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RECLAMAÇÃO 34.475 PARAÍBA RELATOR : MIN. LUIZ FUX RECLTE.(S) :ADOBE ASSESSORIA DE SERVICOS CADASTRAIS S.A. E OUTRO(A/S) ADV.(A/S) : JULIANA LUCAS DOS SANTOS SILVEIRA E OUTRO(A/S) RECLDO.(A/S) :TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS BENEF.(A/S) :MARTIN VICENTE MOREIRA NETO ADV.(A/S) :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS RECLAMAÇÃO. CONSTITUCIONAL. TRABALHISTA. TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS PARA CONSECUÇÃO DE ATIVIDADE-FIM. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA EMPRESA CONTRATANTE. ALEGAÇÃO DE AFRONTA À AUTORIDADE DA DECISÃO DESTA SUPREMA CORTE PROFERIDA NA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 324. ARTIGO 25, PARÁGRAFO 1º, DA LEI 8.987/1995. ALEGAÇÃO DE AFRONTA À SÚMULA VINCULANTE 10. OCORRÊNCIA PRECEDENTES. CONFIRMAÇÃO DA MEDIDA LIMINAR. RECLAMAÇÃO QUE SE JULGA PROCEDENTE. DECISÃO: Trata-se de reclamação, com pedido de medida liminar, ajuizada por Adobe Assessoria de Serviços Cadastrais S/A contra decisão proferida pela 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho nos autos do Processo 0000816-66.2016.5.13.0023, por suposta ofensa à autoridade da decisão proferida por esta Corte na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 324. Supremo Tribunal Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código EDBA-64B3-CEEE-51E7 e senha F86B-4B6C-CD73-BD27 RCL 34475 / PB Eis a ementa do acórdão ora reclamado, in verbis: “AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA – RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014 - TERCEIRIZAÇÃO. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI Nº 13.429/2017. ART. 896, “C”, DA CLT - COISA JULGADA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGALIDADE DA TERCEIRIZAÇÃO. SÚMULAS 126 E 296, I, DA CLT - ÔNUS DA PROVA. TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA – VÍNCULO EMPREGATÍCIO. ENQUADRAMENTO À CATEGORIA DOS FINANCIÁRIOS. ART. 896, § 1º-A, I, DA CLT – RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. GRUPO ECONÔMICO. SÚMULA 126 DO TST. Nega-se provimento ao agravo de instrumento que não logra desconstituir os fundamentos do despacho que denegou seguimento ao recurso de revista. Agravo de instrumento a que se nega provimento.” Narra a parte reclamante que é demandada em processo no qual se discute a responsabilização subsidiária pelo pagamento de verbas trabalhistas em ação proposta por Martin Vicente Moreira Neto. Relata que o Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região, por considerar ilícita a terceirização realizada, “reconheceu o vínculo empregatício da parte diretamente com a Crefisa S/A e, por conseguinte, determinou o enquadramento da parte na categoria dos financiários e deferiu os pedidos correlatos, quais sejam, as benesses das convenções coletivas dos financiários e jornada especial dos bancários”. Discorre que, interposto recurso de revista, o mesmo teve seu seguimento negado pelo Tribunal a quo, decisão que ensejou o manejo de agravo de instrumento. Quando do julgamento desde, o Tribunal Superior do Trabalho manteve a declaração de ilicitude da terceirização e declarou a irretroatividade da Lei 13.429/2017. Sustenta, assim, que ao acolher a tese de ilicitude da terceirização da atividade-fim, o juízo reclamado desconsiderou a autoridade da decisão proferida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 324. Afirma, nesse sentido, que “o e. STF julgou, conjuntamente com a 2 Supremo Tribunal Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código EDBA-64B3-CEEE-51E7 e senha F86B-4B6C-CD73-BD27 RCL 34475 / PB ADPF 324, o RE 948252, vindo a encerrar, de forma definitiva, o debate acerca da terceirização de “atividade-meio e de “atividade fim”, considerando lícitas todas as formas de terceirização, de modo a privilegiar o livre exercício da atividade econômica de que tratam o inciso IV e o parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal”. Requer, liminarmente, a suspensão da decisão impugnada e da tramitação do Processo 0000816-66.2016.5.13.0023. No mérito, requer a procedência do pedido para “cassar a decisão reclamada, nos termos do art. 992 