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CAPÍTULO 1 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos A partir da perspectiva do saber fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Apresentar os conhecimentos filosóficos, históricos, sociológicos e econômicos na Educação de Surdos. 3 Mostrar os diferentes conhecimentos da história na Educação de surdos no mundo e no Brasil. 10 Deficiência Auditiva e Libras 10 11 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos 11 Capítulo 1 contextUalização Apresento a trajetória da comunidade Surda e sua educação como ponto de partida na construção da identidade cultural, sociológica e educacional dos sujeitos Surdos. A conquista do seu espaço como sujeito Surdo se deu graças à introdução do “alfabeto manual”, que possibilitou a sua inserção na sociedade. Com a inserção na sociedade, transformou o sujeito Surdo em sujeito crítico, criativo e inovador. Os sujeitos Surdos foram precursores de várias atividades, dentre elas, as Associações, movimentos sociais e da educação de Surdos até hoje. a trajetória dos sUjeitos sUrdos A trajetória social, política, linguística e de educação dos sujeitos Surdos inscreve-se junto com o longo do capítulo das exclusões. Os sujeitos Surdos como personagens são, ao mesmo tempo, excluídos e incluídos. Da inclusão, a comunidade não-surda escondia as deficiências e acabou criando guetos para os sujeitos Surdos. Da exclusão, a comunidade não-surda não os aceitava como membros da sociedade como um todo. Estes fatos são escritos e narrados por diversos autores, como Marcos, no seu Evangelho, quando Jesus Cristo fez os Surdos e Mudos falarem e ouvirem pelo milagre divino (SANCHÉZ, 1990). Nos seus livros, Platão e Aristóteles, ao tratarem do planejamento das cidades gregas, recomendavam que as pessoas nascidas “disformes” deveriam ser eliminadas. A eliminação se daria pela exposição ao sol, abandono ou, ainda, atiradas do alto da montanha chamada de Taygetos, na Grécia. Segundo a concepção de Aristóteles, é impossível educar as pessoas Surdas: “[...] mudos também são Surdos: eles podem ter vozes, mas não podem falar palavra alguma” (SANCHÉZ, 1990, p. 31). Nos séculos de pré-conceito errôneo, ignorância, desconfiança, piedade, mitos e desprezo, os sujeitos Surdos começaram a desmitificar tais preconceitos. A desmitificação começou a mostrar que os restos da audição, como um dos resquícios da presença e da integridade física, viabilizavam a capacidade de ouvir como os demais cidadãos. A partir de então, criaram-se vários métodos que, em sua maioria, foram pesquisados por padres, abades e frades e registrados pela igreja e monastérios como de sua autoria. Os livros das antiguidades e seus métodos para os sujeitos Surdos eram conservados nos repositórios da igreja. Mudos também são Surdos: eles podem ter vozes, mas não podem falar palavra alguma. 12 Deficiência Auditiva e Libras 12 Pesquise na Biblioteca de sua região como os antigos romanos e gregos faziam com os Surdos. A metodologia na soletração de alfabeto manual foi positiva aos sujeitos surdos, porque os padres, frades ou monges, ao criarem uma forma de comunicação no sistema de silêncio, criaram o alfabeto manual, como relata Melchor Sánchez de Yebra (PLANN, 1997). Segundo ele, no seu livro “Simplification of the Letters of the Alphabet and Method of Teaching Deaf Mutes to Speak” (1620), a fonte original desse alfabeto é San Buanaventura (Frei Juan de Fidanza, 1221-1274). Este criou o alfabeto manual para comunicar-se com outros companheiros pelo voto de silêncio. O sistema passou a ser aproveitado para ensinar aos Surdos daquela época. Com essa ação, inicia-se uma nova fase de integração dos Surdos com o objetivo de eliminar a exclusão dos mesmos do meio social, dadas as circunstâncias que aconteceram na época, como herança e matrimônio entre os filhos Surdos dos condes, príncipes e até reis. A integração deles, por meio da intervenção dos padres, frades ou monges, de modo consciente ou inconsciente, está mais relacionada à solução, ou a salvar a “alma”, apiedar-se e re-colocar os Surdos na sociedade. Atividade de Estudos: 1) Escreva em cinco linhas o porquê do uso da letra “S” em maiúscula para definir o Sujeito Surdo. