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HISTORIA_DA_REFORMA_PSIQUIATRICA (1)

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MATERIAL DIDÁTICO 
 
 
HISTÓRIA DA REFORMA 
PSIQUIÁTRICA 
 
 
 
 
 
CREDENCIADA JUNTO AO MEC PELA 
PORTARIA Nº 1.004 DO DIA 17/08/2017 
 
0800 283 8380 
 
www.faculdadeunica.com.br 
 
 
Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de 
direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios 
eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e 
recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. 
2
 
SUMÁRIO 
 
UNIDADE 1 - INTRODUÇÃO ...................................................................................... 3 
UNIDADE 2 - ÍCONES DAS CIÊNCIAS DA MENTE .................................................. 5 
UNIDADE 3 - EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PSIQUIATRIA E SAÚDE MENTAL .... 20 
UNIDADE 4 - A REFORMA PSIQUIÁTRICA E OS DISCURSOS 
CONTEMPORÂNEOS DA SAÚDE MENTAL ........................................................... 29 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 44 
 
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direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios 
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3
 
UNIDADE 1 - INTRODUÇÃO 
 
A reforma psiquiátrica ou antimanicomial ou, ainda, antipsiquiatria implica na 
mudança e implementação de determinados valores éticos, de compromissos 
profissionais, acadêmicos, políticos e de gestão que se antagonizam a perspectivas 
anteriores que serviam a outros princípios filosóficos, de perversão e acomodação 
política e naturalmente na lógica da centralização do capital privado (STOCKINGER, 
2007). 
Essa reforma começa em 1961, na Itália, liderada por Franco Basaglia, com 
as influências da psicoterapia institucional e da comunidade terapêutica e a 
transformação do hospital psiquiátrico de Gorizia com a qual se buscava a 
separação da internação manicomial. 
Nos EUA, o processo de desospitalização significou o fechamento dos 
hospitais psiquiátricos, objetivando reduzir despesas do Estado, sem ter a 
contrapartida adequada da criação de serviços comunitários, configurando-se no 
fenômeno “os loucos na rua”. 
No Brasil, o modelo clínico expandiu-se e contou com importante impulso 
durante o processo de industrialização nos anos 70, quando ocorreu uma grande 
expansão da indústria farmacêutica e de equipamentos médico-hospitalares. 
Chama-se a atenção para o fato de que enquanto o mundo voltava-se para a 
desospitalização, o Brasil, sob o cenário do golpe militar, investia na extensão dos 
cuidados psiquiátricos através do aumento de leitos e da multiplicação da rede 
privada contratada (KANTORSKI, 2001). 
A superação do modelo manicomial encontra ressonância nas políticas de 
saúde do Brasil que tiveram um marco teórico e político na 8ª Conferência Nacional 
de Saúde (1986), na 1ª Conferência Nacional de Saúde Mental (1987), na 2ª 
Conferência Nacional de Saúde Mental (1992), culminando na 3ª Conferência 
Nacional de Saúde Mental (2001). 
Observa-se, na reforma psiquiátrica brasileira, nas últimas décadas, 
intercalação de períodos de intensificação das discussões e de surgimento de novos 
serviços e programas, com períodos em que ocorreu uma lentificação do processo. 
Historicamente, podemos situar as décadas de 1980 e 1990 como marcos 
 
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direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios 
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recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. 
4
 
significativos nas discussões pela re-estruturação da assistência psiquiátrica no país 
(HIRDES, 2009). 
Veremos ao longo dessa apostila a evolução das pesquisas de alguns ícones 
da Psiquiatria, ressaltando que até o século XIX não havia um pensamento médico-
científico sistematizado sobre a doença mental, e o louco não era assumido pela 
medicina como doente sob responsabilidade de seu campo de ação. Nos grandes 
asilos para alienados juntavam-se toda sorte de indivíduos pertencentes às minorias 
que representavam diversos problemas sociais, desde mendigos e delinquentes a 
prostitutas e loucos de rua. 
Se considerarmos as bases do pensamento científico sobre o qual a 
psiquiatria do século XIX apoiou-se, veremos que o trabalho de Pinel e seus 
seguidores representou uma verdadeira revolução de ideias (PACHECO, 2003). 
Enfim nosso objetivo nesta apostila será: 
• Conhecer os ícones que construíram a história da psiquiatria; 
• Descrever os fatos mais importantes da história da Psiquiatria e da Saúde 
Mental; 
• Analisar a reforma psiquiátrica e os discursos contemporâneos da Saúde 
Mental; 
• Refletir criticamente a reforma da Saúde Mental no Brasil. 
Salientamos que este trabalho é uma compilação de escritos que 
consideramos importantes para compor o curso de Gestão em Saúde Mental e que 
lacunas podem eventualmente surgir. Assim deixamos ao final uma lista de 
referências consultadas e utilizadas onde poderão aprofundar os estudos. 
Boa leitura a todos! 
 
 
 
 
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5
 
UNIDADE 2 - ÍCONES DAS CIÊNCIAS DA MENTE 
 
Não temos como falar em reforma psiquiátrica sem promover uma 
retrospectiva histórica da desatenção ou exclusão dos portadores de doenças 
mentais. E evidentemente, falar de médicos e pesquisadores que deram sua 
contribuição para o estudo da ciência do comportamento. 
Carlos Batista Lopes (2001) em um artigo intitulado “Desafios Éticos atuais da 
Psiquiatria” nos leva a refletir em uma consideração muito pertinente que justifica 
esse capítulo. 
É bem verdade que pouquíssima gente sabe quais eram as concepções, por 
exemplo, de Pinel sobre as doenças mentais ou, menos ainda, quais eram os 
tratamentos por ele prescritos (ouve-se falar em Pinel numa alusão aos loucos ou ao 
lugar destinado a eles). Trata-se de um conhecimento restrito aos historiadores e 
aos médicos dotados de especial curiosidade. 
Todos sabem que ele foi um dos primeiros – ou pelo menos dos mais 
importantes – a considerar que os psicóticos e os neuróticos eram pessoas 
acometidas por doenças. Em suma, sua grande contribuição está em ter dado 
dignidade humana aos doentes e à doença mental, em reconhecer seres humanos 
no que antes eram supostas “feras” ou “simuladores” indecentes. Ao retirarem a 
doença mental do campo da condenação pela moral oficial para inseri-la no campo 
da medicina, conferiram novo patamar moral aos pacientes e à ciência. 
Sendo assim tentaremos mostrar um pouco da história desses pesquisadores 
que vieram ao longo dos séculos construindo o novo modelo de entendimento que 
temos hoje na saúde mental. 
A história de cada um tem detalhes que não conseguiríamos expor a todos, 
portanto, se ficarem lacunas sugerimos que sejam curiosos, pesquisadores e 
aprofundem para sanar suas dúvidas. 
Jean-Étienne Dominique Esquirol (1772 – 1840) foi o precursor da 
psiquiatria científica proposta por Pinel. É reconhecido entre os grandes clássicos da 
psiquiatria francesa da primeira metade do século XIX, considerado representante 
da psiquiatria alienista francesa e que ajudou a consolidar a ideia de loucura como 
doença. 
 
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direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios 
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6
 
Esquirol posiciona-se como um dos marcos na fundação do pensamento 
psicopatológico contemporâneo. Desenvolveu um trabalho de continuação da obra 
de Pinel, como um de seus mais talentosos discípulos, e marcou sua atuação pela 
utilização sistemática da observação que lhe permitiu grande aprofundamento do 
trabalho clínico e uma delimitação precisa de quadros nosográficos da nascente 
psiquiatria contemporânea (PACHECO, 2003). 
É o estudioso que diferenciou demência (doença mental) e amência 
(deficiência mental), nas palavras dele, o primeiro é louco, o segundo é idiota. É 
com Esquirol que a idiotia deixa de ser considerada uma doença e o critério para 
avaliá-la passa ser o rendimento educacional. O médico, em consequência, perde a 
palavra final no que diz respeito à deficiência mental, abrindo as portas dessa nova 
área de estudo ao pedagogo. 
Se considerarmos as bases do pensamento científico sobre o qual a 
psiquiatria do século XIX apoiou-se, veremos que o trabalho de Pinel e seus 
seguidores representou uma verdadeira revolução de ideias. 
Apesar de a loucura ter sido efetivamente considerada pertencente ao campo 
da medicina desde o final do século XVII, ainda não havia modelos ou definições 
claras, tampouco sistematizações nosográficas que pudessem caracterizar 
diferentes espécies clínicas do vasto gênero “loucura”. Eram muito grandes as 
variações entre os padrões que definiam os transtornos psíquicos: não se tinha uma 
visão abrangente e as descrições limitavam-se a algumas particularidades de 
sintomas (PACHECO, 2003). 
A transformação metodológica introduzida por Pinel e Esquirol, fundamentada 
na observação clínica sistemática e na delimitação de categorias psicopatológicas 
estáveis, inscreve-se historicamente em um momento em que a medicina tinha a 
clara preocupação de diferenciar-se da filosofia, da psicologia e da religião, cujos 
objetos de conhecimento transcendem o corpo ou a matéria, indagando sobre temas 
espirituais, lógico-discursivos e/ou ético-estéticos. As ciências médicas buscavam, 
então, firmar seus princípios baseados em critérios objetivos e com nítida 
aproximação dos métodos das ciências naturais. O diagnóstico médico não podia, 
portanto, prender-se na observação do comportamento, para não sofrer a 
indesejável interferência de dados subjetivos (ALVAREZ, 2010). 
 
