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A cidade em duas rodas: introdução à prática do ciclismo na cidade de São Paulo (1890- 1910). Yuri Vasquez Souza (*) Palavras chave: ciclismo, bicicleta, São Paulo, cultura. INTRODUÇÃO De origem europeia1, o ciclismo, prática cultural do andar de bicicleta e a bicicleta, passaram a ser símbolos da modernidade e do progresso presentes no cotidiano através das diversas manifestações do seu uso e da sua incorporação às dinâmicas sociais.2 A bicicleta, objeto dessa pesquisa é simples, porém versátil e o seu uso diário pode abranger diversas áreas da vida. Múltiplos podem ser os sentidos atribuídos ao objeto: meio de transporte de pessoas e mercadorias, práticas desportivas, lazer e turismo e realização de desafios. Com o aprimoramento da técnica, a prática cultural de “andar de bicicleta”, sofreu adequações e passou a produzir espaços e estruturas próprias para a prática desportiva do ciclismo, criando novas instituições, reforçando a ideia de sujeito universal e promovendo novas relações sociais3. O ciclismo desportivo foi responsável em parte por incorporar o uso tecnologias modernas ao esporte.4 No final do século XIX, a bicicleta desembarcou em São Paulo e no Rio de Janeiro, trazida pela burguesia que frequentemente viajava para países da Europa e de lá importavam suas modas e formas de viver.5 Se inaugurava as prática dos sports6 que usam tecnologia moderna no Brasil. OBJETIVO 1 Para aprofundamento na origem do ciclismo ver: VIGARELLO, Georges. O tempo do desporto. In: Corbin, Alain. História dos tempos livres. Lisboa, 2001. p.231-262. e WEBER, Eugen. França Fin-de- Siècle. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. 2MELO, V. A. de E SCHETINO, A. A bicicleta, o ciclismo e as mulheres na transição dos séculos XIX e XX. In: Revista Estudos Feminista vol. 17 no. 1 Florianópolis Jan./Apr. 2009 disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-026X2009000100007&script=sci_arttext>, 2MELO, V. A. de E SCHETINO, A. A bicicleta, o ciclismo e as mulheres na transição dos séculos XIX e XX. In: Revista Estudos Feminista vol. 17 no. 1 Florianópolis Jan./Apr. 2009 disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-026X2009000100007&script=sci_arttext>, 3 Vigarello, Op. Cit., 2001 4 Idem 5Sobre a chegada da bicicleta no rio de Janeiro e a cultura ciclística que por lá se desenvolvel, ver: SCHETINO, André Maia. Pedalando na modernidade: a bicicleta e o ciclismo: uma análise comparada entre Rio de Janeiro e Paris na transição dos séculos XIX e XX. Dissertação (Mestrado em História Comparada) – Programa de Pós-Graduação em História Comparada, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, Rio de Janeiro, 2007. 6Aqui utilizamos o termo sport assim como encontramos nos estudos de ELIAS, Norbert e DUNNING, Eric. Deporte y ócio en el processo de la civilización México D.F. Fundo de cultura econômica 1995. Buscamos discutir como se deu a introdução da prática do ciclismo na cidade de São Paulo na última década do século XX. Para isso empreendemos uma pesquisa em torno da cultura ciclística, afim de sistematizar as práticas produzidas a partir do uso da bicicleta7. A pesquisa se apoia nas publicações sobre o assunto: Correio Paulistano e O Estado de São Paulo publicados entre 1890-1910, no Semanário A Bicycleta, publicado em 1896, além de outras publicações esportivas da época. ANÁLISES E DISCUSSÃO Ao chegar a São Paulo, em meados de 1890, a bicicleta trouxe consigo traços dos usos que a sociedade europeia lhe atribuiu, principalmente no que diz respeito ao uso esportivo.8 Se tratando de ciclismo de pista, a alta burguesia paulistana se deleitava nos páreos de bicicleta do Jockey Club, do Parque Antártica e no velódromo de Sant’Anna e principalmente nos realizados pelo Veloce Clube Olímpico Paulista no Velódromo Paulista. No início de 1890, Antônio Silva Prado, cafeicultor e político, encomendou o projeto e contruiu um velódromo no interior da chácara de sua mãe, Veridiana Prado.9 Os semanários publicados na cidade destacavam o crescente gosto pelos “sports”: ciclismo, esgrima, football, remo e tiro ao pombo. No ano de 1892 foram fundados em São Paulo o Velódromo Paulista e o Veloce Club Paulista. A prática ciclística se difundiu entre as classes abastardas da cidade. Cabe salientar que era um esporte primordialmente masculino sendo ridicularizada pelo público a tentativa da participação feminina no Rio de Janeiro10. A cidade inaugurava seus primeiros espaços de sociabilidade esportiva, o Velódromo, inspirado nos modelos europeus, contava com medidas oficiais11 e passou a abrigar as corridas de bicicleta, o que possibilitou o surgimento de um dos primeiros clubes esportivos da cidade: o Veloce Club Olímpico Paulista. As disputas realizadas no 7CERTEAU, MICHEL de. A invenção do cotidiano: artes do fazer. Petrópolis, Vozes, 1996. 