica. Com isso, 
 
 
4 
quero dizer que já os assisti tantas vezes, escrevi e dei aulas sobre eles, que 
posso dizer com segurança que fazem parte do meu repertório de professora, 
mesmo que eu não tenha um grande acervo de filmes. Boa parte do 
conhecimento acumulado pode ser considerado acervo. Quando você toma 
posse deles e os usa na sua prática, eles incrementam o seu repertório. A 
infinidade de informações que você consome nas redes sociais e na internet, se 
chegam a se fixar na sua memória, podem ser acervo. Mas, convenhamos, a 
maioria é simplesmente descartável. Então, por favor, não confunda informação 
de internet com repertório. 
Quando um indivíduo inicia sua formação profissional, o esperado é que 
ele seja pobre de repertório, pois não tem conhecimento nem experiência. Com 
o tempo, os estudos vão se tornando mais complexos e o volume de coisas 
vistas e lidas aumenta. Mas o que realmente faz diferença no repertório individual 
são as experiências: sucessos e fracassos. Nietzsche, em uma de suas reflexões 
sobre comunicação, argumentou que nós, humanos, somos mais eficientes na 
comunicação porque somos fisicamente frágeis. A tese é a de que indivíduos 
que conseguem o que querem à força não têm por que aprender a negociar. Se 
isso é fato, então explica por que os fracassos aumentam nosso repertório. 
Quando não sabemos fazer alguma coisa, temos de tentar de diversas maneiras, 
pesquisar, pedir ajuda. No processo, aumentamos nosso repertório. Então, 
sugiro que, caso você esteja começando, pense nas suas dificuldades como um 
processo de aumento de repertório. 
Nesta parte do nosso estudo, o principal é compreender o papel do 
emissor, ou seja, daquele que precisa de repertório para emitir uma mensagem. 
 
 
 
5 
Figura 1 – Meninos conversando por meio de brinquedo 
 
Crédito: pio3/Shutterstock. 
Mensagem, emissor e receptor são termos comuns para quem estuda 
comunicação. Na Figura 1, o menino da direita é o emissor, o da esquerda é o 
receptor e a mensagem é o que passaria de um ao outro pelo fio que une as 
duas partes do brinquedo. Você poderá estar se perguntando o que isso tem a 
ver com Design de moda, interiores, gráfico, animação e assim por diante. E eu 
te respondo: lembra que o artista, para nós, é um inventor de signos, e que Arte 
é a comunicação prazerosa? Então, por dedução, quem inventa signos 
comunica e por isso pode ser considerado um emissor. Trocando em miúdos, 
sempre que um designer cria, reinventa ou manipula signos, ele está emitindo 
uma mensagem. Você já sabe que essas mensagens se materializam por meio 
de substituições, sejam elas gestos, desenhos, materiais, língua, sons ou 
cheiros. 
Se liga 
Inventar signos é uma atividade artística. 
Seja qual for a sua área de atuação, certamente você espera se 
comunicar de maneira eficaz com seu potencial cliente. Você quer que ele 
entenda a sua mensagem. Toda mensagem que faz uso de convenções tem 
 
 
6 
mais chances de ser compreendida, porque segue leis que todos conhecem. 
Mas, para não correr o risco de se tornar irrelevante, você precisa ser aquele 
que melhor conhece a convenção e sabe utilizá-la de modo criativo. Pense na 
dificuldade que é fazer uma comunicação inovadora para datas tradicionais 
como Natal, Dia das Crianças, das mães, dos namorados. A sensação é a de 
que tudo já foi dito. 
Mas observe comigo a Figura 2. Trata-se de um cartão de Boas Festas 
que se apoia basicamente na convenção das cores e do pinheiro, que ficou 
convencionado como um símbolo das festividades. As felicitações de Natal e 
Ano Novo, que aparecem em inglês, são quase redundantes,de tão objetivo que 
é o cartão. A inovação ficou por conta da maneira como são representados os 
pinheiros. O cérebro do observador tem de deduzir que são cortes e que a 
sequência de cortes está representando um pinheiro. Como dizia Kant, esse tipo 
de jogo, entre imaginação e entendimento, é muito prazeroso. 
Figura 2 – Cartão natalino em três cores 
 
Crédito: Riseness/Shutterstock. 
Se você acompanhou o raciocínio, concluirá que um bom emissor, em 
termos de Design, sabe explorar criativamente as convenções, sabe fazer as 
substituições mais eficientes e, principalmente, sabe quando deixar uma parte 
do trabalho para a mente do receptor. Ou seja, há elementos da mensagem que 
devem ser apenas sugeridos. Uma boa analogia você encontra naqueles jogos 
de adivinhação/mímica nos quais uma pessoa fica fazendo gestos e um grupo 
de espectadores tem que adivinhar o nome da coisa imitada, que pode ser um 
filme, ator, brincadeira ou música. 
 
