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PROSA Aspectos gerais • Geração 45 – de 1945 a 1980 – fase final do Modernismo. • Em relação à 1.ª geração, os autores de 45 foram menos liberais e contestadores e voltaram a ser mais conservadores. Os nomes de maior expressão desse momento são: • João Cabral de Melo Neto (1920-1999) • Clarice Lispector (1920-1977) • João Guimarães Rosa (1908-1967) • Ariano Suassuna (1927) • Lygia Fagundes Telles (1923) https://www.google.com/url?q=http://educacao.globo.com/literatura/assunto/autores/joao-cabral-de-melo-neto.html&sa=D&source=editors&ust=1667344892552941&usg=AOvVaw1G8lDI8Tu6tMpYy1LWAQ38 https://www.google.com/url?q=http://educacao.globo.com/literatura/assunto/autores/clarice-lispector.html&sa=D&source=editors&ust=1667344892610326&usg=AOvVaw0IRtG7EWS67YBF-Xi9zUEx https://www.google.com/url?q=http://educacao.globo.com/literatura/assunto/autores/guimaraes-rosa.html&sa=D&source=editors&ust=1667344892610914&usg=AOvVaw1scQicepQVfMkvWhNhRrkp https://www.google.com/url?q=http://educacao.globo.com/literatura/assunto/autores/ariano-suassuna.html&sa=D&source=editors&ust=1667344892611310&usg=AOvVaw09yytxnmgnA22rQLyirqPP Tipos de prosa Prosa Intimista - explorando temas humanos, é mais íntima, psicológica e subjetivista. Principal autor (a): Clarice Lispector e Lygia Fagundes Telles. Prosa urbana - ambientada nos espaços urbanos em detrimento ao campo. Principal autor (a): Lygia Fagundes Telles. Prosa regionalista - foco nos aspectos no campo, na vida agrária, no uso da linguagem coloquial e regionalista. Principal autor: João Guimarães Rosa, Ariano Suassuna. MODERNISMO EM PROSA Já na prosa deparamos com duas distintas vertentes: Uma prosa de denso vasculhar psicológico em que se mergulha em busca de profundezas do ser, uma sondagem de envergadura nunca antes vista em nossa literatura, representada na obra de Clarice Lispector e de Lygia Fagundes Telles e outra de profunda reinvenção da linguagem, ambientada no espaço do Sertão, central na produção de Guimarães Rosa. Em Clarice, especialmente, veremos ainda a eclosão de uma prosa poética que reinventa os limites da produção literária, em um exercício de linguagem riquíssimo. Características Literárias (prosa) ✔ Uma das marcas mais flagrantes da ficção experimental é a interiorização do relato – chamado fluxo de consciência. ✔ Geralmente as narrativas são centradas em momentos de vivência interior das personagens. Os acontecimentos exteriores provocam interiorização. ✔ Preferem narração em primeira pessoa. Esse tipo de narração proporciona ao relato um intimismo inigualável, assim como verossimilhança. ✔ “lembrar de acontecimentos que viveu, em um longo monólogo, a apartir de um momento do cotidiano. Fluxo de consciência É uma técnica narrativa utilizada para expressar, por meio de um monólogo interior, os vários estados de espírito e as emoções que caracterizam uma personagem. Para isso, o narrador apresenta pensamentos sem se preocupar em garantir a articulação lógica entre as ideias: uma série de impressões (visuais, olfativas, auditivas, físicas, associativas) ganha forma no texto, recriando, em um universo ficcional, o funcionamento da mente humana. “Mas quem sou eu, recostada neste porão a observar meu setter que fareja em torno? Às vezes penso (ainda não tenho vinte anos) que não sou uma mulher, mas a luz que cai neste portão, no solo. Sou as estações, penso às vezes, janeiro, maio, novembro, a lama, a neblina, a madrugada. Não posso agitar-me nem esvoaçar docemente, nem misturar-me com outras pessoas. Mas agora, recostada neste portão até o ferro deixar marcas nos meus braços, sinto o peso que se formou dentro de mim. Algo foi-se formando na escola, na Suíça, algo duro. Nem suspiros nem risos; nem volteios nem frases engenhosas; nem as estranhas comunicações de Rhoda, quando olhos além de nós, sobre nossos ombros; nem as piruetas de Jinny, membros e corpo uma coisa só. O que sou é peso.” “Talvez a nordestina já tivesse chegado à conclusão de que a vida incomoda bastante, alma que não cabe bem no corpo, mesmo alma rala como a sua. Imaginavazinha, toda supersticiosa, que se por acaso viesse alguma vez a sentir um gosto bem bom de viver – se desencantaria de súbito de princesa que era e se transformaria em bicho rasteiro. Porque, por pior que fosse sua situação, não queria ser privada de si, ela queria ser ela mesma. Achava que cairia em grave castigo e até risco de morrer se tivesse gosto. Então defendia-se da morte por intermédio de um viver de menos, gastando pouco de sua vida para esta não acabar. Essa economia lhe dava alguma segurança pois, quem cai, do chão não passa. Teria ela a sensação de que vivia para nada? Nem posso saber, mas acho que não. Só uma vez se fez uma trágica pergunta: Quem sou eu? Assustou-se tanto que parou completamente de pensar.” A hora da estrela O projeto literário da prosa pós-moderna Como não existe uma definição única de Pós-Modernismo, não há somente um projeto literário para a prosa pós-moderna. O universo ficcional de Guimarães Rosa se caracteriza pelo uso particular da linguagem e por, nesse mundo aparentemente regional, tratar de temas próprios a todos os seres humanos. Guimarães Rosa envolve o leitor em uma imensa rede de histórias que abrem espaço para a reflexão sobre as grandes questões universais que atormentam o ser humano. Essas questões dizem respeito a temas como o bem e o mal, a sanidade e a loucura, o certo e o errado, o amor e a morte, o acaso e