8 A semanário A Bicicleta demostras afinidades com o ciclismo francês e muitas vezes destaca os velódromos e provas ciclísticas disputadas nas França. A Bicycleta, 1896, nº 4, p.17 9 Para mais informações sobre o velódromo e as sociabilidades ver: NICOLINI, H. Tietê: o rio do esporte. São Paulo: Phorte Editora 2001. e RAGO, Margareth. A invenção do cotidiano na metrópole: sociabilidade e lazer em São Paulo, 1900-1950. In: PORTA, P. (Org.). História da cidade de São Paulo. São Paulo: Paz e Terra, 2004. v. 3, p. 387-436. 10 O Semanário A Bicycleta noticiou o ocorrido, quando ao entrar na oixta para disputar um páreo, a ciclista foi recebida com vaias “sendo vexada e insultada gratuitamente”. A Bicycleta, 1896 nº18 p.72 11Situado na Rua da consolação, contava com uma raia de 380 metros de comprimento por 8 metros de largura e arquibancada para abrigas até 800 pessoas. MELO, V. Bicicleta e ciclismo. Rio de janeiro: Mimeo, 2005 Velódromo Paulista serviram para estabelecer um primeiro contato da bicicleta com a cidade. Ali se estabeleceram os primeiros recordes da modalidade no Brasil. O velódromo foi o berço do ciclismo competitivo na cidade e importante estádio para o desenvolvimento do futebol. O parque esportivo foi um espaço de sociabilidade da cidade frequentado por muitos paulistanos, mas principalmente pelas famílias da elite. CONSIDERAÇÕES FINAIS Em meados de 1900 o crescente entusiasmo por outros esportes, o futebol e o automobilismo, contribuíram para o abandono parcial do ciclismo. O velódromo ganhou um campo de Futebol e passou a receber partidas de futebol12 Com pouco apoio e infraestrutura necessários para sua popularização, pouco a pouco a prática do ciclismo esportivo foi se reduzindo aos poucos apaixonados pela modalidade já nos finais da primeira década do século XX. O Velódromo foi demolido em 1914 para possibilitar a abertura de uma avenida. Contudo, após os primeiros anos da chegada da bicicleta em São Paulo, seu uso rompeu os limites das pistas dos velódromos e passou a estar presente no espaço urbano tanto para passeio como para transporte13. Ao longo das primeiras décadas do século XX, a bicicleta passou a transitar como veículo na cidade. Mesmo não contando com propulsão a motor elétrico e nem de combustão, como o automóvel e o bonde, e tendo apenas um simples sistema de engrenagem mecânica que potencializa a força humana, a bicicleta é considerada um veículo capaz de atingir elevada velocidade e de agilizar deslocamentos curtos e longos. Assim relação do uso da bicicleta e do ciclismo passou a ter uma relação estreita com os outros veículos que transitam pelas ruas e avenidas. . FONTES: -Semanário Ilustrado A Bicycleta, 1896 nº 04, 11, 18, 19 e s/n. -Semanário de Reclame Arte e Sport, 22/11/1903 nº3. -A Bohemia, 1896 nº 10 -O Estado de São Paulo 1890 – 1910 12O velódromopassou a ser a sede do Athletico Clube Paulistano fundado em 1900. A primeira partida do campeonato paulista foi realizado no velódromo paulista no mesmo ano. 13 Muitas notas e anúncios no O Estado de São Paulo e No correio Paulistano, jornais de grande circulação na cidade no período estudado, 1890-1910, apontam presença das bicicletas em São Paulo. Multas, acidentes, atropelamentos, colisões, roubos dentre outras ocorrências apareciam com frequência entre 1890 e 1910 nas notas policiais. Lojas, importadores, mecânicas e alfaiatarias anunciavam seus produtos e serviços na busca por novos clientes. -Correio Paulistano, 1890-1910 REFERÊNCIAL TEÓRICO METODOLÓGICO. CERTEAU, MICHEL de. A invenção do cotidiano: artes do fazer. Petrópolis, Vozes, 1996. CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Tradução Maria Manoela Galhardo. Rio de Janeiro: Bertrand. 1990. ELIAS, Norbert, Eric DUNNING, A busca da excitação. Lisboa: Difel, 1992. MELO, V. A. de E SCHETINO, A. A bicicleta, o ciclismo e as mulheres na transição dos séculos XIX e XX. In: Revista Estudos Feminista vol. 17 no. 1 Florianópolis Jan./Apr. 2009 disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-026X2009000100007&script=sci_arttext> RAGO, Margareth. A invenção do cotidiano na metrópole: sociabilidade e lazer em São Paulo, 1900-1950. In: PORTA, P. (Org.). História da cidade de São Paulo.São Paulo: Paz e Terra, 2004. v. 3, p. 387-436. SCHETINO, André Maia. Pedalando na modernidade: a bicicleta e o ciclismo: uma análise comparada entre Rio de Janeiro e Paris na transição dos séculos XIX e XX. 2008. Dissertação (Mestrado em História Comparada) – Programa de Pós-Graduação em História Comparada, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, Rio de Janeiro, 2007. VIGARELLO, Georges. O tempo do desporto. In: Corbin, Alain. História dos tempos livres. Lisboa, 2001. p.231-262. WEBER, Eugen. França Fin-de-Siècle. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. FONTE DE FINANCIAMENTO: Bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), processo nº 134332/2015-6. (*)Yuri Vasquez Souza: Graduado em Educação Física- Licenciatura e Bacharelado- pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul. Mestrando em História Social na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP com ênfase movimentos sociais contemporâneos, história da tecnologia e do E-mail: yuri.vsouza@gmail.com.