 
 
7 
Figura 3 – Moça fazendo jogo de adivinhação 
 
Crédito: Ground Picture/Shutterstock. 
Com isso, quero dizer que, para ser um emissor de sucesso, você precisa 
ir além da fala e escrita corretas, dos artefatos irrepreensivelmente úteis e 
ecológicos. Nas mensagens significativas, quantidade de signos e adequação 
ética não são sinônimos de qualidade. A chave é fazer a mente do observador 
trabalhar com prazer enquanto decifra um enigma. Ninguém será um bom 
emissor se não tiver um repertório qualificado e criatividade para utilizá-lo de 
modo inovador. Steven Shainberg e Wes Anderson, diretores que citei na etapa 
anterior, não produziriam filmes tão intrigantes se não fossem possuidores de 
um repertório de signos extraordinário e não estivessem dispostos a arriscar. 
Por isso, é tão desafiador para um jovem iniciante ultrapassar o uso 
ordinário dos signos que, de tão utilizados, já se tornaram velhos e pouco 
atrativos. O erro mais comum, conforme mencionei em etapa anterior, é 
exagerar, repetir em demasia, tornar-se óbvio. Quase como um vendedor que 
exagera nos argumentos para compensar um produto de qualidade 
questionável. Tive a oportunidade de ver alunos recorrendo ao mesmo 
estratagema, ou seja, tentar defender com argumentos um projeto 
conceitualmente fraco. Não funciona. 
 
 
8 
Penso que, para quem está começando, há duas possibilidades: aprender 
com os melhores na sua área e fazer uma imersão em si mesmo. Não creio que 
seja preciso escolher uma ou outra, e esse é o assunto do próximo tópico. 
TEMA 2 – CONHECE-TE A TI MESMO 
O famoso templo de Apolo, em Delfos, traz esta enigmática inscrição: 
conhece-te a ti mesmo. Sócrates, famoso pensador grego, também ficou 
conhecido por instigar seus interlocutores a fazerem questionamentos internos 
a fim de conhecerem a si mesmos. 
E como é que alguém poderia conhecer a si mesmo? Ou ainda, qual o 
interesse disso para uma disciplina que se propõe a explorar a Semiótica de 
maneira prática? A primeira pergunta é mais difícil de responder porque não há 
muito acordo sobre o que é, e se existe, esse “si mesmo” realmente. Os 
psicólogos vêm debatendo o “eu” há algum tempo, e este estudo não tem 
ambição de resolver essa questão em definitivo. Em compensação, na etapa 
anterior, já apresentei uma dica importante sobre o porquê isso importa na 
prática do Design. Qualquer pessoa pode compreender um pouco mais do seu 
próprio eu por meio de experiências com objetos, com poesia, música e cinema 
(Nascimento, 2014a, p. 113). Nós nos experimentamos, conhecemos nossas 
sensações e reações, interagindo com as coisas. Quantas vezes você já se 
apaixonou pelo herói ou heroína de uma série, e quantas vezes já teve ímpetos 
de matar o vilão? Assim, de certa maneira, é somente na experiência com o que 
está fora de nós que podemos conhecer a nós mesmos. Você pode deduzir disso 
que o filtro que utiliza para escolher aquilo que ouve, assiste ou lê determinará 
quais as sensações interiores você conhecerá. 
Um ator que precisa interpretar um assassino não tem que assassinar 
ninguém para fazê-lo bem. Ele precisa conhecer o sentimento, a emoção. Por 
isso dependerá de que alguém, antes dele, tenha colocado em Arte aqueles 
sentimentos, do contrário não poderá experimentá-los. Para isso, ele precisará 
dos livros, da música, e das artes representacionais. Um bom exemplo você 
encontra nos quadros de Caravaggio (1571-1610). Diz-se que o pintor italiano 
do século 16 tinha predileção por cenas violentas, a maioria retirada dos relatos 
bíblicos. Essa violência o observador constata nas cores, nas marcas do pincel, 
nas expressões dos personagens. Caravaggio ambicionou representar aquelas 
emoções fortes e, ao fazê-lo, disponibilizou-as para todos nós. 
 
 
9 
Figura 4 – Salomé com a cabeça de São João Batista 
 
Crédito: National Gallery/PD-CC. 
Se fosse solicitado a um designer que criasse um artefato em analogia ao 
quadro de Caravaggio, ele teria que encontrar meios para expressar essa 
mesma emoção. Melhor dizendo, teria que encontrar meios para que seu cliente 
experimentasse aquelas emoções no seu produto. Para isso teria de utilizar as 
formas, os materiais e as cores (Nascimento, 2014a). 
É um erro grosseiro achar que experimentar sensações por meio da Arte 
pode induzir pessoas a fazerem coisas que elas não fariam. O que a Arte 
permite, e isso é bom, é que todos nós nos conheçamos, aprendamos a lidar 
com as emoções, e isso sem consequências sociais graves. Através da Arte 
podemos sentir ódio, e aprender a lidar com ele. Podemos nos frustrar, e 
aprender a lidar com isso. Quem gosta de filmes de terror, ou brinquedos que 
causam medo, terá muito mais repertório para esse tipo de sensação do que eu, 
que não subiria em uma montanha-russa nem sob tortura. Igualmente, quem 
gosta de narrativas romanceadas, com o tempo armazenará infinitos signos para 
o que é amar, ser amado, perder o amor e assim por diante. Quem gosta de 
futebol, no Brasil, desde pequeno aprende a lidar com a frustração, aprende que 
o mundo não é justo e que não deve levar as coisas tão a sério. Aprender isso 
na realidade da vida seria muito mais traumático. Esses são apenas alguns 
exemplos de como as coisas nos dão a oportunidade de conhecer nossas 
próprias emoções. 
 
