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Classes Gramaticais e Categorias Verbais

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categoria “substantivo” expressa substantivos por meio de nomes como homem, livro,
saudade, por meio de pronomes como isto, isso, aquilo, por sintagmas como Rio Grande do
Norte ou orações (as chamadas subordinadas substantivas). As palavras lexemáticas e
categoremáticas só estão categorialmente determinadas como substantivo, adjetivo, verbo e
advérbio quando integradas na oração, atualizadas no discurso. No momento em que a
gramática geral define o que é “adjetivo”, essa definição, se correta, deverá servir a todas as
línguas que tenham adjetivos. É equivocado o querer definir “o adjetivo em português”. À
gramática descritiva cabe descrevê-lo numa língua.
Constituem o substantivo, o adjetivo, o verbo e o advérbio as quatro únicas reais
“categorias gramaticais” da língua, confusamente misturadas na gramática tradicional, e que
aqui chamaremos “categorias verbais”, porque são as únicas dotadas do significado
categorial. Admitem, como já ensina a gramática tradicional, subdivisões, que serão estudadas
no lugar próprio (substantivos próprios e comuns, etc.). Cabe lembrar que o significado
categorial não caracteriza apenas os lexemas, mas ainda sintagmas e orações inteiras. Também
o significado categorial está sempre implicado com certas funções específicas na estruturação
gramatical; por isso, só o “substantivo” (representado por nome, pronome, sintagma nominal,
oração nominalizada) pode ser o sujeito da oração, assim como o verbo exerce a função de
predicado.18 Os significados categoriais são modos do conteúdo significativo. Todavia isto
não serve de definição de substantivo; uma palavra não é substantivo porque funciona como
sujeito, mas, ao contrário, pode ser sujeito porque é substantivo ou pode aparecer como tal.
 
c ) significado instrumental é o significado dos morfemas, isto é, dos elementos
pertencentes ao universo da gramática, e podem apresentar-se como palavras morfemáticas
(como os artigos e as preposições, por exemplo, ou como elementos de palavras: o -s de
livro-s ou de trabalha-s, etc.); são os chamados englobadamente instrumentos gramaticais. O
artigo o em o livro tem o significado “atualizador” e o -s em livro-s tem o significado
“pluralizador”. Incluem-se como dotados desse significado instrumental, isto é, como
“morfemas”, nas combinações gramaticais, os prefixos, os sufixos, as desinências, o acento, o
ritmo, a entoação, a ordem das palavras, etc. Os significados instrumentais são modos da
expressão material.
 
d) significado estrutural ou sintático (este aqui tomado em sentido restrito) é o
significado que resulta das combinações de unidades lexemáticas ou categoremáticas com
unidades morfemáticas e morfemas, dentro da oração. São significados estruturais “singular”,
“plural”, “atual”, “virtual”, “ativo”, “passivo”, “presente”, “passado”, “futuro”, “indicativo”,
etc. Assim o -s de livro-s tem o significado instrumental” pluralizador” (e não “plural”) ao
lado do pluralizado livro; da combinação resulta o significado estrutural ou sintático “plural”.
 
e) significado ôntico, que só se dá no plano da oração, é o que corresponde ao valor
existencial que se comunica ao estado de coisas designado na oração: “afirmativo”,
“negativo”, “interrogativo”, “imperativo”, etc.
 
