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O Discurso de Despedida e a Última Oração de Jesus

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Prévia do material em texto

D. A. CARSON
DE JESUS
EXPOSIÇÃO 
DE JOÃO 14-17
O DISCURSO DE 
DESPEDIDA E A 
ÚLTIMA 
ORACAO
O QUE PODEMOS APRENDER COM 
OS ÚLTIMOS ENSINAMENTOS DE 
JESUS ANTES DA CRUCIFICAÇÃO?
-aJ 
A atmosfera era tensa, infeliz, incerta. São essas as palavras que 
abrem este livro, uma descrição sucinta da última noite de Jesus 
com seus discípulos. Nessa noite, após comer a Última Ceia e 
antes de ser preso, Jesus profere seu “Discurso de Despedida”, 
relatado apenas pelo apóstolo João, numa passagem 
considerada o clímax da história terrena de 
Jesus, o momento decisivo em que a tensão atinge seu ápice 
e começa a se resolver.
Em O Discurso de Despedida e a Última Oração de Jesus, D. A. 
Carson dedica sua atenção aos capítulos de 14 a 17 do 
Evangelho de João e analisa a mensagem final de Jesus a seus 
discípulos, uma mensagem de conforto, promessas, 
encorajamento e esperança. Mesclando academicismo, 
exposição sólida e linguagem em prosa - que em diversos 
momentos faz com que o leitor se sinta parte dos 
acontecimentos Carson explica os ensinamentos de Jesus 
sobre a vinda e a obra do Espírito Santo e, por fim, analisa a 
Oração Sacerdotal de João 17, em que Jesus ora por si mesmo, 
por seus seguidores e, finalmente, por nós.
VIDA NOVA
vidanova.com.br
O /vidanovaedicoes
O ©edicoesvidanova
© ©edicoesvidanova
vidanova.com.br
O DISCURSO DE 
DESPEDIDA E A 
ULTIMA 
ORAÇAO 
DE JESUS
Dados Internacionais de Catalogação na Puhlicação (CIP) 
Ange'lica Ilacqua CRB-8/7057
Carson, D. A., 1946-
O Discurso de Despedida e a Ultima Oração de Jesus : exposição de 
João 14—17 / D- A Carson ; tradução de Thomas de Lima. - São Paulo : 
Vida Nova, 2019.
192 p.
ISBN 978-85-275-0890-2
Título original: The Farewell Discourse and Final Prayer of Jesus: 
an Evangelical exposition ofjohn 14—17
1. Bíblia. N.T. João - Crítica, interpretação etc. I.Título II. Lima, 
Thomas de.
18-2190 CDD 226.5077 
índices para catálogo sistemático
1. Bíblia- N.T. João - Crítica, interpretação etc.
D. A. CARSON
O DISCURSO DE 
DESPEDIDA E A 
ÚLTIMA 
ORAÇAO
DE JESUS
EXPOSIÇÃO 
DE JOÃO 14-17
TRADUÇÃO
THOMASDE LIMA
VIDA NOVA
®1980, de Baker Publishing Group
Título do original: The Farewell Discourse and Final Prayer of Jesus: 
an Evangelical exposition ofjohn 14—17, 
edição publicada por Baker Books, 
divisão do Baker Publishing Group (Grand Rapids, Michigan, Estados Unidos).
Todos os direitos em língua portuguesa reservados por
Sociedade Religiosa Edições Vida Nova
Rua Antônio Carlos Tacconi, 63, São Paulo, SP, 04810-020 
vidanova.com.br | vidanova@vidanova.com.br
1.’ edição: 2019
Proibida a reprodução por quaisquer meios, 
salvo em citações breves, com indicação da fonte.
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
Todas as citações bíblicas sem indicação da versão foram traduzidas diretamente 
da New International Version. As citações com indicação da versão in loco foram 
traduzidas diretamente da King James Version (KJV). O grifo nas citações bíblicas é de 
responsabilidade do autor.
Direção executiva
Kenneth Lee Davis
Gerência editorial
Fabiano Silveira Medeiros
Edição de texto
Leandro Bachega
Rosa Ferreira
Preparação de texto
Danny Charão
Mareia B. Medeiros
Revisão de provas
Gustavo N. Bonifácio
Gerência de produção
Sérgio Siqueira Moura
Diagramação
Claudia Fatel Lino
Capa
Souto Crescimento de Marca
vidanova.com.br
mailto:vidanova@vidanova.com.br
Para
David e 
Joyce Smith.
Sumário
Prefácio ..................................................................................................... 9
1. Prólogo (Jo 13)................................................................................................... 11
2. Uma introdução à fé triunfante (Jo 14.1-14).......................................17
3. A vinda do Espírito da verdade (Jo 14.15-24)...................................... 43
4. Três esclarecimentos (Jo 14.25-31)............................................................65
5. Intimidade espiritual com Jesus Cristo (Jo 15.1-16)...........................85
6. Calculando o custo (Jo 15.17—16.4).....................................................107
7. Dois ministérios especiais do Espírito (Jo 16.5-15)...........................127
8. Mas, primeiro, a cruz (Jo 16.16-33)..........................................................145
9. Jesus ora por si mesmo e por seus seguidores (Jo 17.1-19)..............161
10. Jesus ora por todos os cristãos e pelo mundo (Jo 17.20-26).....181
Prefácio
Durante os últimos oito anos passei mais tempo estudando o Evan­
gelho de João que qualquer outra parte das Escrituras. Isso demons­
trou ser uma lição de humildade. João é simples o bastante para uma 
criança ler e complexo o bastante para exaurir a capacidade mental das 
maiores mentes. Como disse um comentarista, o livro é como uma piscina 
em que uma criança pode brincar e um elefante pode nadar. Não sou um 
elefante; mas tomei consciência dos muitos pontos cuja profundeza está 
além do meu alcance.
Até agora, o que escrevi a respeito desse Evangelho foi preparado para 
o ministro de boa formação ou para o estudante sério e só está disponível 
em publicações ou em livros que não costumam ser lidos pelo leitor comum. 
No entanto, estou cada vez mais convencido de que aqueles de nós que pela 
graça de Deus tiveram o privilégio de passar muito tempo estudando as 
Escrituras devem o fruto de seu trabalho não só à comunidade acadêmica, 
mas também à igreja em geral. Há necessidade tanto das abordagens acadê­
micas como das populares; mas este volume pertence à segunda categoria. 
Ele se originou de uma série de palestras ministradas em várias conferências 
no Canadá e nos Estados Unidos. Estas foram retrabalhadas e reescritas como 
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
ensaios, forma mais adequada à página impressa do que um sermão; no entanto, 
abstive-me propositalmente de eliminar todos os traços da forma anterior.
É comum na comunidade acadêmica afirmar que o Jesus histórico foi 
responsável por muito pouco do ensino registrado em João 14—17. Ficará 
rapidamente óbvio que não sou tão cético. Com alguma hesitação, abstive- 
-me de acrescentar um apêndice para explicar minha abordagem às questões 
histórico-críticas (como fiz em The sermon on the mount: an Evangelical expo- 
sition of Matthew 5—7, também publicado pela Baker);1 e só raramente aludi 
a questões de autenticidade ao longo da exposição. Os interessados em saber 
como eu abordaria tais problemas podem ler “Current source criticism of the 
Fourth Gospel: some methodological questions” (in:Journal of Biblical Literature 
97 [1978]: 411-29), e “Historical tradition in the Fourth Gospel: after Dodd, 
what?” (in: D. Wenham, org., Gospel perspectives [1981], vol. 2.
Renae Grams e Karen Sich datilografaram o texto com exatidão, eficácia 
e animação características; e sou muito grato.
Oro para que estes breves estudos sejam tão proveitosos espiritualmente 
para aqueles que os leem como foram para mim enquanto os preparava. Mas, 
acima de tudo, oro para que este volume encoraje muitos a voltarem repe­
tidamente às próprias Escrituras. Tudo o que nos ajuda a melhor entender, 
obedecer e acreditar na Palavra de Deus contribui para nosso bem-estar eterno; 
mas a fonte última desse bem-estar é tão somente Deus.
Soli Deo gloria.
D. A. Carson, 
Trinity Evangelical Divinity School, 
Deerfield, Illinois, 
fevereiro de 1980
’Edição em português: O Sermão do Monte: exposição de Mateus 5—7 (São Paulo: Vida Nova, 
2019).
1 Prólogo
atmosfera no espaçoso aposento superior era tensa, infeliz, incerta.
A noite havia sido ruim desde o começo. Os discípulos tinham se 
reunido com Jesus, como combinado, e subido ao aposento superior, onde a 
comida já estava preparada. Eles olharam ao redor procurando o servo habitual 
que lhes lavaria os pés; porém, não vendo ninguém, e sendo educados demais 
para mencioná-lo, estiraram-se sobre as esteiras em volta da mesa baixa sem 
dizer nenhuma palavra. Jesus ofereceu a tradicional precede ação de graças, e 
então perceberam que Jesus estava se levantando da esteira. A conversa cessou. 
O Mestre retirou o manto em silêncio. Para a total consternação deles, ele 
se dirigiu ao lavatório, amarrou a toalha à cintura, pegou a grande bacia de 
água e se dirigiu ao discípulo mais próximo.
Mestres não deveriam fazer coisas desse tipo. Nem mesmo os iguais 
deveriam lavar os pés uns dos outros: esse é um trabalho para servos — para 
aqueles da mais baixa posição, aliás. O primeiro discípulo, surpreso demais 
para se mexer, constrangido demais para protestar, sentiu que suas sandá­
lias estavam sendo retiradas e, depois, a água fria e a toalha seca. O Mestre 
passou ao segundo discípulo, e ao terceiro; e durante todo esse tempo o 
silêncio era ensurdecedor.
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
Tipicamente era Simão Pedro quem rompia o silêncio. Enquanto Jesus se 
aproximava para lavar seus pés, Pedro encolheu as pernas e indicou a impro- 
priedade do ato do Mestre com o que julgou ser uma pergunta sagaz:
— Senhor, tu lavarás os meus pés?
Jesus endireitou as costas, olhou-o nos olhos e respondeu calmamente:
— Você não entende agora o que estou fazendo; mais tarde, porém, entenderá.
A voz de Pedro se endureceu; alguém tinha que dizer alguma coisa. Se 
o Mestre não conseguia perceber que estava se rebaixando, Pedro precisaria 
dizer isso a ele.
— Não — ele disse —, tu nunca lavarás meus pés.
Jesus continuava a olhá-lo com olhar inabalável.
— A não ser que eu o lave — ele disse —, você não terá parte comigo.
Confronto aberto. Por um instante o ar parado carregou-se de suspense. 
Jesus não reconhecia que Pedro estava falando por amor? Entretanto, confrontado 
com uma resposta como aquela, Pedro agora hesitava em responder à altura. 