do CPC, reestabelecendo-se a autoridade do e. STF exarada na ADPF n. 324, determinando-se o julgamento dos embargos de divergência, com a observância da decisão do e. STF”. Em 25/04/2019, deferi o pedido de medida liminar apenas para suspender os efeitos do acórdão ora reclamado. O Tribunal reclamado prestou informações (Doc. 12). Devidamente citado (Doc. 13), na forma do inciso III do artigo 989 do Código de Processo Civil, Martin Vicente Moreira Neto deixou de apresentar contestação. É o relatório. DECIDO. Ab initio, pontuo que a reclamação, por expressa determinação constitucional, destina-se a preservar a competência desta Suprema Corte e a garantir a autoridade de suas decisões, ex vi do artigo 102, inciso I, alínea l, além de salvaguardar a estrita observância de preceito constante em enunciado de Súmula Vinculante, nos termos do artigo 103-A, § 3º, ambos da Constituição Federal. A propósito, a jurisprudência desta Suprema Corte fixou diversas condições para a utilização da via reclamatória, de sorte a evitar o desvirtuamento do referido instrumento processual. Disso resulta: i) a impossibilidade de utilização per saltum da reclamação, suprimindo graus de jurisdição; ii) a impossibilidade de se proceder a um elastério hermenêutico da competência desta Corte, por estar definida em rol numerus clausus; e iii) a observância da estrita aderência da controvérsia contida no ato reclamado e o conteúdo dos 3 Supremo Tribunal Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código EDBA-64B3-CEEE-51E7 e senha F86B-4B6C-CD73-BD27 RCL 34475 / PB acórdãos desta Suprema Corte apontados como paradigma. Antes de examinar se, de fato, há desobediência à decisão proferida nos autos da ADPF 324, Rel. Min. Roberto Barroso, é preciso esclarecer o que ela dispõe. Naquela ocasião, o Tribunal julgou procedente o pedido formulado pela Associação Brasileira do Agronegócio – ABAG e firmou a seguinte tese: “1. É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada. 2. Na terceirização, compete à contratante: i) verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada; e ii) responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias, na forma do art. 31 da Lei 8.212/1993.” Com efeito, no referido julgamento fixou-se o entendimento de que “é lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”. Da análise dos autos, verifica-se que a pretensão deduzida pelo autor da demanda de origem envolve a verificação da licitude de contratação via terceirização, para fins de responsabilização subsidiária da ora reclamante pelo pagamento de verbas trabalhistas. No julgamento daquela demanda, o juízo reclamado condenou a ora reclamante, subsidiariamente, ao pagamento dos encargos trabalhistas postulados pelo autor da ação, por considerar ilícita a terceirização realizada. Destarte, observa-se que a decisão proferida nos autos da ADPF324 abarca o caso concreto, já que guarda similitude fática com a situação posta nos autos. Dessa forma, resta evidenciada a afronta à autoridade de decisão desta Corte dotada de efeitos vinculantes e com eficácia erga omnes. 4 Supremo Tribunal Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código EDBA-64B3-CEEE-51E7 e senha F86B-4B6C-CD73-BD27 RCL 34475 / PB De outro lado, quanto à alegada ofensa ao teor da Súmula Vinculante 10, é preciso esclarecer o que ela dispõe: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.” In casu, o acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região, posteriormente mantido pela decisão reclamada, consignou: “Com efeito, a prova dos autos é cabal no sentido de que, de fato, estava o autor envolvido em todo o processo de venda dos produtos financeiros da Crefisa. Nesse sentido, além do que expôs a sentença impugnada, os diversos documentos, sobretudo os email's e mensagens do aplicativo whatsapp, trazidos pelo autor anexos à sua exordial, que muito claramente demonstram não somente os produtos trabalhados, a exemplo de empréstimos e crédito pessoal, como a dinâmica laboral do autor como parte de um todo onde Crefisa e Adobe atuam como se única empresa fossem. Observe-se que a ADOBE sempre funcionou com o LOGO da Crefisa e durante muito tempo os e-mails dos funcionários também