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TEORIA GERAL DAS OBRIGAÇÕES AULA 1 – RELAÇÃO JURÍDICA OBRIGACIONAL Professora: Kelly Cristine Baiao Sampaio Dia: 08/01 1. Conteúdo histórico-evolutivo do direito civil: reflexões críticas - Estado Moderno (Modernidade): interferência das codificações que irão influenciar os Códigos seguintes e atuais. - Revolução Francesa, sociedade estamentária (período das grandes codificações); - Grandes Navegações (ponto final): expansão das classes, essencialmente, a burguesia (passa a deter liberdade de gerir); - Movimento antropocêntrico: o homem como centro (jusnaturalismo). 2. Obrigação: aspectos introdutórios - Legisla-se: criação de leis; - Afasta-se o Estado, o âmbito do privado não cabe ao público interferir (dicotomia: público X privado); - Assumir a titularidade de seus bens, sem levantar questionamentos. Quando a titularidade é questionada, o que garante essa tutela é o contrato (instrumento garantidor), dispondo das possibilidades de adquirir, vender e trocar. - Positivismo jurídico: a norma dotada de validade, exigível e, portanto, aplicada. - A parte geral do Código disciplinou as questões de titularidade, se o objeto é lícito e possível, negociações. • A noção de obrigação não prima pelo equilíbrio, se preocupa com o cumprimento do que foi estabelecido, da tutela do credor em face do devedor. 2.1- Introdução: • Teoria do Direito Civil e direito das obrigações A importância do direito das obrigações é inquestionável. Uma importância que logo se poderia traduzir quantitativamente: ninguém duvida que a maior parte das relações jurídicas é obrigacional. A importância do direito das obrigações está no seu caráter abstrato, o que garantiu, desde a época do direito romano, uma certa uniformidade e constância de princípios, com o tempo cada vez mais refinados, que formam hoje o que Almeida Costa chama de “paradigma” da teoria do direito civil. A propósito do rigor teórico do direito das obrigações, afirma o professor português: Também se aduz o alto grau de vocação e construção estritamente técnico-jurídicas deste domínio normativo. Até as grandes revoluções ideológicas dos tempos modernos- a francesa e a russa- que tiveram acentuados reflexos noutros setores jurídicos, sobremaneira em matéria de direitos reais e de direito de família, afetaram muito menos o relativo universalismo das obrigações. Nesse mesmo sentido, Caio Mário da Silva Pereira transcreve as observações de Saleilles: “... de todo o Direito Civil são as obrigações que guardam maior cunho de elaboração científica e maior expressão ideal da lógica jurídica apresentam no direito moderno.” 3. Acepções técnico-jurídicas do termo “obrigação” Em sentido muito amplo e vulgar, a obrigação é o elemento passivo de toda a relação reconhecida pelo Direito. No entanto, sabemos que a linguagem está para o Direito como o cálculo para a matemática. Convém, portanto, antes de tudo, determinar qual, dentre as acepções que o termo pode ter no Direito, será utilizada no decorrer da presente exposição. Não se trata, note- se, de conceituar a obrigação, tarefa bem mais difícil, mas apenas de definir a priori a que “situação jurídica” pretendemos nos referir. 3.1 Obrigação como espécie de dever jurídico Numa primeira acepção, “obrigação” indica uma espécie de dever jurídico. Com este sentido, a palavra aparece em inúmeros artigos do Código Civil, como nas designações “obrigação de dar”, “obrigação de fazer” e “obrigação de não fazer”, consagradas tanto na lei como na doutrina. Este primeiro sentido atribuído à expressão em exame obriga-nos a compreender o que seja o “dever jurídico”, já que o entendimento da espécie não pode rescindir do entendimento do gênero a que pertence. Assim, define-se: Dever jurídico: “O dever jurídico é toda a necessidade, imposta ou sancionada pelo Direito (objetivo), de as pessoas observarem determinada conduta. É o dever de não matar, não injuriar, não furtar, de não danificar a coisa alheia, de pagar o que se deve.” Obrigação: É uma espécie de dever jurídico que resulta da existência de um vínculo entre, de um lado, o credor, que pode exigir o cumprimento de uma prestação, e, de outro lado, o devedor, adstrito ao cumprimento desta prestação. O conceito de dever jurídico é mais amplo do que o de obrigação, porque abrange, além dos deveres de prestar das relações de crédito, os deveres resultantes dos direitos reais, dos direitos familiares ditos puros e dos direitos da personalidade. Estado de sujeição (caminha ao lado dos direitos potestativos): Corresponde aos chamados direitos potestativos: “(...) traduz-se ele numa situação inelutável de suportar na esfera jurídica própria as consequências do exercício de um direito dessa natureza.” Desta forma, “(...) o titular passivo da relação nada tem a fazer para a satisfação do referido interesse, assim como é impossível impedi-la.” É o caso do mandatário, que não tem obrigação tampouco o dever de aceitar a revogação do mandato, como não tem o mandante a obrigação de aceitar a renúncia do mandatário. “No estado de sujeição, há uma simples subordinação inelutável a uma modificação na esfera jurídica de alguém por ato de outrem.” Nestes termos, a doutrina exemplifica com os casos de servidão legal de passagem (art. 559, do CC) e o direito de escolha nas obrigações alternativas. (art. 884 do CC). Ônus jurídico: É a “necessidade de adotar certa conduta para a obtenção ou conservação de uma vantagem própria.” O mesmo Almeida Costa exemplifica: “exigência de registro para a oponibilidade de certos fatos a terceiros.” O ônus jurídico tão comum em matéria processual – basta pensar no ônus da prova -, é definido sistematicamente por Olímpio Costa Júnior como um “encargo posto sob estímulo.” 4. Obrigação: conceito e elementos - Sentido técnico: a obrigação como espécie de dever jurídico- dever da prestação. Pode ser definida: “relação transitória de direito, que nos constrange a dar, fazer ou não fazer alguma coisa economicamente apreciável, em proveito de alguém que, por ato nosso ou de alguém conosco juridicamente relacionado, ou em virtude de lei, adquiriu o direito de exigir de nós essa ação ou omissão.” (Clóvis Beviláqua. Direito das Obrigações, Salvador: Livraria Magalhães, 1896- retirado de Fundamentos do Direito Civil, p. 1) Direito das obrigações apresenta três inovações essenciais: 1- Expansão do objeto da obrigação- abrange não somente os direitos de crédito (relações creditórias); 2- Obrigação como relação jurídica complexa (ninguém é sempre credor ou devedor, é algo muito mais complexo que isso); 3- Valorização do aspecto estático e funcional. ➢ O que é tutelado é a relação em si, não os sujeitos (interesse do credor sob o do devedor). É papel do direito também tutelar a pessoa humana, na sua condição humana. Exemplo: 2° Guerra Mundial – atingiu classes sociais privilegiadas, por características de raça, credo, cor e cai por terra de que uma grande família tradicional rica passa a ser perseguida, aqueles que se sentiam inatingíveis passam a ser caçados; mostrando que o ser humano é capaz de torturar seus semelhantes. Quanto à estrutura da obrigação: 1- Sujeitos: credor e devedor; no aspecto funcional ambos devem primar pela boa fé 2- Objeto: prestação 3- Vínculo jurídico Aspecto funcional: obrigação como processo, conjunto de atos e atividades que caminham para atender a determinado fim econômico e social. Obrigação: estrutura + função 4.1 Sujeitos da relação jurídica obrigacional: credor e devedor-funcionalidade (boa-fé objetiva), deveres conexos (ex. informação) Relação jurídica; situação jurídica- plurilateralidade, ex. grupo de pessoas ou unilateralidade de sujeito. Ex. doação para nascituro. Determinabilidade do sujeito: ex.títulos ao portador. Mutabilidade do sujeito: ex. renúncia, exceção: intuitu personae 4.2 Objeto da relação jurídica obrigacional: Prestação -Prestação: ação ou omissão do devedor exigível pelo credor. (dar, fazer, não-fazer) -Requisitos da prestação: a) possibilidade (material, jurídica, relativa), b) determinabilidade (certa, generalidade, arbitragem), c) patrimonialidade (interesse extrapatrimonial). - A Prestação Como Objeto Da Obrigação: Diz o jurista português João de Matos Antunes Varela, que “a prestação é o fulcro da obrigação, o seu alvo prático”, afirma também que “o objeto da obrigação é a prestação devida”. É o meio que satisfaz o interesse do credor, que lhe proporciona a vantagem a que ele tem direito. A prestação consiste, em regra, numa atividade humana ou numa ação do devedor (entregar uma coisa, realizar uma obra, transportar alguns móveis, dar certo número de lições, etc...), mas pode também consistir, como vimos, numa abstenção, tolerância ou omissão”. Caio Mário também afirma que “toda obrigação há de ter um objeto, que é a prestação do devedor”. Esclarece, no entanto, que não deve ser confundido o OBJETO da obrigação, com a COISA em que a prestação se especializa e dá o seguinte exemplo: “O objeto de uma obrigação decorrente de um título cambial não é o dinheiro em si, expresso no mesmo, mas sim o fato humano, a atividade do homem de pagar, uma atuação do sujeito passivo”. São ensinamentos deste autor: “Quando a obrigação é de dar ou de entregar, seu objeto não é a coisa a ser entregue, porém a atividade que se impôs ao sujeito passivo