o destino Suas narrativas abandonam o interesse pelo enredo, para submeter as personagens a um processo de individualização que permite a elas reconhecer a própria identidade. Esse reconhecimento as faz reavaliar o contexto em que se encontram e questionar a sua submissão às expectativas familiares e sociais. O projeto literário da prosa pós-moderna Linguagem: experimentalismo criador Tanto em Guimarães Rosa como em Clarice Lispector, o trabalho com a linguagem é a principal ferramenta para a criação literária. Na obra de Guimarães Rosa, esse trabalho aparece sob a forma da experimentação radical com as palavras: resgate de termos arcaicos, criação de neologismos, tentativa de fugir dos clichês, reconstrução da fala regional do interior de Minas, criando ritmos inesperados, inversões surpreendentes, imagens delicadas e belas Quando escrevo, repito o que já vivi antes. E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente. Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser um crocodilo porque amo os grandes rios, pois são profundos como a alma de um homem. Na superfície são muito vivazes e claros, mas nas profundezas são tranquilos e escuros como o sofrimento dos homens. ROSA, Guimarães. Disponível em: <http://www.tvcultura.com.br/ aloescola/literatura/guimaraesrosa>. Acesso em: 2 jul. 2015 Em Clarice Lispector, a experimentação afeta principalmente a estrutura da narrativa. O domínio da técnica do fluxo de consciência, porém, torna-se a marca registrada da autora. Linguagem: experimentalismo criador — — — — — — estou procurando, estou procurando. Estou tentando entender. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi. Não sei o que fazer do que vivi, tenho medo dessa desorganização profunda. Não confio no que me aconteceu. Aconteceu-me alguma coisa que eu, pelo fato de não a saber como viver, vivi uma outra coisa? A isso quereria chamar desorganização, e teria a segurança de me aventurar, porque saberia depois para onde voltar: para a organização anterior. A isso prefiro chamar desorganização pois não quero me confirmar no que vivi — na confirmação de mim eu perderia o mundo como eu o tinha, e sei que não tenho capacidade para outro. [...] LISPECTOR, Clarice. A paixão segundo G. H. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. p. 11. (Fragmento). Autores Guimarães Rosa: o descobridor do sertão universal O caráter regionalista que definiua ficção da geração de 1930 aparece completamente transformado nas obras de Guimarães Rosa. As marcas regionais são evidentes nos termos utilizados, na recriação da fala de jagunços e de vaqueiros do interior de Minas. As questões tematizadas, porém, vão muito além de uma perspectiva regional. Em suas narrativas, Rosa fala dos grandes dramas humanos: a dor, a morte, o ódio, o amor, o medo. Indagações filosóficas aparecem na boca de homens simples, incultos, deixando claro que os grandes fantasmas da existência podem ser identificados em qualquer lugar, desde um grande centro urbano até um minúsculo vilarejo nos sertões das Gerais. Guimarães Rosa: o descobridor do sertão universal Observe “O real não está no início nem no fim, ele se mostra pra gente é no meio da travessia”. “O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”. “Apertou em mim aquela tristeza, da pior de todas, que é a sem razão de motivo”. “Se eu fosse filho de mais ação e menos ideia, isso sim, tinha escapulido, calado “. “Um dia ainda entra em desuso matar gente”. “O senhor saiba: eu toda a minha vida pensei por mim, sou nascido diferente. Eu sou é eu mesmo. Diverjo de todo o mundo”. “A gente morre é para provar que viveu”. “Viver é muito perigoso: sempre acaba em morte”. “Quem ama é sempre muito escravo, mas não obedece nunca de verdade”. Caracterizam sua obra Caracterizam sua obra Observe — Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvore, no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade. Daí, vieram me chamar. Causa dum bezerro: um bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser — se viu —; e com máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito como nasceu, arrebitado de beiços, esse figurava rindo feito pessoa. Cara de gente, cara de cão: determinaram — era o demo. Grande Sertão Veredas As narrativas curtas: contos e novelas Guimarães Rosa tornou-se conhecido pelo livro de contos Sagarana. Quando a obra surgiu, em 1948, causou surpresa pela linguagem, que recriava o português como língua literária e dava uma dimensão nova ao regionalismo. Dos contos e novelas de Guimarães Rosa, emerge um mundo sempre marcado pelo confronto de opostos: o arcaico e o moderno, o rural e o urbano, o oral e o escrito. COLETÂNEA DE CONTOS As narrativas curtas: contos e novelas O título da obra é um hibridismo: "saga", radical de origem germânica que significa "canto heroico", "lenda"; e "rana", palavra de origem tupi que significa "que exprime semelhança ". Assim Sagarana significa algo como "próximo a uma saga". COLETÂNEA DE CONTOS https://guiadoestudante.abril.com.br /estudo/sagarana-resumo-da-obra- de-guimaraes-rosa/ Sagarana Ficha técnica • Primeira obra de Guimarães Rosa a sair em livro, traz nove contos, nos quais o universo do sertão, com seus vaqueiros e jagunços, surge no estilo marcante que o escritor iria aprofundar em textos posteriores. • Publicado em 1948 • Em relação ao foco narrativo, com exceção dos contos “Minha Gente” e “São Marcos” – que são narrados em primeira pessoa –, os demais possuem narradores em terceira