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1 
 
Disciplina: Análise literária de textos Realistas, Parnasianos e Simbolistas 
Autores: M.e Marta Ouchar de Brito 
Revisão de Conteúdos: Esp. Marcelo Alvino da Silva 
Revisão Ortográfica: Jacqueline Morissugui Cardoso 
Ano: 2017 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas 
páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de 
Marketing da Faculdade São Braz (FSB). O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em 
cobrança de direitos autorais. 
 
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FICHA CATALOGRÁFICA 
 
 
 
BRITO, Marta Ouchar de. 
Análise literária de textos Realistas, Parnasianos e Simbolistas / Marta 
Ouchar de Brito. – Curitiba, 2014. 
64 p. 
Revisão de Conteúdos: Marcelo Alvino da Silva. 
Revisão Ortográfica: Jacqueline Morissugui Cardoso. 
Material didático da disciplina de Análise literária de textos Realistas, 
Parnasianos e Simbolistas – Faculdade São Braz (FSB), 2017. 
 
 
 
3 
 
 
 
 
 
 
Análise literária de textos 
Realistas, Parnasianos e 
Simbolistas 
 
 
 
 
 
 
 
 
ANO 
2017 
4 
 
PALAVRA DA INSTITUIÇÃO 
 
Caro(a) aluno(a), 
Seja bem-vindo(a) à Faculdade São Braz! 
 
 Nossa faculdade está localizada em Curitiba, na Rua Cláudio 
Chatagnier, nº 112, no Bairro Bacacheri, criada e credenciada pela Portaria nº 
299 de 27 de dezembro 2012, oferece cursos de Graduação, Pós-Graduação e 
Extensão Universitária. 
 A Faculdade assume o compromisso com seus alunos, professores e 
comunidade de estar sempre sintonizada no objetivo de participar do 
desenvolvimento do País e de formar não somente bons profissionais, mas 
também brasileiros conscientes de sua cidadania. 
 Nossos cursos são desenvolvidos por uma equipe multidisciplinar 
comprometida com a qualidade do conteúdo oferecido, assim como com as 
ferramentas de aprendizagem: interatividades pedagógicas, avaliações, plantão 
de dúvidas via telefone, atendimento via internet, emprego de redes sociais e 
grupos de estudos o que proporciona excelente integração entre professores e 
estudantes. 
 
 
 Bons estudos e conte sempre conosco! 
 Faculdade São Braz 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
Apresentação da disciplina 
Esta disciplina tem por objetivo fornecer algumas diretrizes e orientações 
que permitam a análise de textos literários produzidos ao longo de quatro 
séculos, abrangendo as escolas do Realismo, Naturalismo, Parnasianismo e 
Simbolismo. 
A disciplina está estruturada em quatro aulas. Seguindo a abordagem 
temática e cronológica, nas quais serão selecionados e analisados fragmentos 
da obra dos autores mais destacados de cada período, dando especial atenção 
às características, buscando contextualizar historicamente suas obras. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
6 
 
Aula 1 – Conceitos básicos sobre análise literária 
Apresentação da aula 1 
 Nesta aula serão abordados os conceitos básicos à respeito da análise 
literária, ressaltando os seus aspectos e tendências, visando auxiliar no “como 
proceder”, para se efetuar uma análise literária consistente. 
 
1. Conceitos básicos sobre análise literária 
O primeiro passo é sem dúvida, uma tarefa árdua, ou seja, buscar a 
definição, o conceito de Literatura que cabe no anseio de trabalhar com a 
análise literária de textos Realistas, Naturalistas, Parnasianos e Simbolista, 
lembrando que tratam-se de tendências literárias, que ora uma, ora outra, 
contemplaram textos em prosa e em verso (o que por si só já exige certa 
especificidade analítica). 
Inicialmente já se exclui o conceito genérico que considera Literatura 
“toda a produção escrita de um povo”. Esse conceito, exilado aqui, aceita ser 
toda produção escrita, abortada a dimensão artística, passível de ser nomeada 
Literatura. Escuta-se então, expressões como Literatura Médica, Literatura 
Jornalística, entre outras. Essa abordagem não adota tal conceito, pois se 
entende, nesse contexto, o texto literário essencialmente artístico, restando 
então investigar e revelar os aspectos que o ligam à arte. 
Muitos teóricos tentaram conceituar a Literatura, traçando limites ou 
elencando características que a definissem. Outros continuarão tentando, mas 
nesse momento não se tem a intenção de definir irrevogavelmente Literatura, e 
sim, encontrar aquela definição que se adapte às análises propostas. 
Teorias literárias mais clássicas apresentam definições, as quais 
afirmam que “A arte literária consiste na realização dos preceitos estéticos da 
invenção, da disposição e da elocução” (TAVARES, 1981, p. 30); ou 
preconizam que a “Arte literária é a arte que cria, pela palavra, uma imitação da 
realidade” (TAVARES, 1981, p. 31). 
Nesse contexto, Tavares (1981), afirma que: 
7 
 
O termo ‘literatura’ é mais uma dessas palavras impossíveis de uma 
conceituação uniforme, tal a polivalência de sentidos com que é 
tomada não só no âmbito restrito das Belas-Artes (com suas 
inúmeras teorias estéticas e escolas), como também nas conversas 
gerais da fala rotineira. (TAVARES, 1981, p. 27). 
 
No que tangem as dificuldades apontadas em relação à conceituação de 
Literatura, Tavares (1981, p. 34) aponta duas eras distintas na teoria da 
literatura (a Clássica e a Moderna), e finaliza suas investigações propondo a 
seguinte conceituação acerca da arte literária: “Arte Literária é a criação de 
uma suprarrealidade pela intuição do artista, mediante a palavra 
expressivamente estilizada”. 
A Literatura também pode conceituar-se a partir da junção harmônica 
entre forma e conteúdo no interior do texto oral ou escrito. Nesse contexto deve 
optar-se por investigar os aspectos que diferenciam o uso da linguagem nessa 
arte, do uso corrente da língua. Entretanto, apesar das tentativas de 
conceituação constata-se que a Teoria da Literatura e a Literatura 
propriamente dita, assumiram contornos diferentes nos diversos momentos 
históricos e sociais pelos quais passaram. Um exemplo claro desse processo 
aconteceu com as obras Realistas/Naturalistas, pois naquele momento os 
conceitos adotados pela estética romântica, tais como individualismo, 
sentimentalismo, subjetivismo, idealização da mulher e do amor, entre outros, 
já não se adequavam a um cenário recheado de cientificismo como o 
desenhado por Conte, Taine e outros pensadores da segunda metade do 
Século XIX. 
Dessa forma, o que acontece é um ajuste nas produções literárias que 
acabam obedecendo a uma dinâmica histórico-social, mudando também as 
bases da teoria e, por conseguinte, da crítica literária. Sendo assim, um 
romance realista poderia não ser considerado literatura se analisado à luz de 
conceitos românticos, movimento literário anterior ao Realismo/Naturalismo. 
Para dar conta dessa diversidade de teorias e desse movimento 
realizado pelas tendências literárias, Souza (2004), em sua Teoria da 
Literatura, apresenta três grupos de correntes estéticas: Correntes 
Textualistas, Correntes Fenomenológicas e Correntes Sociológicas. 
8 
 
De cada um desses grupos, há uma corrente representante para que se 
possa perceber o deslocamento em relação ao foco da análise literária, 
privilegiando-se, contudo, a Corrente Fenomenológica, e mais especificamente 
a Estética da Recepção (essa abordagem privilegiada se deve ao fato de que a 
Estética da Recepção focaliza de maneira predominante o receptor da obra 
literária e,como essa autora considera ele, o receptor, fundamental para a 
construção do significado da obra, torna-se inviável um processo analítico que 
desconsidere esse receptor). 
 
1.1 Correntes de Análise Literária: Textualistas, Fenomenológicas e 
Sociológicas 
Nas Correntes Textualistas, observa-se que o foco primeiro de análise é 
o texto, e o Formalismo Eslavo representa claramente essa preferência. 
A primeira possibilidade apontada pelos formalistas em relação à 
linguagem é, portanto, o “estranhamento” gerado por essa linguagem que se 
desvia do “padrão” linguístico. 
Os formalistas eslavos, também chamados russos, representam um 
grupo expressivo na teoria literária do começo do Século XX. Eagleton (1997), 
afirma que “[...] a literatura não era uma pseudo-religião, ou psicologia, ou 
sociologia, mas uma organização particular da linguagem”. (EAGLETON, 1997, 
p.3). 
Essencialmente, os formalistas aplicaram conceitos linguísticos ao 
estudo de literatura, fundamentando suas investigações nas estruturas da 
linguagem, deixando em segundo plano (quase à margem dos estudos) o 
sentimento, a emoção, o conteúdo do texto. 
Eagleton (1997), resume a técnica formalista da seguinte forma: 
Os ‘artifícios’ incluíam som, imagens, ritmo, sintaxe, métrica, rima, 
técnicas narrativas; na verdade, incluíam todo o estoque de 
elementos literários formais; e o que todos esses elementos tinham 
em comum era o seu efeito de ‘estranhamento’ ou de 
‘desfamiliarização’. (EAGLETON, 1997, p.4-5). 
 