Ele decidiu aproveitar da situação e declarar seu amor de forma diferente.
— Então, Senhor — respondeu ele —, não somente meus pés, mas também 
minhas mãos e minha cabeça.
Isso poderia ter aliviado a situação; mas então Jesus acrescentou algo mais, 
algo que, naquele momento, era altamente enigmático e que reintroduziu o ar 
sombrio e fatídico no aposento. Ele disse:
— Quem se banhou só precisa lavar os pés; seu corpo todo está limpo. E — 
acrescentou, olhando ao redor do aposento —, vocês estão limpos, mas nem todos.
Assim, no silêncio total que se seguiu, ele terminou de lavar os pés deles.
Os discípulos viram Jesus enxugar as mãos, vestir o manto e retomar à sua 
esteira. Incapazes de se entreolharem, constrangidos tanto por si mesmos como 
por seu Mestre, eles estavam silenciosamente gratos pelo hm do episódio. E então, 
de repente, o fim não havia chegado; porque Jesus começou a falar novamente.
— Vocês entendem o que lhes fiz? — ele perguntou.
Eles entendiam bem o suficiente; ele havia lavado os pés deles. Mas então 
começaram a perceber que ele esperava uma resposta mais profunda. O que Jesus 
havia feito foi para dar-lhes um exemplo; e, enquanto percebiam lentamente essa 
verdade, trazida à tona pela pergunta silenciosa, perceberam que suas respostas 
incertas eram confirmadas enquanto Jesus respondia à sua própria pergunta.
— Vocês me chamam “Senhor” e “Mestre” — ele disse —, e corretamente, 
porque é isso que sou. Agora que eu, seu Senhor e Mestre, lavei os pés de vocês, 
PRÓLOGO 13
vocês também devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei o exemplo, para 
que façam como lhes fiz. Em verdade lhes digo que nenhum servo é maior que 
seu mestre, nem é o mensageiro maior que aquele que o enviou. Agora 
que vocês sabem essas coisas, felizes serão se as praticarem.
Esse foi o primeiro episódio constrangedor da noite. Jesus havia falado em 
termos vagos a respeito de traição e outros assuntos sombrios; mas naquele 
momento o que ele estava dizendo não parecia muito coerente. A conversa 
gradualmente voltou ao normal, e o banquete começou. Estranhamente, 
enquanto a atmosfera melhorava, Jesus parecia ficar cada vez mais desanimado, 
profundamente perturbado em seu espírito. A conversa minguou. Aproveitando 
o silêncio, Jesus falou novamente, dessa vez com clareza.
— Em verdade lhes digo — disse ele —, um de vocês me trairá.
A atmosfera instantaneamente voltou a ficar sufocante. O silêncio 
retornou, cobrindo tudo como um cobertor, enquanto os discípulos se entre- 
olhavam, atônitos. Dessa vez não havia nenhuma dúvida quanto ao sentido 
das palavras do Mestre. A única pergunta era qual discípulo Jesus tinha em 
mente. Os olhares ao redor da mesa baixa eram variados: curiosos, inexpressivos, 
assustados. A ceia foi interrompida.
Em uma explosão de perguntas confusas, vários perguntaram incredula- 
mente se era neles que o Senhor estava pensando; e Judas Iscariotes uniu-se a eles.
Pedro recuperou-se primeiro; mas, lembrando-se de que seu último 
desabafo havia recebido uma repreensão um tanto áspera, relutou em lançar a 
pergunta óbvia. Vendo que João olhava para ele, sussurrou a pergunta que agora 
se formava na mente de todos.
— Pergunte de quem ele está falando — gesticulou ele, acenando para João, 
que estava reclinado na esteira ao lado de Jesus.
João, apoiado no braço esquerdo, curvou-se lentamente para trás, para poder 
falar com Jesus. A cabeça de João reclinou-se sobre o peito de Jesus; e então 
João perguntou silenciosamente:
— Senhor, quem é?
Jesus respondeu:
— Aquele a quem eu darei este pedaço de pão que molhei no prato.
Todos olharam para Jesus. Ninguém disse nada. Lentamente, Jesus molhou 
o pão no prato, chacoalhou-o para remover o excesso e ofereceu o pão a 
Judas Iscariotes.
Agora todos olharam para Judas. Não parecia possível que ele fosse um 
traidor. Não havia ele estado com eles desde o começo, pregando e realizando 
14 O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
milagres com os melhores deles? Não havia ele conquistado confiança e respeito 
suficientes para servir como tesoureiro? Era difícil acreditar que Judas poderia se 
tornar um vira-casaca. Quando isso aconteceria? Ou estava Jesus simplesmente 
oferecendo uma advertência e esperando que uma tendência perigosa pudesse 
ser cortada pela raiz com uma palavra afiada, com a exposição pública?
Mesmo assim Jesus ofereceu o pão ajudas. Judas sentiu os olhares. Enver­
gonhado e taciturno, ele nada disse enquanto sua mente frenética examinava o 
que deveria fazer em seguida. Eleja havia feito os preparativos para trair Jesus, e 
agora havia chegado a uma decisão final. Ele havia achado o episódio do lava-pés 
tão humilhante, tão inadequado para um suposto Messias, que percebeu que 
sua decisão de trair Jesus havia sido consideravelmente reforçada. E agora isso! 
A audácia desse Jesus! Mas qual era a intenção de Jesus? Ele o estava advertindo? 
Ou rogando que se recusasse a tomar o pão? Ou denunciando o blefe dele? 
Ou tentando dissuadi-lo por meio da vergonha? Apenas repare no olhar atônito 
e estúpido desses sujeitos — eles não parecem reconhecer que sua vitalidade e 
independência estão sendo castradas por esse Mestre curiosamente cativante, 
mas manso e fraco demais para providenciar a liderança de que a nação precisa.
Firme, decisivamente, Judas esticou o braço e tomou o pão molhado. O 
desafio foi aceito, ou o blefe foi denunciado. Judas atravessou seu Rubicão1 
pessoal, e Satanás se apossou dele.
Então Jesus voltou a falar, dirigindo-se diretamente ajudas:
— O que você está para fazer, faça depressa.
Judas respondeu com silêncio pétreo; todavia, ergueu-se da esteira e pôs-se 
lentamente em pé. Os outros observavam, atônitos, incertos. Não lhes ocorria 
que Jesus estava de fato dizendo a Judas para prosseguir com a traição, para 
traí-lo rapidamente; pois que homem em sã consciência diria isso? Eles não 
podiam imaginar tal coisa, porque continuavam não conseguindo acreditar 
que seu Mestre estava deliberada e decididamente dando todos os passos que 
o levariam à sua própria execução cruel. Incapazes a essa altura de entender a 
necessidade da cruz no plano de Deus e a submissão voluntária de Jesus a esse 
plano, eles não tinham categoriamental em que pudessem colocar os comentá­
rios de Jesus ou com que pudessem dar sentido à ordem de Jesus ajudas. Talvez, 
especulavam eles, Jesus estivesse passando a algum novo assunto. Talvez Jesus
'Referência ao rio Rubicão, na Itália, e ao famoso episódio em que Júlio César, contrariando 
a lei romana de que nenhuma tropa deveria atravessar o rio, avançou com seu exército, vindo 
do norte, em direção a Roma. (N. do E.)
PRÓLOGO 15
estivesse satisfeito com a advertência que tinha dado e agora estava mostrando 
ajudas que em algum sentido ainda confiava em sua aptidão para desempenhar 
as responsabilidades de tesoureiro. Nada estava muito claro.
Judas abriu a porta e saiu; e era noite. Não muito tempo depois, João se 
lembraria das trevas do outro lado da porta aberta e as julgaria adequadas. A 
verdadeira luz que dá luz a todo homem havia entrado no mundo (1.9); contudo, 
aqueles que fazem o mal odeiam a luz e não virão para luz, porque temem que 
seus feitos sejam expostos (3.20). Jesus afirmou ser a luz do mundo (9.5): quão 
apropriado que o traidor da luz saia e adentre as trevas.
Assim que Judas saiu, Jesus começou a falar aos discípulos restantes acerca 
de sua própria partida. Ele falou de forma um tanto enigmática sobre ser glori­
ficado, de deixá-los para trás. Ele os lembrou de amarem uns aos outros e falou 
de forma consoladora do futuro testemunho deles.
No entanto, a maior parte do que ele disse era desconcertante. Eram coisas 
impressionantes de certa forma, e dramáticas, mas não muito compreensíveis. 
O que os discípulos de fato entenderam, e o que os alarmou, foram essas pala­
vras a respeito da partida de Jesus. Finalmente, Pedro não aguentou mais. Ele 
queria respostas claras a perguntas claras, e ele as queria agora. Ele formulou 
sua pergunta francamente e perguntou firmemente:
— Senhor, para onde vais?
Foi assim que o terceiro episódio constrangedor e perturbador começou 
naquela noite. Jesus não aceitou ser pressionado e respondeu de forma calma, 
mas enigmática:
— Para onde eu vou, vocês não podem me seguir agora, mas seguirão 
mais tarde.
Pedro respondeu com outra pergunta:
— Senhor, por que não posso seguir-te agora?
Então, temendo que talvez sua própria lealdade estivesse sendo contestada, 
ele protestou vigorosamente:
— Darei minha vida por ti.
Jesus respondeu:
— Você realmente dará sua vida por mim? Digo-lhe a verdade: antes que 
o galo cante, você me negará três vezes.
Constrangimento, pesar e tristeza podem aguçar os sentidos e marcar detalhes 
de forma indelével na memória. Aquela noite incrível tornou-se eternamente
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
vivida para os discípulos, ainda mais depois da ressurreição, quando puderam 
situá-la em uma perspectiva adequada e apreciar plenamente o que havia acon­
tecido e o que Jesus havia dito. Aquela foi a noite em que Jesus instituiu a ceia 
do Senhor: mas seu significado aguardava os acontecimentos dos próximos 
três dias. As implicações mais completas do lava-pés também ficaram claras em 
retrospecto. Então os discípulos puderam entender melhor que, ao lavar-lhes os 
pés, Jesus forneceu não só um exemplo moral (13.15), mas também um sinal da 
redenção e da purificação que estava prestes a realizar em prol deles (13.10,11). 
Ele não apenas lavou os pés deles com água: muito mais do que isso, em sua 
missão naquele fim de semana ele os lavaria completamente. Mais uma vez, ele 
próprio era a “água viva” que sacia toda sede (4.10, 7.37), e ele haveria de prover 
o Espírito como fonte contínua de “água viva” dentro de cada cristão (7.38).
Naquela noite, Jesus aproveitou os sentidos aguçados dos discípulos para 
discorrer uma última vez acerca de vários temas. Sem dúvida ele retornou a 
muitos dos mesmos temas depois de sua ressurreição (cf. At 1.3), mas explicar 
algumas dessas coisas antes da cruz, mesmo que de forma enigmática, deixaria 
claro para os discípulos que ele não foi apanhado de surpresa. A cruz não era 
um erro nem um plano B, mas parte de sua missão — aliás, a parte central. 
