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7 CONCLUSÕES 
 
 
 
O presente trabalho tornou possível um amplo conjunto de considerações, 
que vão desde as essencialmente conceituais, relativas ao conceito de 
accountability, até as de viés notadamente pragmático, como é o caso da baixa 
representatividade social nos conselhos gestores de políticas públicas, 
especialmente no CACS, ou da carência de informações relativas aos resultados das 
PPEs geridas pelo FNDE. Trato aqui neste momento das conclusões referentes aos 
objetivos traçados no início da pesquisa e em seguida apresento algumas sugestões 
que se mostraram como potenciais caminhos para superar os problemas históricos 
sentidos pelo FNDE na gestão de prestação de contas. Por fim, lanço algumas 
questões que não estavam dentre os objetivos inicialmente propostos, mas cuja 
relevância tornou-se evidente na longa pesquisa, sendo necessário manter o registro 
como sugestão para estudos posteriores. 
Quanto aos objetivos específicos, ao final do segundo capítulo, concluiu-se o 
percurso para alcançar o primeiro deles, que consistia em discutir o conceito de 
accountability, construindo uma matriz de classificação conceitual para avaliação do 
nível de presença das características da accountability no SiGPC – Contas Online. 
Ponto fundamental a destacar é que foi possível identificar um conceito 
expressivamente elástico, que envolve relações dialógicas intraestatais (modalidade 
horizontal) ou entre o agente público e o cidadão (modalidade vertical), em uma 
interação que visa a garantir que a ação dos representantes não se distancie do 
interesse de seus representados, ou seja, que o agente público mantenha-se fiel ao 
interesse público. 
Em que pese a grande amplitude do conceito de accountability, foi possível 
sistematizá-lo devidamente por meio da organziação em duas dimensões: 1) 
answerability, composta pelos atributos da informação e justificação; 2) enforcement, 
onde se identifica o atributo da sanção. As dimensões e seus atributos foram 
dispostos nas linhas da Matriz de Classificação Conceitual, e permitem identificar a 
presença destas características constituintes da accountability. Para finalizar a 
matriz, as modalidades foram caracterizadas nas colunas, por sua vez,organizadas 
em modalidade horizontal (intraestatal) e vertical, esta última subdividindo-se em 
eleitoral e societal. Com a organização das dimensões do conceito em linhas e das 
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modalidades em colunas, gerou-se uma estrutura que permite avaliar se 
determinado instrumento possui os atributos da accountability e, neste caso, a qual 
modalidade corresponde. A forma generalizante utilizada para construir a referida 
matriz permite seu uso em diversos outros estudos, sempre que o objetivo for avaliar 
a identificação da presença dos elementos característicos da accountability em 
determinado contexto. 
O segundo objetivo específico estabelecido foi o de identificar mecanismos de 
controle presentes na organização da administração pública brasileira, e seu alcance 
na gestão de programas e projetos educacionais. Neste fito, a discussão traçada no 
Capítulo III tratou detidamente da estrutura de controle existente na administração 
pública federal, sistematizada em: 1) controle externo, a cargo do Congresso 
Nacional, com apoio do TCU; 2) controle interno, que no Poder Executivo é centrado 
nas competências da CGU; e 3) Controle Social. 
Tanto o controle externo quanto o interno identificam-se claramente com a 
modalidade horizontal, ou seja, com um sistema de controle intraestatal. Além disso, 
estão claras as prerrogativas legais que conferem ao exercício destes controles os 
atributos necessários à caracterização da accountability: informação, justificação e 
sanção. Entretanto, pode-se perceber, dentro do objeto da pesquisa, que o foco nos 
resultados das políticas públicas é reduzido, sendo por vezes os controles 
demasiadamente formais e menos preocupados com os resultados das políticas 
públicas. Embora esteja sinalizada uma tendência de evolução no que diz respeito a 
este foco no processo, percebe-se as limitações do modelo em duas dimensões: 1) 
a falta de clareza quanto aos próprios resultados esperados da execução das PPEs 
no modelo de descentralização (vigente e predominante); 2) a falta de efetividade 
dos controles interno e externo em exigir o refinamento do processo de prestação de 
contas, haja vista que recomendações neste sentido estão em pauta nas 
recomendações dos órgãos de controle há mais de duas décadas, sem que 
ocorressem efetivos avanços. 
