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Arte e Educação na Contemporaneidade

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ARTE E EDUCAÇÃO: 
encontros investigativos na 
contemporaneidade
Renata Sieiro Fernandes
João Costa Gouveia Neto
Luís Müller Posca 
Organização
2021
Conselho Editorial
Dr. Clívio Pimentel Júnior - UFOB (BA)
Dra. Edméa Santos - UFRRJ (RJ)
Dr. Valdriano Ferreira do Nascimento - UECE (CE)
Drª. Ana Lúcia Gomes da Silva - UNEB (BA)
Drª. Eliana de Souza Alencar Marques - UFPI (PI)
Dr. Francisco Antonio Machado Araujo – UFDPar (PI)
Drª. Marta Gouveia de Oliveira Rovai – UNIFAL (MG)
Dr. Raimundo Dutra de Araujo – UESPI (PI)
Dr. Raimundo Nonato Moura Oliveira - UEMA (MA)
Dra. Antonia Almeida Silva - UEFS (BA)
ARTE E EDUCAÇÃO: encontros investigativos na contemporaneidade
© Renata Sieiro Fernandes – João Costa Gouveia Neto – Luís Müller Posca 
1ª edição: 2021
DOI: 10.29327/529244
Link de acesso: https://doi.org/10.29327/529244
Editoração
Acadêmica Editorial
Diagramação
Danilo Silva
Capa
Acadêmica Editorial
Reprodução e Distribuição
CAJU: Educação, Tecnologia e Editora
 
Ficha Catalográfica elaborada de acordo com os padrões estabelecidos no 
 Código de Catalogação Anglo – Americano (AACR2) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Bibliotecária Responsável: 
Nayla Kedma de Carvalho Santos – CRB 3ª Região/1188 
 
 
 Arte e educação: encontros investigativos na contemporaneidade / Renata 
 Sieiro Fernandes, João Costa Gouveia Neto, Luís Müller Posca, 
 organizadores. – Parnaíba, PI: Acadêmica Editorial, 2021. 
 E-book. 
 
 ISBN: 978-65-88307-52-6 
 
 
1. Educação. 2. Arte. 3. Formação docente. 4. Prática de ensino. 
 I. Fernandes, Renata Sieiro (Org.). II. Gouveia Neto, João Costa (Org.). 
 III. Posca, Luís Müller (Org.). IV. Título. 
 
 
 
 CDD: 370.7 
 
 
 