9 
 
Todos esses recursos privilegiados pelos formalistas russos apontavam 
para efeitos criados pela forma, pois esses teóricos acreditavam que a 
linguagem literária era uma violência linguística caracterizada por um desvio da 
norma corrente, assim a Literatura seria uma forma estilizada da linguagem 
usual, cotidiana, da norma-padrão, ainda que a conceituação referente ao que 
se considera ‘norma-padrão’ seja relativa e discutível a ponto de ameaçar a 
teoria dos russos. 
Ceia (S/d.), descreve o Formalismo Russo, como: 
Corrente de crítica literária que se desenvolveu na Rússia a partir de 
1914, sendo interrompida bruscamente em 1930, por decisão política. 
O nome do movimento foi objeto de discussão e, muitas vezes, se 
disse que era inadequado. Nos textos introdutórios da tradução 
portuguesa (de Iasbel Pascoal) da coletânea de textos dos 
formalistas russos, preparada por Tzvetan Todorov, quer Roman 
Jakobson quer o próprio Todorov começam por chamar à designação 
formalismo uma espécie de falácia ou termo pejorativo, criado pelos 
opositores desta teoria. Citando Jakobson, o formalismo, que foi “uma 
etiqueta vaga e desconcertante que os detratores lançaram para 
estigmatizar toda a análise da função poética da linguagem, criou a 
miragem de um dogma uniforme e consumado.” (Todorov, 1999, 
p.12). O Círculo Linguístico de Moscovo foi fundado por alguns 
estudantes da Universidade de Moscovo, no inverno de 1914-1915, 
com o propósito de promover estudos de poética e de linguística, 
afastando-se assim da linguística tradicional e aproveitando a 
renovação da poesia russa que os poetas da época haviam iniciado. 
Este Círculo veio a receber oportuna colaboração da Sociedade de 
Estudos da Linguagem Poética (sigla russa: OPOIAZ), a partir de 
1917. A primeira publicação do grupo, A Ressurreição da Palavra 
(1914), de Viktor Skhlovski, foi seguida da coletânea Poética, que 
havia de divulgar os primeiros trabalhos do grupo. (CEIA, S/d.). 
 
No grupo de Correntes Fenomenológicas, a Hermenêutica, segundo 
Souza (1990, p. 58) postula que “[...] o fenômeno literário é conatural a sua 
teoria, razão por que é necessariamente poética a reflexão acerca do poético”. 
Essa definição acaba deslocando o foco para o “fazer poético”, ou seja, 
dinâmica da criação literária. Nesse deslocamento do texto, foco do 
Formalismo Russo, para a reflexão acerca do poético, a Hermenêutica, que 
originalmente se refere à interpretação das escrituras sagradas, deita seu foco 
de análise na interpretação da obra e mais especificamente no sentido que o 
autor quis dar a essa obra, como se quisesse salvá-la das significações 
atribuídas pelos leitores. 
 
10 
 
Moyers (2016), comenta: 
O americano E. D. Hirsch Jr. afirma que as diferentes interpretações 
podem existir, mas segundo Eagleton (1997, p 92) isso “é antes uma 
questão da significação da obra do que do seu sentido”. 
Nessa perspectiva, a obra literária pode adquirir diferentes 
significações a medida em que o tempo e as sociedades se sucedem, 
mas o sentido original dado a ela pelo escritor permanece intacto. 
Hirsch afirma ainda, segundo Eagleton (1997, p. 93) que “o sentido é 
algo que o autor quer; é um ato mental, espiritual, que é então ‘fixado’ 
para todo o sempre através de uma série particular de sinais 
materiais”. (MOYERS, 2016, p. 129). 
 
Percebe-se, portanto que, a exemplo da interpretação das escrituras 
sagradas, a Hermenêutica tenta, com seu círculo hermenêutico, preservar o 
sentido supostamente original que o autor concebeu à obra das significações 
anárquicas atribuídas pelos leitores, pelas sociedades. 
A partir dessa ideia percebe-se a diferença entre uma abordagem 
embasada teoricamente na Hermenêutica, centrada no fazer artístico e no 
sentido que o autor destinou a sua obra e uma abordagem ancorada na Teoria 
da Recepção, centrada nas significações atribuídas pelo leitor, sobre a qual 
segue a discussão. 
Rezende (2014), reforça que: 
A Fenomenologia trata dos fenômenos perceptíveis, extinguindo a 
separação entre o sujeito e o objeto. Essa filosofia surgiu no século 
XIX, a partir dos estudo de Franz Brentano e teve em sua corrente de 
estudos os filósofos Edmund Husserl, Martin Heidegger, Jean-Paul 
Sartre e Merleau-Ponty. (REZENDE, 2014). 
 
Dessa maneira, a hermenêutica fenomenológica poderá fornecer certa 
estrutura analítica sobre a natureza dos atos da interpretação e da 
compreensão, de modo a jogar luz sobre o processo de pesquisa, contudo sem 
fornecer um conjunto de regras ou procedimentos rígidos na realização do 
programa de pesquisa. A hermenêutica fenomenológica faz o oposto, gerando 
ou ampliando os espaços de engajamento entre o objeto de pesquisa e o 
pesquisador (MARKUS, 1987; WACHTERHAUSER, 1994). 
É oposta ao positivismo, analisando a realidade no ponto de vista 
individual. Tudo que se apresenta à consciência ocorre como um objeto 
intencional. O objetivo do método fenomenológico é alcançar a intuição das 
11 
 
essências. Busca interpretar o mundo através da consciência de um 
determinado sujeito, segundo as suas experiências. 
No grupo das Correntes Sociológicas, além das evidentes preocupações 
sociológicas, encontram-se também preocupações de cunho ético e político. 
Desse grupo, destaca-se a Estética da Recepção que, segundo Souza (1990, 
p.60) “pretende valorizar um elemento pouco considerado pela teoria da 
literatura: o leitor ou receptor do texto.” 
Para a Teoria da Recepção (EAGLETON, 1997, p.105) “[...] qualquer 
obra, por mais sólida que pareça, compõe-se na realidade de ‘hiatos’”. Esses 
hiatos podem ser entendidos como lacunas criadas pela própria dinâmica 
narrativa do autor, determinado por seu estilo, que opta por construções, 
expressões ou mesmo palavras que precisam da participação efetiva do leitor 
para concretizar sua significação. 
Esse movimento estético, desenvolvido pela Escola de Constança, tem 
em Hans Robert Jauss um de seus mais expressivos representantes. Segundo 
Tadié (1992, p. 189), Jauss acreditava que “a obra ‘engloba ao mesmo tempo o 
texto como estrutura dada e sua recepção ou percepção por parte do leitor ou 
espectador’”. Em consequência disso, o sentido da obra dependeria tambémdo contexto histórico e social no qual acontece a recepção dessa obra pelo 
leitor. Nesse contexto, “a ação, o efeito” são diferentes da recepção do texto. 
Portanto, o efeito pode ser verificado com a análise desse texto, mas a 
recepção seria mutável, tendo em vista um sujeito receptor que associa aos 
índices textuais uma impressão criada a partir das experiências sociais e 
históricas das quais compartilha e nas quais está inserido. 
Nessa perspectiva, é possível construir um encadeamento de recepções 
de uma mesma obra, que se transformam e adquirem relevância ou não, a 
partir dessas diferentes recepções. Ou seja, um romance que tenha sido 
escrito no século XVIII e, naquele momento considerado irrelevante, pode 
adquirir destaque à luz de um novo contexto histórico-social. 
Não são poucos os exemplos de obras que precisaram atravessar 
décadas ou séculos para conseguirem uma recepção que realmente efetivasse 
sua existência. Segundo Tadié (1992, p. 191), para Jauss “determinados livros 
12 
 
constituem muito lentamente, muito tardiamente, seu público”, e para entender 
melhor a formação tardia desse público pode-se considerar dois movimentos 
relevantes entre obra e público, ou seja, a comunicação e o movimento 
dialético. 
Assumindo que a recepção de uma obra pressupõe um movimento 
inicial de comunicação, pode-se imaginar uma dinâmica comunicativa entre o 
emissor (neste caso, o livro) e o receptor (o leitor) que dispõe de outros 
elementos, tais como o contexto, o canal, o código e a mensagem. 
Essa dinâmica, sabidamente, não se efetiva caso o receptor não 
compreenda, por exemplo, o código utilizado. Porém, além da possibilidade de 
falha na comunicação, pode acontecer também uma comunicação 
diferenciada, “contaminada” por fatores externos como o já citado contexto. 
Para a Estética da Recepção não acontece apenas um movimento 
comunicativo entre livro e leitor, mas sim uma dinâmica dialética que recria, 
atualiza a obra a cada nova leitura. A esse respeito Gustave Lanson (TADIÉ, 
1992, p.192) afirma: 
Esse sentido permanente e comum, quando se tratar de textos 
famosos que todas as gerações de críticos e de leitores manusearam, 
talvez possa parecer um pouco violento e banal: todavia será bom 
não deixar de a isso retornar e ligar todas as variações matizadas 
com que o enriqueceram as diversas épocas e os espíritos. Será 
conveniente partir daí para ir em busca do sentido original, do sentido 
do autor e, depois, do sentido do público primeiro e dos sentidos de 
todos os públicos, franceses e estrangeiros, que o livro encontrou 
sucessivamente. A história de cada obra-prima contém, resumida, 
uma história do gosto e da sensibilidade da nação que a produziu e 
das nações que a adotaram. (Estudos franceses, 1/1/1925). 
 
Outro grande teórico da Escola de Constança, na Alemanha, é Wolfgang 
Iser, cuja Estética da Recepção sofreu grande influência da Hermenêutica de 
Gadamer. 
A relação texto-leitor, nesse teórico, é pontuada por uma condição, ou 
seja, o leitor deve estar aberto a modificações que o texto produza nele, 
precisando, por conseguinte, “não” ter convicções ideológicas muito rígidas e 
sim flexíveis e mutáveis para poder transformar-se com o texto. 
Segundo Eagleton (1997, p. 109) “A teoria da recepção de Iser baseia-
se, de fato, em uma ideologia liberal humanista: na convicção de que na leitura 
13 
 
devemos ser flexíveis e ter a mente aberta, preparados para questionar nossas 
crenças e deixar que sejam modificadas.” 
Essa recepção não é totalmente liberal, pois mesmo reconhecendo o 
papel do leitor nessa relação, Iser propõe uma normatização que resguarde 
sua teoria de uma avalanche de interpretações, determinando o leitor 
acadêmico como leitor adequado às obras literárias. 
Roland Barthes, crítico francês, adepto da teoria da recepção, diferente 
de Iser, que localiza suas análises em textos realistas, prefere textos 
modernos, e para eles propõe uma leitura que, segundo Eagleton (1997, p. 
114), “detona a identidade cultural segura do leitor, numa jouissance que, para 
Barthes, é ao mesmo tempo uma benção da leitura e um orgasmo sexual”. 
Vocabulário 
A palavra arcaica anglo-francesa jouissance, retomada e 
ampliada por Jacques Lacan no seminário sobre "Deus e a 
jouissance de A mulher", sugere traduções interpretativas 
tão subtis como "orgasmo", "gozo", "fruição" "prazer", 
"satisfação", "posse", "apetite" ou "desejo". Em português, o 
termo tem sido traduzido por "gozo", no entanto, tal tradução 
carece de uma mais precisa definição: "Gozo" (do espanhol 
goce, que, por sua vez deriva do latim gaudium para "júbilo, 
fruição"), ao equivaler-se a jouissance terá de traduzir gosto, 
prazer; posse ou uso de alguma coisa de que advêm 
satisfação, vantagens, interesses; deleite sexual, prazer, 
orgasmo. 
Fonte: 
http://www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&task=vi
ewlink&link_id=98&Itemid=2 
 