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ San Buanaventura (Frei Juan de Fidanza, 1221-1274) criou o alfabeto manual para comunicar-se com outros companheiros pelo voto de silêncio. 13 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos 13 Capítulo 1 No início da Idade Moderna, vários monges, como Melchor Sánchez de Yebra (1526-1586) e Gerolamo Cardomo (1501-1576), instruíram os Surdos a lerem e escreverem; Beneditino Pedro Ponce de Léon (1510-1584) e Juan Pablo Bonet (1579-1633) publicaram alfabeto manual, livros e métodos que ensinavam aos Surdos a usar sinais e escrita, e alguns utilizavam a via da oralização. Com a efervescência política, econômica e cultural e a transição da Idade Média para a Idade Moderna, a época do Renascimento trouxe o esclarecimento, a música, a arte, a razão e as ciências empíricas, que, aos poucos, apagaram as ações negativas sobre os sujeitos Surdos. As pesquisas acerca da Surdez e sua metodologia eram veiculadas nas igrejas e abadias da Europa, especificamente, na França, na Abadia de Amiens. O primeiro professor Surdo de que se tem notícia foi Etienne de Fay, francês, nascido em 1669, arquiteto, bibliotecário, escultor, procurador e professor de instrução na cidade de Amiens, França, onde foi educado e onde morreu aos 70 anos. Ensinou uma turma de sete crianças Surdas usando a língua de sinais e a escrita (TRUFFAUT, 1993, apud LANE, 1999). Surdos-Mudos: É uma representação identitária, cultural e os sinais são convencionados pela comunidade Surda utilizada do século XVI até a presente data, apesar de a denominação “Mudo” ser retirada pelo Congresso de Milão em 1880. Condiz que Surdo-Mudo não é portador da “mudez” por problema patológico e também por não falar, não ter “voz”, e sim por usar a língua de sinais, que é a modalidade viso-gestual e não usa a “fala” ou a “oralização” para articular e sinalizar ao mesmo tempo. As letras “S” e “M”, maiúsculas, são utilizadas por uma questão de identidade. (CAMPELLO, 2008). Oralização: No dicionário HOUAISS, quer dizer prática ou método de ensino de linguagem oral orientada para crianças com perda auditiva. Ciências empíricas: São as ciências que se baseiam em demonstrações reais para comprovar alguma coisa. Por outras palavras, são as ciências que comprovam dados científicos através de demonstrações de acontecimentos que ocorrem naturalmente na natureza. Uma coisa empírica é algo que é aprendido ou adquirido através das experiências. Por exemplo, a biologia, a química, a física, a geologia e outras são exemplos de ciências empíricas. Por outro lado, você tem as ciências conceptuais, 14 Deficiência Auditiva e Libras 14 que se baseiam em demonstrações teóricas para comprovar dados científicos. Uma coisa conceptual é algo que se baseia em conceitos e teorias. Por exemplo, a matemática e a filosofia são ciências conceptuais.institUto nacional de jovens sUrdos de Paris No século XVIII, já existiam comunidades Surdas espalhadas na capital e nas cidades vizinhas da França. O abade francês Charles Michel de l`Epée, nascido em Versailles, em 1712, tomou uma importante iniciativa, em termos pedagógicos, no que se refere à educação dos Surdos, começando tal instrução com duas mulheres Surdas, com vocação religiosa. Com a mendicância nos arredores de Paris, a revolução francesa e a opressão lingüística contra os Surdos não instruídos, o abade de l`Epée criou uma escola particular bancada com seus próprios recursos. Depois da sua morte, a Constituição Francesa criou a escola chamada de Institution Nationale des Sourds-Muets, em Paris, em 1760, atual Institut Nationale de Jeunes Sourds de Paris (INJS) com o objetivo de dar independência e reconhecimento aos Surdos como cidadãos pelas pessoas não surdas. Apesar de serem Surdos, estes, como cidadãos franceses, não eram