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Gastropediatria ALERGIA ALIMENTAR Reação adversa a um componente alimentar específico desencadeada por quaisquer tipos de resposta imunológica (IgE mediada, não IgE mediada – enterocolite e proctocolite - e tipo misto – esofagite e gastroenterite eosinofílica -). Afeta cerca de 8% das crianças < 3 anos e 3-4% dos adultos Criança com dermatite atópica, tem mais prevalência de alergia alimentar. Alérgenos alimentares mais comuns associados à IgE: · · Leite · Ovo · Amendoim · Soja · Trigo · Nozes · Peixe · Crustáceos Reação tardia (LT) - maioria dos sintomas gastrointestinais Geralmente crianças no 1º ano de vida, com HF de atopia (principalmente asma e eczema atópico), com exposição precoce à proteína de outra espécie. · Quanto mais precoce exposto à proteína heteróloga, maior chance de desenvolver alergia alimentar Algumas reações adversas diagnosticadas como alimentar, envolvem mecanismos farmacológicos e metabólicos, reações a toxinas alimentares ou intolerâncias (ex.: à lactose) Intolerância à lactose é diferente de alergia à proteína do leite!! (são substâncias diferentes) · Intolerância à lactose: reação gastrointestinal à lactose (dissacarídeo do leite) 🡪 causa diarreia osmótica (explosiva) com fermentação e acidez nas fezes · Alergia à proteína do leite de vaca: reação alérgica a uma proteína MECANISMOS DE DEFESA DO TGI Evitam que toxinas/microorganismos passem para a circulação, impedem que o organismo entre em contato com proteínas específicas. Uma quebra dessas barreiras pode gerar a cascata de reação imunológica A barreira mecânica representada pelo próprio epitélio intestinal e pela junção firme entre suas células epiteliais (enterócitos 🡪 promovida por tight junctions, desmossomos, entre outros), a flora intestinal, ácido gástrico, secreções biliares e pancreáticas e a própria motilidade intestinal Muco que recobre as células epiteliais e contém diferentes mucinas. Ele ajuda na formação da primeira linha de defesa, facilita aderência das bactérias por componentes da parede celular, ai a peristalse elimina elas. Alterações na permeabilidade intestinal e nos mecanismos de barreira podem ser a origem de doenças do TGI envolvendo processos inflamatórios Mecanismos de defesa específicos, relacionados à defesa imunológica do TGI, podem ser encontrados em 3 níveis: 1. Barreira epitelial intestinal 2. Lâmina própria 3. Sistema imunológico do TGI (GALT – gust-associated lymphoid tissue): maior órgão linfoide do organismo, linfonodos intestinais Possibilidades de um alimento se tornar capaz de induzir reações: · Ingestão, contato com a pele ou trato respiratório. · Reatividade cruzada, (produção de IgE específica e sensibilização antes mesmo do contato com o alimento) 🡪 alérgenos parecidos entre si imunologicamente · Reatividade cruzada entre um alérgeno inalável (ex.: pólens, látex) responsável pela sensibilização e produção de IgE e ingestão do alimento 🡪 ex.: se a criança é alérgica ao pólen e ingere mel, pode ter reação alérgica FATORES DE RISCO PARA ALERGIA ALIMENTAR · Lactente masculino; asiáticos e africanos; comorbidades alérgicas; desmame precoce; insuficiência de VIT.D · Redução do consumo de ac graxos poli-insaturados, antioxidantes · Uso de antiácidos que dificulta a digestão dos alérgenos 🡪 ácido gástrico (clorídrico) tem como função desnaturar proteínas · Obesidade (inflamação) · Época e via de exposição aos potenciais alérgenos alimentar · Teoria da higiene · Hereditariedade: se um membro da família tem, aumenta em 40% a chance do paciente ter. HISTÓRIA NATURAL DA ALERGIA ALIMENTAR Em crianças, a maioria é transitória, já em adultos é persistente. A prevalência está aumentando, tempo para desenvolver tolerância está maior. Fatores de risco para maior persistência da alergia alimentar: Antecedente de reações graves a determinado alérgeno, desencadeadas por mínimas quantidades do alimento Presença de comorbidades alérgicas Altos níveis de IgE específica para o alimento alergênico Leite, soja, ovo e trigo: com frequência se associam à remissão da alergia ao longo do tempo Amendoim, nozes e castanhas: tendem a gerar quadro alérgico mais persistente MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS SINAIS E SINTOMAS GERAIS SINAIS E SINTOMAS DIGESTIVOS Anemia Perda de peso Déficit de crescimento Recusa alimentar (associada a dor ao comer) Irritabilidade Choro Dor abdominal Diarreia (mucossanguinolenta) Náusea Vomito Hematêmese, melena Enterorragia Outros sintomas: Urticária, rubor, angioedema facial e prurido da boca ou da garganta EM CASOS GRAVES: angioedema de língua, úvula, faringe ou vias respiratórias