Buscar

Preservação do Patrimônio Cultural

Prévia do material em texto

NOME DA DISCIPLINA 
FUNDAMENTOS DA PRESERVAÇÃO 
PATRIMONIAL 
 
 
2 
 
SUMÁRIO 
NOSSA HISTÓRIA ...................................................................................................... 3 
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 4 
TRADIÇÃO, CULTURA MATERIAL E CULTURA CONSTRUTIVA ............................ 9 
A HISTORICIDADE DAS TERMINOLOGIAS ............................................................ 10 
BEM PATRIMONIAL: DA MATERIALIDADE E IMATERIALIDADE - UM PONTO DE 
INTERSEÇÃO ........................................................................................................... 11 
MATERIALIDADE ..................................................................................................... 11 
A IMATERIALIDADE ................................................................................................. 19 
ACOLHIMENTO E REJEIÇÃO DAS PRIMEIRAS INSCRIÇÕES DOS BENS 
IMATERIAIS .............................................................................................................. 20 
CONSERVAÇÃO PREVENTIVA, CIÊNCIA E METODOLOGIA ............................... 23 
O FIM DO SIGNIFICADO DOS CONCEITOS ABSOLUTOS .................................... 28 
ARQUITETURA COMO MONUMENTO PORTADOR DE MONUMENTALIDADE ... 29 
PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO, CULTURAS CONSTRUTIVAS TRADICIONAIS E 
SOCIEDADES GLOBALIZADAS ............................................................................... 36 
A TRANDISCIPLINARIDADE DA HISTÓRIA E A HISTÓRIA DA CONSTRUÇÃO ... 39 
A CONSTRUÇÃO E PATRIMÔNIO CONSTRUÍDO: A TRADIÇÃO .......................... 42 
ALGUMAS CONCLUSÕES ....................................................................................... 43 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 45 
 
 
 
3 
 
 
 NOSSA HISTÓRIA 
 
 
A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em 
atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com 
isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível 
superior. 
A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de 
conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no 
desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de 
promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem 
patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras 
normas de comunicação. 
A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e 
eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. 
Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de 
cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do 
serviço oferecido. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
 Num primeiro momento é necessário relembrar que o órgão responsável pela 
preservação do patrimônio cultural brasileira é o palavra preservação possui 
amplo significado, dentro das diversas áreas do conhecimento, e normalmente 
está relacionada ao cuidado e ao amparo do patrimônio. No campo da 
restauração, a palavra preservação compreende desde a intenção de salvaguardar o 
monumento arquitetônico, passa pelos estudos e análises específicos do campo 
disciplinar, até encontrar-se com as ações práticas da intervenção em 
monumentos históricos. Ou seja, a preservação carrega os significados próprios da 
teoria do restauro e caminha para as ações práticas, desde as manutenções 
simples e ordinárias, até as intervenções de escala abrangente. Entretanto é 
verificável que as ações práticas que vêm sendo executadas em bens 
patrimoniais, no Brasil e no exterior, nem sempre estão munidas de toda a 
bagagem intrínseca ao termo. A falta de diálogo entre as ações práticas e 
a teoria do restauro leva o patrimônio arquitetônico a uma situação de 
risco: de um lado, faltam ações de manutenção preventiva. De outro, as 
intervenções realizadas, por vezes, estão desprovidas de estrutura teórica própria 
do campo disciplinar do restauro. 
A palavra patrimônio remete refletir questões advindas e relacionadas sobre 
herança, e esta, pode ser coletiva ou individual, herdado dos nossos familiares 
e/ou deixado para as próximas gerações. E a arquitetura que integra a paisagem é 
um modelo de patrimônio, considerado interessante, vivo e coletivo, 
independentemente se é em âmbito individual. 
O patrimônio arquitetônico contribui, de forma significativa, no diálogo com o 
contexto urbano e no planejamento e desenvolvimento do mesmo, pois interage 
diretamente com a paisagem e seu entorno, conferindo informações e 
possibilidades de imaginação de quem o observa. 
Nessa perspectiva, Vilanova (2013), afirma que preservar é defender, proteger 
e resguardar; é exercer o direito à cidadania, à memória e à identidade. É pertinente 
considerar que o patrimônio arquitetônico constitui-se no coletivo, por grupos diversos 
e de grande interesse para a sociedade, haja visto, que a salvaguarda da 
arquitetura é importante quando associada à coletividade e à preservação da memória 
urbana. A memória é uma aliada para a construção da identidade do corpo 
 
5 
social e colabora para o entendimento da trajetória humana, ajudando a 
compreender as ações de planejamento e desenvolvimento urbano das cidades. 
Dessa forma, preservar é imprescindível para o entendimento do que nossos 
antepassados pensavam e como viam o mundo, pois o patrimônio, vista como arte e 
é o reflexo dos nossos pensamentos, sentimentos e demais subjetividades. 
Vimos em Oliveira e Callai (2018) que as políticas de preservação do patrimônio 
transformam-se em peças fundamentais e estratégicas, muitas vezes, identificadas 
como verdadeiros instrumentos de ordenamento da cidade. E que proteger o 
patrimônio é manter vivas as marcas da história, assegurando a possibilidade 
de que as gerações futuras tomem conhecimento das manifestações produzidas 
socialmente ao longo do tempo, seja no campo das artes, nos modos de viver, nas 
crenças, lugares ou mesmo na paisagem da própria cidade, com seus atributos 
naturais, tangíveis e intangíveis. 
É de responsabilidade do Estado, através da legislação do Instituto do 
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), órgão responsável por evitar o 
descaso com as edificações patrimoniais. O governo, como um todo, tem 
também a função de criar leis e fazer com que elas sejam seguidas, sendo 
dever elaborar normas para que a preservação seja mais respeitada, além de, divulgar 
a importância da mesma, uma vez que, só se tem vontade de proteger aquilo que se 
conhece e, dessa forma, os cidadãos passam a entender o motivo quando conhecem 
e quando conscientizados do papel que bem edificado bem tem na construção da 
identidade urbana. Neste contexto, Vilanova (2013), afirma que preservar é manter 
a integridade dos valores pelo/do próprio povo. 
Assim, Oliveira e Lopes (2018) observam, de maneira constitutiva, que 
patrimônio edificado pode ser pensado enquanto suporte do imaginário e da memória 
social de uma localidade, ou seja, os edifícios e áreas urbanas possuidoras de valor 
patrimonial. Também podem ser tomados como um ponto de apoio da construção 
da memória, de valor e poder como um estímulo externo queajuda a reativar 
e reavivar os traços arquitetônicos na formação sócio territorial. 
Nesse viés, a memória coletiva moldada formada e articulada através do 
tempo não é mais do que um passeio através da história, revisitada e 
materializada no presente pela arquitetura, reforçando a ligação de identidade 
e pertencimento do ser humano em certo tempo e espaço. 
O patrimônio arquitetônico traz, como um bem patrimonial material, desperta e 
proporciona um sentimento de identidade e de pertencimento para quem o olha. 
 
6 
Reconhecendo as manifestações culturais de um povo através da história contada no 
passar dos tempos, assim , desta forma, o patrimônio é símbolo que expressa grande 
valor para a coletividade podendo ser visto, sentido e vivido. A compreensão de que 
a preservação possui um papel fundamental para as futuras gerações faz 
referência para entender um pouco da história base, aquela construída através da 
vidas dos antepassados numa determinada sociedade. 
 O patrimônio arquitetônico preserva a história da cidade em que está situado, 
pois tudo que é mantido intacto possui a finalidade de contribuir em algo do presente 
e para o futuro. E Oliveira e Callai (2018) verbera brilhantemente que o espaço 
urbano contemporâneo, destituído de várias edificações e conjuntos 
arquitetônicos, transformam-se em espaços heterogêneos que muitas vezes não 
valoriza os edifícios com relevância arquitetônica remanescentes. As demolições 
relacionam-se principalmente com a perda da memória da evolução urbana e com o 
empobrecimento da ambiência que poderia ser mais diversa e rica. Estes fatores 
corroboram para seu futuro desaparecimento e indicam a necessidade imediata da 
preservação do que há, de ações de educação patrimonial e da conscientização da 
população quanto ao significado e importância dos prédios existentes como fator 
de identidade e pertencimento do cidadão com o seu local de origem. 
Observa-se que a conservação do patrimônio contribui com questões 
relacionadas à sustentabilidade ambiental, uma vez que, acaba utilizando recursos 
financeiros e técnicos com valores inferiores no lugar de construir algo novo, a 
exemplo, da restauração que contribui para que o imóvel antigo com marcas do tempo 
seja preservado. Para manter o patrimônio arquitetônico vivo existem instrumentos e 
instituições legais (a nível federal, estadual e local) que defendem a proteção e a não 
demolição de edificações que possuem valor para a sociedade de forma coletiva. 
Amaral e Messias (2016) entendem que o valor patrimonial de um bem só pode ser 
compreendido se não houver uma ruptura da sua memória espacial e temporal, ou 
seja a restauração não pode modificar seu estilo inicial e nem as suas peculiaridades. 
A arquitetura pensada como bem patrimonial passou a ser considerada como 
um mediador entre passado e presente, uma âncora capaz de dar uma sensação de 
continuidade em relação ao passado. Pensar arquitetura como patrimônio, de pronto, 
conceitua-se como o legado, o vestígio tangível herdado e transmito às futuras 
gerações. O patrimônio arquitetônico criado pelo Homem tem sua existência física em 
certo espaço e tempo, onde por diversos motivos, muitos desses bens destroem-se 
e/ou desaparecem. 
 