desprezados, excluídos e tutelados. Na França, houve a padronização da língua de sinais, um dos princípios da política linguística, como formação de uma língua, como “sinais metódicos”, ou francês sinalizado (PADDEN, 1988, LANE, 1999). Pesquise, no site do Google, sobre a comunidade Surda do século XVIII, em inglês ou francês. Utilize a palavra “Deaf-Mutes” ou “Sourds-Muets”. Você encontrará coisas interessantes para conhecer! Os “sinais metódicos” eram forjados a partir de uma forma existente, como a Antiga Língua de Sinais Francesa – ALSF (WILCOX, 2005), que era aceita e não era estereotipada pela comunidade não-surda. Do mesmo modo, o poder político do império francês promoveu a criação de um instituto por meio da Constituição Francesa, escolhendo ou impondo a língua de uma minoria, como é o caso da comunidade Surda, com o intuito de elevar os Surdos franceses da época como cidadãos e com os mesmos direitos civis dos não-surdos. 15 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos 15 Capítulo 1 Na determinação e implementação, Sicard, sucessor do abade de l`Epée e antigo diretor do INJS – Institut National de Jeunes Sourds, junto com os professores ouvinte, criou e usou os “sinais metódicos” em cima da Antiga Língua de Sinais Francesa (língua natural da comunidade Surda da França) como uma forma de institucionalizar o ensino pedagógico dos Surdos porque sua inventiva pretendia não apenas (pretensamente) gramaticalizar os sinais, mas, ao escolher os elementos mais “adequados” para essa gramaticalização, oferecer ao surdo um instrumento acurado para uma análise linear das idéias aglomeradas em sua mente (SOUZA, 2003). Lane (1999) apresenta um ponto de vista positivo quanto à introdução de sinais metódicos às crianças Surdas francesas oriundas de lugares pobres, tanto de Paris como de outras cidades francesas, pois o autor considera que isso permitiu um ponto favorável: a socialização, por meio da língua de sinais francesa, entre os mesmos (no caso de escolas que serviram de internatos) e, ao mesmo tempo, os introduziu a um novo mundo, com novos conhecimentos e aquisição de novos significados ao aprender a ler e escrever. Com tais instruções, passaram a adquirir a sua primeira educação efetiva para torná-los cidadãos franceses na conturbada revolução francesa da época e no período da proibição de mendicância nas ruas de Paris. Esta época era denominada de “Século de Ouro”. Essa abordagem ou proposta pedagógica criada por l`Epée foi marcada pela característica populista/nacionalista e ainda tem ressonância na contemporaneidade. Nesse sentido, McLaren (2000, p. 25) diz que “No atual momento das práticas educacionais dominantes, a linguagem está sendo mobilizada dentro de uma ideologia populista autoritária, que a vincula à identidade nacional, à cultura e à formação”. Da mesma forma, o Institut Nationale de Jeunes Sourds de Paris (INJS) formou e enviou professores para várias cidades vizinhas, inclusive criando diversas escolas de Surdos, das quais citaremos pessoas famosas como: Monsieurs Allibert, Berthier (eleito deputado da Assembleia Francesa, ativista, idealizador do banquete em homenagem ao abade De l`Epée e agraciado com medalha de honra por parte do Rei Napoleão Bonaparte), Borie, Carette, Chambellan, Chomat, Clerc (fundador do Institution de Hartford, atualmente Gallaudet University junto com Thomas Gallaudet nos Estados Unidos), Delfariel, Dubois, Dusuzeac (bacharel em ciência matemática), Lenoir, Massieu (fundador do Institution de Lille), Orsoni, Pélissier (criador do dicionário de Língua de Sinais Francesa do Institution Nationalle des Sourds-Muets de Paris), Riviére, Tessières, Théobald e Tronc; Mademoiselles Alleton e Meunier (ACERVO do INES, 2007). 