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7
 
Firmava-se a concepção de “doença mental” como uma decorrência de 
distúrbios orgânicos provindos de disfunções de estruturas orgânicas, ou ainda de 
lesões anatômicas ou funcionais do encéfalo, e que se refletiam no comportamento 
sob a forma de sintomas. 
Contudo, a preocupação de Pinel e, em seguida, de Esquirol era menos a de 
construir uma teoria biológica da loucura do que conhecer e bem delimitar suas 
apresentações clínicas. 
Pinel introduziu a concepção da loucura como consequência das paixões 
exacerbadas, e o louco como vítima de uma desorganização das funções mentais 
superiores do sistema nervoso central, ou seja, das funções intelectuais, 
pressuposto que deu nova direção à psiquiatria do final do século XVIII e início do 
século XIX. 
Este grande alienista francês impôs em seu trabalho uma preocupação com a 
classificação nosográfica e, em sua clínica, uma prática inovadora: a observação 
empírica sistemática e o tratamento moral. Ao considerar o indivíduo alienado como 
doente mental, vítima de disfunções psíquicas, Pinel deu a eles o direito de serem 
ouvidos e conferiu à medicina a necessidade de entendê-los e tratá-los humana e 
respeitosamente. Foi, portanto, um dos primeiros médicos psiquiatras a conceder o 
estatuto de dignidade aos loucos, diferenciando-os dos bandidos e dos criminosos 
comuns, e transformando com essa abordagem, o conceito de instituição para 
doentes mentais. 
Quanto à etiologia, Pinel reconhece as causas hereditárias como 
responsáveis pela doença, mas ressalta a influência essencial de outros fatores não 
hereditários, como os acontecimentos externos e as emoções violentas, 
determinando o quadro mórbido. Focalizou sua atenção sobre a mania ou delírio 
total, que considerou como a forma mais típica e mais comum de loucura. Esquirol, 
em seguida, por sua visão ampla e seu comprometimento com o trabalho clínico, 
imprimiu mudanças expressivas na psiquiatria de sua época, prosseguindo e 
aprofundando o trabalho de Pinel. Mesmo conservando o pressuposto das causas 
físicas e morais atuando simultaneamente na determinação da doença mental, 
Esquirol representou um avanço expressivo no plano teórico ao propor nova 
 
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sistematização nosográfica, a partir de uma análise fina e de uma diferenciação mais 
detalhada das síndromes psicopatológicas (ALVAREZ, 2010). 
No campo mais específico do saber e da prática psiquiátrica, Esquirol também 
produziu uma mudança importante ao rever o conceito de melancolia depois de 
pesquisá-la e descrevê-la longamente. 
Ordenou então sua classificação nosográfica, diferenciando quatro grupos 
principais de doenças mentais, por meio dos quais procurou separar as perturbações 
de fundo claramente orgânico das perturbações de natureza psíquica, consideradas 
disfunções mentais: 
• Idiotia: que pode ser congênita ou adquirida, mas constitui uma categoria 
bastante diferenciada das que agrupam os problemas propriamente 
psíquicos. 
• Demência: na forma aguda, passível de cura, e na forma crônica, 
praticamente incurável. 
• Mania: que se refere ao delírio total com exaltação. Seria uma alteração 
generalizada das funções mentais, como a inteligência, percepção, volição, 
atenção. 
• Monomanias: que agrupa todas as perturbações mentais que trazem 
prejuízos psíquicos apenas parciais, conservando perfeitas outras funções 
intelectuais. 
O delírio é parcial e pode ter uma forma alegre ou uma forma triste. 
Aqui se encontra a contribuição mais original e também mais controvertida de 
Esquirol: a separação da melancolia, da antiga classificação de Pinel, em duas 
categorias diferentes – a mania e a lipemania, umas das formas de monomania. 
Esse termo foi escolhido por ele com o objetivo de resolver as ambiguidades 
e confusões que a palavra melancolia comportava. 
A lipemania consistiria num delírio intelectual, de natureza depressiva, 
situado em primeiro plano e que acabaria por afetar toda a vida do paciente 
incapacitando-o para as mais simples atividades. Esta designação não permanece, 
todavia, muito tempo na nosografia psiquiátrica: o termo melancolia volta a ser 
utilizado numa categorização reformulada. 
 
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No que se refere à terapêutica, Esquirol deu continuidade à prática de um tipo 
de tratamento diferenciado: o tratamento moral iniciado por Pinel. Esta abordagem 
estruturou-se em decorrência dos pressupostos teóricos a respeito da loucura que, 
deixando de ser exclusivamente organicista, passou a considerar o aspecto 
psicológico como fundamental na determinação da doença. As experiências vividas 
pelo paciente adquirem assim um novo valor como dados a serem observados e 
considerados no conhecimento de suas funções mentais. A compreensão dessas 
funções mentais já não se dá pela noção de sistemas gerais de explicação causal e, 
dessa forma, se o adoecer é parte da experiência sensorial do sujeito, a loucura 
pode ser um estado reversível. 
Esquirol situou-se nesses princípios para melhor sistematizar o conhecimento 
e a prática psiquiátrica de sua época. Endossou a ideia de que as paixões 
exacerbadas poderiam desencadear as grandes perturbações mentais e considerou 
também que os procedimentos terapêuticos capazes de apaziguá-las seriam um 
meio de reconduzir o doente a encontrar a coerência entre a realidade percebida 
pelos sentidos e as funções mentais, pelas suas ideias, raciocínios, julgamentos. 
O tratamento moral tinha, portanto, um sentido educativo que envolvia 
aspectos ambientais e sociais. No entanto, a ideia de que através dos métodos 
psicológicos seria possível corrigir erros na lógica de pensamento e raciocínio 
daqueles que se afastavam da norma admitida como correta, implica uma questão 
ética que podia facilmente justificar condutas arbitrárias ou coercitivas. 
E nesse sentido Esquirol teve uma postura de autoritarismo, segundo o olhar 
de hoje, ao pressupor que a conduta terapêutica, para se opor às ideias delirantes, 
não podia usar apenas a compreensão, a persuasão e os conselhos lógicos, mas 
deveria introduzir diversas formas de “choque” que perturbassem emocionalmente o 
paciente para fazê-lo adotar uma ideia oposta à de sua lógica delirante. 
Nesse momento da história da psiquiatria, o louco ainda não era efetivamente 
ouvido em seu sofrimento. O delírio era considerado apenas como uma forma 
patológica de juízo distorcido, e o tratamento moral consistiria em um esforço de 
confrontação do sujeito com seu erro, de modo a reabilitá-lo ao convívio social 
(PACHECO, 2003). 
 
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A história do pensamento sobre a loucura e seu tratamento encontra um 
ponto referencial em Esquirol. Ele defende a ideia de que a relação com o médico 
desempenha um papel importante na cura, e nessa mudança de concepção vai 
fundamentando a noção de que a liberdade do sujeito é vista como condição 
necessária ao aparecimento de sua verdade de louco, como descreve FOUCAULT 
(1995). A psiquiatria não poderia, portanto, a seu ver, estar ligada à filosofia ou à 
religião, mas sim lançar-se em busca de um método próprio sem, no entanto, pautar 
a compreensão dos transtornos psíquicos apenas pelas causas orgânicas 
(PACHECO 2003). 
Uma geração de especialistas em doenças mentais, liderada por Jean 
Etienne Dominique Esquirol (1772-1840), foi educada em La Salpêtrière e 
disseminou as ideias de Pinel pela Europa. Esquirol sucedeu a Pinel na Salpêtrière 
(COBRA, 2003). 
Philippe Pinel (1765-1826), francês, médico pioneiro no tratamento dos 
doentes mentais. Seu interesse pela psiquiatria inicia somente aos 40 anos de idade 
quando se preocupou em socorrer um amigo, vítima de psicose maníaca aguda. 
Pinel, no entanto, foi o primeiro a distinguir vários tipos de psicose e a 
descrever as alucinações, o absentismo, e uma série de outros sintomas. Para o seu 
tempo, sua obra Nosographie Philosophique ou Méthode de l'analyse appliquée à la 
médecine (“Classificação filosófica das doenças ou método de análise aplicado à 
medicina”), de 1798; continha descrições precisas e simples de várias doenças 
mentais, com o conceito novo de que a cada doença era “um todo indivisível do 
começo ao fim, um conjunto regular de sintomas característicos”. 
Pinel aboliu tratamentos como sangria, purgações, e vesicatórios, em favor de 
uma terapia que incluía contato próximo e amigável com o paciente, discussão de 
dificuldades pessoais, e um programa de atividades dirigidas. Preocupava-se 
também em que o pessoal auxiliar recebesse treinamento adequado e que a 
administração das instituições fosse competente (COBRA, 2003). 
Ele percebeu que havia sempre traços de razão no alienado, capaz de 
permitir uma terapia pelo diálogo. Salienta o interesse de um tratamento humano 
para os doentes mentais e insiste nas relações deste com o meio familiar e com os 
outros doentes, e no papel do médico na administração hospitalar para cortar o 
 