A786
 
SUMÁRIOSUMÁRIO
APRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃO ..................................................................................................... ..................................................................................................... 77
EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEMEDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM ........................ ........................1515
Renata Sieiro Fernandes
DOI: 10.29327/529244.1-1
ENSINO SUPERIOR INCLUSIVO: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA DE ENSINO SUPERIOR INCLUSIVO: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA DE 
SUCESSO ACADÊMICO EM UM CURSO DE LICENCIATURA EM ARTES SUCESSO ACADÊMICO EM UM CURSO DE LICENCIATURA EM ARTES 
VISUAISVISUAIS .................................................................................................................. .................................................................................................................. 3232
Luís Müller Posca
Fabiano Ferreira Lucena
DOI: 10.29327/529244.1-2
O SUBPROJETO DE MÚSICA DO PIBID DA UEMA: CONTEXTUALIZAÇÃO O SUBPROJETO DE MÚSICA DO PIBID DA UEMA: CONTEXTUALIZAÇÃO 
HISTÓRICA (2018 - 2020)HISTÓRICA (2018 - 2020) ..................................................................................... ..................................................................................... 4747
João Costa Gouveia Neto
DOI: 10.29327/529244.1-3
REFLEXÕES ACERCA DE SABERES ESPECÍFICOS SOBRE O OFÍCIO DE REFLEXÕES ACERCA DE SABERES ESPECÍFICOS SOBRE O OFÍCIO DE 
ARTE-EDUCADOR(A)ARTE-EDUCADOR(A) ............................................................................................ ............................................................................................5858
Walace Rodrigues 
DOI: 10.29327/529244.1-4
CORPO E PROCESSOS CRIATIVOS PERFORMÁTICOS NO ENSINO DE CORPO E PROCESSOS CRIATIVOS PERFORMÁTICOS NO ENSINO DE 
ARTEARTE ........................................................................................................................ ........................................................................................................................ 6969
Wechila Andrade de Brito
DOI: 10.29327/529244.1-5
EDUCAÇÃO QUE MOVIMENTA SABERES: FAZERES DO CORPO NAS DANÇAS EDUCAÇÃO QUE MOVIMENTA SABERES: FAZERES DO CORPO NAS DANÇAS 
DE MATRIZ AFROBRASILEIRADE MATRIZ AFROBRASILEIRA ............................................................................ ............................................................................8585
Artenilde Soares da Silva
Francisco Elismar da Silva Junior
DOI: 10.29327/529244.1-6
ORALIMAGENSORALIMAGENS COMO PRÁTICAS EDUCATIVAS EM ARTE COMO PRÁTICAS EDUCATIVAS EM ARTE ............................ ............................9595
Francilene Brito da Silva
DOI: 10.29327/529244.1-7
MONTAGEM TEATRAL E FESTIVAL ESTUDANTIL DE TEATRO NA EDUCAÇÃO MONTAGEM TEATRAL E FESTIVAL ESTUDANTIL DE TEATRO NA EDUCAÇÃO 
BÁSICA: PROCESSOS PEDAGÓGICOS. BÁSICA: PROCESSOS PEDAGÓGICOS. .......................................................... .......................................................... 108108
Marcos Clóvis Fogaça
DOI: 10.29327/529244.1-8
ARTE POPULAR E A FESTA JUNINA TEMÁTICA NO COLÉGIO ARTE POPULAR E A FESTA JUNINA TEMÁTICA NO COLÉGIO 
PENTÁGONOPENTÁGONO ......................................................................................................... ......................................................................................................... 119119
Radamés Alves Rocha da Silva
DOI: 10.29327/529244.1-9
A IMAGEM NA LITERATURA INFANTIL: UM CONVITE À EDUCAÇÃO DO A IMAGEM NA LITERATURA INFANTIL: UM CONVITE À EDUCAÇÃO DO 
OLHAR NA SALA DE AULAOLHAR NA SALA DE AULA ................................................................................ ................................................................................ 130130
Rodolfo Rodrigues Pontes
Leandro do Nascimento Vieira de Souza
DOI: 10.29327/529244.1-10
MUSEUS E INSTITUIÇÕES EDUCACIONAIS DE EDUCAÇÃO INFANTIL: MUSEUS E INSTITUIÇÕES EDUCACIONAIS DE EDUCAÇÃO INFANTIL: 
INFÂNCIAS, CRIANÇAS E FAMÍLIAS NA RELAÇÃOINFÂNCIAS, CRIANÇAS E FAMÍLIAS NA RELAÇÃO ....................................... ....................................... 140140
Michelle Dantas Ferreira
Adrianne Ogêda Guedes
DOI: 10.29327/529244.1-11
EXISTÊNCIA E RESISTÊNCIA DA CRECHE/PRÉ-ESCOLA OESTE DA USP SOB EXISTÊNCIA E RESISTÊNCIA DA CRECHE/PRÉ-ESCOLA OESTE DA USP SOB 
O OLHAR DA ARTE/EDUCAÇÃOO OLHAR DA ARTE/EDUCAÇÃO ........................................................................ ........................................................................ 155155
Radamés Alves Rocha da Silva
Maria Christina de Souza Lima Rizzi
DOI: 10.29327/529244.1-12
SOBRE O(A)S AUTORE(A)SSOBRE O(A)S AUTORE(A)S ............................................................................... ............................................................................... 167167
ÍNDICE REMISSIVOÍNDICE REMISSIVO ............................................................................................. ............................................................................................. 172172
APRESENTAÇÃO
ApresentaçãoApresentação
Philippe Meirieu (2007) escreve que “(...) educar é, então, introduzir a um 
universo cultural, um universo em que os homens têm conseguido amansar até 
certo ponto a paixão e a morte, a angústia ao infinito, o terror perante as próprias 
obras, a terrível necessidade e a imensa dificuldade de viver juntos... um mundo 
em que ainda existem algumas ‘obras’ às quais é possível referir, às vezes apenas 
para atribuir palavras, sons ou imagens que nos atormentam, apenas para saber 
que não se está só”. (p. 25-26, em espanhol no original)
Nesta afirmativa o autor estabelece uma conexão direta entre a Educação 
comoum processo formativo que acontece por meio de um repertório cultural, 
que fornece possibilidades de irmos nos inventando e, também, modos de ser 
e estar no mundo e com outros. Mas uma conexão que não é de mão única, que 
tanto influencia como é influenciada, que tanto forma como se transforma, pois 
envolve ação e esforço sobre si, com tensões e abrandamentos, com conflitos e 
contradições, com transbordamentos para além do que é intencionado.
Nos educamos na cultura e nas práticas cotidianas, institucionalizadas 
ou não, reafirmamos e reconstruímos a cultura, podendo desejar e agir para 
superarmos limites e fronteiras estranguladoras, discriminatórias, violentas, 
excludentes. Podemos sonhar com novos horizontes ou permanecermos naquilo 
que já é.
A Arte como produção humana é parte dessa tentativa de dar sentido à 
vida, ao mundo, de oferecer estímulos, desafios, para entender além do óbvio, do 
superficial, de afetar pela via dos sentidos, atravessando pele, órgãos, músculos 
provocando emoções, sensações e pensamentos. E, daí, sustentar ações de 
interesse pelo que temos e pelo que ansiamos e imaginamos, participando 
coletivamente na criação de outros mundos neste que temos.
A relação da Arte com a Educação tem sido tema de debates ao longo 
dos últimos anos e essa construção teórica tem acontecido, geralmente, a partir 
do primeiro campo de investigação, pois ainda é necessário que pontuemos e 
justifiquemos a necessidade da presença da Arte na Educação. 
Segundo Barbosa (2012, p. 12) “(...) Arte-Educação é uma área de estudos 
extremamente propícia à fertilização interdisciplinar e o próprio termo que a 
designa denota pelo seu binarismo a ordenação de duas áreas num processo 
que se caracterizou no passado por um acentuado dualismo [...]” e diz ainda 
7
ARTE E EDUCAÇÃO: encontros investigativos na contemporaneidade
a autora, que esse processo se dava quase como uma colagem das teorias da 
Educação ao trabalho com material de origem artística na escola ou vice-versa, 
numa alternativa de subordinação. 
Ao longo dos últimos anos essa tendência tem sido ressignificada a partir 
de aproximações mais significativas e dialéticas para as duas áreas, sob uma 
perspectiva, realmente, interdisciplinar aos moldes que aponta Fazenda (2015), 
no sentido de não criar um novo campo de atuação, mas realmente estabelecer 
procedimentos comuns às áreas envolvidas. 
Vê-se, então, como Educação, Arte e Cultura se imbricam e se atrelam, 
gerando pólens e sêmens de saberes e fazeres necessários e urgentes que os 
tempos-espaços vividos e compartilhados reclamam, por maravilhamento e/ou 
por espanto.
Os saberes e fazeres derivam de decisões pessoais e imprevisíveis do 
aprender. E aprender é, nas palavras novamente de Meirieu (2007), subverter o 
planejado, o instituído, mudar o que está dado, o que se é, reinventar, logo “(...) 
é um ato de rebeldia contra todos os fatalismos e todos os aprisionamentos” (p. 
80, em espanhol no original), em direção a um estado de liberdade de ser, estar 
e viver. E trata-se de um processo que se recomeça incessantemente.
Desse modo, nos primeiros 20 anos do século XXI, notamos que a forma 
como os seres humanos se apropriam da arte mudou drasticamente através 
da tecnologia e da popularização dos acessos aos museus em visitas virtuais 
e através de novas formas de apropriação (CHARTIER, 2002, p. 21, 44) dos 
artefatos culturais.
Enquanto o aprender parte de uma iniciativa, de vontade, a experiência é 
aberta, receptiva e disponível. Larrosa (2015) a apresenta como “uma categoria 
vazia, livre, como uma espécie de oco ou de intervalo, como uma espécie de 
interrupção, ou de quebra, ou de surpresa, como uma espécie de ponto cego, 
como isso que nos acontece quando não sabemos o que nos acontece e sobretudo 
como isso que, embora nos empenhemos, não podemos fazer com que nos 
aconteça, porque não depende de nós, nem de nosso saber, nem de nosso poder, 
nem de nossa vontade” (p.12).
Assim, a experiência é uma provocação a que nos permitimos e 
quando ela acontece, gera aprendizado e saberes. A experiência é um campo 
de possibilidades e potências estéticas, poéticas, éticas, criativas, inventivas, 
que nos remete a um conceito criado em 1934 por Dewey, na obra Arte como 
experiência (2010) e que, atualmente, tem sido frequentemente retomado no 
pós-modernismo por pesquisadores da Arte/Educação.
Esse conceito de “Arte como experiência”, de Dewey, em suma, demonstra 
que Arte e vida não se separam. Logo, as experiências artísticas inserem a Arte 
em um campo democrático, no qual a experiência estética ampara elementos 
práticos e cognitivos que vão além da mera apreciação e fruição para alcançar 
elementos de percepção superiores, que nos possibilitam exercitar o pensamento, 
8
APRESENTAÇÃO
a compreensão das nossas práticas sociais e, sobretudo, permite abrir novas 
possibilidades de leitura do mundo. Portanto, partindo das experiências 
estéticas, criativas e de aprendizagem como campo de possibilidades, podemos 
reafirmar que a Arte é uma parte da vida.
A Arte tem tido seu espaço garantido na Educação brasileira há, pelo 
menos, duas décadas. Essa conquista, entretanto, só foi possibilitada através 
das incessantes lutas dos arte-educadores no Brasil, sobretudo ao longo dos 
anos 1980, do século XX. Todavia, a obrigatoriedade do ensino de Arte entrou em 
vigor apenas a partir da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação 
Nacional (LDBEN), nº 9.394/96 estabelecendo, assim, o ensino de Arte como 
“componente curricular da Educação básica” (BRASIL, 1996). A obrigatoriedade 
do ensino desse componente curricular foi reforçada mais recentemente, com 
a publicação da Lei nº 13.278 de 2016, que incluiu as Artes Visuais, a Dança, a 
Música e o Teatro como “componentes curriculares obrigatórios da disciplina 
Arte em toda a Educação básica brasileira, especialmente em suas expressões 
regionais” (BRASIL, 2016). 
Podemos então afirmar que, se no alvorecer do século XXI, o conceito de 
Arte enquanto área de conhecimento se ampliou e se contorceu ao aproximar-se 
da Cultura e da vida das pessoas, consequentemente o ensino de Arte também 
veio sofrendo positivas transformações, que o elevaram do patamar ainda 
tecnicista para o artístico e reflexivo.
Se antes o ensino de Arte era mero sinônimo de um conjunto de 
atividades artísticas, descontextualizadas da realidade do/as educandos/as e 
ministrado por um/a educador/a/docente que, em muitos casos, não contava com 
a formação específica ou que completava a carga horária de outras disciplinas 
com as aulas de Arte, reproduzindo modelos deslocados da sua própria cultura 
e contexto social dos estudantes, avançamos, gradualmente, para um ensino no 
qual o centro é a própria Arte, seja através do olhar para ela em sala de aula ou 
fora dela em espaços informais e não formais de ensino e Educação, como por 
exemplo museus e instituições culturais. 
Nas discussões sobre Arte com os/as educandos/as, percebe-se a 