7 
Entretanto, outros sobrevivem acumulando e evidenciando expressões como 
monumentalidade, valor e poder. Dessa maneira, a preservação arquitetônica 
representa para a sociedade atual uma verdadeira necessidade, pois a arquitetura 
resgata parte do que é o passado permitindo assim possibilidades de se compreender 
o presente e de ações para o futuro. 
Fundamentalmente o elemento que define patrimônio é a relação da 
capacidade de representar simbolicamente uma identidade. Compreendendo os 
símbolos como um veículo nato de comunicação cultural, a sociedade mantém através 
destes, um estreito vínculo com o passado, haja visto, que é através desta identidade, 
passado/presente, que nos diferenciamos coletivamente como iguais, que nos 
identificamos com os restantes e que nos discernimos dos demais. 
Silva (2000, p. 220) salienta que através do patrimônio o indivíduo sequestra 
um pedaço de passado, sob a forma de totens pessoais, em relação aos quais 
percebe uma vinculação direta com a preservação; seja como um artifício idealizado 
com finalidades de identificação no espaço e no tempo ou como elemento de 
referência. Conhecer a história da cidade e seu processo constitutivo, conforme 
salienta Souza (2008) é saber que cada indivíduo faz parte deste processo como ser 
ativo, é o caminho para a criação de uma identidade, primeiramente para com o seu 
local, depois regional e finalmente atingir a identidade nacional, onde a preservação 
do patrimônio arquitetônico envolve uma série de atores sociais e políticos. 
Nesse sentido, Silva (2000) sinaliza ainda que é através da própria dinâmica 
da existência, que a arquitetura do passado alimenta, pela sua permanência no tempo, 
a criatividade de novas gerações e assim fluindo a cultura e a preservação da 
arquitetura existente, pois a arquitetura e a cidade, se transformam em uma extensão 
do que uma coletividade quer. 
A arquitetura e a cidade, na visão de Oliveira, Diniz e Wildner (2017) assumem 
um papel que acaba por contribuir na formação da identidade de um local, na 
formação de grupos, de categorias sociais e no resgate da memória, desencadeando 
assim uma ligação entre o cidadão e suas raízes. Canani (2005) afirma que a 
arquitetura vista como patrimônio está relacionada a um bem que pertence ao paterno, 
tão valioso que justifica sua herança e preservação, por nela estar incutida a memória 
e a identidade de quem o deixa e de quem o herda. 
Oliveira, Diniz e Wildner (2017) mais vez corroboram que a arquitetura 
patrimonial pertence à comunidade que a produziu e que a compõem, onde a 
consciência em preservar, sem dúvida, contribuirá para que os demais possam 
 
8 
 
usufruir desta herança e, que por meio destes testemunhos do passado, possam 
compreender o processo de desenvolvimento da identidade desse espaço. Como 
reforça Silva (2000) o patrimônio arquitetônico não é só o legado que é herdado, mas 
o legado que, através de uma seleção consciente, um grupo significativo da população 
deseja legar ao futuro. Ou seja, existe uma escolha cultural subjacente à vontade de 
legar o patrimônio cultural a gerações futuras. E existe também uma noção de posse 
por parte de um determinado grupo relativamente ao legado que é coletivamente 
herdado. 
Choay (2001), diz que a preservação do patrimônio cultural abrange diversos 
aspectos daquilo que é considerado monumento histórico, onde no caso dos bens 
arquitetônicos essa discussão relaciona-se intimamente com uma de suas 
características intrínsecas, o uso, pois a arquitetura é a única, entre as artes maiores, 
cujo uso faz parte de sua essência e mantém uma relação complexa com suas 
finalidades estética e simbólica. Ballar (1997) fecha observando que a noção de 
patrimônio surge quando um indivíduo ou um grupo de indivíduos identificam como 
um objeto ou um conjunto de objetos. 
 Oliveira, Diniz e Wildner (2017) afirmam que o patrimônio arquitetônico possui 
a capacidade de estimular a memória das pessoas historicamente vinculadas a ele, e 
por isso, é alvo de estratégias que visam a sua promoção e preservação, onde a 
preocupação em protegê-lo começou no início do século XX, sendo criadas a partir 
daí várias comissões e conferências para estabelecer critérios para proteger e 
conservar o patrimônio. Os autores observam que é através da materialidade, que o 
indivíduo consegue se realizar e afirmar sua identidade cultural, podendo também, 
reconstruir o seu passado histórico. 
Já Silva (2000) salienta que a história e os seus objetos ganham um valor e 
um interesse sem precedentes face ao fantasmada ruptura e da desordem provocado 
pela ausência de valores simbólicos e de identificação, a sociedade reclama, numa 
explosão de nostalgia, a recuperação do passado. Então, nesse viés, do contexto 
nostálgico, a preservação e a salvaguarda da arquitetura surge como uma forma de 
recuperação especialmente eficaz. 
Ainda a autora (2000) reforça que o patrimônio se converte, nos últimos anos, 
num verdadeiro culto popular e também, numa etiqueta extraordinariamente extensiva 
a uma enorme quantidade de elementos e objetos, do individual ao coletivo, do 
material ao intangível, de um passado mais remoto a um passado mais recente 
 
9 
 
 
TRADIÇÃO, CULTURA MATERIAL E CULTURA CONSTRUTIVA 
 
A palavra tradição tem a sua origem na latina tradere que significa transmitir e 
a tradição artística refere-se ao patrimônio artístico de uma determinada cultura. Por 
extensão, tradição construtiva tratar-se do patrimônio de conhecimento de uma 
determinada cultura construtiva, se considerarmos a definição de cultura construtiva 
proposta por Howard Davis. A cultura material como materialização de uma cultura e 
evidência de uma sociedade, no que se refere às realizações arquitetônicas como 
objetos materiais, resultaria de uma cultura construtiva que, também ela, se trataria 
de uma criação cultural. 
Como repercussão da aplicação da ideia de tradição a outros âmbitos como 
valores, crenças e costumes religiosos ou simplesmente rituais de interação social, a 
interpretação do conceito no âmbito arquitetônico e construtivo sofreu alterações ao 
longo de todo o século XX. Uma memória que contrasta com a memória-pura, que 
pretende representar o passado e que aceita os fatos históricos como irrepetíveis 
(BERGSON, 1896). No campo da sociologia Edward Shils referiu-se à tradição como 
um padrão orientador, uma forma de conhecimento transmitida entre gerações, 
passível de algumas mutações (SHILS, 1981, 12). Hobsbawm (1983) introduziu a 
ideia de ‘tradição inventada’ para todas as formas de práticas imutáveis tacitamente 
inculcadas nas sociedades em processos de repetição e referidas ao passado. 
Outros investigadores preocuparam-se em defender a natureza unicamente 
simbólica da tradição pela impossibilidade de se tratar de algo contínuo e imutável 
(HANDLER & LINNEKIN, 1984). A partir destes últimos estudos construiu-se a visão 
incompleta e redutora usada ainda por muitos âmbitos teóricos e práticos, que associa 
a ideia de tradição a uma manipulação artificial das sociedades, não considerando o 
seu sentido mais essencial que consiste no conhecimento acumulado entre gerações 
(Figura 1). 
 
 
 
 
 
 
 
 
10 
 
 
 
Figura 1: A moldagem e secagem artesanal de tijolos e ladrilhos de barro antes de serem 
cozidos em forno de lenha. Vetriolo (Viterbo), Itália. 
 
Fonte: João Mascarenhas Mateus 2006. 
 
A HISTORICIDADE DAS TERMINOLOGIAS 
 
O conceito de tradição está intimamente ligado ao conceito de História e Henry 
Glassie na sua obra Material Culture (1999) recorda o modo em que a História, como 
disciplina, desde cedo foi desmembrada em especializações: história econômica, 
religiosa, política, da arquitetura. Em 1934, Karl Popper afirmava que o caráter de uma 
teoria científica tenderia à sua refutabilidade (POPPER, 2007, 29-30). O conceito de 
proteção do patrimônio construído transformou-se igualmente com o tempo. 
Ao falar em restauração/preservação não há como não dizer que no século XIX 
debateram-se as posições ruskinianas de ‘less intervention is more’ e as intenções de 
restauro de estilo de Eugène Viollet-le-Duc. Do restauro filológico de Camillo Boito e 
Gustavo Giovannoni passou-se ao restauro crítico de Roberto Pane e Renato Bonelli. 
Mais recentemente, das instâncias estéticas e históricas de Cesare Brandi nasceram 
o restauro histórico-crítico de Giovanni Carbonara e as intenções tradicionalistas de 
Paolo Marconi, entre outros. 
 
11 
Desde a Ilustração que se criou uma particular ambição em compartimentar 
todos os âmbitos do conhecimento e por isso se procede a ajustes periódicos que 
seguem esquemas idênticos de delimitação disciplinar, numa competição por 
conseguir verdades absolutas. Felizmente, desde tempos recentes, estamos também 
a assistir a reinvidicações da transitoriedade de muitas definições, a uma historicidade 
incontornável das interpretações. 
Uma prova clara desta historicidade pode encontrar-se no próprio conceito de 
tradição. 
 