A falta de definição quanto aos resultados desejados com a implementação 
de determinada PPE dificulta o exercício da accountability, pois para que ela esteja 
presente é primordial que os resultados sejam conhecidos. Ainda, a existência de 
extensa malha de controle com reduzida capacidade de desencadear mudanças 
demonstra pouco alinhamento aos princípios da accountability que, por essência, 
quando percebido que a ação do Estado, por meio de agentes públicos, diverge do 
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interesse público, precisa ser capaz de corrigir estes passos, inclusive, de impor esta 
correção ou, ao menos, punir quem deixou de fazê-lo. Se, como é o caso do advento 
do SiGPC – Contas Online, uma mudança cuja necessidade é objeto de antigo 
diagnóstico posterga-se por décadas, a ineficiência dos controles resta evidente na 
modalidade horizontal, no caso, no âmbito do governo federal. 
Além disso, tanto controle interno quanto externo estendem seu alcance para 
além da esfera federal sempre que recursos da União são descentralizados. Isto 
significa dizer que, por essência, a estrutura de controle prevista para a 
administração pública federal não haveria de ocupar-se com a ação de gestores 
estaduais, municipais, distritais ou mesmo com a direção de instituições privadas 
sem fins lucrativos. Porém, quando verbas do erário federal são repassadas a outras 
esferas, o olhar do controle acompanha o percurso daquilo que lhe é dado a 
controlar: o dinheiro. Com isso, parte do universo de recursos federais dissemina-se 
para outras esferas e sua execução mistura-se com as diversas outras ações 
executadas nestas esferas, gerando uma malha altamente complexa de 
financiamento e execução, que dificulta um discernimento que é precípuo à 
accountability: que a sociedade saiba claramente quem é responsável pelo quê. 
Já em relação aos controles verticais percebeu-se que os conselhos são a 
principal bandeira utilizada para indicar a participação da sociedade, em nosso atual 
modelo de gestão pública. Com a utilização da Matriz de Classificação Conceitual, 
foi possível perceber que, em que pese a elasticidade do conceito de accountability, 
a realidade brasileira não é devidamente representada pelas abordagens tratadas 
nesta pesquisa, haja vista que é patente na literatura especializada que, para haver 
accountability, é necessário que Estado e sociedade, ao mesmo tempo que 
interagem, sejam claramente diferenciáveis, o que não ocorre quando se analisa o 
modelo de controle social baseado em conselhos gestores de políticas públicas, 
responsáveis legalmente por – e portanto obrigados a – acompanhar e emitir 
pareceres sobre a execução de diversos recursos, notadamente aqueles do PNAE, 
do PNATE e do PAR. Ocorre que, embora tais conselhos contem com a participação 
de representantes de alguns segmentos da sociedade, inclusive de pais e alunos, é 
forte a participação de agentes públicos em sua composição, o que compromete que 
tais colegiados tenham de fato o caráter que seu adjetivo promete, ou seja, os 
conselhos são, de fato, conselhos híbridos, não podendo ser tratados como 
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essencialmente sociais, mas sim conselhos com participação social. E em diversos 
casos, participação minoritária. 
Com isso, por serem tais colegiados normalmente identificados tipicamente 
como controle social, o enquadramento na Matriz de Classificação Conceitualfoi 
realizado na modalidade vertical. Porém, uma vez que tais conselhos assumem 
obrigações em nome do Estado, passam a confundir-se com ele e, por serem 
instituídos formalmente e obrigados a cumprir com determinadas atribuições, 
confundem-se com o próprio Estado e, por conseguinte, com a modalidade 
horizontal. Ou seja, o modelo de controle exercido sobre as PPEs no que concerne à 
participação dos conselhos sociais não pode ser devidamente qualificado por 
qualquer dos conceitos de accountability estudados, especialmente quanto à 
classificação relativa à modalidade. 