16 Deficiência Auditiva e Libras 16 Para você conhecer melhor a história e características da Associação de Surdos, visite e pesquise as Associações de Surdos da sua cidade e enumere os fatos que revelam a atuação das Associações sobre a comunidade Surda. Politicamente, o mais importante de todos os fatos aconteceu no governo Napoleão Bonaparte, que conferiu ao Professor Ferdinard Berthier, Surdo- Mudo, eleito na Assembléia Constituinte, o título de Cavaleiro da Legião da Honra (RANGEL, 2004). Pela primeira vez, os direitos civis tiveram força, graças ao empenho e à façanha política do Professor Berthier, que representou 22.000 “irmãos silenciosos”. E também, juntamente com a comunidade Surda Francesa, organizava anualmente o “banquete” em memória ao abade De l`Epée. Para mostrar a importância do uso da Antiga Língua de Sinais Francesa – ASLF – na prática de instrução educacional e da sua preservação da língua de sinais francesa no Instituto, como método viável na educação de Surdos, o Professor Berthier, como professor, foi convidado a se retirar do Instituto pelo Conselho de Administração, por insubordinação, e deflagrou uma “Guerra dos Surdos” contra a introdução do ensino da fala e rebaixamento dos professores Surdos franceses como professores repetidores (LE POUVOUIR DES SIGNES, 1990). Isso mostra a nitidez da relação do poder, como diz Foucault (2007), que começa com a introdução de novos métodos de controle para não modificar algo que é de interesse dos detentores do poder. A “Guerra dos Surdos” e o movimento de introdução e de preservação da língua de sinais francesa impulsionaram uma nova prática, que é a organização de uma sociedade, como a Sociedade Universal de Surdos (RANGEL, 2004), em 1838, para delimitar o território do poder linguístico de língua de sinais. Contou com o apoio de vários autores importantes, como: Diderot, o filósofo e enciclopedista (1713-1784), que elaborou um livro chamado de “Carta sobre os Surdos-Mudos para uso dos que ouvem e falam”, contra o abade Charles Batteux, sobre a uniformidade da construção gramática da língua francesa e dos gestos dos Surdos, que são ricos gramaticalmente. Igualmente aconteceu com outro autor, Pierre Deslogues, Surdo (1747-1799) que escreveu o seu livro “Observações de um Surdo-Mudo” (WILCOX, 2005) defendendo que os sujeitos Surdos possuíam, de fato, uma antiga língua de sinais francesa e que se comunicavam em vários assuntos (política, trabalho, religião, família etc.). Dizia também que essa língua de sinais, ou seja, “sinais metódicos” (mesclada com a língua francesa) não era popularmente aceita nas instituições educacionais por “resistência ideológica dos dominantes” (HALL, A “Guerra dos Surdos” e o movimento de introdução e de preservação da língua de sinais francesa impulsionaram uma nova prática, que é a organização de uma sociedade, como a Sociedade Universal de Surdos, em 1838, para delimitar o território do poder linguístico de língua de sinais. 17 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos 17Capítulo 1 2006, FOUCAULT, 2007). O Professor Pierre Pélissier publicou em 1856 o seu primeiro dicionário da língua de sinais francesa, chamado de “Iconographie des Signes”, com 40 folhas e 362 verbetes, juntamente com os desenhos, separados por categoria gramatical com os explicativos de como se sinalizam, no intuito de preservar a língua denominada antiga língua de sinais francesa. Sinais Metódicos eram corrupções gramaticais feitas deliberadamente por L’Epée a partir do latim e do francês (BERTHIER, 1984 apud SOUZA, 2003). congresso de milão em 1880 Com a influência européia e das pesquisas descobertas de que os Surdos podiam falar por meio de método oralista, sucedidos na Alemanha e na Inglaterra, no século XVIII, os profissionais resolveram organizar o Congresso de Veneza, em 1872, para definir que a modalidade falada, ou seja, da filosofia oralista é superior à modalidade gesto-visual, que é a língua de sinais. Seus argumentos baseavam-se na ideia de que o meio humano para a comunicação do pensamento é do uso da língua oral. Em 1880, um grupo de profissionais não-surdos tomou a decisão, sem a participação dos professores e profissionais Surdos, de excluir a língua de sinais no ensino de Surdos. O Congresso começou no dia 6 de setembro e foi até o dia 11 de setembro