 
10 
Veja que significativa é a Figura 5. Trata-se de uma imagem muito bem 
construída do ponto de vista da Semiótica. Ela exige um repertório específico 
para ser produzida e compreendida. Quem a vê deve conhecer o artefato, deve 
reconhecer onde ele está e saber para que serve. Somente assim decifrará a 
narrativa. De posse desse repertório, o espectador conclui que houve um jogo e 
que o atleta perdeu — o jogo e o controle emocional — descontando sua ira na 
raquete. O observador poderá ainda ser empático ao jogador ou recriminá-lo. 
Todas essas emoções são possíveis por meio de uma simples foto significativa. 
Figura 5 – Fotografia de raquete de tênis quebrada 
 
Crédito: Elkhophoto/Shutterstock. 
Vistos dessa maneira, os produtos criados por designers precisam, muitas 
vezes, ser como essa raquete, o lugar para onde o cliente irá dirigir suas 
emoções inconsequentemente. É por causa desse mecanismo que existem os 
caçadores de tendência, que são aqueles que observam as escolhas de compras 
das pessoas e deduzem, a partir delas, certos sentimentos e sensações que 
servem de indícios do futuro (Nascimento, 2014a). Nas nossas ações de compra, 
em geral, acontece um duplo movimento: conhecemos a nós mesmos e nos 
revelamos. 
 
 
11 
Como designer, você terá mais dificuldade em produzir um artefato 
significativo para alguém que está carente de amor, se não conhece essa 
emoção. Isso vale para segurança, otimismo, frustração, vazio, alegria. Enfim, o 
ser humano tem infinitas sensações e emoções que ele pode experimentar por 
meio dos artefatos e serviços que você irá produzir. Isso quer dizer que, como 
responsável por emitiro discurso, você precisa estar bem abastecido de 
recursos. Deve conhecer muitas sensações e emoções, e saber como substituí-
las por signos. Aprender com os artistas a entrar, de maneira muito real, em cada 
afeto. Ainda me lembro da tristeza que eu senti ao ler a letra de Cobaias de Deus, 
no encarte que acompanhava o CD Burguesia. Soube, naquele momento, que o 
poeta Cazuza estava morrendo. Aquela foi uma emoção real para mim, muito 
embora eu não tenha estado perto da morte. Com Tempestade, que o Legião 
Urbana lançou pouco tempo antes da morte de Renato Russo, soube, pelas 
letras, que também ele estava morrendo. Foram dois poetas que me mostraram 
o horror de ver a própria vida acabar antes da hora. 
Agora, muito embora você possa adquirir parte desse repertório por meio 
da Arte como aconteceu comigo, a prática mostra que é melhor, sempre que 
possível, ter experiências não mediadas, ou seja, mais concretas. Digo isso 
porque as gerações atuais podem substituir boa parte das suas relações 
pessoais por outras, virtuais. Isso muda o tipo de experiência. Experiências 
virtuais têm seu valor, mas elas nos protegem, nos deixam dentro de uma bolha. 
Como dizem as mães, é preciso descer para brincar no parquinho, ainda que 
haja o risco de ralar os joelhos. 
Figura 6 – Crianças brincando de rolimã 
 
Crédito: FamVeld/Shutterstock. 
 
 
12 
Mas fique atento para este detalhe: um artista, hoje, pode pensar a sua 
Arte como produto de subjetividade, ou seja, mera expressão de si mesmo. Não 
é isso que proponho quando sugiro que aprendamos com os artistas. Como 
designers, é preciso haver comunicação. O seu papel seria produzir artefatos e 
produtos que ecoem as sensações e desejos de outras pessoas. Nesse sentido, 
o Design é um reflexo da cultura e do grupo social no qual está inserido 
(Nascimento, 2014a). Ele não tem autonomia para determinar o destino daquilo 
que produz e, portanto, sua obra será sempre inacabada. 
TEMA 3 – UMA OBRA INACABADA À ESPERA DA SUA SIGNIFICAÇÃO 
Há muitos anos, tive a oportunidade de ler o clássico O Espírito das 
Roupas: a Moda no Século Dezenove, de Gilda de Mello e Souza, publicado em 
1987. Na época, eu era estudante de moda e me senti impactada com a maneira 
consistente com a qual a autora argumentava que havia, sim, arte nas roupas. 
Um costureiro, escreveu ela, trabalha tal qual qualquer artista, quando está 
fechado em seu ateliê: ele tem de respeitar o destino, a vocação da matéria. 
Para isso, utilizará volume, linha, ritmo e cor. Um trabalho extremamente técnico 
e familiar ao designer. Para o nosso tema, o relevante é a maneira como Gilda 
de Mello e Souza descreveu as roupas como uma obra sempre inacabada, à 
espera da sua significação. Segundo esse conceito, a roupa só alcançaria a sua 
verdadeira identidade quando houvesse, dentro dela, um corpo vivo. Por isso, 
seria uma obra que o artista confia a alguém, para que ele a complete 
(Nascimento, 2014a). 
Você verá, em etapas posteriores, que a Semiótica Peirceana faz uma 
leitura análoga, à medida que prescreve que o signo significa alguma coisa para 
alguém, ou seja, há um interlocutor ao qual cabe interpretar o signo, sem o qual 
ele não existirá. Nesse sentido, a obra do designer também será confiada a 
alguém, inacabada. Disso decorre que o caráter significativo de um artefato ou 
produto estará sempre em aberto, sujeito ao inesperado e à surpresa. Nunca me 
esqueço do senhor Wilson, do filme Náufrago. Quem projetou a bola não o fez 
pensando em humanizá-la, mas foi esse o seu destino. 
Dica 
O diretor Robert Zemeckis, ao produzir Náufrago (2000), utilizou atributos 
humanos para fazer com que o espectador criasse um vínculo afetivo com 
 