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11
 
círculo infernal que leva à perpetuação e ao agravamento da doença mental. Para 
ele o tratamento medicamentoso era secundário, uma atitude que lhe vinha 
certamente de observar a ineficácia da farmacologia de seu tempo (CHERUBINI, 
2006). 
Sem dúvida, foi um revolucionário no método de tratamento dos doentes 
mentais. Para a França Revolucionária, era de profundo interesse que seus 
cientistas sobressaíssem e Pinel se constituiu, na área da medicina e da psicologia, 
em um dos seus principais expoentes. Seus escritos privilegiam o refinamento 
literário, característico da Europa do séc. XVIII e início do séc. XIX, onde, 
predominaram as concepções de humanismo e liberalismo, de forte influência 
Iluminista. 
Pinel elevou a categoria dos doentes, antes tratados como criminosos ou 
endemoniados, à condição de “homo paciens” e a doença mental, como o resultado 
de uma exposição excessiva à estresses sociais e psicológicos, e, em certa medida, 
a danos hereditários, sendo que tais enfermidades decorreriam de alterações 
patológicas no cérebro. Com isso baniu tratamentos antigos tais como sangrias, 
vômitos, purgações e ventosas, preferindo terapias que incluíssem a aproximação e 
o contato amigável com o paciente, proporcionando-lhes, ainda, um programa de 
atividades ocupacionais, onde o tratamento digno e respeitoso foi a tônica. 
O século XVII na Europa foi aquele em que reinou, de forma absoluta, a 
razão, emanada do pensamento de Descartes e entronizada pelos Iluministas. Desta 
forte tradição, originou o pensamento de Philippe Pinel, para o qual o psíquico se 
tornou matéria de conhecimento objetivo e quantitativo. 
Pinel foi o primeiro a elaborar uma classificação para as doenças mentais, 
fato este que constituiu extraordinário avanço da psiquiatria. Utilizou como principal 
método a observação e a análise de seus pacientes. 
Em sua primeira obra Nosographie philosophique (1798) destinada à 
classificação das doenças, distinguiu várias psicoses e descreveu, dentre outros 
fenômenos, alucinações, isolamentos, e uma variedade de outros sintomas, o que 
lhe rendeu grande projeção. Seu principal livro, um dos clássicos da psiquiatria, 
Traité médico-philosophique sur l'aliénation mentale ou la manie (1801), discutiu sua 
abordagem psicologicamente orientada (COBRA, 2003). 
 
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12
 
Pode-se dizer que Philippe Pinel se distinguiu pelas inovações que introduziu. 
Sua orientação foi visivelmente psicológica, suas ideias características de sua 
época, do Iluminismo e das tendências promovidas pela Revolução Francesa: 
igualdade, liberdade e fraternidade. 
A Psicologia, tendo em vista o momento em que as ciências físico-químicas e 
biológicas monopolizavam as atenções, adotou, com a contribuição de Pinel, um 
modelo de cientificidade, inspirado no marco referencial Galileico-Baconiano, uma 
nova epistemologia e uma nova visão do homem que, em determinadas 
circunstâncias da vida e de sua conflitualidade, expressa o sofrimento humano 
através da mente e da alma. 
Foi dessa forma, e somente dessa forma, que a psicologia, na metade do 
século XIX, aprendeu a considerar o seu material de estudo como parte da natureza, 
e a tentar explicá-lo em termos naturais, ou seja, a psicologia tornou-se capaz de se 
constituir uma ciência, tanto na matéria como no método, faltando pouco para passar 
a ser experimental tarefa empreendida por Wundt, em Leipzig, ao criar o primeiro 
laboratório de psicologia (ALVAREZ, 2010). 
Assim, por qualquer lado que se olhe a vida e a obra desse extraordinário 
psiquiatra-psicólogo, vamos encontrar sempre a marca de alguém que revolucionou 
a concepção de loucura de um tempo e promoveu um caminho de humanização e 
de libertação para o enfermo mental. 
O moderno movimento de humanização dos manicômios, a que estão 
engajados os organismos de ponta da evolução social, não podem esquecer, na sua 
trajetória de luta, que o seu representante primeiro, foi, sem sombra de dúvida, 
Philippe Pinel (ALVAREZ, 2010). 
Pierre Janet (1859 – 1947) foi um dos pilares das Ciências Mentais do século 
XIX e XX. 
Em sua monumental Histoire de la découverte de l'inconscient (1970), Henri 
Ellenberger sustenta que Pierre Janet teria sido o primeiro, cronologicamente, a 
propor um novo sistema de psiquiatria dinâmica destinado a substituir aqueles do 
século XIX, herdeiros das teorias sobre o magnetismo animal, das descobertas dos 
hipnotizadores, da sugestão, dos combates entre as tradições iluministas e 
românticas e, finalmente, do tratamento moral. 
 
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13
 
Do ponto de vista terapêutico, Janet propunha o uso da hipnose e da 
sugestão para obter um efeito catártico das ideias e representações separadas da 
personalidade em função de traumas e de vivências pessoais não suficientemente 
elaboradas. Nesse contexto, sua proposta de uma “análise psicológica” sistemática, 
realizada em um contexto de intimidade com o paciente, com atenção rigorosa nas 
palavras efetivamente pronunciadas e buscando restituir detalhadamente os 
antecedentes pessoais e a história da doença, constituía ao mesmo tempo um 
elemento importante da pesquisa psicopatológica e uma dimensão decisiva para a 
instituição da terapêutica psicológica (PEREIRA, 2008). 
O legado de Janet nos campos da análise psicológica, da teoria 
psicopatológica da histeria e de outros estados, como a “psicastenia” e a angústia, e 
da abordagem psicoterapêutica das neuroses é da maior importância, influenciando 
diretamente toda uma geração de psicólogos e psicopatólogos pela interrogação do 
papel do eu, e de sua unidade apenas aparente, na constituição da personalidade e 
de suas perturbações. 
Janet configurou os principais elementos da Psicologia Clínica e da 
Psiquiatria Dinâmica. “L´Automatisme Psychologique”, é a obra no qual os 
conteúdos não foram esgotados numa só livro, sendo que é o prefácio de uma obra 
imensa, “uma das mais vastas sínteses que jamais foi produzida pelo espírito 
humano sobre o espírito humano” expressão usada por H. F. Ellenberger, psiquiatra 
canadense que nunca parou de escrever e de promover o pensamento de Pierre 
Janet. 
Com Janet, Charcot, Freud e outros autores da época apareceram novas 
terminologias centradas na neurose, na paranóia, na histeria etc., com a expansão 
progressiva dos estudos mentais novos conceitos foram introduzidos como, por 
exemplo, em 1911 criou o termo esquizofrenia para substituir o de demência 
precoce. 
Aconteceu assim a construção clássica da clínica psiquiátrica-psicanalítica 
contemporânea de um lado, e a área da psicopatologia com o estudo das psicoses 
(esquizofrenia, paranóia, maniaco-depressiva) e das neuroses. 
A psicose servia para designar a loucura em geral, e as neuroses as doenças 
ditas “nervosas”. 
 
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A psiquiatria com abertura feita por Janet, do homem deficiente, expandiu os 
seus domínios, enfatizando a grande difusão da depressão. Janet definiu e utilizou 
amplamente os conceitos voltados ao estudo do automatismo psicológico nos 
estados de sonambulismo (THEOPHILO, 2010). 
Carl Gustav Jung (1875 – 1961), suíço, médico, afirmava que existem em 
nossa mente quatro funções essenciais que são básicas: a percepção, o 
pensamento, o sentimento e a intuição. 
O pensamento é a manifestação da vontade que faz o indivíduo discernir. 
Mas nem todos estão preparados para o discernimento, que resulta de um processo 
atávico, em que etapa a etapa o indivíduo vai logrando patamares de observação, 
de percepção e intuição e logra da facilidade de apresentar as vontades 
mnemônicas reprodutivas. O pensamento é o atributo que torna a criatura humana 
um ser estrutural e real. 
Considerado o clínico das psicoses, particularmente, da esquizofrenia. Jung 
aos 32 anos publicou sua importante e capital obra chamada “Psicologia da 
demência precoce” (1907) e um dos seus últimos trabalhos foi a apreciação de seus 
textos sobre a esquizofrenia (1957) quando contava com 82 anos de idade. São 
textos que agrupam observação clínica e experimentação e onde se defende, pela 
primeira vez, a tese de que todos os sintomas psicóticos podem ser compreendidos 
psicologicamente. 
Jung enquanto psiquiatra apresenta três aspectos fundamentais: 
• A busca incessante de uma etiologia psicológica para as psicoses e seus 
sintomas. 
• A importância das fantasias nas produções delirantes e alucinações. 
• A relevância das funções do ego com as imagens no sujeito psicótico. 
 