“Contei-lhes agora, antes que aconteça”, disse ele, “para que, quando acon­
tecer, vocês creiam” (14.29).
Talvez um dos aspectos mais incríveis desse “Discurso de Despedida”, 
como ele veio a ser chamado, seja seu começo. E Jesus quem está rumando 
para a agonia na cruz; é Jesus quem está perturbado em seu espírito. Contudo, 
nessa noite, na qual dentre todas as noites teria sido adequado que os discípulos 
o encorajassem e o apoiassem, descobrimos que eles só conseguem enxergar 
sua própria perda. Jesus, portanto, precisa encorajá-los. Na própria noite em 
que provará a morte em prol deles, ele se dirige à perplexidade confusa, à fé 
inconstante, à visão fraca e ao egocentrismo deles; e diz: “Não se perturbe o 
coração de vocês...”.
Uma introdução à fé triunfante
O 
!< O
“Não se perturbe o coração de vocês. Confiem em Deus; confiem tam­
bém em mim. Na casa de meu Pai há muitos aposentos; se não fosse 
assim, eu lhes teria dito. Estou indo para lá preparar um lugar para vocês. 
E se eu for e preparar um lugar para vocês, voltarei e os levarei para 
estarem comigo, para que vocês também estejam onde estou. Vocês 
sabem o caminho do lugar para onde estou indo.”
Tomé disse a ele: “Senhor, não sabemos para onde estás indo; como 
então podemos saber o caminho?”.
Jesus respondeu: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém 
vem ao Pai senão por mim. Se vocês realmente me conhecessem, também 
conheceriam meu Pai. De agora em diante vocês de fato o conhecem 
e o viram”.
Filipe disse: “Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos será suficiente”.
Jesus respondeu: “Você não me conhece, Filipe, mesmo depois de 
eu estar entre vocês por tanto tempo? Todo aquele que me viu, viu o 
Pai. Como você pode dizer: ‘Mostra-nos o Pai’? Você não crê que eu 
estou no Pai e que o Pai está em mim? As palavras que lhes digo não 
são apenas minhas. Antes, é o Pai, vivendo em mim, que está fazendo 
sua obra. Acreditem em mim quando digo que estou no Pai e que o 
Pai está em mim; ou ao menos acreditem na evidência dos próprios 
milagres. Digo-lhes a verdade: todo aquele que tem fé em mim fará o 
que tenho feito. Fará até mesmo coisas maiores que essas, porque estou 
indo para o Pai. E farei tudo o que vocês pedirem em meu nome, para 
que o Filho possa trazer glória ao Pai. Vocês podem pedir qualquer coisa 
em meu nome, e eu o farei”.
Contra o pano de fundo da confusão e da ansiedade dos discípulos, Jesus 
fala de fé serena, de tranquilidade espiritual: “Não se perturbe o coração 
de vocês. Confiem em Deus; confiem também em mim” (14.1). Exigir corações 
tranquilos (14.1a) seria apenas uma provocação cruel ou um conselho vazio não 
fosse o fato de que Jesus também ensina a única base sobre a qual seu povo pode 
realizar esse feito: a fé, fé no Pai e fé no próprio Jesus (14.1b).
18 O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
Se a passagem deve ser traduzida por “confiem em Deus; confiem também 
em mim” ou “vocês confiam em Deus; confiem também em mim” é de certa 
forma secundário; porque em ambos os casos Jesus está se associando diretamente 
a Deus. Todo judeu do primeiro século sabia que era seu dever confiar em Deus; 
todavia, que um homem exorte os outros a confiarem nele da mesma forma 
que devem confiar em Deus precisa ser interpretado, tanto hoje como naquela 
época, como reivindicação de divindade. Que um homem diga “confiem em 
mim” em um contexto tão absoluto é ou sublime ou ridículo: não há meio-termo. 
Um homem que é apenas um homem não merece tal confiança, e uma hora ou 
outra a frustrará; um homem que também é Deus não só merece tal confiança, 
mas não lhe é possível frustrá-la.
Tendo por base a confiança em Deus e em Jesus, os discípulos não devem 
se perturbar. Tanto a soberania como a bondade de Deus e de Jesus estão 
pressupostas. Eles têm o poder de realizar aquilo que querem, e o bem-estar 
dos discípulos está em seu coração: caso contrário, não se poderia acreditar que 
são confiáveis em sentidotão absoluto.
Sem dúvida essa exortação pode se aplicar com proveito aos cristãos de 
todas as épocas que passam por ansiedades e tribulações estarrecedoras. Em outra 
passagem do Novo Testamento, Paulo generaliza essa exortação ao escrever: 
“Não andem ansiosos por coisa alguma, mas em tudo, mediante oração e 
súplicas, com ação de graças, apresentem seus pedidos a Deus. E a paz de Deus, 
que excede todo o entendimento, guardará o seu coração e a sua mente em 
Cristo Jesus” (Fp 4.6,7). No contexto do Discurso de Despedida, no entanto, o 
encorajamento de Jesus tem o propósito de atender a uma situação específica. 
Não só os incidentes dolorosos da Ultima Ceia — o lava-pés, a partida de Judas, 
a predição da covardia de Pedro — causaram mal-estar nesses homens; pior 
ainda, Jesus especificamente lhes disse que está prestes a partir e a deixá-los. 
“Meus filhos”, disse ele, “estarei com vocês apenas mais um pouco. Vocês me 
procurarão e, como eu disse aos judeus, agora digo a vocês: Para onde eu vou, 
vocês não podem ir” (13.33).
Incapazes de compreender que a partida de Jesus para longe deles é seu 
retorno à glória que é dele por direito, por meio da cruz e do sepulcro, os discí­
pulos afundam em tristeza, temendo que estejam prestes a ser abandonados. 
Nós também talvez vaguemos vez ou outra no pântano do desespero e nos 
sintamos abandonados; mas a situação em João 13 e 14 é única. A sensação de 
abandono experimentada pelos discípulos foi incitada por um acontecimento da
UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE
história da redenção impossível de ser repetido: a partida física de Jesus Cristo 
por meio da cruz. Portanto, embora os discípulos precisassem da exortação 
geral de confiar em Deus e de confiar em Jesus, precisavam de algo mais: eles 
precisavam de instruções adicionais, de uma explicação mais detalhada do signi­
ficado dos acontecimentos prestes a ocorrer. Mesmo que continuassem incapazes 
de absorver todos os detalhes até que aquele fim de semana épico houvesse 
transcorrido, as palavras de Jesus forneciam não só algum alívio imediato, mas 
também o quadro que no fim das contas conferia sentido aos acontecimentos 
mais importantes de toda a História.
Em outras palavras, o Discurso de Despedida não deve ser tratado de 
forma simplista, como mero conforto cristão criado para consolar santos 
derrotados. Em vez disso, ele é antes de mais nada uma exposição do signifi­
cado da “partida” de Jesus para o Pai por meio da cruz. Trata-se de teologia 
elementar; e é só nesse sentido que ele oferece encorajamento e consolação. Para 
os cristãos atribulados, há pouco conforto genuíno que esteja separado do 
significado dos acontecimentos daquele fim de semana em Jerusalém e arre­
dores, quase dois mil anos atrás. Isso era especialmente verdade para aqueles 
primeiros cristãos, cuja angústia mostrou-se particularmente aguda pelo fato 
de eles próprios participarem desses acontecimentos e serem tragados por eles. 
Entretanto, também para os cristãos de hoje a melhor forma de descobrir fé e 
firmeza renovadas não é apegar-se a aforismos espirituais isolados e a clichês 
evangélicos, mas, sim, voltar a uma compreensão profunda da estrutura histó­
rica e redentora de sua fé.
Dentro desse quadro, Jesus fornece um conteúdo em que seus seguidores 
podem crer (14.2-7): ele enuncia verdades em que precisam acreditar para que 
sua fé seja triunfante e seu espírito fique tranquilo. Infelizmente, os discípulos 
entendem pouco do que é dito, porque já se equivocaram em relação a quem Jesus 
é. As implicações profundas da exortação: “Confiem em Deus; confiem também 
em mim" (14.1) não foram minimamente captadas por eles; portanto, Jesus precisa 
repassar alguns de seus ensinamentos anteriores e fornecer uma lição para alunos 
que demoram a aprender a respeito de quem ele realmente é (14.8-14).
Algumas verdades para acreditar (14.2-7)
Jesus estabelece três verdades em que certamente é preciso acreditar para que a 
fé dos discípulos se mostre triunfante:
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
1. Jesus não está simplesmente indo embora; ele está, na verdade, indo para a 
casa espaçosa de seu Pai — e está indo para preparar um lugar para seus seguidores. 
“Na casa de meu Pai há muitos aposentos; se não fosse assim, eu lhes teria dito. 
Estou indo para lá preparar um lugar para vocês” (14.2).
A KJV promete “muitas mansões” em vez de “muitos aposentos”; e sem 
dúvida a perspectiva de uma mansão eterna é mais atraente que a perspectiva 
de um aposento eterno. A palavra mansão inspirou um bom número de hinos 
que retratam o júbilo eterno em categorias em geral materialistas: “Tenho uma 
mansão logo depois do pico da montanha”, nós cantamos, mal conseguindo 
impedir nossa imaginação de contar os mordomos a nosso dispor. “Tenda ou 
cabana, que me importam? / Estão construindo um palácio para mim.” Aqui 
nós até promovemos a “mansão” a “palácio”.
A palavra usada no texto original é extremamente rara; mas ela é empregada 
em outra passagem do Novo Testamento — nesse mesmo capítulo, 14.23. Nesse 
versículo aprendemos que o Pai e o Filho, por meio do Espírito Santo, farão sua 
“morada” (KJV) ou “habitação” no cristão. A NIV de forma agradável, traz: 
“viremos [...] e faremos nossa morada nele”. A palavra em questão não deveria 
suscitar imagens de uma suntuosa propriedade rural. É um termo neutro, que 
significa morada, habitação, lugar para morar. Certamente seria uma metáfora 
bastante forçada falar em muitas mansões em uma casa.
Contextualmente, é óbvio que os discípulos não estão preocupados a essa 
altura com a fortuna de sua herança eterna. Eles estão aborrecidos com a pers­
pectiva de perder Jesus. A essência da garantia que ele lhes dá é que, embora 
esteja voltando para a casa de seu Pai, ele um dia se unirá a seus discípulos 
novamente. O retorno à casa de seu Pai não é um retiro de esplêndido isola­
mento, mas uma jornada para preparar o lugar para seus seguidores. “... Se 
não fosse assim”, ele os repreende gentilmente, “eu lhes teria dito...” — como 
se quisesse dizer que apenas uma forma grosseira de incredulidade imaginaria 
que Jesus pudesse de qualquer modo abandonar seus seguidores. Como se 
atrevem a pensar que ele poderia demonstrar ser tão inconstante quanto eles? 