de efetuar a entrega daquele bem”. “Quando a obrigação é um facere, está nítido o ato do devedor: a ação humana como seu objeto consiste na realização de um trabalho, na confecção de uma coisa, na emissão de uma declaração de vontade, etc..., tudo envolvido na expressão genérica - prestação de um fato - e, como se no facere se contém igualmente o non facere, o mesmo sentido de atividade humana está abrangido na omissão ou na abstenção, tal qual se apresenta na ação”. Antunes Varela tem o seguinte entendimento: “Tendo principalmente em vista as obrigações com prestações de coisas, os autores costumam distinguir entre o objeto imediato e o objeto mediato da obrigação. O primeiro consiste na atividade devida (na entrega da coisa, na cedência dela, na sua restituição, etc..); o segundo na própria coisa em si mesma considerada.” E exemplifica: “Se A vende um prédio a B e, em virtude da venda fica obrigado a entrega-lo, são realidades completamente distintas o ato de entrega do prédio (a prestação devida), por um lado, e o prédio (objeto da prestação...)” Obs. Quanto à patrimonialidade: dever jurídico: interesse extrapatrimonial-violação: consequência jurídica: indenização (obrigação autônoma- deriva da avaliação dos prejuízos sofridos em decorrência da lesão a bem jurídico essencial). Patrimonialidade da reparação- obrigação autônoma - Reparação extrapatrimonial: violação à dignidade da pessoa humana 4.3 Vínculo jurídico Elemento da relação obrigacional de ligação entre devedor e credor e de deveres anexos oriundos do contrato social. Teoria tradicional: dualidade do vínculo: débito (Schuld) e responsabilidade (Haftung). Débito: dever de se efetuar a prestação: responsabilidade: faculdade de se exigir o cumprimento da prestação Obs. Dívida prescrita (perda de exigibilidade do cumprimento); fiança. Obrigação natural: Art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível. (moral?) Trata-se de débito sem responsabilidade. ➢ Coisas tem preço e pessoas têm valor. Responsabilidade: castigos físicos, responsabilidade patrimonial (patrimônio mínimo). Obs. Prisão civil do devedor de alimentos (instrumento de coerção, não se trata de responsabilização obrigacional, pena) 5. A funcionalização das relações obrigacionais A relação obrigacional somente pode ser corretamente compreendida quando examinada sob seu perfil estrutural e sob o funcional. A doutrina tradicional, dentro de uma perspectiva voluntarista, definia a tutela da obrigação a partir de uma análise estritamente estrutural, ou seja, mediante a identificação dos sujeitos (quem) e daquilo que se prometeu (o quê). Neste contexto, a análise da função jurídica teria uma importância secundária, surgindo pontualmente naquelas hipóteses em que a lei expressamente chamasse o intérprete a considerar o interesse do credor, como, por exemplo, na apreciação da legitimidade do pagamento realizado por terceiro ou da possibilidade de o devedor purgar a mora, realizando a prestação depois de vencida a dívida. Contudo, a doutrina mais moderna, reconhecendo a insuficiência da análise exclusivamente estrutural, destaca que a disciplina da relação obrigacional deve partir prioritariamente da investigação das finalidades que as partes perseguem com o cumprimento da obrigação. A própria razão para o ordenamento tutelar determinada relação obrigacional passa pela apreciação da legitimidade das suas finalidades, exigindo-se, nesse sentido, que o interesse do credor no cumprimento da obrigação seja digno de tutela. Afinal, não se pode admitir que o devedor consinta em despojar-se de parte de sua liberdade, contraindo uma obrigação perante o credor, se não for para atender um interesse considerado, à luz dos valores que informam o ordenamento jurídico, merecedor de tutela. Nesses termos, a obrigação deixa ser concebida com um fim em si mesmo para ser valorada, na sua essência, como um instrumento de cooperação social para a satisfação de certo interesse do credor. Esta sua função jurídica orienta todo o desenvolvimento da relação obrigacional até o momento de sua extinção, servindo, em particular, de parâmetro para a valoração do comportamento das partes, que são chamadas, de acordo com a cláusula geral da boa-fé objetiva, a colaborarem mutuamente para a plena realização dos seus legítimos interesses. Chega-se, portanto, à concepção pluralista e dinâmica da relação obrigacional, que supera a concepção tradicional, marcadamente formalista e abstrata. A obrigação é relação jurídica cujo conteúdo, variável e complexo, se define no caso concreto em função dos legítimos interesses a serem tutelados – especialmente o do credor – e se vai constituindo pelos diversos deveres acessórios de conduta que completam e integram o núcleo central, composto pelo dever de prestar do devedor e pelo direito de exigir a prestação do credor. AULA 2 – CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES (DAR, FAZER, NÃO FAZER) Professor: Sérgio Negri Dia: 13/01 • Pressupostos discursivos • Área de poucas inovações (?) 1. INTRODUÇÃO “A teoria clássica define a obrigação como o vínculo pelo qual uma pessoa fica adstrita, para com a outra, “a realização de uma prestação” – Antônio Menezes Cordeiro. - Atualmente é insuficiente para assegurar toda a matéria, mas serve como ponto de partida. - O direito em geral se estrutura por meio de uma linguagem própria, e muitas vezes nesse processo, aquele sentido comum que é conferido a determinado termo, acaba recebendo uma nova significação no campo jurídico. É exatamente o que acontece com o termo “obrigação”, em um sentido amplo e genérico, a obrigação é associada a ideia de um dever jurídico de qualquer natureza. Em sentido estrito, o termo obrigação se refere a uma espécie particular de dever, nesse aspecto particular, a compreensão da ideia de obrigação guarda relação com a ideia de relação jurídica, uma relação mediante a qual o devedor fica adstrito ao cumprimento de uma prestação perante o credor, que passa a ter o direito de exigi-la. - Na ideia da prestação que se desenvolve a principal classificação do direito obrigacional.O Código Civil de 2002 estabelece três tipos de obrigação: • De dar (atividade positiva/ entrega ou restituição); • De fazer (atividade positiva/ prestação de serviço); • De não fazer. Ainda que a ideia central de obrigação tenha passado por um processo de alteração, nota-se que a definição trabalhada é simples, insuficiente e incompatível com o mundo real. Todo o direito obrigacional gira em torno da prestação. • A obrigação pode ser vista de dois aspectos: Dívida: o devedor se encontra adstrito a uma prestação. No direito obrigacional, a prestação não se define simplesmente pelo ato de dar, pode ocorrer uma prestação de fazer ou não fazer. Responsabilidade: Consequência jurídica do inadimplemento. Hoje em dia, a sujeição pelo inadimplemento não recai sobre a pessoa do devedor e sim sobre seu patrimônio (a prisão por dívida é uma grande exceção, não a regra). Obs.: Teoria dualista: desenvolvida na Alemanha e que separava a relação jurídica obrigacional em duas espécies, a dívida e a da responsabilidade. 2. A OBRIGAÇÃO NA ATUALIDADE O direito obrigacional aparenta ter sofrido poucas alterações desde o direito romano. É uma informação errada, pois passa uma impressão irreal do Direitos das Obrigações. Características associadas ao direito obrigacional numa perspectiva contemporânea: • Complexidade: Ao contrário do modelo simples, a relação obrigacional é marcada por uma complexidade interna, que alcança, além dos tradicionais deveres de prestar, diversas outras situações, como os deveres laterais que decorrem da boa-fé objetiva. • Dinamicidade: Poderes e deveres que surgem ao longo da relação, “com algo que se encadeia e se desdobra” em direção ao adimplemento (elemento finalístico), voltado para a satisfação dos interesses das partes considerados dignos de tutela. • Funcionalização: A obrigação representa um instrumento de cooperação para a promoção dos interesses legítimos envolvidos na relação em concreto. As partes devem colaborar mutuamente para a plena realização do programa obrigacional. A função deve orientar todo o programa obrigacional, de forma que o adimplemento se aproxima da realização em concreto do resultado útil programado. O interesse do credor ainda que importante será confrontado com outros interesses merecedores de tutela. 