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Fibromialgia Quezia Brito CONCEITO Síndrome dolorosa crônica, caracterizada por dor musculoesquelética generalizada e fadiga podendo estar associada a alterações do sono, distúrbios cognitivos, sintomas psiquiátricos e sintomas somáticos Sintomas psiquiátricos: há áreas no SNC, processadoras da dor, que podem ter intercessão com aquelas que processam as emoções. Pacientes com FM são muito intensos nas emoções: emotivos, deprimidos, ansiosos A FM não é uma doença psicológica Denominações dadas por especialidades não- reumatológicas: transtorno somatoforme, síndrome somática funcional, síndrome do estresse corporal EPIDEMIOLOGIA Existe um componente genético/ambiental: 50%/50% Há variação na prevalência no mundo Acomete mais mulheres que homens (6:1) Idade: 25-65 anos Mais prevalentes em pacientes com doenças crônicas, sobretudo as reumatológicas FISIOPATOLOGIA Fatores genéticos: genes alterados envolvidos: ✓Relação com enzimas que degradam monoaminas ✓Relação com transportadores e receptores de serotonina e dopamina ✓Proteínas que organizam diretamente estruturas do SNC Disfunções dos sistemas autônomo e hormonal Anormalidades psicofisiológicas e de transmissão Gatilhos periféricos: situações que amplificam uma dor existente Pacientes com FM tem uma reestruturação do SNC, particularmente o sistema nociceptivo (vias do processamento da dor) ✓Reposta anormal e inadequada do SNC aos estímulos periféricos em decorrência de hiperexcitabilidade neuronal (baixo limiar de dor) ✓Alteração na regulação da dor + dor inadequadamente amplificada = síndrome de sensibilização central Aumento do glutamato no córtex posterior da ínsula: níveis aumentados associados com menores limiares de dor Hiperatividade da amígdala e ínsula que integram o sistema nociceptivo ao circuito “cerebral de emoções” – hiperatividade neste sistema= resposta emocional exacerbada: catastrofização Rede neural em modo padrão com maior conectividade com a ínsula – evocação de experiências dolorosas e com rede de atenção executiva (alterações memória e atenção: déficits cognitivos) Alteração da atividade inibitória normal de estímulos nociceptivos: baixos níveis de GABA na ínsula Sono não reparador: pode levar a menor atividade de sistemas descendentes de controle da dor. Não possuem o sono REM: irritabilidade Maior conectividade entre neurônios do córtex sensorial associados a maiores níveis de hipervigilância e castrofização: estresse e alerta Sistema de antecipação de alívio da dor não é ativado na FM, sobretudo a área tegmentar ventral (“área de recompensa” ao liberar dopamina e GABA) Potencialização dos estímulos nociceptivos no corno posterior da medula: receptores NMDA e glutamato Níveis de neurotransmissores aumentados no líquor da medula: substância P e fator de crescimento neuronal É como se o cérebro estivesse em constante estresse, irritabilidade, vigilância, fadiga. Isso acaba alterando o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal: disfunção hormonal. QUADRO CLÍNICO Clássicos: dor difusa e crônica, fadiga, alterações na memória, no humor e no sono Outros: ✓distúrbios cognitivos ✓sensação subjetiva de edema: paciente refere que suas articulações estão inchadas, mas não estão ✓sintomas psiquiátricos: depressão, ansiedade, transtorno bipolar, doenças do estresse pós- traumático, traços de catastrofização e alexitimia (paciente não consegue definir suas emoções) ✓cefaleia ✓parestesias, mas com exame físico inocente. Há presença de fibras finas na superfície da pele (não em todos os pacientes) ✓Síndrome do intestino irritável: constipação alterando com diarreia, que não há alteração nos exames ✓Doença do refluxo gastroesofágico ✓Dor pélvica/abdominal ✓Urgência miccional, polaciúria ✓Sintomas de disfunção do sistema nervoso autônomo: olho seco, pseudo-Raynaud (vasoespasmo por disatonomia, simulando os sintomas de Raynaud, mas não se trata de uma doença vascular) EXAME FÍSICO Áreas de sensibilidade dolorosa em múltiplos locais de partes moles: trigger points: pontos dolorosos sensíveis ao toque Avaliação neurológica é inocente. Alguns podem referir parestesias Avaliação de diagnósticos diferenciais quando necessário (gatilhos periféricos) Bom estado geral CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO/DIAGNÓSTICO Critérios para classificação da síndrome da fibromialgia