A grande diferença entre Iser e Barthes está na normatização proposta 
por Iser durante a relação entre o leitor e o livro e a proposta anárquica e 
hedonista proposta por Barthes. 
Ainda dentro da discussão acerca do papel/colaboração do leitor na 
construção do significado da obra, existem teóricos como o americano Stanley 
Fish que afirmam uma participação intensa e irrestrita do leitor. Para Fish 
(EAGLETON, 1997, p.117) “O verdadeiro escritor é o leitor”. 
14 
 
Todavia, assim como Iser, Fish também recorre à certa normatização 
para evitar um número exagerado de interpretações que uma abordagem muito 
maleável, como a teoria de Barthes e seu hedonismo literário, parece permitir. 
Essa normatização teórica de Fish prevê um leitor “informado ou familiarizado” 
(EAGLETON, 1997, p.118), fato que diminuiria a grande divergência de 
interpretações da obra. 
A despeito das variantes entre as teorias da recepção de Jauss, Iser, 
Barthes e Fish, o leitor é, finalmente, o foco da Estética da Recepção, na 
medida em que se reconhece sua existência e sua relação com a obra literária 
ancoradas em momentos históricos e sociedades diferentes, que por sua vez 
oferecem à narrativa literária, contribuições culturais e particulares que 
determinam suas diferentes significações. 
 Lima (2004), comenta à respeito das conquistas da Estética da 
Recepção: 
Nas universidades da Alemanha do final dos anos 1950, o ensino da 
literatura se prestava aos interesses comuns de preservação dos 
valores sociais arraigados, e qualquer tipo de atitude considerada 
subversiva poderia ser banida. Nesse contexto, a Estética da 
Recepção veio trazer uma nova perspectiva aos estudos 
literários e iniciar um processo de renovação, tornando 
relevantes aspectos antes desconsiderados nos textos. 
 
Naquele tempo, o objetivo final de qualquer leitura sensata deveria 
ser a descoberta do sentido do texto, dos seus recursos estruturais, 
da? mensagem? que a obra queria transmitir, ou daquilo que se 
pensava ser a intenção do autor. Em última instância, diante de 
controvérsias, a interpretação indiscutível do professor determinava 
qual era essa intenção ou qual o sentido aceitável. 
 
Desconsiderava-se que a interpretação do professor também 
estava condicionada a sua formação, que poderia ser de linha 
formalista ou estruturalista, ou estar vinculada a correntes 
psicológicas ou sociológicas. Esse dado permanecia irrelevante, 
pois, mesmo que as diversas tendências interpretativas se 
digladiassem em discussões intermináveis (o que ficou conhecido 
como a? querela das interpretações?), nenhuma delas levava em 
conta o papel que o leitor poderia ter no processo da leitura. 
 
Mas, ainda que o ambiente universitário permanecesse conservador, 
há décadas, a arte moderna integrava o contexto cultural europeue, 
com ela, antigos padrões formais e temáticos foram rompidos e novas 
questões teóricas surgiram. Além disso, depois da II Guerra Mundial, 
a Alemanha viu-se dominada por uma onda de contestação 
ideológica nas universidades, e até mesmo o ensino da literatura teve 
sua validade questionada. 
 
É neste momento conturbado que se manifesta, na Alemanha, a 
chamada Escola de Constança, constituindo-se na primeira tentativa 
de deslocar o foco dos estudos para a relação texto-leitor, numa 
atitude de renovação condizente com o espírito da época. Depois 
15 
 
disso, os estudos passaram a se dividir em duas categorias distintas: 
a dos que se interessam pelo ato individual da leitura (Teoria do efeito 
estético), representada por pesquisadores como Wolfgang Iser e, 
posteriormente, Umberto Eco; e a daqueles cujo interesse se volta à 
resposta coletiva e de época histórica ao texto (Estética da 
Recepção), como Hans Robert Jauss. 
 
Muitas foram as contribuições trazidas por esses estudos, dentre elas 
ideias hoje firmemente estabelecidas na área dos estudos literários, 
inclusive no âmbito escolar. Ultrapassou-se a concepção de obra 
como uma unidade autosuficiente, um sistema fechado de existência 
independente do leitor. Na análise da recepção, o texto é considerado 
um estímulo, realizando-se apenas no ato da leitura. Nas palavras de 
Umberto Eco:? o texto é uma máquina preguiçosa que precisa do 
leitor para funcionar?. 
 
E diversas são as implicações que podem surgir a partir disso. 
Imediatamente, conclui-se que o papel desse leitor deve ir muito além 
do ato de decifrar o código verbal e compreender as informações, 
numa atitude meramente descritiva. Novas questões se apresentam: 
Como o leitor chega ao sentido do texto? Esse sentido é o mesmo 
para pessoas de diferente formação enquanto leitor? Em que medida 
o texto pode regular a constituição dos sentidos, e se as normas e 
valores individuais têm influência nesse processo? 
 
A Teoria da Recepção considera o sentido um efeito experimentado 
pelo leitor, não um objeto rigidamente predeterminado pelo autor. Isto 
é, o objeto literário realiza-se na interação com um interlocutor, na 
medida em que este reage aos estímulos do texto, construindo 
sentidos, estabelecendo conexões, misturando o seu universo ao 
universo textual. E, para que esta ideia não leve à aceitação de um 
verdadeiro caos interpretativo, o texto passa a ser considerado um 
esquema virtual capaz de instruir a sua leitura desejada. Assim, há 
um tipo de leitor solicitado pela obra, com habilidades e competências 
adequadas para que este esquema funcione. A leitura é, portanto, 
uma atividade que pode se realizar em vários níveis e, para que seja 
cada vez mais eficiente, é preciso que o leitor seja submetido a 
esquemas de textos gradualmente mais complexos, que o levem a 
ampliar suas habilidades. Essa ideia, particularmente, tem motivado 
reflexões úteis ao ensino da leitura nas escolas. Principalmente, ao 
trabalho de formação de leitores, considerado hoje uma das principais 
preocupações dos docentes e dos projetos pedagógicos. [grifos 
nossos] (LIMA, 2004). 
 
1.2 A análise literária e seus elementos relevantes 
Para se construir uma análise literária é preciso traçar alguns caminhos, 
escolhendo quais elementos serão analisados e qual será a abordagem 
assumida. 
 Quanto à perspectiva e à abordagem, esse texto já apontou algumas 
tendências da análise literária que pode ajudar o crítico a escolher seu 
caminho, mas é preciso também traçar um roteiro de análise, ou seja, quais 
elementos da obra serão analisados. Alguns desses elementos são essenciais, 
pois determinam a própria natureza da obra. Assim, ao analisar-se um texto 
16 
 
narrativo, em algum momento abordará naturalmente os elementos que 
constituem uma narrativa. 
 É preciso ressaltar que, quando se fala em roteiro, de maneira alguma, 
falamos em receitas prontas ou roteiros fixos até porque a percepção do 
analista é fundamental para a construção da análise, e aqui cabem suas 
leituras e seus saberes acerca da obra e dos links que essa obra apresenta. 
 Os roteiros de análise literária devem ser flexíveis e adaptáveis à obra 
analisada, pois, em se tratando de arte, cada uma é especial e específica. 
 
1.3 Roteiro de análise literária: uma sugestão para textos em prosa 
 Antes de propor a construção de um roteiro de análise literária é preciso 
conhecer muito bem o objeto de análise e uma das primeiras informações deve 
ser a respeito do gênero literário ao qual a obra pertence. 
 Esse elemento é relevante porque determina os demais elementos que 
podem ser analisados e/ou privilegiados durante a análise. 
 Os gêneros literários em prosa mais conhecidos são o romance, o 
conto, a novela e a crônica. E o poema figura soberano, nos textos em verso, 
distribuídos em diversas formas, tais como o soneto, a epopeia, a ode, entre 
outras. 
 Sugere-se para a análise de um texto em prosa o seguinte roteiro: 
 Gênero literário ao qual pertence; 
 Identificação: autor e obra; 
 Pesquisa: breve (muito breve) biografia do autor; 
 Estrutura narrativa da obra: de que maneira a história é 
contada? A obra é dividida em capítulos? Longos ou curtos? O 
autor utiliza outro tipo de organização para contar a história? 
Qual? 
 Enredo: qual a sequência de fatos contada? 
 
 
17 
 
Importante 
Faz-se importante observar a Introdução, ou seja, o momento 
no qual são apresentados os fatos iniciais e no qual o leitor é 
situado diante da história. 
Observando-se também a Complicação, pois é nessa parte da 
história que se desenvolvem os conflitos. “Quais são os 
aspectos relevantes neste momento?” 
O Clímax é o momento culminante da história, em que a 
tensão, o suspense ou a emoção são mais marcantes. 
Investigue e aponte de que maneira o escritor construiu essa 
situação. 
O Desfecho é o último estágio do enredo e é nele que a 
solução do conflito é apresentada. Dentre outros aspectos, a 
coerência ou não do conflito. 
 