Sua integridade é tal que, caso seu propósito último tivesse sido deixar seus 
seguidores sozinhos, ele lhes teria dito.
A verdade é que Jesus havia falado repetidamente aos seus discípulos a 
respeito de sua partida; mas, como no caso de tantas coisas que ele ensinou, 
a mentalidade deles impediu que captassem o que estava dizendo antes dos 
acontecimentos a que se referia. “O que acontecerá se vocês virem o Filho 
21UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE
do homem subir para onde ele estava antes?” (6.62), perguntou ele certa vez. 
Mesmo para os fariseus, ele declarou: “... Estou com vocês apenas por pouco 
tempo e logo irei para aquele que me enviou. Vocês procurarão por mim, mas 
não me encontrarão; e para onde estarei vocês não podem ir” (7.33,34, cf. tb. 
8.21). Naquela mesma noite, depois de Judas Iscariotes ter deixado o aposento, 
Jesus disse a seus discípulos: “Meus filhinhos, estarei com vocês apenas mais 
um pouco. Vocês procurarão por mim e, como eu disse aos judeus, agora lhes 
digo: Para onde eu vou, vocês não podem ir” (13.33). No entanto, agora ele 
lhes dá a garantia de algo adicional: sua partida tem o propósito de estabe­
lecer para eles habitações permanentes na própria presença de Deus. Essa é a 
verdade acerca da partida dele. Se acreditarem nela, a fé deles triunfará sobre 
suas dúvidas e sua mente atribulada. Tal fé dissiparia as suspeitas insistentes 
de que estavam sendo abandonados. Aliás, como homens que tinham todas 
as razões para confiar em Jesus assim como confiavam em Deus podiam se 
rebaixar a ponto de achar que a partida dele não era para o bem supremo deles?
A própria expressão “a casa de meu Pai” faz pensar na presença de Deus. 
Quando limpou o Templo, Jesus usou a mesma expressão: "...Tirem isso 
daqui! Como se atrevem a transformar a casa de meu Pai em um mercado?!” 
(2.16; cf. Lc 2.49). Ali, no entanto, “a casa de meu Pai” referia-se ao templo. 
Mas o templo não era entendido como o lugar onde os homens podiam entrar 
na própria presença de Deus por meio de sacrifícios oferecidos para expiar o 
pecado? Prevendo que o sacrifício definitivo era ele próprio, Jesus uma vez 
afirmou que o verdadeiro templo era nada menos que seu próprio corpo (2.21). 
Semelhantemente, embora “a casa de meu Pai” fosse uma descrição adequada 
do templo à medida que ele servia como ponto focal do encontro entre Deus 
e o homem, ela podia aplicar-se mais plenamente ao céu, a casa de Deus, e à 
esperança última do povo de Deus, a promessa da visão beatífica. “Aposentos” 
em tal casa significa nada menos que o puro júbilo de habitar para sempre no 
esplendor manifesto da glória de Deus.
Os cristãos não devem perder de vista essa perspectiva de longo alcance. 
Vivemos em uma época em que somos lembrados continuamente de nossos 
privilégios e de nossas responsabilidades temporais como cristãos: desfrutamos 
de vida abundante agora e precisamos lembrar de ajudar os pobres, buscar 
justiça para todos, insistir na integridade e demonstrá-la em nós mesmos. Tais 
lembretes são importantes precisamente porque é possível, em sentido superficial, 
ter uma mentalidade celeste que, contudo, seja moral e socialmente inútil. Ao 
mesmo tempo, os cristãos precisam evitar identificar os objetivos do reino de
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
Deus com objetivos políticos, econômicos ou sociais; ou, mais precisamente, 
essa identificação nunca deve ser exclusiva. Assim como o reino de Jesus Cristo 
não é deste mundo (18.36), ele também não está restrito a este mundo. Nosso 
objetivo último não é a transformação da sociedade, por mais valioso que isso 
possa ser. Nosso objetivo último é a adoração pura na presença irrestrita de Deus.
Essa perspectiva, e somente ela, é poderosa o bastante para nos conclamar à 
obediência incondicional. Tal ponto de vista eterno nos capacita a sermos mais 
úteis em nossa sociedade do que seríamos de outra maneira; porque, ao seguir um 
Mestre exaltado, aprendemos alguma coisa sobre servir, enquanto caminhamos 
em uma atitude de autonegação que se recusa a construir um império pessoal. 
A construção de impérios é uma tentação tão comum para os idealistas que os 
revolucionários de hoje costumam se tornar os tiranos de amanhã. O cristão 
tem o potencial de escapar dessa armadilha porque seu objetivo mais elevado 
transcende o meramente temporal. Ele louva a integridade aliada à mansidão 
porque reconhece que essas graças são dons do Mestre, que as exemplificou.
Essa perspectiva é pressuposta pelo texto, embora não seja elaborada. O obje­
tivo de viver para sempre com Jesus na casa de seu Pai é concedido aos primeiros 
discípulos de Jesus e é concedido também a nós. O perigo que enfrentamos, não 
partilhado por eles, é que fiquemos tão confortáveis enquanto nos regalamos nas 
bênçãos que Deus já nos deu que percamos o gosto por coisas mais excelentes. 
Acabamos deixando de nos importar o suficiente com o fato de que Jesus pode nos 
abandonar — agora, não para ir à cruz, mas no sentido de deixar de nos ensinar 
que dependemos dele. Pior, podemos não desfrutar de nenhuma expectativa 
ansiosa pela eternidade; podemos deixar de exclamar com os cristãos de todas 
as épocas: “Vem, Senhor Jesus!”. O status quo é o desejável, não a consumação.
A ironia é que o amor por nossos privilégios não produziu, em geral, 
uma fé mais triunfante, uma serenidade mais espiritual do que seria o caso se 
a situação fosse outra. Bem pelo contrário: fomentamos uma geração neuró­
tica de insatisfeitos. Da mesma forma que os primeiros discípulos de Jesus 
precisavam confiar em Jesus e acreditar que sua partida era para o bem eterno 
deles, nós hoje precisamos confiar em Jesus e acreditar que sua partida, agora 
longínqua, é para o nosso bem eterno. Em ambos os casos, é a perspectiva de 
longo alcance que confere estabilidade à fé.
A verdadeira base da fé estável pode ser mais bem compreendida após o 
exame da oração gramatical a seguir. Jesus diz: “... Estou indo para lá preparar 
um lugar para vocês”. O texto grego subjacente precede essas palavras com 
UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE 23
um “porque” causai: isto é, “na casa de meu Pai há muitos aposentos (as pala­
vras seguintes, “se não fosse assim, eu lhes teria dito”, são parentéticas); porque 
estou indo para lá preparar um lugar para vocês”. O “há” na primeira parte do 
versículo, como frequentemente é o caso no Evangelho de João, é proléptico 
(antecipatório). Podemos traduzir a ideia assim: “Na casa de meu Pai haverá 
muitos aposentos; porque estou indo para lá preparar um lugar para vocês”.
Mas o que Jesus está realmente preparando, e por que está demorando 
tanto? Os primeiros poucos versículos desse Evangelho já insistiram que a 
Palavra pré-encarnada foi o agente de Deus na criação. Se ele podia com suas 
palavras fazer irromperem novos mundos, por que demorou tanto para preparar 
uns poucos quartos?
A resposta fica óbvia quando examinamos de perto as palavras de Jesus da 
forma que João as relata: “Estou indo para lá preparar um lugar para vocês”. 
Nesse Evangelho, as descrições da partida de Jesus — também chamada sua 
ida, seu retorno ao Pai, sua glorificação, sua ascensão — referem-se todas ao 
mesmo acontecimento: seu retorno ao Pai por meio da cruz e da ressurreição, 
com todo o significado redentor compreendido por esse retorno. Em 14.2, 
portanto, Jesus não está, com efeito, dizendo: “Estou retornando à casa de meu 
Pai para que, depois de chegar lá, eu possa preparar o lugar para vocês”; mas, 
na verdade: “Estou retornando à casa de meu Pai para que este próprio retorno, 
esta jornada redentora, seja a forma de preparar o lugar”. Em outras partes do 
Novo Testamento, lemos a respeito da atividade do Jesus exaltado: ele é agora 
o rei mediador por meio de quem toda a soberania de Deus é exercida (lCo 
15.24ss.), o sumo sacerdote com o sacerdócio permanente que sempre vive para 
interceder por seu povo (Hb 7.24,25). Mas essa atividade provavelmente não está 
em vista em João 14. Antes, a “ida” de Jesus tem em si mesma o propósito de 
preparar um lugar para seus seguidores, e parte disso é preparar seus seguidores 
para o lugar, como bem disse Agostinho.
A fé daqueles primeiros cristãos era estável e forte uma vez que se baseava 
tanto em Jesus como em Deus, pela crença de que a partida de Jesus era um 
retorno à presença de seu Pai, um retorno que em si mesmo abria a casa do 
Pai para eles. A fé dos cristãos no século 21 será estável e forte à medida que 
se basear tanto em Jesus como em Deus, pela crença de que a partida de Jesus 
por meio da cruz, hoje um acontecimento há quase dois mil anos no passado, 
foi seu retorno triunfante ao Pai e o meio pelo qual nunca precisamos temer 
o abandono. Podemos exultar porque Jesus foi embora para preparar um lugar 
24 O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
para nós, e essa perspectiva de longo alcance, essa expectativa de júbilo eterno, 
faz com que nossos temores efêmeros sejam absorvidos pela serenidade da 
fé. Exultamos com Paulo: “Aquele que não poupou seu próprio Filho, mas o 
entregou por todos nós — como também não nos dará graciosamente, junto 
com ele, todas as coisas?” (Rm 8.32).
Há uma segunda verdade que nos ajuda a estabelecer a fé triunfante:
2. Jesus voltará para os seus. Ele promete: “E se eu for e preparar um lugar 
para vocês, voltarei e os levarei para estarem comigo, para que vocês também 
estejam onde estou” (14.3).
Esse versículo inspirou muitas interpretações mutuamente excludentes. 
Como a ida de Jesus é uma referência à sua morte, alguns argumentam que sua 
promessa de voltar é uma alusão à sua ressurreição. Essa interpretação falha em 
dois pontos: primeiro, a ida de Jesus inclui uma referência à sua morte, mas não se 
restringe a isso— em última instância ele está indo por meio de sua morte ao seu 
Pai (17.13). Portanto, não é óbvio que “voltarei” deva ser restrito à ressurreição. 
