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Bolzani - História, temas e problemas da filosofia

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docente de filosofia.
Itdnana Mattar Niaanian 
organizador
Nesta obra Novas Tendências para o 
Ensino de Filosofia: o contexto de sala 
de aula e o âmbito das pesquisas 
busca-se consolidar os diversos 
modos da pesquisa filosófica em sua 
vinculação com a sala de aula em 
alguns momentos e, em outros, tendo 
como objeto a escola pensada por 
1 meio de filósofos da própria tradição, 
k num movimento de adensamento que 
I toma possível a reflexão cada vez 
B mais profunda sobre o tema, 
H derivando-se dai novas práticas e 
H teorias capazes de propiciar alguma 
M mudança nas condições dadas 
B atualmente. O intuito geral do pre- 
B sente volume é o de fortalecer a for- 
B mação teórico prática do leitor diante 
B dos atuais desafios postos à prática
I
I
Novas Tendências para 
o Ensino de Filosofia 
0 contexto fle sala de aula 
e o âmbito das pesquisas 
volume 3
Ml 11
CDD 101
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Este livro foi avaliado e aprovado por pareceristas adhoc.
Bibliografia
ISBN 978-85-444-1607-5
DOÍ 10.24824/978854441607.5
Sydione Santos (UEPG) 
Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA) 
Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)
Élsio José Corá (UFFS) 
Elizeu Clemenlino (UNEB)
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP) 
CATALOGAÇÃO NA FONTE
Conselho Editorial:
Aldira Guimarães Duarte Dominguez (UNB) 
Andreia da Silva Quintanilha Sousa (UNIR/UFRN)
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Comité Científico:
Andreia N. Militào (UEMS)
_______ __ II VU yuUHUIiiuiw y Diosnei Centurion (Uni v Americ. de Asunción - Py) 
Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ) Cesar Gerónimo Tello (Universidad Nacional
Carlos Alberto Vilar Estêvão (UM1NH0 - PT)
Carlos Federico Dominguez Avila (UNB)
Carmen Tereza Velanga (UNIR)
Celso Conti (UFSCar)
Leonel Severo Rocha (UNI SINOS)
Lídia de Oliveira Xavier (UNIEURO) 
Lourdes Helena da Silva (UFV)
Maria de Lourdes Pinto de Almeida (UNICAMP)
Maria Lília Imbiriba Sousa Colares (UFOPA)
Maria Cristina dos Santos Bezerra (UFSCar)
Paulo Romualdo Hemandes (UNICAMP)
Rodrigo Pralte-Santos (UFES)
Sérgio Nunes de Jesus (IFRO) 
Simone Rodrigues Pinto (UNB)
Solange Helena Ximenes-Rocha (UFOPA) 1Via,vç,w ............. .....-”/- •• r. Patrice Vermeren(UNIVERSITÉ - PARIS8)
Richard Theisen Simanke (UFJF)
Selvino António Malfatti (UNIFRAN/RS)
índice para catálogo sistemático
1. Educação - filosofia 100
2017
Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/1-)/-) 
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização d
Todos os direitos desta edição reservados pela: Editor cd d’tora CRV
Tel.: (41) 3039-6418 - E-mail; sac@editoracrv.com.br
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Editor-chefe: Railson Moura 
Diagramaçao e Capa: Editora CRV 
Revisão: Os Autores
Novas tendências para o ensino de filosofia: o contexto de sala de aula e 
o âmbito das pesquisas. / Adriana Mattar Maamari (org.). - Curitiba: CRV,
200 p. (Série Novas Tendências para o Ensino de Filosofia - volume 3).
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de Três de Febrero - Argentina) 
Elizeu Clemenlino (UNEB) 
Francisco Ari de Andrade (UFC) 
------ . Helder Buenos Aires de Carvalho (UFPI)
Cesar Gerónimo Tello (Univer. Nacional Sonia Maria Ferreira Kochler (UNISAL) 
Três de Febrero - Argentina) l|ma Passos A. Veiga (UNICEUB)
Elione Maria Nogueira Diogenes (UFAL) foês Bragança (UERJ)
Élsio José Corá (UFFS) José de Ribamar Sousa Pereira (UCB)
Elizeu Clemenlino (UNEB) Lourdes Helena da Silva (UFV)
Francisco Carlos Duarte (PUC-PR) Lucia Marisy Souza Ribeiro de Oliveira (UNIVASF)
Gloria Farinas León (Universidade Maria de Lourdes Pinto de Almeida (UNICAMP) 
de La Havana - Cuba) Maria Lília Imbiriba Sousa Colares (UFOPA)
Guillermo Arias Beatón (Universidade Monica Pereira dos Santos (UFRJ)
de La Havana - Cuba) Najela Tavares Ujiie (UTFPR)
Jailson Alves dos Santos (UFRJ) Ana Chrystina Venancio Mignot (UERJ)
João Adalberto Campato Júnior (UNESP) Sérgio Nunes de Jesus (IFRO)
Josania Portela (UFPI) Vera Lucia Gaspar (UDESC)
Adilson Xavier da Silva (UFRJ)
Claudia Pereira do Carmo Murta (UFES) 
Daniel Ornar Perez (UNICAMP) 
Élsio José Corá (UFFS)
Francisco Verardi Bocca (PUCPR)
Jorge Augusto da Silva Santos (Bento 
Silva Santos) (UFES)
José Eudimar Xavier de Menezes (UCSAL) 
Josiane Cristina Bocchi (UNESP) 
Marcelo Martins Barreira (UFES)
1. Filosofia 2. Ensino de filosofia 3. Currículo de filosofia. 4. Educação I. 
Maamari, Adriana Mattar (Org.). II. Título III. Série.
SUMÁRIO
PREFÁCIO 9
11
.45
73
99
119
137
157
iWi
A PRÁTICA DA PESQUISA NO ENSINO DE FILOSOFIA
Antônio Joaquim Severino
FILOSOFIA E OUTROS SABERES: atos, hábitos, 
intelecto e vontade......................................................
Juvenal Savian Filho
HISTÓRIA, TEMAS E PROBLEMAS DA FILOSOFIA 
EM SALA DE AULA.........................................................
Roberto Bolzani Filho
FILOSOFIA NA SALA DE AULA
Maria Lucia de Arruda Aranha
A FILOSOFIA E O SEU ENSINO NA PERSPECTIVA 
DA MODERNIDADE E DA LAICIDADE........................
Adriana Mattar Maamari
OPINION VERSUS INSTRUCTION PUBLIQUE À L’ÂGE
RÉVOLUTIONNAIRE..............................................................
Bertrand Binoche
UNE APPROCHE PAR COMPETENCES EN 
PHILOSOPHIE?.................................................
Michel Tozzi
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2
HISTÓRIA, TEMAS E 
PROBLEMAS DA FILOSOFIA 
EM SALA DE AULA
“A história da filosofia, corretamente feita, é uma ati­
vidade importante em si mesma e também importante 
para a formação de filósofos. Contudo, não é possível 
fazer boa história da filosofia sem dominar a filoso­
fia. A ideia de que a história da filosofia seria como 
que uma propedêutica da filosofia não tem em conta 
a dialética enriquecedora entre a filosofia e a história 
da filosofia: uma boa formação filosófica enriquece a 
história da filosofia e uma boa formação em história 
da filosofia enriquece a filosofia” (MURCHO, 2010).
Roberto Bolzani Filho
Professor do Departamento de Filosofia da USP2
"Aprender filosofia será, ao fim e ao cabo, contem­
plar diferentes possibilidades de sentido e escolher, 
num certo ponto, a 'pintura do mundo ’ que faz sentido 
para nós. Isto não é possível sem um conhecimento 
amplo da história, mas também não é possível sem a 
pergunta fundamental sobre a verdade, o bem e o belo. 