 
13 
aquela bola. Lembra dos comentários, da etapa anterior, sobre os atributos da 
pedra e da água? No filme, bastou a bola ter o rascunho aproximado de um rosto, 
e um capim que parecia cabelo. O restante foi impulsionado pela solidão e pelo 
desespero do náufrago. A ideia repercutiu tanto que, em 2022, o artefato foi 
leiloado por mais de R$ 300 mil. Voltarei ao exemplo de Náufrago várias vezes. 
Seria uma boa ideia você assistir. 
 
Se liga 
Em que pese todos os seus esforços, quem irá confirmar se o seu produto 
tem, ou não, algum significado, é o interpretante, aquele para quem ele adquire 
significado. 
Na etapa anterior, mencionei que no livro do Gênesis, Moisés explica para 
os hebreus quem era Deus por meio dos atributos da pedra, assim como 
Zemeckis faz com que o espectador desenvolva afetividade por uma bola, 
reconhecendo nela atributos humanos, por semelhança. Portanto, introduzir 
certos atributos nos artefatos ou produtos é uma maneira de levar o observador, 
ou cliente, à relação afetiva que se espera. No exemplo que eu capturei do livro 
de Gilda de Mello e Souza, o costureiro provavelmente introduziu no seu vestido 
atributos que seriam atrativos para um cliente específico, que ele manteve em 
mente durante sua criação. Quase como se o vestido tivesse de dizer, por si 
mesmo, para que, ou para quem, ele havia sido criado. Novamente, não há como 
ter controle dessa relação, o que há são tentativas. 
A expectativa de controle sobre a reação dos clientes ao seu produto faz 
com que você tome certas decisões projetuais. Gosto de observar o mobiliário 
como artefatos que se esforçam por dizer para que foram feitos. Imagino-os 
como artefatos “desejantes”, coisas que desejam se completar ou serem 
acabadas em um determinado uso ou lugar. Analise comigo as figuras 7 e 8. 
Você concorda que essas luminárias só se completam quando estão no lugar 
certo? A luminária que deseja estar na parede, criando efeitos óticos, não é a 
mesma que deseja uma mesa que a acompanhe. Sem a parede e sem a mesa, 
esses objetos ficam incompletos e inadequados. 
 
 
 
 
14 
Figura 7 – Arandelas de parede 
 
Crédito: Ecaterina Glazcova/Shutterstock. 
Figura 8 – Luminárias de mesa 
 
Crédito: Vfilimonov/Shutterstock. 
 
 
15 
Então, você, designer, pode e deve tentar dirigir o uso dos seus artefatos 
e produtos, mesmo sabendo que eles serão sempre uma obra inacabada. Eles 
devem expressar o que desejam, de maneira inteligente. Artefatos pouco claros 
demandarão excesso de informação publicitária e, com isso, correm o risco de 
ficar cansativos, pois não deixam nada com que o observador se ocupar. 
TEMA 4 – ARTEFATOS SÃO CHAMADOS À EXISTÊNCIA POR DESEJOS 
Na etapa anterior, mencionei o filme A pele, de Steven Shainberg. O filme 
é interessante para o estudo da aplicabilidade da Semiótica, sob vários aspectos. 
A trama, mesmo, é uma mistura de biografia com ficção. Shainberg teve de fazer 
malabarismos para explicar ao espectador que ele não pretendia ser biográfico 
no sentido literal, ou seja, aquela poderia não ser a história de Diane Arbus, 
personagem interpretada por Nicole Kidman (Nascimento; Campos, 2016). Por 
outro lado, pretendeu ser muito verdadeiro em relação aos sentimentos que 
Arbus teria experimentado ao longo da sua curta e trágica vida. Já observei, e 
reafirmo, Shainberg é obcecado por substituições síngeas, o que faz dos seus 
filmes, A pele em particular, uma fonte inesgotável de estudo (Nascimento; 
Campos, 2016). 
Para familiarizá-lo com o contexto, informo que o casal Arbus apresentado 
na película é real e foi muito famoso entre os anos 50 e 60 em função das fotos 
de moda que produziu para revistas importantes do segmento. Quando Diane, a 
esposa, decidiu fazer carreira solo, rompeu drasticamente com a moda. Suas 
fotos mais famosas, depois da mudança, são uma sequência de retratos feitos 
durante uma viagem, na qual encontrou exóticos personagens, vários deles 
trabalhando em circo (Nascimento, 2014b). Shainberg substituiu essa ruptura e 
esses personagens pela figura sedutora do vizinho Lionel Sweenay, cujos 
cabelos desciam pela tubulação e com quem a Arbus de Shainberg manteria um 
romance proibido. 
Anosdepois da morte da Arbus verdadeira, Carol Schloss escreveu um 
ensaio muito sensível sobre a alegada mudança temática do seu trabalho 
fotográfico, indo da moda para personagens de circo. Segundo a autora, essa 
ruptura temática nunca existiu no trabalho de Arbus. Para Schloss, Diane apenas 
radicalizou uma característica que já estava presente em suas fotos de moda: a 
denúncia de que as coisas criadas não são suficientes para dizer o que nós 
somos (Nascimento, 2014b). Aprende-se com Schloss que essa insuficiência é 
 