pelo Colégio Americano de Reumatologia de 1990: sensibilidade: 84% especificidade: 87% 1. dor difusa por mais de três meses ✓dor nos 4 quadrantes + dor axial quadrantes: acima e abaixo da cintura e do lado esquerdo e direito do corpo 2. presença de 11 dos 18 pontos dolorosos palpação do trigger points: com o polegar da mão dominante, aplica-se uma força de 4kg/cm² de superfície cutânea Critérios para classificação da síndrome da fibromialgia pelo Colégio Americano de Reumatologia de 2010/2011: sensibilidade: 86% especificidade: 90% Para esse critério ser aplicado deve-se: ✓FM ser um diagnóstico de exclusão ✓Sintomas por pelo menos 3 meses Dividida em dois domínios: Índice de dor generalizada – IDG -Pergunta a paciente se ele sentiu dor nesses locais nos últimos 7 dias -Variação: 0-19 pontos Escala de gravidade de sintomas – EGS -Variação: 0-12 pontos -Sintomas associados: distúrbios do sono/ sono não reparador, cefaleia, parestesias, rigidez matinal, irritabilidade, dificuldade de concentração, déficit de memória, zumbido, tontura/vertigem, desmaios, palpitação, dispneia, sintomas de cólon irritável, sintomas de síndrome das pernas inquietas, dor pélvica, náuseas, empachamento, urgência urinária, disparemia, diminuição da libido, sintomas de TPM, edema articular/periférico subjetivo, Raynaud, xerostomia, xeroftalmia, ansiedade, depressão, fadiga diurna, sintomas alérgicos, sintomas de apneia do sono Resultado IDG ≥ 7 + EGS ≥ 5 ou = FIBROMIALGIA IDG= 3-6 + EGS ≥ 9 Critérios para classificação da síndrome da fibromialgia pelo Colégio Americano de Reumatologia de 2011: Escore de severidade de fibromialgia (IDG + EGS): considerar ≥ 12 ✓Questionário autoaplicável: sintomas associados ficaram mais suscintos ✓Contexto de estudos epidemiológicos/pesquisa EGS: variação de 0-12 Critérios para classificação da síndrome da fibromialgia pelo Colégio Americano de Reumatologia de 2016: 1. dor difusa em 4 de 5 regiões (não considerar mandíbula, tórax e abdome) ✓propôs a validade do diagnóstico independentemente de outros diagnósticos (deixa de ser diagnóstico de exclusão) Resultado IDG ≥ 7 + EGS ≥ 5 ou = FIBROMIALGIA IDG= 4-6 + EGS ≥ 9 AFINAL, ESSA TAQUICA VÉA FICA COMO? ASSIM: Novas diretrizes para o diagnóstico de fibromialgia – 2017 Aplica o questionário IDG + EGS e palpa os trigger points 1. dor difusa por mais de três meses ✓dor nos 4 quadrantes + dor axial quadrantes: acima e abaixo da cintura e do lado esquerdo e direito do corpo 2. presença de 11 dos 18 pontos dolorosos 3. índice de dor generalizada – IDG 4. escala de gravidade dos sintomas – EGS Critérios de 1990 + critérios de 2010: alta acurácia A presença da dor difusa é fundamental para o diagnóstico de FM. FM não é diagnóstico de exclusão DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS NÃO há necessidade de realizar exames laboratorial (exame de imagem, termografia, polissonografia – distúrbios do sono, autoanticorpos: pode da + mesmo não tendo doença autoimune) para diagnóstico da FM. A não ser que necessite fazer algum diagnóstico diferencial ou para acompanhamento da medicação para FM (função renal transaminases) ✓Hipotireoidismo ✓Doenças inflamatórias reumatológicas: artrite reumatoide ✓Uso de medicação: estatinas, bisfosfonatos, inibidores da aromatase e opiodes ✓Neuropatias✓Doenças ósseas: hiperparatireoidismo, osteomalácia ✓Doenças musculares ✓Doenças neurológicas ✓Mieloma múltiplo TRATAMENTO EDUCAÇÃO: ✓Conhecimento do paciente dos seus sintomas, dos objetivos e das etapas de tratamento ✓Participação ativa do paciente na estratégia terapêutica e nos fatores que influenciam sua sintomatologia ✓Orientar contra medidas com eficácia duvidosa: gera frustação: amplifica estresse: piora dor ✓Individual ou em grupo ✓Terapia multicomponente: atividades educacionais + exercícios (dor e fadiga) EXERCÍCIOS FÍSICOS: melhora dor, sono, fadiga ✓Aumento dos níveis de serotonina, melhorando depressão, dor, distúrbios do sono ✓Estimulação da produção de GH-IGF1, interferindo na dor e na fadiga ✓Regulação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal e sistema nervoso autônomo, diminuindo dor, distúrbio do sono, ansiedade, psudo-Raynaud, sintomas de secura, alteração do hábito intestinal, lipotímina e outros sintomas relacionados à disautonomia EULAR, 2027 ✓Aeróbicos: melhoram a função e a dor, os aspectos emocionais e qualidade de vida ✓Solo