pessoa. • Quanto ao tempo e ao espaço de “Sagarana”, pouco há o que ser dito. Sobre o primeiro elemento, vale destacar a linearidade da narrativa, que se desenvolve na maior parte sob o tempo psicológico dos personagens. Obras •Contos – Sagarana; Primeiras estórias, Tutameia; Estas estórias. •Novelas – Corpo de bailes (a partir da terceira edição, esta obra foi dividida em três volumes – Manuelzão e Miguilim; No Urubuquaquá; no Pinhém; Noite do sertão) •Romance – Com o vaqueiro Mariano; Grande Sertão Veredas. • Diversos – Ave, palavra. https://docs.google.com/document/d/19-KXZqk4TQgLUG-teaKHIstfRo6dAEAHgHhFCbhr uE4/edit?usp=sharing Grande sertão: veredas e os avessos do homem ❖ Publicada em 1956, inicialmente chama atenção por sua dimensão – mais de 600 páginas – e pela ausência de capítulos. ❖ A obra, uma das mais importantes da literatura brasileira, é elogiada pela linguagem e pela originalidade de estilo presentes no relato de Riobaldo, ex-jagunço que relembra suas lutas, seus medos e o amor reprimido por Diadorim. Personagens ● Riobaldo: protagonista da obra, Riobaldo é o narrador-personagem, um velho fazendeiro, ex-jagunço. ● Diadorim: O grande amor de Riobaldo, representa o amor platônico, impossível. ● Nhorinhá: Uma prostituta, representa amor carnal de Riobaldo. ● Otacília: Outro amor de Riobaldo, representa a pureza do amor verdadeiro. ● Zé Bebelo: fazendeiro com pretensões políticas, pretende acabar com os jagunços do sertão mineiro, sobretudo com o bando de Joca Ramiro. ● Joca Ramiro: pai de Diadorim, o maior chefe dos jagunços. ● Medeiro Vaz: outro chefe dos jagunços, que lidera a vingança contra Hermógenes e Ricardão. ● Hermógenes e Ricardão: assassinos do chefe Joca Ramiro, Hermógenes representa o líder dos jagunços inimigos. ● Só Candelário: outro chefe dos jagunços, torna-se líder do bando de Hermógenes. ● Compadre Quelemém de Góis: amigo confidente de Riobaldo. ● Selorico Mendes, o padrinho. Enredo Riobaldo, protagonista e narrador de Grande sertão: veredas, cresceu na fazenda de seu “padrinho” (na verdade, o pai que não havia reconhecido a paternidade). Essa condição lhe garantiu alguma educação formal. Sua educação real, porém, acontece quando se junta a um bando de jagunços e começa a longa viagem pelo sertão das Gerais. Recontada em forma de um longo monólogo, a narrativa está situada no interior de Minas Gerais, onde geograficamente se localiza o sertão real associado ao romance de Guimarães Rosa. O texto, porém, povoa esse espaço com as sagas dos seus habitantes, o que o torna mítico. Assim, o sertão se expande, perde suas fronteiras geográficas e reais e passa a simbolizar a busca pelas respostas para as grandes questões humanas: o que é o bem?, o que é o mal? • Com a morte de sua mãe, Riobaldo passou a viver com seu padrinho, Selorico Mendes, na fazenda São Gregório; mais tarde ele descobrirá que Selorico é seu verdadeiro pai. • Por conseguinte, na fazenda conhece o bando de jagunços de Joca Ramiro, o chefe dos jagunços. Mais adiante, conhece Reinaldo, jagunço do bando de Joca Ramiro, que mais trade revela ser Diadorim, seu grande amor. • Note que, em suas digressões, Riobaldo foca sobretudo, no seu amor impossível, Diadorim, e na existência de Deus e do Diabo. • Por meio de uma narrativa ziguezagueante (não é linear), ou seja, labiríntica e espontânea, é narrado as divagações de Riobaldo, que descreve as personagens que compõem a obra e ainda, as lutas entre os bandos de jagunços, o conflito com o bando de Zé bebelo e a morte de chefe dos jagunços, Joca Ramiro. Enredo Estrutura da obra •O Grande Sertão Veredas é uma obra extensa com mais de 600 páginas, dividida em 2 volumes e não em capítulos. •Marcada pela oralidade e uma linguagem repleta de neologismos, arcaísmos e brasileirismos, a obra possui um enredo não-linear. •Ou seja, não segue uma sequência lógica dos fatos, sendo narrado em primeira pessoa (narrador personagem), cujo narrador é Riobaldo, que faz reflexões sobre os acontecimentos de sua vida. •Para tanto, o tempo da narrativa é o psicológico, em detrimento do tempo cronológico. https://www.google.com/url?q=https://www.todamateria.com.br/narrador-personagem/&sa=D&source=editors&ust=1667344902860095&usg=AOvVaw2KW-uHOViLTiFtYQnSPoSf Clarice Lispector Clarice Lispector: a busca incansável da identidade A menina Haia nasceu em Tchetchelnik, na Ucrânia. Quando veio para o Brasil, em 1922, recebeu o nome que a consagraria como uma das maiores escritoras brasileiras: Clarice Lispector (1920-1977). Sua estreia oficial no mundo das letras aconteceu com a publicação do romance Perto do coraçãoselvagem (1943). A obra desnorteou a crítica, que não estava preparada para a força da narrativa intimista de Clarice. SOBRE A OBRA O livro mostra o cotidiano de Joana, menina criada pelo pai, já que a mãe, Elza, morrera muito cedo. O pai passado alguns anos também morre, então ela vai morar com a irmã de seu pai. A tia não gostava de Joana, pois a presença da menina a sufocava e a enviou para um internato, lá ocorre uma paixão avassaladora por seu professor um pouco mais velho. Um ponto culminante que a enviou para o internato foi dias antes acompanhando à tia as compras, como um teste para si mesma e causa espanto aos outros, Joana roubou um livro, trazendo mais dificuldades a sua convivência com a família da tia. A descoberta do “eu” A literatura produzida por Clarice Lispector não se preocupa com a construção de um enredo tradicionalmente estruturado, com começo, meio e