 
 
BEM PATRIMONIAL: DA MATERIALIDADE E IMATERIALIDADE - UM PONTO DE 
INTERSEÇÃO 
 
MATERIALIDADE 
O que tínhamos até a metade do século XX, a definição corrente de patrimônio 
era, na grande maioria das vezes, de um objeto/ construção de valor histórico e/ ou 
artístico excepcional. Eram contemplados castelos, igrejas, esculturas, ruínas, entre 
outros. A sua identificação era realizada por especialistas, que a partir de critérios 
ditos técnicos e objetivos, indicavam o que merecia proteção do Estado. Os valores 
do patrimônio eram apresentados como intrínsecos, bastando o exame ou o olhar do 
especialista para o seu reconhecimento. Os conflitos eram reduzidos, afinal a decisão 
estava restrita a um pequeno grupo de seletos, que possuíam uma visão similar sobre 
quais eram os principais movimentos artísticos e a importância de se proteger os 
vestígios materiais das sociedades antigas estudadas pela arqueologia. Após 
classificados como patrimônios, não restavam alternativas além de preservá-los para 
a posterioridade e oferecê-los à população como a verdadeira história, a comprovação 
de um passado glorioso e único. Raramente ocorriam discussões sobre a influência 
das condições do presente na escolha das construções a serem promovidas como 
 SAIBA MAIS: 
O termo monumento histórico deve ser esclarecido [...] por monumento 
histórico, não se deve entender obra grandiosa de valor artístico e 
histórico excepcional (como foi frequente no século XIX), mas, 
sim, como propõem variados autores da atualidade, qualquer artefato 
que adquiriu significação cultural com o tempo, - algo mais 
relacionado ao seu sentido etimológico e às propostas de Riegl". Kühl (2010, 
p. 301) 
 
12 
patrimoniais, assim como não eram considerados os diferentes pontos de vista que a 
população poderia ter sobre a mesma obra. 
Se o passado era uma constatação, uma realidade, ainda que às vezes 
encoberta, era suficiente reconhecer a sua existência, descrevê-lo e apontar suas 
obras mais relevantes. Ao mesmo tempo em que as percepções da população não 
tinham o poder de mudar esse passado, também não possuíam legitimidade para 
determinar o que era artístico ou historicamente singular. À sociedade estava 
reservada a instrução de valorizar o patrimônio revelado pelo conhecimento de 
intelectuais e técnicos, ou seja, a um simples receptor passivo. 
Assim, salienta-se que a atenção estava voltada para a materialidade do 
patrimônio: como descrevê-lo, preservá-lo, restaurá-lo, impedir sua destruição, expô-
lo e transportá-lo, este último, quando possível e necessário. Questionamentos sobre 
a razão de somente algumas obras terem sobrevivido ao longo do tempo, de algumas 
culturas terem recebido mais atenção do que outras, das listas patrimoniais terem 
privilegiado determinados movimentos artísticos, continentes e épocas, entre outros 
aspectos que denotam escolhas, parcialidade e relações de poder eram deixados em 
segundo plano ou deliberadamente evitados. 
Esta abordagem levou à preservação da cultura e história europeia, de 
construções e objetos que representam o que é belo e artístico no Ocidente, enquanto 
manifestações culturais de povos minoritários, não ocidentais e de países 
subdesenvolvidos eram vistas como inferiores e atrasadas ou, nas melhores 
condições, pitorescas e exóticas. Mesmo quando se concluía que determinadas 
manifestações mereciam salvaguarda,os instrumentos disponíveis se mostravam 
insuficientes, já que baseados em um referencial europeu que priorizava edificações, 
ignorando outras práticas de celebração e perenização de uma cultura. 
A concepção moderna de patrimônio começou a se estabelecer durante a 
Revolução Francesa, com a preocupação de proteger os monumentos históricos. Em 
meio à destruição dos vestígios do Antigo Regime, emergiu a reflexão sobre o que 
fazer com o que possuía expressivo valor econômico e o destino do grande número 
de bens confiscados. Um dos primeiros atos da Constituinte, em 2 de outubro de 1789, 
foi colocar os bens do clero “à disposição da nação”, seguido pelos bens dos 
emigrados e da Coroa. Nesta primeira concepção, essas riquezas pertenceriam ao 
povo, eram a sua herança e, portanto, deveriam ser usufruídas por todos (CHOAY, 
2006, p. 98). A Constituinte ainda criou uma comissão para inventariar e, 
 
13 
posteriormente, proteger os monumentos. Para a divisão dos trabalhos, as obras 
foram separadas em dez categorias, nas quais a expressão material era o principal 
critério de organização: a divisão I foi reservada aos livros impressos, a IV às 
medalhas antigas e modernas, a V às pedras gravadas e inscrições e assim por 
diante. Já no período pós-Revolução, a Comissão dos Monumentos Históricos, de 
1837, dividiu as obras em três grupos, novamente pautando-se pelo tipo de 
construção, ou seja, sua materialidade: remanescentes da Antiguidade, edifícios 
religiosos da Idade Média e castelos (CHOAY, 2006, p. 12 e 98-100). 
Esta ênfase no caráter físico dos monumentos, embora não seja ingênua e 
sirva para transmitir uma ideia de neutralidade em sua classificação, possuía uma 
motivação prática, funcional. Para combater o vandalismo revolucionário, era 
indispensável, além de listar os monumentos históricos, enviá-los para galpões e, 
especialmente quando não era possível deslocá-los para um local fechado e seguro, 
atribui-los um uso. Desse modo, a divisão entre bens móveis e imóveis facilitava e 
direcionava a aplicação de medidas protetivas ou substitutivas. Catedrais, igrejas, 
conventos e abadias, por exemplo, foram transformados em mercados, prisões, 
casernas e depósitos de munição, sal e salitre (CHOAY, 2006, p. 105). 
A noção de utilidade também estava presente no emprego dos monumentos na 
educação formal e informal. Nesta perspectiva, a arquitetura e as esculturas 
espalhadas pela cidade e os objetos dispostos nos museus, bibliotecas e escolas 
serviriam tanto para instruir as novas gerações quanto para esclarecer as massas. 
Contudo, além de uma simples exposição, este projeto tinha como propósito 
reescrever a história nacional, criando uma nova imagem do passado que colaboraria 
para legitimar o regime do presente (POULOT, 2009, p. 85-86). 
Nesse sentido, uma questão se coloca: se o Antigo Regime era rejeitado, se os 
revolucionários não só permitiram como emitiram decretos determinando a destruição 
de “todos os sinais da monarquia e do feudalismo” (CHOAY, 2006, p. 108) e se boa 
parte da população desejava se livrar dos resquícios do período anterior, como 
promover as coleções confiscadas dos reis e Igreja como monumentos nacionais e 
fontes do conhecimento? A resposta está na distinção entre o passado e o presente. 
Ao retirar toda a significação primeira das obras, reduzindo-as a objetos 
descontextualizados, desvinculadas do cotidiano, adotando inclusive medidas 
drásticas como o apagamento de inscrições e símbolos, a transferência para outros 
 
14 
lugares, tornava-se possível reapresentar os monumentos como marcas de um 
passado distante, sem uma influência direta na atualidade. 
O papel mnemônico, típico dos monumentos, era substituído pelo valor 
histórico e artístico das construções. Assim, antes de servir como rememoração de 
vivências compartilhadas, eles poderiam mostrar a beleza artística já produzida pelo 
homem e contar a história oficial do país, com um distanciamento que contribuiria mais 
para o aprendizado e a formação educacional institucionalizada do que para o 
despertar de emoções e traumas recentes. A classificação dos monumentos, a 
escolha de locais/instituições de guarda e exibição e as maneiras como eles eram 
organizados e expostos podem ser interpretados como estratégias de ressignificação 
da cultura material para fins do presente, habilmente apresentadas como atividades 
neutras para a preservação das riquezas do passado. 
Ainda que os monumentos antigos tenham recebido outros valores além do 
mnemônico antes do século XVIII, foi a Revolução Francesa que sedimentou a 
preferência pelos valores históricos e artísticos no tratamento da cultura material, 
abrindo caminho para a formulação da ideia de um patrimônio nacional (e, em um 
futuro bem mais longínquo, de patrimônio mundial). A passagem da memória para a 
história desvincula o patrimônio das experiências sociais e afetivas de uma 
comunidade para recriá-lo como um vestígio de um passado que pode informar, 
esclarecer, divulgar outras culturas, ser estudado ou decifrado. O patrimônio torna-se 
o outro, o não vivido ou então o todo abstrato, ao mesmo tempo vago e homogêneo, 
ao contrário do monumento, centrado no eu e no grupo. Esta transformação não seria 
possível sem uma intervenção na materialidade das obras. 
Os revolucionários não assumiam a utilização dos bens confiscados na 
afirmação do regime. Em seus discursos, eles argumentavam que estavam apenas 
restaurando o valor original das obras, divulgando a sua real beleza, protegendo a 
arte, que não pertencia a nenhum governo ou sistema político. O desvirtuamento do 
sentido autêntico teria sido provocado pela monarquia, Igreja e nobreza em prol dos 
seus interesses imediatos e manutenção dos seus poderes. A Revolução teria apenas 
recuperado o projeto dos grandes artistas e pensadores da França para, em seguida, 
compartilhar suas obras com toda a população, a verdadeira detentora das riquezas 
e conquistas nacionais (POULOT, 2009, p. 116). As políticas patrimoniais, 
formalizadas ou não, a partir do final do século XVIII, recorreriam ao argumento da 
objetividade e neutralidade para justificar as suas medidas. Neste ponto, era mais 
 