Desta forma, para estudar mais acuradamente a classificação do modelo de 
controle existente na gestão das PPEs no Brasil em relação à presença do princípio 
da accountability, deve-se avaliar, para estudos futuros, a inclusão de uma 
modalidade intermediária à horizontal e vertical, ou seja, uma modalidade que, 
dotada de características típicas da horizontal, tal como a obrigação de exercer o 
controle, conta com a participação de atores típicos da modalidade vertical, numa 
conjuntura que configuraria, então, uma modalidade transversal. 
O terceiro e último objetivo específico levou à análise dos elementos do 
Sistema de Gestão de Prestação de Contas do FNDE, bem como a visão dos 
gestores responsáveis por sua implantação, a fim de identificar possíveis relações 
com o conceito de accountability. O primeiro ponto relativo a este intento refere-se 
ao próprio conceito-chave desta pesquisa, pois foi percebido que a noção de 
accountability não é elemento que povoa o posicionamento dos gestores do FNDE 
na investida de implantação do SiGPC – Contas Online, embora estes demonstrem 
preocupação com alguns aspectos correlatos ao conceito, em especial quanto às 
preocupações com a formação de uma robusta base de informações. 
A análise dos itens componentes do sistema apresentou resultados 
consoantes com a visão dos gestores, haja vista ser o atributo informação o mais 
evidente no sistema. A disponibilidade de tais informações à sociedade e aos órgãos 
de controle interno e externo, que é tratada pelos gestores como ponto fundamental 
do sistema, ainda não se materializou, bem como não há evidências de que vá 
tornar-se realidade em curto espaço de tempo. Ou seja, embora os entrevistados 
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evidenciem a perspectiva de disponibilizar vasta gama de informações aos mais 
diversos interessados, no que concerne à sociedade ampla, a disponibilidade não 
existe em medida alguma: não há acesso público de quaisquer informações do 
sistema, exceto aquelas que divulgam a liberação dos recursos e os extratos das 
contas específicas, o que ocorre independente da existência do SiGPC – Contas 
Online. Ainda, restou evidente nas entrevistas que os gestores possuem muitas 
reservas quanto à disponibilização ampla das informações, tratando sua 
disponibilização, muitas vezes, como a última etapa do controle, enquanto haveria 
de ser preliminar às demais, haja vista ser o acesso à informação um subsídio 
necessário a ações de outras instâncias de controle, notadamente o controle social 
propriamente dito. 
Além disso, é preciso avaliar detidamente o tipo de informação que está 
sendo concentrada no sistema e, portanto, o tipo de informação que poderá ser 
disponibilizado à sociedade, quando e se isso vier a ocorrer. Quanto a isso, foi 
possível perceber que a maioria absoluta das informações recepcionadas no sistema 
é relativa ao ciclo de execução das despesas: registro de informações básicas do 
processo licitatório ou afim, registro de notas fiscais ou equivalentes, registros de 
pagamentos. Para além disso, as informações são extremamente sintéticas, sendo 
praticamente inexistentes os indicadores de resultados. Ou seja, destaca-se o 
aspecto legal e financeiro da execução, em detrimento de informações relativas aos 
benefícios gerados pela execução de determinada PPE. Esse conjunto de 
características impõe ao SiGPC – Contas Online um viés fortemente associado ao 
modelo burocrático de administração pública, mesmo inserido em um contexto de 
descentralização, princípio característico do paradigma gerencial. 
Essa evidencia de viés burocrático da administração não é inaugurada, nem 
fortalecida pelo SiGPC – Contas Online, mas mantida e evidenciada nele. Com essa 
forte presença de foco no processo, os elementos que mais poderiam favorecer a 
accountability ficam dificultados, especialmente para sua modalidade vertical, pois 
mesmo que não seja tarefa simples à sociedade avaliar se os resultados alcançados 
por um governo convergem com o interesse público, é um obstáculo severamente 
maior para o cidadão conhecer todo o processo seguido por seus representantes e, 
a partir disso, tentar identificar e avaliar resultados. Conhecer e avaliar esse 
processo, inclusive, será menos estimulante ao controle social do que tratar da 
avaliação dos benefícios percebidos. 