Filosofar será, então, habitar um outro tipo de mundo 
sobre o qual se refletiu e que, em certa extensão, foi 
escolhido. Aqui se mostra tanto a dívida quanto a au­
tonomia do ens ino da filosofia em relação à tradição, 
e é esta a relação responsável e criativa com a história 
que o ensino da filosofia deveria buscar” (BIRCH AL, 
2010, p. 80).
Roberto Bolzani Filho possui graduação em Filosofia pela Universidade de São Paulo (1985), 
mestrado em Filosofia pela Universidade de São Paulo (1992), doutorado em Filosofia 
pela Universidade de São Paulo (2003) e Livre-docência pela mesma Universidade (2013). 
Atualmente é professor do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo. Tem ex­
periência na área de Filosofia, com ênfase em História da Filosofia, atuando principalmente nos 
seguintes temas: Filosofia Antiga, Platão, Aristóteles e ceticismo.
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NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ENSINO DE FILOSOFIA: 
o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
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Antes de mais nada, há que formular uma distinção bá­
sica sobre dois sentidos da expressão “história da filosofia”3. 
De um lado, por “história da filosofia” podemos entender um 
longo processo, que já dura aproximadamente dois mil e qui­
nhentos anos, no qual um grande número de filósofos pro­
puseram as mais diferentesteorias sobre os mais diferentes 
temas que, em suas épocas, foram considerados filosóficos. 
Nesse sentido, a história da filosofia começa com os gregos e 
se define, em princípio, como sucessão das filosofias histori­
camente desenvolvidas. De outro lado, por “história da filoso­
fia” entendemos uma disciplina relativamente recente, na qual 
estudamos, das mais variadas maneiras e com metodologias 
diversas, os filósofos do passado. Neste sentido, a história da 
filosofia adquire vigor no século XIX e é uma atividade basi­
camente acadêmica. A história da filosofia é então caracteri- 
zada por certos tipos de investigação, bastante específicos e 
complexos, nos quais se tomam certas filosofias como objeto 
de estudo, para sua interpretação e elucidação. E é neste se­
gundo sentido, evidentemente, que “fazer história da filosofia” 
se separa profundamente de “fazer filosofia”. E, de fato, a his­
tória da filosofia, entendida como uma disciplina acadêmica 
e universitária de estudo, análise e interpretação das diversas 
filosofias, pode e deve ser descrita em termos que mostram 
suas evidentes diferenças em relação à filosofia, entendida 
esta como uma atividade ou processo de criação e produção 
de pensamento.
Essas diferenças se percebem já nas perguntas que se 
põem filósofos e historiadores da filosofia, pois tais perguntas 
são diferentes. O filósofo se pergunta, por exemplo: “o que é 
uma substância”? Ou: “o que é a causalidade”? Essas são per­
guntas especiais, que exigem uma reflexão propriamente filosó­
fica, para que se obtenha uma resposta. As respostas dadas pe­
los filósofos têm sido, como se sabe, variadas e frequentemente
A respeito deste tema, alguns parágrafos a seguir retomam, reformulam ou desenvolvem análi-
A filosofia vem se mostrando, ao longo dos séculos, uma 
forma de reflexão e investigação na qual o olhar para sua 
história tem sido, mais ou menos intensamente, um ato ele 
mesmo filosófico, uma parte constitutiva dessa mesma refle­
xão e investigação. Por isso, pensar sobre as relações entre 
a filosofia e sua história consiste, nos dias atuais, em tarefa 
de especial relevância, pois assistimos hoje, em boa parte dos 
cursos de filosofia de nossas Universidades, a um fenômeno 
que, de tão costumeiro para nós, corre o risco de nos parecer 
desprovido de maior importância: trata-se de uma espécie de 
acordo tácito, admitido não só em nossos solitários gabinetes 
de pesquisa, mas também, e sobretudo, em nossas salas de 
aula, que reconhece uma natural separação entre filosofia e 
história da filosofia, como duas atividades, mais do que dis- 
autónomas. Temos sido levados a dissociar o estudo 
c^n77Sa' ftl°SOfiaS’ como um aprendizado e exercício de 
te dita^Para n^ meSmas’ da refle*ào filosófica propriamen- 
pois, como sab°emosniPreenSà° e reflexào nao se misturam’ 
dizer quando, na tenentendernos mal o que um filósofo quer 
nossas próprias ideia1de comPreendê-lo, intrometemos 
teste surgiu outra, mas ^°nv^cções- Ora, desta verdade incon- 
estamos então diante de^ a^enas aparente, que sustenta que 
como duas retas paralela^ atividades condenadas a serem 
T^^^fia^^eenX ??nca encontram: ou “faze- 
filosnfir aV' ° tenAa das relacõ fazemos história da filosofia”- 
entre ^amba^Pretenc^e fi^ofia e história da
não precisam ío* diferen<?as existentes
a não ser que assim o h SW d ^ue ta^s diferenças 
des^mos. de são incompatíveis,
Considerações gerais: a relação visceral entre a 
filosofia e sua história
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NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ENSINO DE FILOSOFIA: 
o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
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exemplos dados, antes de tudo, o historiador deve recorrer 
aos textos de Aristóteles e Leibniz, ou os de Hume e Kant, 
para lê-los e interpretá-los. Os textos do filósofo estudado são 
indispensáveis para responder à pergunta posta, são eles que 
servem de referência e neles, a princípio, espera o historiador 
encontrar a resposta desejada, mesmo que esta nem sempre 
se localize facilmente na superfície desses textos e contenha 
obscuridades ou ambiguidades suficientes para produzir inter­
pretações diferentes.
Já para a reflexão filosófica, nenhum texto adquire im­
portância particular, exceto na medida em que serve de oca­
sião ou estímulo para uma busca própria da verdade. Se uma 
filosofia se concebe como um projeto de construção de um 
discurso verdadeiro, ela poderá, talvez, ver no conhecimento 
do passado filosófico, das tentativas que julga incompletas ou 
equivocadas de apreender essa mesma verdade, uma espécie 
de meio, de ambiente conceituai onde se dará sua prepara­
ção para a descoberta e apresentação de tal verdade, ou uma 
ocasião para a melhor formulação de suas questões, sem que, 
no entanto, o filósofo veja nesses textos seu objeto de inves­
tigação e análise, sem que os considere o lugar onde deverá 
procurar e encontrar essa verdade.
Assim, do ponto de vista do filósofo, um texto filosófi­
co qualquer não é uma autoridade para o estabelecimento de 
uma tese filosófica. Mas, do ponto de vista do historiador da 
Filosofia, o mesmo texto é uma autoridade indispensável para 
comprovar, refutar ou tomar convincente uma hipótese inter- 
pretativa a respeito da filosofia que esse mesmo texto veicu­
la. E a razão para essa função distinta dos textos filosóficos 
está no fato de que a pergunta do filósofo versa sobre temas 
filosóficos, que não se esgotam num texto e que, afinal, têm 
por objeto o mundo, os fatos, o próprio homem, enquanto a 
pergunta do historiador se dirige especificamente aos textos 
estudados, isto é, àquilo que os filósofos disseram oficialmen­
te para explicar o mundo, fatos e o próprio homem. De tudo
conflitantes: uma substância é algo que existe ou pode existir 
por si mesmo, ou algo que é concebido ou pode ser concebi­
do por si mesmo; há uma única substância, que é Deus; hâ 
duas substâncias, as mentes e a matéria, ou há três tipos de 
substância: Deus, as mentes e a matéria; uma substância é um 
composto de forma e matéria; só há matéria, como substância 
extensa; só há substâncias mentais e suas ideias... Igualmente, 
fonnularam-se distintas teorias causais: há quatro causas (for­
mal, material, eficiente e final); há duas causas (formal e mate­
rial ou eficiente e final); ou há somente uma causa (eficiente), a 
causa tem uma conexão necessária com seu efeito; ou a relação 
de causalidade se reduz às conjunções constantes...