superiores Esporadicamente: rinoconjuntivite ou sibilância de modo isolado (lactentes sibilantes). Raramente: anafilaxia ao alimento pode envolver apenas colapso cardiovascular DIAGNÓSTICO Anamnese: identificar os sintomas que possam cursar com esse diagnóstico. · História de relação temporal entre a ingesta de alimentos suspeitos e o início da reação · Natureza e duração dos sintomas observados Medidas por IgE: sintomas ocorrem de min a 2h pós ingestão. Não mediados por IgE e mistos: início mais tardio Algumas vezes, podem ocorrer sintomas agudos, porém a causa pode não ser óbvia, devido à alérgenos alimentares oculto Teste cutâneo: teste cutâneo negativo ou nível sérico indetectável de IgE, pode ser necessária a execução de um Teste de provocação oral para confirmar ausência ou presença de alergia Teste de Provocação oral: se introduz o alimento suspeito e se avalia a resposta do paciente a esses alimentos 🡪 deve ser realizado em local adequado, com assistência médica · Exclusão de alergia alimentar, reações transitórias. · Alergia de reatividade cruzada. · Paciente com dúvida se é alérgico ou não · Avaliar a tolerância ao alimento em diferentes processamentos (ex.: assado, cozido...) · Pode se usar placebo As dietas de eliminação extensas quase nunca estão indicadas, e prefere-se uma avaliação por um alergologista antes da eliminação desnecessária de múltiplos alimentos As dietas de eliminação e os testes de provocação oral também podem constituir as únicas ferramentas para avaliar a suspeita de reações alimentares não mediadas por IgE MEDIADA POR IGE MISTO NÃO MEDIADA POR IGE Pele Urticaria, angioedema, rash eritematoso mobiliforme, rubor Dermatite atópica Dermatite herpetiforme Dermatite de contato Respiratório Rinoconjuntivite alérgica Broncoespasmo agudo Asma Síndrome de Heiner Gastrintestinal Sindrome de alergia oral Espasmo intestinal agudo Esofagite eosinofílica Gastrite eosinofílica Gastroenterite eosinofílica FPIES FPIPS Sindrome de enteropatia induzida pela alergia alimentar Cardiovascular Tontura e desmaio Miscelânea Cólicas e contrações uterinas Sentimento de morte iminente Sistêmicas Anafilaxia DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Estenose pilórica: hipertrofia do piloro, gerando estreitamento da luz pilórica e vômitos de repetição (lactente até 3-4m) DRGE Na presença de sintomas gastrointestinais crônicos, considerar a possibilidade de: · Deficiências enzimáticas: ex.: à lactose (deficiência à lactase) · Fibrose cística · Doença celíaca · Infecções intestinais crônicas · Malformações gastrointestinal · Síndrome do intestino irritável TRATAMENTO Evitar os alimentos que causam reação Consulta com nutricionista Pacientes com histórico de reação grave devem portar epinefrina auto-injetável e anti-histamínico de ação rápido. LACTENTES Em aleitamento materno: a mãe deve ser submetida à dieta de exclusão do alérgeno envolvido, se o lactente manifesta reação. · Na restrição total de leite de vaca e derivados, deve ser recomendada a suplementação de cálcio e vitamina D para a mãe Sem aleitamento materno ou complementado: · As fórmulas hidrolisadas devem ser usadas · Durante este período, os lactentes com APLV devem ser mantidos com fórmulas sem a proteína intacta do leite de vaca, que podem ser extensamente hidrolisadas à base da proteína do leite de vaca (Pregomin, Alfaré), aminoácidos livres (dietaelementar – Neocate, Alfamino) ou de proteína isolada de soja (somente para crianças maiores de 6 meses e sem manifestação do TGI) CONSTIPAÇÃO CRÔNICA Prevalência: 14-36% na população pediátrica Incidência entre 2-4 anos de idade, podendo relacionar-se com a retirada das fraldas (questões psicológicas, por exemplo) Controle esfincteriano: · Noturno: até 5 anos · Diurno: até 3 anos OBS.: Geralmente o controle esfincteriano fecal vem primeiro que o urinário O controle esfincteriano tem relação com a mielinização, então muito precocemente a criança ainda não tem o processo completo para conseguir controlar CAUSAS ORGÂNICAS Causas intestinais ou anorretais: imperfuração anal, estenose anal, doença de Hirschspurg, anus ectópico Defeitos da medula espinal: alteração na inervação do intestino, gerando constipação por alteração neurológica e anatômica · Espinha bífida · Meningomielocele: gera também bexiga neurogênica Doenças endocrinológicas e metabólicas: hipotireoidismo, hipercalcemia, hipocalcemia, hipopotassemia. Doenças musculares: · Paralisia cerebral: doença neurológica que cursa com fraqueza muscular e hipotonia · Distrofia muscular Medicamentosa: anticonvulsivantes, codeína, morfina, anticolinérgicos Doenças sistêmicas: fibrose cística, doença celíaca