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Assim, percebe-se a tendência a ser criado um robusto repositório de 
informações, porém, constituído de tal forma que a transformação em conhecimento, 
se não inviável, é deveras desafiadora ao cidadão comum, mesmo àquele dotado de 
conhecimentos básicos que haveriam de lhe permitir o exercício da cidadania. E 
mesmo que se possa extrair destas informações algum conhecimento, este não será 
o mais relevante se considerarmos – como faço – que ao cidadão interessa de fato 
conhecer os resultados gerados pela ação de seus representantes muito mais do 
que acompanhar os procedimentos que estes seguiram. 
Ainda a existência do atributo informação aos potenciais agentes accounting 
não implica na existência de accountability, pois para que isso ocorra é preciso que 
se viabilize a relação dialógica entre os atores, o que demanda a presença do 
atributo da justificação, o qual apresenta fraca presença no sistema, tanto no que já 
está implementado quanto nas projeções indicadas pelos gestores. Deste modo, os 
resultados permitem concluir que o sistema apresenta significativa presença de 
elementos relacionados à accountability, entretanto, as ênfases estão nos atributos, 
primeiramente, da informação e, em seguida, da sanção. 
A presença destes dois atributos em nível expressivamente superior ao de 
justificação sinaliza que o instrumento não se propõe precisamente a construir uma 
relação dialógica entre os atores, mas sim uma relação estritamente de controle, 
com caráter mais impositivo do que colaborativo. Afinal, o que se percebe é a lógica 
de o governo central definir as regras, objeto e objetivos, transferir recursos e exigir 
que os recursos sejam utilizados dentro do escopo previsto, sem os quais sanções 
haverão de ser aplicadas, com fraca possibilidade de justificativas e, por 
conseguinte, pouca relevância às peculiaridades locais e dificuldades de percurso e, 
inclusive, com pouca relevância aos resultados alcançados. 
Com isso, fica reforçado o argumento de que a descentralização é realizada 
com caráter desconcentrador e, por consequência, os gestores locais têm sua 
possibilidade de decisão restrita, o que implica igualmente em redução das 
possibilidades de accountability em relação às esferas locais, afinal, para que um 
ator possa ser accountable, ele precisa estar imbuído de poder. Sendo este poder 
inscrito em regras rígidas e a elas limitado, pode haver forte controle, mas não se 
poderá tratar este controle como accountability. 
Neste ponto, cabe resgatarmos a questão inicial que representa a 
problemática tratada neste trabalho: o Sistema de Gestão de Prestação de Contas 
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(SiGPC – Contas Online) do FNDE pode ser considerado um instrumento que 
favorece o fortalecimento da accountability na gestão pública em educação? 
Em relação a esta questão norteadora, as conclusões obtidas permitem 
avaliar a hipótese proposta no início do trabalho, de que: o SiGPC – Contas Online 
apresenta expressivo potencial para favorecer a accountability nagestão pública. 
Porém, o ponto decisivo para tornar efetivo seu potencial é como será preenchido o 
espaço discricionário de sua implementação, que tenderá a dedicar-se mais aos 
aspectos formais e de legalidade, em detrimento de ações proativas ligadas a 
princípios do modelo gerencial de administração pública. 
A primeira parte da hipótese, pelas discussões acima, foi verificada, pois se 
conclui que o SiGPC – Contas Online possui potencial para favorecer a 
accountability, ainda que de forma moderada, e este potencial poderá tornar-se 
efetivo de acordo com as opções tidas pelos gestores em sua implementação. 
Contudo, a baixa presença do atributo justificação pode enviesar o liame entre a 
informação e a sanção. Assim, para garantir que o sistema contribua para o 
fortalecimento da accountability política na gestão de programas e projetos 
educacionais, o FNDE precisa garantir que o sistema possa atuar como meio para a 
relação dialógica entre a Autarquia e os responsáveis pela execução, bem como 
entre quaisquer destes atores e a sociedade, seja por meio dos conselhos ou não. 
Além disso, é preciso que sejam expressos claramente os resultados esperados de 
cada PPE e que o sistema contenha indicadores representativos destes resultados. 
Sem isso, o potencial do sistema quanto ao fortalecimento da accountability tornar-
se plenamente inócuo. 