15 
eficiente enfatizar as ações realizadas nas obras enquanto objetos do que discutir as 
mensagens que elas transmitiam. As mensagens não eram para ser problematizadas. 
O século XX, através de cartas e convenções publicadas pelas duas principais 
instituições internacionais que se ocupam, ao lado de outras atividades, da 
preservação do patrimônio, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a 
Educação, a Ciência e a Cultura) e o ICOMOS (Conselho Internacional de 
Monumentos e Sítios), deu continuidade a esta visão dominante desde o século XVIII. 
A Carta de Veneza, de 1964, que serviu de parâmetro para a criação de políticas 
nacionais de patrimônio, abordava somente monumentos históricos, definidos como 
“criação arquitetônica isolada, bem como o sítio urbano ou rural que dá testemunho 
de uma civilização particular, de uma evolução significativa ou de um acontecimento 
histórico”. Sua finalidade se limitava à conservação e restauração dos monumentos, 
o que garantiria, por consequência, a preservação dos seus valores históricos e 
artísticos. Esses valores, pinçados entre tantos outros possíveis, não eram abordados 
que de forma indireta. A restauração, por exemplo, levaria à sua conservação e 
revelação. Era a materialidade que garantiria a perenidade dos significados dos 
monumentos, como se eles também fossem físicos e não subordinados a um 
julgamento. Nesse sentido, a suposta falta de divergências sobre os valores do 
monumento era um sinal de sucesso das políticas adotadas, uma comprovação de 
que os técnicos acertaram em sua análise, cabendo à sociedade comtemplar e cultuar 
sua herança. 
A adoção do conceito de patrimônio, ampliando as opções de bens a serem 
incluídos, como na Convençãosobre a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e 
Natural de 1972, não levou ao abandono desta abordagem voltada para a salvaguarda 
de edificações e objetos museológicos. Em seu preâmbulo, a Convenção se justificava 
pela ameaça de destruição dos patrimônios, sua degradação ou desaparecimento 
pelos perigos trazidos pela evolução da vida econômica e social, enfim, pela 
possibilidade de que as obras, enquanto construções materiais, pudessem ser 
danificadas ou destruídas. A definição de patrimônio cultural se resumia a uma lista 
de monumentos (obras arquitetônicas, escultura, pinturas, etc.), conjuntos (grupo de 
construções) e lugares notáveis realizados pelo homem ou pela natureza que 
tivessem um valor excepcional do ponto de vista da história, da arte, da ciência, da 
etnologia ou da antropologia. Nenhum desses valores era discutido ou conceituado, 
como se eles fossem autoexplicativos. Por fim, ao invés de ouvir a população para 
 
16 
decidir quais eram os patrimônios e como eles deveriam ser preservados, caberia ao 
Estado, segundo a convenção, “adotar uma política geral que vise dar ao patrimônio 
cultural e natural uma função na vida da coletividade” (UNESCO, 1972). 
Para Smith (2008), a noção de patrimônio como uma “coisa” que deve ser 
protegida pela sua antiguidade, grandeza, representação nacional e valores artísticos, 
históricos e científicos observados por técnicos de instituições patrimoniais 
constituídas por governos ou organismos internacionais fundava o que ela nomeou de 
discurso patrimonial autorizado. Este discurso legitimaria um conjunto de ações que 
se propõe controlado, imparcial, universal e definitivo. 
Todas as informações estariam na obra e a obrigação do Estado seria 
preservá-la, restaurá-la e divulgá-la, como quando utilizada no ensino. O patrimônio 
existiria enquanto a sua materialidade fosse garantida Um dos meios para silenciar as 
vozes dissonantes era o recurso à autoridade: aqueles que detinham o poder e 
condições de dizer o que era patrimônio eram a UNESCO, o ICOMOS, o IPHAN 
(Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), no caso do Brasil, os arquitetos 
e os historiadores especialistas no assunto, reconhecidos pelos seus pares. 
A partir dos questionamentos, que se fortaleceram na década de 1970, sobre a 
não inclusão de manifestações e bens de alguns países e culturas nas listas 
patrimoniais ou então das dificuldades de enquadrá-los nos critérios estabelecidos 
mesmo quando considerados relevantes por grupos sociais, novas discussões 
conseguiram mostrar as limitações e tendenciosidade do discurso e técnicas 
empregados até aquele momento. Primeiro, o patrimônio como “coisa” transformaria 
produtos selecionados de uma cultura em alegorias de valores a serem enaltecidos 
por toda a nação, geralmente com o propósito de naturalizar uma visão de cultura das 
classes dominantes. Segundo, embora atendesse a uma determinada escrita da 
história e a uma formação de memórias artificiais que não são neutras nem 
inofensivas, a justificativa de sua preservação era relacionada à manutenção dos 
vínculos com o passado, sem desdobramentos nos dias atuais. 
Opondo-se a esse mascaramento das relações de força que conduz ao 
reconhecimento de somente um número restrito de bens como “patrimoniáveis”, Smith 
(2008) adotou a concepção de patrimônio como um processo, que não possui uma 
feição acabada, que não pode ser simplesmente encaixotado, restaurado, vendido, 
negociado, em suma, materializado. O patrimônio estaria no fazer, no compartilhar, 
no experimentar, nos conflitos e nas divergências que permitem que alguns bens se 
 
17 
destaquem como gatilhos mnemônicos e provoquem sentimentos de pertencimento e 
de identidade. Desse modo, o patrimônio sempre seria circunstancial, delimitado 
espacialmente e temporalmente, imerso em contestações que colaborariam para a 
seu desenvolvimento e vivacidade. Seu estado estaria em constante revisão no 
presente por aqueles que o promovem, não de maneira institucionalizada ou mesmo 
consciente, mas como resultado dos próprios embates que garantem a sua existência. 
Em resposta às críticas crescentes e como resultado de conferências 
promovidas pela própria instituição, a UNESCO publicou, em 2003, a Convenção para 
a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial. Neste documento, a preocupação com 
o risco de deterioração era menos enfatizada que a necessidade de ser inclusivo, de 
considerar indígenas, grupos minoritários ou mesmo um único indivíduo detentor de 
conhecimentos específicos e tradicionais. Os bens a serem preservados não eram 
mais divididos por tipo de material ou forma física, mas pela sua expressão cultural, 
como rituais, celebrações, técnicas e práticas. A salvaguarda, ao invés de buscar 
impedir mudanças, praticamente congelando os bens para a posteridade, previa, 
primeiro, registrá-los e inventariá-los, para, em seguida, permitir e garantir que eles se 
atualizassem, se modificassem ou mesmo desaparecessem, caso perdessem sua 
função para a comunidade. A condição de patrimônio passou a ser transitória e sua 
atribuição dependente dos posicionamentos de seus promotores. Ainda assim, a 
materialidade não deixou de possuir seu papel para a Convenção, pois as 
manifestações dependeriam de suportes e de uma espacialidade para serem 
realizadas, sendo, portanto, parte da constituição do bem. De acordo com o 
documento, UNESCO (2003), patrimônio imaterial poderia ser entendido como as 
práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas, junto com os 
instrumentos, objetos, artefatos e lugares que lhes são associados, que as 
comunidades, os grupos e, em alguns casos os indivíduos reconhecem como parte 
integrante de seu patrimônio cultural. 
Smith (2008) discorre em seus documentos que ao enfatizar o intangível, a 
Unesco, não estaria ignorando o caráter tangível do patrimônio, mas somente 
desnaturalizando a percepção de que ele é evidente, inato, porém ao propor ser é um 
processo, reforçam, que mais do que simplesmente apontar a existência de um 
patrimônio imaterial, que todo patrimônio é sempre intangível. Sendo assim, de fato, 
nesta perspectiva, ele é um discurso, uma construção. Não que antes não fosse, mas 
o seu objetivo foi mostrar que os bens elevados à categoria de patrimônios atendiam 
 
18 
a uma visão de história, privilegiavam uma cultura específica e que, agora, de forma 
diferente, este processo não apenas poderia ser exposto como o direito das 
comunidades definirem seus próprios patrimônios, de acordo com suas experiências 
e princípios, passou a ser defendido. 
Identifica-se uma recusa dos valores universais e inflexíveis como vinham 
sendo forjados desde a Revolução Francesa. Embora ainda não concretizada, sugere-
se uma definição de patrimônio de baixo para cima, cabendo às instituições nacionais 
e internacionais apenas chancelar as escolhas das sociedades e colaborar para que 
suas decisões sejam respeitadas. 
Como consequência, as escalas local e regional ganharam destaque, já que o 
nacional e o mundial tenderiam a ocultar dissonâncias a favor de uma falsa ideia de 
consenso. Ainda que o monumento antigo fosse dividido em obra comemorativa da 
arquitetura/ escultura e monumento funerário destinado à recordação de uma pessoa 
(LE GOFF, 2003), a noção contemporânea de patrimônio está mais próxima de sua 
etimologia do que dos sentidos adotados e reforçados a partir do século XVIII; de obra 
de excepcional beleza artística, grandiosa, antiga e histórica. 
Segundo o autor, o monumento antigo era intencional, pensado e construído 
para rememorar algo, exaltar a identidade de um grupo. Desta forma, eram seus 
criadores que definiam o que seria um monumento, sem a necessidade de um 
julgamento externo. Já o monumento histórico ou patrimônio adquiriria o seu status a 
partir de uma atribuição posterior, concedida por profissionais autorizados, comoo 
historiador e o arquiteto. Por meio deste raciocínio, Poulot indica que a opção pelo 
culto, preservação ou promoção do monumento/ patrimônio passou dos seus 
idealizadores para os seus observadores/ receptores. 
Com a corrente atual, que não é a única, mas que tem se tornado uma das 
principais ou mesmo a dominante, o patrimônio não tem necessariamente um início, 
como um prédio ou escultura com data de execução, nem depende de uma avaliação 
técnica para ser visto e celebrado como patrimônio. Como o monumento antigo, são 
os seus realizadores, aqueles que desencadeiam o processo, que têm a última 
palavra sobre o que os identificam e fortalecem suas memórias e identidades, sem 
que, necessariamente, seja uma ação planejada, intencional. Mais do que uma nova 
categoria, o de patrimônio intangível, o que presenciamos é uma reformulação da 
própria noção de patrimônio. 
 