OBS.: Encoprese (escape fecal): pode ocorrer por escapes das fezes amolecidas que passam em torno das fezes impactadas no reto · Cólon descendente: reabsorção de água 🡪 endurecimento das fezes · Em pacientes constipados, há impactação e acúmulo de fezes no intestino grosso (cólon descendente), gerando um círculo vicioso, pois quanto mais ficam nessa estase, mais endurecem. E as fezes que estão chegando, vem líquidas em torno desse bolo fecal e o paciente perde essas fezes (pois perde o feedback que “avisa” quando está na hora de evacuar) CONSTIPAÇÃO FUNCIONAL D. HIRSCHSPRUNG Idade de início Varia Ao nascer Eliminação do mecônio Primeiras 24h de vida Retardada Distensão abdominal Rara Frequente Escape fecal Pode estar presente Raro Toque retal Ampola cheia Ampola vazia Enema opaco Distensão retal Estreitamento do segmento distal com dilatação proximal Manometria anorretal Reflexo reto anal normal Não tem relaxamento do esfíncter anal com a distensão retal Biopsia retal Presença de células ganglionares Ausência de células ganglionares ESCALA DE BRISTOL 1. Nódulos duros e separados 2. Fezes endurecidas, nódulos agrupados 3. Fezes moldadas com rachaduras na superfície 4. Fezes moldadas de aspecto liso e amolecido 5. Fezes não moldadas com bordas definidas 6. Fezes pastosas, semi-liquidas e bordas irregulares 7. Fezes liquidas, sem pedaços sólidos. CRITÉRIOS DE CONSTIPAÇÃO RECÉM-NASCIDOS, LACTENTES E PRÉ-ESCOLARES (< 4 ANOS) 2 dos seguintes critérios por no mínimo 1 mês: · 2 ou menos evacuações/semana · Pelo menos 1 episódio/semana de incontinência fecal, após a aquisição do controle do esfíncter anal · Comportamento e retenção para evitar e defecção (devido à dor) · Presença de dor ou dificuldade para evacuar · Presença de grande quantidade de fezes no reto · Fezes cibalosas ou duras (escala de Bristol 1 ou 2) · Eliminação de fezes de grande diâmetro, podem causar entupimento do vaso sanitário ESCOLARES E ADOLESCENTES (> 4 ANOS) Com desenvolvimento neuropsicomotor adequado e que não preencham critérios para síndrome do intestino irritável Pelo menos 2 dos seguintes · 2 ou menos evacuações/semana no vaso sanitário · Pelo menos 1 episódio/semana de incontinência fecal · Comportamento de retenção ou retenção voluntária das fezes · Evacuação com dor ou dificuldade · Presença de grande quantidade de fezes no reto · Fezes cibalosas ou duras (Bristol 1 ou 2) · Eliminação de fezes de grande diâmetro, que podem causar entupimento do vaso sanitário - Sintomas inespecíficos: irritabilidade, saciedade precoce e diminuição do apetite podem acompanhar esses sintomas - OBS.: Palpação de fossa ilíaca esquerda: geralmente é possível palpar fezes em crianças constipadas - Nunca dar alta para criança recém-nascida do hospital antes da eliminação do mecônio SINAIS DE ALERTA PARA CAUSAS ORGÂNICAS - Hábito intestinal anormal ao nascimento - Hipodesenvolvimento - Neuropatia/paralisia cerebral - Distensão abdominal - Sinais/sintomas obstrutivos - Malformações lombossacrais e/ou perineais - Ânus anteriorizado - Sangramento retal EXAMES COMPLEMENTARES · Hemograma · Cálcio, potássio · Hormônios tireóideos · Anticorpo antitransglutaminase: investigação de doença celíaca · Radiografia de abdome simples: presença de fecaloma, malformação sacral · Enema opaco: investigação de doença de Hirschspurg · Eletrólitos no suor: investigar fibrose cística · Manometria anorretal: avalia a presença do reflexo retoanal · Biópsia retal: indicada na suspeita da doença de Hirschsprung TRATAMENTO Esvaziamento da ampola retal: Para retomar o feedback para não ocorrer mais escape Geralmente se faz primeiro, e depois se faz o tratamento de manutenção Enema via oral: polietilenoglicol (PEG) Enema via retal: Fosfato de sódio (Phosfoenema) ou Sorbitol (Minilax) Manutenção MEDICAMENTO IDADE DE INDICAÇÃO POSOLOGIA Leite de magnésia >1 ano 1-3mL/Kg/dia em 1 ou 2 vezes Óleo mineral >1 ano 1-3mL/Kg/dia em 1 ou 2 vezes Lactulose >1 mês 1-3mL/Kg/dia em 1 ou 2 vezes PEG 3350 0,8g/kg/dia 1x ao dia Pode ser por muitos meses Reeducação: Orientações gerais à família. Criar hábito intestinal: rotina de evacuar no mesmo horário do dia Responder ao estímulo evacuatório: reflexo gastrocólico (reflexo de evacuação pós-prandial 🡪 não deixar para depois, ao sentir vontade, deve ir) Manter os pés apoiados ao sentar-se no vaso sanitário 🡪 fomos projetados para “agachar” ao evacuar (em 35° e não em 90° como fazemos) Dieta: aumentar ingestão de líquidos, carboidratos (glicose de milho) e fibras OBS.: Crianças com constipação crônica podem ter predisposição a infecções urinárias de repetição (principalmente as meninas, devido à uretra que é mais curta)