Classe de palavra e classe verbal
Classe de palavra e classe verbal – Tem-se feito confusão entre classe de palavra e
categoria ou classe verbal, confusão que pode ser desfeita com exemplos simples.19
Assinalando com F a forma física, com L o significado léxico e com C o significado
categorial, as palavras abstratas podem ser constituídas: a) como puras “formas” (F), por
exemplo “amo” em português, e somente levando em conta sua forma, pode-se classificar
apenas pelo seu lado material: é uma palavra dissílaba; é uma palavra paroxítona; é uma
palavra com três fonemas, etc.; b) como “formas léxicas” ou “lexemas” (FL), por exemplo o
português verde, independentemente dos diferentes significados categoriais, isto é, como
adjetivo ou como substantivo; c) como “formas categoriais” ou “categoremas” (FC), por
exemplo, quadro, papel, como substantivos, independentemente dos diferentes significados
léxicos (“quadro de um pintor”, “quadro de futebol”, “folha de papel”, “papel de um ator”) e
d) como palavras com significado léxico e categorial (FCL), por exemplo, em português amo
‘senhor’, substantivo, e amo ‘quero bem’, verbo. Somente as palavras abstratas dotadas com
FC ou com FCL podem ser classificadas categorialmente graças ao elemento C; isto significa
que uma mesma palavra FL poderá figurar em classes distintas se apresenta diferentes
significados C, como foi o caso de verde (adjetivo: “folha verde”, e substantivo: “o verde da
folha”) e amo (substantivo e verbo). Em suma: não podemos querer que a palavra verde,
substantivo, pertença à classe da palavra verde, adjetivo, apenas porque tem o mesmo
significado lexical, isto é, apelando para um traço que nada tem que ver com o critério com
que está constituída a classe verbal.
Se tomarmos por critério FL, “verde” será uma só e mesma palavra, assim como “amo”; se
as estabelecermos como FCL, “verde”, adjetivo, e “verde”, substantivo, serão duas palavras
diferentes, assim como “amo” ‘senhor’ e “amo” ‘quero bem’, o que também valerá para o
inglês (the) fire e (to) fire, isto é, substantivo e verbo.
Ao nos referirmos ao significado estrutural, aludimos, junto com as unidades lexemáticas
(lexemas), às unidades categoremáticas, os pronomes, que são “formas sem substância”, isto
porque apresentam apenas, ou em primeiro lugar, um significado categorial, sem representar
nenhuma matéria extralinguística. Por isso, os pronomes são substantivos, adjetivos, advérbios
e – em algumas línguas que não o português – até verbos. Diferem dos lexemas porque não
possuem significado lexical, ou, se o apresentam, têm um significado lexical genérico
(“pessoa”, “coisa”, “lugar”, “tempo”, “modalidade”, etc.), dado pela situação ou por outras
palavras do contexto.20
Nas mesmas condições do pronome, pode-se incluir na classe das palavras categoremáticas
o numeral.21
Por tudo o que vimos até aqui, os significados léxico, categorial e instrumental nos
permitem dividir as palavras em lexemáticas (substantivo, adjetivo, verbo e advérbio),
categoremáticas (pronome e numeral) e morfemáticas (artigo, preposição e conjunção).
Isto não impede que uma palavra categoremática possa também aparecer com significado
instrumental, como é o caso de meu lápis, em que meu tem o significado categorial “adjetivo”
e o significado instrumental em relação ao substantivo lápis, determinado como singular e do
gênero masculino. Vimos que as palavras lexemáticas, além do significado lexical, têm em
português significado categorial, e podem funcionar também como instrumentos.
Da lista tradicional das classes de palavras só nos falta falar da interjeição, que, a rigor,
nem é pura palavra, mas uma palavra-oração, que só por si pode valer por um conteúdo de
pensamento da linguagem emocional.
Distinguidas assim as classes de palavras, podemos agora caracterizar uma a uma.
1 – Substantivo
Substantivo
Substantivo – é a classe de lexema que se caracteriza por significar o que
convencionalmente chamamos objetos substantivos, isto é, em primeiro lugar, substâncias
(homem, casa, livro) e, em segundo lugar, quaisquer outros objetos mentalmente apreendidos
como substâncias, quais sejam qualidades (bondade, brancura ), estados (saúde, doença),
processos (chegada, entrega, aceitação).
 
Concretos e abstratos
Concretos e abstratos – Os substantivos se dividem em concretos e abstratos. Os
concretos são próprios e comuns.
Substantivo concreto é o que designa ser de existência independente: casa, mar, sol,
automóvel, filho, mãe.
Substantivo abstrato é o que designa ser de existência dependente: prazer, beijo,
trabalho, saída, beleza, cansaço.
Os substantivos concretos nomeiam pessoas, lugares, animais, vegetais, minerais e coisas.
Os substantivos abstratos designam ações (beijo, trabalho, saída, cansaço), estado e
qualidade(prazer, beleza ), considerados fora dos seres, como se tivessem existência
individual.
 
Próprios e comuns
Próprios e comuns – Dividem-se os substantivos em próprios e comuns, divisão que
pertence a planos diferentes.
 
Substantivo próprio é o que se aplica a um objeto ou a um conjunto de objetos, mas
sempre individualmente. Isto significa que o substantivo próprio se aplica a esse objeto ou a
esse conjunto de objetos, considerando-os como indivíduos. Assim, um nome como João,
Isabel ou Açores só acidentalmente se aplicará a várias pessoas ou ilhas não porque estas
apresentam características comuns que as identifiquem como membro de uma classe ou
conjunto específico. Por isso cada João, cada Isabel e cada Açores é uma pessoa ou ilha
considerada como indivíduo inconfundível para as demais pessoas. São materialmente
idênticos, mas se aplicam a indivíduos diferentes. Se por palavra se entende significante
(expressão) + significado (conteúdo), dois ou mais nomes João ou Isabel não representam a
rigor uma só palavra.
Os substantivos próprios mais importantes são os antropônimos e os topônimos. Os
primeiros se aplicam às pessoas que, em geral, têm prenome (nome próprio individual) e
sobrenome ou apelido (“que situa melhor o indivíduo em função da sua proveniência
geográfica [Frei Henrique de Coimbra], da sua profissão [Caeiro], da sua filiação
(patronímico) [Soares, filho de Soeiro], de uma qualidade física ou moral [Diogo Cão], de
uma circunstância de nascimento [Neto]”).22
Os topônimos se aplicam a lugares e acidentes geográficos.
Substantivo comum é o que se aplica a um ou mais objetos particulares que reúnem
características inerentes a dada classe: homem, mesa, livro, cachorro, lua, sol, fevereiro,
segunda-feira, papa.
Os cinco últimos exemplos patenteiam que há substantivos comuns que são nomes
individualizados, não como os nomes próprios, mas pelo contexto extralinguístico e pelo
nosso saber que nos diz que, no contexto “natural” nosso só há uma lua, um sol, um mês
fevereiro, e um só dia da semana segunda-feira, e, no contexto “cultural”, só há um papa. Se
forem escritos com maiúscula, deve-se o fato à pura convenção ortográfica, e não porque são
nomes próprios.
Nomes empregados no plural com referência a uma pluralidade de objetos que
individualmente têm o mesmo nome (os Antônios, as Marias, as Romas), ou se aplicam ao
conjunto de membros de uma mesma família ou nacionalidade (os Azevedos, os Maias) ou que
significam “entes como...” (os Tiradentes, os Ruis, os Pelés, os Eldorados), ou, ainda, os
objetos designados pelos nomes dos autores, fabricantes, produtores (os Rembrandts, os
Machados de Assis e os Fords), são, na realidade, nomes da “classe” e, portanto, substantivos
comuns.
 