 Na interpretação faz-se importante a leitura identificativa, das quais 
deve-se analisar os seguintes elementos: 
 Narrador: Ao identificarmos o narrador, identificamos também o 
ponto de vista ou foco narrativo, isto é, podemos verificar se o 
narrador conta a sua própria história (1ª pessoa) ou conta à 
história de outras pessoas (3ª pessoa). É sempre importante 
analisar o tom, o intimismo ou não do narrador e associá-lo ao 
ponto de vista escolhido para a narração. 
 Personagem: ser que vive a ação, responsável pelos 
acontecimentos da história. É importante caracterizar o 
personagem, relacionando sua conduta com possíveis fatos e 
influências da situação apresentada. Esses personagens podem 
ser Principais (os mais importante no desenrolar do enredo), ou 
Secundárias (personagem que tem uma participação menor ou 
menos frequente). 
 Espaço: O “Espaço” pode ser apenas o lugar onde se passam 
as ações das personagens, ou pode ser o “Ambiente”, espaço 
com características sociais, econômicas, morais, psicológicas 
em que vivem as personagens. 
18 
 
 Tempo: determinado pelos índices que o enredo apresenta. O 
tempo pode ser caracterizado quanto à: “Duração” (tempo que a 
história levou a ocorrer) e/ou “Época” (pano de fundo da 
história). Quando a época é atual, basta justificar com elementos 
da atualidade; quando a época é antiga, pode-se e deve-se 
procurar uma correspondência com fatos históricos. 
 
Outros elementos que devem ser observados em uma análise 
literária são as constantes e recorrentes. 
 
 
O estilo de um escritor é identificado, entre outros elementos, pelas 
constantes e recorrentes que encontramos em seu texto. Ou seja, marcas 
linguísticas,ideias, símbolos, posturas que se repetem e que podem se tornar 
constantes em sua obra. 
Esses aspectos constantes e recorrentes também podem estar 
relacionados à estrutura da obra, à caracterização dos personagens, ao 
espaço, enfim, relacionados a todos os elementos constitutivos de um texto 
literário. 
Além das constantes e recorrentes também pode-se analisar as ideias e 
concepções de um texto. Nesse contexto a linguagem não é neutra, embora 
muitas vezes busque-se essa neutralidade, principalmente em textos 
científicos. Por esse motivo, à medida que o escritor constrói seu texto ele 
deixa indícios, pistas sobre suas ideias e concepções morais, éticas, filosóficas, 
religiosas, políticas, entre outras. Isso não implica dizer que as concepções do 
narrador ou das personagens possam ser confundidas com as do escritor, pois 
é necessário diferenciar esses elementos na obra literária. 
Todavia, a abordagem de determinado tema pode (e geralmente o faz) 
apresentar não só as concepções do escritor, mas também de uma geração 
inteira, de uma tendência social, literária, religiosa, enfim, das ideias de um 
período histórico-social no qual o escritor está inserido. Sendo assim, é 
19 
 
importante responder, durante a análise algumas perguntas, tais como: “De 
que forma o autor trata a temática desenvolvida na obra?” Se pensarmos na 
ideia recorrente, mas nem por isso ultrapassada da temática amorosa, veremos 
que ela foi abordada inúmeras vezes e de maneira diferentes. 
Umas vezes, de maneira etérea, quase santificada, como é o caso das 
idealizações dos românticos; e outras de maneira lasciva, como a abordagem 
feita pelos naturalistas. 
Para ilustrar essa diferença, segue um trecho do romance A Viuvinha, de 
José de Alencar e do romance O Cortiço, de Aluísio Azevedo. 
A Viuvinha 
[...] 
Ao cair da tarde, havia de descobrir na última das janelas o vulto gracioso de 
uma menina que aí se conservava imóvel até seis horas, e que, retirando-se 
ligeiramente, vinha pela portinha do jardim encontrar-se com um moço que 
subia a ladeira, e oferecer-lhe modestamente a fronte, onde ele pousava um 
beijo de amor tão casto que parecia antes um beijo de pai. 
Depois, com as mãos entrelaçadas, iam ambos sentar-se a um canto do 
jardim, onde a sombra era mais espessa, e aí conversavam baixinho um 
tempo esquecido; ouvia-se apenas o doce murmúrio das vozes, interrompidas 
por esses momentos de silêncio em que a alma emudece, por não achar no 
vocábulo humano outra linguagem que melhor a exprima. 
[...] 
 (ALENCAR, 1997) 
 
O Cortiço 
[...] 
Naquela mulata estava o grande mistério, a síntese das impressões que ele 
recebeu chegando aqui: [...] ela era a cobra verde e traiçoeira, a lagarta 
viscosa, a muriçoca doida, que esvoaçava havia muito tempo em torno do 
corpo dele, assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe as fibras 
embambecidas pela saudade da terra, picando-lhe as artérias, para lhe cuspir 
dentro do sangue uma centelha daquele amor setentrional, uma nota daquela 
música feita de gemidos de prazer, uma larva daquela nuvem de cantáridas 
que zumbiam em torno de Rita Baiana e espalhavam-se pelo ar numa 
fosforescência afrodisíaca. [...] (O cortiço, Cap. VII, p.68). 
 (AZEVEDO, 2001) 
 
20 
 
 É facilmente notado pelos trechos apresentados que o amor é abordado 
de maneiras postas em momentos históricos não tão distantes. Mas não é só a 
abordagem que muda, a própria escolha dos temas também se modifica de 
acordo com a tendência literária. 
Em alguns momentos, a arte literária foi elitista e abordava questões 
alheias aos acontecimentos sociais, como é o caso dos poemas parnasianos; 
outras vezes, a obra literária assumiu ares de instrumento de denúncia social, 
como é o caso do poema Navio negreiro, de Castro Alves, ainda durante o 
Romantismo. Enfim, durante a análise literária é fundamental reconhecer as 
ideias e concepções implícitas ou não na obra. 
 
1.4 Roteiro de análise literária: uma sugestão para textos em verso 
 A análise de textos em verso requer outra abordagem, determinada 
exatamente pela natureza diferente do gênero textual. 
 Algumas diferenças são marcantes. Na análise de um texto narrativo em 
prosa procuramos o narrador, no poema procuraremos o eu lírico e sua postura 
diante do tema; se no texto narrativo em prosa procuramos a estrutura 
narrativa, buscando capítulos ou marcações similares, no poema, 
procuraremos a organização das estrofes, dos versos, enfim, procuraremos 
analisar elementos inerentes ao poema. 
 Para tanto, faz-se importante a aplicabilidade de algumas perguntas, as 
quais podem compor um roteiro de análise literária para poemas, sendo elas: 
 Em qual escola literária o poema se insere? 
 Quais características dessa escola podem ser observadas no 
poema? 
 Há alguma influência de outra tendência literária? Qual delas é 
mais evidente? (exemplificar com trechos do poema). 
 O poema é descritivo, narrativo ou dissertativo? 
 Qual é a postura do eu lírico dentro do poema? 
 Qual a temática abordada? De que maneira o poeta aborda 
essa temática? 
21 
 
 Quanto à linguagem, como podemos classificar a sintaxe e o 
vocabulário? 
 Quanto à forma, analise a métrica, o ritmo e o esquema de 
rimas do poema. 
 Conclua a análise destacando os pontos mais marcantes do 
poema. 
 É importante lembrar novamente que apresentamos uma sugestão de 
roteiro e que ele deve ser adaptado à obra que será analisada, pois cada uma 
delas possui elementos característicos e específicos que merecem ser 
analisados de maneira particular. 
 
Resumo da aula 1 
 Nesta aula abordaram-se os conceitos básicos da análise literária, 
ressaltando os seus aspectos e tendências. Com base nesses teóricos 
efetuaram-se análises textuais. 
Atividade de Aprendizagem 
Analise os textos abaixo, atribuindo um perfil adequado a 
cada um dos roteiros, discorra a respeito da elaboração de 
seus roteiros. Texto 1 (Um beijo, de Olavo Bilac); Texto 2 
(Músculos e Nervos, de Aluísio Azevedo). 
 
Texto 1 – Um Beijo 
Foste o beijo melhor da minha vida, 
Ou talvez o pior...Glória e tormento, 
Contigo à luz subi do firmamento, 
Contigo fui pela infernal descida! 
 
Morreste, e o meu desejo não te olvida: 
Queimas-me o sangue, enches-me o pensamento, 
E do teu gosto amargo me alimento, 
E rolo-te na boca malferida. 
 
Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo, 
Batismo e extrema-unção, naquele instante 
Por que, feliz, eu não morri contigo? 
 
Sinto-te o ardor, e o crepitar te escuto, 
Beijo divino! e anseio, delirante, 
Na perpétua saudade de um minuto... 
 (BILAC, 1996) 
22 
 
 
Texto 2 - Músculos e Nervos 
Terminava a primeira parte do espetáculo, quando D. Olímpia 
entrou no circo, pelo braço do pai. 
Havia grande enchente. O público vibrava ainda sob a 
impressão do último trabalho exibido, que devia ter sido 
maravilhoso, porque o entusiasmo explodia por toda a plateia 
e de todos os lados gritavam ferozmente: “Scot! À cena Scot!” 
Dois sujeitos de libré azul com alamares dourados conduziam 
para o interior do teatro um cavalo que acabava de servir. 
Muitos espectadores, de chapéu no alto da cabeça, estavam 
de pé e batiam com a bengala nas costas das cadeiras; as 
cocotes pareciam loucas e soltavam guinchos, que ninguém 
entendia; das galerias trovejava um barulho infernal, e, por 
entre aquela descarga atroadora, só o nome do idolatrado 
acrobata sobressaía, exclamado com delíriopor mil vozes. 
- Scot! Scot! 
Olímpia sentiu-se aturdida; o pai, no íntimo, arrependia-se de 
lhe ter feito a vontade, consentindo em levá-la ao circo, mas o 
médico recomendara tanto que não a contrariassem… e ela 
havia mostrado tanto empenho no capricho de ir aquela noite 
ao Politeama… 
De repente, um grito uníssono partiu da multidão. Estalaram 
as palmas com mais ímpetos; choveram chapéus; 
arremessaram-se leques e ramalhetes, Scot havia 
reaparecido. 
- Bravo! Bravo, Scot! 
E os aplausos recrudesceram ainda. 
O ginasta, que entrara de carreira, parou em meio da arena, 
aprumou o corpo, sacudiu a cabeleira anelada, e, voltando-se 
para a direita e para a esquerda, atirava beijos, sorrindo, no 
meio daquela tempestade gloriosa. 
Depois de agradecer, estalou graciosamente os dedos e 
retirou-se de costas, a dar cambalhotas no ar. 
Desencadeou-se de novo a fúria dos seus admiradores, e ele 
teve de voltar à cena ainda uma vez, mais outra, cada vez 
mais triunfante. 
Olímpia, entretanto, com a cabeça pendida para a frente, o 
olhar fito, os lábios entreabertos, dir-se-ia hipnotizada, tal era 
a sua imobilidade. O pai tentou chamá-la à conversa; ela 
respondeu por monossílabos. 
- Queres… vamos embora. 
- Não. 
Na segunda parte do espetáculo, a moça parecia divertir-se. 
Não despregava a vista de Scot, a quem cabia a melhor parte 
dos trabalhos da noite. 
O mais famoso era a sorte dos voos. Consistia em 
dependurar-se ele de um trapézio muito alto, deixar-se 
arrebatar pelo espaço e, em meio do trajeto, soltar as mãos, 
dar uma cambalhota e ir agarrar-se a um outro trapézio que o 
23 
 