Sigmund Freud (1856 – 1939), pai da Psicanálise, seus estudos foram os 
pioneiros acerca do inconsciente humano e suas motivações. Ele, durante muito 
tempo (de fins do século XIX até início do século XX), trabalhou na elaboração da 
psicanálise. 
A psicanálise é um método de tratamento para perturbações ou distúrbios 
nervosos ou psíquicos, ou seja, provenientes da psique; bastante diferente da 
 
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hipnose ou do método catártico. A terapêutica pela catarse hipnótica deu excelentes 
resultados, não obstante as inevitáveis relações que se estabeleciam entre médico e 
paciente.Posteriores investigações levaram Freud a modificar essa técnica, 
substituindo a hipnose por um método de livre associação de ideias (psicanálise). 
O método psicanalítico de Sigmund Freud, consistia em estabelecer relações 
entre tudo aquilo que o paciente lhe mostrava, desde conversas, comentários feitos 
por ele, até os mais diversos sinais dados do inconsciente. 
O psicanalista deveria “quebrar” os vínculos, os tratos que fazemos ao nos 
comunicarmos uns com os outros. Ele não poderia ficar sentado ouvindo e 
compreendendo apenas aquilo que o seu paciente queria dizer conscientemente, 
mas perceber as entrelinhas daquilo que ele o diz. É o que se chama de quebra do 
acordo consensual. Há uma ruptura de campo, pois o analista não se restringe 
somente aos assuntos específicos, e sim ao todo, ao sentido geral. 
A psicanálise se apoia sobre três pilares: a censura, o conteúdo psíquico 
dos instintos sexuais e o mecanismo de transferência. A censura é representada 
pelo superego, que inibe os instintos inconscientes para que eles não sejam 
exteriorizados. Nem sempre isso ocorre, pode ser que eles burlem a censura, por 
um processo de disfarce, manifestando-se assim com sintomas neuróticos. Existem 
diversas formas de exteriorizarmos nossos instintos inconscientes: os atos falhos, 
que podem revelar os segredos mais íntimos e os sonhos. Os atos falhos são ações 
inconscientes que estão em nosso cotidiano; são coisas que dizemos ou fazemos 
que um dia tenhamos reprimido. 
Freud interessou-se inicialmente pela histeria e, tendo como método a 
hipnose, estudou pessoas que apresentavam esse quadro. Mais tarde, com 
interesses pelo inconsciente e pulsões, entre outros, foi influenciado por Charcot e 
Leibniz, abandonando a hipnose em favor da associação livre e da interpretação dos 
sonhos. Estes elementos tornaram-se as bases da psicanálise. Freud, além de ter 
sido um grande cientista e escritor (Recebeu o Prêmio Goethe em 1930), possui o 
título, assim como Darwin e Copérnico, de ter realizado uma revolução no âmbito 
humano: a ideia de que somos movidos pelo inconsciente. 
Atualmente muitas críticas têm sido feitas ao método psicanalítico, porém, por 
mais que a ciência moderna avance, muitos dos conceitos estruturadores da psique 
 
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humana e os resultados obtidos pela aplicação do método continuam melhorando a 
qualidade de vida de muitas pessoas. Nota-se que a revolução promovida por Freud 
abriu caminhos para estudos que antigamente se encontravam em um plano 
imaginário. A criação de um método clínico a serviço do diagnóstico e tratamento de 
doenças da psique é um fato sem igual em toda a história da ciência. Porém é de se 
constatar certamente que em muitos escritos de Montaigne e de Pascal a ideia da 
autoanálise já era usada para explicar problemas subjetivos usando a lógica vigente, 
transformando os problemas do ser e de seu inconsciente em desafios universais, 
com os quais todos os homens se deparam. 
Uma das mais severas críticas sofridas pelo método psicanalítico foi feita pelo 
filósofo da ciência Karl Popper. Segundo ele, a psicanálise é pseudociência, pois 
uma teoria seria científica apenas se pudesse ser falseável pelos fatos. 
Um exemplo é a teoria freudiana do “Complexo de Édipo”. Freud afirmava que 
esse complexo era universal, mas com que base de dados chegou a essa 
conclusão? Na época da formulação da psicanálise, a sua “amostra” era bastante 
limitada; parte dela vinha de sua experiência subjetiva (a sua “auto-análise” 
precedendo a publicação de A Interpretação dos Sonhos) e da sua prática clínica, 
feita na maioria das vezes com pacientes burgueses de uma Áustria vitoriana. Ou 
seja: uma amostra retirada de contextos bem específicos e que não podem 
fundamentar a universalidade pretendida pelo autor. 
Karl Theodor Jaspers (1883 – 1969), filósofo e psiquiatra alemão, 
considerado um dos mais importantes do existencialismo germânico e em cuja obra 
tratou essencialmente sobre o tema da preocupação do homem com sua própria 
existência. Filho de um jurista e de mãe de origem rural, foi educado no Alten 
Gymnasiums, em Oldenburg, e entrou na Universität Heidelberg (1902) onde 
estudou direito e medicina e se estabeleceu como médico no hospital psiquiátrico da 
universidade (1909) e depois (1913) tornou-se professor de psicologia da Faculdade 
de Filosofia dessa instituição. Na clínica psiquiátrica da universidade local firmou sua 
reputação ao aplicar à prática clínica os métodos da fenomenologia: investigação e 
descrição dos fenômenos tal como a consciência os percebe, excluindo toda 
teorização sobre sua causa. Nesta temática publicou Allgemeine Psychopathologie 
(1913) e Psychologie der Weltanschauungen (1919), livros que prenunciavam sua 
 
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futura fundamentação filosófica. Influenciado pelo seu conhecimento em 
psicopatologia e um pouco pelas doutrinas de Kierkegaard e Nietzsche, nas duas 
décadas seguintes dedicou-se a elaborar suas ideias que, junto com as de seu 
compatriota Martin Heidegger, formariam a base do existencialismo alemão. 
Por questões políticas, afastou-se de Heidegger quando este se filiou ao 
partido nazista e, posteriormente (1937), foi demitido do cargo de professor de 
filosofia na universidade. Mesmo assim, recusou (1942) uma autorização para deixar 
o país sem sua mulher, de origem judia. Finda a II Guerra, recuperou seu cargo de 
professor na Universidade de Heidelberg (1945) e três anos depois (1948) transferiu-
se para a Universidade de Basiléia, na Suíça, onde viveu pelo resto de sua vida. 
Morreu em Basiléia, três dias depois de completar 86 anos, deixando uma obra de 
trinta livros publicados, entre eles Existenzphilosophie (1938), onde cunhou o termo 
existência para designar a experiência indefinida entre liberdade e possibilidade, e 
Die grossen Philosophen (1957), onde tratou sobre até que ponto o pensamento 
passado pode ser inteligível. 
Michel Foucault (1926 – 1984), francês, psicólogo e psicopatologista de 
formação. Ao escrever a obra “História da Loucura”, procurou mostrar como o 
conceito de loucura mudou através dos tempos, desde a era medieval quando os 
loucos vagavam livres pela sociedade – já que havia uma sacralização da loucura – 
até os tempos modernos em que os loucos passaram a ser confinados ou tratados, a 
partir de uma visão psiquiátrica. Quando foi lançado em 1961, o livro transformou 
Foucault num líder intelectual na França, ao lado dos então emergentes Derrida e 
Barthes. 
Segundo Foucault (1995), a loucura não está somente ligada às 
assombrações e aos mistérios do mundo, mas ao próprio homem, às suas 
fraquezas, às suas ilusões e a seus sonhos, representando um sutil relacionamento 
que o homem mantém consigo mesmo. Aqui, portanto, a loucura não diz respeito à 
verdade do mundo, mas ao homem e à verdade que ele distingue de si mesmo. 
Franco Basaglia (1924 – 1980) colocou a doença mental entre parênteses a 
fim de dar voz, sem interpretar, e fazer emergir novos sujeitos no palco da história – 
os pacientes, os familiares, os não especialistas. Para ele a relação terapêutica 
devia instaurar-se dentro de um espaço no qual toda resposta pré-fabricada e todo 
 