valorização da imagem, som, corpo e movimento como campos de conhecimentos 
específicos desse componente curricular. As aulas, cada vez mais, estão 
sendo ministradas por docentes licenciados em Arte, formados em cursos de 
Licenciatura específica em diferentes linguagens artísticas, que sobretudo 
formam arte-educadores preparados para o ofício da docência respeitando as 
diferenças culturais e o contexto de sua sala de aula.
Temas e problemáticas como estas que foram levantadas e apontadas 
aparecem em textos reflexivos, que se configuram como um dos lugares de 
enfrentamento, visibilidade e ampliação de escuta e leitura. 
9
ARTE E EDUCAÇÃO: encontros investigativos na contemporaneidade
Nesta coletânea são apresentados textos teórico-práticos no âmbito do 
ensino e da Educação e da formação do arte-educador para o trabalho nesta 
intersecção de campos do conhecimento.
No primeiro aspecto, a coletânea conta com o texto Educação-Arte. 
Memória-Escrita. Memória-Imagem, de Renata Sieiro Fernandes,que apresenta 
e analisa a partir de conceitos de memória, envolvendo a percepção sensorial 
e seu conteúdo cognitivo-reflexivo e de escrita-pensamento-fluxo, algumas 
produções artísticas textuais e imagéticas de alunos/as realizadas durante o 
percurso de formação, no Ensino Superior, a partir de imagens-carta, deflagradas 
pelo tarô de Marselha e seus repertórios imagéticos. 
No segundo aspecto, apresenta-se o texto Reflexões sobre alguns 
saberes específicos para um arte-educador, de Walace Rodrigues, que apresenta 
a perspectiva de um arte-educador acerca de saberes necessários para o bom 
exercício do ofício, apresentando um olhar reflexivo sobre sua experiência com 
o componente curricular Arte e a necessidade do aperfeiçoamento constante 
dos arte-educadores para que esse ensino esteja alinhado a grande diversidade 
de realidades encontrada nas escolas brasileiras e a pluralidade cultural que 
pode ser trabalhada em sala de aula alinhada às materialidades e a criatividade 
transformando a prática cotidiana do ensino de Arte. 
Os textos, ainda, abrangem experiências em todos os níveis de 
escolarização, começando pela Educação Infantil, como é o caso de Existência 
e resistência da creche/pré-escola oeste da USP sob o olhar da arte/educação, de 
Radamés Alves Rocha da Silva e Maria Christina de Souza Lima Rizzi e Museus 
e instituições educacionais de Educação Infantil: infâncias, crianças e famílias na 
relação, de Michelle Dantas Ferreira e Adrianne Ogêda Guedes.
O texto de Radamés Alves Rocha da Silva e Maria Christina de Souza 
Lima Rizzi discute as perspectivas de uma Arte/Educação Humanista, dentro 
do universo da creche/pré-escola da Universidade de São Paulo (USP), trazendo 
como problemática o que em vista da diversidade e visibilidade pode conferir-lhe 
o status de um patrimônio cultural e imaterial da USP e referência de Educação 
Infantil.
O texto de Michelle Dantas Ferreira e Adrianne Ogêda Guedes apresenta 
aspectos das vivências em instituições museais para crianças desde a fase da 
educação infantil e defende que esses espaços informais de aprendizagem 
da Arte não só podem como devem ser frequentados por crianças desde sua 
primeira infância, retratando com um entendimento mais amplo esse espaço 
cultural como lugar de aprendizagem e não apenas como lugar de lazer através 
das relações estabelecidas entre instituições educacionais, museus/centros 
culturais e crianças, ainda apresentam os resultados de uma investigação 
envolvendo uma instituição educacional localizada em uma favela da Zona 
Norte do Rio de Janeiro.
10
APRESENTAÇÃO
Não restringindo-se apenas a um dos aspectos aqui mencionados, 
mas permeando vários, deles, os textos passam, também, por experiências na 
Educação Básica, como se vê no texto Montagem teatral e festival estudantil de 
teatro na Educação Básica: processos pedagógicos, de Marcos Clóvis Fogaça, em 
que relata as experiências vividas a partir da criação de um festival estudantil 
de teatro nas aulas de Arte e Projeto de Vida, pontuando a contribuição para 
montagens teatrais significativas na escola, formação de plateia, processos 
de criação, visando o protagonismo juvenil frente aos desafios da montagem e 
gerando reflexões sobre o trabalho do professor de teatro na arte de conduzir 
processos artísticos e pedagógicos. 
O texto Arte popular e a festa junina temática no Colégio Pentágono, de 
Radamés Alves Rocha da Silva, aborda as práticas de ensino e questões didáticas 
e pedagógicas, organizadas e estruturadas por meio de discussão pertinente 
sobre o ensino de Arte, a partir dos registros de experiências e resultados de 
investigações dos processos de criação e manifestações artísticas na temática 
da Arte Popular no referido colégio.
Na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA), consta o texto 
Há um super-herói dentro de você: pesquisa e prática sobre a autoestima e a 
expressão artística na EJA, de Caroline Ferreira da Silva, em que são apresentadas 
reflexões importantes sobre a produção de desenhos por alunos/as da EJA, 
oriundas de oficina remota, durante a pandemia de Covid-19, em que estes/estas 
são instigados a olharem para si e suas trajetórias de vida, espelhando-se na 
jornada do herói, um monomito em que a personagem supera vários desafios na 
vida para ir se transformando em quem se é.
E chega-se ao Ensino Superior a partir de Ensino Superior inclusivo: 
relato de uma experiência de sucesso acadêmico em um curso de licenciatura em 
artes visuais, de Luís Müller Posca e Fabiano Ferreira Lucena, em que os autores 
tratam do tema inclusão nas Artes Visuais através da experiência exitosa de 
um acadêmico com encefalopatia crônica, que concluiu seus estudos no curso 
de Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Federal de Roraima (UFRR). 
Trata, ainda, de como professor e aluno resolveram o problema do trabalho de 
conclusão de curso, tendo em vista as dificuldades de escrita desse acadêmico, 
através de uma metodologia de pesquisa que culminou com a criação de um 
vídeo etnográfico. 
E de outro texto, O subprojeto de música do PIBID da UEMA: 
contextualização histórica (2018 - 2020), de João Costa Gouveia Neto, em que 
apresenta as experiências do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação 
à Docência (PIBID), que tem por objetivo conceder bolsas para fomentar os 
estudos e as práticas sobre a formação de professores, a partir das vivências 
dos/as alunos/as de Licenciatura, que estão na primeira parte do curso. As 
atividades foram desenvolvidas em três escolas públicas da rede estadual de 
Educação de São Luís, capital do Maranhão, contando com a participação de 24 
11
ARTE E EDUCAÇÃO: encontros investigativos na contemporaneidade
bolsistas, 3 supervisores de escolas e 1 coordenador de área. O texto também 
aponta a importância da interlocução constante entre os saberes produzidos na 
universidade e as experiências cotidianas das escolas. 
Ainda que o espaço privilegiado de ação e reflexão dos textos seja 
o da escola, pois esta se mostra como a instituição responsável, política e 
historicamente, por apresentar repertórios de saberes e por proporcionar 
situações e contextos de construção de sentidos e significados aos grupos que 
por ela passam, também, aparecem práticas envolvendo grupos organizados 
da sociedade civil e outras instituições no seu fazer educativo, como o museu, 
instituição cultural e artística, que também forma diferentes públicos e que 
aqui, estabelece relação próxima e direta com o ambiente escolar.
Nesta seleção há uma variedade de grupos etários e sociais envolvidos, 
mostrando que há uma preocupação em não circunscrever públicos prioritários 
no que toca a experimentação e exercício da Arte.
Também não há alguma linguagem artística priorizada, apresentando-
se práticas e experiências em Literatura, como traz o texto Imagem na literatura 
infantil: um convite à educação do olhar na sala de aula, de Rodolfo Rodrigues 
Pontes e Leandro do Nascimento Vieira de Souza, que entendem o livro infantil 
como sendo um objeto multimodal, que apresenta conexão entre Literatura e as 
Artes Visuais. E focam nos subsídios de análise da imagem/ilustração presente 
no objeto livro, como ferramentas para uma fruição estética de tal material. Os 
autores chamam a atenção para as ilustrações como elementos narradores e 
comunicadores, em diálogo com textos verbais, quando se co-apresentam com 
palavras escritas, mas também quando servem de suporte para narrativas orais.
Estão presentes textos sobre as várias linguagens da Arte, como 
Artes Visuais, Música, Teatro, Dança e Performance sem que haja, necessária 
ou exclusivamente, fronteiras entre elas, o que enriquece e favorece as 
possibilidades educativas e formativas no entrecruzamento, como se lê nos 
textos Oralimagens como práticas educativas em arte, de Francilene Brito da 
Silva, Corpo e processos criativos performáticos no ensino de arte, de Wechila 
Andrade de Brito e Educação que movimenta: saberes do corpo, fazeres na dança,de Artenilde Soares da Silva e Francisco Elismar da Silva Junior.
Francilene Brito da Silva traz reflexões e descrição de percurso 
metodológico de criação artística em oficinas com gravuras e outros meios 
imagéticos, que unem narrativas orais e narrativas em forma de imagens, 
denominadas oralimagens, que culminam em narrativas escritas com vistas a 
uma formação desubalternizante de sujeitos e grupos.
Wechila Andrade de Brito traz a linguagem da performance como um 
fazer artístico facilitador do trabalho com processos criativos conscientes e 
propositivos nas experimentações artísticas em salas de aula do Ensino Médio, 
relacionando aspectos pessoais à perspectivas epistemológicas e didático-
12
APRESENTAÇÃO
metodológicas da formação estética pós-moderna com o intuito de problematizar 
o corpo e a performance na Arte a partir da observação do transcurso histórico 
do ensino de Arte e da cultura visual.
E, por fim, Artenilde Soares da Silva e Francisco Elismar da Silva Junior 
apresentam a Dança a partir do corpo afrodescendente e de sua ascendência 
ancestral tendo como marco para as discussões do texto a matriz afro diaspórica 
como uma construção de conhecimento e das relações da Dança com a Educação, 
como meio de reconhecimento do corpo e conhecimento do mundo.
Acreditamos que as contribuições dos textos desta coletânea estão 
relacionadas aos exemplos bem sucedidos compartilhados pelos/as autores/as, 
a partir das experiências artístico-culturais, que têm a Arte como não somente 
como meio, mas como objeto de análise de entendimento das problemáticas e 
desafios educacionais. 
A perspectiva da Arte na Educação está para além da “[...] arte como 
certas manifestações da atividade humana diante das quais nosso sentimento 
é admirativo, isto é, nossa cultura possui uma noção que denomina solidamente 
algumas de suas atividades e as privilegia. [...].” (COLI, 1981, p. 12).
No contexto atual, é importante não perder de vista questões de Arte 
que têm levado em consideração dimensões do gosto relacionados ao bom e 
ao mau, ou a avanços e retrocessos, mas sem problematizações realmente 
estéticas e culturais. Neste sentido, essa é uma das contribuições da escrita da 
história para o entendimento da dinâmica humana não como boas ou ruins, mas 
como controversas, contraditórias e relacionadas às construções do tempo na 
qual estão inseridas e são compartilhadas socialmente (DOSSE, 2012).
Os organizadores
Referências
BARBOSA, Ana Mae. Arte-Educação no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2012. 
BARBOSA, Ana Mae. Redesenhando o Desenho: educadores, política e história. 
São Paulo: Editora Cortez, 2015. 
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Institui as diretrizes e bases 
da educação nacional. Brasília, 1996. 
BRASIL. Lei nº13.278, de 2 de maio de 2016. Altera o § 6º do art. 26 da Lei nº 
9.394, de 20 de dezembro de 1996, que fixa as diretrizes e bases da educação 
nacional, referente ao ensino da arte. Brasília, 2016.
CHARTIER, Roger. À beira da falésia: a história entre incertezas e inquietudes. 
Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2002. 
13
ARTE E EDUCAÇÃO: encontros investigativos na contemporaneidade
COLI, Jorge.O que é arte. São Paulo: Brasiliense, 1995. 
DEWEY, John. Arte como experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
DOSSE, François. História do tempo presente e historiografia. Revista Tempo 
e Argumento. 4(1), p. 5-22, 2012. Disponível em: http://www.revistas.udesc.br/
index.php/tempo/article/view/2175180304012012005/2014. Acesso em: 19 jan. 
2021.
FAZENDA, Ivani. Catarina Arantes. Interdisciplinaridade: Didática e Prática de 
Ensino. Interdisciplinaridade, São Paulo, v.1, n.6, p. 9-17, abr. 2015. 
LARROSA, Jorge. Tremores: escritos sobre experiência. Belo Horizonte: 
Autêntica, 2015.
MEIRIEU, Philippe. Frankenstein educador. Barcelona: Laertes, 3a. edição, 
2007.
 