Segundo, Jesus promete voltar e levar seus discípulos para estarem consigo. Não é 
óbvio que qualquer coisa desse gênero tenha se seguido à ressurreição. Por razões 
semelhantes, não é muito satisfatório julgar que a volta de Jesus seja simplesmente 
sua vinda na presença do Espírito Santo (como mais tarde em 14.23).
Outros defenderam vigorosamente que a volta de Jesus é a promessa de que 
ele retornará para os seus discípulos quando eles morrerem e os levará consigo 
para estarem com ele. A passagem é frequentemente lida em funerais cristãos, e 
provavelmente esse é o conforto que tal leitura pretende transmitir. Essa inter­
pretação é possível; mas não é de forma alguma persuasiva. O texto não fala 
em parte alguma da morte dos discípulos, nem sequer a sugere. Em nenhuma 
parte do Evangelho de João ou de suas epístolas há qualquer enunciação clara 
dessa doutrina; portanto, não temos nenhuma garantia de que esse era o tipo de 
coisa que interessava a João e que ele teria registrado ou a que ele teria aludido.
E melhor tomar a promessa como uma referência à segunda vinda: 
Jesus retornará para buscar os seus e levá-los para estarem com ele. Ele não 
está apenas indo embora; ele está voltando. João aborda esse tema em outras 
passagens, tanto explícita (e.g., 21.22) como implicitamente, em referências 
à ressurreição, ao juízo final, ao último dia, e assim por diante (e.g., 11.24,25; 
6.54; ljo 4.17).
Isso é mais que uma mera esperança distante. A natureza intensamente 
pessoal da promessa precisa ser percebida: “Estou indo para lá preparar um lugar 
UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE 25
para vocês [...] E [...] voltarei e os levarei para estarem comigo, para que vocês 
também estejam onde estou". É a sensação de serem abandonados que perturba 
os discípulos, e Jesus responde que sua partida é uma preparação necessária para 
que os discípulos se unam a ele. E não somente isso, ele voltará para eles. Os 
discípulos não suportavam a ideia de perdê-lo, e ele garante que não o estão 
perdendo — eles o estão ganhando.
A esperança suprema da igreja sempre foi o retorno de Jesus Cristo. Entre­
tanto, ao contemplar essa feliz perspectiva, não devemos jamais perder de vista o 
fato de que o objetivo é estar com Cristo. E verdade que a segunda vinda promete 
ser um fim para a História como a conhecemos e constitui uma garantia de que 
o caos moral e a rebelião humana não prevalecerão no final. E verdade que rece­
bemos, dessa forma, a garantia de que a História não está fora de controle nem é 
desprovida de sentido. Mas é preciso não se esquecer da maior fonte de conforto 
para todos: a perspectiva de estar com Cristo. Não surpreende que Jesus coloque 
tamanha ênfase nas implicações pessoais de sua volta. A consumação em si mesma 
seria um triunfo vazio se Jesus não estivesse ali.
Do mundo os prazeres fugazes 
seriam mar turbulento, 
o céu, ele próprio sem ti, 
como as trevas da noite seria.
Cordeiro de Deus! Tua glória, 
é a luz do céu.
Cordeiro de Deus! Tua glória, 
é a vida do amor.1
Os cristãos serão serenos e estáveis em sua fé quando confiarem em Jesus assim 
como confiam em Deus e direcionarem sua atenção, suas aspirações e seus 
valores à volta de Jesus e à perspectiva abençoada de desfrutar de sua presença 
para sempre.
3. Os seguidores de Jesus sabem o caminho do lugar para onde ele está indo 
(14.4-7). Essa é a terceira verdade que precisa ser entendida e apreendida. Jesus 
diz: “Vocês sabem o caminho do lugar para onde estou indo” (14.4). (Deve-se 
preferir essa à variante textual refletida na KJV: “e para onde eu vou vós sabeis, 
e o caminho vós conheceis”). Jesus está dizendo algo semelhante a isto: Agora,
'D. A. McGregor (1847-1895). 
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
com base em tudo o que lhes contei, vocês certamente sabem que o caminho 
para a casa de meu Pai é, para mim, tanto o caminho da vergonha e crucificação 
como o caminho da glória e ressurreição. Eu falei repetidamente a respeito de 
“ser elevado”, de ser traído, de morrer: assim, vocês precisam aceitar o fato de 
que, embora eu agora fale de ir para meu Pai, estou indo por meio da cruz. É 
para esse caminho que agora estou indo. Isso vocês sabem.
É Tomé quem faz a pergunta, mas provavelmente outros a fizeram 
mentalmente: “... Senhor, não sabemos para onde você está indo; como então 
podemos saber o caminho?” (14.5). Em certo sentido há algo atraentemente 
direto nesse homem, Tomé. Pensamos nele como aquele que duvida, por causa 
de seu ceticismo rígido logo depois da ressurreição (20.24-29); mas, mesmo 
naquela ocasião, não está de modo algum claro se outro discípulo qualquer 
teria se saído minimamente melhor caso tivesse estado ausente e perdido a 
primeira aparição pós-ressurreição de Jesus aos discípulos reunidos. Vale a 
pena lembrar que esse mesmo Tomé está preparado para enfrentar a morte 
com Jesus: “Vamos também [à área de Jerusalém], para morrermos com ele” 
(11.16). Ele é um homem franco que encara o medo, a dúvida e a confusão 
de forma direta. Ele se recusa a blefar ou a ostentar um rosto piedoso e assentir 
sabiamente como se entendesse aquilo que não entende. O que ele diz, efeti­
vamente, é isto: Veja, você está nos dizendo que conhecemos o caminho para 
onde está indo. Estou lhe dizendo que nós nem sequer sabemos para onde 
você está indo; então, como poderiamos saber o caminho para lá?
A objeção de Tomé é ainda mais ignorante do que ele pensa. Jesus vem 
falando a respeito de ir ao Pai e do caminho que ele mesmo precisa trilhar para 
chegar lá. Tomé afirma que não sabe nem para onde Jesus está indo nem o 
caminho — dando a entender que o caminho que Jesus trilhar para chegar onde 
quer que ele esteja indo também será o caminho que os discípulos precisarão 
trilhar para segui-lo até lá. Como podem eles saber como seguir Jesus até a casa 
de seu Pai se eles não sabem o caminho para lá? Assim, Tomé não distinguiu 
entre o caminho que Jesus precisa trilhar para voltar ao Pai e o caminho que os 
discípulos precisam trilhar para se unirem a ele. Esse é o mesmo tipo de erro 
que Pedro cometeu alguns minutos antes, quando perguntou impulsivamente: 
“... Senhor, por que não posso segui-lo agora? Darei minha vida por você” 
(13.37). Muito pelo contrário: Jesus daria sua vida por Pedro, e o ato redentor 
abriria o acesso ao único caminho pelo qual Pedro um dia seguiría Jesus até a 
presença do Pai.
UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE
Jesus, sensível ao engano de Tomé, para de falar de seu próprio caminho até 
o Pai, o caminho da cruz, e responde à pergunta de Tomé contando-lhe acerca 
do caminho que os discípulos precisam percorrer: “Eu sou o caminho”, responde 
ele, “a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai senão por mim” (14.6). Assim, 
uma das maiores afirmações das Escrituras Sagradas é enunciada pelo Mestre, 
suscitada pela incapacidade dos discípulos de captar o que ele vinha ensinando.
Trata-se de uma afirmação incrível. “Eu sou o caminho” — dito por alguém 
cujo caminho era a vergonha ignominiosa da cruz romana, a morte dos crimi­
nosos desprezados e degradados. “Eu sou a verdade” — dito por alguém prestes 
a ser condenado por testemunhas mentirosas, alguém que, em geral, não era 
acreditado por seu próprio povo, por sua própria família. “Eu sou a vida” — 
enunciado por alguém cujo cadáver espancado em breve descansaria em um 
sepulcro escuro, selado pelas autoridades.
Há glória nesse paradoxo e bastante espaço para meditar em adoração. Como 
o caminho de Jesus era a cruz, ele próprio tomou-se o caminho para outros. 
Como Cordeiro de Deus, ele retirou o pecado do mundo (1.29); como Bom 
Pastor, ele deu sua vida pelas ovelhas (10.11). O cordeiro morre, o mundo vive. 
O pastor morre, as ovelhas vivem. Jesus é a porta pela qual os homens entram e 
encontram a vida (10.9; cf. Hb 10.19,20); ele é o caminho deles. O caminho de 
Jesus éa cruz: o caminho dos discípulos é Jesus. Não surpreende que os primeiros 
cristãos fossem chamados “seguidores do Caminho” (At 9.2; 22.4; 24.14).
Aquele que foi traído por um apóstolo, renegado por outro apóstolo, aban­
donado por todos eles, condenado por testemunhas mentirosas era a verdade. 
Não lemos simplesmente que aquilo que ele diz é verdade, mas que ele próprio 
é a verdade. Ele é a verdade encarnada, assim como é o amor e a santidade 
encarnados; porque ele é a Palavra encarnada. “...A Palavra se fez carne e viveu 
por um tempo entre nós. Vimos sua glória, a glória como do Unigênito que 
veio do Pai, cheio de graça e verdade” (1.14). “Pois a lei foi dada por meio de 
Moisés; graça e verdade vieram por meio de Jesus Cristo. Ninguém jamais viu 
a Deus, mas o Deus Unigênito, que está ao lado do Pai, o tornou conhecido” 
(1.17,18). João não está nos dizendo que os escritos de Moisés não eram verda­
deiros, nem que fossem outra coisa que não a Palavra de Deus. Mas, por mais 
que a Lei tenha sido revelada por Deus, ela não era o desvelamento do próprio 
Deus, a revelação da graça e da verdade encarnadas.
Nas férias de Natal de 1963, eu trouxe para casa, na região de Ottawa, 
um amigo que eu havia conhecido e apreciado na universidade que estava 
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
frequentando. Mohammed Yousuf Guraya era paquistanês, muçulmano devoto, 
amigo gentil e sensível. Ele estava tentando me converter ao islã; eu estava 
tentando convertê-lo a Cristo. Ele havia começado a ler o Evangelho de João 
quando o levei para visitar os edifícios do parlamento de Ottawa. Desfrutamos 
de uma visita guiada àquelas estruturas majestosas e aprendemos um pouco 
de sua história e simbolismo. Nosso grupo havia chegado ao último saguão 
quando o guia explicou o significado das estatuetas de pedra esculpidas nos arcos 
estriados. Uma delas, para a qual ele apontou, representava Moisés, concebida 
para proclamar que o governo depende da lei.
— Onde está Jesus Cristo? — perguntou Guraya, com sua voz alta e agra­
dável, seus dentes brancos irradiando um sorriso brilhante por trás da barba preta.
— Não entendi — gaguejou o guia.
— Onde está Jesus Cristo? — insistiu Guraya, um pouco mais devagar, 
levemente mais alto, enunciando cada palavra por temer que o sotaque tivesse 
tornado a pergunta incompreensível.