esperava do lado oposto. 
Cada um destes saltos levantava sempre uma explosão de 
bravos. 
Scot havia feito já; por duas vezes, o seu voo arriscado; 
faltava-lhe o último e o mais perigoso. Diferençava este dos 
primeiros em que o acrobata, em vez de lançar-se de frente, 
tinha de ir de costas e voltar-se no ar, para alcançar o trapézio 
fronteiro. 
O público palpitava ansioso, até que Scot afinal assomou no 
alto trampolim armado nas torrinhas, junto ao teto. 
Cavou-se logo um fundo silêncio nos espectadores. Os 
corações batiam com sobressalto; todos os olhos estavam 
cravados na esbelta figura do artista, que, lá muito em cima, 
parecia, nas suas roupas justas de meia, a estátua de uma 
divindade olímpica. Destacava-se-lhe bem o largo peito, 
hercúleo, guardado pelos grossos braços nus, em contraste 
com os rins estreitos, mais estreitos que as suas nervosas 
coxas, cujos músculos de aço se encapelavam ao menor 
movimento do corpo. 
Com uma das mãos ele segurava o trapézio, enquanto com a 
outra limpava o suor da testa. Depois, tranquilamente, sem o 
menor abalo, prendeu o lenço à sua cinta bordada e de 
lantejoulas e deu volta ao corpo. 
Ouvia-se a respiração ofegante do público. 
Scot sacudiu o braço do trapézio, experimentando-o, puxou-o 
afinal contra o colo e deixou-se arrebatar de costas. 
Em meio do circo desprendeu-se, gritou: “Hop!” deu uma volta 
no ar e lançou-se de braços estendidos para o outro trapézio. 
Mas, o voo fora mal calculado, e o acrobata não encontrou 
onde agarrar-se. 
Um terrível bramido, como de cem tigres a que rasgassem a 
um só tempo o coração, ecoou por todo o teatro. Viu-se a bela 
figura de Scot, um instante solta no espaço, virar para baixo a 
cabeça e cair na arena, estatelada, com as pernas abertas. 
O recinto do circo encheu-se logo. Nos camarotes mulheres 
desmaiaram, em gritos; algumas pessoas fugiam espavoridas, 
como se houvesse um incêndio; outras jaziam pálidas, a boca 
aberta e a voz gelada na garganta. Ninguém mais se 
entendia; nas torrinhas passavam uns por cima dos outros, 
numa avidez aterrada, disputando ver se conseguiam 
distinguir o acrobata. 
Este, todavia, sem acordo e quase sem vida, agonizava por 
terra, a vomitar sangue. 
Olímpia, lívida, trêmula, estonteada, quando deu por si, 
achou-se, sem saber como, ao lado do moribundo. Ajoelhou-
se no chão, tomou-lhe a cabeça no regaço, e vergou-se toda 
sobre ele, procurando sentir nas faces frias o derradeiro calor 
daquele belo corpo escultural e másculo. E, desatinada, 
ofegante, apalpava-lhe o peito, o rosto, a brônzea carne dos 
braços, e, com um grito de extrema agonia, molhava a boca 
24 
 
no sangue que ele expelia pela boca. 
Scot teve um estremecimento geral de corpo, contraiu-se, 
vergou a cabeça para trás, volveu para a moça os seus 
límpidos olhos comovidos, agora turvados pela morte, soltou o 
gemido derradeiro. 
E o corpo do acrobata escapou das mãos finas de Olímpia, 
inanimado. 
 (AZEVEDO, 1893) 
 
Aula 2 – Análise de textos Realistas e Naturalistas 
Apresentação da aula 2 
 Nesta aula foram analisados obras Realistas e Naturalistas, 
evidenciando as características dos principais autores. 
 
2. Análise de textos Realistas e Naturalistas 
No período do surgimento do Realismo e do Naturalismo, foi um período 
fértil para o desenvolvimento dos textos literários em prosa, notadamente, o 
Romance. Embora não tenha sido o berço do Romance, como se afigurou o 
Romantismo, as Escolas Realista e Naturalista deixaram para a Literatura 
Brasileira, obras que marcaram um período em que a arte atuou de maneira 
engajada e crítica em relação à sociedade e suas contradições. 
Machado de Assis, Aluísio Azevedo, Raul Pompeia, entre outros, 
construíram um acervo que retrata o Brasil e seus costumes de maneira crua e 
verdadeira. 
 
2.1 Realismo 
Corrêa (S/d), quanto ao Realismo evidencia que: 
Na França, o nome “Realismo” apareceu pela primeira vez em 1826, 
quando a revista literária Mercure de France publicou o seguinte 
texto: Esta doutrina literária que a cada dia ganha terreno e que 
conduzirá à fiel imitação não das obras-primas da arte, mas dos 
originais oferecidos pela natureza, poderia, com muita propriedade, 
ser chamada realismo. Ao que parece, ela será a literatura do século 
XIX, a literatura da verdade (apud WELLEK, 1972, p. 1). A partir de 
então, o termo “realismo” começa a ser empregado no contexto 
literário por romancistas e críticos franceses. Em 1833, Gustave 
Planche, ao tecer comentários sobre o “realismo” na obra de George 
25 
 
Crabbe, empregou o termo para analisar o rigor do romancista na 
composição dos quadros descritivos de seus romances. Hippolyte 
Fortoul, em 1834, criticou um romance escrito “com exagero de 
realismo, à maneira de Victor Hugo” (apud WELLEK, 1972, p. 1). 
Nessa época, realismo nomeava um traço característico de escritores 
hoje classificados como românticos. Só um pouco mais tarde passou 
a corresponder à descrição de costumes contemporâneos. Em 1846, 
Hippolyte Castille inovou, ao relacionar Balzac à escola realista (apud 
WELLEK, 1972, p. 2). (CORRÊA, S/d. p.3045-3046). 
 
O Realismo iniciou-se na França, em 1857, com a publicação de 
Madame Bovary, de Gustave Flaubert, no Brasil iniciou-se em 1881, com as 
obras Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis e O Mulato, 
de Aluísio Azevedo. Vale reforçar que Machado de Assis já havia produzido 
várias obras durante o Romantismo e por isso é chamado de escritor de 
transição. Suas obras realistas são, todavia, mais encorpadas e provocativas, 
pois abordam a sociedade carioca e escancaram suas mazelas (adultério, 
traição, mentiras e tráfico de influências são alguns dos temas que podem ser 
encontrados na tríade de obras mais conhecidas Dom Casmurro, Quincas 
Borba e Memórias Póstumas de Brás Cubas). 
As principais características do Realismo, são: 
 Oposição ao idealismo romântico (não havia representatividade 
do envolvimento sentimental); 
 Representação mais fiel da realidade; 
 Romance como crítica às instituições sociais decadentes da 
época (como o casamento, a hipocrisia, ojogo de interesses pelo 
poder, analise dos valores burgueses, corrupções de classe, 
dentre outras); 
 Narrativa minuciosa (rica em detalhes); 
 Personagens analisadas psicologicamente. 
 
Seus principais autores e obras foram: 
 Machado de Assis: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), 
Quincas Borba (1891); Dom Casmurro (1899), Esaú e Jacó 
(1904) e Memorial de Aires (1908); 
 Raul Pompéia: O Ateneu (1888). 
26 
 
No Realismo, o gênero literário que mais se desenvolveu foi o Romance, 
o que não implica dizer que o conto e a novela não existiram, aponta apenas 
para uma predominância do Romance. Os textos em verso também figuraram 
durante o período, mas de forma menos marcante. A prova disso é que 
Machado de Assis, grande romancista também escreveu belíssimas poesias, 
como as explicitadas na sequência. 
 
Livros e flores 
 
Teus olhos são meus livros. 
Que livro há aí melhor, 
Em que melhor se leia 
A página do amor? 
 
Flores me são teus lábios. 
Onde há mais bela flor, 
Em que melhor se beba 
O bálsamo do amor? 
 (ASSIS, 1946) 
 
Círculo Vicioso 
 
Bailando no ar, gemia inquieto vaga-lume: 
- Quem me dera que fosse aquela loura estrela, 
que arde no eterno azul, como uma eterna vela! 
Mas a estrela, fitando a lua, com ciúme: 
 
- Pudesse eu copiar o transparente lume, 
que, da grega coluna à gótica janela, 
contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela! 
Mas a lua, fitando o sol, com azedume: 
 
- Misera ! tivesse eu aquela enorme, aquela 
claridade imortal, que toda a luz resume! 
Mas o sol, inclinando a rutila capela: 
 
- Pesa-me esta brilhante aureola de nume... 
Enfara-me esta azul e desmedida umbela... 
Porque não nasci eu um simples vaga-lume? 
 (ASSIS, 1946) 
 
 
Machado de Assis foi prosador e foi poeta, mas como este texto já 
afirmou, no que se refere à análise literária, é importante lembrar que a análise 
é diferenciada em alguns aspectos. Embora busquemos o mesmo objetivo, os 
elementos a serem analisados são diferentes e bem específicos. 
27 
 
No texto em prosa, buscam-se os elementos da narrativa e no texto em 
verso, buscam-se a postura do eu lírico, a abordagem da temática, a análise da 
forma linguística, entre outros elementos característicos. 
Como no Realismo e no Naturalismo predominam a prosa, na sequência 
se efetuará a análise de trechos do romance Memórias Póstumas de Brás 
Cubas, de Machado de Assis e do conto O caso da vara, também do mesmo 
autor. Além dos textos machadianos, será analisado o conto Inveja, de Aluísio 
Azevedo, o qual que segue a tendência naturalista, dentro da Escola 
Realista. 
 