19 
Se o patrimônio é um sentido atribuído, um adjetivo, tudo se torna 
potencialmente patrimônio. Hoje, acompanhamos discussões sobre o patrimônio 
cultural, etnológico, material, imaterial, genético, ambiental, local, regional, nacional e 
até mesmo mundial. 
Enquanto o século XX viveu a explosão das memórias artificiais que buscavam 
(re)criar uma tradição e ressuscitar/forjar um sentimento de continuidade entre 
passado, presente e futuro, os novos olhares sobre o conceito de patrimônio 
prometem a inclusão de até mesmo os mais restritos, simples e populares 
manifestações, obras e lugares. 
 
A IMATERIALIDADE 
 
Consideramos que as discussões recentes sobre o patrimônio têm contribuído 
para que o seu conceito seja mais abrangente e maleável, adequando-se a diferentes 
contextos e culturas, além de permitir que comunidades sem grande poder político e 
econômico obtenham reconhecimento e proteção para as suas práticas culturais. As 
críticas à suposta objetividade e cientificidade do discurso patrimonial autorizado, que 
se valia da materialidade dos bens para invocar-se neutro, foram importantes por 
denunciar a exclusão de tudo que não se enquadrava nos parâmetros ocidentais de 
beleza e historicidade. 
Sendo assim, defender o patrimônio como um processo, destacando os 
sentidos elaborados pelo homem/sociedade para nomear e tornar inteligível seu 
entorno, tem colaborado para ampliar a diversidade de bens valorizados e garantido 
a coexistência de mais de um ponto de vista sobre a sua relevância. Vale ressaltar 
que, este enfoque não ignora o papel dos objetos na constituição de patrimônios, 
porém, corre-se o risco de compreendê-los como secundários, inertes, simples 
suportes ou condutores do intangível. Nesta concepção, o material não interferiria nem 
estabeleceria limites aos sentidos do patrimônio, cabendo ao homem, sem qualquer 
restrição ou coerção, decidir sua função no processo. 
Sem abdicar das conquistas atuais, defendemos que a materialidade é 
determinante na produção do sentido e que, antes mesmo de sua interpretação, ela 
já afeta seu observador ou usuário. 
 
 
20 
 
ACOLHIMENTO E REJEIÇÃO DAS PRIMEIRAS INSCRIÇÕES DOS BENS 
IMATERIAIS 
 
O Registro como instrumento legal de proteção de bens de natureza imaterial 
foi elaborado, segundo Márcia Sant’Anna (2006), visando dois princípios. O primeiro 
relaciona-se à natureza processual e múltipla das manifestações desse tipo de bem, 
uma vez que, dotados de forma específica de “transmissão, atualização, 
transformação e apropriação peculiar de recursos do meio ambiente” (SANT'ANNA, 
2006, p. 19), não poderiam ser submetidas ao tombo, e toda a forma de proteção que 
ele enseja. Esse princípio, portanto, não propõe que haja uma contrariedade entre 
patrimônio material e imaterial e que a ligação entre ambos como elementos 
constitutivos de um todo seja ignorada. O objetivo seria destacar e valorizar os 
processos de criação e manutenção, as técnicas de concepção bem como de 
transmissão dos conhecimentos, ao invés dos produtos que representam a expressão 
material desses bens. 
O segundo princípio, diz respeito à substituição da noção de autenticidade pela 
noção de continuidade histórica. Para Sant’Anna (2006) a ideia de autenticidade está 
em direta oposição com a proteção do patrimônio cultural imaterial, e justamente por 
isso, foi que a compreensão de continuidade histórica viria no sentido de garantir um 
acompanhamento periódico da manifestação cultural “para avaliação de sua 
permanência e registro das transformações e interferências em suas trajetórias”. 
(2006, p. 19) A ideia de acompanhamento, portanto, não enseja museificação ou 
verificação de autenticidade, mas surgiu como forma de se compreender os aspectos 
de mudança e transformação dos bens culturais, bem como, colocar o Estado como 
agente que colaborasse com as condições de produção e reprodução desses 
patrimônios culturais. 
Observa-se que segundo Sant'anna (2006) esses dois princípios constituem o 
entendimento de que o patrimônio imaterial não requer proteção e conservação, mas 
identificação, reconhecimento, registro etnográfico, acompanhamento periódico, 
divulgação e apoio. Enfim, mais documentação e acompanhamento que intervenção. 
Dessa forma, pode-se compreender qual o papel do processo de inventariação, 
através da metodologia do Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) e do 
instituto do Registro. 
 
21 
O inventário é uma das fases do processo de Registro, entretanto não é 
utilizado apenas para esse fim. O INRC é um instrumento metodológico que visa o 
levantamento, atualização e organização de dados sobre determinada realidade 
cultural territorialmente delimitada. 
Procurou-se por meio de sua aplicação unificar as informações produzidas ou 
disponibilizadas sobre um bem em questão. São as informações colhidas no 
inventário que possibilitam a identificação das referências culturais, ou seja, os 
aspectos específicos do grupo pesquisado e os elementos que singularizam a suas 
identidades. O INRC foi formulado para tratar dos bens culturais inseridos em uma 
delimitação territorial, como, por exemplo, em um núcleo histórico tombado. Porém 
isso não impede que a unidade referencial se delimite em torno de temas como uma 
manifestação religiosa e suas diversas variantes regionais, como por exemplo INRC 
das Referências Culturais da Festividade de São Sebastião, ou um tipo de 
manifestação com abrangência nacional, como a capoeira. 
O Registro, por sua vez, é o reconhecimento público do Estado sobre 
determinado bem cultural, conferindo-lhe a distinção de patrimônio cultural brasileiro. 
Registro significa a identificação e produção de conhecimento sobre o bem cultural, 
como também o compromisso do Estado e da sociedade em viabilizar formas de apoio 
para garantir sua continuidade. O processo de Registro origina-se por meio de pedido 
formal, encaminhado à presidência do IPHAN, que pode partir do Ministro da Cultura, 
de instituições vinculadas ao MinC, Secretarias Estaduais, Municipais e do Distrito 
Federal, bem como de sociedades e associações civis. 
A solicitação deve conter identificação do proponente, denominação e 
descrição concisa do bem em questão, breve documentação, que de acordo com o 
tipo de bem pode conter fotografias, reportagens, vídeos, bibliografia, e o mais 
importante, uma declaração formal de representante da comunidade detentora 
daquele bem cultural, ou então de seus membros, demostrando anuência e interesse 
no Registro. Após o encaminhamento do pedido é realizada instrução técnica do 
processo, ou seja, produção de conhecimento, que pode se utilizar do INRC como 
instrumento, ou mesmo da pesquisa etnográfica. O prazo de execução desta fase é 
de dezoito meses. O trabalho da instrução resulta em um dossiê que, de forma mais 
aprofundada que o pedido de Registro, apresenta outras referências bibliográficas e 
documentais, material audiovisual produzido, e o mais importante; o conteúdo 
 
22 
produzido pelapesquisa que, dentre outras coisas, traz sugestões de ações de 
salvaguarda para o bem cultural em questão. 
A metodologia do INRC, especificamente, indica que o processo de pesquisa 
envolva pesquisadores detentores dos bens culturais em análise. Essa medida tem 
por objetivo não colocar os detentores desses bens culturais como meros informantes 
no processo de pesquisa, mas como investigadores, agentes analíticos e produtores 
dos conteúdos a serem elaborados, logo, visando não apenas os processos e objetos 
dos bens culturais em questão, mas também seus sujeitos. 
Com a finalização do processo de instrução, o pedido passou, a partir de 2005, 
a ser encaminhado para a Câmara do Patrimônio Imaterial, que é responsável por 
avaliar se o pedido será direcionado para análise do Conselho Consultivo do 
Patrimônio Cultural, se será necessário solicitar adensamento de informações, ou 
então, decide pela sua rejeição. Em mãos do Conselho Consultivo, o pedido e seu 
dossiê são encaminhados a um dos conselheiros, que fica responsável por estudá-lo 
e emitir parecer que, em um segundo momento, será avaliado e debatido pelos demais 
conselheiros. 
Diante dessas considerações, retomo que foi escolhida a análise das atas do 
Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, devido ao fato de as mesmas reunirem, 
além dos pareceres emitidos pelos conselheiros responsáveis sobre os bens culturais 
imateriais em questão, os debates e argumentos elaborados pelos conselheiros, que 
revelam a trama discursiva elaborada a partir da ideia de patrimônio cultural imaterial. 
A metodologia do INRC foi o resultado do amadurecimento de estudos 
realizados a partir dos anos 1990, com o intuito de se desenvolverem novas técnicas 
de inventariação de bens culturais. As primeiras iniciativas de se conceber essa nova 
metodologia remetem ao ano de 1995, realizadas nos núcleos urbanos tombados do 
Serro e de Diamantina-MG e de Vila Boa de Goiás. 
A partir de 1999, foi feita uma parceria entre o Departamento de Identificação e 
Documentação do IPHAN e a empresa de consultoria Andrade e Arantes Projetos 
Culturais, coordenada pelo antropólogo e posteriormente presidente do IPHAN, 
Antônio Augusto Arantes, para que se aprimorasse a metodologia do INRC e, a 
experiência piloto desta parceria foi aplicada junto ao Museu Aberto do Descobrimento 
(MADE) em Porto Seguro/BA. (GARCIA, 2004). 
 