 
16 
revelada pela expressão insatisfeita dos retratados. Muito sagazmente, Arbus 
teria ido à procura de personagens circenses cujas poses e roupas faziam 
referência de modo inequívoco ao mundo da moda, que ela conhecia tão bem 
desde o seu tempo nas revistas. Para entender o artifício, observe comigo os 
retratos das figuras 9 e 10. São dois homens utilizando o mesmo modelo de 
chapéu, terno e camisa semelhantes. No entanto, o personagem da Figura 10 
parece tragicômico. Claro, a maquiagem e o chapéu inclinado estão ali para não 
deixar dúvida. Nos retratos de Arbus, se você procurar por eles na internet, verá 
que a expressão é muito semelhante. O que Schloss argumenta é que as 
pessoas dos retratos veem a si mesmas como as modelos das revistas, buscam 
concretizar essa autoimagem nos artefatos de moda, mas o resultado não 
convence. 
Figura 9 – Homem com traje típico 
 
Crédito: Susan Law Cain/Shutterstock. 
 
 
17 
Figura 10 – Ilustração de homem atuando como palhaço 
 
Crédito: Everett Collection/Shutterstock. 
Na série de retratos de Arbus, a inadequação ficava mais do que evidente, 
e com isso se imortalizou a narrativa que Schloss descreve. Aquelas plumas, 
óculos e vestidos teriam falhado em atender às reivindicações internas de quem 
os vestia, e isso teria ficado evidente nos olhares que Arbus conseguiu capturar 
com suas lentes. Com Schloss, aprendemos que os seres humanos anseiam por 
expressar a si mesmos nas coisas, conhecer-se, experimentar-se, e nem sempre 
isso acontece. 
Certa vez, Arbus disse estar convicta de que havia coisas que ninguém 
veria se ela não as fotografasse (Nascimento; Campos, 2016). Parafraseando 
Arbus, eu diria que há desejos, reivindicações internas, que as pessoas só 
poderão experimentar por meio do seu trabalho como designer. Pense que você 
pode ampliar as possibilidades, contribuindo para diminuir as frustrações. 
 
 
18 
Exemplos típicos podem ser vistos na ampliação dos tamanhos das roupas e 
das cores das maquiagens. Até poucos anos atrás, uma pessoa maior ou com 
pele mais escura teria dificuldades em se manifestar adequadamente por meio 
de roupas e maquiagens. O mercado tem ampliado consideravelmente essas 
possibilidades. 
O importante neste tópico é que você compreenda que o seu cliente, o 
usuário, o interpretante do signo que você criou, tem o poder de recriar o seu 
produto por meio de desejos. Você pode desenvolver uma bola, e ele, no 
desespero, pode fazer dela um ser humano. Ou, você pode criar uma animação 
para crianças, e um adulto encontrar algo de si nela. Como designer, você não 
terá muito controle sobre o que as pessoas esperam ou farão com suas 
produções. O que importa é que elas sejam ricas em possibilidades. Importa que 
sejam produtos, de fato, artísticos. Analise, por exemplo, a riqueza do trabalho 
de Arbus. O que ela produziu foi tão rico que sobreviveu a uma mudança radical 
de temática, serviu de fonte inspiracional para o complexo trabalho semiótico de 
Shainberg, inspirou um ensaio crítico atemporal escrito por Schloss, eu mesma, 
depois de conhecer esses trabalhos, escrevi vários artigos sobre isso e você está 
se beneficiando de Arbus nesta etapa. Prova-se assim que um trabalho 
significativo é inesgotável, atemporal e universal. Se você fizer bem o seu 
trabalho, seu produto será um acréscimo no mundo e na vida das pessoas, pois 
poderá substituir inúmeros desejos, atendendo a muitas reivindicações internas. 
Passo agora a exemplos menos filosóficos e mais práticos. Tenho em 
casa uma mesa de madeira que ganhei da minha mãe. Tem tampo redondo 
dobrável e, embaixo, uma estrutura onde podem ser guardadas as quatro 
cadeiras, também dobráveis. Enfim, minha mãe podia abrir a mesa quando 
recebia os filhos e netos, e usá-la como aparador quando estava sozinha, nas 
rotinas da casa. Ela comprou a mesa pela flexibilidade do tamanho, que se 
adequava à variação do número de pessoas à mesa. Eu detestava, porque 
sempre batia os joelhos naquela estrutura. No entanto, observando a Figura 11, 
hoje estou segura de que o problema não era a mesa, e sim um desencontro de 
desejos. O destino daquela mesa, ou seja, o seu desejo, não era estar na sala 
da minha mãe. Quem a projetou pensou em um mobiliário que pudesse ser 
utilizado em área externa por algumas horas e depois fosse guardado, quem 
sabe, em uma garagem. Na casa da minha mãe, pelo desejo dela, virou uma 
mesa de copa. 
 