2.1.1 Análise da obra Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de 
Assis 
 Por trata-se de um texto extenso, não será possível abordá-lo em sua 
totalidade. Contemplaremos então alguns trechos da obra, apresentando uma 
proposta de redação para uma análise literária. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fonte: 
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5b/Memorias_Posthumas_de_Braz
_Cubas.jpg 
 
Lembramos sempre que sua participação como analista e crítico literário 
é fundamental, tendo em vista que cada um de nós, amantes da Literatura, 
carregamos nossas experiências, nossas leituras e nossas preferências. São 
esses elementos que atribuíram o viés do texto analítico, sem, todavia, 
abandonar os elementos essenciais a uma boa análise literária. 
28 
 
2.1.1.1 Análise do narrador e do foco narrativo 
 
[...] 
Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como 
saudosa lembrança estas memórias póstumas. 
 
CAPÍTULO 1 
Óbito do Autor 
 Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou 
pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha 
morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas 
considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu 
não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem 
a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais 
galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs 
no introito, mas no cabo; diferença radical entre este livro e o Pentateuco. 
 Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de 
agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e 
quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía cerca de trezentos 
contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos! 
Verdade é que não houve cartas nem anúncios. Acresce que chovia — 
peneirava — uma chuvinha miúda, triste e constante, tão constante e tão 
triste, que levou um daqueles fiéis da última hora a intercalar esta 
engenhosa ideia no discurso que proferiu à beira de minha cova: 
— “Vós, que o conhecestes, meus senhores, vós podeis dizer comigo que 
a natureza parece estar chorando a perda irreparável de um dos mais 
belos caracteres que tem honrado a humanidade. Este ar sombrio, estas 
gotas do céu, aquelas nuvens escuras que cobrem o azul como um crepe 
funéreo, tudo isso é a dor crua e má que lhe rói à natureza as mais íntimas 
entranhas; tudo isso é um sublime louvor ao nosso ilustre finado. 
(ASSIS, 1978) 
 
 
Machado de Assis criou um narrador póstumo, por isso a narração é 
feita em primeira pessoa, mas mescla o foco narrativo com uma terceira 
pessoa observadora. Na posição de defunto autor, Brás Cubas “vive” e conta 
sua própria história. 
Essa versatilidade marca a obra machadiana e lembramos ainda que o 
narrador criado por Machado de Assis, em muitos momentos e em várias obras 
do escritor, mantém um diálogo franco e aberto com o leitor, como podemos 
perceber no trecho que segue. 
 
29 
 
2.1.1.2 Análise do tempo 
 
[...] 
CAPÍTULO 7 
O delírio 
 Que me conste, ainda ninguém relatou o seu próprio delírio; faço-o eu, 
e a ciência mo agradecerá. Se o leitor não é dado à contemplação destes 
fenômenos mentais, pode saltar o capítulo; vá direito à narração. Mas, por 
menos curioso que seja, sempre lhe digo que é interessante saber o que se 
passou na minha cabeça durante uns vinte a trinta minutos. 
(ASSIS, 1978) 
 
 
É perceptível que o narrador se dirige ao leitor, advertindo-o sobre a 
narrativa que virá e sugerindo-lhe que “salte” o capítulo caso não goste do 
tema que será abordado. 
 Ainda no Capítulo 7, Machado, aliás, o defunto-autor continua a contar 
seu delírio e podendo então analisar o tempo da narrativa neste trecho. 
 
 
[...] 
 
 Primeiramente, tomei a figura de um barbeiro chinês, bojudo, destro, 
escanhoando um mandarim, que me pagava o trabalho com beliscões e 
confeitos: caprichos de mandarim. 
 Logo depois, senti-me transformado na Suma Teológica de São 
Tomás, impressa num volume, e encadernada em marroquim, com fechos 
de prata e estampas; ideia esta que me deu ao corpo a mais completa 
imobilidade; e ainda agora me lembra que, sendo as minhas mãos os 
fechos do livro, e cruzando-as eu sobre o ventre, alguém as descruzava 
(Virgília decerto), porque a atitude lhe dava a imagem de um defunto. 
Ultimamente, restituído à forma humana, vi chegar um hipopótamo, que 
me arrebatou. Deixei-me ir, calado, não sei se por medo ou confiança; 
mas, dentro em pouco, a carreira de tal modo se tornou vertiginosa, que 
me atrevi a interrogá-lo, e com alguma arte lhe disse que a viagem me 
parecia sem destino. 
— Engana-se, replicou o animal, nós vamos à origem dos séculos. 
[...] 
(ASSIS, 1978) 
 
 
Pode-se perceber dois tempos verbais no romance: um é o tempo 
psicológico utilizado pelo autor defunto que, por ser defunto e alheio ao mundo30 
 
dos vivos, conta a história na sequência que mais lhe agrada, fazendo pausas, 
adiantando o tempo, enfim, manipulando-o com bem quer. 
O delírio, título do Capítulo 7 da obra mostra como o defunto autor pausa 
a narrativa e introduz outras narrativas, que nem sempre respeitam a 
verossimilhança tão comum nas obras daquele tempo. 
Percebam que ela narra um delírio que durou cerca de 20 a 30 minutos, 
obviamente pouco tempo para as peripécias do tal delírio. 
Por outro lado, há o tempo cronológico, que aparece de forma cíclica, ou 
seja infância, adolescência, juventude, maturidade, velhice, morte e novamente 
a infância que fecha e reabre o ciclo. 
Não podemos esquecer da linearidade ou não da narrativa. Esse 
elemento costuma estar articulado com a escolha do tempo da narrativa, 
determinado em que sequência os fatos serão apresentados. 
 
2.1.1.3 Análise do Espaço 
 
[...] 
 
CAPÍTULO 25 
Na Tijuca 
 Ui! lá me ia a pena a escorregar para o enfático. Sejamos simples, 
como era simples a vida que levei na Tijuca, durante as primeiras semanas 
depois da morte de minha mãe. No sétimo dia, acabada a missa fúnebre, 
travei de uma espingarda, alguns livros, roupa, charutos, um moleque, — o 
Prudêncio do capítulo 11, — e fui meter-me numa velha casa de nossa 
propriedade. Meu pai forcejou por me torcer a resolução, mas eu é que não 
podia nem queria obedecer-lhe. Sabina desejava que eu fosse morar com 
ela algum tempo -duas semanas, ao menos; meu cunhado esteve a ponto 
de me levar à fina força. Era um bom rapaz este Cotrim; passara de 
estróina a circunspecto. Agora comerciava em gêneros de estiva, labutava 
de manhã até a noite, com ardor, com perseverança. 
 De noite, sentado à janela, a encaracolar as suíças, não pensava em 
outra coisa. Amava a mulher e um filho, que então tinha, e que lhe morreu 
alguns anos depois. Diziam que era avaro. 
(ASSIS, 1978) 
 
 
 Com o trecho do Capítulo 25, evidencia-se a questão do Espaço na 
narrativa machadiana. 
31 
 
Machado elegeu o Rio de Janeiro como espaço principal de todas as 
suas obras. Embora Brás Cubas tenha passeado por toda a Europa, sua 
história passa-se mesmo no Rio de Janeiro e seus arredores, como o Capítulo 
25 mostra. Nele, o jovem Brás se isola do mundo após a morte de sua mãe e 
para tanto segue para a Chácara da família, na Tijuca. 
Aqui é importante destacar o espaço social e histórico e trabalhar com 
algumas características que podem aproximar o leitor da análise daquele 
contexto histórico. 
Perguntas como: O que significava ter uma chácara “na Tijuca” naquele 
contexto? Devem ser respondidas para apresentar, por exemplo, a medida da 
situação financeira de Brás Cubas que pode se dar ao luxo de isolar-se, sem 
pensar em trabalho ou obrigações, até que o pai viesse chamá-lo a esses 
deveres. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro, século XIX 
Fonte: http://files.asliteratas.webnode.com.br/200000116-4d1f14e171/ruadireita-g.jpg 
 
 
32 
 
2.1.1.4 Análise da estrutura narrativa 
 
[...] 
 
CAPÍTULO 34 
A uma alma sensível 
Há aí, entre as cinco ou dez pessoas que me leem, há aí uma alma 
sensível, que está decerto um tanto agastada com o capítulo anterior, 
começa a tremer pela sorte de Eugênia, e talvez..., sim, talvez, lá no fundo 
de si mesma, me chame cínico. Eu cínico, alma sensível? Pela coxa de 
Diana! Esta injúria merecia ser lavada com sangue, se o sangue lavasse 
alguma coisa nesse mundo. Não, alma sensível, eu não sou cínico, eu fui 
homem; meu cérebro foi um tablado em que se deram peças de todo 
gênero, o drama sacro, o austero, o piegas, a comédia louçã, a 
desgrenhada farsa, os autos, as bufonerias, um pandemônio, alma 
sensível, uma barafunda de coisas e pessoas, em que podias ver tudo, 
desde a rosa de Smirna até a arruda do teu quintal, desde o magnífico leito 
de Cleópatra até o recanto da praia em que o mendigo tirita o seu sono. 
Cruzavam-se nele pensamentos de vária casta e feição. Não havia ali a 
atmosfera somente da águia e do beija-flor; havia também a da lesma e do 
sapo. Retira, pois, a expressão, alma sensível, castiga os nervos, limpa os 
óculos, — que isso às vezes é dos óculos, — e acabemos de uma vez com 
esta flor da moita. 
(ASSIS, 1978) 
 
 
 
A estrutura narrativa do romance é marcada por um grande número de 
capítulo, inclusive capítulos bem curtos. A obra apresenta 160 capítulos. 
É importante destacar essa escolha do escritor e discutir a necessidade 
dessa estrutura, respondendo questões como: “Essa criação, inicialmente 
excessiva de capítulos foi realmente necessária? Por que Machado assim 
procedeu?” 
Esses são alguns dos elementos que podem ser analisados em um 
romance. Cabe a você, analista e crítico, buscar todos os aspectos relevantes 
da obra literária que é objeto da análise, retirando dela, com todo o respeito, as 
singularidades inerentes ao objeto artístico. 
 