fim. Ela busca a compreensão da consciência individual, marcada sempre pela grande introspecção das personagens. Suas narrativas tratam do momento preciso em que uma personagem toma consciência da própria individualidade. Esse momento pode ser desencadeado por situações corriqueiras, como a contemplação de rosas ou a visão de um cego mascando chiclete. Como a autora declarou: “os meus livros não se preocupam com os fatos em si, porque para mim o importante é a repercussão dos fatos no indivíduo”. São situações narrativas complexas, em que as personagens passam por transformações capazes de abalar a estrutura prosaica de suas vidas. Observe Veja que • Ana é uma mulher de classe média com uma vida completamente organizada em torno da família. Sua vida é linear: nada sai dos trilhos, tudo ocorre segundo uma rotina prevista e esperada. O perigo está nas horas em que as tarefas domésticas já foram concluídas e Ana se vê com tempo em suas mãos. É em um desses momentos que se dá sua descoberta. Observe Assim Avistar um cego que mascava chiclete faz com que a vida tão controlada por Ana seja abalada em suas raízes. Essa visão a liberta da rotina de acontecimentos previsíveis e devolve-lhe a possibilidade de uma existência individual. O tormento de Ana prolonga-se por todo o dia até que, de volta ao convívio com o marido e com os filhos, o mundo familiar vai aos poucos recolocando-a em seu papel convencional. Esse processo de descoberta individual por que passam as personagens de Clarice Lispector é chamado de epifania. O termo faz referência à apreensão intuitiva da realidade por algo geralmente simples e inesperado. Nesse sentido, é a percepção do significado essencial de alguma coisa. Epifania Na obra de Clarice Lispector, epifania significa a descoberta da própria identidade a partir de um estímulo externo (como a visão do cego mascando chiclete, no conto “Amor”). As personagens, nesse momento, descobrem a própria essência, aquilo que as distingue das demais e as transforma em indivíduos singulares. Uma estrutura recorrente Nos seus muitos romances e contos, Clarice Lispector trata da condição feminina, da dificuldade de relacionamento humano, da hipocrisia dos papéis socialmente definidos, da busca pelo “eu”. As narrativas apresentam uma estrutura semelhante, que o crítico Affonso Romano de Sant’Anna definiu em quatro passos: 1. A personagem é disposta numa determinada situação cotidiana. 2. Prepara-se um evento que é pressentido discretamente pela personagem (algo como uma inquietação). 3. Ocorre o evento que ilumina sua vida (epifania). 4. Apresenta-se o desfecho, no qual a situação da vida da personagem, após a epifania, é reexaminada Uma estrutura recorrente O trabalho com a linguagem é fundamental para que esse processo de autodescoberta adquira a dimensão intimista que permite, ao leitor, acompanhar os efeitos, na personagem, do momento de iluminação. A autora promove, na forma do texto, uma desconstrução equivalente àquela vivida pelas personagens, fazendo com que a própria linguagem assuma uma função libertária. Outra característica recorrente, na ficção de Clarice, é a presença constante de animais (cavalo, galinha, barata, aranha, búfalo, gato, etc.) que representam o “coração selvagem” da vida, que pulsa descontrolada, sem se submeter às regras e expectativas sociais. Essa é uma forma também revolucionária de simbolizar a busca incessante das personagens pela libertação das amarras sociais e o mergulho no irreversível processo de individuação. Obras principais Laços de família A hora da estrelaPerto do coração selvagem Outras obras ● O Lustre (1946) ● A Cidade Sitiada (1949) ● A Maçã no Escuro (1961) ● A Legião Estrangeira (1964) ● A Paixão Segundo G. H (1964) ● O Mistério do Coelho Pensante (1967) ● A Mulher que Matou os Peixes (1968) ● Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres (1969) ● Felicidade Clandestina (1971) ● Água Viva (1973) ● A Imitação da Rosa (1973) ● Via Crucis do Corpo (1974) ● Onde Estivestes de Noite? (1974) ● Visão do Esplendor (1975) Laços de família • Laços de família é uma coletânea de contos, publicada em 1960, da escritora Clarice Lispector e eles se interligam através de uma temática comum a quase todos: o desentendimento familiar. As personagens criadas pela autora são pessoas comuns, massacradas pela banalidade comum a existência, mas que buscam a libertação. • São 13 contos centrados, tematicamente, no processo de aprisionamento dos indivíduos através dos “laços de família” https://www.google.com/url?q=https://www.coladaweb.com/biografias/clarice-lispector&sa=D&source=editors&ust=1667344905185685&usg=AOvVaw2rPXi2OnxZ1rclxOoQHjoA https://www.google.com/url?q=https://www.coladaweb.com/biografias/clarice-lispector&sa=D&source=editors&ust=1667344905186404&usg=AOvVaw0E8MPUhbRdbB3ufHXBOD4s Laços de família • Laços de família reúne treze contos, sendo que doze deles são narrados em terceira pessoa e apenas “O jantar” é narrado em primeira pessoa. Em todos eles a figura da família está presente nos contos da obra e através deles percebem-se os impasses do relacionamento familiar. • Há outra forma de organizar os contos de Laços de família, segundo Benedito Nunes, tendo como eixo central a tensão de conflito de transe nauseante (Amor), de cólera (Feliz aniversário), de ira (O jantar), de ódio (O búfalo), de loucura (A imitação da rosa), de medo (Preciosidade), de culpa (O crime professor de matemática); situação de confronto, não somente de pessoa a