Além disso, é fundamental destacar que as conclusões apontam que existe 
um potencial moderado para favorecer a accountability. Entretanto, no atual estágio 
do desenvolvimento e uso do sistema, associar seu uso ao princípio da 
accountability seria reduzir severamente o conceito. Ou seja, para que o potencial do 
sistema torne-se efetivo é imprescindível que as projeções sejam levadas a efeito, 
complementadas por ações que visem dotar o sistema de condições para refletir os 
resultados de cada PPE, além de elementos que permitam a relação dialógica entre 
os atores envolvidos. 
Quanto ao segundo ponto da hipótese – de que as decisões discricionárias 
para a implementação podem limitar o potencial do sistema, na medida em que 
tenderão a priorizar aspectos legais e formais em detrimento daqueles que tratam da 
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avaliação dos benefícios gerados –, pelo atual estágio do sistema, não é possível 
apresentar resposta conclusiva, pois, por um lado, se percebe que até o momento o 
que há no sistema apresenta características de um modelo burocrático, com elevado 
foco no processo em detrimento de informações relativas aos resultados alcançados. 
Por outro lado, o posicionamento dos gestores quanto às suas pretensões traz, 
ainda que não de maneira uniforme, expectativas de cunho gerencial. Por isso, o 
teste efetivo da segunda parte da hipótese dependerá de avanços no sistema e, por 
isso, precisará ser mantido em aberto para estudo posterior. 
Como discutido ao longo deste estudo, a accountability nasce, entre outros, 
da intencionalidade de construir instrumentos que a viabilizem e pode-se concluir 
que, ao menos até o momento, esta intenção não está evidenciada no SiGPC – 
Contas Online, que é proposto e ainda percebido no intuito de superar um problema 
crônico do modelo exercido, e não de efetivamente modificar o modelo, abrindo 
espaço para a efetiva avaliação da gestão do que é público. Assim pode-se concluir 
que o advento do referido sistema mostra-se como uma medida retroativa, pois 
emerge como resposta a um problema histórico, cuja solução tem sido 
sucessivamente postergada, e que é materializado pela incapacidade de analisar 
tempestivamente as prestações de contas recebidas em razão da descentralização 
de recursos. 
O sistema visa a conferir ao controle exercido pelo FNDE, sobre a utilização 
dos recursos por ele transferidos, um mecanismo que condiga com os dias atuais, 
tanto no aspecto tecnológico quanto no atendimento às demandas dos órgãos de 
controle interno e externo, evitando que a autarquia persista a exercer o controle 
depois de decorridos muitos anos da execução, mas não evidencia elementos 
suficientes para sugerir os refinamentos dos quais a democracia brasileira carece. 
Em síntese, pode-se dizer que evoluem os meios utilizados para exercer o controle, 
mas não se altera a sua essência e, enquanto isso perdurar, pode-se qualificar o 
sistema como poderoso mecanismo de controle, mas não se constrói a 
accountability. 
A expectativa que se depreende da norma que rege o sistema – 
especificamente da Resolução CD/FNDE nº 02/2012 –, bem como das entrevistas 
realizadas com os gestores, das notícias que têm sido disseminadas no sítio do 
FNDE e das apresentações que têm sido feitas pelo Brasil todo é de que o sistema 
demonstra ser precipuamente um mecanismo de ação proativa na transparência das 
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informações e na busca da garantia do alcance de resultados efetivos nas PPEs 
financiadas com recursos transferidos pela Autarquia, para de fato contribuir para 
uma educação pública de qualidade. Esta é a face da questão que ainda necessita 
ser mais aprofundada. E, com ela, será possível que o SiGPC – Contas Online 
evidencie também a maior identificação com os atributos da accountability. 
Para que isso ocorra, porém, é imprescindível que o FNDE reveja alguns 
aspectos concernentes ao sistema, especialmente: 1) é necessário que, para cada 
programa ou projeto, conste no sistema claramente qual é o benefício público que 
precisa ser gerado; 2) os benefícios públicos precisam ser traduzidos em 
indicadores, que por sua vez também devem constar no sistema, de forma que os 
responsáveis pela execução possam informar os resultados alcançados; 3) é 
imprescindível que haja no sistema espaços para que os responsáveis prestem 
esclarecimentos quanto aos resultados obtidos, a fim de evidenciarem 
externalidades que tenham afetado os resultados; 4) os dados consignados no 
sistema devem ser, a qualquer tempo, de acesso público, e todo cidadão comum 
precisa dispor, de forma simples e célere, de informações claras e significativas, que 
possam ser por ele avaliadas. 