e água: igualmente efetivos ✓Associação (aeróbio + força) parece ser superior à isolada ✓Pilates: ótimos resultados ✓Exercícios personalizados levando-se em conta as peculiaridades destes pacientes ✓Treinos de resistência.: melhora a dor e capacidade funcional ✓Treinamento de aptidão cardiovascular ideal geralmente requer um mínimo de 30 minutos de exercícios aeróbicos 3x/semana em uma faixa próxima à FC alvo TERAPIAS PSICOLÓGICAS: o estresse piora a dor e a dor piora o estresse ✓Correção dos mecanismos de estresse: terapia cognitiva comportamental (EULAR, 2027) ✓Outras modalidades: intervenções de realidade virtual, técnicas de meditação, terapia de comprometimento e aceitação (TCA), terapia interpessoal breve, terapia do espelho, terapia corpo-mente MEDIDAS NÃO FARMACOLÓGICAS: ✓Acupuntura ✓Hidroterapia ✓Técnicas de meditação: Tai chi, yoga, terapia de consciência corporal, qigong ✓Tai chi: maior melhora sintomática, em comparação com exercícios aeróbios ✓Quixopraxia: não é recomendado FARMACOLÓGICO Iniciar com doses pequenas e vai titulando Pacientes com FM tem mais predisposição a apresentar os efeitos colaterais dos fármacos Manter o esquema por, pelo menos, 12 meses TRICÍCLICOS: atuam no sistema descendente inibitório do estímulo doloroso, inibindo a recaptação de monoaminas. NÃO para tratar a depressão, a dose é para tratar a dor (menor) ✓amitriptilina e nortriptilina -Custo baixo -Melhoram a dor, o sono e fadiga -Doses entre 12,5 e 50mg/dia (mais baixas, do que é para depressão). Máxima: 75mg/dia -Tomar 1 a 3h antes de dormir -A dose pode ir sendo aumentada em 5mg no máximo a cada duas semanas -Efeitos adversos: ganho de peso, sonolência excessiva, obstipação intestinal, perda da libido, aumento da pressão intraocular, olho e boca seca -Contraindicado em casos de glaucoma ISRSN: antidepressivos duais: inibidores da recaptação de norepinefrina e serotonina ✓Duloxetina: melhora na dor; 60-120mg/dia ✓Venlafaxina: melhora na fadiga ISRS: inibidores da recaptação de serotonina -Só da serotonina: não tem ação analgésica boa ✓Fluoxetina: eficácia analgésica podre, podem ser úteis no tratamento dos sintomas GABAPENTINOIDES: modulador dos canais de cálcio alfa-2/delta – alfa2ligantes. Redução da aferência do estímulo doloroso, por meio da atuação nos canis de cálcio do neurônio pré- sináptico ✓Pregabalina -Melhora dor, fadiga e sono -Alto custo -Efeitos adversos: semelhantes aos antidepressivos, tontura, sedação -Doses: 150-300mg/dia ✓Gabapentina -Melhora da dor, mas não tão quanto a pregabalina -O SUS oferece -Doses: 1200-2400 mg/dia MIORRELAXANTES: ✓Ciclobenzaprina -Embora seja um agente tricíclico, não é antidepressivo -É uma alternativa à amitriptilina, em casos de sintomas leves e moderados -Reduz a atividade do neurônio motor eferente e na dor por meio da inibição de recaptação de serotonina -Dose: 10-40mg/dia -Alivia a dor, fadiga e melhora a qualidade do sono -Efeitos adversos: aumento da pressão intraocular, olho e boca seca -Contraindicado em casos de glaucoma OPIÓIDE ✓Tramadol -Isolado ou associado ao paracetamol: melhora dor -Outros opioides (codeína, morfina), AINES isolados NÃO têm efeito -NÃO SE FAZ MORFINA EM FM, pois não trata a dor e o risco de dependência é grande -AINES se o paciente tiver algum gatilho periférico (busite, tendinite): pode servir -Tem efeito pois também inibe a receptação de serotonina-noradrenalina (discretamente) INDUTORES DO SONO: se existe queixa de insônia, mas não por causa das dores ✓Zolpidem: 5-10mg ✓Zoplicone: 7,5mg ✓Clonazepam: mioclonais e síndrome das pernas inquietas CONCLUSÃO MEDICAMENTOS: Distúrbios de sono grave: pregabalina 150- 300mg/dia (modulador dos canis de cálcio alfa- 2/delta – alfa2ligantes) e gabapentina Fadiga ou depressão graves + dores: dulexetina 60-120mg/dia ou venlafaxina (ISRSN) Não responde adequadamente a tricíclicos: ISRSN ou gabapentinoides CONSIDERAÇÕES FINAIS Identificar a FM como síndrome de sensibilização central Doença de abordagem multidisciplinar Importância da atividade física Não afastar paciente com FM do trabalho, pois há uma piora. Quanto mais limitações impor: mais transtorno psiquiátricos surgirão Pacientes tratados em ambientes de cuidados primários na comunidade apresentam melhores resultados que no ambiente especializado PCR, VHS, CPK: NÃO estão alterados em decorrência da FM, mas sim em doenças inflamatórias