pessoa (O jantar, Amor, Feliz aniversário), porém também de pessoa a coisa (Amor, O crime do professor de matemática, A imitação da rosa). RESUMO DOS PRINCIPAIS ENREDOS • AMOR A personagem Ana é uma mulher casada, mãe de dois filhos, levava uma vida doméstica pacata e cuidava dos seus com muito zelo e amor. A sua paz desapareceu quando certa vez ao ir às compras deparou-se com um cego que teve os ovos que carregava quebrados devido à freada brusca do bonde. Ana terminou por descer no Jardim Botânico, onde pela paisagem começou a temer o inferno. Nesse instante é possível relacionar a beleza possível aos olhos e o cego que está privado disto. Portanto, esse é o fato que tanto impressiona e incomoda a personagem. Quando Ana retornou ao seu lar sentiu que algo havia mudado em si, então abraçou fortemente o filho, foi ajudar o marido quando ele derrubou o café que carinhosamente pegou-lhe pela mão e a levou para o quarto para dormirem. • UMA GALINHA • “Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã.” (p.30) Era uma galinha pronta para o abate, contudo, pega pelo pai da garota passa a ser a narradora do texto que acabou pondo um ovo, então rapidamente a menina avisa aos familiares sobre o fato e a nova condição de “mãe” da galinha e implora para que não matem a galinha, pois agora ela pusera um ovo e queria o bem deles. • Sentindo-se culpado por ter feito a galinha correr para o abate, o pai da garota nomeia a ave como de estimação e alertasobre a pena de que se o animal fosse sacrificado nunca mais se alimentaria de galinha. • Porém, um dia “mataram-na, comeram-na e passaram-se anos”. O conto evidencia que a rotina leva ao esquecimento e à banalidade. RESUMO DOS PRINCIPAIS ENREDOS • FELIZ ANIVERSÁRIO • Era aniversário de 89 anos de uma senhora, mãe de sete filhos, que morava com uma das filhas, Zilda, que preparou toda a festa. Após o almoço a filha preparou a mãe e a colocou no lugar de destaque da mesa, a cabeceira, para aguardar os convidados do aniversário que viriam no fim da tarde. • Porém a chegada deles foi um desastre, de modo que a aniversariante permanecia imóvel em seu lugar sem participar de sua festa. Após os parabéns a neta pediu a avó que cortasse o bolo, ela o fez com brutalidade e causou espanto em todos os presentes. • Com a continuação da festa, a senhora passou a observar com desprezo sua festa e cuspiu no chão. Zilda se envergonhou pelo ato da mãe, pois todos achavam que ela responsável pela mãe. Um dos filhos discursou para tentar amenizar a situação desagradável. • Ao anoitecer todos se despediram e foram embora. A idosa permaneceu na cadeira à espera do jantar que a filha serviria. • Esse conto narrado em terceira pessoa evidencia a hipocrisia da família. Ao tentarem manter os hábitos educados durante a festa mostram quão falsas são as relações familiares e a ausência de sentimentos sinceros entre parentes. Por isso, essa hipocrisia desperta a ira de Dona Anita, que não suporta essa característica nos seus. RESUMO DOS PRINCIPAIS ENREDOS A hora da estrela • “A Hora da Estrela” é o último romance da escritora brasileira Clarice Lispector, publicado em 1977. Trata-se de uma obra instigante e original, pertencente à Terceira Geração Modernista. • É classificada como um romance intimista, também conhecido como romance psicológico, estilo em que a autora se destaca. Afinal, a obra de Clarice é marcada por suas emoções e sentimentos pessoais. • Espaços da narrativa - Alagoas e Rio de Janeiro • Tempo em que se passava a estória: anos 70 • narrador em 1.ª/3.ª pessoa (Rodrigo S.M narra a história de Macabéa em 3.ª pessoa, ao mesmo tempo em que se coloca como personagem. Personagens • Rodrigo S.M: Este é o personagem narrador e é entendido como uma representação da própria Clarice Lispector. Ao longo do livro ele reflete sobre o próprio ato de escrever e se preocupa com a profundidade do ser humano. • Macabéa: Essa é a principal personagem. Trata-se de uma alagoana de 19 anos, muito desleixada, que vive sem a família no Rio de Janeiro. É muito ignorante e sequer reconhece a própria infelicidade. • Olímpico de Jesus: Primeiro namorado de Macabéa. Outro nordestino, mas muito ambicioso. • Glória: Filha do açougueiro e amiga de Macabéa. Ela, por ser mais atraente que a amiga, ficou com Olímpico de Jesus. • Madame Cartola: Cartomante que diz o futuro de Macabéa. • Raimundo: chefe de Macabéa. • As três Marias - moram na mesma pensão que Macabéa Resumo • A história é narrada por Rodrigo S.M. (narrador-personagem), um escritor à espera da morte. Ele é uma das peças-chave do livro. Ao longo da obra ele reflete os seus sentimentos e os de Macabéa, a protagonista da obra. • Nordestina órfã de pai e mãe, e criada por uma tia que a maltratava muito, Macabéa é uma alagoana pobre de 19 anos que possui um corpo franzino e só come cachorro quente. Além disso, ela é feia, virgem, tímida, solitária, ignorante, alienada e de poucas palavras. • Quando vai morar no Rio de Janeiro, consegue um emprego de datilógrafa na cidade. Chega a ser despedida pelo patrão, seu Raimundo, que por fim, tem compaixão de Macabéa, deixando-a permanecer com o trabalho. • No Rio de Janeiro, Macabéa mora numa pensão e divide o quarto com três moças. Todas elas são balconistas das Lojas Americanas e chamadas de “as três Marias”: Maria da Penha, Maria da Graça e Maria José. • Um de seus maiores prazeres nas horas vagas é ouvir seu rádio relógio, emprestado de uma das Marias. • Mesmo destituída de beleza, Macabéa (ou