registravam o domínio desta, sendo praticamente impossível dissociar uma da outra, o que justifica, inclusive, a condenação em responsabilidade solidária, como novamente bem fez a origem. […] Assim, sem maiores esforços, fica evidente pelas atividades exercidas pelo reclamante que, apesar de ter sido contratado pela primeira reclamada, o fato é que prestava serviços em benefício da segunda, negociando produtos financeiros, laborando predominantemente no ramo de atuação desta, caracterizando, portanto, típica situação de terceirização ilícita.” Nesse contexto, ao realizar a leitura do decisum reclamado, verifico que houve afronta ao conteúdo da súmula vinculante em apreço. 5 Supremo Tribunal Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código EDBA-64B3-CEEE-51E7 e senha F86B-4B6C-CD73-BD27 RCL 34475 / PB Deveras, a decisão do Tribunal reclamado, ao considerar ilícita a terceirização, sob o argumento de que os serviços especializados ligados à atividade-fim da tomadora seriam insuscetíveis de terceirização lícita, não deixou qualquer espaço para discussão sobre a aplicabilidade, ou não, da regra prevista no § 1º do artigo 25 da Lei 8.987/1995, cujo teor transcrevo: “Art. 25. Incumbe à concessionária a execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue essa responsabilidade. § 1º Sem prejuízo da responsabilidade a que se refere este artigo, a concessionária poderá contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido, bem como a implementação de projetos associados.” (Grifei) Dessa forma, o órgão fracionário afastou integralmente o comando legal que permite a terceirização, pelas concessionárias de serviço público, de atividades inerentes ao serviço concedido, em afronta à Súmula Vinculante 10, uma vez que destituiu “a norma de qualquer carga de eficácia jurídica, esvaziando por completo a pretensão originária do legislador, seja ela qual tenha sido” (Reclamação 25.508, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 22/08/2017). Ao apreciar caso semelhante, esta Suprema Corte reconheceu a afronta ao aludido verbete vinculante: “DIREITO DO TRABALHO E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM RECLAMAÇÃO. ALEGADA OFENSA À SÚMULA VINCULANTE Nº 10. 1. De acordo com a Súmula Vinculante nº 10, o afastamento da incidência de lei, mesmo sem declaração expressa de inconstitucionalidade, exige a observância da cláusula de reserva de plenário. Essa regra não é observada quando a decisão do órgão fracionário, sob o fundamento de interpretar dispositivo legal, não 6 Supremo Tribunal Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código EDBA-64B3-CEEE-51E7 e senha F86B-4B6C-CD73-BD27 RCL 34475 / PB deixa qualquer espaço para que ele seja aplicado. 2. Viola a Súmula Vinculante nº 10 a decisão que, invocando o art. 25, § 1º, da Lei nº 8.987/1995, afasta genericamente o comando que permite a terceirização, pelas concessionárias de serviço público, de atividades inerentes ao serviço concedido.” (Reclamação 27.184- AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe de 15/05/2018) No mesmo sentido foram as seguintes decisões monocráticas: Reclamações 25.508, Rel. Min. Alexandre de Moraes, 10.132, Rel. Min. Gilmar Mendes, 19.598-MC, Rel. Min. Cármen Lúcia, e 16.903-MC, Rel. Min. Roberto Barroso. Ex positis, com fundamento nos artigos 992 do Código de Processo Civil e 161, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, JULGO PROCEDENTE a presente reclamação, para cassar o acórdão proferido pela 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho nos autos do Processo 0000816-66.2016.5.13.0023 e determinar que outro seja proferido, observando-se o que dispõe o artigo 97 da Constituição da República. Comunique-se o teor desta decisão ao Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região e ao Tribunal Superior do Trabalho. Publique-se. Brasília, 14 de junho de 2019. Ministro LUIZ FUX Relator Documento assinado digitalmente 7 Supremo Tribunal Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código EDBA-64B3-CEEE-51E7 e senha F86B-4B6C-CD73-BD27 2019-06-14T17:10:24-0300 LUIZ FUX Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o código EDBA-64B3-CEEE-51E7 e senha F86B-4B6C-CD73-BD27