14
EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM
EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. 
MEMÓRIA-IMAGEMMEMÓRIA-IMAGEM
Renata Sieiro Fernandes
DOI: 10.29327/529244.1-1
Abrindo as cartas
Fazer de uma disciplina oportunidade para experimentação artística da 
linguagem escrita e imagética, que proporcione campos de experiência de si, 
a que chamo de pesquisa de si, menos do que uma ementa para constar de um 
documento de programa de curso de Pós-graduação em Educação, é mais um 
mergulho em si, nos outros, no mundo a partir da noção de memória e da arte 
da memória. Talvez uma jornada que interconecta um eu a muitos outros. Uma 
tentativa motivada por um desejo de arriscar.
Ainda que, inicialmente, os estudantes possam ter se sentido estarrecidos, 
amedrontados, desnorteados, a partir de uma escrita-confissão de um deles, 
que serviu de escriba de um sentimento de incômodo coletivo registrado no 
aplicativo do celular, logo no início do percurso, uma coragem-confiança surgiu e 
tomou-nos de tal modo que dali em diante, o que viria a acontecer seria como se 
lançar de mãos dadas em um poço de águas profundas sem medo de se afogar. 
O objetivo deste texto é apresentar e analisar, sob a luz de conceitos 
de memória e de escrita como construção de si, algumas produções artísticas 
textuais e imagéticas realizadas durante o percurso de formação, estas últimas 
tomando o conteúdo de cartas de tarô de Marselha como inspiração. Desta 
forma, trata-se de um estudo exploratório, de cunho qualitativo no campo da 
Educação, sendo descritivo e analítico quanto ao que se objetiva.
A escrita pelo tarô
Em um mergulho sem escafandros, com a pele e pelos expostos ao sal 
e à agua, quem serve de guia é Bergson, o filósofo da memória, que se pergunta 
e nos pergunta: como o passado toca o presente? Ao entender que somos 
passado por tudo que vivemos e experimentamos, a lembrança é o que atualiza 
esse tempo sob a forma de imagem neste presente que não é mais do que uma 
duração, pois sempre já-foi. Imagem-lembrança.
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Renata Sieiro Fernandes
[...] por “imagem” entendemos uma certa existência que é mais do 
que aquilo que o idealista chama uma representação, porém menos 
do que aquilo que o realista chama uma coisa - uma existência situada 
a meio caminho entre a “coisa” e a “representação”. (BERGSON apud 
ANDRADE, 2012, p. 137)
As imagens exteriores movimentam o corpo por afecção e este, em 
ação, devolve os movimentos às imagens, sendo impossível definir o limite entre 
elas. O cone invertido, metáfora bergsoniana, serve para demonstrar quando o 
passado (uma base imensa) toca o presente (a ponta, o vértice) em um plano 
de imanência, em que a imagem encontra o mundo. É quando o espírito toca a 
matéria.
Ou no “apelido” dado por Santos (2018), de acordeom bergsoniano, 
“porque descreve remotamente o formato da figura e suas qualidades de 
contração e expansão ressonantes da memória e das camadas virtuais da 
realidade no objeto” (p. 40).
Assim, o passado se atualiza e pressiona o presente e cria o futuro, 
indeterminado, em instantâneos, em continuidade, em fluxos, em interpenetração. 
“A duração é o progresso contínuo do passado que rói o porvir e incha à medida 
que avança” (BERGSON apud ANDRADE, 2012, p. 140).
Lispector (1979), poeticamente nomeia a volatilidade do presente de 
“instante-já”. E o descreve como sendo 
[...] um pirilampo que acende e apaga. O presente é o instante em que 
a roda do automóvel em alta velocidade toca minimamente no chão. E 
a parte da roda que ainda não tocou, tocará num imediato que absorve 
o instante presente e torna-o passado. Eu, viva e tremeluzente como os 
instantes, acendo-me e me apago, acendo e apago, acendo e apago. Só 
que aquilo que capto em mim tem, quando está agora sendo transposto 
em escrita, o desespero das palavras ocuparem mais instantes que um 
relance de olhar. Mais que um instante, quero seu fluxo. (LISPECTOR, 
1979, p. 4)
Tomando o tempo e não o espaço como suporte para a memória, Bergson 
entende que “a sucessão temporal é uma mudança ou fluxo contínuo incessante, 
uma transformaçãoininterrupta. Tanto na vida psíquica quanto no mundo físico, 
não há estabilidade” (COELHO, 2004, p. 240), portanto, a mudança é constitutiva 
do real, não havendo, assim, uma essência inalterada. A capacidade de perceber 
mudanças se dá pelo trabalho da memória, que é passado, pois o presente 
impede a percepção de relação entre o que é contínuo e o que é mutável. 
A percepção acontece no presente e a lembrança se faz a partir do 
passado, o que coloca ambas as temporalidades em contato e não de modo 
estático, mas em movimento é a memória atenta, “criadora, viva, maleável e 
móvel”. (MARQUES, 2017, p. 79)
[...] “criamos ou reconstruímos” o tempo todo, uma percepção que 
não é mais um processo de trajeto único, que iria da excitação 
ocasionada pelo objeto às sensações, das sensações às ideias 
e destas a pontos cada vez mais longínquos de nossa memória, 
fazendo-nos distanciar cada vez mais do objeto e não voltando mais 
ele. (MARQUES, 2017, p. 77)
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EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM
E é o corpo, lugar de passagem dos fluxos, dos movimentos e de reação, 
de ação, que introduz um saber, de interpretação. 
Lembrar é entendido, então, como um novo modo, a cada vez, de colocar 
em relação, logo, de interpretar as imagens, os signos (que contêm os símbolos, 
letras e números) que participam dos repertórios pessoais e coletivos. E, assim, 
o passado se atualiza.
Essa atualização acontece, por exemplo, quando se manuseiam e se 
atua sobre as cartas do tarô. Este é formado por um conjunto de imagens em 
forma de lâminas ou cartas que se constituem de 78 cartas divididas em três 
grupos, sendo 22 Arcanos ou Trunfos, 16 cartas da Corte e 40 cartas dos Naipes. 
Os quatro naipes são chamados de: bastões, taças, espadas e moedas e 
que, na atualidade são chamados de: paus, copas, espadas e ouros. Cada naipe 
tem quatro cartas da Corte, sendo elas: o Rei, a Rainha, o Valete e o Cavaleiro.
A palavra “arcano” vem do latim “arcanus” e significa “segredo, mistério” 
(BARTLETT, 2011). Todos os 22 Arcanos ou Trunfos do tarô são os seguintes: 0 
- O Louco; 1 - O Mágico; 2 - A Papisa; 3 - A Imperatriz; 4 - O Imperador; 5 - O Sumo 
Sacerdote; 6 - Os Enamorados; 7 - A Carruagem; 8 - A Força; 9 - O Eremita; 10 - 
Roda da Fortuna; 11 – A Justiça; 12 - O Enforcado; 13 – A Morte; 14 – A Temperança; 
15 - O Diabo; 16 - A Torre; 17 - A Estrela; 18 - A Lua; 19 - O Sol; 20 - O Julgamento; 21 
- O Mundo. 
Trata-se de um baralho de cartas misterioso e de origem desconhecida, 
tendo, pelo menos, seis séculos de existência e sendo o antepassado das 
modernas cartas de jogar (NICHOLS, 1995, p. 12). Segundo Nichols (1995), 
“nasceram num tempo em que o misterioso e o irracional tinham mais realidade 
do que hoje, trazem-nos uma ponte efetiva para a sabedoria ancestral do nosso 
eu mais íntimo” (p. 12).
Nichols (1995) e Santos (2018) sustentam ser o tarô um dispositivo 
mnemônico. Santos (2018) defende a ideia de o tarô pertencer ao princípio da Ars 
Memoriae do tempo, largamente usado na Antiguidade, que servia para manter 
na memória os repertórios e princípios de todos os campos do conhecimento. O 
palácio da memória e o teatro da memória são construções arquitetônicas 
que se edificavam com o intuito de servirem de sustentação espacial para um 
repertório visual que facilita a retenção e a evocação da memória temporal, 
segundo o autor. 
Deste modo, a motivação é desenvolver e aprimorar um dispositivo que 
faz uma ideia se transformar em uma imagem e esta em memória. 
E permanece na atualidade como uma tradição cultural que “constitui o 
legado de imagens e objetos sobre os quais agem os seres humanos, além dos 
repertórios de formas de agir da maneira mais eficiente sobre estes objetos e 
imagens”. (SANTOS, 2018, p. 28)
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Renata Sieiro Fernandes
Sendo assim, o dispositivo mnemônico proporcionaria um contato com 
saberes antigos por meio de lembranças e evocações e de associação entre 
os repertórios disponibilizados, mas, para que tudo isso faça sentido interno, 
ou seja, que ative memórias pessoais, bem como coletivas (na medida em que 
afetam os grupos humanos) é preciso que haja uma ativação provocada pelos 
órgãos sensoriais (percepção) e por um trabalho cognitivo, de atenção, de 
imaginação, criação e reflexão. 
Por esta razão, Santos (2018) entende ser o tarô de Marselha arte da 
memória, estabelecida em uma construção arquitetônica (como se vê na figura 
abaixo), operando como uma “máquina de educação sensorial” (p. 28) que 
comporta em si imagens agentes (imagines agentes), sinais (notae) e símbolos 
(simulacra).
A memória se expande e se contrai por um trabalho perceptivo e reflexivo, 
não sendo cronológica e nem espacializada, mas temporal. Esse trabalho 
sobre objetos, imagens e símbolos de um passado, se atualizam no presente e 
se refere a imprimir atenção e percepção para partes e para o todo, extraindo 
elementos, indícios que se conectam a outros e costuram possíveis sentidos e 
significados, criando interpretações que sustentam os modos de ser, existir e 
viver no agrupamentos humanos e não-humanos.
É tanto ação sobre as coisas como sobre si. E é tanto atuação como 
atualização, no sentido bergsoniano atribuído por Santos (2018).
Escrever também participa desse ato que coloca em relação e 
interpretação os repertórios e um ato de criação sobre as coisas, o mundo e 
sobre si. Ao fazer isso, o sujeito se faz, se cria, se inventa, ou ensaia novas formas 
de subjetivação. Escrever é uma prática, entre outras, que age sobre a memória 
e que forja subjetividades. 
Pode-se incluir também, a produção de imagens, como em um trabalho 
com intenções artísticas, como forjadora de subjetividades, pois que tanto a 
escrita quanto a colagem – no caso específico da proposta de oficinas de que 
trata este texto – são linguagens, logo, discursos verbais e não verbais. 
Segundo Hall (1997, p. 33), “toda prática social tem condições culturais 
ou discursivas de existência. As práticas sociais, na medida em que dependem 
do significado para funcionarem e produzirem efeitos, se situam ‘dentro do 
discurso’, são ‘discursivas’”.
Fazer uso da palavra é um recurso de memória (oral e escrita) e a 
produção de discursos é mais do que comunicar e expressar se entendemos que 
é invenção de si, sendo a linguagem o que constitui e configura o mundo, muito 
mais do que representação. Entender a potência dos discursos, por exemplo, 
da escrita nesse processo é tratar a linguagem como prática do pensamento, 
como diz Nobre (2018), do uso feito por Nietzsche, assumidamente como um 
recurso filosófico-poético, um encontro entre filosofia, arte e vida. Portanto, 
para Nietzsche, a escrita, a narrativa não é nunca um meio para, mas um fim.
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EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM
A partir de um percurso de formação teórico e prático, desenvolvido em 
uma disciplina de Pós-graduação em Educação, em um Centro Universitário 
localizado no interior do Estado de São Paulo, com 11 alunos/as, por 4 meses, 
totalizando 15 aulas de 3 horas e 30 minutos cada, busca-se apresentar e 
analisar a produção artística textual e imagética dos alunos participantes sob 
a luz de conceitos de memória e de escrita como construção de si, tomando o 
baralho de tarô de Marselha como inspiração.
Assim, trata-se de um estudo exploratório, de abordagem qualitativa, 
no campo da Educação. As abordagens metodológicas utilizadas obedeceram 
aos procedimentos éticos estabelecidos para a pesquisa científica em 
Ciência Humanas. O estudo exploratório ou a pesquisa exploratória visa uma 
aproximação com o fenômeno que está sendo investigado, uma investigação 
preliminar, de modo que uma pesquisa subsequente possa ser concebida com 
uma maior compreensão, entendimento e precisão.
Para Babbie (apud PIOVESAN; TEMPORINI, 1995, p. 320), “estudos 
exploratórios são mais comumentemente desenvolvidos para três propósitos: 
(1) simplesmente satisfazer a curiosidade e o desejo de compreensão do 
pesquisador, (2) testar a viabilidadede realizar um estudo mais cuidadoso e 
(3) desenvolver métodos a serem empregados em um estudo mais cuidadoso”. 
(Tradução minha).
Desta forma, o desejo de compreensão da pesquisadora se vincula a 
apresentar as produções textuais e imagéticas de alunos/as construídas durante 
o percurso de uma disciplina que tratou da memória e da arte da memória, 
valendo-se do tarô de Marselha como instrumento orientador e inspirador. E, 
com isso, buscar algumas possíveis análises a partir dos efeitos oriundos da 
aproximação e leitura das composições, bem como dos afetos sentidos e das 
percepções proporcionadas sobre o trabalho da memória em cada um e em mim, 
tomando-se o repertório pessoal e coletivo (presente no baralho) e a escrita 
como invenção de si, constituindo-se, a memória, a escrita e a colagem como 
caminhos de pesquisa de si e subjetivação.
O percurso consistiu de uma parte inicial teórica e literária1, desenvolvida 
nos 3 primeiros meses e, de uma parte prática, desenvolvida no mês seguinte, 
constituindo-se em oficinas de colagem. A produção textual, prática pós-
colagem, ocorreu como trabalho doméstico.
A parte teórica tratou, basicamente, dos conceitos de Bergson sobre 
tempo e memória e da pesquisa de doutorado de Ribeiro (2018) sobre o tarô de 
Marselha como Arte da Memória. 
A proposta relativa à parte prática da oficina de colagem foi a seguinte: 
a cada aula eram sorteadas duas cartas do baralho de tarô de Marselha, que 
eram apresentadas visualmente tomando-se informações descritivas de seus 
1 Agradecimento especial ao João Grego, que proferiu palestra sobre o tarô.
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Renata Sieiro Fernandes
elementos imagéticos, simbólicos e metafóricos (disponíveis em <http://www.
clubedotaro.com.br>), bem como a apresentação de cartas imagéticas similares 
de outros baralhos, de diferentes tempos, espaços e autorias. Sendo assim, 
todos/as produziriam, pelo menos, 10 cartas (do total de 22 arcanos superiores). 
A figura 1 mostra um dos baralhos produzidos, com todos os arcanos 
superiores (FERNANDES, 2019): 
Figura 1: 22 arcanos superiores
 