3. ABUSO DE DIREITO X BOA-FÉ OBJETIVA Boa-fé objetiva: Assim como no abuso do direito, a boa- fé objetiva se desenvolveu a partir de tentativas de se conter recessos da liberdade individual. Parâmetros de cooperação, retidão e lealdade para valorar a condutas das partes, e como barreira ao exercício da autonomia privada. Art.187 - Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art.422 - Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. AULA 3 – RETIRAR DÚVIDAS Professor: Sérgio Negri • O contrato de compra e venda não transfere a propriedade. Direitos obrigacionais; dentro dos direitos subjetivas tenho aqueles suscetíveis de xxxx econômica. A obrigação de dar (bem determinado) se divide em 2 comportamentos: entrega (contrato de compra e venda do carro) e devolução/restituição (contração de depósito de locação). AULA 4 – OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA A obrigação de dar envolve propriamente dois comportamentos: entrega e restituição. E essa diferenciação tem implicação na própria distribuição de riscos na relação obrigacional. Art. 234. Se, no caso do artigo antecedente, a coisa se perder, sem culpa do devedor, antes da tradição, ou pendente a condição suspensiva, fica resolvida a obrigação para ambas as partes; se a perda resultar de culpa do devedor, responderá este pelo equivalente e mais perdas e danos. No perecimento sem culpa, o prejuízo fica para o dono (proprietário). Há uma diferença substancial entre a entrega e a restituição, de acordo com o art.238 do CC, se a coisa perece antes da restituição sem culpa do devedor resolve-se a obrigação. No entanto, a diferença do art.238 para o art.234, é que no art.238 como antes da devolução o proprietário é o credor, ele fica com o prejuízo; no art.234 (entrega) o prejuízo fica com o devedor, porque antes da entrega o devedor é o proprietário. Obrigação de dar coisa incerta: Até aqui o objeto da prestação se mostrava totalmente individualizado (entregar o carro, entregar 10 sacas de café). Na qual o objeto não se mostra perfeitamente individualizado (determinado). 1. INTRODUÇÃO • A incerteza é sempre relativa Art.243. A coisa incerta será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade. (a incerteza recai sobre a qualidade ou a espécie). Exemplo: Num contrato de compra e venda você assume a obrigação de entregar 10 garrafas de vinho. Qual vinho será entregue? Brunello ou Cantina da Serra? Não resta dúvida quanto a quantidade e o gênero. Se o objeto da prestação não se mostra suscetível de determinação, a consequência é a nulidade. A obrigação será nula em razão desse vício do objeto. O legislador, no entanto, franqueou as partes a possibilidade de uma individualização posterior, é aqui que se insere a obrigação de dar coisa incerta. O objeto embora na constituição do vínculo obrigacional entre credor e devedor, cujo objeto é uma prestação, e que não se mostre perfeitamente individualizado, existe essa possibilidade, pois é determinável, onde haverá a especificação do que será entregue. A incerteza não é absoluta, é relativa/parcial. 2. OBRIGAÇÃO DE DAR Uma das principais formas de classificar uma obrigação levando em conta a prestação. O dar contempla a entrega e restituição. Ex.: contrato de compra e venda (bilateral) Coisa certa: perfeitamente individualizado. Coisa incerta: possibilidade de determinação posterior, no momento dessa individualização, aquela obrigação passa a ser disciplinada pela obrigação de dar. 3. OBRIGAÇÃO ALTERNATIVA Obrigação de dar coisa incerta: obrigação simples no que se refere a prestação, sendo uma única prestação que não se mostra perfeitamente individualizada/determinada (incerteza quanto a qualidade e espécie). Obrigação alternativa: obrigação complexa no que se refere ao objeto, composta por mais de 1 (uma) prestação. Na obrigação alternativa, tem-se 2 (duas) ou mais prestações e o devedor se desobriga entregando apenas uma. Exemplo: é assinado um contrato no qual um devedor pode entregar determinado bem ou a quantia referente aquele determinado bem, e o devedor se desobriga realizando apenas uma, pois aqui há uma alternativa. Não se restringe a obrigação de dar. 4. ESCOLHA E ESPECIFICAÇÃO Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor. Art. 245. Cientificado da escolha o credor, vigorará o disposto na Seção antecedente. O ato da escolha é, conforme determinado no artigo 246, o divisor de águas nas obrigações de entregar coisa incerta. Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito. Não se trata propriamente de uma escolha, aproxima- se mais de uma especificação. Uma vez realizada a especificação a obrigação de dar coisa incerta se torna obrigação de dar coisa certa, não basta a escolha, se a escolha compete ao devedor é com a comunicação da individualização que ocorre essa transformação. 5. PERECIMENTO Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito. A grande característicada obrigação de dar coisa incerta está no perecimento. Já que o objeto não se mostra perfeitamente individualizado, na disciplina do risco, se a coisa perece sem culpa do devedor, resolve-se a obrigação. Ninguém será responsabilizado pelo caso fortuito ou de força-maior. Aqui fala-se de impossibilidade e não de inexecução da prestação. O gênero não perece na obrigação de dar coisa incerta. É possível determinar o gênero a certas espécies, isso pode acontecer de forma natural. Princípio da qualidade média: não é porque não foi determinado o objeto, que se deve aceitar algo de baixa qualidade. OBRIGAÇÃO DE FAZER E EXECUÇÃO ESPECÍFICA Dia: 26/01 A obrigação de fazer nos permite estudar outras matérias do direito obrigacional e não só neste âmbito. 1. A ILUSÃO DA TUTELA RESSARCITÓRIA A obrigação de fazer se insere no conceito tradicional de obrigação, estamos assim falando de uma relação jurídica entre credor e devedor que tem como objeto uma prestação. A particularidade é que a prestação se trata de um fazer, geralmente, prestação de um serviço (relação médico-paciente, relação com o pintor para a pintura da casa). Não é fácil em algumas situações concretas separar a obrigação de dar e a de fazer. Qual o melhor remédio oferecido pelo ordenamento para as partes em caso de inadimplemento de uma obrigação de fazer? No nosso Código, há uma separação da obrigação de fazer fungível e a obrigação de fazer infungível. A obrigação de dar comporta uma execução específica, já que ela incide sobre a coisa, ainda que indiretamente. A obrigação de dar envolve a prestação, a entrega ou a restituição; mas o interesse se mostra vinculado a entrega daquele determinado bem. O mesmo a princípio não valeria para a obrigação de fazer. Se o devedor se recusa a realizar a prestação só a eles imposta, caberia ao credor pedir apenas as perdas e danos. O código Civil de 2002 ainda acaba deixando margem para a Ilusão quanto a tutela ressarcitória. Que é você pensar que o único remédio para inadimplemento para a obrigação de fazer seria as perdas e danos. • Obrigação de fazer fungível: oferta a possibilidade de realização da prestação por um terceiro; • Obrigação de fazer infungível: é aquela que a princípio só pode ser exercida pelo próprio devedor, ele só se exonera da obrigação se realizar a prestação, não havendo, inicialmente, a previsão de realização por um terceiro. a) Omnis condemnatio pecuniaria (Zimmerman) b) Código Civil francês de 1804 (artigo 1442): reforçava a ilusão da tutela ressarcitória, como uma força de diferenciar a obrigação de fazer e a de dar. 2. EXECUÇÃO ESPECÍFICA E A OBRIGAÇÃO DE FAZER Art.247 - Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele exequível. • Obrigação de fazer infungível (prestação personalíssima): o que a torna infungível pode ser a própria natureza do serviço. Deve ser determinada no contrato. Art. 247, CC é responsável também pela confusão no que tange à tutela ressarcitória. A tutela específica da obrigação de fazer infungível teve um papel importante no reconhecimento da prevalência da execução específica das obrigações. A tutela ressarcitória não é o único remédio, o principal hoje é a execução específica da obrigação. Atualmente o ordenamento disponibiliza ao credor mecanismos, por exemplo, de execução indireta. Ao contrário da execução forçada (em que o Direito tenta persuadir o devedor a realizar o comportamento esperado no programa obrigacional). Ex: Emprego da multa, forma de correção indireta na qual procura-se constranger o devedor a realizar a obrigação na sua forma específica. Essa associação imediata entre recusa da obrigação infungível e perdas e danos não e mais adotado no Direito Brasileiro. 3. EXECUÇÃO ESPECÍFICA E MEIOS DE EXECUÇÃO A legislação processual teve grande relevância na consolidação da tutela especifica das obrigações. Não podemos ler o art. 247 do CC de forma isolada, é fundamental conjugar aquela relação com o 499/ CPC. Código de Processo Civil. Art. 499. A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Outros exemplos: A) Sentença (infungibilidade jurídica) B) Astreintes – espécie de multa (indireta) C) Execução por terceiro (contrato substitutivo) 4. EXECUÇÃO POR TERCEIRO E AUTOTUTELA Destaca-se a possibilidade do exercício (assim como na obrigação de não fazer) da autotutela por parte do credor. Art. 249. Se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da indenização cabível. – Obrigação de fazer fungível – Credor pode mediante autorização judicial optar por contrato substitutivo Parágrafo único. Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido. (Independe de decisão judicial) Reforçam a separação da tutela contratual e da tutela jurisdicional, isso não significa que o ordenamento reserve à parte lesada uma esfera de absoluta liberdade de forma a vedar qualquer interferência por parte do Estado. O exercício da tutela por parte do credor também passa pelos filtros disponibilizados pelo ordenamento, para se aferir, verificar, se o exercício da autonomia privada em concreto se afigura legítima ou não. A interpretação pelo que se entende como urgência, deverá ser feita com base nas circunstâncias do caso em concreto, nesses casos o juiz não deve analisar o conceito de urgência de forma restrita para não inviabilizar a faculdade conferida ao leitor. “Se houver limitação excessiva na definição das hipóteses de urgência, o credor só optará pela execução por terceiro após prévia verificação da urgência frente ao judiciário”. Ainda que o credor tenha a obrigação de cooperar com o devedor para a promoção do resultado esperado, devendo inclusive reduzir seus próprios prejuízos em alguns casos, o contrato com terceiro (substitutivo) representa uma faculdade que lhe foi conferida, cuja previsão não afasta a possibilidade da execução especifica (passa a ser a regra) do próprio devedor com a utilização de meios de execução indireta. 