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AS RELACOES ENTRE OS ORDENAMENTOS

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AS RELAÇÕES ENTRE OS ORDENAMENTOS JURÍDICOS – XV 
 
 
I – A pluralidade dos ordenamentos: 
 
- Um outro problema pertinente ao ordenamento jurídico é o das relações entre 
ordenamentos. Assim, para que possamos falar de relações entre os ordenamentos é 
necessário que exista mais de um. Ao sustentarmos a existência de um único Direito 
Universal, ao qual podemos denominar de monismo jurídico, não há que se cogitar 
de tal problema. Admitindo a existência de vários ordenamentos, ao qual podemos 
denominar pluralismo jurídico, verificamos que este possui as seguintes fases 
históricas: 
1) primeira fase: também chamada de estatal ou nacional, nesta fase admite-se a 
existência de muitos ordenamentos jurídicos, porque existem muitas nações e cada 
uma dotada de um ordenamento unitário (ordenamento estatal). Acabou por 
prevalecer na segunda metade do século XIX, pelo Positivismo Jurídico, corrente 
esta segundo a qual não existe outro Direito além do Direito Positivo, que tem por 
características o de ser criado por uma vontade soberana; 
2) segunda fase: também chamada de institucional, porque pela sua tese existe um 
ordenamento jurídico onde existe uma instituição, não só de vários ordenamentos 
jurídicos, mas de vários tipos de ordenamentos. A aceitação desta teoria implica, 
também, na constatação da existência das relações entre ordenamentos estatais, como 
também o de relacionamento entre ordenamentos diferentes dos estatais. Entre os 
ordenamentos não-estatais poderemos distinguir quatro tipos: 
a) ordenamentos acima do Estado, como o ordenamento internacional, e o da 
Igreja Católica, segundo algumas doutrinas; 
b) ordenamento abaixo do Estado, como os ordenamentos sociais, o qual o Estado 
reconhece, limitando-o ou absorvendo-o; 
c) ordenamento ao lado do Estado, como o da Igreja Católica, ou, também, o 
internacional, segundo a doutrina dualista; 
d) ordenamento contra o Estado, como as associações de quadrilhas, seitas secretas 
e outras. 
 
- Apesar da proeminência das doutrinas de sustentação do pluralismo jurídico, a 
concepção universalista do Direito perdura nos tempos atuais, fortalecida após o 
segundo conflito mundial e com a criação da ONU, não como era antes na crença de 
um eterno Direito Natural, mas na intenção de ser constituído um Direito Positivo 
único, recolhendo em unidade todos os Direitos Positivos existentes, com a idéia do 
Estado mundial e a constituição de um Direito Positivo universal; 
 
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II. Vários tipos de relações entre ordenamentos: 
 
- Aqui procura ser estabelecido, entre vários ordenamentos, um relacionamento 
hierárquico entre eles, a exemplo do que ocorre entre as normas de um ordenamento, 
em termos de superioridade ou inferioridade. 
Assim, numa primeira classificação das relações entre os ordenamentos, poderemos 
fazê-lo com base no diferente grau de validade, desta forma poderemos ter as 
seguintes distinções: 
1) Relação de coordenação: tem lugar ente Estados soberanos, que dão origem 
ao regime pactuário, ou seja, o regime no qual as regras de coexistência são o 
produto de uma autolimatação recíproca; 
2) Relação de subordinação: são os encontrados entre os ordenamentos estatais 
e os sociais, como os das associações de classes, sindicatos, partidos, igrejas e 
outros os quais têm estatutos próprios, cuja validade deriva do 
reconhecimento do Estado; 
- Um segundo critério de relacionamento entre ordenamentos é o que leva em conta a 
diferente extensão recíproca dos diferentes âmbitos de validade. Assim 
poderemos ter os seguintes tipos de relações: 
1) De exclusão total: o de não sobrepor em relação a um outro em nenhuma das 
suas partes. Exemplos 
a) com respeito à validade espacial das suas respectivas normas jurídicas: 
como o de dois ordenamentos estatais que se excluem totalmente, num 
mesmo território: 
b) com respeito à validade material, embora sejam validas num mesmo 
território (validade espacial), há exclusão em relação à matéria, porque a 
regulada por um dos ordenamentos é diferente da regulada pelo outro: 
Igreja e Estado; 
2) De inclusão total: significa que um dos dois ordenamentos tem um âmbito de 
validade compreendido totalmente no outro: 
a) se por exemplo considerarmos a validade espacial, o ordenamento de um 
Estado-membro está compreendido totalmente no ordenamento do Estado-
federal; 
b) se por exemplo considerarmos a validade material, o ordenamento da 
Igreja está totalmente incluído no ordenamento do Estado; 
3) De exclusão parcial ou inclusão parcial: significa que um dos dois 
ordenamentos tem uma parte em comum e uma parte não comum. Verifica-se 
quando, por exemplo, o ordenamento estatal absorve parte do ordenamento da 
Igreja ou de uma associação particular, mas não totalmente, assim uma parte 
do ordenamento da Igreja ou da associação que não foi absorvido fica fora do 
ordenamento estatal, continuando a regular o comportamento dos seus 
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membros, numa zona que é em relação ao Estado, de mera licitude. Outros 
exemplos poderão ser utilizados de ordenamento não absorvido totalmente 
pelo ordenamento estatal, como o da Moral (roubo e dívida de jogo); 
 