Os historiadores da Filosofia levantam questões diferen­
tes. Eles não se perguntam: “o que é substância?”, mas sim. 
“o que é substância para Aristóteles?” ou “o que é substân­
cia para Leibniz?” E não se perguntam: “o que é a causalida, 
de? , mas sim: “qual é a concepção humana da causalidade, 
ou qual é a concepção kantiana de causalidade? . Trata-se 
de perguntas sobre o 
contextos, pensaram 
Para o historiadr.; „u, 
ramente é substância' 
ISSO
que determinados filósofos, em certos 
sobre uma questão que se propuseram.
L não se trata de descobrir o que verdadei- 
isso Aristóteles, EeibmaS S'm sa^er o que disseram sobre
conceitos de substân^2 e outros filósofos, quais eram seus 
deram ou souberam def COmo a definiam, de que modo pu­
de aPresentarumarespo?tdê'los’.tan'lbém não o move a tarefa 
e outros mde’ mas sitn exnrdnÍt'Va à indagaÇao sobre o que 
argumentos°qul°empbte a de HUme’
Para essas pereJe^raiT'para c C CaUSaS e efelt°S’ ° 
te histórico, há taS>SSeresPostasnd trUÍrem SUaS P0SÍÇÕeS' 
tos, o que tem gerado Vaned 6 Carater essencialmen- 
adequação. Apesar disso^*"16 de métodos propos- 
lógicos básicos dos hist’o^ntudo, os sobre sua eficácia e 
de quaisquer métodos de da ?.°Ced>mentos método- 
distintos 
a- ^ra retomar os
50
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que significa esse 
ao mesmo tempo
NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ENSINO DE FILOSOFIA 
o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
filósofo e historiador da filosofia. Retomemos então aquelas 
diferenças significativas entre filosofia e história da filosofia, 
sobretudo no que diz respeito às diferentesperguntas feitas 
pelo filósofo e pelo historiador. Se, por um lado, essas diferen­
ças servem ao estabelecimento da tese de que o filósofo pode 
dispensar a história da filosofia, de que o conhecimento a res­
peito de uma filosofia do passado não é necessário para urna 
tentativa de investigação filosófica própria e autónoma, por 
outro lado, elas poderiam também, se compreendidas de outro 
modo, legitimar a tese de que o filósofo encontra nas filosofias 
passadas material filosófico relevante, a partir do qual desen­
volveria sua reflexão. Nesse caso, pode-se dizer que, embora 
seja verdade que a história da filosofia não é indispensável 
para a filosofia, a reflexão do filósofo, contudo, ganhará em 
consistência, profundidade e precisão, se souber retirar dessas 
filosofias passadas subsídios para sua própria elaboração.
Retomemos nossos exemplos. Quando um filósofo con­
temporâneo se pergunta “o que é substância?” ou “o que é 
causalidade?”, para propor uma resposta, para encontrar a for­
ma que lhe parece verdadeira ou mais adequada de fazê-lo, 
talvez lhe seja útil saber o que é substância para Aristóteles 
e Leibniz, ou o que é causalidade para Hume e Kant, pois 
estes, ainda que muito distantes no tempo, apresentam respos­
tas instigantes às questões investigadas, respostas que influen­
ciaram reflexões posteriores. Será importante, portanto, que 
esse filósofo compreenda com o máximo de exatidão possível 
- pensando, então, também como historiador da filosofia - o 
que eles pensaram sobre esses temas, para então, tomando- 
-os como um ponto de referência, ou afastar-se deles, ou re­
considerar positivamente suas opiniões. Essa atitude pode até 
mesmo auxiliar o filósofo a melhor compreender o sentido de 
uma questão, antes de tentar respondê-la, pois logo descobri­
rá, ao estudar as filosofias passadas, que a própria pergunta é 
portadora de diferentes significados e intenções. E se eventu­
almente propuser uma resposta, ela estará inscrita numa linha
isso se pode concluir que um filósofo, para sê-lo, pode, se qui­
ser dispensar-se de conhecimentos de historia da filosofia. E 
parece também permitir a conclusão de que um historiador da 
filosofia, para sê-lo, não precisa ser filósofo.
Essas diferenças tomam muitas vezes correta a asserção, 
tão comum nos meios acadêmicos, de que os filósofos, quan­
do se dispõem a comentar as filosofias de seus antecessores, 
o fazem mal, o fazem como maus historiadores da filosofia. 
Costuma-se dizer então que, movidos por suas próprias con­
vicções e interesses filosóficos, eles estão condenados a co­
meter o equívoco de introduzir sua reflexão própria ao tentar 
compreender as outras filosofias. Ora, dessa constatação po e 
seguir-se, para pensar o tema das relações entre filosofia e his­
tória da filosofia, um perigoso dilema: se os filósofos não po 
dem ser bons historiadores da filosofia, em virtude de serem 
filósofos, então bons historiadores da filosofia não poderão ser 
filósofos. E, assim, ou se é filósofo, ou historiador da filoso a.
No entanto, trata-se aí de um falso dilema, poique nos 
esquecemos de que filósofos e historiadores da filosofia fazem 
diferentes perguntas a respeito de diferentes temas, e que não 
se deve, portanto, comparar suas atividades, como se estives 
sem em conflito. A. atividade de compreensão a respeito da 
reflexão de um filósofo não se confunde e não rivaliza com a
que defendem umaT é tão simPles‘ De fat°’ aqUÊ 
toriador da filosofia não* ra(bcal entre o filósofo e o his
toriador da filosofia não* necessariamente que um his- 
podem querer dizer, na verd^ também um filósofo. EleS 
ao mesmo tempo. E essa n qUe nao é possível ser ambos 
sofisticada, conduz a num’V.?Or®uMo do problema, mais 
patamar de reflexão. °Vo’ mais profundo e interessante
Tentemos então COrn
desdobramento da ques^®^ melhOr 0 
na°SePodeSer
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NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ENSINO DE FILOSOFIA: 
o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
dessa história, ou ao menos como um novo início. O conflito 
das filosofias moveu muitos filósofos a conceber suas filoso­
fias como uma descoberta da verdade que é ao mesmo tempo 
a solução desse conflito; e esse conflito, sendo histórico, im­
plica a consciência histórica da reflexão filosófica.
Assim, a história da filosofia nos mostra que a filosofia 
tem, com sua história, relação filosófica. A incursão histórica 
do filósofo não é primordial mente histórica, mas sim filosófi­
ca, porque a história da filosofia, antes de ser disciplina filo­
sófica, é objeto filosófico, ela mesma é tema de reflexão filo­
sófica, antes de ser objeto de compreensão histórica. Vejamos 
então que consequências se podem extrair dessa relação vis­
ceral entre filosofia e história da filosofia, para o entendimen­
to de algumas características da Filosofia.
Pode-se, por exemplo, pensar o tema da possível distin­
ção entre o que está “morto” e o que está “vivo” na filosofia4. 
Há certamente textos que propõem perguntas que não nos di­
zem mais respeito, enquanto outros permanecem dizendo-nos 
algo de significativo, independente da época de sua elaboração. 
Desse ponto de vista, não é tão relevante saber quando um texto 
foi escrito ou publicado, o importante é saber se suas perguntas 
são também nossas. Se forem, será um texto “vivo” para a refle­
xão filosófica; se não forem, o texto será talvez apenas objeto de 
um estudo histórico. Em geral, grandes textos filosóficos tratam 
de questões que permaneceram instigantes para nós e, nesse 
sentido, ainda são atuais; textos menos importantes podem sua 
relevância filosófica, ainda que não a histórica.