Os turistas de nosso grupo pareciam estar constrangidos. Enquanto isso, eu 
ria no meu íntimo, perguntando-me o que viria a seguir e se eu deveria intervir 
ou abster-me de aconselhá-lo.
— Não entendi — o guia repetiu, um tanto estupefato, um tanto rabugento.
— O que você quer dizer? Por que Jesus deveria estar representado aqui? 
Guraya respondeu, ele mesmo um tanto atônito agora:
— Li em seu livro sagrado que a Lei foi dada por Moisés, mas a graça e a 
verdade vieram por meio de Jesus Cristo. Onde está Jesus Cristo?
Creio que meu amigo Guraya havia sentido o impacto do Evangelho 
de João mais profundamente do que eu. E de forma alinhada com o foco do 
prólogo de João (1.1-18), em que a Palavra eterna se torna a Palavra encarnada, 
que o próprio Jesus proclama: “Eu sou a verdade”.
“Eu sou a vida.” Antes, no sepulcro de Lázaro, Jesus declarou: “... Eu sou a 
ressurreição e a vida. Aquele que acredita em mim viverá, mesmo que morra; 
e quem viver e acreditar em mim jamais morrerá...” (11.25,26). A respeito 
de Jesus, João escreve: “Ele é o verdadeiro Deus e a vida eterna” (ljo 5.20). 
Aquele que morreu, condenado, capacita os outros a viverem, perdoados.
Sou o caminho a Deus: não vim iluminar
a senda, abrir caminho, para que sigas 
os meus passos simplesmente, que persigas 
minha sombra como prêmio fácil de ganhar.
UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE 29
Minha vida revela a vida de Deus, a soma 
de tudo o que ele é e faz. Como então podem, 
filhos da noite, fitar-me e interpretar 
meu caminho como mera estrada para seus pés?
Meu caminho passa pelo Getsêmani, pela cruz, 
e pela dura rejeição vestida de agonia.
Meu caminho a Deus abraça a perda total: 
seu caminho a Deus não é o meu, sou eu.
Todo outro caminho é triste pântano ou fraude.
Eu sou único: eu sou o caminho a Deus.
Eu sou a verdade de Deus. Não reivindico 
apenas dizer a verdade, como se fosse 
um profeta (não mais que isso), um canal, movido 
pelo poder do Espírito, de forma puramente humana. 
Nem digo que, quando tenho seu nome 
em meus lábios, minha doutrina seja infalível 
(embora seja verdade). Mero intérprete 
eu não sou, alguma voz profética de fama especial.
Nos confins atemporais da eternidade 
o Deus triúno decidiu que a Palavra, 
a autoexpressão da Divindade, 
revestir-se-ia de carne e sangue — e assim seria ouvida. 
A alegação de dizer a verdade os bons homens aplaudem. 
Alego muito mais: sou a verdade de Deus.
Sou a vida da ressurreição. Não é 
como se eu apenas trouxesse bebida que dá vida, 
elixir mágico que (talvez pensem os homens) 
é barato porque, embora fino, não foi comprado. 
O preço da vida foi integralmente pago: lutei 
com a morte e o negro desespero; pois sou a bebida 
da vida. A manhã da ressurreição é o elo 
entre minha morte e a vida infinda há muito buscada.
Sou o primogênito dentre os mortos; e, com 
meu triunfo, decreto a morte às luxúrias e aos ódios. 
Minha vida agora estendo aos homens, e aplico-lhes 
o sopro que sacia para sempre.
A página da religião está cheia de vangloria vazia: 
mas eu sou a ressurreição e a vida.
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
A reivindicação tripla é chocante. Os artigos não são acidentais: “Eu sou o 
caminho, a verdade e a vida”; ele não é uma alternativa agradável, um caminho 
entre outros. Para que todos captem a mensagem, a segunda parte do versículo 
não deixa dúvidas: “Ninguém vem ao Pai senão por mim”.
Essa última oração gramatical realiza duas coisas. Primeiro, ao falar clara­
mente a respeito de ir ao Pai por meio dele próprio, Jesus indica como Tomé 
entendeu de forma completamente equivocada os comentários anteriores que 
ele havia feito de seu próprio caminho até o Pai. Tomé e os outros seguidores 
precisam reconhecer que o caminho que Jesus trilha não deve simplesmente 
ser imitado. Unir-se a Jesus na casa do Pai exige o reconhecimento de que o 
próprio Jesus é o caminho. Os seguidores de Jesus não devem simplesmente 
seguir seu ensino verdadeiro ou copiar sua vida, antes reconhecem nele a 
verdade encarnada, o adoram e recebem vida dele. “Ninguém vem ao Pai 
senão por mim”.
Não menos significativo é o segundo ponto em que essa afirmação insiste. 
Jesus é o caminho, a verdade e a vida de modo exclusivo. Isso não é popular em 
nossa época sincretista; contudo, a mesma ideia é ensinada repetidamente no 
Novo Testamento. “A salvação não se encontra em nenhum outro”, proclama 
Pedro, “porque não há nenhum outro nome dado aos homens debaixo do céu 
pelo qual devamos ser salvos” (At 4.12). Paulo acrescenta: “Mas, mesmo que nós 
ou um anjo do céu pregue um evangelho que não este que pregamos a vocês, 
que ele seja eternamente condenado!” (G1 1.8). Talvez seja particularmente 
importante reconhecer essa característica de exclusividade do Evangelho de 
João, porque aqui, mais que em muitos livros do Novo Testamento, há uma 
vasta variedade de termos literários e religiosos encontrados em outras religiões. 
João pode estar disposto a tomar emprestado o vocabulário religioso de outros, 
mas não está disposto a conceder que a salvação seja encontrada em qualquer 
outro senão em Jesus. E esse, ele insiste, é o ensinamento do próprio Jesus.
Aí está a resposta à pergunta de Tomé. Jesus não se concentra mais no 
caminho que ele próprio precisa trilhar; ele se concentra, antes, no caminho que 
os discípulos precisam trilhar. O equívoco de Tomé e de seus colegas deve-se 
ao fato de não perceberem quem Jesus realmente é e a natureza da missão que 
ele se dispôs a realizar. Portanto, Jesus diz: “Se vocês realmente me conhecessem, 
também conheceríam meu Pai...” (14.7).
Esse versículo (14.7) tem uma complicação textual extremamentedifícil 
de resolver. O texto em que a NIV se baseia traz: “Se vocês realmente me 
UMA 'NTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE 31
conhecessem, também conheceríam meu Pai. De agora em diante vocês de 
fato o conhecem e o viram”. Isso sugere uma repreensão: Se vocês realmente 
me conhecessem, como a essa altura certamente deveríam, vocês também 
conheceríam meu Pai. As outras evidências textuais principais apoiam a 
nota de rodapé da NIV ao versículo 7: “Se vocês realmente me conhecerem, 
também conhecerão meu Pai. De agora em diante vocês de fato o conhecem 
e o viram”. Isso sugere uma promessa: Se vocês agora me conhecem, como 
de fato ocorre, também conhecerão meu Pai. Alguns defenderam que a 
segunda parte do versículo, “De agora em diante vocês de fato o conhecem 
e o viram”, exige a segunda leitura. Pelo contrário, Filipe em seguida mostra 
que eles ainda não o conhecem realmente (14.8). A segunda parte de 14.7 está 
dizendo que, em certo nível, os discípulos de fato vieram a conhecer a Cristo: 
eles podiam descrevê-lo, conversar com ele, viajar com ele, comer com ele, 
fazer-lhe perguntas, e assim por diante. Nesse sentido, como Jesus e seu Pai 
são um (10.30), eles vieram, objetivamente falando, a conhecer o Pai também. 
Por causa de quem Jesus é, conhecer Jesus é conhecer a Deus. Objetivamente, 
é assim. A ironia é que os próprios discípulos não percebem o que vieram 
a conhecer! Eles conhecem Jesus; no entanto, não captando, mesmo a essa 
altura, quem realmente ele é, eles não o conhecem de fato e, portanto, não 
reconhecem que conhecê-lo é conhecer a Deus.
Parece melhor, pensando bem, reconhecer que Jesus os está repreendendo 
por sua lentidão em perceber quem ele é. Diferente mente dos fariseus (8.19), 
os discípulos avançaram um pouco em conhecer ajesus; no entanto, deveríam 
ter avançado mais. Ele se identifica mais uma vez como aquele que tornou 
Deus manifesto (cf. 1.18): “De agora em diante vocês de fato o conhecem e 
o viram” (14.7). Os discípulos precisam perceber que conhecer ajesus é nada 
menos que conhecer a Deus, porque o próprio Jesus é o caminho, a verdade 
e a vida. Enxergar essa verdade claramente equivale, assim, a realmente 
conhecer Jesus. Portanto, os seguidores de Jesus de fato sabem o caminho 
do lugar para onde Jesus está indo (14.4), porque eles conhecem Jesus. O 
problema é que eles próprios não percebem que sabem o caminho: nesse 
sentido, eles não o conhecem.
A questão é profundamente cristológica. Essa terceira verdade, que os 
discípulos de Jesus precisam apreender firmemente se quiserem que sua fé seja 
triunfante, é quem Jesus é. Realmente saber quem Jesus é equivale a saber o 
caminho que eles precisam trilhar para chegar ao lugar para onde Jesus está indo.
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
Retornamos assim ao desafio do primeiro versículo, em que Jesus diz: “Não se 
perturbe o coração de vocês. Confiem em Deus; confiem também em mim”. A 
fé estável, serena, precisa ter como seu objeto o próprio Cristo.
O conforto que Jesus oferece a seus discípulos tornou-se intensamente 
cristológico, mas seus discípulos continuam incapazes de absorver essas verdades 
sublimes. Jesus entende ser necessário resumir parte do que vem ensinando 
há muito tempo e explicar de forma mais completa a afirmação cristológica 
profunda que fez.
Uma lição para alunos que custam a aprender: 
uma exposição resumida da revelação 
do Pai no Filho (14.8-14)
Como professor, é profundamente encorajador para mim que o próprio Jesus 
também tenha tido alunos que custavam a aprender. Meus alunos que demoram 
a aprender costumam ser assim mais por capacidade limitada que por preguiça 
ou perversidade; já os alunos de Jesus que custavam a aprender costumavam ser 
dessa maneira mais por incredulidade moralmente indefensável e mesmo por 
desobediência do que por razões mais lisonjeiras.
Apesar da clareza da afirmação de Jesus, os apóstolos não conseguem 
aceitá-la literalmente. Imersos em uma herança judaica em que o mono- 
teísmo desempenhava papel tão forte, eles mal conseguiam conceber um 
monoteísmo trinitário como aquele que os cristãos com o tempo vieram a 
confessar. Eles continuavam a manter um abismo fundamental entre Jesus e 
o Pai. É triste dizer, mas alguns dos oponentes mais amargos de Jesus discer­
niram o que ele estava reivindicando mais rapidamente que seus apóstolos. 