5. EXECUÇÃO ESPECÍFICA E A EXECUÇÃO INDIRETA Multa é uma técnica processual de indução que representa uma das formas mais importantes de execução indireta. Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente. § 1º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial. Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito. (Multa tem como destinatário a parte e não o Estado). A tutela específica em relação à multa não se restringe nas obrigações de fazer infungíveis. Limites a essas multas fixadas a persuadir o devedor a prestar a prestação- Uma vez constatada que foi estabelecida fora dos parâmetros da razoabilidade ou quando se tornar exorbitante podendo tornar-se indevida. 6. EXECUÇÃO ESPECÍFICAE A PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS Súmula 239 – O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis. Fazer promessa de compra e venda com o vendedor, pago todas as prestações, ele se recusa indevidamente a manifestar a vontade necessária para a escritura e registro do imóvel. Você tem uma sentença que diante da recusa há a substituição da vontade do promitente vendedor. Dupla natureza: infungível (ponto de vista fático), mas fungível (do ponto jurídico pode ser substituída pela sentença). Há essa execução específica permitindo ao credor ter acesso àquela manifestação necessária para a transferência para o imóvel. Sentença que diante da recusa substitui a manifestação de vontade (obrigação de fazer). TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES I – CESSÃO DE CRÉDITO Professor: Marcus Dantas (28/01) Percurso da aula: • Transmissão das obrigações; • Cessão de crédito: hipótese; • Validade e efeitos frente em relação a terceiros; • Efeitos quanto ao devedor e quanto ao cessionário; • Responsabilidade do cedente. TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES ➢ Os elementos essenciais das obrigações • Polo ativo • Polo passivo Polos ocupados por pessoas físicas ou jurídicas, mas a identidade não é determinante. Apesar de necessariamente termos 2 polos, as pessoas podem mudar, ou seja, as obrigações são transmissíveis, seja na posição de credor ou devedor. Nesta aula, trataremos da transmissão de obrigação na posição de credor. Exemplo: Mariana (devedor) pegou um dinheiro emprestado com Marcus (credor de Mariana), todavia, Marcus é devedor em relação a Nina (credora de Marcus). Marcus pode transmitir a condição de credor perante Mariana para Nina, dessa forma, Marcus é conhecido como cedente, passando sua posição para Nina como credora e ela será conhecida como cessionária (beneficiada com a transmissão). A transmissão permanece, mas a identidade das pessoas foi alterada e não interfere no desenvolvimento dessa transmissão de obrigação. Transmissão é a situação na qual tanto o credor quanto o devedor transmitem sua obrigação a terceiro a obrigação a qual estava vinculado e ela continua existindo, mas a identidade do polo passivo ou ativo foi alterada. ➢ Tipos de transmissão • Que decorrem diretamente da lei; • Que decorrem fruto de uma decisão judicial • Que decorrem fruto de uma decisão voluntária: transmissão entre vivos (acordo de vontade – o exemplo supracitado acima refere- se a essa opção); • Que decorrem em função da morte (crédito que o de cujus estava vinculado). ➢ Cessão de crédito ➢ Cessão de débito (assunção de dívida) ➢ Obrigações intransmissíveis (por determinação legal, ex.: art.298; natureza da obrigação, ex.: alimentos, ajustes entre as partes) • Exceção da transmissão de obrigações. CESSÃO DE CRÉDITO ➢ Conceito/hipótese Negócio jurídico no qual o credor (cedente) transfere a outrem (cessionário) os direitos decorrentes dessa relação obrigação. Essa transmissão do crédito não depende da anuência do devedor e a princípio não faria diferença a ela. Existe uma diferença no que diz respeito a qual vai ser a nova posição desse cedente (antigo credor): ➢ Cessão pro soluto/ cessão pro solvendo Reutilizando o exemplo do Marcus, Mariana e Nina. Marcus sendo o credor de Mariana, mas o devedor de Nina. Ao transmitir sua posição de credor para Nina, ele está pagando a dívida que ele tem com a Nina (cessão de crédito com a Nina), podendo ser uma cessão pro soluto ou pro solvendo. Pro soluto: o cedente (antigo credor) se liberta do vínculo com o cessionário no momento da cessão, não se responsabilizando pelos pagamentos futuros. Pro solvendo: a responsabilidade é mais ampla, o cedente garante a existência do crédito e o pagamento da dívida (que a pessoa tenha dinheiro para pagar); não se liberta totalmente da responsabilidade. ➢ Créditos intransmissíveis. Ex.: CC, art.298 ➢ Pactum non cedendo. CC, art.286 (cessionário de boa-fé) Pacto de não transmissão: quando as partes chegam em um acordo e não será possível transmitir; Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação. ➢ Transmissibilidade dos acessórios. CC, art.287 (ex.: garantias) Art. 287. Salvo disposição em contrário, na cessão de um crédito abrangem-se todos os seus acessórios. VALIDADE DA CESSÃO E SEUS EFEITOS ➢ Validade da cessão e seus efeitos entre as partes: CC, art.288 (forma livre) Art. 288. É ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do § 1° do art. 654. ➢ Eficácia da cessão perante terceiros: CC, art.654, §1° Art. 654. Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante. § 1º - O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos. ➢ Necessidade de registro: CC, art.221 (requisito de oponibilidade) O registro tem como objetivo dar a publicidade de existência da obrigação em relação a transmissão acordada entre as partes sobre a relação obrigacional. Não é eficaz perante terceiros se não for registrada. ➢ Registro competente, Lei 6015/73, art.130, 9°: títulos e documentos ➢ Eficácia da cessão em relação ao devedor, CC, art.290 ➢ Meios de ciência do devedor, CC, art.294; CC, art.292 ➢ Caráter instrumental da notificação EFEITOS DA CESSÃO QUANTO AO DEVEDOR E QUANTO AO CESSIONÁRIO ➢ CC, art.291: pluralidade de cessões do mesmo crédito. Qual deve prevalecer? A cessão na qual o cessionário tiver o título (documento comprobatório da existência do crédito). ➢ Tradição do título; B) prioridade na notificação, C) rateio do valor; ➢ Direito à indenização: CC, art.292 ➢ Crédito objeto da penhora: CC, art.298 ➢ Atos de conservação do crédito: CC, art.293 ➢ Direito de defesa contra a cobrança do crédito pelo cessionário: CC, art.294 RESPONSABILIDADE DO CEDENTE ➢ Cessão onerosa (responde pela existência/exigibilidade do crédito); ➢ Cessão gratuita (só responde se tiver agido de má-fé) ➢ Regra geral: o cedente não é responsável pelo efetivo adimplemento da obrigação transmitida ou pela solvência do devedor (CC, art.296) ➢ Cessão pro soluto ➢ Cessão pro solvendo. Limitação da responsabilidade ao preço (CC, art.297) TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES II – CESSÃO DE DÉBITO (ASSUNÇÃO DE DÍVIDA) Professor: Marcus Dantas (30/01) Percurso da aula: • Cessão de crédito e de débito: distinções; • Efeitos da assunção de dívida; • Anulação da assunção de dívida; • Cessão de posição contratual. CESSÃO DE CRÉDITO E DE DÉBITO: DISTINÇÕES ➢ CC, art.299: consentimento expresso Transferência de crédito e débito, além disso, na cessão de débito há a necessidade de consentimento expresso do credor na relação obrigacional. Exemplo: Marcus é devedor da Mariana e Nina é devedora do Marcus, então, Nina assumirá a dívida de Marcus (cede o débito que ele tem) frente a Mariana. Para a Mariana é relevante saber se Nina tem condições de honrar esse débito, nesse caso, na cessão de débito o consentimento da outra parte é uma condição de existência, o silêncio não deve ser interpretado como uma forma de aceitação. Art. 299. É facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consentimento expresso do credor, ficando exonerado o devedor primitivo, salvo se aquele, ao tempo da assunção, era insolventee o credor o ignorava. Parágrafo único. Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa. ➢ CC, art.303: assunção pelo adquirente de imóvel hipotecado Hipoteca é um direito real de garantia sobre bens imóveis. O credor pode executar a hipoteca, levando a leilão e apurar o crédito que ela possui sobre a hipoteca. Art. 303. O adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar em trinta dias a transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento. ➢ Abusividade da negativa EFEITOS DA ASSUNÇÃO DE DÍVIDA ➢ Efeito principal: liberação do devedor primitivo; Transfere a dívida para não ser mais o responsável pelo débito. ➢ Ressalva: CC, art.299, final; ➢ Enunciado 16, Jornadas do Direito Civil: “o art.299 do CC não exclui a possibilidade da assunção cumulativa da dívida quando dois ou mais devedores se tornarem responsáveis pelo débito com a concordância do credor”. ➢ Transmissão dos elementos acessórios: juros, cláusula penal, etc. Art. 300. Salvo assentimento expresso do devedor primitivo, consideram-se extintas, a partir da assunção da dívida, as garantias especiais por ele originariamente dadas ao credor. Regra: os acessórios seguem o principal. ➢ As garantias especiais não são transmitidas (CC, art.300) ➢ Garantias especiais oferecidas por terceiros ANULAÇÃO DA ASSUNÇÃO DE DÍVIDA ➢ CC, art.301: “restauração do débito”; Art. 301. Se a substituição do devedor vier a ser anulada, restaura-se o débito, com todas as suas garantias, salvo as garantias prestadas por terceiros, exceto se este conhecia o vício que inquinava a obrigação. ➢ Garantias prestadas por terceiros ➢ CC, art.302: exceções pessoais Art. 302. O novo devedor não pode opor ao credor as exceções pessoais que competiam ao devedor primitivo. Ex.: dolo utilizado anteriormente. CESSSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL ➢ Hipótese Ceder ao terceiro a sua posição, cedente sua posição da posição contratual. ➢ Características: contratos bilaterais; anuência do cedido (acordo entre 3 vontades); As partes devem estar de acordo para que a cessão seja feita corretamente, promovendo segurança para todos. ➢ Efeitos: entre o cedente e o cessionário; entre o cessionário e o cedido. Cedente: posição original e que irá transferir sua posição para o cessionário. Cessionário: vai passar a ocupar a posição do antigo cedente. Cedido: parte original que continua vinculada. REGIME DO ADIMPLEMENTO Prof.: Flávio Henrique (03/02) 1. REQUISITOS DO PAGAMENTO Em geral: (a) intenção do pagador de solver uma dívida; (b) prestação, tempo, lugar, quantidade e qualidade em conformidade com o contrato ou a lei, salvo concordância do credor em receber uma prestação desconforme; (c) quando o pagamento é feito por terceiro, consentimento dado pelo credor ou pelo devedor, se necessário; (d) legitimidade do recebedor do pagamento. Em alguns casos: transferência da propriedade. 2. PAGAMENTO POR TERCEIROS COM INTENÇÃO DE SOLVER (PRESTAÇÕES EM GERAL) Consentimento do credor: • Terceiro interessado, quando o devedor não cumpriu ou resta claro que não irá • cumprir no tempo devido: NÃO • Terceiro não interessado que paga em nome do devedor: NÃO • Terceiro não interessado que paga em nome próprio: SIM Consentimento do devedor: • Terceiro interessado: NÃO • Terceiro não interessado que paga em nome do devedor: SIM • (exceto na hipótese de gestão de negócios permitida) • Terceiro não interessado que paga em nome próprio: NÃO 3. PAGAMENTO POR TERCEIROS COM INTENÇÃO DE SOLVER (SERVIÇOS INTUITU PERSONAE) Consentimento do credor: • Qualquer terceiro: SIM Consentimento do devedor: • Qualquer terceiro: SIM 4. QUEM TEM LEGITIMIDADE PARA RECEBER O PAGAMENTO? • Credor de direito ou alguém autorizado pelo credor de direito (ex.: sujeito que contratou com aquele devedor); • Credor putativo; • Qualquer pessoa, desde que o pagamento seja posteriormente transferido ao credor de direito ou seja por ele ratificado. 5. IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTO 6. FORMA DO PAGAMENTO DE PRESTAÇÕES PECUNIÁRIAS 7. PERDA DO DIREITO DE PAGAR, OFERECER O PAGAMENTO OU CURAR A PRESTAÇÃO DESCONFORME 8. OFERTA DO PAGAMENTO E PAGAMENTO Requisitos da oferta: os mesmos requisitos do pagamento (intenção de solver a dívida; prestação, tempo, lugar, quantidade e qualidade em conformidade com o contrato ou a lei; direito de realizar o pagamento por parte do pagante e direito de receber por parte do recebedor; eventualmente a capacidade de transferir ao credor a propriedade da prestação oferecida em pagamento), mais uma demonstração inequívoca da disposição e capacidade de realizar o pagamento. Caso o devedor já tenha descumprido o contrato, de maneira que lhe possa ser imputável, então além dos requisitos acima o devedor também tem de oferecer o pagamento de uma indenização ao credor pelos prejuízos causados em virtude do atraso. Efeitos da oferta em relação ao devedor: (a) desculpa para o inadimplemento, caso o devedor ainda não tenha descumprido; (b) afastamento do direito do credor de obter a resolução do contrato em virtude do prévio inadimplemento do devedor; (c) atenuação da responsabilidade do devedor pelo perecimento ou deterioração da prestação devida (ele passa a responder somente por dolo); (d) direito de cobrar indenização do credor pelos prejuízos sofridos com a conservação da prestação devida; (e) direito de cobrar a contraprestação devida pelo credor (normalmente, o preço), ainda que o devedor seja liberado de seu dever de cumprimento em virtude de impossibilidade ou onerosidade; (f) impedimento ou cessação do corrimento de juros, indenização por lucros cessantes e outros prejuízos decorrentes do atraso, assim como não cabimento de multa e outras penalidades em virtude do inadimplemento; (g) permissão concedida ao devedor para revender a prestação devida para um terceiro, com o depósito do dinheiro arrecadado em favor do credor; (h) reconhecimento da dívida e interrupção da prescrição; (i) tendo o devedor o direito de escolher, a oferta do pagamento pode eventualmente deixar evidente a escolha da prestação a ser entregue, tornando-a uma obrigação de dar coisa certa, nos casos em que anteriormente a obrigação era de entregar coisa genérica. Efeitos que a oferta do pagamento compartilha com o pagamento: (a) transferência ao credor do risco de perecimento ou deterioração acidental da prestação devida, conforme descrito na letra “c”, exceto pelo fato de que no pagamento tal transferência tem caráter definitivo, enquanto na oferta do pagamento a transferência ocorre até o momento em que o credor purgar a sua mora; (b) impedimento ou cessação do corrimento de juros e outras penalidades, conforme descrito na letra “f”, exceto pelo fato de que no pagamento tal impedimento ou cessação tem caráter definitivo, enquanto na oferta do pagamento tais consequências ocorrem até o momento em que o credor purgar a sua mora. Diferenças: exceto quanto às hipóteses de exoneração do devedor em virtude da impossibilidade de cumprimento ou onerosidade excessiva (ocorridas durante a mora do credor), somente o pagamento extingue definitivamente a obrigação de cumprimento do devedor. 9. PAGAMENTO EM CONSIGNAÇÃO 10. DEVER ATRIBUÍDO AO CREDOR DE RECEBER O PAGAMENTO OU ÔNUS DE RECEBER (QUE TRAZ CONSEQUÊNCIAS NEGATIVAS EM CASO DE NÃO RECEBIMENTO INJUSTIFICADO)? Em geral: ônus de receber. Logo, não cabe resolução por “inadimplemento” do credor. Excepcionalmente, há dever do credor quando tal dever de recebimento da prestação ou de cooperação é estipulado no contrato. Entretanto, o inadimplemento de taldever por parte do credor não permite ao devedor solicitar ao juiz a condenação do credor a receber. O inadimplemento apenas permite ao devedor obter a resolução do contrato. 11. PROVA DO PAGAMENTO E DESPESAS RELACIONADAS AO PAGAMENTO 12. TRANSFERÊNCIA DAS GARANTIAS E PRIVILÉGIOS DO ANTIGO CREDOR AO NOVO CREDOR (SUB-ROGAÇÃO) Pagamento por terceiros: (a) terceiro interessado; (b) terceiro não interessado que paga com consentimento do devedor; (c) qualquer terceiro a quem o credor transferiu expressamente tais garantias e privilégios; (d) credor que paga aos demais credores a dívida do devedor comum. Outras hipóteses: (e) cessão do crédito para o novo credor; (f) mutuante que empresta a quantia exata para o devedor pagar a dívida. 13. CIRCUNSTÂNCIAS EM QUE AS GARANTIAS E PRIVILÉGIOS DO CREDOR SÃO EXTINTAS, SEM A SUA RENOVAÇÃO PARA O MESMO CREDOR OU A SUA TRANSFERÊNCIA PARA UM NOVO CREDOR Em caso de troca do devedor por assunção de dívida, salvo se o devedor primitivo tiver concordado em continuar submetido às garantias por ele originalmente dadas. Em caso de contração pelo devedor de nova dívida, mais onerosa, para extinguir e substituir a anterior; exceto se houver acordo entre o credor e o devedor em sentido contrário. Eventuais garantias prestadas por terceiros que não concordaram com a nova dívida contraída pelo devedor serão extintas (fiadores, proprietários dos bens dados em penhor ou hipotecados, demais devedores, etc.). 14. MODALIDADES ALTERNATIVAS DE PAGAMENTO: DAÇÃO EM PAGAMENTO E COMPENSAÇÃO 15. OUTRAS FORMAS DE EXTINÇÃO DA DÍVIDA SEM PAGAMENTO: CONFUSÃO E REMISSÃO DA DÍVIDA COMO DIFERENCIAR O PAGAMENTO DE SITUAÇÕES ANÁLOGAS? 