Há, seguramente, alguma verdade nessa proposta, pois 
nem todos os textos do passado nos tocam da mesma manei­
ra. Contudo, certas dificuldades são manifestas. Em primeiro 
lugar, um texto “morto” pode voltar a ser “vivo” e, portanto, a 
distinção é relativa. Nada impede que uma filosofia, propondo 
a revalorização ou reformulação de uma questão esquecida ou 
mal compreendida, torne “atuais” certas afirmações, até então 
4 Sobre estetemãfcf Smith e Bdzam 2010, p. 355-357
de pensamento que remonta a um passado mais ou menos dis 
tante. Estará devidamente localizada num terreno que já esta' 
va preparado pelos seus antecessores e que, provavelmente é 
conhecido por seus interlocutores, por aqueles que ele procura 
convencer em favor da tese que propõe como resposta. Nesse 
sentido, a história da filosofia, mais do que ocasião e estímulo 
para o filósofo, mostra-se possuidora de uma espécie de po­
tencial filosófico infinito, cuja atualização dependerá sempre 
do filósofo que sobre ela se debruça e nela procura elementos 
para sua reflexão.
Evidentemente, tudo isso significa que a leitura de um 
texto filosófico por um filósofo também pode ser uma leitura 
de compreensão, mas de uma compreensão que imediatamen­
te prepara uma reflexão. Nesse sentido, é correto, mas apenas 
trivialmente correto, afirmar que não se é filósofo e historiador 
da filosofia simultaneamente. Porque o filósofo sempre pode 
empreender uma leitura das obras de seus pares que sabe, por 
sim dizer, administrar a relação entre compreensão e refle-
’ iss^'Um C0n^ec^ment0 fid dessas obras, na medida em 
dios ià ffl6 P,°?sível’ e um aproveitamento próprio dos subsí- 
Por ^ss C°S qUe eSSe con^ec’rnento proporciona.
ma mencionai PJec'S0 °^ar com cuidado para o fato aci- 
inquestíonávei0^ 'storicarnente inegável, mas nem por isso 
lósofos pelo pon^ t0^° ^soío interpreta os outros fi- 
pando ou os comnr e V'Sta sua filosofia, assim os detur- 
das diferentes fnOso^n^en^° mal. Com o acúmulo histórico 
TXC1C'° pens&ment a h*storicidade da filosofia enquanto 
flexão mosófi8eraçôes de mlgoafnhando visibilidade junt0 às 
de algumas fií* Va'até mesmo °S’ e ° caráter histórico da re- 
de Aue a aspi^. Os filósof "C°ntrando seu lugar no seio 
menos um fioTo^a * Verdade°i°S deS(^e ce^° se deram conta 
mente-D filósofa c°r os ataVeSt^ada por eles criava ao
e às vezes chega ^aassin, ^unia,ainda que tenua- 
0 a c°nceber 2 ^arte uma históri3» 
------------------------------ SUa filosofia como o fim
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NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ENSINO DE FILOSOFIA.
o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
ciências aspiraram alcançar, descobrindo as verdades últimas 
das coisas, verdades que podem então ser objeto de sistemati­
zação completa. Desde o ideal de uma verdade absoluta, que 
já se encontra nas filosofias de Platão e Aristóteles e permane­
ce presente ao longo da filosofia moderna, os filósofos procu­
raram, com suas filosofias, satisfazer a exigências característi- 
cas de uma ciência.
Semelhante concepção de filosofia parece levar, como 
que naturalmente, à ideia de que a história da filosofia, enten­
dida como sucessão no tempo das diversas filosofias, exibe, 
não somente acumulação quantitativa, como também progres­
so qualitativo. Talvez uma primeira versão dessa posição, ain­
da embrionária, se apresente em Aristóteles, que se volta para 
o estudo dos princípios da natureza, em sua Física, partindo 
de uma análise dos filósofos anteriores e concluindo que eles, 
“embora o estabeleçam sem explicação, enunciam como con­
trários os elementos e os por eles denominados princípios - 
como que constrangidos pela própria verdade” (Aristóteles, 
2009, I, 5). A história das filosofias anteriores, para esse fi­
lósofo, é, portanto, uma história da própria verdade, verdade 
essa que se deixa entrever nas afirmações ainda hesitantes e 
apenas parcialmente corretas de seus antecessores. E ainda, no 
primeiro livro de sua Metafísica, percebe-se que a própria his­
tória da filosofia auxilia a estabelecer a verdade de uma dou­
trina, pois ao enunciar sua célebre teoria das quatro causas, 
Aristóteles imediatamente acrescenta: “Estudamos adequa­
damente essas causas na Física-, todavia, devemos examinar 
também os que antes de nós enfrentaram o estudo dos seres e 
filosofaram sobre a realidade. É claro que também eles falam 
de certos princípios e de certas causas. Para a presente inves­
tigação certamente será vantajoso referir-se a eles. Com efei­
to, ou encontraremos outro gênero de causa ou ganharemos 
convicção mais sólida nas causas das quais agora falamos” 
(Aristóteles, 2002,1, 3). Note-se a importância dessa incursão 
histórica do filosofo, pois o mínimo que se pode dizer é que
consideradas meramente “históricas”, revelando nelas 
sentido ou significado até então ignorado. Podemos encon 
trar uma formulação mais precisa da explicação precedente 
afirmando que um texto é filosófico, portanto “vivo”, quando 
pertence à rede de discussões filosóficas atuais, quando é rele­
vante para nossos debates, e é de interesse apenas histórico e, 
nesse sentido, “morto”, quando deixou de ser uma referência 
importante ou necessária a esses debates.
Embora interessante e até correta, tal ideia, no entanto, 
não nos deve fazer perder de vista que a oposição entre “filo­
sófico” e “histórico”, bem como a correspondente distinção 
entre o que está “vivo” e o que está “morto” arrisca-se a obs­
curecer um sentido mais profundo da relação entre a filosofia 
e sua história, segundo o qual não haverá oposição entre “fi­
losófico e histórico”. Mostra-o o simples fato de que, como 
oi observado, aquela rede de discussões possa sofrer modi- 
cações, dando-se nova vida àquilo que parecia perdido na 
lra dos tempos, conferindo-se a uma filosofia, a um modo 
mentadí aparentemente “superado”, novo fôlego, agora ali- 
maneira coV- Capacidade da reflexão atual de retomá-la de 
consistente.
netramos já em ° ^ar de “suPeraÇões” e “recuperações”, pe' 
filosofia e suahisftr° tema Car° a redexão filosófica sobre a 
mediante uma na’ P°de ser esclarecido e comentado 
outras formas de nen^^ do Pensamento filosófico com duas 
osofiatemcaracte J^onto: a ciência e a arte. De fato, a fr 
a relacãleUCla’ Se^a permitem sua aproximação seja
na maneirTco f''QsoíX ciênc'' A maneira como concebemos 
lação entre a C°nsecluCnte' ° arte’ tem grande influência 
brevemente, 2"°fia * sUa ^ente’ compreenderemos a re-
A fiiosofia S/Uas c°ttipa,Sa°?a' Exploremos, ainda que 
cunho eientífico ^ten^J0^-
truturado de conh^Wo ma&deU'se um saber de 
_ nt0s> como O°SU nien°s articulado e es- 
^Ue P°r muito tempo as
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NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ENSINO DE FILOSOFIA 
o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
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tema da relação entre filosofia e história da filosofia? Do ponto 
de vista de uma concepção estritamente científica de filoso­
fia, um filósofo pode ver no passado filosófico os esboços de 
uma verdade que os outros filósofos afirmaram encontrar, mas 
que apenas conseguiram entrever (é o caso de Aristóteles), ou, 
então, pode encontrar uma forma de assimilar esse passado e 
harmonizá-lo com sua doutrina ou sistema, que se torna então 
a expressão plena de toda essa história (é o caso de Hegel). 
Parece, assim, que uma concepção essencialmente científica 
da filosofia e do discurso filosófico tende a veicular uma ideia 
de progresso na história da filosofia. Há uma presença ine­
gável, em filosofia, de características tipicamente científicas, 
como a busca da verdade, a formulação de explicações para o 
mundo e a procura por um conjunto de verdades que formem 
um todo coerente e sistemático. A elas parece associar-se uma 
visão de sua história como portadora de uma evolução ou pro­
gresso racionais.