 
19 
Figura 11 – Cena típica de churrasco em área externa 
 
Crédito: Gorodenkoff/Shutterstock. 
Sempre penso nisso quando coloco meus anéis. Com a idade, passei a 
achar que certos anéis grandes não favoreciam a minha mão. Talvez eu devesse 
dizer, em respeito aos artefatos, que minha mão deixou de favorecê-los. Minha 
opção foi passar a utilizar anéis menores, nas falanges, aumentando, assim, o 
comprimento dos meus dedos. 
Figura 12 – Uso de anéis 
 
Crédito: Suzie Ferreira do Nascimento. 
 
 
20 
Como professora de Semiótica aplicada, não posso ignorar que o 
designer que projetou os anéis que uso nas falanges pode ter passado horas 
encontrando a melhor maneira de apresentá-los na base do dedo anelar. Mesmo 
assim, eu opto por usá-los nas falanges dos dedos. 
A mesa da minha mãe e meus anéis são dois exemplos pessoais de que 
aquele que usa tem o poder de trazer à existência características do artefato que 
o designer não previu. Mas isso só é possível porque o artefato possui bons 
atributos e a potencialidade para isso. Em outras palavras, quem o concebeu 
deixou ali possibilidades em aberto que o usuário pode explorar. Os retratos de 
Arbus trataram de mostrar quando os artefatos falham nesta missão. 
TEMA 5 – ALARGANDO A REALIDADE DO CLIENTE 
Ao longo desta etapa, argumentei de várias maneiras em favor de uma 
atenção especial para a significação daquilo que você faz. Iniciei falando sobre 
a importância de ter repertório, expliquei que ele depende de autoconhecimento, 
adverti que as produções dos designers costumam ser obras abertas, à espera 
de alguém que as interprete e, por último, disse que o usuário, receptor ou 
interpretante, tem o poder de dar novos significados ao seu produto por meio dos 
seus desejos. Quero finalizar convidando você a se engajar no desafio de alargar 
a realidade das pessoas, mais precisamente, do seu usuário ou cliente. 
Aproveito a oportunidade para aumentar o seu repertório sobre a teoria 
do Design, introduzindo aqui alguma informação sobre Vilém Flusser, um filósofo 
tcheco que viveu no Brasil nos anos 70. Tinha um profundo interesse pelo 
Design, e era também leitor de Nietzsche. É um dos poucos autores que 
escreveu sobre teoria do Design em português. Seus ensaios são variados, e 
sua obra nunca foi sistematizada, mas ele tem alguns princípios valiosos que 
nos ajudarão com a aplicabilidade da Semiótica. 
Saiba mais 
Para saber mais sobre Flusser, leia o capítulo “Explorações do ser”, de 
Anke Finger, no dossiê Flusser, que você encontra em: VÁRIOS AUTORES. 
CULT – Dossiê: Vilém Flusser. 
Flusser não era muito entusiasta da Arte como expressão subjetiva, no 
sentido de não ter compromisso em fazer uma comunicação clara. Ao contrário, 
defendeu que a experiência da Arte é algo que acontece depois que ela está 
 