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preconceito ficassem entre parênteses: somente assim seria possível ir ao encontro 
do doente num plano de liberdade (AMARANTE, 2005). 
Basaglia tem uma participação fundamental na história da Reforma 
Psiquiátrica Brasileira. Com suas visitas ao Brasil pôde, com a clareza que lhe era 
própria, demonstrar o absurdo dos hospitais psiquiátricos, ao lado de explicitar em 
nome de que estavam organizados: da repressão às classes dominadas. A 
colocação em debate do ambiente hospitalar, nos seus mínimos detalhes, com o 
lema “crear condiciones para permitir aflorar las necessidades reales de los usuarios 
del servicio [...]” foi a marca histórica do trabalho de Basaglia (PINTO, 2004). 
Em 1968 ele estabelece um ponto de ruptura com a psiquiatria asilar, 
posicionando-se claramente contra as práticas repressivas e mortificadoras da 
ordem médica no trato das pessoas acometidas pelo sofrimento psíquico. Em suas 
palavras: 
 
Para começar, torna-se necessário negar tudo o que está à nossa volta: a 
doença, o nosso mandato social, a nossa função. Negamos, assim, tudo 
que possa dar um sentido predefinido à nossa conduta. Ao mesmo tempo 
em que negamos nosso mandato social, negamos a rotulação do doente 
como irrecuperável e, ao mesmo tempo, nossa função de simples 
carcereiros, tutores da tranquilidade da sociedade; negando a 
irrecuperabilidade do doente negamos sua conotação psiquiátrica; negando 
sua conotação psiquiátrica negamos sua doença como definição científica; 
negando a sua doença, despsiquiatrizamos nosso trabalho, recomeçando-o 
em um território ainda virgem, por cultivar. 
(Ao ser perguntado pelo ponto de partida do seu posicionamento) Partiu-se 
do encontro com a realidade do manicômio, que, sendo opressiva, é trágica. 
Não era possível que centenas de homens vivessem em condições 
desumanas somente por serem doentes. Não era possível que nós, na 
qualidade de psiquiatras, fôssemos os artífices e os cúmplices de uma tal 
situação. O doente mental é “doente”, sobretudo por ser um excluído, um 
abandonado por todos; porque é uma pessoa sem direitos e em relação a 
quem pode-se tudo. Por isso negamos dialeticamente nosso mandato 
social, que exigia que considerássemos o doente como um não homem, e, 
ao negá-lo, negamos a visão do doente como um não homem. Do ponto de 
vista prático, negamos a desumanização do doente como resultado último 
da doença, atribuindo o grau de destruição à violência do asilo, da 
instituição, de suas mortificações, desmandos e imposições, que derivam da 
violência, dos abusos e das mortificações que são o esteio de nosso 
sistema social. Tudo isso foi possível porque a ciência, sempre a serviço da 
classe dominante, decidira que o doente mental era um indivíduo 
incompreensível e, como tal, perigoso e imprevisível, impondo-lhe, como 
única alternativa, a morte civil (BASAGLIA, 1985, p. 29). 
 
Franco Basaglia mostrou, com sua articulação entre as práticas de Saúde 
Mental e a política, que a psiquiatria sempre esteve a serviço dos poderes 
 
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dominantes. Pretendeu revelar que o campo da saúde mental é eminentemente 
político. Esse desvelamento tornou-se fator básico para os avanços, sem o qual o 
risco permanente de estarmos a serviço das forças da alienação não pode ser 
criticado. 
Ele apontou o caminho que a mudança no modo de organizar os sistemas de 
saúde deveriam tomar, politizou a discussão em Saúde, especialmente em Saúde 
Mental. Ele mostra que a psiquiatria só havia, até então, proposto soluções 
negativas para o problema do sofrimento mental. Recortando um aspecto do homem 
que sofre, reduzindo toda a complexidade da vida a dados psicopatológicos, a 
psiquiatria tornou-se parte do aparelho de exclusão. Ao ter essa função, a psiquiatria 
se incumbia de escamotear as contradições sociais que produzem as injustiças, o 
sofrimento, a miséria. 
As contribuições de Basaglia foram muitas. Ele adverte, também, que o 
trabalho deve ter os dois aspectos: o científico e o político. 
Como diz Pinto (2004), se transportarmos para os nossos dias o que Basaglia 
diz é que não há “soluções” definitivas em Saúde Mental, mas sim mudanças nas 
práticas que levam, cada vez mais, a lançar a discussão e as ações na direção da 
vida concreta das pessoas envolvidas. E, também, que a sociedade seja provocada 
a se colocar a mesma questão: o que é o sofrimento mental? Quem são as pessoas 
que sofrem? Quais as condições sociais que favorecem a saúde mental e as que a 
prejudicam? 
Resumindo, podemos relacionar Jung à Psicologia analítica; Esquirol à 
Psicopatologia descritiva; Pierre Janet à Dissociação; Philippe Pinel ao Tratamento 
Psiquiátrico; Karl Jaspers à Fenomenologia; Sigmund Freud à Psicanálise e Franco 
Basaglia à Antipsiquiatria. 
 
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UNIDADE 3 - EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PSIQUIATRIA E 
SAÚDE MENTAL 
 
Dois fatos marcaram o surgimento dos primeiros trabalhos ligados à 
Psiquiatria no Brasil: a mudança da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, em 
1808, e a criação do primeiro jornal de Medicina do país. 
A corte trouxe com ela o médico cirurgião José Correia Picanço (1745-1823), 
o qual iniciou um curso médico no Hospital Real Militar, no mesmo local onde fora 
construído, posteriormente, o edifício da tradicional Escola de Medicina da Bahia. No 
mesmo ano, um curso de Medicina também fora criado no Rio de Janeiro 
(ORNELLAS, 1997). 
O primeiro jornal de Medicina, fundado por José Francisco Xavier Sigaud 
(1796-1856), de título “O propagador de ciências médicas” ou “Anais de Medicina, 
Cirurgia e Farmácia”, teve papel decisivo no desenvolvimento da cultura médica do 
país. Possibilitou a reunião de profissionais da Medicina, contribuindo para o 
nascimento da “Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro” (SANTOS, 2008). 
Segundo Ornellas (1997) nas reuniões da Sociedade de Medicina do Rio de 
Janeiro foi sugerida a criação de uma casa de saúde ou hospício para abrigar os 
loucos trancados nos quartos de suas famílias, os que andavam livremente pela 
cidade e os que habitavam o Hospital da Santa Casa de Misericórdia. Era intenção 
da sociedade daquela época organizar, disciplinar e normalizar a cidade em busca 
de salubridade. 
Atendendo os apelos, o Imperador Pedro II fundou um hospital de alienados, 
o Hospício Pedro II, ainda como anexo do Hospital da Santa Casa de Misericórdia. 
Antes mesmo do início das obras do hospital, no terreno da Praia Vermelha, foram 
enviados para uma casa reformada e adaptada, nas localidades da construção, 
todos os doentes da Santa Casa. José Martins da Cruz Jobim tornou-se responsável 
pela casa e é considerado o primeiro médico de doentes mentais do país. 
O Hospício Pedro II foi inaugurado em 5 de dezembro de 1852, e foi, em sua 
época, considerado o mais belo edifício da América do Sul. O fato de estar 
subordinado à Santa Casa fez com que dela ainda dependesse sua administração, 
mesmo em sede distinta.Ficou muito tempo fora do alcance da administração 
pública, assemelhando-se, nesse período, mais a um convento que a um hospital. O 
 
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domínio das freiras era absoluto. Diretor e médicos ficavam restritos às informações 
que elas lhes ministravam (ORNELLAS, 1997). 
O funcionamento de um hospício guiava-se pelos princípios do isolamento, 
vigilância, distribuição e organização do tempo dos internos, com vistas à repressão, 
controle e individualização. As intervenções dos psiquiatras sofreram grande 
influência das ideias de Philippe Pinel (1745 —1826), médico francês e pai da 
Psiquiatria, que propunha afastar o louco do que era considerada a fonte de suas 
loucuras, ou seja, a família, a sociedade e seus hábitos. 
Somente a partir de 1884, com a instalação das cátedras de Psiquiatria nas 
Faculdades de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro, o estudo das doenças 
mentais passou a constituir um ramo à parte da patologia interna, não mais unido a 
outras enfermidades. 
A psiquiatria nasceu dentro dos asilos e da necessidade de abrigar, proteger, 
cuidar, investigar, diagnosticar e tratar os indivíduos que da loucura fossem 
acometidos. Fica bastante claro que os loucos existiam antes do que os psiquiatras, 
e que a loucura representa um tremendo desafio para todos interessados em 
estudá-la. A loucura é um desafio que muitas outras áreas do conhecimento se 
associam neste processo de investigação dos seus segredos: filósofos, sociólogos, 
antropólogos, neurocientistas, psicofarmacologistas. 
O Instituto de Psiquiatria do Brasil foi criado em 1938, pelo decreto-lei 591, 
que o transferia para a Universidade do Brasil. Sua origem histórica, entretanto, 
encontra-se no Instituto de Psicopatologia, fundado em 1893, como o Pavilhão de 
Observação do primeiro hospício brasileiro. O hospício, criado por decreto imperial 
de 1841, foi inaugurado em 1852, com o nome de Hospício de Pedro II, numa clara 
deferência ao imperador. Sua fundação inspirava-se na experiência francesa, na 
qual a origem histórica da psiquiatria era um corolário da constituição do asilo, 
disputado inicialmente pelas instâncias médicas e religiosas (VENÂNCIO, 2003). 
No entanto, segundo Teixeira (2000), os contextos específicos nos quais se 
deu o surgimento do asilo apontam para diferenças significativas. No caso da 
França, esteve respaldado no projeto liberal-burguês instaurado com a Revolução 
Francesa, valendo-se mais intensamente da contribuição dos médicos para a 
 