Embora exiba características próprias das ciências, a fi­
losofia, contudo, não deixa de manter-se original, no que diz 
respeito à relação com sua história. Assim, a história da ciên­
cia pode ser considerada com certa tranquilidade, pelo menos 
para parte considerável das epistemologias existentes, como 
algo que não mais proporciona subsídios para a reflexão e 
pesquisa científicas atuais. O cientista, por seu turno, sente- 
-se à vontade para considerar certas teorias passadas como 
“superadas” por um conjunto de descobertas das quais ele 
não pode considerar-se “criador”: a experiência científica, em 
boa medida compartilhada, não o permite. Há, portanto, neste 
contexto, certa objetividade que caracteriza a prática científi­
ca, embora isso não elimine a possibilidade de que o cientista 
também procure conceber sua tarefa como uma retomada da 
tradição, na busca de solução para seus problemas. Em filoso­
fia, contudo, sua história se distingue como fonte de proble­
mas teses e argumentos que ainda podem ser submetidos à re­
flexão contemporânea. O vínculo da filosofia com sua história
ela lhe proporciona uma confirmação da verdade que afirma. 
E Aristóteles, ao menos em princípio, chega a admitir a pos­
sibilidade de que essa história lhe mostre uma verdade que 
não havia descoberto. Seja como for, a confiança do filósofo 
na descoberta de uma verdade exclusiva o leva a fazer uma 
espécie de leitura filosófica do passado, leitura que o auxilia a 
tomar sua proposta filosófica mais consistente.
Em certo sentido, portanto, já se percebe nessa visão oti­
mista da história, resultante da confiança inabalável na des­
coberta da verdade, um embrião da ideia de progresso. Essa 
ideia, contudo, provavelmente tem em Hegel seu maior e mais 
original defensor, visto que, para este filósofo, a relação en­
tre filosofia e história da filosofia, como ocorre com a própria 
ideia de história, só é compreensível no seio de sua metafísi­
ca. Sendo a História o próprio desenvolvimento do Espírito, a 
“Biografia do Espírito do Mundo” regida pelas leis da Razão 
imanentes ao Mundo, a Filosofia, como saber e ciência rigoro­
sos - não, contudo, à maneira das ciências em geral -, deverá 
aprender a reconhecer a presença de tais leis na História, isto 
ca ,^niversal em seu desenvolvimento. Isso signifi- 
ta de tal desenXTm F’losofia só se compreende em vis- 
da Filosofia também S1Stemático’ 0 1ue torna a Histona 
concepção, as filosofi™" s’stema em desenvolvimento. Nesta 
tas” ou “erradas”-. são?^3^5 nao são- a bem dizer’ *'Cer' 
cretizar o conteúdo em distintas deapresentar e con- 
processo dialético que a?®'ess° sucessivo da Ideia, de um 
necessários. Assim, a História"? ?da Uma- seus momentos 
cesswo progredir, necessàrio^ Hlosofia consiste num su-
filosofia é constitutiva do si? P°de'se diz?” 3 C°nStl,tUIÇf)a
Em que semelhantes ap^J ft'°sófiCo r ^Ue a h^toria d 
cia nos ajudam a compree?°^çòes e 
ticas familiares trazem alm.^ n°sso e «losofia e ciem
Suas caracterís- 
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o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
e “melhor”. Quando assim entendida, a filosofia assume, em 
primeiro plano, papel sobretudo crítico, no seio de um con­
junto de saberes a que se reúne e não procura desqualificar ou 
subordinar. Dessa perspectiva, dificilmente poderíamos falar 
num progresso da filosofia, se nào a considerássemos legíti­
ma pretendente à descoberta da verdade, assim como não se 
diria necessariamente que um movimento artístico é melhor 
ou constitui um progresso em relação a outro, sem para isso 
reivindicar uma rigorosa e polêmica concepção estética da 
produção artística.
A ideia de progresso certamente não se aplica da mes­
ma maneira quando deixamos de pensar a filosofia como urna 
espécie de ciência e passamos a privilegiar as características 
que comunga com a arte. Neste caso, pode-se falar de mudan­
ça e até mesmo de “evolução” nos padrões e procedimentos 
estéticos, assim como se pode falar de “evolução” e mudança 
nos padrões e procedimentos que balizam a descrição do mun­
do, isto é, de “evolução” e mudança nos limites entre o que 
tem sentido e o que não tem sentido dizer sobre o mundo. Se 
comparamos os produtos da filosofia com os da arte, vendo-os 
como diferentes formas de descrição do real, que não compe­
tem entre si, mas apenas são distintas, então não mais caberá 
ver, ao longo de sua história, aquisição de conhecimentos e 
estabelecimento de verdades objetivamente reconhecidas e 
compartilhadas, mas somente sucessão de diferentes formas 
de pensar o real, cada uma das quais pertinente à sua época.
Duas teorias científicas podem rivalizar entre si e exigir 
de nós a realização de um experimento para decidirmos por 
uma delas, do mesmo modo que duas teorias filosóficas, se 
as entendermos como teorias científicas, poderão rivalizar e 
exigir critérios e argumentos para que possamos aderir a uma 
e rejeitar a outra. Mas duas formas artísticas, mesmo quan­
do se apresentam em confronto, não precisam ser vistas por 
nós como rivais nem como se excluindo mutuamente. Não é 
necessário, nesse caso, optar por nenhuma delas, ainda que
é, certamente, muito mais rico e profundo do que o da ciênci 
com sua história.
Por sua vez, as relações da filosofia com a arte, assim 
como ocorre com o caso da ciência, não são simples. De um 
lado, nào raro, a própria arte se faz filosófica: as várias mani­
festações artísticas, de diferentes formas e segundo distintas 
intenções, envolvem, ou podem envolver, uma postura refle­
xiva sobre o mundo ou sobre os homens, portando, por isso, 
certa dimensão filosófica. Muitas obras literárias, pictóricas 
ou musicais podem nos levar a uma atitude de questionamento 
e reflexão, ao tomarem como tema, por exemplo, a condição 
humana. E verdade, no entanto, que a intenção do autor de 
um romance, conto, pintura ou outro produto artístico dessa 
natureza nào é comunicar a seu público uma tese e argumentar 
em favor dela, o que distingue nitidamente seu produto dos 
escritos de filosofia. O escritor, por exemplo, visa também - 
^o^T VeZeS’ ta^vez exclusivamente - exercitar uma concep- 
tamW aVte' UTUa °PÇà° estética, e mesmo quando pretende 
meio de urTT^ Uma V^s^° s°bre as coisas, ele o faz por 
tos filosóficosTma exPressao distinta da maioria dos tex-
quando levamoT 'C'°n^S ^em^ora haja maior aproximação 
nào elimina o evTt C°nta °S filosóficos). Mas isso
arte pode exibir P°^encial filosófico que uma obra de
Mas há interess
entre filosofia e arte npeS ,mane'ras de pensar a semelhança 
en os'çào ^jofitári?1 historicamente essa não seja 
rigoroso,X5^^’ÍOSÍi?âO íFeCÍSa Ser entefdo 
compreendê-la conies^elhanç® ’tlV0 d° rea1’ em Se" d 
realidade, por teWiva de " C,encia- Pode-se também 
numa cultura. Nesse n°Ções h‘ .a de aProximação da 
das e notadas pelafi^550’ muda°nCamente estabelecidas 
forma de repreSentaç^Sofia cOrre ’lças conceituais produzi- 
conhecimem0“SUpera[iJteaUdadi nderiam a mudanças na
p0rurn con^°Su'3stituições de um 
c'mento “atualizado"
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dirigem à realidade
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filosofia, pautada por 
-- certa forma julgou
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ser perseguida e um mérito a ser conquistado; não, contudo, 
por alguma convicção estética, mas porque a descoberta de 
uma verdade absolutamente incontestável se associa natural­
mente à ideia de que tal verdade se deixa apresentar de ma­
neira sistemática, harmónica e unificada. Se um sistema filo­
sófico não pode ser considerado uma obra de arte, para certos 
filósofos seria possível, no entanto, compreender e comentar 
seu caráter intrinsecamente orgânico, mediante um vocabulá­
rio caro à reflexão estética, autorizado pela observação de uma 
real semelhança entre arte e filosofia. Não é por outra razão 
que, com frequência, somos capazes de apreciar a beleza de 
uma filosofia.