 
21 
pronta, uma ação futura. O que Flusser está dizendo é que só é possível afirmar 
alguma coisa sobre uma Arte depois que elafoi assimilada por alguém. Nesse 
sentido, ele segue Kant, porque entende que a beleza de alguma coisa tem a 
ver com a sua compreensão. O interessante, para nós, é que Flusser condiciona 
a beleza ao balanço entre o que já se sabe sobre uma coisa e o que ela tem de 
novidade (Nascimento, 2014a). Se você retomar o assunto da etapa anterior, 
lembrará que foi exatamente isso que eu disse a respeito das substituições. 
Um bom trabalho em termos de Semiótica precisa apresentar a 
quantidade exata de novidade e os recursos necessários à sua apreensão, do 
contrário, será excessivamente ruidoso, entediante ou confuso. Mas Flusser tem 
mais a oferecer para a sua prática. Ele dizia que o designer que não apresenta 
novidade alguma em seu produto não aumenta o domínio da realidade. Por outro 
lado, se a novidade é muita, não seria compreendido, e isso também não 
aumentaria o parâmetro do que é considerado real. 
Nos termos de Nietzsche, em qualquer dos casos, o designer estaria 
falhando no papel de inventor de signos (Nascimento, 2014a). Talvez você esteja 
se perguntando por que isso é importante. Lembre-se do que argumentei 
anteriormente: as pessoas se reconhecem na experiência que têm com as 
coisas. É possível sentir emoções novas indo ao cinema, lendo um livro, vendo 
ou usando uma joia, aprendendo um jogo e assim por diante. Com isso, o 
parâmetro de realidade da pessoa se vê aumentado. No caso dos modelos de 
Arbus, eles desejavam apresentar a si próprios e encontraram um limite nos 
artefatos, como se não houvesse artefatos suficientes para representá-los. 
Seja indo ao cinema, comprando um artefato ou vestindo uma roupa, a 
pessoa está tendo, ou deseja ter, uma experiência que pode ser alargadora. 
Quando conhecemos mais e melhor nossas sensações, nosso mundo aumenta. 
Ou seja, como designer, você pode aumentar o parâmetro do real permitindo 
que o usuário tenha experiências reais por meio de signos que você insere no 
seu produto. No meu caso, amadureci com os sentimentos tristes que Cazuza e 
Renato Russo colocaram em suas letras. Graças à sua Arte, tornei-me uma 
pessoa mais experiente e, em certo sentido, minha realidade foi aumentada. 
Muitos garotos aumentam seu parâmetro do real com jogos. Quem nasce 
em apartamento e se muda para uma casa térrea, ou vice-versa, terá uma série 
de novas experiências com o espaço, com a Arquitetura, com o mobiliário, e com 
isso alargará a sua própria realidade. Quem está habituado a andar de carro, 
 
 
22 
quando anda de moto ou bicicleta, tem o seu repertório de experiências 
aumentado, e assim também a sua realidade. Enfim, toda nova experiência 
estimulada pelas coisas é um aumento do parâmetro do real. 
Anteriormente também argumentei que você deve se inspirar nas casas 
de luxo, que se arriscam bastante nas suas peças publicitárias. Quero insistir um 
pouco mais nisso, agora à luz de Nietzsche e Flusser. Nietzsche escreveu um 
ensaio crítico a respeito da obra de Richard Wagner, cuja música você deve 
conhecer pela famosa Cavalgada das Valquírias, que o diretor Francis Ford 
Coppola imortalizou em Apocalypse Now (1979). A verdade é que há muitas 
outras obras de Wagner em filmes, e a maioria de nós nem sabe. Embora 
Nietzsche não o diga com estas palavras, o que subjaz à sua crítica a Wagner é 
um problema de Semiótica. 
Wagner, para agradar seu público, começou a produzir dramas 
musicados, ou seja, começou a colocar a música como um acessório àquilo que 
era falado na cena. Para Nietzsche, uma corrupção inaceitável. A preferência 
dos cineastas atuais pela instrumentalidade de Wagner prova que o filósofo 
germânico estava certo: músicas como a Wagneriana são tão eloquentes que 
devem ser colocadas no lugar das palavras, e não à sua sombra. Veja o que 
mencionei há pouco sobre Cazuza e Renato Russo. No meu caso, a força das 
palavras suplantou meu interesse pelas músicas, que só vim a conhecer em um 
segundo momento. Esse é um exemplo da força atrativa que as palavras têm 
para nós, humanos modernizados. Por motivo similar, já não temos interesse em 
cinema mudo. 
Dica 
O diretor de cinema Lars von Trier utilizou o prelúdio de Tristão e Isolda, 
de Wagner, como trilha sonora em seu filme Melancolia (2011). A música de 
Wagner é a ferramenta utilizada pelo diretor para significar o desespero dos 
personagens com a aproximação do fim do mundo. 
O principal, para esta abordagem, é que você preste atenção no motivo 
pelo qual Wagner começou a submeter sua música às palavras: o público. 
Portanto, assim como você e eu, Richard Wagner também precisava atender 
certas demandas comerciais e, com isso, conforme a opinião de Nietzsche, 
empobreceu sua música. Quem poderá dizer quantas Cavalgadas das Valquírias 
 