Maca, seu apelido) consegue encontrar um namorado, o nordestino ambicioso e metalúrgico Olímpico de Jesus Moreira Chaves. O namoro termina quando Glória, ao contrário de Macabéa, bonita e esperta, rouba seu namorado. • Quando vai à Cartomante, uma impostora chamada Madame Carlota, Macabéa descobre por meia das cartas sua “sorte”. No entanto, ao sair de lá, atravessa a rua muito contente pelas palavras que acabara de ouvir, sendo atropelada por um Mercedes Benz amarelo. • É ali que ocorre sua "hora da estrela", o momento em que todos a enxergam e ela se sente uma estrela de cinema. A obra possui uma grande ironia em seu término, visto que só no momento da morte é que Macabéa obtém a grandeza do ser. Resumo Foco narrativo •O enredo de A hora da Estrela não segue uma ordem linear: há flashbacks iluminando o passado, há idas e vindas do passado para o presente e vice-versa. Além da alinearidade, há pelo menos três histórias encaixadas que se revezam diante dos nossos olhos de leitor: • 1. A metanarrativa – Rodrigo S. M. conta a história de Macabéa: Esta é a narrativa central da obra: o escritor Rodrigo S.M. conta a história de Macabéa, uma nordestina que ele viu, de relance, na rua. • 2. A identificação da história do narrador com a da personagem – Rodrigo S.M. conta a história dele mesmo: esta narrativa dá-se sob a forma do encaixe, paralela à história de Macabéa. Está presente por toda a narrativa sob a forma de comentários e desvendamentos do narrador que se mostra, se oculta e se exibe diante dos nossos olhos. Se por um lado, ele vê a jovem como alguém que merece amor, piedade e até um pouco de raiva, por sua patética alienação, por outro lado, ele estabelece com ela um vínculo mais profundo, que é o da comum condição humana. • 3. A vida de Macabéa – O narrador conta como tece a narrativa. Ariano Suassuna Sobre o autor Ariano Suassuna (1927- 2014) foi um escritor brasileiro. "O Auto da Compadecida", sua obra-prima, foi adaptada para a televisão e para o cinema. Sua obra reúne, além da capacidade imaginativa, seus conhecimentos sobre o folclore nordestino. Foi poeta, romancista, ensaísta, dramaturgo, professor e advogado. Em 1989, foi eleito para a cadeira n.º 32 da Academia Brasileira de Letras. Em 1993, foi eleito para a cadeira n.º 18 da Academia Pernambucana de Letra e em 2000, ocupou a cadeira n.º 35 da Academia Paraibana de Letras. MOVIMENTO LITERÁRIO O dramaturgo pode ser considerado um dos escritores do movimento modernista, mais especificamente da 3ª fase, geração de 45. Mas a obra de Suassuna reúne elementos de diferentes movimentos, como o simbolismo, o barroco e a literatura de cordel, tão presente no nordeste. https://www.google.com/url?q=http://educacao.globo.com/literatura/assunto/movimentos-literarios/modernismo-geracao-de-45.html&sa=D&source=editors&ust=1667344906443153&usg=AOvVaw20_6EN_evyVSAYkp3cShP0 https://www.google.com/url?q=http://educacao.globo.com/literatura/assunto/movimentos-literarios/simbolismo.html&sa=D&source=editors&ust=1667344906443677&usg=AOvVaw3k-I0ldYny4-ZOIBSKVKnW https://www.google.com/url?q=http://educacao.globo.com/literatura/assunto/movimentos-literarios/barroco.html&sa=D&source=editors&ust=1667344906444067&usg=AOvVaw0iCfLdE4NpcNB0hNxrAcRA Estilo O nome do escritor costuma ser atrelado ao teatro, principalmente pelo papel que desempenhou na modernização do teatro brasileiro. A produção de Ariano Suassuna tem como característica a improvisação e o texto popular. O escritor coloca muitos elementos da cultura nordestina em suas peças. Suassura foi um dos fundadores do Movimento Armorial, que buscava criar a arte erudita através da cultura popular nordestina. O movimento inclui os diferentes tipos de arte, como dança, literatura, teatro, música e arquitetura. Ariano recebeu o apoio da Universidade Federal de Pernambuco e de vários escritores nordestinos, o MovimentoArmorial foi lançado em 1970. Movimento Armorial Em 1970, Ariano Suassuna cria e dirige o Movimento Armorial, com o objetivo de realizar uma arte brasileira erudita a partir das raízes populares. Mais do que um movimento, o armorial buscava ser um preceito estético, que partia das ideias de que é preciso criar a partir de elementos realmente originais da cultura popular do país, como os folhetos de cordel, os cantadores, as festas populares, entre outros aspectos. De 1969 a 1974, Ariano Suassuna atuou como Diretor do Departamento de Extensão Cultural da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Foi com apoio desse Departamento que Suassuna, ao lado de outros artistas, criou o movimento armorial em 18 de outubro de 1970. Obras destaques A primeira peça foi “Uma Mulher Vestida de Sol”, que recebeu o prêmio Nicolau Carlos Magno em 1948. Entre as mais conhecidas da carreira do escritor estão “Auto da compadecida”, de 1957, e “O Santo e a Porca”, de 1964, a primeira, inclusive, ganhou uma adaptação na televisão em 1999 com direção de Guel Arraes. O AUTO DA COMPADECIDA FICHA TÉCNICA • A peça foi escrita em 1955 e encenada pela primeira vez em 1956. Anos mais tarde, foi adaptada para a televisão e para o cinema, em 1999 e 2000 respectivamente. • A peça retoma elementos do teatro popular, contidos nos autos medievais, e da literatura de cordel para exaltar os humildes e satirizar os poderosos e os religiosos que se preocupam apenas com questões materiais. • Auto da compadecida é uma peça teatral em forma de auto (gênero da literatura que trabalha com elementos cômicos e tem intenção