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EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM
Fonte: Fernandes (2019)
Após esse contato inicial, partia-se para o trabalho de busca de 
imagens que evocassem os conteúdos das duas cartas, por meio de analogias 
e metáforas e, na sequência, o processo criativo e artístico de composição dos 
elementos por meio de colagem a fim de produzir um discurso, um texto, ainda 
que não totalmente compreensível ou entendível, pois que buscava-se lidar com 
o intuitivo, o inconsciente, e as evocações que isso traz.
Deste modo, estabelecer um contato com o que se desafia Lispector 
(1999):
[...] não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. 
Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. 
Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, 
do modo como falo, é um dom. não entender, mas não como um simples 
de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção 
estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse mando, 
é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: 
quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que 
não entendo”. (LISPECTOR, 1999, s/p)
Para a escritora, entender não se trata de inteligência, mas de sentir, 
deixar-se tocar, afetar pelo que está em volta, dentro de si, que transborda, que 
atravessa. 
Motivados por esse desafio, foram construídas, inicialmente, 10 cartas 
inspiradas nos seguintes arcanos sorteados: O Louco; O Mágico; A Roda da 
Fortuna; O Enforcado; A Morte; A Temperança; O Diabo; A Torre; A Estrela; O 
Mundo, embora alguns/mas alunos/as tenham produzido todo o conjunto.
 