“... Buscamos apedrejá-lo”, disseram eles, “por blasfêmia, porque você, mero 
homem, reivindicou ser Deus” (10.33). No entanto, a essa altura, Filipe ainda 
pede: “Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos será suficiente” (14.8).
Jesus respondeu: “Você não me conhece, Filipe, mesmo depois de eu estar 
entre vocês por tanto tempo? Todo aquele que me viu, viu o Pai. Como você 
pode dizer: ‘Mostra-nos o Pai’?” (14.9). Efetivamente, Jesus diz a Filipe que sua 
pergunta é supérflua precisamente porque o Pai se fez conhecido na Palavra, 
que é Deus, mas que se tornou carne. Portanto, todo aquele que viu a Palavra 
encarnada viu o Pai. Jesus já não havia deixado isso claro? Não muito antes 
disso ele havia ensinado publicamente: “... Quando um homem crê em mim, 
ele não crê em mim apenas, mas naquele que me enviou” (12.44).
UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE
Mas como isso pode ser verdade?
1. Afirmação de fato: a revelação do Pai no Filho (14.10). “Você não crê que eu 
estou no Pai e que o Pai está em mim? As palavras que lhes digo não são apenas 
minhas. Antes, é o Pai, vivendo em mim, que está fazendo sua obra” (14.10).
Para entender esse versículo adequadamente, é preciso se distanciar um 
pouco dele e refletir a respeito de como João apresenta Jesus Cristo no Quarto 
Evangelho2 e também a respeito de como os cristãos lutaram para formular 
afirmações teológicas acerca da divindade e da humanidade de Jesus Cristo 
enquanto continuavam a permanecer fiéis aos pressupostos bíblicos.
2Tratei dessa questão com alguma profundidade em meu livro Divine sovereignty and human 
responsibility: some aspects of fohannine theology againstJewislt background (London, Reino Uni­
do/ Atlanta: Marshall, Morgan and Scott/John Knox, 1980 [edição em português Soberania 
divina e responsabilidade humana (São Paulo: Vida Nova, 2019)]. O que escrevi acima é uma 
simplificação dos temas tratados com um pouco mais de rigor nesse volume.
Muitas pessoas estão cientes de que o Evangelho de João enfatiza fortemente 
a divindade de Jesus. Ele é identificado com a Palavra encarnada, e desde toda 
a eternidade essa Palavra era Deus (1.1). Em um momento de enorme drama, 
Tomé adora o Jesus ressuscitado com palavras que só podem ser aplicadas a Deus: 
“Senhor meu e Deus meu” (20.28); e Jesus aceita a atribuição de divindade e 
pronuncia uma bênção sobre aqueles que chegam a uma fé semelhante sem 
precisar de prova como aquela (20.29). Os atributos da divindade são aplicados 
a Jesus, assim como as funções da divindade. Não surpreende que Jesus diga a 
Filipe: “Todo aquele que me viu, viu o Pai” (14.9).
Contudo, há outra ênfase no Evangelho de João que muitos ignoram: a 
obediência e a completa dependência de Jesus em relação a seu Pai. O alimento 
de Jesus é fazer a vontade daquele que o enviou e concluir sua obra (4.34). 
"... Digo-lhes a verdade”, Jesus insiste, “o Filho não pode fazer nada por si 
mesmo; ele só pode fazer aquilo que vê seu Pai fazer [...] Por mim mesmo não 
posso nada; julgo apenas o que ouço, e meu julgamento é justo, porque não 
busco agradar a mim mesmo, mas àquele que me enviou” (5.19,30). Mais uma 
vez: “... Meu ensinamento não é meu. Ele vem daquele que me enviou” (7.1 ó). Se 
o Pai que enviou Jesus não o abandonou, é porque, nas palavras de Jesus, “sempre 
faço o que lhe agrada” (8.29). O próprio sacrifício de Jesus de si mesmo, como 
o Bom Pastor por suas ovelhas, é uma ação realizada em resposta à “ordem” do 
Pai (10.18). Perto do fim de seu ministério público, Jesus podia afirmar: “... Não
34 O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS 
falei de minha própria parte, mas o Pai que me enviou meordenou o que dizer 
e como dizê-lo [...] De modo que tudo o que digo é apenas aquilo que o Pai 
me mandou dizer” (12.49,50). E, na oração que pronuncia bem na iminência 
da cruz, Jesus pode afirmar: “Eu lhe trouxe glória na terra ao completar a obra 
que você me deu para fazer” (17.4).
Como interpretar esses temas aparentemente opostos? Os cristãos sustentam 
que Jesus é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem; mas é um pouco 
espantoso observar em detalhes os contornos bíblicos dessa doutrina incrível. 
No Evangelho de João, Jesus e Deus são um em relação ao homem, na criação, 
na revelação e na autoridade; mas ele e o homem são um em relação a Deus, 
na submissão, na dependência e na obediência.
Cristãos ao longo dos séculos tentaram oferecer formulações que façam 
justiça a todos esses indícios bíblicos aparentemente discordantes. Eles refletiram 
a respeito do que a Palavra eterna teria de abandonar para se tornar a Palavra 
encarnada. Para usar as categorias que Paulo emprega em Filipenses 2.5-11, eles 
se perguntam do que Cristo “se esvaziou” para se unir à raça humana.
A resposta certa a tais perguntas não é fácil de encontrar; não obstante, 
é razoavelmente fácil detectar grandes porções de respostas erradas. Alguns 
sugerem que Cristo abandonou sua divindade ao se tornar homem; mas isso 
certamente é simples demais, já que o Novo Testamento insiste em que Jesus 
durante seu ministério e paixão era tanto Deus como homem. Outros dizem 
que ele abandonou parte de seus atributos divinos — talvez sua onisciência, 
sua onipotência, sua onipresença. O problema com tal formulação é que um 
ser não pode ser prontamente separado de seus atributos. Se vejo um ser que 
se parece com um gorila, corre como um gorila e tem todos os atributos de 
um gorila, presumo que estou vendo um gorila. Se afirmam que um ser é um 
gorila, mas ele tem poucos atributos de gorila e muitos atributos de lemingue 
ártico, provavelmente não me impressionarão as alegações entusiasmadas de 
que o ser é de fato um gorila. Quando Paulo, por exemplo, insiste em que, “em 
Cristo, toda a plenitude da Divindade vive em forma corpórea” (Cl 2.9), ele 
parece eliminar a possibilidade de uma encarnação que retenha apenas alguns 
atributos da divindade; e Paulo não está sozinho nessa insistência.
Outros teólogos sugeriram que, embora o Filho eterno de Deus não tenha 
abandonado nenhum de seus atributos divinos, ele de fato abandonou o uso 
de seus atributos divinos. Isso significaria que, durante seu ministério, Jesus 
Cristo nunca usou mais atributos do que, digamos, os usados por um profeta 
do Antigo Testamento. Afinal, se Jesus realizou milagres, eles também o fizeram.
UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE
Se Jesus alegou pronunciar as palavras de Deus, eles também o fizeram. Mas 
mesmo essa formulação restrita é falha. Em todos os Evangelhos, Jesus alega ter 
um relacionamento com o Pai do qual nenhum mero profetajamais desfrutou. 
Em todos os Evangelhos, mas sobretudo no Evangelho de João, os milagres 
realizados são interpretados como sinais que apontam para quem Jesus é. Fora 
do Evangelho de João, o silenciamento da tempestade suscita o medo, o espanto 
e a indagação: “... Quem é este? Ele manda até nos ventos e na água, e estes lhe 
obedecem” (Lc 8.25; cf. Mt 14.33). E quem pode perdoar pecados, em qualquer 
sentido absoluto, senão o próprio Deus (cf. Mc 2.1-12)?
Alguns, consequentemente, buscam um refinamento adicional. O Filho 
eterno de Deus, eles dizem, para os propósitos da encarnação, abandonou o uso 
independente de suas prerrogativas divinas. Isso está bem próximo de estar certo. 
O Filho de Deus abandonou todo uso de suas prerrogativas e capacidades divinas 
das quais, como um homem, ele não teria desfrutado a não ser que seu Pai celestial 
lhe desse a direção de usar tais prerrogativas. Dessa forma, ele se recusou a usar 
seus poderes para transformar as pedras em pão para si próprio: isso equivalería 
a corromper sua identificação com os seres humanos e, portanto, abandonar sua 
missão, porque os seres humanos não têm acesso instantâneo a tais soluções. Sua 
missão o proibia de arrogar para si mesmo as prerrogativas que lhe eram de direito. 
Todavia, se essa missão exigia dele que multiplicasse pães para os cinco mil, ele o 
fazia. Seu próprio conhecimento era, por confissão própria, limitado (Mt 24.36).
Estamos lidando com coisas santas, coisas que, apesar de nossas melhores 
tentativas de análise e formulação, continuam a desafiar nossa capacidade finita 
de entender — elas nos incitam a cobrir a boca em adoração silenciosa. A Palavra 
estava com Deus, e a Palavra era Deus: isso é claramente um pressuposto. A 
Palavra tornou-se carne: isso também é um pressuposto. Mas, quando saímos 
dos pressupostos, corremos o risco de introduzir alguma nova implicação negada 
pelas Escrituras em outras passagens. Mesmo na última tentativa de formulação, 
há um problema. Dizer que o eterno Filho de Deus, para efeitos da encarnação, 
abandonou o uso independente de suas prerrogativas divinas é quase sugerir 
que o Cristo pré-encarnado desfrutou de independência irrestrita no uso de 
suas prerrogativas divinas. Nesse caso, fica extremamente difícil imaginar como 
alguém ainda poderia defender a forma de monoteísmo que a doutrina da 
Trindade representa. Será que o Filho alguma vez foi independente da vontade 
de seu Pai? Deus enviou seu Filho ao mundo; e, mesmo se presumirmos que o 
Filho voluntariamente consentiu nessa missão, sempre descobrimos, no pouco
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
que sabemos do relacionamento pré-encarnado do Filho com seu Pai, que a 
iniciativa e a ordem estão com o Pai, enquanto a submissão e a obediência 
pertencem ao Filho. Ousamos, portanto, supor que o Filho alguma vez desfrutou 
do uso verdadeiramente independente de suas prerrogativas divinas?
Em certo sentido, é correto supor que o Filho, como pessoa distinta e 
distinguível, gozava de “independência” como pessoa; mas iria contra total às 
Escrituras pensar que tal “independência” poderia resultar em um curso de ação 
no Filho e um curso de ação diferente no Pai, ou que seus respectivos papéis 
poderíam ser trocados. Podemos dizer, então, que a formulação que arriscamos 
é aceitável?