23 
 A metodologia do INRC elaborada pela equipe de Arantes, propôs aliar a 
documentação dos aspectos materiais e imateriais dos patrimônios culturais, 
aproximando o trabalho dos diversos profissionais envolvidos na temática do 
patrimônio, especialmente arquitetos e antropólogos. O objetivo era desenvolver uma 
metodologia capaz de identificar bens culturais diversificados, sendo capaz de 
apreender os diversos sentidos e significados atribuídos a esses bens pelos grupos 
sociais a ele ligados, bem como encontrar maneiras que se adequassem à sua 
preservação. Por conseguinte, foi o produto final da equipe de Arantes, que constituiu 
a versão atual do INRC e que orientou os processos de instrução dos pedidos de 
Registro de bens culturais imateriais. 
Apesar das já mencionadas experiências de aplicação do INRC, a primeira 
experiência de execução de inventários ligados à temática do patrimônio imaterial foi 
a realizada junto à comunidade de Paneleiras de Goiabeiras, no Espírito Santo – bem 
cultural que também obteve o primeiro Registro no livro de Saberes, tal como veremos 
a seguir. 
Decidiu-se organizar essa subseção pela ordem cronológica do Registro dos 
bens culturais que são abrangidos pelo período eleito para essa pesquisa. Por fim, 
apresento os debates sobre as rejeições de proposta de Registro: Enciclopédia Virtual 
Itaú, Talian , dialeto vêneto rio-grandense, um caso controle que, ao contrário dos 
apresentados, foi rejeitado tanto pela área técnica do IPHAN, quanto pelo Conselho 
Consultivo. 
 
CONSERVAÇÃO PREVENTIVA, CIÊNCIA E METODOLOGIA 
 
As ações de conservação preventiva vêm dominando o campo do patrimônio 
cultural não faz muito tempo. A tônica contemporânea em relação a ações 
empreendidas por profissionais que lidam com a preservação de bens imóveis e 
móveis não pode mais prescindir do entendimento proposto pela ciência da 
conservação preventiva. Para Guichen (1995, p. 2) a conservação preventiva significa 
assegurar a sobrevida das coleções patrimoniais e ainda segundo o ICOM CC (2008), 
a ação da conservação preventiva é ampla e ocorre de forma indireta em relação ao 
conjunto total de bens culturais. 
Entretanto, analisando, pode-se questionar se a Conservação Preventiva seria 
uma ciência ou uma metodologia, uma vez que como ciência, segue os estudos já 
 
24 
desenvolvidos há séculos pelos conservadores do patrimônio cultural, cuja origem, 
segundo descreve Carla Coelho (2017), remonta aos trabalhos introduzidos por John 
Ruskin (1819- 1900) e William Morris (1834-1896) na Inglaterra, que buscavam a 
autenticidade dos edifícios e a manutenção regular como melhor forma de preservá-
los. Já como metodologia, alguns autores veem um paralelo entre ela e a medicina 
preventiva (Coelho, 2017). 
Observa-se que não é de hoje que estudiosos do campo da arquitetura e do 
urbanismo, no qual pode-se incluir os que detêm suas investigações e atuações em 
prol do patrimônio cultural, reconhecem uma suposta aproximação entre medicina e 
urbanismo e entre medicina e arquitetura. Por exemplo o arquiteto Le Corbusier (1887-
1965), no livro Urbanismo, lançado em 1925, apresenta um capítulo intitulado 
“Medicina ou Cirurgia”, em que associa essas práticas a algumas ações urbanas 
empreendidas nas cidades francesas, de maior ou menor intervenção, por 
reconhecer, na ocasião, que estavam doentes e que algo precisava ser feito. 
De maneira mais simples, a medicina, como bem sabe-se, está associada à 
prevenção da doença, e a cirurgia, à intervenção clínica. Da mesma forma, segundo 
o arquiteto francês, toda atitude que indicasse planejamento e prevenção das cidades 
estaria relacionada à medicina. E toda ação que se resumisse a rasgos e retalhos no 
tecido urbano da cidade era associada à cirurgia. Diante disso, o mesmo paralelo 
apontado por alguns restauradores à medicina preventiva e à conservação preventiva. 
O que se quer com a medicina é evitar a morte do paciente, mas pode-se fazer 
isso curativa ou preventivamente. Do mesmo modo, podemos salvar uma edificação 
agindo cirurgicamente, o que pode desencadear outras patologias, ou podemos agir 
preventivamente, buscando sua manutenção de forma contínua e sistemática. O que 
vê é que a prática da conservação preventiva requer atitudes e planejamento que 
contribuam para essas ações regulares. Nesse sentido, pode-se pensar a 
Conservação Preventiva como uma metodologia. 
Beatriz Colomina (1997; 2003), apresenta uma aproximação entre medicina e 
arquitetura cuja cumplicidade é reconstruída a cada nova teoria em saúde. Ou, se 
pensarmos bem, a cada nova teoria em arquitetura e urbanismo. Da mesma forma 
Colomina apud Costa (2019), a relação entre a arquitetura e as ciências médicas é 
muito mais íntima do que se pode imaginar, e teria tido início ainda durante o 
Renascimento. A partir da vontade dos médicos de cortar o corpo para poder 
compreender melhor seu interior, tal metodologia de análise teria influenciado os 
 
25 
arquitetos para poderem visualizar os edifícios por dentro (Colomina apud Costa, 
2019). 
Assim desde esta contextualização, a associação com a medicina vem 
ensinando aos arquitetos e urbanistas formas de agir sobre os objetos arquitetônicos 
e sobre a cidade, seja para planejar e projetar de raiz, seja para elaborar projetos de 
prevenção e remodelação. 
Seguindo um método de atuação prioritariamente indireto, a Conservação 
Preventiva pode constar de um conjunto de estratégias estabelecidas de forma 
interdisciplinar, objetivando evitara deterioração e a perda de valor dos bens culturais. 
Associada a essa prática, a mesma política adota outras formas de ação, como o 
Gerenciamento de Riscos, a Conservação Integrada, a Preservação Sustentável, a 
Pesquisa e o Desenvolvimento, e a Educação Patrimonial. 
 
CULTURA, IDENTIDADE E DIVERSIDADE: A IDENTIDADE DE UM POVO COMO 
PATRIMÔNIO NACIONAL 
Como referenciado anteriormente, atualmente a noção de patrimônio não se 
limita a monumentos e coleções de objetos, mas abarca sob o signo do cultural e não 
somente histórico e artístico, as tradições ou expressões vivas herdadas de nossos 
antepassados e transmitidas a nossos descendentes, como tradições orais, artes do 
espetáculo, usos sociais, rituais, atos festivos, conhecimentos e práticas relativas à 
natureza e ao universo, saberes e técnicas vinculados ao artesanato tradicional, bem 
como sítios naturais terrestres e subaquáticos. 
Essa compreensão abrangente de patrimônio construída durante o século XX 
teve a UNESCO como importante espaço e agente. Desde sua fundação, em 1946, a 
instituição se dedicou a promover uma ampla discussão sobre os meios e as ações 
de preservação do patrimônio em todas as nações. Vinculada à Organização das 
Nações Unidas (ONU), se edificou no contexto do pós-guerra e descolonização, 
quando, os países europeus, arruinados economicamente devido às grandes perdas 
nos conflitos das duas grandes guerras, buscavam lidar com sua reestruturação, ao 
passo que, as antigas colônias iniciavam um processo de luta por autonomia e 
independência. 
Com o objetivo de contribuir para assegurar a paz e o bem estar da humanidade 
por meio da cooperação entre as nações do mundo através das esferas da educação, 
 
26 
ciência e cultura, a UNESCO, neste primeiro momento, deu especial atenção ao 
fomento da cooperação internacional no campo das artes e ao estudo da maneira de 
reconhecer as diversas identidades culturais do mundo (LANARI BO, 2003). O trauma 
do pós-guerra impulsionou a busca por soluções para o racismo, o evolucionismo e a 
hierarquização das culturas numa lógica linear baseada em critérios de progresso e 
civilização, todas essas fundamentações que embasaram o genocídio humano 
durante a Segunda Guerra Mundial. 
Vale aqui discutir o conceito antropológico de cultura, visto que foi um 
enunciado importante durante o século XX, seja para superar visões de mundo 
racistas e eugênicas, para as lutas de reconhecimento de identidades, bem como para 
a discussão sobre diversidade e multiculturalismo, enunciados com os quais o 
discurso da preservação e proteção do patrimônio relacionou-se no período. 
Essa tradição antropológica se estabeleceu ante duas perspectivas. O Uma 
renovação dessa visão surgiu com o desenvolvimento da antropologia cultural norte-
americana durante o início do século XX, tendo Franz Boas como figura emblemática 
dessa escola. Boas buscou institucionalizar a antropologia na academia e foi 
responsável pela formação de notáveis pensadores como Louis Kröeber, Edward 
Sapir, Margaret Mead, Ruth Benedict, Melville Herskovits. Dentre os principais 
postulados da visão antropológica que se estabeleceu estava o rechaço às teorias 
evolucionistas precedentes e a separação da esfera biológica na explicação dos 
fenômenos sociais. Ou seja, no que diz respeito às sociedades humanas, raça, quer 
seja numa visão monogenista ou poligenista, não figurava como elemento explicativo 
para a diversidade de fenômenos culturais e linguísticos. A proposta foi entender a 
cultura (ou culturas) cientificamente, e, portanto, como fenômeno universal, porém, 
com variações particulares, que não estão inseridas numa lógica de história unilinear, 
isto é, existem várias culturas com características idiossincráticas e desenvolvimentos 
próprios. (KUPER, 2002) (ORTIZ, 2015) 
Compreende-se, através de trechos da UNESCO (1954), que os bens, móveis 
ou imóveis, que apresentem uma grande importância para o património cultural dos 
povos, tais como os monumentos de arquitetura, de arte ou de história, religiosos ou 
laicos, ou sítios arqueológicos, os conjuntos de construções que apresentem um 
interesse histórico ou artístico, as obras de arte, os manuscritos, livros e outros objetos 
de interesse artístico, histórico ou arqueológico, assim como as coleções científicas e 
 