1. Critérios de distinção: No verdadeiro pagamento, o pagante (que pode ser o próprio devedor ou um terceiro) tem a intenção de cumprir uma obrigação perante determinado credor, com o objetivo específico de extinguir a dívida do devedor perante aquele credor. O pagamento pode ser bem sucedido ou não, dependendo do atendimento dos seus requisitos. Caso seja bem sucedido, o pagamento irá extinguir a dívida do devedor. Caso o pagamento tenha sido feito por um terceiro, talvez ele consiga obter a restituição do enriquecimento do devedor. [Exemplo: B, que celebrou um contrato com A, corta algumas árvores no terreno de A, em cumprimento ao estipulado no contrato entre as partes. Se o serviço tiver sido prestado corretamente, então aquilo será considerado um pagamento, extinguindo a dívida de B.] Em sua situação parecida com o pagamento, que o código civil brasileiro chama de “pagamento indevido” (arts. 876-883), e que os romanos chamavam de condictio indebiti, o pagante tem a intenção de cumprir uma obrigação perante determinado credor, com o objetivo específico de extinguir a dívida do devedor perante aquele credor. Entretanto, por engano, ele acaba entregando alguma coisa ou acaba prestando um serviço para alguém que não era o verdadeiro credor. Em tal situação, somente serão aplicáveis as normas do pagamento, com a extinção da dívida do devedor e afastando-se a condictio indebiti, se o recebedor pudesse ser considerado um “credor putativo” (quer dizer, aparente). Do contrário, o devedor continuaria obrigado perante o seu verdadeiro credor. Caso a dívida não fosse extinta, o pagante poderia, talvez, recuperar do recebedor a restituição do seu enriquecimento (com base na condictio indebiti). Caso a dívida fosse extinta, o verdadeiro credor é que teria de correr atrás do recebedor para tentar obter a restituição do seu suposto enriquecimento (com base no regime geral do enriquecimento). [Exemplo: B, por engano, corta algumas árvores no terreno de A, acreditando que ele estava obrigado, em virtude de um suposto contrato válido entre as partes, a realizar tal serviço. Por coincidência, A queria que as suas árvores fossem cortadas para ele vender a madeira. O verdadeiro credor de B era C. Supondo-se que A fosse um credor putativo (aparente); então a ação de B seria equiparada a um pagamento, extinguindo a sua dívida perante C. Restaria a C tentar cobrar a restituição do suposto enriquecimento de A com base no regime geral do enriquecimento. Por outro lado, caso A não pudesse ser considerado credor putativo; então B continuaria obrigado perante C. Restaria a B tentar cobrar a restituição do suposto enriquecimento de A com base na condictio indebiti. Conduta de B não seria considerada pagamento, apesar de ele ter tido a intenção de pagar.] Outra hipótese de cabimento da condictio indebiti ocorre quando o pagante realiza uma prestação para o verdadeiro “credor”, mas num contrato que era nulo de pleno direito por algum motivo. Em tal hipótese, não são aplicadas as normas do pagamento, com extinção da dívida do devedor, simplesmente porque não havia qualquer dívida. O pagante tem direito de tentar obter a restituição do suposto enriquecimento do recebedor. [Exemplo: B, que celebrou um contrato com A, corta algumas árvores no terreno de A, acreditando que ele estava obrigado, em virtude de um suposto contrato válido entre as partes, a realizar tal serviço. Entretanto, o contrato era nulo de pleno direito em virtude da incapacidade absoluta de A. Em tal hipótese, B pode tentar cobrar a restituição do suposto enriquecimento de A com base na condictio indebiti. Conduta de B não seria considerada pagamento, apesar de ele ter tido a intenção de pagar.] Em outra situação, que não possui qualquer conexão com a realização de um pagamento, alguém entrega alguma coisa ou presta um serviço para alguém, sem a intenção de extinguir qualquer dívida, mas que – por coincidência – era algo esperado pelo recebedor como um pagamento a ser feito por outra pessoa. Em tal situação, são aplicadas as normas do pagamento, com a extinção da dívida do verdadeiro devedor, se ele já existisse. O “pagante” (entre aspas mesmo) talvez consiga obter a restituição do enriquecimento, seja do verdadeiro devedor (se ele já existisse) ou do recebedor, desde que o “pagante” tivesse sofrido algum tipo de empobrecimento. [Exemplo: B, por engano, corta algumas árvores no terreno de A, acreditando que ele estava cortando as árvores do seu próprio terreno, para vender a madeira. Por coincidência, A também queria que as suas árvores fossem cortadas para ele vender a madeira. Na hipótese de A já ter contratado alguém, D, para realizar o corte das árvores; então a ação de B seria equiparada a um pagamento, apesar de ele nunca ter tido a intenção de pagar (exonerando D do seu dever de cumprimento perante A). Na hipótese de A não ter contratado ninguém para fazer o serviço, então a ação de B não receberia a qualificação de pagamento. Talvez B pudesse cobrar a restituição do suposto enriquecimento de D ou A, dependendo das circunstâncias. Em primeiro lugar, seria necessário estabelecer se alguém foi enriquecido pela prestação do serviço, assim como saber quem foi enriquecido (D, que recebeu o preço, mas não chegou a prestar o serviço; ou A, que recebeu o serviço, mas não chegou a pagar o preço). Em segundo lugar, seria necessário estabelecer se B foi empobrecido com a prestação do serviço. No exemplo dado, parece que sim, pois ele queria cortar as árvores para obter um lucro. Assim, ele acabou realizando um serviço sem receber nada em troca. Por outro lado, imaginemos uma variação deste exemplo: vamos supor que B cortou as árvores para realizar exercícios físicos, de forma a ficar mais saudável. Em tal situação, não teria ocorrido o seu “empobrecimento” e ele não poderia cobrar a restituição de ninguém, ainda que D ou A tivessem obtido um enriquecimento. Supondo-se que B, como no exemplo dado, pudesse cobrar a restituição de alguém (D ou A); então tal cobrança não poderia ser fundamentada no regimejurídico do pagamento indevido (condictio indebiti), já que ele nunca teve a intenção de pagar alguém com o serviço de corte das árvores, mas teria de ser fundamentada no regime geral do enriquecimento.] Em conclusão: (1) existe o verdadeiro pagamento; (2) existe uma situação em que o sujeito tem a intenção de pagar e, apesar de não conseguir alcançar o seu objetivo, a sua conduta é equiparada a um pagamento (credor putativo); (3) existe uma situação em que o sujeito nunca teve a intenção de pagar, mas a sua conduta pode ser equiparada a um pagamento, por ter sido capaz de satisfazer o que o credor de alguém tinha direito de receber. [Observação: o código civil italiano, art. 1.191 (pagamento feito por um incapaz), diz que “o devedor que cumpriu a prestação devida não pode impugnar o pagamento com fundamento na sua própria incapacidade”. Portanto, a intenção de pagar é avaliada de forma superficial, sem a análise da questão de se o pagante tem condições de formar uma intenção válida, ainda que o pagamento possa ser posteriormente invalidado pela falta dos requisitos para a transferência da propriedade do bem dado em pagamento.] 2. Como avaliar o enriquecimento do recebedor de uma prestação ou do devedor cuja dívida foi extinta por outra pessoa nas situações de: pagamento verdadeiro realizado por um terceiro; pagamento ao credor putativo; pagamento indevido (condictio indebiti) e ações que, mesmo sem a intenção de pagar, satisfazem o recebedor. O que se segue é aplicável tanto ao recebedor de uma prestação stricto sensu, quanto ao devedor cuja dívida foi extinta. Ressalte-se agora que, no caso do devedor, a extinção da sua dívida pode ser equiparada ao recebimento de uma prestação de natureza pecuniária, não importando tanto a natureza da prestação por ele originalmente devida. O motivo é que ele tem os seus custos de cumprimento economizados, o que pode ser calculado em termos monetários. A extinção da sua dívida equivale, até certo ponto, ao recebimento de dinheiro. Por outro lado, a situação é mais complexa no caso do recebedor da prestação realizada por alguém. A seguir, alguns critérios para avaliar o enriquecimento. I- Enriquecimento encarado de forma subjetiva Motivo: o bem ou serviço foi imposto ao enriquecido, logo seria injusto se ele fosse obrigado a restituir algo mesmo não tendo sido subjetivamente enriquecido. [Exemplo: B, por engano, corta algumas árvores no terreno de A, acreditando que ele estava cortando as árvores do seu próprio terreno. O objetivo de B era praticar atividades físicas, de maneira que ele pudesse ficar mais forte e saudável. Infelizmente, A detestou o corte de árvores. Ele apreciava a vista daquelas árvores. Sob o seu ponto de vista, ao invés de receber um “enriquecimento”; ele sofreu uma dolorosa perda. Ele agora quer cobrar de B uma indenização pelos danos sofridos. Observe que o estado mental de A pode fazer toda a diferença entre o recebimento de um enriquecimento e a inflição de uma perda. O enriquecimento não comporta apenas elementos objetivos, como o valor do serviço de corte de árvores, mas também aspectos subjetivos. Da mesma forma, o empobrecimento de B não comporta apenas elementos objetivos, mas também elementos subjetivos. O estado mental de B pode fazer toda a diferença entre um empobrecimento e um ganho com a prestação daquele mesmo serviço. No exemplo dado, B obteve um ganho, pois ele conseguiu praticar atividades físicas utilizando recursos alheios sem ter de pagar nada por isso. Assim, ao invés de cobrar uma indenização pela sua perda, A poderia optar por cobrar a restituição do enriquecimento de B.] II- Uso de presunções por causa da dificuldade de se provar fatores subjetivos II.1- Benefício recebido tem natureza pecuniária (dinheiro) Presunção: o sujeito que recebeu dinheiro é considerado como tendo sido subjetivamente enriquecido na medida exata do montante recebido. Motivo da aplicação da presunção: o dinheiro, como a mercadoria que possui maior liquidez em uma economia, pode ser trocado por qualquer tipo de bem ou serviço que traga satisfação ao seu recebedor. Exceção: quando existem indícios ou provas de que o recebedor não foi subjetivamente enriquecido no exato montante recebido, então considera-se apenas o efetivo enriquecimento como, por exemplo, em Ministry of Defence v. Thompson, [1993] 2 Estates Gazette Law Reports 107 [C.A.U.K. (Civ. Div.)]