Quando foi iniciada esta pesquisa, a expectativa era de que antes do seu 
término o processo de implantação do SiGPC – Contas Online estivesse em fase 
final ou já concluído, o que refinaria em muito as conclusões obtidas. Isso não 
ocorreu limitando os resultados obtidos. Porém, ao considerar que os resultados 
aqui obtidos serão apresentados ao FNDE, pode-se também esperar que o aparato 
teórico e os resultados da análise realizada nesta pesquisa possam, no atual estágio 
do processo de implantação do sistema, contribuir como subsídio para uma melhoria 
significativa da gestão de prestações de contas na autarquia. 
Por ora, é preciso considerar que o decurso do tempo, conforme discutido no 
Capítulo II, é também um fator determinante para a viabilização de práticas de 
accountability. Como se viu, pelo modelo anterior de prestação de contas era 
impensável a associação entre a análise das prestações de contas e a 
accountability, haja vista que o tempo médio entre a apresentação de uma prestação 
de contas e a sua análise é de aproximadamente 5 anos, tempo superior ao de um 
mandato eletivo para cargos do executivo de qualquer das esferas. 
Com o advento do SiGPC – Contas Online essa dificuldade não foi superada 
de imediato. Ao contrário, o tempo para que as primeiras prestações de contas, 
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relativas aos recursos transferidos e executados ao longo de 2011, fossem 
registradas e enviadas por meio do sistema foi de cerca de 2 anos após o término da 
execução. Ou seja, o tempo perdura excessivo para que se possa falar em 
viabilização de uso das informações para fortalecer a accountability. Contudo, para 
as prestações de contas relativas ao ano de 2012 o tempo vem sendo reduzido para 
um ano e, a partir de 2013, a recepção das informações poderá ser tempestiva. 
Em relação ao tempo para a análise, não se tem ainda um panorama capaz 
de permitirconclusões, pois não estão implementados os recursos necessários para 
que se proceda à análise de prestações de contas com auxílio do sistema. A 
contribuição do SiGPC – Contas Online para qualificação do processo de controle e 
contribuição para fortalecimento da accountability depende em grande parte do quão 
tempestivo o FNDE conseguirá ser nas análises, ponto que persiste inconclusivo. 
Assim, uma questão que persiste em aberto é: em que medida o SiGPC – Contas 
Online contribui para a redução da intempestividade das análises das prestações de 
contas de programas e projetos educacionais? 
Alguns outros pontos demonstraram merecer atenção ao longo da pesquisa, 
sem que tivessem sido considerados nos objetivos iniciais. Vale, porém, registrá-los 
como possíveis focos de investigações futuras. O primeiro destes pontos tem a ver 
com a afirmação de que, para que se estabeleça uma efetiva accountability, é 
preciso ter clareza de quem é responsável pelo quê. Nas relações intraestatais essa 
identificação é factível, sem grandes obstáculos. Porém, enquanto os agentes 
públicos estão sempre associados a determinada esfera da administração pública – 
municipal, estadual e federal –, com competências determinadas, a sociedade não é 
de tal forma segmentada. Desta feita, a separação por esfera só faz sentido em 
relação aos atores accountable ou aos accounting da modalidade horizontal. 
O cidadão o é estadual, municipal e federal, concomitante e cumulativamente. 
Por isso, a sociedade também se interessa pela ação do governo em qualquer de 
suas esferas. Mesmo assim, o cidadão não necessariamente conhece de forma 
clara as competências de cada ente e, por consequência, de cada agente público. 
Além disso, em nosso objeto de estudo tratamos das PPEs voltadas à educação 
básica, cuja competência de oferta é essencialmente municipal e estadual. Ou seja, 
se a sociedade vigilante perceber eventual desvio de recurso que está sendo 
aplicado na educação básica, como saberá se tais recursos são federais, estaduais 
ou municipais? A malha de financiamento é complexa e mereceria mais atenção,

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