Pode-se então considerar que o discurso filosófico exibe, 
ao mesmo tempo, algumas características afins com a ciên­
cia e outras que o aproximariam da arte, como as que foram 
acima comentadas. Nesse caso, seria razoável concluir que a 
filosofia, comparada à ciência e à arte, deve ser considerada 
como um terceiro tipo de discurso sobre as coisas, que detém 
autonomia em relação aos outros dois, embora neles veja um 
importante ponto de referência para pensar suas próprias ca­
racterísticas. E entre essas características, destaca-se a pecu­
liar relação que sustenta com sua história5.
Tendo em vista a peculiaridade da filosofia, que acima 
se buscou comentar, sobretudo no que tange às suas originais 
relações com sua história, algumas considerações podem ser 
feitas a respeito da leitura dos textos filosóficos.
A leitura filosófica, aquela que um filósofo faz da obra de 
outro filósofo, sempre contém matéria para o olhar do histo­
riador da filosofia, pois este, voltado para a compreensão do 
pensamento de um filósofo, deve saber beneficiar-se também 
do diálogo crítico que os filósofos sustentam com seu passado. 
Isso porque uma filosofia pode tornar-se algo que escapa a seu 
criador, uma ideia pode ser desviada do contexto de sua in­
venção e do sentido ou significado iniciais que havia recebido.
5 Sobre o tema das relações entre filosofia, ciência e arte, retomaram-se partes de Smith e 
Bolzani, 2010, p. 365-371
isso também seja possível. De maneira análoga, se duas fil0 
sofias somente descrevem e articulam conceitos por meio do' 
quais pensamos a realidade, mas não se dirigem à realidade 
como uma teoria científica, então não há por que pensar que 
devemos escolher obrigatoriamente uma delas como melhor 
ou mais verdadeira que a outra.
A história da filosofia seria então, desse ponto de vista, 
uma sucessão de formas de pensar o mundo, mas não o pro­
gresso em direção a um conjunto articulado de verdades que 
descreveriam a realidade de uma vez por todas. A tarefa do 
historiador da filosofia, nesse caso, consistiria em descreveras 
difeientes formas pelas quais os filósofos pretenderam dizer 
o mundo, traçando os limites, de acordo com cada época ou 
vertente filosófica, entre o que tem sentido e o que não tem 
sentido dizer.
O que dizer da relação da arte com sua história? O artista 
tom? P?e refietÍr de f0rma livre a aspeito do passado e re- 
artista^pode^0 pro^cuo’ como acontece com a filosofia. Um 
quem sabeVnaf deva pensar sua arte como um momento, 
para um estado d C <evo^utiva”’ como uma solução 
muitas vezes,j? C°’sas ern sua arte. O mesmo faz o filósofo, 
essa história, de ?Udo"se inclusive no direito de reconstruir 
raro, o filósofo par? eSSa dn^a de modo peculiar. Mas, não 
posição é privilepi? 17 alérn do artista, por pensar que sua 
otada de certa objetiviaU7erdadeira’ sendo por isso mesmo 
Pre a2ém 6 °U Universalidade nem sem-
filosofia e arteSn?°de fazer outro r
um ide» d, mu.to “P» * aproximação entre
puder apre,™";
poderiam aproxi^á 1°^ Unidade ’ de certa fonna julgou 
arte, aquela que vè n*’ ^di?^161110 formais que
valor estético signiftCa^ ideal a’ de certa concepção de 
to tempo, a filosofi* mes dade * beleza formal um 
v*u nesse iu dv°' ^urante mui- 
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o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
da filosofia como o historiador da filosofia o é. O filósofo ana­
lisa outra filosofia, não para explicá-la, mas para pensar filo­
soficamente a partir dela. O historiador da filosofia pensa filo­
soficamente uma filosofia, não para pensar a partir dela, mas 
para explicá-la. Ambos, contudo, de distintos pontos de vista e 
conforme prioridades diversas, aliam compreensão e reflexão. 
Essa aliança, talvez seja preciso sempre recordá-la, sobretudo 
aos historiadores da filosofia.
Em ambos os casos, a leitura de um filósofo consiste num 
contínuo diálogo, sem data definida para terminar, no qual 
aprendemos a segui-lo até mesmo em seus desvios e hesita­
ções, a ponto de saber prever objeções mesmo antes que se 
manifestem, seja no interior da própria obra, seja na obra de 
seus críticos, ou bem para melhor compreendê-lo, ou bem para 
aprender com ele a pensar. Ler a obra de um filósofo é aceitar 
participar de uma espécie de duelo, em que ganhamos de qual­
quer modo, porque aprendemos a pensar. Pois nisso consiste o 
ato mesmo de ler, que não seria possível senão como um exer­
cício de pensamento ao mesmo tempo polêmico e amistoso.
Por isso, filósofos ou historiadores, compreendemos me­
lhor um autor quando o relemos, porque então será menor o 
risco de ler nele somente aquilo que ali colocamos. Relê-lo 
significa vagarosamente entregar-se ao seu pensamento e so­
mente depois de certo tempo propor-se a discuti-lo; significa 
confiar provisoriamente nele, para objetar-lhe apenas após jul­
gar tê-lo bem compreendido e, então, fazer-lhe todas as per­
guntas que nos importam e observar como ele as responde ou 
poderia ter respondido. Ora, embora possamos encontrar nes­
sa descrição as figuras do filósofo e do historiador da filoso­
fia, isso não parece ser suficiente para distingui-los, por assim 
dizer, essencialmente. Nesse sentido, é peifeitamente possível 
ser ao mesmo tempo filosofo e historiador da filosofia, e isso 
porque existe, desde que saibamos enxergá-la, uma profunda 
aliança entre a filosofia e sua história.
As obras dos filósofos suscitam movimentos de pensamento 
que têm seus desenvolvimentos próprios, independentes das 
intenções dos filósofos que as geraram e às vezes mesmo con­
trários a essas intenções. Por isso, um filósofo pode apropriar- 
-se de uma ideia de outro filósofo, repensando-a, e o historia­
dor deve também acompanhar e apreender esses movimentos 
porque eles auxiliam na compreensão do pensamento do filó­
sofo que teve suas ideias repensadas.
Se assim é, então o trabalho do historiador da filosofia, na 
tentativa de compreender o pensamento de um filósofo, deve 
consistir essencialmente em pensar com ele, em repensá-lo, 
refazendo seu itinerário de pensamento e pensando o que ele 
pensaria em resposta àqueles que, posteriormente, também 
pensaram com ele ou mesmo pensaram contra ele. Ao estudar 
a obra de um filósofo para elucidá-la, o historiador não vai 
simplesmente repeti-la. Mesmo quando se propõe a alcançar 
uma interpretação o mais possível objetiva, ele deve saber 
^ene ciar-se da fortuna crítica dessa obra como meio de ilu- 
sufikza ter qUe Ser caPaz seguir e compreender as 
temente • pensamento do autor estudado, as quais frequen- 
do texto anafi reformulaÇão argumentativa da letra 
que melhor oT Uma reaPresentação de um pensamento 
dados pelo filósn7Un^Ue’ sem Per^er o sentido e significado
Noutros termV pensamento-
a atenção para UmaS’ trata“se agora simplesmente de chamar 
historiador da filosofi^^^6 que às vezes se esquece: um 
uma ^PacidadeTi0 P0(^e s^'^° com eficácia, se não
da filaS°I° exarninado. is°SÓfica de Penetrar no pensamento 
certo sentiL8XUÍnament4S atlvidade do historiador 
características^d°S°^0 assim c^Ca " faZ do historiador, em 
historiador, 0 his?'^'1"'0 filosófi”10 ° ^ósofo, em virtude de 
balho historiopráfil'ad°r’ vim?,?’Se ^az’ em certa medida, 
Evidentemente°’Se faz, de características de tra- 
como o filósofo o é’ °?"storiador /"^‘da, filósofo.