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formulação e implantação de uma política assistencial pública que respondesse à 
problemática da exclusão e inclusão social de diferentes segmentos da população. 
Já no caso do Brasil, a criação do asilo foi expressão do regime monárquico 
centralizador, gerado a partir de um consenso de elites (TEIXEIRA, 2000, p. 85). A 
ascensão da classe médica e de suas propostas seria limitada pela afirmação e 
sustentação de um poder central monárquico, que tinha a instituição religiosa como 
importante aliada. O tema da inclusão social se colocava dominantemente sob a 
rubrica da caridade aos desvalidos, em vez de enfatizar um novo contrato social. 
Sobre a relação entre ciência e assistência psiquiátrica, Venâncio (2003) 
assinala que quando da criação e inauguração do hospício (1841 e 1852), a ciência 
psiquiátrica brasileira ainda não se constituíra enquanto tal. Isso só iria ocorrer 
paulatinamente, a partir de um alargamento do campo de possibilidades de 
participação da medicina nos projetos relativos à assistência à população. Conforme 
Russo (1993), nos anos 1830, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro promulgou um 
código de posturas estabelecendo uma legislação sanitária municipal. Foi nessa 
época que surgiram os primeiros protestos médicos contra a situação dos loucos 
internados na Santa Casa do Rio de Janeiro, vindos de membros da Sociedade de 
Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro. Criada em 1829, “tratava-se de uma 
sociedade de medicina social com influência notável da medicina francesa, 
defendendo medidas de higiene pública. Como fundadores encontram-se dois 
médicos franceses — Jean Maurice Fraive e Xavier Sigaud — e associados 
brasileiros — José da Cruz Jobim e Joaquim Cândido Soares de Meirelles —, que 
haviam se formado em escolas francesas” (TEIXEIRA, 1997, p. 50). 
Em 1882 a lei n. 3.141 determinava que se realizasse concurso público para a 
cátedra de psiquiatria na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, sendo aprovado 
e empossado no ano seguinte o prof. João Carlos Teixeira Brandão (1854-1921). 
Em 1887, pouco antes do advento da República, Teixeira Brandão tornava-se 
também diretor do hospício, permanecendo no cargo por dez anos. 
É possível, portanto, afirmar que a medicina legal foi praticamente o berço da 
psiquiatria brasileira. Esta raiz comum que une as duas especialidades não é de 
modo algum fortuita. As relações de proximidade e conflito entre a medicina legal e a 
psiquiatria demonstram de forma exemplar a importância do discurso médico em 
 
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geral, e do psiquiátrico em particular, na definição das questões políticas 
fundamentais para a nova sociedade que emergia (RUSSO, 1993, p. 9). 
Em 1893, 41 anos após a inauguração do hospício, foi criado o Pavilhão de 
Observação. Isso ocorreu em concomitância a uma série de medidas da 
administração de Teixeira Brandão, professor catedrático de clínica psiquiátrica, 
diretor do hospício e também diretor do novo serviço. Segundo Teixeira (1999), no 
ano anterior ao surgimento do pavilhão, o decreto n. 896 de 29 de junho de 1892 
instituía dois tipos de pacientes: os pensionistas e os gratuitos. Em seguida, o 
decreto n. 1.559 de 7 de outubro de 1893 — que também ampliava o número de 
médicos no hospício e incluía os cargos de oftalmologista e diretor sanitário — 
fundava o Pavilhão de Observação, um serviço de avaliação preliminar dos 
pacientes que se apresentavam para serem internados (VENÂNCIO, 2003). 
O pavilhão objetivava acolher os pacientes com atendimento gratuito, 
suspeitos de alienação mental, que ali chegavam por meio das autoridades públicas. 
Estava exclusivamente destinado à clínica psiquiátrica e de moléstias mentais da 
Faculdade de Medicina. “O professor de clínica psiquiátrica era pago pela 
Assistência a Alienados, e devia residir numa casa vizinha ao hospício, com a 
incumbência de atender aos doentes do pavilhão a qualquer hora que fosse 
solicitado” (TEIXEIRA, 1999, pp. 222-3). Ao menos desde 1896 procedia-se a 
anotações em livros de observações clínicas dos pacientes desse pavilhão. 
Posteriormente, seguindo a Lei de Assistência aos Alienados de 1903, tais 
observações passaram a ser formalizadas “num registro de internação, que exigia a 
anexação de todos os dados pessoais, descrição fisionômica e sinais característicos, 
além de fotografia do “suspeito de alienação”. 
A relação entreciência e assistência se reorganizou logo no início do século 
XX. Em 1903, Juliano Moreira foi nomeado para a direção do hospício. A direção do 
hospício deixava assim de ser exercida pelo professor catedrático de psiquiatria da 
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Essa separação de funções produzia, 
aparentemente, uma imagem de ruptura entre ciência e assistência pública. No 
entanto, ela fortaleceu a preeminência das diretrizes da política assistencial, em 
detrimento da produção de uma ciência psiquiátrica brasileira academicamente 
autônoma (VENÂNCIO, 2003). 
 
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Do ponto de vista da política assistencial, a nomeação de Juliano Moreira 
para a direção do hospital de alienados e as reformas que lá empreendeu, 
coadunavam-se com todo um processo de reorganização espacial. Inseria-se no 
esforço de saneamento e assistência à saúde que a cidade do Rio de Janeiro vivia 
durante a administração do prefeito Pereira Passos e a gestão de Oswaldo Cruz 
como diretor geral de Saúde Pública (PORTOCARRERO, 2002). 
Nos anos 1920 e 1930, o ideário psiquiátrico preventivista seria fortemente 
sustentado pela Liga Brasileira de Higiene Mental, com os psiquiatras identificando-
se cada vez mais como higienistas, ao mesmo tempo que concediam um sentido 
específico à higiene mental. Inicialmente considerada uma aplicação do 
conhecimento psiquiátrico, ela foi alçada à condição de teoria geral, fundada na ideia 
de eugenia1, que devia conter e orientar a prática psiquiátrica (COSTA, 1981, p. 79). 
Nesse sentido, a política assistencial fundada na ideia de higiene mental 
ensejava a criação de campanhas, serviços abertos, ambulatórios, de modo a dar 
conta de sua entrada e permanência na sociedade. Segundo Cunha (1986 apud 
Venâncio, 2003), havia nesse período um abandono da defesa do grande hospício 
como modelo assistencial, embora possamos constatar sua permanência como lugar 
de degradação. Assim, ainda que caótico, o modelo assistencial asilar não foi 
extinto. Ao contrário, o asilo parecia permanecer como elemento importante para, 
também em seu interior, alojar a população-alvo da política de higiene mental. Ele 
passava a ser ampliado numérica e conceitualmente, como demonstrava a 
crescente inauguração dessas estruturas institucionais e a incorporação em seu 
campo semântico da figura dos asilos-colônias. 
Medeiros (1977) lembra que nos anos 1912 a 1920 foram criadas a Colônia 
de Engenho de Dentro, a Colônia de Jacarepaguá e o Manicômio Judiciário, e até 
fins dos anos 1930, difundiu-se o modelo asilar com a construção de novos 
pavilhões nas colônias já inauguradas. Em 1934, terminava a construção do 
Pavilhão Rodrigues Caldas, com capacidade para 120 doentes, posteriormente 
incorporado ao Instituto de Psiquiatria da Universidade do Brasil. 
A Colônia de Psicopatas do Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, deve ser 
ressaltada como marcante, já que foi uma das primeiras referências da perspectiva 
 
1 Ciência que estuda as condições mais propícias à reprodução e melhoramento genético da espécie 
humana (FERREIRA, 2004). 
 