. II.2- Benefício recebido não possui natureza pecuniária (bens móveis, serviços, etc.) Presunção: o recebedor NÃO é considerado como tendo sido subjetivamente enriquecido. Motivo da aplicação da presunção: em muitos casos, o recebedor não teria como devolver o recebido em espécie, tendo que alienar algo do seu patrimônio para levantar o dinheiro necessário para a restituição (problemas de liquidez); o recebedor não atribui um valor positivo para aquilo que recebeu da outra parte (problemas de valorização); o recebedor até poderia considerar positivo o que recebeu, mas nunca teria considerado como sua prioridade investir na aquisição do bem ou serviço recebido (problemas relacionados ao custo de oportunidade). Exceções: (a) Casos em que é possível realizar a restituição em espécie (b) O benefício é posteriormente transformado em dinheiro ou seu equivalente (c) O recebedor havia previamente revelado uma disposição em pagar pelo benefício (d) O recebedor foi poupado de ter de gastar com uma despesa necessária Exemplo: Mich. Cent. Ry. v. State, 155 N.E. 50, 50-51 (Ind. Ct. App. 1927). Um carregamento de carvão foi entregue por engano pela empresa ferroviária para a prisão do estado da Indiana. O verdadeiro credor do empobrecido, que contratou a empresa ferroviária para fazer a entrega, era outra pessoa. Entretanto, por coincidência, o recebedor (prisão estadual) também estava esperando um carregamento de carvão. Parte do carvão foi consumida pelo recebedor antes que o erro fosse descoberto. A empresa ferroviária indenizou o empobrecido pela perda do carvão com base no seu valor de mercado. O empobrecido, por sua vez, cedeu à empresa ferroviária o direito de cobrar a restituição do suposto enriquecimento do recebedor (prisão estadual). Observe-se que, no caso concreto, a prisão estadual havia feito um contrato de fornecimento de carvão de longo prazo com um terceiro. Com base em tal contrato, a prisão estadual deveria pagar um preço por tonelada substancialmente menor do que o valor de mercado do carvão consumido por engano. O benefício recebido não tinha natureza pecuniária (dinheiro), mas ainda assim o recebedor deveria ser considerado como tendo sido subjetivamente enriquecido. Motivo: ele havia demonstrado previamente a disposição em pagar pelo benefício recebido (carvão), conforme atestado pelo contrato feito com o terceiro. Entretanto, o enriquecimento subjetivo do recebedor não foi medido com base no valor de mercado do carvão consumido, mas sim com base no valor que ele estava disposto a pagar no contrato com o terceiro. [Supondo-se que uma parte do carvão ainda estivesse em poder da prisão estadual, ela teria de devolver ao empobrecido. Mas tal devolução da posse não seria baseada no direito de reivindicar a propriedade sobre o carvão, que já teria sido perdida para a prisão estadual, mas na restituição do enriquecimento obtido pela prisão às custas do antigo proprietário (empobrecido). Em tal caso, haveria o enriquecimento subjetivo do recebedor por enquadrar-se na primeira exceção à presunção de não enriquecimento acima mencionada. Supondo-se que uma parte do carvão tivesse sido revendida pela prisão estadual para outras pessoas, ela teria de restituir ao empobrecido (antigo proprietário do carvão) ou à empresa ferroviária (em virtude da cessão do direito feita pelo empobrecido)o preço de venda para esses terceiros (renda bruta obtida), limitada ao montante do prejuízo sofrido pelo empobrecido ou pelo cessionário. Em tal caso, haveria o enriquecimento subjetivo do recebedor por enquadrar-se na segunda exceção à presunção de não enriquecimento acima mencionada.] CLASSIFICAÇÃO DOS BENS Utilitas in re ipsa: um reexame da classificação dos bens considerados em si mesmos Denis Franco Silva e Flávio Henrique Silva Ferreira 1. A PROBLEMÁTICA DA CLASSIFICAÇÃO DOS BENS O ato de dividir e classificar fenômenos e/ou coisas apresenta-se como uma necessidade epistemológica. Atos de divisão e classificação são o que permite toa e qualquer concepção de sistema ou ordem e, portanto, de conhecimento abrangente acerca de uma realidade. O ato de classificar, possui uma intrínseca relação com determinada visão de mundo pré-concebida, ou com certos conceitos preestabelecidos de forma muito mais arbitrária do que inicialmente se pode imaginar, retroalimentando tais conceitos preestabelecidos a partir da perplexidade ou estranheza causados por aquilo que escapa ou ultrapassa os estreitos limites da classificação apresentada. No Capítulo I do Título Único do Livro II da Parte Geral do Código Civil de 2002, as categorias apresentadas só se revelam possíveis e integradas de forma sistêmica se pressuposta determinada ideologia e, consequentemente, determinada função ou finalidade a elas atribuída, de seus estreitos limites escapando e causando estranheza em tudo aquilo que não possa se adequar aos critérios ordenadores que lhe deram origem. Quanto a isto, os próprios elementos caracterizadores do que seria um “bem” para o direito, ou seja, as características que imediatamente conduziriam um ente qualquer à posição de objeto de relações jurídicas fixam os limites inerentes a tal classificação, quais sejam: utilidade, suscetibilidade de apropriação, limitabilidade e exterioridade. A classificação dos bens se ocupa da titularidade, aquisição e circulação dos bens em economia de mercado. Mesmo no âmbito do direito, o termo “bem” pode ser empregado para designar coisas completamente distintas, tais como o direito à “educação”, a um “meio ambiente saudável”, a um ‘automóvel”, a um “crédito”, sendo que um ordenamento jurídico pode então apoiar a produção e circulação desses bens, a reprimir ou lhe ser indiferente. Quanto ao sentido tacitamente empregado na Parte Geral do Código Civil de 2002, percebe-se que o legislador teve em mente especialmente aqueles bens de caráter patrimonial suscetíveis de alienação e, no que se refere aos bens em si mesmo considerados, a classificação confere ênfase à utilidade que o bem representa, per se, para seu titular. 2. UMA BREVE E ÚTIL REMISSÃO HISTÓRICA O ato de classificar os bens em diferentes categorias é algo relativamente recente em termos históricos. Os romanos, de quem se tomou emprestado grande arte de nosso direito privado, não se preocupavam em elaborar categorias e classificações compreensivas. Encontra-se menção a diferentes tipos de bens, em diversos fragmentos, sempre que necessário para a exposição de alguma controvérsia ou regra jurídica concreta. Os romanos dividiam as coisas entre aquelas divinis iuris e aquelas humani iuris. As primeiras são res sacrae, res religiosae e res sanctae, enquanto as últimas podem ser classificadas como sendo públicas ou privadas. Outras divisões – mais relevantes para o direito privado – são entre as coisas corpóreas ou incorpóreas, e também entre res macipi e res nec mancipi. O Código de 1916, assim, veio apresentar a priemira classificação ordenada e sistematizada dos bens no direito brasileiro, com uma estrutura que foi, de fato, recepcionada pelo atual Código Civil de 2002, levando em consideração as divisões categoriais no que se refere aos bens considerados em si mesmos. 3. A CLASSIFICAÇÃO DOS VENS CONSIDERADOS EM SI MESMOS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002 O Código Civil de 2002, como o código anterior, reúne uma série de dicotomias categoriais – quais sejam, imóveis/móveis, fungíveis/infungíveis, consumíveis/ não consumíveis, singulares/coletivos – dentro de uma mesma categoria sistêmica mais ampla, uma classe, qual seja, a dos bens considerados em si mesmos, em oposição às classes dos bens reciprocamente considerados e dos bens públicos (respectivamente, Capítulos I, II e III do Título Único do Livro II da Parte Geral). Sendo o principal escopo de tal sistemática classificatória estabelecer critérios que norteiam questões ligadas à titularidade, aquisição e circulação dos ditos bens, tal distinção em três grandes eixos categoriais se apresenta relevante. No que se refere à titularidade, declina-se no Capítulo III tratamento diferenciado aos bens públicos, ou seja, estabelece-se um regime jurídico específico em função do titular dos direitos que incidem sobre bens enquadrados em tal categoria. Nos Capítulos I e II, em mais clara relação de oposição, encontram-se as categorias estruturadas em função da utilidade representada pelos bens inseridos em tal classificação. Assim, em oposição a uma sistemática que visa regular questões de titularidade, aquisição e circulação de bens em situações nas quais a utilidade é determinada ou sobrelevada pela relação com outro bem (classe dos bens reciprocamente considerados), encontra-se a classe na qual, per re ipsa, ou seja, independentemente da relação imediata de um bem com outros, tal utilidade é abstratamente reconhecida e se estabelecem distinções categoriais de suma relevância quanto ao regime jurídico de apropriação, perda e circulação de determinado bem no ordenamento, a depender das categorias da classe dos bens considerados em si mesmos nas quais se subsume o bem em questão. 