C0tla0 o filó °fOfia não é filósofo 
°f° na° é historiador
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NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ENSINO DE FILOSOFIA: 
o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
professor concebe a filosofia como algo vivo e transformador, 
e não como um edifício em ruínas, cuja diversidade de anda­
res, aposentos, entradas e saídas nos caberia, com respeito, 
apenas contemplar e admirar.
Mas essa objeção, embora justa, legítima e bem-inten- 
cionada, parece basear-se, como vimos, em uma concepção 
da relação entre a filosofia e sua história que é, para dizer o 
mínimo, discutível. Segundo essa concepção, a relação entre a 
filosofia e sua história seria de exclusão’, quando estudamos a 
história da filosofia, somos inevitavelmente forçados a pôr de 
lado nossas próprias opiniões e, assim, somos impedidos de 
filosofar. A filosofia, então, terá de ser uma atividade pessoal 
e individual que não pode deixar-se contaminar pelas nume­
rosas filosofias do passado, para que não se percam valores 
como liberdade de pensamento, autenticidade e originalidade.
Sobretudo o jovem estudante interessado em assuntos fi­
losóficos poderá naturalmente abraçar essa ideia. Professores 
de filosofia também a acolhem. Mas muitos desses professores 
podem preferir uma posição mais moderada, segundo a qual, 
como também vimos, apesar de distintas, a filosofia e sua his­
tória não precisam ser tomadas como completamente excluden- 
tes. A filosofia não é idêntica à sua história e não se resume a 
ela, porque o filósofo, ao pensar, ao criar e propor ideias, está 
inevitavelmente se baseando em sua própria maneira de ver 
o mundo. Filosofar, como uma atividade singular e única de 
um indivíduo, é sempre um ato livre e original. E certamente, 
para isso, um filósofo não necessita conhecer o que pensaram 
os filósofos que o antecederam, ou, se porventura conhece, não 
precisa tomar suas filosofias como fundamento para sua própria 
reflexão. A história da filosofia, por sua vez, pode ser objeto de 
estudo histórico, sem que, para isso, se adote uma posição ou 
atitude filosóficas. Em certo sentido, é mesmo necessário que 
alguém que procura compreendei o pensamento de um filóso­
fo não permita que suas próprias convicções “atrapalhem” essa 
compreensão. Se queremos entender realmente uma filosofia,
Filosofia e história da filosofia no Ensino Médio* 
duas possibilidades
Com base em tudo o que foi dito acima a respeito do tema 
das relações entre a filosofia e a história da filosofia, pode-se 
encaminhar uma reflexão a respeito da questão: Por que o en­
sino de filosofia deve centrar-se ou pelo menos levar em conta 
a história da filosofia?
Para responder a essa pergunta, é preciso justificá-la, isto 
é, explicar sua relevância.
Não seria de estranhar que estudantes de filosofia do 
Ensino Médio mostrassem certa resistência à ideia de que de- 
vem apiender e conhecer conteúdos de história da filosofia. Se 
liv °S°^a’ como muitas vezes se diz, é algo que nos permite 
soa6™016 eXP°r nossas opiniões, convicções e reflexões pes- 
miÍn°J transformá-la em mais uma disciplina de trans- 
^daparaes^^05- ^ecorat^vos’\ que o estudante memori-Ocorreria tahe^’ t*vesse passado pelas avaliações?
junto de informaçõ^^J°so^a’ transformada em simples con- 
apró°VUie ° Passad°’ risco semelhante a que 
/et história como disciplina escolar.
1 verdade, poderia ser formulada 
Avez a’ e Ser*a Uma °kjeÇà° justa’ 
' c°uteúdoame ^a ideia de reduzir suas 
ie que a fill^V^stória da filosofia. Ele 
t0 Ensino Médio a’ ^Uando apresentada a 
jucutir a c^eve aspirar a algo mais
* Seu esníH?^ade de pensar com 
C^rca e si critico, de forma a 
P^ ’ Para’ talVeZ’ 
Jual,Sejan^xistêncS Por ele, para
ejanaeS' 
artístJ6sejaÇa° em C0‘ 
’Cas- t-JaPara sentir
esse
; — “'«mações sobre se ve submetida a -■
BssaPossive\objeçào;7a' 
pelo propno professOí de ’ 
Esse professor relutará taV ' 
aulas à transmissão de 
provavelmente entendi 
jovens estudantes d< 
do que isso. Deve neles in, 
profundidade e desenvolver 
interrogar o mundo que o < 
encontrar novos caminhos, 
entender e planejar sua p í 
fera de sua conduta individi 
munidade, seja para compreender 
e experimentar as manifestações
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NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ENSINO DE FILOSOFIA: 
o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
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Com base, portanto, na tese de que a filosofia, como uma 
livre atividade de reflexão, não exclui conhecimentos da his­
tória da filosofia - muito ao contrário, tem sempre em mira 
também essa história -, o professor pode traçar e planejar aos 
menos duas distintas estratégias de ensino, que podem ser vis­
tas, afinal, como dois pontos de vista diferentes pelos quais 
abordar e tratar dessa relação, como dois sentidos diferentes 
para caminhar na mesma direção, e que sugerem dois pontos 
de partida alternativos6. Em ambos os casos, caberá ao pro­
fessor fazer escolhas prévias a respeito dos temas e textos que 
considerar adequados para o contexto pedagógico em que se 
situa. Caberá ao professor, portanto, decidir qual lhe parece 
ser o melhor assunto para tratar em sala de aula com seus alu­
nos: questões relativas ao conhecimento? Às ciências? À mo­
ral? A política? A estética? E importante que essa escolha leve 
em conta também os interesses do próprio professor e a maior 
familiaridade com que consegue transitar por um determinado 
tema, procurando assim conciliar esses interesses com a rele­
vância que o assunto lhe parece possuir para seus estudantes, 
ou para o que, segundo o mesmo professor, os estudantes de­
vem obrigatoriamente conhecer nos conteúdos da disciplina.
Na primeira estratégia sugerida, trata-se de escolher um 
tema e, em seguida, selecionar um texto e tomá-lo como ma­
terial exclusivo de análise durante um período determinado. 
Nesse caso, tratar-se-á de proceder à leitura do texto, cuja ex­
tensão, evidentemente, deverá ser adequada ao período plane­
jado. Pode ser um texto completo, desde que não muito longo, 
um capítulo ou mesmo partes menores, e mais uma vez caberá 
ao professor decidir a esse respeito.
A ideia é que o professor coordene e conduza essa leitura, 
de modo a mostrar aos estudantes que o texto trata de uma 
questão filosófica que, ao mesmo tempo, lida com um assun­
to que pode interessá-los e pode ser aproximado de vivências 
e experiências que lhes são familiares. Se essa ligação for 
6 Essas estratégias são fortemente inspiradas nas análises de Leopoldo e Silva, 1986
devemos temporariamente nos despir de nossas próprias opi 
niões e crenças sobre as questões que essa filosofia investiga e 
sobre as respostas que ela dá às perguntas que formula, não im­
portando, nesse caso, se discordamos delas ou com elas concor­
damos. O estudo da história da filosofia, nesse sentido, muito 
diferente do que ocorre na atividade filosófica, parece aspirar, 
portanto, à impessoalidade, a uma espécie de neutralidade.