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psicoterápica no Brasil, num momento em que os métodos psiquiátricos mostravam-
se dominantes (SANTOS, 2008). 
A “Liga Brasileira de Higiene Mental” foi fundada em 1923, por Riedel, com o 
objetivo de prestar assistência ao doente mental. Esse objetivo inicial, entretanto, foi 
sendo alterado e as metas da liga passaram a enfatizar a profilaxia e a educação de 
indivíduos, transferindo a preocupação da cura para prevenção, o que teria sido um 
avanço não fosse essa preocupação pautada nas ideológicas eugênicas. 
Sob essa perspectiva, a Psiquiatria pretendia exercer controle sob as 
problemáticas pelo ordenamento do espaço urbano. Tinha autoridade para punir e 
banir os desajustados. Buscaram combater o alcoolismo, o jogo, a prostituição e o 
crime. A doença mental era sinônimo de criminalidade, fazendo-se assim o 
pareamento entre louco e periculosidade, sempre com base na teoria da 
degenerescência (ORNELLAS, 1997). 
No que se refere à formação psiquiátrica, portanto, até meados da década de 
1930, os psiquiatras produziram e reproduziram seu saber a partir das sociedades 
científicas e do hospício. Na condição de especialidade médica, a formação do 
psiquiatra estava bastante atrelada à prática desenvolvida na instituição, e foi no 
hospício que a Faculdade de Medicina buscou psiquiatras para o ensino no espaço 
acadêmico. Desse processo decorreram dois movimentos. Em primeiro lugar, o fato 
de o ensino ser feito a partir do hospício levava o modelo assistencial asilar vigente 
para dentro do locus acadêmico, reproduzindo-o, sem tomá-lo como objeto de 
reflexão. Em segundo lugar, observava-se uma marginalização social da psiquiatria 
no âmbito do conhecimento médico. “Médico de doidos, a respeito de quem se 
admitia nada fazer e nada saber” (Medeiros, 1977, p. 82). Essa marginalização 
social pode ter sido, inclusive, uma das marcas a motivar o discurso acadêmico 
psiquiátrico a ser tão enfático e afirmativo de sua cientificidade, procurando valorizar 
o psiquiatra e seu conhecimento (VENÂNCIO, 2003). 
A falta de recursos eficazes para o tratamento dos doentes, e a pobreza de 
sua clientela, determinou a progressiva deterioração e declínio dos hospícios, ainda 
que o aumento da população enferma exigisse a expansão do sistema (ORNELLAS, 
1997). 
 
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Ainda entre os anos 1920 e 1930, deu-se o primeiro esforço de reforma do 
modelo psiquiátrico: Juliano Moreira e Ulisses Pernambucano foram os primeiros 
artífices. Ulisses diferenciou os serviços de psicóticos agudos dos crônicos, instituiu 
um serviço aberto para tratamento em regime de pensão livre, criou um sistema de 
educação especial e um serviço de saúde mental. 
À medida que a falta de remédios específicos para os enfermos psiquiátricos 
continuava, o processo de degradação da assistência psiquiátrica pública no Brasil, 
tal como no resto do mundo, se aprofundava. A degradação só poderia ser detida 
com a descoberta de fármacos psicotrópicos, que possibilitaram o efetivo 
enfrentamento das enfermidades mentais. Foi a revolução psicofarmacológica. À 
penicilina, que tratava efetivamente a sífilis, acrescentaram-se os neurolépticos e os 
antidepressivos, que transformavam os portadores das grandes psicoses em 
pacientes ambulatoriais (ORNELLAS, 1997). 
Mas tal avanço implicou outro problema: a assistência psiquiátrica pública se 
dividiu em duas: a assistência patrocinada pelo Estado e aquela mantida pela 
previdência social pública, que se multiplicou movida única ou predominantemente 
pela busca de lucro. O doente mental se transformou em uma fonte inesgotável de 
lucro para empresários que viviam dessa condição. 
No plano da assistência pública direta, a tônica do enfrentamento desse 
problemaresidiu na tentativa de ambulatorização do tratamento. O Serviço Nacional 
de Doenças Mentais, desde a primeira gestão, do Professor Jurandyr Manfredini, 
encetou outra tentativa de reforma, elegendo como principal meta a substituição da 
hospitalização pela assistência ambulatorial (ORNELLAS, 1997). 
A Internação Psiquiátrica no Brasil produziu seus efeitos: no fim da década de 
50, os Hospícios estavam com lotação muito acima da sua capacidade, como por 
exemplo, o Juqueri, em São Paulo, com quase 15 mil pessoas, ou o São Pedro, em 
Porto Alegre, com 3.200 internos, quando as vagas eram 1.700 (PINTO, 2004). 
Foi no quadro descrito acima que, em 1944, foi trabalhar no então chamado 
Centro Psiquiátrico Nacional do Rio de Janeiro, a psiquiatra Nise da Silveira. 
Encontrou como práticas dominantes o eletrochoque, o coma insulínico e a 
lobotomia. Nise da Silveira conhecia a obra de Carl Gustav Jung, o que proporcionou 
que levantasse questões incômodas para a época e ainda para os dias em que 
 
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vivemos: os sintomas e as produções do inconsciente das pessoas com diagnósticos 
de psicose fazem sentido, caso se queira prestar atenção. De posse dessa 
compreensão e de um profundo interesse pela pessoa a ser tratada, Nise organizou, 
em 1946, o Serviço de Terapêutica Ocupacional no referido Hospício. 
Utilizando técnicas de pintura, modelagem e xilogravura, Nise proporcionou 
aos internos um oásis de humanidade e criatividade em meio à destruição do 
ambiente hospitalar. Mostrou, com repercussão internacional, tendo como base as 
obras que os pacientes criavam, que os métodos tradicionais da psiquiatria 
caracterizavam uma violência aniquiladora. Em meio à incompreensão e falta de 
recursos, continuou com seu trabalho, já um verdadeiro movimento, com diversos 
colaboradores. Viu surgir, dentre os internados, artistas cujas obras estão entre as 
mais importantes do século XX no Brasil, como as de Fernando Diniz e Carlos 
Pertuis. 
Nise da Silveira não teve, no seu tempo de atuação, ação no sentido de 
mudanças amplas na organização da Assistência à Saúde Mental. A época estava 
ainda longe disso. Mas, com seu trabalho que indica a aproximação pessoal e 
artística com as pessoas com diagnósticos de psicose, revolucionou, pelo exemplo, 
pelas publicações e pela organização do Museu de Imagens do Inconsciente, a face 
da Saúde Mental no Brasil. Hoje, o antigo “Hospício de Pedro II” tem o nome de 
“Instituto Municipal de Assistência à Saúde Nise da Silveira”. 
Nos anos 1950 e 1960, esses recursos se multiplicaram, principalmente em 
unidades sanitárias e anexos de hospitais psiquiátricos públicos. A principal crítica a 
esse sistema era a manutenção da segregação do enfermo e da enfermidade 
psiquiátrica, além dos cuidadores da rede de assistência. Os Colóquios de 
Psiquiatria Assistencial e Preventiva que se davam nos congressos da Associação 
Brasileira de Psiquiatria (ABP) e da Sociedade de Neurologia, Psiquiatria e Higiene 
Mental do Brasil testemunharam esse esforço, que não foi adiante porque o Estado 
Brasileiro era privatista nessa área. 
Por isso, na assistência previdenciária, o processo correu na direção oposta: 
a hospitalização foi priorizada unicamente porque era mais lucrativa para quem a 
promovia. Esse fato se refletiu na assistência pública direta, uma vez que se 
transformou em paradigma terapêutico na consciência social e na ideologia de 
 
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muitos terapeutas. Deu-se também o fenômeno de transferência de pacientes 
desospitalizados na rede pública para serem internados em serviços credenciados 
pela previdência social pública. Essa situação foi muito agravada pela instituição da 
ditadura militar e pelo avanço ideológico neoliberalista (ORNELLAS, 1997). 
Paulo Amarante situa o “Início do movimento da reforma psiquiátrica” entre os 
anos de 1978 e 1980. No seu modo de ver, “[...] o movimento da reforma psiquiátrica 
brasileira tem como estopim o episódio que fica conhecido como a Crise da 
DINSAM” (Divisão Nacional de Saúde Mental). (AMARANTE, 1995, p. 51). Em abril 
de 1978, um episódio de denúncia de falta de condições humanas e de trabalho, no 
então já denominado Centro Psiquiátrico Pedro II, o velho hospício do Engenho de 
Dentro, resultou em apoios políticos e notícias na imprensa. Os principais pontos de 
denúncia e reivindicação eram: péssimas condições de trabalho, falta de garantias 
trabalhistas, ameaças a profissionais e pacientes, agressões, estupros, trabalho 
escravo. 
Com a derrocada da ditadura, criaram-se condições para uma reação mais 
eficaz. Era o início da Reforma Psiquiátrica no Brasil. 
 