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Renata Sieiro Fernandes
A cada início de aula, as cartas eram socializadas bem como era feita 
a leitura em voz alta do texto produzido em casa. Assim, exercitamos tanto o 
sentido da visão quanto o da escuta e nos aproximamos do universo pessoal 
de cada um, embora, como em um “acordeom de Bergson” (RIBEIRO, 2018), as 
temporalidades e o universo de todos também estava presente ali, como fluxos 
ativadores.
Para fins de apresentação e análise utilizou-se como procedimento a 
montagem de um conjunto de produções individuais (imagens-cartas e textos-
narrativas), selecionadas por cada aluno/a a partir do critério de potência em 
termos de exploração simbólica e textual e de significativo mergulho em si e no 
universo da memória como repertório coletivo, da humanidade. 
Essas cartas são apresentadas como na série do tarô, uma ao lado 
da outra, ainda que possam repetir algum arcano ou que nem todos estejam 
presentes. A ideia é apresentar todas como uma única composição que 
estabelece conexões e relações entre si.
Na sequência são apresentados trechos dos textos-narrativas, a partir 
do original, de modo a dar visibilidade para os modos experimentados pelos/as 
alunos/as da escrita-pensamento e da escrita-fluxo.
E, por fim, são apresentados trechos dos depoimentos dos/as próprios/
as sobre os aprendizados proporcionados pelas experiências no percurso da 
disciplina extraídos de auto avaliações.
As análises feitas não buscam esgotar as possibilidades de atribuição 
de sentido, mas esboçar reflexões a partir dos afetos provocados pela leitura 
(no momento privado, doméstico) e pela audição (no momento das aulas).
A autoria das produções será indicada pela inicial do nome de cada 
aluno/a.
As imagens-carta
Na composição da figura 2 aparecem as cartas com referência direta 
aos arcanos O Enforcado/Pendurado, A Morte, O Louco, O Mundo, O Mágico 
(O Mago), A Estrela. Uma é denominada Gêmeos, fazendo alusão à dualidade 
(presente na carta A Lua). 
Os elementos presentes nas cartas foram escolhidos motivados por 
analogias e metáforas relacionadas ao contexto histórico e místico da carta 
referida ao tarô e compõem uma narrativa individual, bem como coletiva, pois o 
universo simbólico é compartilhado e possível de ser lido e interpretado, ainda 
que careça ou dispense explicação que acompanhe cada carta. São singulares e 
plurais, pois dizem de si e para todos.
Mostram um exercício de criação, envolvendo imaginação, criatividade, 
composição de narrativa não verbal, trabalho artístico (com colagem manual ou 
digital e, excepcionalmente, desenhos) e apreço estético.
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EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM
Figura 2: Mosaico
Fonte: (Elaboração da autora)
O Enforcado (de A.) é representado por um corpo feminino-trans, de 
ponta cabeça, sendo a corda substituída pelo crucifixo e adicionando-se uma 
plaqueta indicando “homofobia LGBT”, em uma referência a Jesus, na religião 
católica. A imagem foi, originalmente, encenada na rua pelo movimento contra a 
homofobia, em São Paulo-SP. 
A inversão ou a suspensão de ponta cabeça ajuda a mudar perspectivas, 
ações, sentimentos, pensamentos. Traz a ideia de auto sacrifício e do/a herói/
heroína, que se coloca a espera ou em demonstração para que os outros se 
projetem nele e sejam convidados a remexer em estruturas fixas e rígidas.
A carta Gêmeos (de B.), traz a ideia da dualidade indivisível, ou a do 
oposto complementar, presente na carta A Lua. Há menção ao claro-escuro e ao 
duplo que surge do uno, como na divisão celular. E, ainda, traz a representação 
do yin-yang (preto-branco), símbolo oriental, taoísta, que indica a co-presença, 
a existência compartilhada e a união.
O Louco (da P.) usa a imagem do personagem do filme “Alice no País 
das Maravilhas”, de Tim Burton, inspirado no livro homônimo de Lewis Carrol, 
e assim como ele, inspira o espírito brincalhão, aquele que ousa, que não teme, 
que pode dizer o que pensa, que está aberto às novas experiências, como as 
crianças, seguidas pelos fiéis cães em novos e desconhecidos caminhos. Aquele 
que traz caos aonde prevalece a ordem.
As quatro cartas da Morte (de G.; S.; L.; W.) evocam a referência à 
despedida, ao fim, ao luto (anunciado na cor negra, pelas ruínas, pelo anjo, pela 
foice, pelo crânio e peloscorvos), mas também, o lado positivo traduzido pelas 
 