Contudo, como se buscou mostrar aqui, nada nos obriga 
a encarar a relação entre a filosofia e sua história como uma re­
lação de exclusão. Bem ao contrário, a própria história da filo­
sofia nos revela, com frequência, que os filósofos entenderam 
e entendem suas filosofias como participantes de uma espécie 
de comunidade filosófica, onde habitam numerosas propostas 
com as quais cada um desses filósofos dialoga, em geral criti­
camente. E que cada um deles aspira a formular uma filosofia 
um' aPreen^endo a verdade, se apresenta como ponto final de 
lhes nare* de cont*nuidade, para a qual propõem o que 
herdados0^^^^^0 definitiva dos problemas e temas 
mas e problemas são m reconhecem’ então’ fiue esseS 
e que lhes cabe adot' ,Osobcarnente dignos de consideração 
Eles se incluem semVfi C°m° alvos de SU3S esPecula^õeS‘ 
conhecendo serem com CU'dade nesse numeroso grupo, re- 
verdade, muito provável n! SeUS 'nteresses filosóficos. É, na 
filósofos do passado o qUe oVT^ SÍdo a leitura das obraS de 
senamente as questões qUe 0 a levado a decidir investigar
a »Pós encontrar nessas
AuestOes. Os 
tuação similar, na qUai rSnhVe’^r *VerSaS traje 
res a eles já haviam identificado^ pT^0 C°m Uma S1~ 
questões que agora os provocam^^do^^01^8 anter10' 
que esses antecessores, de algum m^ ^Ue^as mesrnaS 
melhor sobre essas questões, mesmo^’ reconbec’do 
as respostas finais oferecidas. não nararn a pensar
°nc°rdem com
68
69
vimos
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c°ncOrd.
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o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3
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os argumentos que propõe em favor dela, e que também é per­
feitamente possível discordar de uma tese defendida por um 
filósofo, sem, ao mesmo tempo, recusar os argumentos que 
utiliza. Uma das funções dessa atividade de leitura e conheci­
mento das filosofias passadas seria, portanto, a de mostrar aos 
estudantes que pensar filosoficamente não consiste apenas, 
nem mesmo consiste principalmente, em aceitar ou recusar 
uma opinião, mas sim em levar em conta as razões alegadas 
tanto pelo filósofo que afirma algo com que se concorda, quan­
to pelo filósofo que afirma algo de que se discorda. Transferir 
o foco da leitura e compreensão de um texto das teses para os 
argumentos é ensinar a pensar e, consequentemente, mostrar 
como a história das filosofias do passado ainda pode ser rica 
de conteúdos interessantes e portadora de vivacidade.
A segunda estratégia consistiria em adotar não um tex­
to único e completo, mas sim um tema que levará à seleção 
de partes ou passagens de textos, recortadas com base nesse 
tema, escritos por filósofos distintos. Nesse caso, o professor 
poderá traçar uma linha “evolutiva” com esses textos, o que 
lhe permitirá apresentar aos estudantes uma espécie de diálogo 
entre as diversas filosofias a respeito do mesmo tema. Há que 
tomar cuidado com a ideia de uma linha evolutiva: se, por um 
lado, é sempre possível e aceitável que o professor faça de sua 
posição pessoal um critério para a escolha e disposição desses 
textos, de modo que a leitura dos textos culmine com a intro­
dução de uma posição filosófica que particularmente o agrada, 
por outro lado, é também sempre saudável deixar claro aos es- 
tudantes/leitores que esse diálogo pode ser construído de dis­
tintas formas, como processos de interlocução que permitem 
diversos posicionamentos e preferências. Nada impede, aliás, 
que o professor, bem à maneira socrática, disponha os textos 
e oriente as leituras e debates de forma a evidenciar, ou ao 
menos deixar fortemente sugerido aos estudantes, a legítima 
possibilidade de um impasse e que essa linha supostamente 
evolutiva não precisa terminar com uma solução consensual.
estabelecida, garante-se o interesse dos estudantes. Ao profes 
sor caberia, portanto, fazer com que os estudantes “saiam” d 
texto, observando as relações que esse texto sustenta com as 
questões que lhes são mais próximas, mas também que pos­
sam “voltar” a esse mesmo texto, agora para interroga-lo so­
bre essas questões e, então, dialogar com ele, compreendendo 
que respostas ele tem a dar. É um fenômeno comum, na leiturados textos, que o estudante constate que as questões filosóficas 
que o interessam já receberam tratamento filosófico nas filo­
sofias passadas, e que suas próprias posições, muitas vezes, 
estão presentes nessas filosofias. Trata-se então, na leitura, 
de fazê-lo ver que conhecer essas filosofias é muito relevante 
para sua própria reflexão.
O próximo passo será provavelmente o mais importante 
e desafiador: mostrar aos estudantes que não devem simples- 
l^ente julgai o texto, dele discordando ou com ele concor- 
soluçã^ 'mec^ato- Embora seja sempre indesejada qualquer 
filósofo ~Ue s'mplesmente recorra à autoridade do texto do 
diz fosse sen^^ P°r Ser um ^lósofo renomado, o que ele 
dante também me^Or ' do que aquilo que pensa um estu- 
ciaçào desse textoed ^noportuna Qualquer atitude de depre- 
passado mais Gumen^^ ^ósofo, apenas porque viveu num 
estudante para consid^r^^0’ Há decerto uma tendência do 
antiga, e vimos como •L?Uperada” qualquer filosofia muito 
ferentes filosofias. Essa ^rrer até mesmo nas di- 
pelo filósofo^ Concorda ou C?sturna levar o estudante a 
até mais importame d<T’Setn ÍuT' * P°SÍÇã° defe"d‘da 
meios pelos quais 0 tex^e 0 c°nteúd Para al8° Aue e ta0 °U 
tos, em suma, que prOpõe ^nta SUa da te®e defendida: os 
divergem da sua. de] p°S19ào, os argumen-
Cabe ao professor, neSSe * C°ntra posições que 
tes percebam que é perfeitam^0’ c
afirmação feita por um filósofo ! p0ssivei Que os estudan-
aceitar
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REFERÊNCIAS
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Nesta segunda estratégia, por uma via distinta da primei­
ra, também se trataria de estabelecer um diálogo entre os es 
tudantes e os textos. Tratando de temas cuja relevância aos 
estudantes deverá ser sugerida ou mostrada pelo professor 
essas passagens mostrarão um diálogo entre os próprios filó­
sofos, diálogo frequentemente crítico, do qual os estudantes 
agora passarão a fazer parte. Agora, em face de uma gran­
de diversidade de posições a respeito de um mesmo tema, o 
estudante poderá perceber que suas próprias opiniões estarão 
mais próximas das posições de alguns filósofos e mais distan­
tes das posições de outros. E poderá também se dar conta de 
que alguns desses filósofos apresentam boas razões para que 
ele próprio justifique, para si mesmo e para os outros, suas 
opiniões próprias, e que outros, contudo, têm boas razões para 
se posicionar de modo diferente, e que o estudante, então, não 
pode simplesmente ignorar essas razões, devendo com elas 
i ar. Em suma, trata-se de boa forma de apresentar aos es- 
inve^ttS ™a caractcrística historicamente incontomável da 
que toE seu caráter polêmico, a necessidade
jeções posST^0 deVe satisfazer de responder a ob- 
as críticas, tudo ís amentar sua posição própria afastando 
das filosofias em ,evan^° em conta a inevitável inserção 
111 sua história.
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NOVAS TENDÊNCIAS PARA O ENSINO DE FILOSOFIA: 
o contexto de sala de aula e o âmbito das pesquisas | Volume 3

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