de 1880. Lá votaram oito resoluções, sendo que uma foi aprovada por unanimidade: a que preconizava que o governo deveria tomar as medidas para que todos os Surdos recebessem educação. Na prática o que aconteceu foi que os profissionais tomaram as resoluções como argumentos para convencer os governos de que a filosofia oralista era o caminho viável na educação de Surdos, sem que “ouvissem” as opiniões dos dirigentes Surdos daquela época. O Congresso de Milão é considerado para a comunidade Surda como o século do “holocausto”, pois proibia os professores Surdos de dar instrução nas escolas de Surdos, o uso da língua de sinais dentro das escolas de Surdos e determinava o fechamento dos institutos em regime de internato. Houve o declínio dos professores Surdos até a quase extinção dos mesmos, restando poucos professores Surdos do mundo. Contudo, a língua de sinais, como política de resistência, continuou agindo às escondidas e com isso, propulsionou o crescimento e a fundação de diversas Associações de Surdos do mundo. O Congresso de Milão é considerado para a comunidade Surda como o século do “holocausto”, pois proibia os professores Surdos de dar instrução nas escolas de Surdos, o uso da língua de sinais dentro das escolas de Surdos e determinava o fechamento dos institutos em regime de internato. 18 Deficiência Auditiva e Libras 18 Pesquise na Internet os significados das palavras: Congresso de Milão (ou Milan 1880). Faça uma reflexão sobre o impacto que as oitos resoluções causaram à comunidade Surda. Registre suas ideias. edUcação de sUrdos no Brasil Os professores dessas escolas das cidades vizinhas da França saíram também para o mundo, como Eduard Huet, Surdo, conde, professor e primeiro diretor do Imperial Instituto de Surdos-Mudos, que, junto com o Imperador Dom Pedro II, instituiu, à maneira da política linguística e educacional da França, a introdução de novos sinais na terra brasileira, de acordo com o ambiente linguístico de língua de sinais brasileira, para atender crianças e jovens Surdos espalhados no antigo império brasileiro. Com a constituição do Imperial Instituto de Surdos-Mudos, em 1855, atualmente Instituto Nacional de Educação de Surdos, no Rio de Janeiro, houve a primeira experiência brasileira quanto à educação de surdos. Lá ensinavam várias disciplinas mesclando a língua de sinais francesa com a língua de sinais brasileira da comunidade Surda do Brasil. Veja o site do Instituto Nacional de Educação de Surdos – www.ines.org.br Com o sucesso e apresentação dos alunos Surdos ao Imperador Dom Pedro II, e da boa formação destes, os Surdos tornaram-se repetidores (atualmente designados como monitores do professor), professores, escultores, pintores e de outras profissões. O Surdo-Mudo, ex-aluno e repetidor Flausino José de Gama, com o apoio do Diretor Tobias Leite e do amigo gráfico, Sr. Eduard Rensburg, aprendeu, no ofício, a copiar os desenhos por meio de litografia, elaborando o primeiro dicionário de língua de sinais, chamado de “Iconographia dos Signaes”, na versão brasileira, traduzindo as palavras dos 362 verbetes da língua de sinais francesa para a língua portuguesa, com os mesmos desenhos, categorias gramaticais e explicativos, em 1875 (ACERVO do INES, 2007). 19 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos 19 Capítulo 1 Para assegurar a língua de sinais brasileira e a formação profissionalizante de Surdos, foi criada uma Associação Protetora dos Surdos (BACELLAR, 1926) no Instituto Central do Povo, um departamento para Surdos com fins escolares e extra-escolares. Um pequeno grupo no Instituto Central do Povo, em 1913, criou a Associação Brasileira de Surdos, promovendo a conscientização da sociedade pelo direito do ensino de língua de sinais aos Surdos. Publicaram seus primeiros jornais em 1914 e só duraram dois anos. Com a decretação da proibição do Congresso de Milão pelo mundo, os Surdos do Imperial Instituto de Surdos, que eram internos, voltaram para as suas cidades de origem e criaram Associações de Surdos com