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Renata Sieiro Fernandes
cores, que se referem ao início de algo novo, à renovação, à transformação (pelo 
efeito do fogo e pela menção à fênix), correspondendo a términos e inícios de 
ciclos que se repetem infinitamente (na alusão ao oito horizontalizado e à espiral), 
como acontece com a natureza (e as flores de vermelho exuberante atestam 
isso). Também estão presentes símbolos do Reiki, uma terapia japonesa, ligados 
à transmutação, purificação e proteção. 
A carta dO Mundo (de R.) traz elementos do cosmos (a lua e as estrelas) 
e a influência na Terra e sobre a humanidade e a natureza, no que toca à criação 
e à necessidade de (auto)desenvolvimento e aprendizados.
A carta dO Mago é revertida para o feminino (na produção de D.), e mantém 
a evocação direta à imagem do mago como mágico, aquele que entretém, que 
tira da cartola com a ação de uma varinha, algo insuspeitado. Assim como no 
tarô, também evoca o alquimista, com efeitos de ilusão manipulada, de jogo, de 
invenção; nesta carta confeccionada, o brilho sugerido pelos confetes e pelas 
estrelas, e a referência ao mar, ao oceano e à natureza, trazem indícios da origem, 
da criação de tudo.
E, por fim, a carta dA Estrela (de P.P.), assumidamente feminina, 
condensada, fazendo uso da figura da mulher no canto esquerdo e pela fusão 
do rosto com o corpo em formato do astro de seis pontas, servindo de pescoço, 
tronco e membros superiores e inferiores. A intersecção ou interpenetração de 
dois triângulos para formar a estrela de seis pontas refere-se a junção do princípio 
masculino (o vértice ascendente) com o feminino (o vértice descendente), em 
harmonia e equilíbrio, o que origina a energia vital e o surgimento dos tempos. 
Os textos-narrativas
Os trechos dos textos, das narrativas produzidas pelos/as alunos/
as, foram escolhidos pelos/as próprios/as, exceção feita quando esta não foi 
apresentada, cabendo a mim fazer uma seleção dentre as que me foram enviadas.
Texto 1
[...] A escrita poética ou a visita na caverna atinge os cinco sentidos. 
Leva sabor a boca, sons aos ouvidos, cores aos olhos, textura ao tato 
e odores ao nariz. Entre o pequeno espaço de tempo que o presente 
ocupa, a expressão comunicativa que sai do abstrato e vira concreto 
pode perpetuar o momento. Fotografia, pintura, escrita, um risco na 
parede. O ato de riscar é passado, o risco é presente.
Lembro-me de quando criança perguntar para a irmã mais velha se 
era projetado sobre minha cabeça um balão de pensamento expondo 
minhas ideias sem filtragem. Ela me assegurou dizendo que não, logo 
depois de direcionar o olhar para cima de minha cabeça. [...] Observando 
a criança de um ano que herda meu nariz e engatinha com uma cópia 
masculina de minhas expressões faciais me questiono: Por que diabos 
viemos de fábrica já com uma caixinha do inconsciente coletivo da 
curiosidade em enfiar o dedo no buraco da tomada da parede? Será que 
o instinto de segurança é menor que o da curiosidade? Será que aquele 
dedinho tem vontade própria e contrária ao que se deve fazer? (B.)
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EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM
Texto 2
[...] Olhinhos de gato, humildade e desespero... por favor, por favor, mais 
uma vez, só mais uma vez... lampejo de vida, era mais que o seu respirar... 
aninhada nos braços da irmã mais velha, ouvia, boquiaberta, os contos 
fantásticos que lhe faziam transcender para outros mundos... seriam 
as histórias, a imaginação ou o afeto daquele momento que marcariam, 
para sempre, a sua vida? [...] Quando Nona teceu o fio da vida no ventre 
da minha mãe, as águas eram mornas, tranquilas, acolhedoras... eu 
estava mergulhada e daí a força do nascer. Foi chegado o tempo de 
remar... por instinto, por aprendizado, por intuição...
Mergulhar...
Me leva mais longe... mas... para mim não existe o longe, pois se o prazer 
está na an–dança, sigo a bailar e tanto faz onde irei chegar. 
Quem sabe onde vai chegar? 
Por que eu teria de saber? Mas isso... sou eu hoje. (D.)
Texto 3
[...] Algo em nós, por algum motivo inexplicavelmente oculto, começou a 
brotar novamente. A vida dentro de nós tornou a florescer, tirando força 
de nosso adubo interior, de nossas próprias entranhas, as quais foram 
devoradas e fertilizaram nossos sentimentos. No fluxo da roda da vida 
que girava incessantemente descobrimos que tudo que havia lá fora, o 
piso de casa onde o papai pisava antes de sair de casa, continuava lá. E 
de repente percebemos que as paredes do muro já estavam mais baixas 
e já conseguíamos ver o outro lado da rua: as pessoas ainda estavam lá, 
os trabalhadores da fábrica ao lado estavam cumprindo suas tarefas 
novamente e os passarinhos voltaram a cantar nos galhos das árvores 
do vizinho. Ainda havia louça suja na pia, mas agora acreditávamos 
que daríamos conta de organizar tudo. Da água de nosso próprio 
saco embrionário a vida passou a fluir novamente e novas penas nos 
revestiram, rasgando nossa pele e ardendo como fogo para crescerem. 
Fomos levados a um voo ainda mais longo que o da vida anterior, dessa 
vez solo, cheio de desafios que nos deram “frio na barriga” por nos 
sentirmos desprotegidos. [...] Assim, a morte renova a vida e dá a ela 
novo sentido: aos que foram, voltarão em breve, renascendo em novos 
corpos para novas experiências e aos que ficaram, um reencontro 
eterno consigo próprios renascendo também, mas em seus próprios 
corpos, já de pele trocada. (G.)
Texto 4
[..] A escuridão... que escuridão é essa que me cerca? Tô na escuridão 
enxergando as coisas belas e bonitas da vida!
Minha audição é igual a sua... eu só presto mais atenção aos pequenos 
detalhes que pra você passam despercebido. Ouço sons, vozes, latidos, 
portas batendo, carros acelerando, bebês chorando e todos eles me 
guiam em meu dia a dia. Mais um som que gosto é o som da minha 
máquina braile, o bater das teclas é música para meus ouvidos. É um 
som aconchegante e tão conhecido para mim.
E que posso falar sobre música? É minha paixão! Mais gosto de música 
com melodia e com letras que tocam meu coração.
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Renata Sieiro Fernandes
E os cheiros? Sinto a sutileza de distintos cheiros...dos bons e ruins. 
Andando pela rua sinto cheiro de comida quando passo pelo restaurante, 
o cheiro do lixo jogado no chão, das flores no jardim, da gasolina no 
posto e piso no cocô do cachorro! Aff! Sempre tem um cocô no meio do 
caminho. Paro na esquina. O que é esquina? Não entendo direito, mas 
fazer o que... 
Estou parado e sinto me puxarem, atravesso a rua. Mas não queria 
atravessar! Porque os videntes veem algum cego parado na esquina e 
já vão puxando o braço sem perguntar? Poxa, só sou cego mais sei falar. 
(P.P.)
Texto 5
[...] Sou fera, sou anjo, sou o que sou!
Vazios sempre sentiremos!
O ar que explode em meu peito, ecoa no universo como se fosse um 
dragão cuspindo fogo a me dizer CORAGEM!
O céu e as estrelas emanam vibrações positivas, e eu cá a sentir o vazio. 
Necessito da rotação a preencher com sabedoria e discernimento tudo 
o que rege em mim e o que me cerca neste mundo tão afoito.
Eu não sou combustível
Sou gente. Sou pessoa. Sou coração. Sou vida. Sou importante. Sou 
raiz. Sou sombra. Sou sol. Sou estrela. Sou paz. Sou a mistura viva no 
infinito a girar na imensidão do Universo. E você? (R.)
Nestes exercícios de escrita há evocações e ressignificações pelo 
trabalho da memória sobre algo localizado no tempo passado e que se atualiza 
no presente, no momento da lembrança, da escrita, da leitura em voz alta, da 
escuta. Mesmo que cada história lembrada e reescrita seja particular, é possível 
lançar projeções emotivas e empáticas, pois que, se em cada parte se reflete o 
todo, os efeitos das palavras, das sensações, das imagens construídas remetem 
a algo universal.
A escrita de si traz mais do que apenas memórias; traz certos 
experimentos com a própria palavra e o desenho dela no papel. Nessa escrita 
se arriscam perguntas sem resposta, um texto que duvida de si, quebusca se 
ensaiar. Que mais do que argumentar e explicar, ousa assumir-se narrando.
Percebe-se na trama que sustenta a tessitura, os conceitos e os/as 
autores/as alinhavados na autoria textual. Não se escreve sozinho, ainda que, 
possivelmente, em situações solitárias, mas carregam-se junto os pensamentos 
e vozes de um punhado de gente que se leu, com quem se conversou, de quem se 
ouviu. Uma escrita que busca mover-se para além do habitual, do senso comum, 
em conversa, consenso ou dissenso com outras ideias e modos forjados em 
outros arranjos espaciais e temporais com as palavras.
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EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM
Exercita-se outra escrita mesmo na primeira pessoa do singular. Mas, 
também, exercita-se o “eu” em pessoas indeterminadas ou assumindo-se o 
lugar do “tu” ou do “ele”, como no caso do rapaz cego. Inventa-se na transcrição 
mediada de um relato emocionado e emocionante, em que silêncios, choros, 
abraços se enredam em corpos-palavras. 
Experimento de escrita poética, com mais fissuras entre, por onde 
escapam sentidos, do que pela prosa que guia. Certo abandono da prosa 
coloquial pela busca do poema.
Como diz Paz (2001) sobre as diferenças entre a prosa e o poema,
Também no poema – cristalização verbal – a linguagem se desvia de seu 
fim natural: a comunicação. A disposição linear é uma característica 
básica da linguagem; as palavras se enlaçam umas às outras de forma 
que a fala pode ser comparada a um veio d’água correndo. No poema 
a linearidade se torce, atropela seus próprios passos, serpenteia: a 
linha reta deixa de ser o arquétipo em favor do círculo e da espiral. Há 
um momento em que a linguagem deixa de deslizar e, por assim dizer, 
levanta-se e move-se sobre o vazio; há outro em que cessa de fluir e 
transforma-se em um sólido transparente – cubo, esfera, obelisco 
– plantado no centro da página. Os significados congelam-se ou 
dispersam-se, de uma forma ou de outra, negam-se. As palavras não 
dizem as mesmas coisas que na prosa; o poema não aspira a dizer e, 
sim, a ser (PAZ, 2001, p. 13)
E certa entrega ao estreitamento e aproximação ao intuitivo, que leva 
a voos e a aterramento. Escrita como exercício de pensamento, de vida, que se 
faz com motivo e motivação. Escrita sintética por necessidade ou extensa por 
adensamento, mas não a escrita do cotidiano, acadêmica. Escrita com fins de 
criar e abarcar vida, escrita-pensamento, escrita-fluxo.
Construções textuais que buscam afinar forma e conteúdo, fazendo 
uso de cores nas fontes ou no fundo do papel, de formatos e tamanhos das 
fontes, com transgressões nas letras maiúsculas e minúsculas frente ao usual, 
na diagramação no papel dentre muitas tentativas que avançam para fora de 
normativas e moldes. Uma escrita que se amplia e da qual apropria-se.
Do trabalho da memória a partir da percepção sensorial e da construção 
pelas imagens do que se vê, se sente e se imagina do mundo passa-se a um 
trabalho cognitivo-reflexivo de conexão entre partes e todo e de construção 
de sentidos aliados a um trabalho de correlação entre o si, os outros, as coisas 
e o mundo. Esse movimento indica fluxo, de expansão e contração em que o 
cronológico não atua como noção temporal, mas as diferentes temporalidades 
co-existem, com o passado se deslocando ao realizar-se de múltiplos modos no 
presente (como entende Bergson ou com o futuro roendo o passado, em potência 
de devir, “puxando” aquele e transformando-o (no pensamento deleuziano).
E mais do que guiar o processo reflexivo por meio de tentativas racionais 
ou controladoras, permitir ser guiado pela intuição e pelo inconsciente que se 
manifesta imageticamente, em palavras, sinais e símbolos que constituem os 
discursos verbais e não-verbais.
27
Renata Sieiro Fernandes
Assim, tanto as imagens-carta, deflagradas pelo tarô de Marselha e 
seus repertórios imagéticos, bem como os textos-narrativos, disparados por 
imagens mentais oriundas do material lido e visto, possibilitaram manusear o 
aparato pessoal e coletivo da memória, em suas temporalidades, construindo 
subjetividades abertas, flexíveis, provisórias, em uma ousadia de exercício de 
experimentação. 
No depoimento de B. aparece a permissão para adentrar o invisível 
depois de alvejada por imagens celestiais:
[...] Adorei os textos discutidos em sala, principalmente sobre Nietzsche. 
O primeiro texto de Clarisse Lispector me despertou formas inusitadas 
de pensar sobre a escrita acadêmica. Foi muito forte a relação dos 
assuntos discutidos em sala e das imagens inconscientes que me 
foram acordadas ao longo do semestre. Por três vezes, eu avistei anjos. 
Parece loucura, mas de fato aconteceu. Anjos brancos, como estátuas 
vivas. Embora o susto tenha sido intenso, me permiti vivenciar essa 
experiência e aprofundar as possibilidades de acesso que corpo, mente 
e alma tem ao entrar em iterligações. (B.)
E, também, a experiência de quem se entregou a ouvir o canto da sereia 
e seguir com ela com ou sem medo:
[...] Entendi que há um universo a ser desbravado dentro de cada um 
nós, que nossa singularidade importa ao universo, sendo passível de 
estudos. Aprendi que mesmo eu sendo tão pequena posso dialogar com 
autores grandes, entendendo suas ideias e criando as minhas a partir 
das deles e que tenho contribuições a dar à formação do imaginário 
coletivo. Essa disciplina foi uma experiência única. [...] Todos os textos 
conversaram entre si e produziram o sentido para nos tirar do óbvio e nos 
levar ao desconhecido, em busca do desbravamento de um imaginário 
singular, que é também coletivo. (G.)
[...] Surpreendentemente me fez adentrar meu interior. Iniciou em mim 
um autoconhecimento diferente, com reflexões que eu nem estava 
disposta a fazer. [...]me senti profundamente tocada pelas narrativas 
de meus colegas e pude perceber quão rica foi esta experiência. (W.)
[...] Esperava um novo renascimento, um fim necessário alojado 
em minha interioridade que despertou-se com a destruição, com a 
criação, com a semente de um discernimento severo e uma sabedoria 
drástica. Esperava pela possibilidade de se construir um pórtico que 
contornasse as entranhas intelectuais e espirituais da minha tão 
falha e tão acertada subjetividade. [...] Esperava generosidade cortês, 
combinação e apropriação das bibliografias estudadas. Esperava 
Paixão. Transcendência da racionalidade. Ilusionismo talvez. Alquimia 
com certeza. Deslocamentos internos então, nem se fala. Felizmente 
não sou mais a mesma. Nem de perto nem de longe. [...] Por ter sentido 
toda a robustez de uma jornada acadêmica, que forma um Espírito 
Alerta e faminto por alegorias, por abandonos de velhos hábitos, por 
profundidade simbólico-existencial. Por desapegos e novos apegos. 
Pela ordem e desordem que a aprendizagem faz girar dentro da gente. 
Pelas expectativas que abraçam a sedução mágica de aprender, que 
nos constituem e re-constituem. Sempre. Ininterruptamente. (L.)
Assumir olhar para si e para fora, em movimento correlacionado, e 
reconhecer a importância e necessidade de usar a escrita para ir traçando 
possibilidades de experimentação lá e cá aparecem nos depoimentos:
28
EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM
[...] As narrativas todas me ajudaram a olhar pra dentro e para fora 
e ver algumas coisas. [...] abrir o leque, a mente, sair da caixinha, do 
tradicionalmente construído e escrever de si, do que sente, de renovar 
o olhar e o modo como perceber o entorno e a vida, a liberdade para 
escrever, ser provocada, desafiada e acima de tudo respeitada nas 
produções tímidas que me atrevi a produzir. (I.)
[...] Possibilitou-me ainda o desenvolvimento da capacidade de 
subverter, de me permitir. [...] Experienciei a escrita como necessidade 
de vida. [...]Senti-me como se, de fato, eu continuasse uma narrativa 
que não é só minha, mas de todos nós. Como se cumprisse a missão de 
perpetuar a nossa ancestralidade. (D.)
[...] Em toda aula eu tentava mudar um pouco a minha escrita, tentei 
criar poesia (nunca fiz isso),foi a primeira vez, tentei fazer acróstico, 
uma pequena história Era uma vez, e assim por diante. Tentei várias 
vezes e estou na busca para aprender. É um exercício novo para mim. E 
com certeza vem me ajudando. (R.)
Penso ser possível dizer que o percurso proporcionado pela disciplina, as 
escolhas de leituras e vídeos, as oficinas e as estratégias didáticas, bem como a 
escrita e a colagem serviram bem como dispositivos de subjetivação em direção 
a algo novo para si e que é reconhecido e sintetizado no trecho do depoimento 
seguinte: “[...] essa disciplina que fez mudar a óptica que tinha sobre a escrita”. 
(P.P)
Recolhendo as cartas do baralho
Proporcionar o trabalho com a memória (pelas lembranças e 
esquecimentos), que não se separa dos acontecimentos físicos e psicológicos e 
que é criação (no entender bergsoniano), em interação com a escrita (em prosa 
e poética) sob os moldes apresentados neste texto, implica provocar direta e 
praticamente a experimentação e a correlação entre a teoria e a ação, visando 
articular percepção, atenção e reflexão.
No ensino superior, tensionar a escrita convencional e acadêmica pode 
ser um profícuo exercício para alargar possibilidades de pensamento e de 
formação de si. Junto a isso, ampliar e redimensionar a noção da pesquisa para 
a perspectiva subjetiva, em que sujeito e natureza não se apartam e nem se 
opõem, mas se completam e se interinfluenciam. 
A escrita-pensamento e a escrita-fluxo se abrem para além do uso em 
narrativas pessoais e privadas, e passam a ser ativadas como uma escrita fim, 
no entendimento nietzschiano.
Ao lado da escrita, a construção de imagem sob a forma artística (no 
caso, as colagens) também funciona como dispositivo de subjetivação que 
provoca construções tidas como estabilizadas e rígidas, permitindo mergulhos 
em si e na cultura, por meio da exploração e criação do universo simbólico que 
se atualiza no presente.
Por fim, acredito que fazer conversar o campo da Educação com a Arte, 
bem como trazer as narrativas e memória sob novas abordagens de entendimento 
dá sua contribuição na formação de alunos/as assumindo a responsabilidade 
29
Renata Sieiro Fernandes
de abrir horizontes e tensionar modos habituais de interpretação do mundo e 
de enfrentamento de problemáticas históricas, sociais, culturais, artísticas, 
educativas e políticas na atualidade.
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NOBRE, Renarde Freire. Nietzsche e a escrita artística do pensamento. Trans/
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30
EDUCAÇÃO-ARTE. MEMÓRIA-ESCRITA. MEMÓRIA-IMAGEM
da saúde pública. Revista Saúde Pública, São Paulo-SP, v. 29, n. 4, p. 318-
325, ago. 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0034-89101995000400010&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 12 
nov. 2020.
SANTOS, Marcelo Ribeiro dos. Tarô de Marselha: o rosto divino. 2018. 289f. 
Tese (Doutorado em Educação), Programa de Pós-graduação em Educação, 
Faculdade de Educação, UNICAMP, Campinas-SP. 
 