 
23 
Wagner produziria se não tivesse optado pelo drama? Quantas experiências 
deixaram de ser disponibilizadas ao público em função dessa opção? 
Da mesma maneira, nós, assim acuados, quando privamos as pessoas 
de experiência, deixamos de dar a elas a oportunidade de alargar suas 
realidades, de estenderem seus parâmetros do real. A consequência é que o 
mundo vai encolhendo e ficando cada vez mais monótono. Nietzsche entendeu, 
e lamentou, que a música de Wagner estivesse adoecendo por ser produto da 
demanda de uma sociedade que também adoecia e não era mais capaz de ter 
experiências puramente musicais (Nascimento, 2014a). 
Você e eu estamos sujeitos às mesmas pressões. Profissionalmente, 
você terá de decidir o quanto estará disposto a arriscar em favor de um 
alargamento do parâmetro do real, quando a maioria dos seus clientes desejar 
ficar na sua zona de conforto. Ou, o que é mais provável, terá de decidir o quanto 
de refinamento exigirá dos sentidos dos seus clientes, em uma época em que 
todos estamos brutalizados pelo excesso de estímulos. 
TROCANDO IDEIAS 
Certa ocasião, assisti ao comercial de uma empresa especializada em 
artefatos para churrasco. Já eram bem audíveis as demandas por igualdade 
entre os gêneros, e a empresa resolveu arriscar com o tema. No geral, não 
surpreendia: um grupo de mulheres, vegetais na grelha, e assim por diante. O 
inusitado é que, lá pelas tantas, aparecia uma moça delicada segurando um 
enorme saco de carvão. A mensagem era clara: igualdade de direitos requer 
igualdade de deveres. 
O autor da publicidade utilizou, propositalmente, uma dupla linguagem: 
enquanto afirmava a igualdade com os recursos mais óbvios, questionava sua 
validade com recursos mais sutis. A experiência trivial de assistir aquele 
comercial alargou minha realidade, pois demonstrou que ainda é possível ser 
criativo. Você lembra quando foi a última vez que assistiu a um comercial 
inteligente, daqueles que somente algumas pessoas entendem a mensagem? 
Compartilhe com seus colegas no Fórum! 
 
 
24 
NA PRÁTICA 
Procure imagens de luminárias sem ambientação, apenas a foto técnica, 
variando nos estilos. Em seguida, procure imagens que poderiam ser a 
ambientação daquela luminária. Veja o exemplo: 
Figura 13 – Luminária de pé 
 
Crédito: Krakenimages.com/Shutterstock. 
Figura 14 – Design de interior 
 
Crédito: vanitjan/Shutterstock. 
 
 
25 
Observe que a luminária tem um pé alto, ajuste de inclinação e não ilumina 
o teto. O objeto que ela deve iluminar estará abaixo, provavelmente um pouco 
deslocado. Por outro lado, a Figura 14 mostra uma poltrona confortável, 
acompanhada de uma estante com livros, mas sem luminária. Conforme o que 
você estudou nesta etapa, a luminária deve estar ao lado daquela poltrona. 
Repita o exercício quantas vezes forem necessárias, até se sentir seguro 
do raciocínio. Será importante para as próximas etapas. 
FINALIZANDO 
Nesta etapa, você aprendeu o valor de um bom repertório. Sugeri, a partir 
das minhas próprias experiências, que você pode adquirir repertório por meio da 
arte, dos jogos e das séries. Isso porque as emoções experimentadas na fantasia 
são reais.Assistindo, jogando, tocando algo ou ouvindo algum som, todos nós 
aprendemos um pouco mais sobre nós mesmos e, assim, aumentamos nossa 
realidade. 
Você também aprendeu que os produtos que criará devem ser ricos em 
significado, pois estarão abertos ao mundo, a uma série de interpretações que 
talvez você não possa prever. Como designer, você pode ser generoso e 
oferecer ao mundo novas experiências. 
 
 
 
26 
REFERÊNCIAS 
NASCIMENTO, S. F. Moda e linguagem: Nietzsche e Arbus, uma aproximação. 
Revista Dobras, 2014b. Disponível em: 
<https://dobras.emnuvens.com.br/dobras/article/view/39/39>. Acesso em: 24 
abr. 2024. 
_____. O criador de roupas enquanto artista. Modapalavra, ano 7, n. 13, jan./jun. 
2014a. Disponível em: 
<https://revistas.udesc.br/index.php/modapalavra/article/view/5127/3314>. 
Acesso em: 24 abr. 2024. 
_____. CAMPOS, J. L. Possibilidades artísticas a partir da obra de Diane Arbus. 
Temática, ano XII, n. 12. Dez./2016. Disponível em: 
<http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/tematica>. Acesso em: 24 abr. 2024. 
RAMOS, F. B. Tropicália: gêneros, identidades, repertórios e linguagens. 1. ed. 
Porto Alegre: Educs, 2008. E-book. Disponível em: 
<https://plataforma.bvirtual.com.br>. Acesso em: 24 abr. 2024. 
SHLOSS, C. À margem: moda e dor na obra de Diane Arbus. In: BENSTOCK, 
S.; FERRISS, S. (Orgs.). Por dentro da moda. Tradução de Lúcia Olinto. Rio de 
Janeiro: Rocco, 2002. 
 
	CONVERSA INICIAL
	CONTEXTUALIZANDO
	TEMA 1 – O REPERTÓRIO DO EMISSOR
	TEMA 2 – CONHECE-TE A TI MESMO
	TEMA 3 – UMA OBRA INACABADA À ESPERA DA SUA SIGNIFICAÇÃO
	TEMA 4 – ARTEFATOS SÃO CHAMADOS À EXISTÊNCIA POR DESEJOS
	TEMA 5 – ALARGANDO A REALIDADE DO CLIENTE
	TROCANDO IDEIAS
	NA PRÁTICA
	FINALIZANDO
	REFERÊNCIAS

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