27 
as importantes coleções de livros, de arquivos ou de reprodução dos bens acima 
definidos. 
Os edifícios cujo objetivo principal e efetivo seja, de conservar ou de expor os 
bens culturais móveis definidos na alínea a) como são os museus, as grandes 
bibliotecas, os depósitos de arquivos e ainda os refúgios destinados a abrigar os bens 
culturais móveis definidos na alínea b) em caso de conflito armado; Os centros que 
compreendam um número considerável de bens culturais que são definidos nas 
alíneas a) e b), os chamados "centros monumentais”. 
Através destes postulados a noção antropológica de cultura e a perspectiva 
relativista são parcialmente incorporadas e assim os símbolos materiais da cultura 
são/devem ser preservados, no entanto, a lógica do primitivo/civilizado foi substituída 
pelo binômio subdesenvolvido/desenvolvido. Cada sociedade deveria ser valorizada 
por seus signos próprios e deveria preservar os elementos que indicam sua 
contribuição para o desenvolvimento do progresso universal. Além disso, retomou-se 
a questão nacional associada a esse amplo conceito de cultura, reflexo da conjuntura 
sócio histórica do período, que em face aos movimentos de independência das antigas 
colônias e da reestruturação dos países europeus no pós-guerra, vincularam cultura 
a identidade. 
Desta forma, os processos de definição e nomeação de patrimônios, sobretudo 
com apoio da ação da UNESCO, refletiram conjunturas nacionais e foram 
retroalimentados sobre o que foi disposto por essa organização, colaborando para a 
construção das nações como comunidades imaginadas. Quando Benedict Anderson 
(1991) propôs que as nações são construções imagéticas de indivíduos que se 
identificam e se entendem ligados por um elo relacionado a uma série de 
características culturais (idioma, tradições, dentre outros), apesar de nunca terem se 
encontrado e provavelmente de nunca terem a oportunidade de fazê-lo, pode-se então 
que a preservação do patrimônio cultural como um discurso e uma ação que colabora 
para a edificação dessa comunidade dita imaginada. 
Compreende-se a partir de então, a noção de patrimônio como bem cultural 
surgindo como importante elemento para a construção de identidades nacionais no 
pós-Segunda Guerra. As criações arquitetônicas, estátuas, mosaicos, cerâmica, 
pinturas, seriam muito mais do que simples ornamentos, eram elementos de um 
arcabouço cultural que colaboraram na construção do elo entre os indivíduos neste 
sistema de comunidades imaginadas. A função da UNESCO, por conseguinte, ao 
 
28 
estabelecer normas de proteção destes patrimônios, seria a de proteger e a ajudar 
com a construção destas comunidades imaginadas. Além do mais, os discursos 
envoltos na proteção desses objetos se fundaram na ideia de que estes eram 
testemunhos da história e cultura de uma nação, perpetuando assim tais identidades. 
O que pode-se perceber que a UNESCO procurou traduzir a ansiedade dos 
países em processo de descolonização em fundamentar os atributos de suas 
nacionalidades, bem como a dos países europeus que saíram em situação 
estruturalmente desvantajosa no pós-guerra, segundo (LANARI BO, 2003). 
Não obstante a discussão sobre as diferenças culturais e superação da noção 
de raça ter sido levada à UNESCO, a concepção de cultura aplicada na época pela 
instituição ainda se vinculava à ideia de que, mesmo admitindo a existência de 
diferentes traços culturais, eram os traços não ocidentais que impediriam o 
desenvolvimento das sociedades, portanto, para atingir o patamar de cultura universal 
as demais sociedades deveriamse adequar aos parâmetros ocidentais. 
Conforme registra Michel Netto (2012), multiculturalismo – a compreensão de 
que as sociedades modernas são plurais visto que diversas culturas convivem em 
conjunto. 
 
O FIM DO SIGNIFICADO DOS CONCEITOS ABSOLUTOS 
 
Considerou-se uma época pós-modernista porque, fazendo confiança na 
ideologia do progresso, a cultura global mais recente sentiu-se capaz de criticar o 
modernismo. Para Dell Upton (1993), os adjetivos tradicional e moderno foram 
inventados pela modernidade. A tradição não existia e foi inventada para 
complementar a modernidade e para combater o medo do que era produzido e 
deixava de ser autêntico, falso. 
Desde há umas décadas que as filosofias pós estruturalistas colocaram 
importantes dúvidas à visão racionalista do progresso e das formas de conhecimento, 
e estas novas visões implicaram o questionar de muitos conceitos. Em 1960, Daniel 
Bell escreveu The End of Ideology. Segundo ele o sistema democrático teria 
suplantado os outros sistemas porque é o sistema ideal e como tal todos os outros 
passariam a ser classificados em relação a esse modelo. Na verdade, o que terá 
acabado foi a crença em que progressivamente se caminharia para o sistema político 
 
29 
e para a ideologia ideal. O que acabou foi um certo conceito de ideologia. Em 1992 
Francis Fukuyama apresentou The End of History and the Last Man. Pensava-se que 
a História era um processo evolutivo baseado unicamente na razão que levaria o 
homem à paz e à prosperidade. 
Como a Guerra Fria tinha terminado teria deixado de haver espaço para a 
História. O que na realidade terá deixado de fazer sentido é o conceito de História 
baseado numa perspectiva racional de progresso. Seguiram-se outras obras 
destinadas a outros “fins” como a de Kenichi Ohmae, The End of the Nation State 
(1995) e o The End of Utopia de Russel Jacoby em 1999. Nesta sequência, Nezar 
Alsayaad2 escreveu The End of Tradition?, em 2004. Uma obra dedicada ao âmbito 
do estudo das formas de construção de habitats e de ambientes tradicionais e portanto 
mais próxima da problemática da tradição e das culturas construtivas. Segundo este 
autor, não foi a tradição que acabou mas o conceito racional e modernista em que a 
tradição é reverenciada como autêntica. Na era da “desterritorialização de identidades 
e lugares devida ao fenômeno da globalização”, a tradição deixou de ser considerada 
como algo que deve ser associado a um lugar ou a uma comunidade determinada. 
Assumindo o fim do seu significado absoluto, a tradição deverá ser considerada como 
um repositório de ideias com valor, que têm que ser conhecidas e preservadas 
(ALSAYAAD, 2004, 12). 
 
ARQUITETURA COMO MONUMENTO PORTADOR DE MONUMENTALIDADE 
 
Mumford (1982), Benevolo (1983) e Rodrigues (2001) observam que a 
monumentalidade nas cidades raramente é tratada de forma teórico-conceitual. 
Mesmo sendo um fenômeno universal, presente tanto nas cidades reais quanto nas 
cidades idealizadas e dos planos não realizados, a monumentalidade em si, como 
opção por um modelo urbano e como elemento denotador de significados políticos, 
econômicos e sociais, raras vezes é o escopo de tratamentos teóricos. Lefebvre 
(1999, p. 46) observa que em toda parte, a monumentalidade se difunde, se irradia, 
se condensa e se concentra. Um monumento vai além de si próprio, de sua fachada, 
de seu espaço interno. 
A monumentalidade pertence a amplitude de um espaço que ultrapassa seus 
limites materiais. Le Goff (1985) busca as origens etimológicas dessas duas palavras, 
monumento e monumentalidade, mostrando as maneiras diferentes como esses 
 
30 
termos têm sido utilizados pelos historiadores ao longo do desenvolvimento da ciência 
histórica. Sobre monumento o autor escreve o seguinte. 
A palavra latina monumentum remete para a raiz indo-europeia men, que 
exprime uma das funções essenciais do espírito (mens), a memória (memini). O verbo 
monere significa ‘fazer recordar’, donde ‘avisar’, ‘iluminar’, ‘instruir’. O monumentum é 
um sinal do passado. O mesmo autor, LE GOFF (1985), recorre às origens filológicas, 
em que o monumento é tudo aquilo que pode evocar o passado, perpetuar a 
recordação. 
Já Rodrigues (2001, p.42) apresenta uma visão mais ampliadas e comenta que 
a monumentalidade se difunde e se concentra nas mais variadas formas, e aqueles 
que habitam as cidades, especialmente, mas não unicamente, os grandes centros e 
capitais, aqueles que convivem, admiram, que se sentem intimidados, e, às vezes, 
se sentem desafiados. 
Para Choay (2001), o monumento assegura e desafia o tempo, pois é a garantia 
das origens e a natureza do seu propósito é essencial, não é somente a de apresentar, 
dar uma informação neutra, e sim a de emocionar, como uma memória viva. O autor 
reforça que, em relação às obras de arquitetura, monumento, designa um edifício 
construído para eternizar a lembrança de coisas memoráveis, ou concebido, erguido 
ou disposto de modo que se torne um fator de embelezamento e de magnificência nas 
cidades. 
Rodrigues (2001, p.42) salienta que a monumentalidade atua na dimensão do 
simbólico, dando visualidade, representando e valorizando as ideias, ações e 
concepções daqueles que a utilizam. Isso porque tem sempre uma razão de ser, a 
qual pode estar bem explicitada ou não. Assim, a ideia de monumento está mais ligada 
ao efeito produzido pelo edifício que ao seu fim ou destinação, ajusta-se e aplica-se a 
todos os tipos de edificações. 
 Conforme o autor supracitado o conceito de monumento configura-se como 
fundamental e útil para alcançar uma definição e um entendimento maior sobre a 
monumentalidade. A monumentalidade (categoria abstrata) ao mesmo tempo que é 
inerente ao monumento (categoria concreta), também o transcende. A 
monumentalidade mostra-se complexa ao limitar-se à realidade empírica imediata. 
Se houver uma indagação maior sobre o seu significado na construção do 
espaço, sua origem e seu papel social na história, a monumentalidade pode até 
aparecer, mas não é óbvia, estando aí talvez a razão de seu limitado tratamento 
teórico. Riegl (1987), também apresenta um conceito amplo de monumento 
 