 
 
33 
 
2.2 Naturalismo 
Corrêa (S/d.), quanto ao Naturalismo explicita que: 
Na filosofia antiga, “naturalismo” era sinônimo de materialismo e de 
epicurismo. Durante muito tempo este foi o sentido primário da 
palavra. Do século XVIII ao século XIX, esta passou a denominar um 
sistema filosófico segundo o qual o homem vive num mundo 
desprovido de forças metafísicas. Diderot declarava que os 
“naturalistas” eram homens que não aceitavam a existência de Deus, 
pois se interessavam unicamente pela substância material. Ao longo 
de toda a década de quarenta do século XIX, o crítico Saint-Beuve 
empregou, em seus ensaios, os nomes “naturalismo” e “materialismo” 
como equivalentes (apud FURST & SKRINE, 1971, p. 11). Este 
primeiro sentido de cunho filosófico, e que põe em relevo o interesse 
do homem pela substância material do mundo visível, permanece até 
hoje. As acepções antigas, nas quais o naturalista aparece como 
aquele que se interessa pela matéria e por suas manifestações 
naturais e leis físicas, tornam-se relevantes quando aplicadas a um 
movimento artístico que atribui grande importância aos objetos 
palpáveis do mundo visível. O século XIX testemunhou a associação 
entre “naturalismo” e “naturalista”. O culto romântico à natureza 
despertou interesse pelo estudo do meio natural. Os estudiosos das 
ciências naturais, como a botânica e a zoologia, passaram, então, a 
denominarem-se naturalistas. Foi assim que, ao longo do século XIX, 
o avanço da ciência fez com que os vocábulos “naturalismo” e 
“naturalista” deixassem de lado a acepção filosófica para adquirir um 
sentido científico. A associação com a ciência permitiu que os termos 
perdessem o tom pejorativo de ateísmo e epicurismo, adquirindo 
respeitabilidade. Paralelamente ao sentido filosófico e científico, 
instaurou-se o sentido artístico. Do século XII ao XIX, o adjetivo 
“naturalista” serviu para classificar o pintor capaz de reproduzir a 
natureza com fidelidade e exatidão. No século XVII, Pacheco, um dos 
pintores espanhóis do chamado “século de ouro”, num de seus 
tratados didáticos, qualificou de naturalista a escola pictórica que se 
consagrava à tradução da natureza. A arte seria a expressão da vida 
em todos os seus modos e teria como único objetivo a reprodução do 
meio natural. Este ideal baseia-se no realismo mimético e leva em 
consideração as escolhas pessoais do artista, quanto ao momento e 
ao modo de retratação. O pintor naturalista era aquele que, diferente 
dos demais, não reproduzia temas históricos, mas sim a natureza. De 
1840 até 1865, aproximadamente, “naturalista” tornou-se um termo 
chave para os críticos que reverenciavam os pintores que retratavam 
a natureza. A palavra foi empregada com frequência pela crítica de 
arte do século XIX, especialmente na França. Como o termo 
“naturalismo”já trazia consigo significados distintos originários da 
filosofia, da ciência e das Belas-Artes, antes mesmo de ser utilizado 
pela crítica literária, é comum encontrarmos ao longo do século XIX 
os seus mais diferentes sentidos manipulados pela crítica. A 
aproximação entre acepções oriundas de diversas áreas do saber fez 
com que, muitas vezes, um romancista fosse chamado naturalista, 
sem saber e sem, de fato, ser. [...] No prefácio da segunda edição do 
romance Thérèse Raquin (1867), assinado em 15 de abril de 1868, 
Émile Zola empregou o termo “naturalista” de forma clara e direta, no 
sentido literário em que hoje o compreendemos. Ao longo de todo o 
prefácio, Zola defende-se dos ferozes ataques sofridos na ocasião do 
lançamento do romance, acusado de imoral e considerado verdadeiro 
lixo literário. Corriqueira e tacanha, para ele a crítica não teria 
compreendido que o ponto de partida de Thérèse Raquin era “o 
estudo do temperamento e das modificações profundas do organismo 
34 
 
sob a pressão do meio e das circunstâncias” (ZOLA, 2001, p. 13). Ao 
especular como a crítica moderna, ao contrário da moralista, 
entenderia seu romance, Zola serve-se do adjetivo “naturalista”. Da 
mesma forma, os adjetivos “grande” e “metódica” são usados para 
qualificar a crítica responsável pela renovação da ciência, da história 
e da literatura. Ainda segundo Zola, essa crítica compreenderia o seu 
romance como um estudo de caso excepcional, um verdadeiro drama 
da vida moderna; diria apenas, talvez, que, para um romance de 
análise, o estilo deveria ser mais simples, enquanto a linguagem, 
mais clara e natural. Ao concluir o prefácio, Émile Zola serve-se 
novamente do vocábulo “naturalista”, agora usado para nomear o 
grupo de escritores que compartilham de sua doutrina literária. Zola 
encerra declarando que não precisa escrever um manifesto para 
defender e explicar Thérèse Raquin diante daqueles que o 
consideram “literatura putrefata” (ZOLA, 2001, p. 14), e argumenta 
dizendo: “O grupo de escritores naturalistas ao qual tenho a honra de 
pertencer tem coragem e fôlego suficiente para produzir obras fortes, 
trazendo em si mesmas a própria defesa” (ZOLA, 2001, p. 14). O 
termo “naturalismo” estava, então, lançado e sobreviveu; a princípio, 
acoplado ao termo “realismo”. Somente no século XX, por uma 
limitação à teoria determinista e científica de Zola, o “naturalismo” 
diferenciou-se do “realismo”, muito mais amplo e vago, aplicado a 
qualquer arte que se relacione com a representação da realidade (cf. 
WELLEK, 1972, p. 15). 
[...] Assim como Émile Zola, os demais escritores naturalistas não 
diferenciavam “realismo” e “naturalismo”. Em 1876, na ocasião do 
lançamento de A taberna (1876), Joris-Karl Huysmans defendeu Zola 
dos ataques da crítica através de uma série de artigos intitulada 
“Émile Zola et L’Assommoir”, publicada no jornal L’Actualité de 
Bruxelles. Nesses artigos, além de traçar um perfil burguês do mestre 
naturalista, Huysmans emprega os termos “realismo” e “naturalismo” 
de forma pouco elucidativa (CORRÊA, S/d. p. 3047-3049). 
 
 
2.2.1 O Naturalismo e suas características 
O Realismo, a exemplo do Romantismo, também reflete uma ordem 
social que se criou a partir de muitas revoluções, entre elas as revoluções do 
operariado fundamentadas nas ideias marxistas. O descontentamento com a já 
solidificada classe burguesa e com as condições de trabalho nas fábricas 
fizeram eclodir várias greves e revoltas. 
Dessa forma, desloca-se o foco de abordagem da obra literária tendo 
como objeto principal as classes menos abastadas e sua situação social. As 
ideias científico-filosóficas buscavam explicar a complexidade do momento. 
Nesse contexto nasce, dentro do Realismo, a tendência naturalista que 
também aborda a sociedade de maneira objetiva, mas com um viés biológico. 
35 
 
 Para os naturalistas, a existência humana é material e o homem é um 
produto biológico e por isso mesmo, refém dessa situação. Por isso, o homem, 
nessa tendência, é controlado por seus instintos e sofre muitas vezes, nos 
romances naturalistas, um processo de zoomorfização, ou seja, uma 
aproximação com os animais. 
Também é característico do Naturalismo um homem condicionado ao 
meio, subordinado a fatores físicos e químicos, à hereditariedade e às 
influências que sobre nesse próprio meio social. 
No Naturalismo, o cientificismo foi levado ao extremo, tanto que o 
romance experimental marcou esse momento da literatura brasileira e mundial. 
 Para tanto os romances naturalistas apresentam linguagem simples e 
descrições minuciosas, optando preferencialmente por temas que remetem à 
falência dos padrões morais e éticos, tais como adultério, miséria, crimes, taras 
sexuais, conflitos sociais, entre outros. 
 Existem obras emblemáticas nesse período e uma delas é Germinal 
(1885), do francês Émile Zola. Na obra, há uma abordagem impressionante da 
situação do proletariado, cotejada com ideias deterministas e marxistas, 
apresentando nitidamente o descontentamento da classe operária com a 
dinâmica capitalisto-burguesa. Os baixos salários, as péssimas condições de 
trabalho, a absurda jornada de trabalho e a desvalorização geral do operário 
desencadeiam uma greve que adoece física e emocionalmente as famílias. 
Depois de vários momentos de conflito e drama o ciclo do determinismo se 
fecha e os operários obrigam-se a voltar ao trabalho, condicionando-se ao meio 
e às forças sociais. A ideia do escapismo e do conformismo se mostram 
presentes no seguinte trecho: 
Quando se vive como um animal, de cabeça baixa, um pouco de 
ilusão não faz mal, um escape onde se possa sonhar com as coisas 
que jamais estarão ao alcance da mão. (ZOLA, 2011). 
 
 
A conduta moralmente questionável e atrelada à situação de miséria e 
condicionamento também aparece muito forte na obra, como evidencia-se no 
trecho a seguir: 
Desde que começara a instruir-se, a promiscuidade da aldeia mineira 
chocava-o. Então eram animais para viverem assim, amontoados, 
36 
 
uns por cima dos outros, com tanto campo em volta, a ponto de não 
se poder trocar a camisa sem ter que mostrar o traseiro ao vizinho? E 
que bem fazia para a saúde essa promiscuidade, com moças e 
rapazes apodrecendo juntos! 
-Ora! - respondeu Maheu. - Se houvesse mais dinheiro viveríamos 
melhor... Mas de fato , só pode fazer mal viver amontoado desse 
jeito. Sempre termina com homens bêbados e mulheres grávidas. 
(ZOLA, 2011, p.172). 
 