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UNIDADE 4 - A REFORMA PSIQUIÁTRICA E OS 
DISCURSOS CONTEMPORÂNEOS DA SAÚDE MENTAL 
 
A saúde mental brasileira nas décadas de 1979 a 1999, passou por 
transformações através de avanços que constituíram e constituem o processo 
contemporâneo desta prática. 
No âmbito social e político, Santos (1997) atesta um estado pós-moderno dos 
acontecimentos através dos denominados Novos Movimentos Sociais (NMSs), 
presentes em todo o mundo, principalmente nas décadas de 70 e 80, de forma mais 
ou menos intensa conforme o estágio de desenvolvimento econômico local. 
Os NMSs são os movimentos tipicamente pós-industriais que denunciam as 
formas de opressão cotidianas contidas na violência, na poluição, no sexismo, no 
racismo e no produtivismo, dentre outras formas de exclusão. Para Santos (1997, p. 
258), os NMSs trazem como “novidade maior tanto uma crítica da regulação social 
capitalista como uma crítica da emancipação social socialista tal como foi defendida 
pelo marxismo”. 
Assim denunciando ‘com uma radicalidade sem precedentes os excessos de 
regulação da modernidade’ e contribuindo para a construção, no dizer deste autor, 
de uma equação que comungue simultaneamente ‘subjetividade, cidadania e 
emancipação’. 
Nesse contexto, a América Latina destacava-se dos demais países periféricos 
e semiperiféricos com relação a atuação dos NMSs, sendo que aqui estes 
movimentos eram peculiarmente ‘nutridos por inúmeras energias’ que compilavam 
desde reivindicações pós-materialistas a lutas por condições básicas de 
sobrevivência, diferentemente do que se passava nos países centrais onde os 
movimentos eram ‘puros’ ou bem definidos. 
Com relação ao Brasil particularmente, lembrando que estávamos no 
momento político de luta pela transição democrática pós-ditadura e esse movimento, 
os NMSs tiveram um notável florescimento. 
Vale situar esse momento crucial para a transformação da sociedade 
brasileira, denominado por Sader (1990) como entre o velho e o novo. O ponto de 
partida da transição hoje é claro: uma ditadura militar permeada por uma ideologia 
 
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de segurança nacional favorável ao grande capital monopolista e financeiro nacional 
e internacional (GUIMARÃES et al, 2001). 
Assim finalizamos a década de 70 e adentramos a década de 80 com um 
Brasil efervescente, manifestadas as contradições e reduzido o poder ditatorial das 
elites dirigentes. A sociedade civil despertava de um pesadelo que durara vinte e um 
anos e havia muito o que ser questionado. Emergindo denúncias e indignação 
acerca da questão psiquiátrica no âmbito da saúde. 
 
O ponto culminante dentro do novo modelo emergente é a 
DESINSTITUCIONALIZAÇÃO. 
As condições (ou a falta de) da assistência à Saúde Mental eram semelhantes 
em todo o país. Com a mobilização no Rio de Janeiro, confluíram para o V 
Congresso Brasileiro de Psiquiatria, em Camboriú, em outubro de 1978, os 
movimentos que já estavam em andamento em diversos estados. Realizado pela 
conservadora Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), o Congresso teve seu 
desenvolvimento politizado pela presença dos militantes do MTSM que, através da 
federada baiana da ABP, a Associação Psiquiátrica da Bahia, conseguiram marcar 
posição na plenária final e aprovar resoluções que foram tiradas nas reuniões 
paralelas ao evento. A privatização na área da saúde é denunciada, bem como a 
ausência de discussão pública a respeito dos rumos da assistência à saúde. A 
universidade é criticada pela sua adesão à lógica do mercado. A prática psiquiátrica 
em vigor é apontada como instrumento “de controle e reprodução das desigualdades 
sociais” (AMARANTE, 1995, p. 54). No campo político amplo, a plenária também se 
manifestou, com a bandeira de luta pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita. 
Numa demonstração da fertilidade do momento, ainda em outubro de 1978 
realizou-se, no Rio de Janeiro, o I Congresso Brasileiro de Psicanálise de Grupos e 
Instituições, que lançava a instituição de formação em psicanálise, terapia de grupo 
e analistas institucionais, o Instituto Brasileiro de Psicanálise, Grupos e Instituições 
(IBRAPSI). Nele estiveram presentes Basaglia, Guattari, Robert Castel, Goffman e 
outros nomes representantes do pensamento crítico da área. (AMARANTE, 1995, p. 
55). Revestido de uma aura de grande produção, o Congresso movimentou ainda 
mais o ambiente. 
 
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Logo a seguir, em janeiro de 1979, acontece em São Paulo o I Encontro 
Nacional dos Trabalhadores em Saúde Mental. É o movimento tomando corpo, 
aprofundando suas discussões, organizando-se de modo autônomo. Nessa altura 
dos acontecimentos, o que estava sendo colocado pelo MTSM, em resumo, era: 
• A crítica ao modelo asilar em psiquiatria. 
• Pressão por solução política para a questão da orientação da assistência à 
saúde mental. 
• O movimento faz parte dos setores da sociedade que lutam pelas liberdades 
democráticas, pela Anistia, pela livre organização de trabalhadores e 
estudantes (AMARANTE, 1995, p. 55). 
 
Apesar da grande repercussão, entre os profissionais de Saúde Mental, do 
que estava acontecendo com a mobilização em torno no MTSM, a grande imprensa 
mantinha-se, em geral, distante do que havia por detrás dos muros dos hospícios. 
A censura à imprensa permanecia em vigor e era difícil vencer a barreira do 
silêncio. Este quadro mudou durante e após o III Congresso Mineiro de Psiquiatria, 
realizado em Belo Horizonte, em novembro de 1979. O Congresso foi organizado 
pela Associação Mineira de Psiquiatria, que já se colocava em adesão ao MTSM 
(CAMARANTE, 1995, p. 55). 
Durante o evento, Basaglia foi visitar o grande hospício de Barbacena, sobre 
os quais recaíam denúncias assustadoras de maus tratos, inclusive a respeito de 
venda de cadáveres de pacientes para faculdades de medicina. O relato 
emocionado de Basaglia, em palestra do Congresso, repercutiu na imprensa e 
durante muitos dias foi para os grandes jornais do país a situação dos hospitais 
psiquiátricos. Foi preciso um visitante estrangeiro, para romper o bloqueio e expor o 
que estava escondido pelos muros dos hospícios, pela censura e pela conivência 
(PINTO, 2004). 
 
Em 1979, o Brasil recebeu a visita do psiquiatra italiano Franco Basaglia, 
cujo discurso sobre a desinstitucionalização do aparato psiquiátrico 
repercutiu no meio social e político que passava por contestações e desejos 
de mudança em uma sociedade que vivenciava um processo de abertura 
após anos de regime militar ditatorial. Surge o Movimento dos 
Trabalhadores em Saúde Mental –até então um NMS – que fortalecido pela 
sociedade civil organizada e pelas primeiras experiências de 
desinstitucionalização, destacadamente a experiência santista, culmina em 
 
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1989 com o movimento de Reforma Psiquiátrica, a criação do Projeto de Lei 
n. 3.657 de autoria do deputado federal Paulo Delgado (PTMG) – que 
dispõe sobre a superação do manicômio e a construção de assistência 
substitutiva – e com a Luta Antimanicomial (AMARANTE E TORRE, 2001). 
 
Em janeiro de 1999, o referido projeto foi aprovado no Senado, passou por 
nova votação na Câmara. Em abril de 2001 foi aprovado e sancionado pelo 
Presidente da República, tornando-se lei. 
A partir da segunda metade dos anos 80, no Brasil, o movimento de 
transformação no campo da saúde mental passou por importantes mudanças, 
caracterizadas pelo surgimento de novos serviços num contexto histórico, político e 
conceitual emergente. A realização de duas Conferências Nacionais de Saúde 
Mental em 1987 e 1992, somada à inscrição da proposta do Sistema Único de 
Saúde (SUS) na Carta Constitucional de 1988, abriram novos caminhos para a 
saúde pública no Brasil da “redemocratização”. Junto a esses movimentos, 
profissionais da saúde mental, articulados por todo o país em torno do lema “Por 
uma sociedade sem manicômios” (adotado no II Congresso Nacional de 
Trabalhadores de Saúde Mental em dezembro de 1987), foram promovidas 
discussões e produzidas uma série de novas experiências em suas intervenções 
junto à loucura e ao sofrimento psíquico (AMARANTE E TORRE, 2001). 
Dentre estas novas experiências, destacam-se a criação do Centro de 
Atenção Psicossocial (CAPS) Prof. Luis da Rocha Cerqueira, em março de 1987 em 
São Paulo, e do primeiro Núcleo de Atenção Psicossocial (NAPS) em Santos, no 
bojo das transformações mais gerais ocorridas naquele município no âmbito da 
saúde mental, após a histórica intervenção na Clínica Anchieta em 03 de maio de 
1989. 
Em termos históricos, foi só a partir da década de 80 que o movimento pela 
Reforma Psiquiátrica no Brasil ganhou importância, tanto política como social. Para a 
sua implementação foi preciso inventar novos locais, instrumentos técnicos e 
terapêuticos, como também novos modos sociais de estabelecer relações com a 
loucura. 
O Programa de Reorientação da Assistência Psiquiátrica no âmbito da 
Previdência Social que foi elaborado em 1982, mostra que desse texto constam as 
seguintes diretrizes para um novo modelo assistencial: 
 
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