moralizadora). É um drama nordestino apresentado em três atos. Contém elementos da literatura de cordel e está inserido no gênero da comédia, se aproximando, nos traços, do barroco católico brasileiro. • Trabalha com a linguagem oral e apresenta também regionalismo através da caracterização do nordeste. Narrador A peça é narrada pelo palhaço e a história se inicia quando Chicó e João Grilo tentam convencer o padre a benzer o cachorro de sua patroa, a mulher do padeiro. Como o padre se nega a benzer e o cachorro morre, o padeiro e sua esposa exigem que o padre faça o enterro do animal. João Grilo diz ao padre que o cachorro tinha um testamento e que lhe deixara dez contos de réis e três para o sacristão, caso rezassem o enterro em latim. Quando o bispo descobre, Grilo inventa que, na verdade, seis contos iriam para a arquidiocese e apenas quatro para paróquia, para que o bispo não arrumasse problemas. Resumo A primeira peripécia narrativa da peça, o enterro do cachorro, pode ser encontrada em diversas obras anteriores, como no cordel “O Dinheiro”, de Leandro Gomes de Barros (1865-1918). Nesse cordel, um cachorro também deixara uma soma em dinheiro no testamento com a condição de que fosse “enterrado em latim”. As duas próximas peripécias, ambas encontradas na segunda parte da peça (que pode ser dividida em três atos), apresentam um gato que supostamente “descome” dinheiro e de um instrumento musical que seria capaz de ressuscitar os mortos. Essas duas estruturas narrativas estão no romance de cordel “História do Cavalo que Defecava Dinheiro”, também de Leandro Gomes de Barros. Importante saber Na peça, porém, Suassuna substituiu o cavalo por um gato, certamente para facilitar a encenação. Esse é um exemplo de como uma necessidade prática pode influir na narrativa, obrigando o autor a transformá-la conforme as necessidades impostas pela forma de apresentação. A apropriação da tradição, ao contrário de ser facilitada pela tematização prévia, é dificultada, pois, ao imitar, é preciso fazer jus a quem se imita, superando-o ou pelo menos igualando-se a ele em qualidade e inventividade. No texto de Leandro Gomes, o instrumento musical capaz de levantar defuntos era uma rabeca e, em Suassuna, passa a ser uma gaita, provavelmente também por causa de uma necessidade cênica. IMPORTANTE No último ato da peça ocorre o julgamento dos personagens que foram mortos por Severino de Aracaju, e do próprio Severino, morto por uma facada de João Grilo. É impossível não pensar no “Auto da Barca do Inferno”, de Gil Vicente, em que uma série de personagens é julgada por seus atos em terra e tem como juízes um anjo e um demônio. A fonte direta de Suassuna, porém, estava mais próxima. É “O Castigo da Soberba”, romance popular nordestino, de autoria anônima, no qual a compadecida aparece para salvar um grupo de condenados. Fica patente o cunho de moralizante da peça, que assume uma posição cujo foco está na base da pirâmide social, a melhor maneira de desvelar os discursos mentirosos das autoridades e integrar os homens e mulheres por meio da compaixão, a qual só os desprendidos podem desenvolver. Nesse aspecto, a moral que se depreende da peça é muito semelhante à do cristianismo primitivo, que se baseava no preceito “amai-vos uns aos outros”. PERSONAGENS Os personagens de “Auto da Compadecida” são alegóricos, ou seja, não representam indivíduos, mas tipos que devem ser compreendidos de acordo com a posição estrutural que ocupam. A criação desses personagens possibilita que se enxergue a sociedade de uma cidadezinha do Nordeste. É por isso que a peça pode ser chamada sátira social, pois procura reformar os costumes, moralizar e salvar as instituições de sua vulgarização. Na literatura, a alegoria representa, mais precisamente, uma figura de palavra de caráter moral, a qual deixa de lado seu sentido meramente denotativo, para pôr em prática o sentido figurado das palavras, ou seja, a duplicidade de sentidos, ou mesmo sua plurissignificação (multiplicidade de significados). Personagens • O Palhaço: como a peça é escrita para ser encenada em forma de teatro de rua, o palhaço atua como um apresentador, entrando e saindo da trama e conversando com o público. • - João Grilo: Um homem pobre e astuto que vive arranjando confusões. Trabalha para o Padeiro e é o melhor amigo de Chicó. Usa de sua inteligência para sobreviver. • - Chicó: É medroso quando se trata das confusões de João Grilo. Gosta de contar histórias. Também trabalha para o Padeiro e é o melhor amigo de João. • - O padeiro: Homem avarento, dono da padaria de Taperoá. Esposo de uma mulher infiel. • - A mulher do padeiro: Mulher adultera que se diz santa. Gosta de animais e é interesseira. Assim como o marido, é muito avarenta. • - Padre João: Padre que chefia a paróquia de Taperoá. Age conforme os interesses dos mais poderosos, é avarento e usa de sua autoridade religiosa para obter lucro material. • - Bispo: Assim como o padre, utiliza do cargo para obter lucro. • - Sacristão: é o sacristão da paróquia. Também cede a chantagem de João Grilo na tentativa de enterrar o cachorro quando descobre que ficaria com três contos de réis. • - Antônio Morais: é um major ignorante e autoritário, que usa seu poder para amedrontar os mais pobres. • - Severino: é um cangaceiro que encontrou no crime uma forma de sobrevivência, já que seus pais foram mortos pela Polícia. • - Cangaceiro: É um dos capangas de Severino. Vive fazendo de tudo para agradar seu chefe, ao qual idolatra. Personagens • - A Compadecida: É a própria Nossa Senhora. Bondosa e cândida, ela intercede por todos no Julgamento. • - Emanuel: É o próprio Jesus Cristo, e também o juiz do povo, julgando sempre com sabedoria e imparcialidade, mas tem o dom da misericórdia. Nesta versão, ele possui a pele negra, o que causa espanto em alguns. • - Encourado: é a encarnação do Diabo. Vive tentando imitar Manuel, por isso exige reverências pelos lugares onde passa. É o justo promotor do Julgamento, mas diferentemente de Emanuel e da Compadecida, não possui misericórdia. Personagens Análise • A peça trata, de maneira leve e com humor, do drama vivido pelo povo nordestino: acuado pela seca, atormentado pelo medo da fome e em constante luta contra a miséria. Traça o perfil dos sertanejos nordestinosque estão submetidos à opressão e subjugados por famílias de poderosos coronéis donos de terra. Nesse contexto, o personagem de João representa o povo oprimido que tenta sobreviver no sertão, utilizando a única arma do pobre: a inteligência. • Fica evidente o cunho de sátira moralizante da peça, através das características de seus personagens. O padeiro e a mulher são avarentos, deixando passar necessidade o empregado enquanto cuidam bem do cachorro. O padre e o bispo, gananciosos, utilizam da autoridade religiosa para enriquecerem. Todos estes são condenados ao purgatório com a interseção de Nossa Senhora. Já Severino e o cangaceiro, apesar de todos os crimes cometidos em vida, são poupados por serem considerados vítimas naquela situação: a seca, a fome e toda a difícil realidade os obrigaram a levar este tipo de vida. •A peça é uma síntese do modelo medieval com o modelo regional: trabalha o tema religioso da moral católica (se aproximando dos temas barrocos), mas inserido no contexto nordestino, ou seja, regional. •Por ser um dos objetivos do movimento modernista trabalhar tendências mundiais de forma regional, adaptando-se a nossa realidade, a peça pode ser considerada como uma tendência modernista. Análise Lygia Fagundes Telles Lygia Fagundes Telles, escritora brasileira, nasceu em 19 de abril de 1923, em São Paulo. Publicou seu primeiro livro de contos — Porões e sobrados — em 1938. Formada em Direito, trabalhou como procuradora do Instituto de Previdência do Estado de São Paulo, foi presidente da Cinemateca Brasileira e fez parte da comissão que, em 1977, entregou ao ministro da Justiça o Manifesto dos intelectuais, abaixo-assinado contra a censura. Sobre a autora ● Prosa intimista. ● Conflito existencial. ● Fluxo de consciência ou monólogo interior. ● Personagens imersos em dúvidas e incertezas. ● Fragmentação da narrativa. ● Dimensão psicológica dos personagens. ● Foco nas relações humanas. ● Contextualização sociopolítica. ● Apresenta um universo marcadamente feminino ● Comprometida em documentar a difícil condição de vida de uma sociedade frágil dos centros urbanos, uma literatura engajada, destinada a documentar a história trágica do país Estilo literário de Lygia Fagundes Telles ● A estreia oficial de Lygia Fagundes Telles na literatura ocorreu em 1944, com o volume de contos "Praia Viva" ● Segue com a contínua produção de contos e romances, entre eles, “Ciranda de Pedra” (1954). ● Em 1958, publica o livro de contos, “História do Desencontro”. ● Em 1963, publica seu segundo romance “Verão no Aquário” ● Escreveu o roteiro para o filme Capitu (1967), baseado na obra Dom Casmurro de Machado de Assis, Carreira literária ● Datado de 1954. ● O centro da história se dá em um acontecimento familiar: o desmembramento da família de Virgínia. Após a doença e morte de sua mãe, e o suicídio do seu padrasto (que na verdade é seu pai verdadeiro) a situação financeira da família fica difícil e Virgínia se vê obrigada a deixar sua casa para ir morar com seu pai (o homem que lhe fora apresentado como pai durante toda a sua vida) e suas irmãs. Devido à distante relação que tinha com o Pai, ela passa a viver conflitos, medos, ansiedades, solidão, angústias, além do sentimento de culpa que tem devido a tragédia que acontecera. Obra destaque ● Quanto ao título, observamos que se refere, em um primeiro momento, a uma ciranda de anões de pedra que ornamenta o jardim da casa onde Virgínia passa a viver. No decorrer da leitura, compreende-se a metáfora existente através desta ciranda, que na verdade representa o comportamento das personagens, simboliza o fechamento diante da presença de outros indivíduos. O grupo é a nova família de Virgínia, que não a aceita a princípio, mas que em um segundo momento a convida para fazer parte, e ela acaba se tornando o centro da “ciranda”. Obra destaque ● Porão e sobrado (1938) — contos ● Praia viva (1944) — contos ● O cacto vermelho (1949) — contos ● Ciranda de pedra (1954) — romance ● Histórias do desencontro (1958) — contos ● Verão no aquário (1963) — romance ● Antes do baile verde (1970) — contos ● As meninas (1973) — romance ● Seminário dos ratos (1977) — contos ● A disciplina do amor (1980) — memórias Obras ● Venha ver o pôr do sol e outros contos (1987) — contos ● As horas nuas (1989) — romance ● A estrutura da bolha de sabão (1991) — contos ● A noite escura e mais eu (1995) — contos ● Oito contos de amor (1996) — contos ● Invenção e memória (2000) — contos ● Durante aquele estranho chá (2002) — memórias ● Conspiração de nuvens (2007) — conto ● Passaporte para a China (2011) — crônicas ● Um coração ardente (2012) — contos ● O segredo e outras histórias de descoberta (2012) — contos Obras