A exploração e a miséria, o descontentamento com o estado das coisa 
aparece de maneira marcante na obra Germinal, fazendo-se importante 
relembrar mais uma vez o constante controle que o vício e os instintos 
exerciam sobre o homem (características do Naturalismo). 
Trabalhavam como bestas numa coisa que antes dó era feita pelos 
condenados às guilhotinas, morriam ali, muito antes de ter chegado a 
sua hora, e tudo isso para nem sequer terem carne no jantar. Ainda 
comiam, claro, mas tão pouco, apenas o suficiente para seguirem 
sofrendo, cheios de dívidas, perseguidos como se tivessem roubando 
o pão que não os deixava morrer de fome. Aos domingos sucumbiam 
exaustos. Os únicos prazeres eram embriagar-se e fazer filhos na 
mulher. E ainda por cima a cerveja fazia crescer a barriga, e os filhos, 
mais tarde, renegavam os pais. Não, não, a vida não tinha graça 
alguma. (ZOLA, 2011. p.173). 
 
Saiba Mais 
Émile-Édouard-Charles-Antoine Zola 
(1842-1902), nasceu em Paris. Foi o 
fundador e o principal representante do 
movimento literário naturalista. Educado 
em Aix-en-Provence, Zola começou a 
trabalhar em 1862 no departamento de 
vendas da uma editora. Quatro anos 
depois decidiu dedicar-se exclusivamente à literatura. Suas 
duas primeiras obras, Contes à Ninon (1864) e o romance 
LaConfession de Claude (1865), marcaram a transição para 
o Naturalismo, já definitivamente manifesto em Thérèse 
Raquin (1867). 
 
 Esses são alguns aspectos que podem ser observados em uma obra 
Naturalista e que devem aparecer na análise literária quando o analista 
apresentar ideias, concepções e abordagem do tema. 
37 
 
O Brasil segue essa tendência e nossos escritores também produzem obras 
aos moldes do naturalismo de Zola. 
Com a publicação de O Mulato (1881), Aluísio Azevedo (1857-1913) 
consagrou-se como um escritor naturalista. A publicação dessa obra marca o 
início do Naturalismo brasileiro. 
O Cortiço (1890), de Aluísio de Azevedo também apresenta uma 
coletividade representada pelo Cortiço de João Romão. Esse, claro, 
representante da classe economicamente privilegiada, exerce controle sobre 
seus inquilinos, formando um ciclo de condicionamento e exploração aos 
moldes do apresentado por Zola. No trecho que segue, Azevedo destaca a vida 
no cortiço e as compras que os moradores faziam na venda que também era 
do dono do cortiço. 
O rumor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os dias 
acentuava-se; já se não destacavam vozes dispensas, mas um só 
ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a fazer 
compras na venda; ensarilhavam-se discussões e rezingas; ouviam-
se gargalhadas e pragas; já se não falava, gritava-se. Sentia-se 
naquela fermentação sanguínea, naquela gula viçosa de plantas 
rasteiras que mergulham os pés vigorosos na lama preta e nutriente 
da vida, o prazer animal de existir, a triunfante satisfação de respirar 
sobre a terra. (AZEVEDO, 1995) 
 
 
Nesse paralelo entre as duas obras podem-se perceber outras 
características realistas e naturalistas. A animalização, a ausência de padrões 
rígidos de moral (característicos do Realismo), o enfoque na dominação do 
instinto (característicos do Naturalismo). 
 Neste trecho, já no final do romance, João Romão denuncia Bertoleza, a 
escrava fugida com a qual vivia amasiado, e a qual havia explorado sexual e 
financeiramente por quase toda a vida. Aqui fica perceptível a zoomorfização e 
a exploração moral e física da personagem. 
— É esta! disse aos soldados que, com um gesto, intimaram a 
desgraçada a segui-los. — Prendam-na! É escrava minha! 
A negra, imóvel, cercada de escamas e tripas de peixe, com uma das 
mãos espalmada no chão e com a outra segurando a faca de 
cozinha, olhou aterrada para eles, sem pestanejar. 
Os policiais, vendo que ela se não despachava, desembainharam os 
sabres. Bertoleza então, erguendo-se com ímpeto de anta bravia, 
recuou de um salto e, antes que alguém conseguisse alcançá-la, já 
de um só golpe certeiro e fundo rasgara o ventre de lado a lado. 
E depois embarcou para a frente, rugindo e esfocinhando moribunda 
numa lameira de sangue. 
38 
 
João Romão fugira até ao canto mais escuro do armazém, tapando o 
rosto com as mãos. (AZEVEDO, 1995). 
 
 
Gomes (S/d), reforça que: 
O Naturalismo é uma ramificação do Realismo e uma das suas 
principais características é a retratação da sociedade de uma forma 
bem objetiva. 
Os naturalistas abordam a existência humana de forma materialista. 
O homem é encarado como produto biológico passando a agir de 
acordo com seus instintos, chegando a ser comparado com os 
animais (zoomorfização). 
Segundo o Naturalismo, o homem é desprovido do livre-arbítrio, ou 
seja, o homem é uma máquina guiada por vários fatores: leis físicas e 
químicas, hereditariedade e meio social, além de estar sempre à 
mercê de forças que nem sempre consegue controlar. Para os 
naturalistas, o homem é um brinquedo nas mãos do destino e deve 
ser estudado cientificamente. (GOMES, S/d.). 
 
As principais características do Naturalismo são: 
 O cientificismo exagerado que transformou o homem e a 
sociedade em objetos de experiências; 
 Descrições minuciosas e linguagem simples; 
 Preferência por temas como miséria, adultério, crimes, problemas 
sociais, taras sexuais e etc. A exploração de temas patológicos 
traduz a vontade de analisar todas as podridões sociais e 
humanas sem se preocupar com a reação do público, enfatizando 
também as classes marginalizadas. 
 
Ao analisar os problemas sociais, o naturalista explicita a sua ânsia em 
reformar a sociedade (através da denúncia desses problemas). 
Os principais autores Naturalistas e suas obras: 
 Aluísio Azevedo: O cortiço (1890), O Mulato (1881), Casa de 
pensão (1884); 
 Adolfo Caminha: O bom crioulo (1895). 
39 
 
Adolfo Caminha publicou as obras A Normalista (1892), e O bom crioulo 
(1895), que falam sobre desvios sexuais e especificamente explicitando o 
homossexualismo. 
Em 1890, o Naturalismo atinge o seu ápice com a publicação de O 
cortiço, de Aluísio de Azevedo (obra repleta de personagens marginalizados). 
 
2.3 Análise de texto Naturalista 
 Para apresentar uma breve análise literária de um texto naturalista, 
escolhemos o conto Inveja, de Aluísio Azevedo. 
 
Inveja 
 Era uma rica tarde de novembro. O sol acabava de retirar-se naquele 
instante, mas a terra, toda enrubescida, palpitava ainda com o calor dos 
seus últimos beijos. 
 O céu, vermelho e quente, debruçava-se sobre ela, envolvendo-a num 
longo abraço voluptuoso; de todos os lados ouvia-se o lamentoso estridular 
das cigarras, e as árvores concentravam-se, murmurando, em êxtases, 
como se rezassem a oração do crepúsculo. 
 Àquela hora de recolhimento e de amor a natureza parecia comovida. 
 A noite abria lentamente no espaço as suas asas de paz, úmidas de 
orvalho, prenhez de estrelas que ainda mal se denunciavam numa 
palpitação difusa. Uma boiada recolhida ao longe, abeberando nos charcos 
do caminho, e bois tranquilos levantavam a cabeça, com a boca 
escorrendo em fios de prata, e enchiam a solidão das clareiras com a 
prolongada tristeza dos seus mugidos. Num quintal, entre uma nuvem de 
pombos, uma rapariga apanhava da corda a roupa lavada que estivera a 
secar durante o dia; enquanto um homem, em mangas de camisa, passava 
pela estrada, cantando, de ferramenta ao ombro. De cada casa vinha um 
rumor alegre de famílias que se reúnem para jantar, e, junto com latidos de 
cães e choros de criança, ouvia-se o contente palavrear dos trabalhadores 
em descanso, ao lado da mulher e dos filhos. 
 Entretanto, um padre ainda moço, depois de passear silenciosamente 
à sombra das árvores, foi assentar-se, triste e preocupado, nos restos de 
uma fonte de pedra, cuja pobreza as ervas disfarçavam com a opulência da 
sua folhagem viçosa e florida. E aí ficou a cismar, perdido num profundo 
enlevo, como se o ardente perfume daquela tarde de verão fora forte 
demais para a sua pobre alma enferma de homem casto. 
 Estranhos e indefinidos desejos levantavam-se dentro dele, pedindo 
confortos de uma felicidade que lhe não pertencia e levando-o a cobiçar 
uma doce existência desconhecida, que seu coração magoado e 
ressentido mal se animava de sonhar por instinto. 
 E, assim, vinham-lhe à memória, com uma reminiscência dolorosa, 
todas as suas aspirações da infância. Ah! nesse tempo, quanta esperança 
40 
 
no futuro!… Quanta inocência nas suas aspirações!… Quanta confiança 
em tudo que é da terra e em tudo que é do céu!… Nesse tempo não 
conhecia ele a luta dos homens contra os homens; não conhecia as 
guerras da inveja e as guerras da vaidade; não conhecia as humilhantes 
necessidades deste mundo; não conhecia ainda a responsabilidade da sua 
vida e não sabia como e quanto dói ambicionar muito e nada conseguir. 
Ah! nesse tempo feliz, ele era expansivo e risonho. Nesse tempo ele era 
bom. 
Mas, continuou a pensar, cruzando sobre o fundo estômago as mãos finas 
e descoradas, enterraram-me numa casa abominável, para ser padre. 
Deram-me depois

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