3.1 Bens imóveis e bens móveis A divisão dos bens entre imóveis e móveis é considerada, historicamente, a mais importante e mesmo reputada pela doutrina francesa como a suma divisão dos bens. Na sistemática do Código Civil de 2002, são imóveis: o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente (art.79), os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram (art.80, I) e o direito à sucessão aberta (art.80, II), estes dois últimos por determinação legal. Observe-se, portanto, que os bens imóveis podem ser assim considerados de três tipos, quais sejam: a) por natureza e acessão natural; b) por acessão física ou artificial; e c) por determinação legal. Claro que se encontra que o direito brasileiro não mais reconhece a chamada imobilização por acessão intelectual, ou seja, nos termos do art.43, III, do CC de 1916 “tudo quanto no imóvel o proprietário mantiver intencionalmente empregado em sua exploração industrial, aformoseamento ou comodidade”. O art. 81 do CC, que encerra a seção relativa aos bens imóveis, dispõe que não perdem seu caráter de imóveis “as edificações que separadas do solo, mas conservando sua unidade, forem removidas para outro local” (art.81, I) e os “materiais provisoriamente separados de um prédio para nele mesmo se reempregarem (art.81, II). Quanto aos bens móveis, o código atual também os divide em dois tipos, quais sejam: os móveis por natureza e os móveis por determinação legal. Os móveis por natureza são aqueles “suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social” (art.82), sendo a parte final do dispositivo o que reforça o fato de ser a utilidade representada pelo bem o determinante para sua classificação. Já os móveis por determinação legal seriam “as energias que tenham valor econômico” (art.83, I), “os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes” (art.83, II), mais uma vez em aplicação da regra de que o acessório segue o principal,e “os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas sanções” (art.83, III). Em termos históricos, especialmente a partir do século XIX, uma das principais funções exercidas pela classificação dos bens em móveis ou imóveis é a elaboração de regras diferenciadas para a aquisição da propriedade sobre os referidos bens por meio de um negócio jurídico inter vivos. Entre os requisitos para a transferência da propriedade sobre bens imóveis está a anotação desta transferência em registros oficiais, enquanto a maior parte dos bens móveis prescinde do referido requisito. Em teoria, no caso dos bens móveis corpóreos, a transferência da posse (tradição) é, juntamente com outros fatores, um dos requisitos para a transferência da sua propriedade, ao invés do registro. Ou seja, a transferência da propriedade sobre os bens imóveis demanda operação mais solene e complexa, como regra, do que a mesma operação tendo por objeto um bem móvel. Crítica: a tutela especial conferida aos bens imóveis é usualmente criticada, mormente pelo fato de que “em muitos casos, os títulos e outros bens móveis possuem valor superior aos bens imóveis”. De fato, ações, títulos e outros valores mobiliários certamente podem possuir, atualmente, valor muito mais elevado e talvez função econômica mais importante que os tradicionais bens imóveis. O determinante, entretanto, para a inclusão ou exclusão na categoria dos bens imóveis, de maneira a se estabelecer um regime mais complexo de aquisição (seja originária, como se verá abaixo, seja derivada) ou transmissão de direitos, não é seu valor econômico ou seu “valor de troca”, mas como dito, a utilidade representada pelo bem individualmente considerado para seu titular. (valores mobiliários apresentam liquidez e facilidade de circulação do capital representado) O enquadramento de certos bens na categoria dos móveis ou imóveis é ainda utilizada pelo ordenamento para elucidar qual o regime jurídico aplicável nas hipóteses de aquisição originária da propriedade como usucapião, ocupação, acessão, especificação e outras. 3.2 Bens fungíveis e infungíveis A classificação seguinte trazida pelo atual Código Civil é a entre bens fungíveis e infungíveis que, como visto, possuir origem no direito romano, sendo que a noção de fungibilidade pode ser reportada aos bens que possuem a particularidade de se identificarem por peso, conta ou medida ou, na mais precisa definição do Código Civil de 2002, aqueles que “podem-se substituir por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade” (art.85). Embora a redação do artigo 85 do Código Civil de 2002 pouco contribua para tanto, percebe-se que do regime conferido à fungibilidade, principalmente no que se refere a seus reflexos obrigacionais, admite o direito brasileiro a noção subjetiva de fungibilidade, também chamada de fungibilidade convencional. Neste sentido, a lição de Orlando Gomes, segundo o qual “a fungibilidade não é propriedade natural da coisa, mas qualidade alterável pela vontade do homem, conforme o fim que tenha em mira ao formar a relação jurídica”. Se o elemento determinante para a classificação é a utilidade representada pelo bem para o seu particular, de outra forma não poderia ser. Tome-se, como exemplo, um touro. Se a utilidade de bem para o titular é a tração de um arado, pode determinar-se a fungibilidade do objeto em uma operação de compra e venda. Todavia, se a utilidade do bem resulta de sua carga genética (um touro reprodutor), infungível será necessariamente considerado. 3.3 Bens consumíveis e não consumíveis Outra classificação, apresentada no art.86 do Código Civil de 2002, é entre bens consumíveis e não consumíveis, tendo aí também preferido o legislador definir o que seriam os bens consumíveis, considerando-se não consumíveis os que não se subsumirem nos termos do dispositivo. Ao contrário do que inicialmente se possa inferir, o conceito de bem consumível não é naturalístico, mas jurídico, e depende, como já se pode presumir a esta altura, da utilidade representada pelo bem. Costuma-se apresentar os bens consumíveis divididos entre duas subcategorias, quais sejam, consumo natural e consumo jurídico. Os primeiros seriam aqueles cujo uso implica na destruição imediata da coisa (por exemplo, alimentos), enquanto os segundos seriam aqueles destinados à alienação, podendo-se exemplifica-los com a menção a livros destinados à venda em uma livraria. Entrementes, a partir da admissão de uma categoria de consumo dita “jurídica”, porque prescinde de destruição imediata da coisa, verifica-se que o consumo é determinado, propriamente, pela extinção ou não de todos os direitos que o titular possui sobre o objeto, seja por perecimento imediato do objeto por meio do uso, seja por transmissão destes direitos a outrem. A utilidade do bem (ou cessação desta) para o titular, desta maneira, é que se revela fator determinante. É possível afirmar, em relação à classificação dos bens em consumíveis ou não consumíveis, que a relevância da distinção entre eles se encontra na aplicação de regras especiais, restritas à categoria dos bens consumíveis, que têm por escopo a validação de certos tipos de pagamento que seriam considerados inválidos em circunstâncias normais. 3.4 Bens divisíveis e indivisíveis Tal classificação, por si, deixa claro seu caráter não naturalístico, uma vez que, a rigor, no mundo físico, até mesmo o átomo pode ser dividido. O Código Civil de 2002 dispõe, de maneira bem mais elucidativa, em seu art.87 que “bens divisíveis são os que podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam”. Tal redação ressalta, em sua parte final, o caráter valorativo de tal classificação centrado, mais uma vez, na utilidade, que se sobressai no texto, tendo em vista, por exemplo, que a “considerável perda de valor” refere-se ao valor de troca, diretamente relacionado ao – no entanto não determinado pelo – valor de uso do bem”. “Art. 87. Bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam. Art. 88. Os bens naturalmente divisíveis podem tornar- se indivisíveis por determinação da lei ou por vontade das partes.” Deve-se notar, diante do disposto no art.88, que se inclinou o legislador também aqui por uma acepção subjetiva na determinação do significado da expressão “do uso a que se destinam”, já que a indivisibilidade pode ainda ocorrer da lei ou, mais importante neste momento, da vontade das partes. Tal raciocínio será melhor esclarecido abaixo, visto que a aplicação mais importante da presente divisão entre bens divisíveis e indivisíveis se manifesta, justamente, no direito das obrigações. De fato, a categorização de um dado bem como indivisível tem como principal objetivo a proteção da utilidade, traduzida em vantagem, almejada pelo credor com o recebimento do referido bem. Tal proteção é conferida por meio da proibição de seu fracionamento no momento da entrega ao mencionado credor. Para a aferição da utilidade trazida pelo recebimento de parte do bem, e, consequentemente, para a aferição de sua categorização como divisível ou indivisível, é levado em conta os usos aos quais o referido bem é tipicamente submetido na sociedade, que podem variar em função da intenção do titular. Entretanto, o uso absolutamente idiossincrático a ser conferido ao bem por um eventual credor deve ser levado em conta nos casos em que tal uso tenha sido objeto de barganha pelas partes contratantes, traduzindo-se em uma cláusula contratual. 3.5 Bens singulares e coletivos A última divisão trazida dentro da classe dos bens considerados em si mesmos é a divisão entre bens singulares