III. Estado e ordenamentos menores: 
 
- Neste caso o estudo se faz entre o ordenamento estatal e determinados 
ordenamentos menores, cuja vida se desenvolve no interior da do Estado, entendido 
por ordenamentos menores os que mantêm unidos os seus membros para fins 
parciais, voltados para os interesses que compõem o grupo. Nestes relacionamentos 
vamos encontrar as seguintes situações, através das quais o ordenamento estatal 
utiliza ordenamentos menores: 
1) absorção: dá-se neste caso a absorção de um ordenamento jurídico por outro, 
como por exemplo, o relacionamento entre Estado e ordenamentos menores, ou seja, 
são aquelas partes do ordenamento estatal que originalmente eram ordenamentos 
parciais, os quais surgiram em comunidade de interesses e finalidades particulares, 
como o Direito Empresarial e o Direito de Navegação, os quais, por muito tempo, 
foram o produto da atividade independente dos comerciantes e navegadores e, 
depois, pouco a pouco, foram introduzidos e integrados no ordenamento estatal 
único; 
2) reenvio: neste caso o ordenamento não se apropria do conteúdo das normas de 
outro ordenamento, limitando-se a reconhecer a sua plena validade no próprio 
âmbito. Ex.: quando a vida familiar em colônia não está regulada por normas 
pertencentes ao ordenamento estatal, mas está regulada por costumes, aos quais o 
ordenamento estatal, atribui validade de normas jurídicas através de um reenvio de 
caráter geral, ou seja, atribui a mesma validade das normas próprias do ordenamento 
estatal, como se aquelas fossem idênticas a estas: 
3) indiferença: ocorre quando o Estado não dá nenhuma proteção às regras contidas 
nos ordenamentos menores. Assim se estes estabelecem algumas ordens e ou 
obrigações, estas valem somente para as pessoas que aderem àquele ordenamento, e 
constitui condição necessária para a participação nele. Ex.: a atitude que o Estado 
assume frente aos regulamentos dos jogos e dos esportes e as obrigações assumidas 
pelos jogadores e pelos esportistas entre si; 
 
IV. Relações temporais: 
 
- Dentre as relações entre os ordenamentos jurídicos, encontraremos diferentes 
âmbitos de validade de um ordenamento, em particular do âmbito temporal, 
espacial e material. Assim se dois ordenamentos se diferenciam em relação a estes 
três âmbitos, é provável que não tenham interferência entre si. Desta forma um 
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problema de suas relações não é colocado em questão. No entanto, quando estes têm 
em comum dois desses âmbitos e diferem no terceiro,existirá a exclusão de 
identificação. Pode ocorrer, na análise de relacionamento entre ordenamentos, a 
existência de dois âmbitos de validade comum diferente do terceiro, podendo resultar 
as seguintes situações: 
1) dois ordenamento têm em comum o espacial e o material, e não o temporal. Como 
o de dois ordenamentos estatais que se sucedem no tempo, no mesmo território; 
2) dois ordenamentos têm em comum o âmbito temporal e o material, mas não o 
espacial. Como do relacionamento entre dois Estados contemporâneos que vigem ao 
mesmo tempo, regulam as mesmas matérias, mas em dois territórios diferentes; 
3) dois ordenamentos têm em comum o temporal e o espacial, mas não o material. 
Como o existente entre um ordenamento Estatal e o da Igreja Católica, uma vez que 
ambos tem jurisdição no mesmo território e ao mesmo tempo, mas as matérias 
estabelecidas em cada ordenamento são diferentes; 
 
V. Relações espaciais: 
 
- Quando se estuda o relacionamento entre ordenamentos que têm validade espacial 
diferente, verificamos que os mesmos são aplicados, respectivamente, em Estados 
soberanos, cujas normas valem dentro dos sues limites espaciais (território), uma vez 
que os Estados consideram-se independentes uns dos outros, dotados de poderes 
próprios que lhes asseguram a não ingerência nos seus domínios por parte do outro 
Estado. Entretanto há casos em que o Estado recorre às norma de um outro Estado 
para solucionar algumas controvérsias, as quais são estudados no Direito 
Internacional Público. 
 
- Vamos encontrar algumas das controvérsias enunciadas no item anterior, quando 
nos deparamos com algumas situações, tais como se dois sujeitos são estrangeiros, de 
Estados diferentes, e a coisa envolvida na relação jurídica existente entre ambos está 
situada num outro Estado que não o deles, ou se os dois sujeitos pertencem a um 
Estado, mas a coisa se encontra em outro Estado. O comum é a aplicação da 
legislação estrangeira; 
 
VI. Relações materiais: 
 
- Nas relações que se desenvolvem entre o ordenamento do Estado e o ordenamento 
da Igreja Católica, os dois tem a mesma validade temporal, por serem 
contemporâneos na sua vigência, e a mesma validade espacial, pois são vigentes no 
mesmo território, porém não se identificam porque se diferenciam um do outro no 
que diz respeito ao âmbito de validade material. 
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BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico, 10. Ed. Brasília: Universidade 
de Brasília, 1999, p. 161-180

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