Não creio que seja; não, ao menos, se a palavra independente for salientada 
e tornada absoluta. Mas talvez estejamos muito perto da melhor formulação 
teológica, por mais insatisfatório que possa ser descrever uma realidade tão 
sublime como a Encarnação, se voluntariamente forçarmos a formulação para 
dentro de um molde menos preciso. Se dissermos que, para efeitos da encarnação, 
o Filho eterno abandonou uma medida substancial de independência no uso de 
suas prerrogativas divinas, não estaremos sendo tão claros, mas provavelmente 
estaremos refletindo de forma mais verdadeira os pressupostos bíblicos.
João vê a perda que a Palavra encarou ao tornar-se carne como uma perda 
de glória. É por isso que ele registra o conteúdo da Ultima Oração prolongada 
de Jesus antes da cruz: “E agora, Pai, glorifica-me em tua presença com a glória 
que eu tinha contigo antes de o mundo ter início” (17.5). Tal afirmação resu­
mida é até aonde podemos ir; mas não estamos indo muito longe, muito porque 
glória e glorifica são palavras poderosas que trazem à tona imagens tremendas, 
mas não transmitem informações precisas. O que está claro é que o Filho pré- 
-encarnado e o Filho pós-ascensão desfrutam da mesma glória que o Pai; mas 
em sua missão terrena o Filho deixou sua glória de lado.
Estamos agora em melhor posição para pensar novamente a respeito das 
passagens no Evangelho de João que salientam a dependência e submissão de 
Jesus a seu Pai. Jesus não só diz: "... Digo-lhes a verdade, o Filho nada pode por 
si mesmo; ele só pode fazer o que vê o Pai fazer...”, mas em seguida acrescenta: 
“porque tudo o que o Pai faz o Filho também faz” (5.19). Jesus está em tão 
completa dependência da direção de seu Pai que tudo o que ele diz ou faz é 
nadamais e nada menos que aquilo que seu Pai diz e faz."... Tudo o que digo”, 
ele afirma, “é apenas aquilo que meu Pai me mandou dizer” (12.50). Aliás, a 
maioria das passagens que sublinham a dependência e a qualidade de “enviado” 
UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE 37
de Jesus funciona em seu respectivo contexto como a base da autoridade de Jesus 
(5.17-30; 6.29,32,33; 7.16,18,28,29; 8.16,29,42; 10.17,18; 11.41,42; 12.45,48,50; 
14.23,24,28-31; 17.2,7).
Essa é a magnificência da ironia: como homem, Jesus depende comple­
tamente de Deus; todavia, essa dependência é tão absoluta, tão pura, que, na 
realidade, tudo o que ele diz e faz é exatamente aquilo que Deus diz e faz, e, 
portanto, está amparado por toda a autoridade de Deus. O caráter absoluto da 
autonegação resultou no caráter absoluto da autoridade; mas essa autoridade 
agora está investida em uma pessoa encarnada, um ser humano que pode ser 
imediatamente percebido, tocado e ouvido por outros seres humanos. Ao 
pronunciar as palavras de Deus (3.34; 7.16; 8.26,38,40; 14.10,24; 17.8), realizar 
apenas as obras do Pai (4.34; 5.17,19ss.,30,36; 8.28; 14.10; 17.4,14) e fazer apenas 
a vontade do Pai (4.34; 5.30; 6.38; 10.25,37), Jesus está em perfeita submissão a 
seu Pai e simultaneamente exerce com ele perfeita autoridade sobre os homens.
Por causa dessa posição única em uma pessoa, o Senhor Jesus Cristo, 
segue-se que o homem que aceita o testemunho de Jesus atestou que Deus diz 
a verdade (3.33). A verdadeira fé que tem a vida eterna ouve a palavra de Jesus 
e acredita naquele que o enviou (5.24; cf. 14.24). Só Jesus viu o Pai (6.46), mas 
agora aquele que viu Jesus viu também o Pai (14.9). E, se tudo isso traz glória 
ao Pai (afinal, Jesus ora: “Eu lhe trouxe glória na terra ao completar a obra 
que você me deu para fazer” [17.4]), trata-se igualmente do método divino de 
garantir que todos os homens honrem o Filho assim como honram o Pai (5.23): 
“Aquele que não honra o Filho não honra o Pai, que o enviou”.
Estamos agora mais bem situados para entender João 14.10: “Você não crê 
que eu estou no Pai e que o Pai está em mim? As palavras que lhes digo não são 
apenas minhas [o grego é ainda mais forte: As palavras que digo a vocês eu não as 
digo de mim mesmo.]. Antes, é o Pai, vivendo em mim, que está fazendo sua obra”.
Jesus aqui fornece aos discípulos mais uma afirmação resumida de seu 
relacionamento com o Pai, algo que ele vem lhes ensinando desde o começo. 
Ele está insistindo em que suas palavras e obras são as palavras e obras do Pai, 
e, portanto, o Pai revelou-se em seu Filho. O que eles haviam testemunhado 
nesses últimos anos enquanto viviam e viajavam com Jesus é nada menos que 
a revelação do Pai no Filho.
As analogias não ajudam muito. Os pregadores muitas vezes compararam a 
encarnação à decisão de um grande e autocrático rei de trajar vestes de camponês 
e visitar seus súditos no nível deles, disfarçado, recusando-se a usar sua autoridade 
O DISCURSO DE DESPEDIDA E A ÚLTIMA ORAÇÃO DE JESUS
régia para clamar por ajuda ou proteção quando precisasse. Mas a analogia, 
ao iluminar a missão do Filho, obscurece o relacionamento do Filho com seu 
Pai. Quem ficou em casa, no castelo do rei? As analogias nos desapontam; pois 
quem ou o que é intimamente análogo a Deus ou à encarnação do Filho que 
ele ama? Para sermos fiéis à verdade bíblica acerca dessas questões, precisamos 
insistir em que o Filho é ontologicamente Deus, divino em seu próprio ser; 
contudo, em sua missão como homem, é ao esconder sua própria glória e, em 
perfeita resposta ao Pai, ao mostrar com suas palavras e obras a glória de seu 
Pai que ele mais reflete a Deus. A revelação do Pai no Filho é o pano de fundo 
essencial do drama da redenção que está prestes a se desenrolar em Jerusalém, 
no monte das Oliveiras, no Gólgota e em um sepulcro vazio.
Essa é uma reivindicação crucial. Os discípulos continuam a pedir para 
ver o Pai, quando o tempo todo eles estão desfrutando da revelação mais clara 
possível do Pai, sem reconhecê-lo. Tão cegos são os olhos espirituais do homem 
que ele não consegue por si mesmo ver a luz em seu esplendor. Tao vagarosa é a 
mente do homem ao pensar sobre coisas espirituais que ele tropeça nas verdades 
centrais que foram ensinadas vezes sem fim.
Se os discípulos de Jesus apreenderem com mais firmeza que é ele próprio essa 
revelação do Pai, suas palavras de conforto terão maior efeito: “Não se perturbe o 
coração de vocês; confiem em Deus, confiem também em mim” (14.1).
2. Exortação a crer na revelação do Pai no Filho. Jesus então encoraja seus 
discípulos: “Acreditem em mim quando digo que estou no Pai e que o Pai está 
em mim; ou ao menos acreditem na evidência dos próprios milagres” (14.11).
A fé que os discípulos precisam ter em Jesus não é nem meramente pessoal 
nem vazia de conteúdo. A fé deles precisa ser pessoal no sentido de que cons­
titui fé no próprio Jesus; mas essa fé no próprio Jesus implica acreditar que as 
coisas que ele diz são verdade: “Acreditem em mim quando digo que...”. A fé 
na pessoa de Jesus precisa suscitar fé na verdade do conteúdo do que ele ensina. 
Nesse caso, o conteúdo do que ele ensina está ligado à sua pessoa, a quem ele é. 
Isso significa que acreditar na verdade do que ele ensina influirá na fé em Jesus 
como pessoa. O argumento está em um círculo, mas o círculo não é vicioso.
É triste que Jesus julgue necessário exortar seus seguidores mais próximos 
a acreditarem em suas palavras, e, portanto, a acreditarem que ele próprio é a 
revelação do Pai. Triste, de fato, mas não estranho. Não é nossa incredulidade 
prova suficiente do quanto a incredulidade é comum? Mesmo depois de termos
UMA INTRODUÇÃO À FÉ TRIUNFANTE
recebido repetidas vezes a garantia de que Deus nos ama, de seu prazer soberano 
em abençoar seu povo com o que ele julga ser bom para nós, não voltamos ao 
ceticismo prático quando as circunstâncias difíceis parecem lançar dúvidas a 
respeito de sua bondade ou poder?
Os primeiros discípulos de Jesus em João 14 estão experimentando dificul­
dades de vários tipos. Eles talvez estejam demorando a entender intelectualmente 
a reivindicação ousada nos lábios de Jesus, repetida várias vezes, de que ele 
está no Pai e o Pai nele. Pior, eles estão desorientados tanto emocional como 
intelectualmente enquanto tentam entender essas palavras a respeito da morte, 
da traição, da partida de Jesus, da incapacidade deles de segui-lo no presente, 
e assim por diante. O que eles precisam acima de tudo é acreditar em Jesus, 
acreditar que o que ele está dizendo é verdade. Se apenas acreditarem, então 
as incertezas que cercam essas e outras grandes questões serão tragadas pela 
confiança de que Jesus é nada menos que a revelação do Pai. Não há fé mais 
fundamental para o triunfo espiritual do que essa.
Percebendo que a incredulidade dos discípulos perdurava, Jesus vai um passo 
além. "... Ao menos acreditem na evidência dos próprios milagres” (14.11). 
Jesus não nutre nenhuma ilusão em relação ao poder que seus milagres têm de 
suscitar a fé. Ele está ciente de que, depois do milagre estupendo da ressurreição 
de Lázaro, embora muitos judeus tenham sido encorajados a crer nele, o mesmo 
ato incitou outros a delatá-lo para as autoridades religiosas (11.45,46) — as quais, 
por sua vez, expandiram seu plano de matar Jesus e incluíram matar Lázaro 
(12.10,11). (A teoria deles era: se as evidências são particularmente persuasivas, 
livrem-se das evidências.) Afinal, não disse o próprio Jesus que "... se não ouvem 
Moisés e os profetas, não serão convencidos mesmo que alguém ressuscite dentre 
os mortos” (Lc 16.31)? Jesus repreende aqueles que não creem a não ser que 
vejam sinais milagrosos e maravilhas (4.48); e, em outras passagens, ele ensina 
que os milagres em si mesmos não provam que a pessoa que os está realizando 
seja boa ou verdadeira (Mt 24.24), porque os milagres podem ser realizados 
por falsos Cristos e falsos profetas. E sempre extremamente perigoso identificar 
toda manifestação

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