31 
semelhante ao de Le Goff (1985), apesar de suas análises estarem voltadas 
especificamente para o que chama de o culto moderno dos monumentos, mas em 
linhas gerais, a valorização dos monumentos como representantes de um período 
histórico e da arte, cultura e sociedade a ele correspondentes, que começa na 
Renascença, se afirma no séc. XVIII, e se intensifica no séc. XIX, no ocidente. 
Para Riegl (1987, p. 35) por monumento, no sentido mais antigo e 
verdadeiramente original do termo, entende-se uma obra criada pela mão do homem 
e edificada dentro do fim preciso de conservar sempre presente e vivo na consciência 
das gerações futuros a lembrança de tal ação ou tal vida (ou as combinações de uma 
e de outra). 
Para o autor, todos os tipos de monumentos são dotados de um valor de 
rememoração, seja ele intencional ou não, e seu maior valor estaria na sua 
antiguidade, na sua capacidade de resistência à ação do tempo. 
Segundo Meneguello (2000) o monumento passa a fazer parte da categoria 
dos bens culturais, pois, o sentido de monumento passa a ser reportado a algo 
grandioso (com grandes dimensões) até pequenos casebres, que possuam um valor 
cultural. 
Elsen (1975), Alvarez (1991), Tinniswood (1998) vinculam monumentalidade e 
autoridade ao analisar detalhadamente a simbologia de obras e elementos 
arquitetônicos diversos (como portas, escadas, janelas e outros), construídos e 
utilizados em épocas históricas diferentes, mas que apresentam em comum seus 
valores propagandísticos. Observam que a carga simbólica da arquitetura 
monumental tem servido como publicidade para o poder de governantes e ideologias 
dominantes, havendo, assim, uma coordenação para permitir o triunfo da articulação 
entre a vontade, a forma e seusignificado. 
Além do exposto acima, com o ensaio de Riegl (1987), houve uma importante 
contribuição para a definição conceitual da conservação através de inventários. Como 
esclarece Choay (2001) trata-se da primeira interpretação da conservação dos 
monumentos de acordo com uma teoria dos valores. Esta análise se estrutura em 
torno da contraposição entre duas categorias principais de valores associados aos 
monumentos: os valores memoriais, ligados ao passado e a sua memória, e os valores 
de contemporaneidade, referentes ao momento presente. 
O monumento é um legado à memória coletiva, um legado criado pela mão do 
homem e por ele edificado para carregar consigo toda uma carga de concepções que 
o farão símbolo de uma mensagem que quis ser passada, de um aviso ou de uma 
 
32 
instrução que se desejou transmitir, como defendido por Rodrigues (2001). A categoria 
concreta, empírica do monumento não se limita, então, ao objeto, uma vez que ele 
leva uma carga simbólica, abstrata, sua monumentalidade, a qual tem por função 
trabalhar sobre o imaginário social. Os avisos instrutivos simbolizados no monumento, 
por sua vez, são ditos através de um monólogo: o monólogo do poder. Conforme a 
autora (2001, p. 45) erigido como símbolo transmissor de ideologias dominantes na 
história das sociedades, o monumento, como poder transmutado sobretudo pela 
arquitetura, a única resposta que se espera deve vir sob a forma de respeito, 
admiração e até mesmo medo. A arquitetura encerra em si uma monumentalidade, a 
qual, por sua vez, é transcendente, pois ela não é só mais um objeto presente no 
espaço urbano; ela é ideia, concepção, crença: objetivo simbolizado em objeto-
símbolo, mas capaz de viajar no imaginário. 
 Rodrigues (2001) afirma que toda obra arquitetônica serve de testemunho do 
poder da história de uma sociedade, uma história que deixa legado à memória coletiva 
a fim de tentar perpetuar-se, fazendo recordar às gerações futuras de sua existência, 
e, mais que isso, avisando e instruindo sobre sua força. Sobre essa linha de 
pensamento Riegl (1987) aponta que os valores são vistos em detalhe, como forma 
de identificar as diferentes atitudes de preservação possíveis. No que tange os valores 
ligados ao passado ou valores de rememoração, o autor define: a) Valor rememorativo 
intencional: relacionado ao monumento intencionalmente construído com função 
memorialística; b) Valor histórico: ligado à história em seus vários ramos; c) Valor de 
antiguidade: que representa, simplesmente, o gosto por tudo àquilo que seja antigo. 
Wieczorek (1984) observa que diferentemente do caráter elitista do valor histórico e 
do valor artístico relativo, o valor de antiguidade atinge também às massas. Ou seja, 
que não resulta de interpretações artísticas ou históricas, mas que é adquirido pela 
sobrevivência de um objeto a passagem do tempo, resultando marcas dessa 
passagem que transformam esse sobrevivente em um testemunho e lhe atribuem a 
consequente valoração. 
O que se vê em Riegl (1987), é que a noção de monumento ou o culto dos 
monumentos, vai do valor rememorativo intencional, passando pelo valor histórico, até 
o valor de antiguidade ou a compreensão intuitiva que todo e qualquer um tem das 
marcas da passagem do tempo. Nesta ordem, dos valores citados tem-se a evolução 
dos valores de rememoração no culto dos monumentos. “ A noção de patrimônio, 
com a ideia de posse que lhe é implícita, sugere-nos imediatamente que estamos na 
presença de algo de valor” (Silva, 2000, p. 218). 
 
33 
Valor que os seres humanos, tanto individual como socialmente, atribuem ao 
legado material do passado, valor no sentido do apreço individual ou social atribuída 
à arquitetura numa dada circunstância histórica. Trata-se de um conceito relativo, que 
varia com as pessoas e com os grupos que atribuem esse valor, permeável às 
flutuações da moda e aos critérios de gosto dominantes, matizado pelo figurino 
intelectual, cultural e psicológico de uma época. 
Ter consciência da história não é informar-se das coisas outrora acontecidas, 
mas perceber o universo social como algo submetido a um processo ininterrupto e 
direcionado de formação e reorganização. É exatamente na moldura da consciência 
histórica, apenas, que a identidade passa a ser o eixo de atribuições relativas a um 
ser que se percebe produto de forças em ação e sujeito a mutações. Por isso mesmo, 
não assimila nostálgica ou submissamente um passado de coisas e eventos 
acontecidos, homogeneizado e desfibrado, mas instaura com ele um equilíbrio 
dinâmico: é um interlocutor que o interroga criticamente. 
Em outras palavras, a memória gira em torno de um dado básico do fenômeno 
humano, a mudança. Se não houver memória, a mudança será sempre fator de 
alienação e desagregação, pois inexistiria uma plataforma de referência e cada ato 
seria uma reação mecânica, uma resposta nova e solitária a cada momento, um 
mergulho do passado esvaziado para o vazio do futuro. É a memória que funciona 
como instrumento, Menezes (1984), de identidade, conservação e desenvolvimento 
que torna legível os acontecimentos. 
Nesse sentido, Pollak (1989 e 1992) afirma que a memória é uma operação 
coletiva dos acontecimentos e das interpretações do passado que se quer 
salvaguardar. O autor aponta três elementos constitutivos da memória, quais sejam: 
os acontecimentos vividos pessoalmente, pessoas e personagens e, por fim, os 
lugares. Compreende que a memória, então, se estrutura em torno desses três 
aspectos, com os quais o sujeito pode ter entrado em contato diretamente ou 
indiretamente. Nesse contexto, cabe citar Nora (1993): informações passadas, ou que 
ele representa como passadas. 
Nesse sentido, Pollak (1989 e 1992) afirma que a memória é uma operação 
coletiva dos acontecimentos e das interpretações do passado que se quer 
salvaguardar. O autor aponta três elementos constitutivos da memória, quais sejam: 
os acontecimentos vividos pessoalmente, pessoas e personagens e, por fim, os 
lugares. Compreende que a memória, então, se estrutura em torno desses três 
 
34 
aspectos, com os quais o sujeito pode ter entrado em contato diretamente ou 
indiretamente. 
Nesse contexto, cabe citar Nora (1993) que a razão fundamental de ser de um 
lugar de memória é parar o tempo, é bloquear o trabalho do esquecimento, fixar um 
estado de coisas, imortalizar a morte, materializar o imaterial para prender o máximo 
de sentido num mínimo de sinais, é claro, e é isso que os torna apaixonantes: que os 
lugares de memória só vivem de sua aptidão para a metamorfose, no incessante 
ressaltar de seus significados e no silvado imprevisível de suas ramificações. 
A memória coletiva e memória individual conforme o passado é organizado sob 
a forma de lembrança. Se o passado for resguardado em torno de uma determinada 
pessoa, que vê esse passado do seu ponto de vista, trata-se de uma memória 
individual, interior ou pessoal. Por outro lado, se as lembranças se distribuem dentro 
de uma sociedade grande ou pequena, da qual são imagens parciais, trata-se de uma 
memória exterior ou social (Halbwachs, 2006, p. 102) 
Finalizando Nora (1993, p. 15) que trata da necessidade moderna de eleger 
lugares onde depositar memórias, impor a certos espaços ou objetos a tarefa de 
capturar a memória e deixá-la ali encerrada para a qualquer momento ser despertada 
pelo homem. O autor destaca que a memória é registradora, que delega ao arquivo o 
cuidado de se lembrar por ela e desacelera os sinais onde ela se deposita, como a 
serpente sua pele morta. Dessa forma, é a arquitetura que detêm a memória e que 
media a relação do homem com seu passado, como se a memória não fosse recurso 
suficiente para promover uma conexão direta entre presente e passado. Nora (1993, 
p. 12) reforça que é necessário algum meio material onde alojar a memória e as 
lembranças. 
O passado revela um sentimento de identidade

Mais conteúdos dessa disciplina