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Luís Müller Posca - Fabiano Ferreira Lucena
ENSINO SUPERIOR INCLUSIVO: ENSINO SUPERIOR INCLUSIVO: 
RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA DE RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA DE 
SUCESSO ACADÊMICO EM UM CURSO DE SUCESSO ACADÊMICO EM UM CURSO DE 
LICENCIATURA EM ARTES VISUAISLICENCIATURA EM ARTES VISUAIS
Luís Müller Posca
Fabiano Ferreira Lucena
DOI: 10.29327/529244.1-2
Introdução
Para iniciar o trajeto desse texto, é importante clarearmos aqui a 
perspectiva de onde falamos, no sentido de facilitar o entendimento do que foi 
essa pesquisa em Arte escrita a quatro mãos entre orientador e orientando, cujo 
objeto de estudo foi o próprio autor da investigação que serviu a dois papéis 
ao mesmo tempo, o de objeto de investigação e de autor/pesquisador. Todavia, 
neste artigo, em alguns momentos, trago a minha fala (professor/orientador) em 
primeira pessoa, traçando relações dialógicas com as falas em primeira pessoa 
de Fabiano1 (orientando – hoje, Licenciado em Artes Visuais) e também reflexões 
produzidas conjuntamente por nós, escritas no plural.
Como orientador, tive a honra de ter sido selecionado como o professor 
do curso que recebeu o desafio de guiar os caminhos de Fabiano em seu trabalho 
de conclusão. Nossa relação foi iniciada ao longo de seus estudos nas disciplinas 
de Estágio Supervisionado, do curso de Licenciatura em Artes Visuais, na 
Universidade Federal de Roraima – UFRR. Ao recebê-lo como estudante, recebi, 
também, um diagnóstico: Fabiano é uma Pessoa com Deficiência (PcD), com 
laudo de encefalopatia crônica. Desde o princípio, nossa relação foi de muito 
aprendizado conjunto; como ele já estava na metade do curso quando nos 
encontramos pela primeira vez, já ficava mais à vontade para esclarecer aos 
professores as melhores formas em que se sentia mais apto a trabalhar nas 
disciplinas e ser avaliado por seus respectivos professores; nessa fase do curso, 
1 Fabiano Ferreira Lucena, 18/06/85, é PcD - Pessoa com Deficiência, com laudo de Encefalopatia 
crônica – em seu caso, apresenta dificuldades de aprendizagem, na leitura e na fala.
32
ENSINO SUPERIOR INCLUSIVO: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA DE SUCESSO ACADÊMICO 
EM UM CURSO DE LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS
já tinha uma relação com vídeos e avaliações orais, trazidos de disciplinas 
anteriores; em contraponto, as avaliações que exigiam os domínios da leitura e 
escrita, competências nas quais apresentava mais dificuldades. 
Devidamente apresentados os interlocutores deste artigo, nosso intuito 
aqui é dialogar brevemente sobre como se deu o processo de inclusão de 
Fabiano nesse curso de Artes Visuais, trazendo à tona a sua fala para este texto 
juntamente com breves reflexões que realizamos sobre o processo de inclusão 
no Ensino Superior e como a sua história é um importante relato, no que concerne 
às histórias de sucesso acadêmico de PcDs. nesse nível de ensino, além de 
demonstrar como o encontro com a Arte e as políticas públicas inclusivas foram 
cruciais para que obtivesse esse sucesso, também no ensino Universitário, 
tendo em vista que outras batalhas foram travadas ao longo de todo o seu 
processo de escolarização básica. Mesmo com todas as dificuldades que teve de 
enfrentar para garantir seu acesso ao Ensino Superior, consideramos que, mais 
importante que isso, foi o processo para garantir sua permanência e condições 
necessárias, em seu percurso de formação, para que ao final obtivesse êxito em 
sua empreitada.
Suas reflexões, entretanto, não ficaram apenas no campo dos estudos 
teóricos já que produziu como trabalho final, além da monografia um vídeo 
etnográfico, criado e produzido pelo próprioaluno, trazendo reflexões sobre 
seu processo de inclusão no ensino superior e com o grande intuito de inspirar 
outros estudantes a buscar seus sonhos de concluir um curso no Ensino Superior, 
independentemente de ter ou não algum tipo de deficiência. 
Portanto, apresentamos na primeira seção deste texto, um diálogo sobre 
o processo de inclusão desse acadêmico juntamente de algumas reflexões 
teóricas sobre o tema. Na segunda seção, trataremos da criação e a produção do 
vídeo etnográfico de Fabiano e, por fim, as reflexões produzidas nesse processo 
de investigação de si e os primeiros impactos alcançados que culminaram com 
a finalização do curso de Artes Visuais em 2019 com aprovação máxima em seu 
trabalho de conclusão de curso.
Inclusão no Ensino Superior: Reflexões e Relato de Experiência
No que diz respeito ao ensino superior, existem políticas públicas 
voltadas de uma maneira específica para a inclusão nesse nível de estudos e que 
foram estruturadas com vista à superação de um processo histórico marcado 
pela elitização, por conseguinte excludente para aqueles marginalizados 
socialmente, entre eles os oriundos de camadas de baixa renda, negros, 
mulheres e pessoas com deficiência. As políticas públicas se inserem no campo 
das orientações filosóficas presentes nos textos normativos e na legislação, as 
quais permeiam a questão do direito à educação (CAIADO, 2013).
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Luís Müller Posca - Fabiano Ferreira Lucena
O Brasil vem reiterando a importância da inclusão no ensino superior; 
órgãos do Governo Federal têm realizado ações por meios de decretos, portarias 
e leis de elaboração de políticas públicas de maneira a garantir o acesso e a 
permanência de acadêmicos com deficiência nas instituições de Ensino Superior. 
Entre as políticas mais recentes que contribuíram para o acesso e permanência 
de PcD ao Ensino Superior destaca-se o Programa de Acessibilidade na 
Educação Superior, conforme Portaria Normativa nº 14, de 24 de abril de 2007 
(BRASIL apud MENDES; RIBEIRO, 2017), que cita normas gerais e critérios 
básicos com o objetivo de incluir um número maior de PcD no meio acadêmico, 
tanto em instituições públicas como em particulares, garantindo ao público-
alvo da educação inclusiva os níveis da educação básica e superior, reafirmado 
recentemente pelo Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, que garante 
a formação acadêmica “sem discriminação e em igualdade de condições”, 
assegurando a esse público as adaptações necessárias (BRASIL, 2009). As 
políticas educacionais estão fundamentadas na Constituição Federal de 1988, 
seguida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96). No que se 
refere à legislação para PcD no Ensino Superior, o documento mais recente é 
o Plano Nacional de Educação, que entrou em vigor para o decênio 2014-2024 
(BRASIL, 2014). Nele encontram-se estratégias especificas visando à inclusão 
de minorias. Há também a Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, intitulada Lei 
Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com 
Deficiência), destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, 
o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais para as pessoas com 
deficiências, visando à sua inclusão social e cidadania (BRASIL, 2015).
O processo de inclusão de Pessoas com Deficiência no Ensino Superior 
apresenta-se, atualmente, como um desafio a esses alunos e também para 
os professores universitários. Isso ocorre porque a inserção de alunos com 
deficiência nesse nível de ensino está ocorrendo sem mecanismos que 
sustentem tanto o acesso, quanto a permanência no contexto das exigências 
características à educação superior, pois não se trata apenas da garantia de 
vagas, mas da organização por parte da Universidade em elaborar estratégias 
que colaborem para o sucesso desses alunos. Para Ramalho e Nunes (2009), 
a Universidade pública brasileira atravessa um processo de democratização 
do acesso, contudo não são comuns ações formativas que potencializam as 
questões de ensino-aprendizagem e das atividades didático-pedagógicas, o que 
implica problemas na qualidade de formação. Já (Moreira apud Mendes; Ribeiro, 
2017, p. 04) afirma que as universidades devem ampliar o significado de sua 
função social e assegurar o direito à educação e à igualdade de oportunidades 
àqueles alunos que tradicionalmente não fazem parte de seu alunado, como é o 
caso dos estudantes com deficiências.
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ENSINO SUPERIOR INCLUSIVO: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA DE SUCESSO ACADÊMICO 
EM UM CURSO DE LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS
Assim como os autores supracitados, consideramos importante os 
estudos e pesquisas sobre os estudantes que apresentam alguma deficiência, 
já que as metodologias utilizadas na sala de aula pelos professores muitas 
vezes não são adequadas e diferenciadas as condições de aprendizagem desses 
alunos, tendo em vista que todos aprendem de maneiras diferentes. Para tanto, 
a didática teria de se integrar a todos os envolvidos nos processos de ensino-
aprendizagem. Infelizmente, ainda encontramos barreiras em relação ao ensino 
aplicado na realidade, pois muitos professores ainda não aceitam que seus 
alunos têm ritmos diferenciados de aprendizagem e querem ensinar todos os 
estudantes da mesma maneira sem diferenciar estratégias de ensino e com um 
olhar para as necessidades de cada um. 
Entende-se por inclusão a garantia, a todos, do acesso contínuo 
ao espaço comum da vida em sociedade, sociedade essa que deve 
estar orientada por relações de acolhimento à diversidade humana, 
de aceitação das diferenças individuais, de esforço coletivo na 
equiparação de oportunidades de desenvolvimento, com qualidade, em 
todas as dimensões da vida (PACHECO; TONETTO, 2006, p.156).
O fato de o ensino não lidar corretamente com a condição de cada um, 
no que tange ao ritmo de aprendizagem, fica claro na experiência de Fabiano, 
quando ele relata sua experiência cotidiana no curso de Artes Visuais, à 
princípio ele chega ao ambiente universitário tendo garantido sua vaga através 
de uma política pública de cotas, relata que no começo do curso não conseguia 
acompanhar os outros alunos da turma e ficava muito sobrecarregado com as 
atividades, pois levou um tempo até que todos seus professores conhecessem 
a sua história e identificassem que receberam uma pessoa com deficiência 
no curso, consequentemente uma demora no processo de compreender suas 
dificuldades de aprendizagem e os melhores caminhos para conduzi-lo ao longo 
do curso, isso atrapalhou seu processo de ensino-aprendizagem. A Universidade, 
nesse caso, não forneceu formação específica para os docentes do curso, não 
realizou uma reunião entre o colegiado, aluno e família nem tampouco garantiu 
o acompanhamento de um tutor para acompanhar o acadêmico nas primeiras 
disciplinas, o que dificultou em sua adaptação ao primeiro ano de curso. Para 
ilustrar um pouco dessa experiência, apresento, na sequência, relatos sobre o 
ponto de vista de Fabiano.
Desde minha educação básica, sempre tive afinidade no que diz 
respeito à Arte, apesar de muito limitada, nos meus anos enquanto 
estudante durante o Ensino Fundamental. Quando fui para o Ensino 
Médio, decidi que queria ser Professor, foi quando resolvi que iria 
cursar Artes Visuais. Minha história com o vestibular vem de longa data, 
tentei entrar no curso de Artes por quatro vezes, todas com a inscrição 
como Portador de Necessidades Especiais2. Em 2010, foi a primeira 
vez que tentei, fiz a prova do vestibular, que na época era realizada em 
duas etapas, na primeira etapa objetiva, eu consegui passar; mesmo 
2 Neste texto, ao invés de PNE – Portador de Necessidades Especiais, utilizaremos a sigla PcD 
– Pessoa com Deficiência, pois entendemos que portador não é mais um termo adequado quando 
tratamos de uma pessoa.
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Luís Müller Posca - Fabiano Ferreira Lucena
diante dessa vitória, ouvi da fiscal de aplicação que estava aprovado 
nessa primeira etapa e que iria para a segunda, mas ressaltou que a 
Universidade