o objetivo de preservar a língua de sinais brasileira. A criação da primeira Associação Brasileira de Surdos ocorreu em 1913, e nos 96 anos seguintes foram criadas cerca de 180 Associações de Surdos, segundo os dados do site da FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos, tanto na capital como no interior do Brasil. Para matar a curiosidade sobre a FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos, clique no site: www.feneis.org.br Realize uma pesquisa na internet sobre a criação de Associações de Surdos depois do Congresso de Milão. Apesar do sucesso da educação dos Surdos no Brasil, esta passou por três fases distintas: Introdução do Oralismo; Introdução de Comunicação Total; Introdução de Bilinguismo. a) Introdução do Oralismo Por problema pessoal, o diretor E. Huet, do Imperial Instituto de Surdos- Mudos, deixou o Instituto e o cargo de diretor, que foi ocupado por vários diretores. O Diretor Tobias Leite estabeleceu, a pedido do Império brasileiro, a obrigatoriedade da aprendizagem da linguagem articulada e da leitura dos lábios, de acordo com a promulgação das resoluções do Congresso de Milão, em 1897. Com a tendência mundial, depois do Congresso de Milão, o Instituto Nacional de Surdos (INES), em 1911, utilizou o oralismo puro como metodologia educacional em suas salas de aula. Mas o uso de língua de sinais permaneceu, apesar da proibição que foi feita oficialmente em 1957. A criação da primeira Associação Brasileira de Surdos ocorreu em 1913, e nos 96 anos seguintes foram criadas cerca de 180 Associações de Surdos. 20 Deficiência Auditiva e Libras 20 b) Introdução de Comunicação Total Após sucessivos fracassos educacionais e exclusões dos Surdos da sala de aula, surgiu uma proposta educacional, na década de 70, proveniente de estudos americanos a respeito do desenvolvimento de crianças Surdas, filhas de pais ouvintes e de Surdos. Esses estudos mostraram diferenças lingüísticas, igualmente importantes, e para melhor, no desenvolvimento de linguagem, capacidade de raciocinar, de aprender e de conviver com outras crianças e com adultos, de poder lidar melhor com as dificuldades, e da capacidade de oralizar, com o uso da língua de sinais. O objetivo da filosofia de Comunicação Total é oferecer às crianças Surdas as oportunidades de ter acesso à língua ede adquirir conhecimento por meio da aquisição da linguagem. A Comunicação Total foi trazida pelas professoras do Instituto Nacional de Educação de Surdos que visitaram a Gallaudet University nos Estados Unidos. c) Introdução de Bilinguismo Na década de 80, os linguistas brasileiros começaram a discutir a viabilidade da introdução do bilinguismo no Brasil e da sua contribuição para a educação do Surdo. Essas discussões partiram da descoberta da pesquisa de língua de sinais americana, como status lingüístico, por Stokoe (1960, apud BRITO, 1995), e de Lucinda Ferreira Brito (1995) sobre a Língua de Sinais Brasileira – Libras. Segundo Vilela (2007), o Instituto Nacional de Educação de Surdos, em 1986, introduziu o projeto de pesquisa chamada de PAE (Projeto de Alternativas Educacionais), um trabalho de implementação da Comunicação Total em grupos de alunos ali matriculados. Esse projeto não foi adiante. No entanto, a língua de sinais brasileira é vista como sistema linguístico de natureza viso-gestual, com gramática própria utilizada pela comunidade Surda do Brasil. Atividades de Estudos: Responda em algumas linhas estas questões: 1) Você conhece algumas escolas de Surdos? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ A língua de sinais brasileira é vista como sistema linguístico de natureza viso- gestual, com gramática própria utilizada pela comunidade Surda do Brasil. 21 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos 21 Capítulo 1 2) Quais são as metodologias de ensino utilizadas dentro das escolas de Surdos visitadas ou conhecidas por você? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 3) Escreva o que entende das características da comunidade Surda. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Com a promulgação da Lei 10.436, de 2002, o sistema educacional federal, estadual, municipal e do Distrito Federal passou a garantir, como parte integrante dos parâmetros Curriculares Nacionais, nos cursos de formação de educação especial, de Fonoaudiologia e de magistério, em seus níveis médio e superior, a inclusão o ensino das LIBRAS. O Surdo passou a ter, assim, garantia dos seus direitos à educação, assegurando uma formação que lhe dê condições de autonomia, em várias áreas do contexto brasileiro: no mercado de trabalho, previdência social, lazer, esportes, educação, entre outros. A educação promoveu a inclusão social em todos os seus aspectos. E igualmente oportunizou a criação de Pós-graduação de Educação e Linguística da UFSC, formando doutores e mestres Surdos; a abertura de Curso de Letras – LIBRAS, modalidade a distância, por meio de decreto 5.626, de 2005, está proporcionando a formação adequada de professores de língua de sinais brasileira e de professores bilingues. Para conhecer os sites que envolvem a área da Surdez: Letras-Libras – www.libras.ufsc.br PROLIBRAS – www.prolibras.ufsc.br 22 Deficiência Auditiva e Libras 22 algUmas considerações A trajetória histórica da educação dos sujeitos Surdos sempre andou junto com a evolução da língua de sinais e suas metodologias. Os sujeitos Surdos eram “descartados” pela sociedade pela sua inutilidade física. A desmitificação da inutilidade física começou com a viabilidade do uso de restos de audição. A metodologia para ensinar aos sujeitos Surdos, geralmente, filhos de reis e de condes, começou a impulsionar pesquisas dentro da igreja, dentre elas, o alfabeto manual, para que eles pudessem receber a educação refinada e de dotes. A partir de então, criou-se uma escola de Surdos, em Paris, uma das primeiras escolas do mundo a dar exemplos para outras cidades vizinhas da França. Antes da criação da escola, havia um professor Surdo-Mudo que ensinava as crianças Surdas a ler, escrever e sinalizar. Mais tarde, o abade de l`Epée criou uma escola chamada de Institution Nationale des Sourds- Muets, em Paris, em 1760, atual Institut Nationale de Jeunes Sourds de Paris (INJS), com o objetivo de dar independência e reconhecimento aos Surdos como cidadãos às outras pessoas não surdas. Mas, a metodologia “sinais metódicos”, criada pelo abade l`Epée, não era reconhecida pela comunidade Surda. A comunidade Surda lutava para adquirir o status linguístico com o mesmo padrão das línguas orais. Na mesma época, começou a introdução da metodologia oralista, com as resoluções do Congresso de Milão, em 1880. Houve movimentos de resistência que impulsionaram uma nova prática, que é a organização de uma Associação de Surdos. Publicaram vários dicionários de língua de sinais, promoveram a fundação de várias escolas de Surdos do mundo e no Brasil. O movimento educacional passou por três fases distintas: oralismo, comunicação total e bilinguismo. A inclusão da língua de sinais brasileira nas escolas inclusivas e bilingues ficou mais forte com a Lei 10.436, de 2002, que reconheceu a língua de sinais brasileira da comunidade Surda e impulsionou os novos cursos de Letras-Libras, modalidade a distância e, em consequência, a formação de professores bilingues. referências ACERVO DO INES. Iconographia dos Signaes por Flausino da Gama. Rio de Janeiro: Biblioteca do INES. 1875. Obras raras. BACELLAR, Arnaldo de Oliveira. A Surdo Mudez no Brasil. Tese. São Paulo: Matinelli, Maia & C. 1926. BRITO, Lucinda Ferreira. Por uma gramática de Línguas de Sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro: UFRJ, Departamento de Lingüística e Filosofia, 1995. 23 Um Breve Histórico de edUcação de sUrdos 23 Capítulo 1 CAMPELLO, A. R. S. Aspectos da visualidade na educação de Surdos. Tese de Doutorado. Florianópolis: UFSC. 2008. DIDEROT, Denis. Carta sobre os Surdos-Mudos: para uso dos que ouvem e falam. São Paulo: Nova Alexandria. 1993. FOUCAULT, M. 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