Passagem de nomes próprios a comuns
Passagem de nomes próprios a comuns – Não nos prendemos apenas à pessoa ou coisa
nomeada; observamos-lhes qualidades e defeitos que se podem transferir a um grupo mais
numeroso de seres. Os personagens históricos, artísticos e literários pagam o tributo de sua
fama com o desgaste do valor individualizante do seu nome próprio que, por isso, passa a
comum. Por esta maneira é que aprendemos a ver no Judas não só o nome de um dos doze
apóstolos, aquele que traiu Jesus; é também a encarnação mesma do traidor, do amigo falso,
em expressões do tipo: Fulano é um judas.
Desta aplicação geral de um nome próprio temos vários outros exemplos: dom-joão (=
homem formoso; galanteador; irresistível às mulheres), tartufo (= homem hipócrita; devoto
falso), cicerone (guia de estrangeiros, dando-lhes informações que lhes interessam),
benjamim (= filho predileto, geralmente o mais moço; o mais jovem membro de uma
agremiação; prende-se ao personagem bíblico que foi o último e predileto filho de Jacó),
áfrica (= façanha; proeza; revive as façanhas dos antigos portugueses nessas terras).
Passam a substantivos comuns os nomes próprios de fabricantes e de lugares onde se fazem
ou se fabricam certos produtos: estradivários (= violino de Stradivárius), guilhotina (de J.
Inácio Guilhotin), macadame (do engenheiro Mac Adam), sanduíche (do conde de Sandwich),
havana (charuto; em Portugal havano) , champanha (da região francesa Champagne),
cambraia (da cidade francesa de Cambray).
 
Contáveis e não contáveis
Contáveis e não contáveis – Outra subclasse do substantivo repousa na variedade da sua
extensão, que pode ser descontínua e discreta ou contínua. No primeiro caso, a classe é
constituída por objetos que existem isolados como partes individualmente consideradas, e
recebem o nome de contáveis: homem, mulher, casa, livro, etc.
No segundo caso, refere-se a classe a objetos contínuos, não separados em partes diversas,
que podem ser massa ou matéria ou, ainda, uma ideia abstrata, e recebem o nome de não
contáveis: oceano, vinho, bondade, beleza. Estes não contáveis constituem em geral os
singularia tantum, isto é, habitualmente só se usam no singular.
À categoria dos não contáveis pertence o substantivo coletivo, que, na forma de singular,
faz referência a uma coleção ou conjunto de objetos: arvoredo, folhagem, casario. Distingue-
se o coletivo do plural de um substantivo contável, pois este alude a uma coleção de objetos
considerados individualmente: árvores, folhas, casas.
Entre os coletivos há os universais (povo, passarada, casario) e os particulares (caniçal,
vinhedo, laranjal). Os coletivos universais não são contáveis, e, por isso, só se pluralizam
nas condições especiais à classe, enquanto os particulares se contam e podem ser
pluralizados.
Não se confundem com os coletivos os chamados por Herculano de Carvalho nomes de
grupo (bando, rebanho, cardume, etc.), embora assim o faça a gramática. Na realidade, são
nomes de conjunto de objetos contáveis, que se aplicam habitualmente ou a uma espécie
definida (cardume, alcateia, enxame) ou total ou parcialmente indefinida (conjunto, grupo,
bando: bando de pessoas, de aves, de alunos). Ao contrário dos coletivos, os nomes de
grupos, principalmente do 2.º grupo, requerem determinação explícita da espécie de objetos
que compõem o conjunto: um bando de pessoas, de adolescentes, etc.; um cardume de
baleias, de sardinhas, etc. Já não seria possível um vinhedo de vinhos.
São coletivos e nomes de grupo usuais:
a) Conjunto de pessoas:
Alcateia, bando, caterva, corja, horda, farândula, malta, quadrilha, récova, súcia, turba: de
ladrões, desordeiros, assassinos, malfeitores e vadios.
Associação, clube, comício, comissão, congresso, conselho, convenção, corporação,
grêmio, sociedade: de pessoas, reunidas para fim comum.
Assistência, auditório, concorrência, aglomeração, roda: de assistentes, ouvintes ou
espectadores.
Cabido: de cônegos de uma catedral.
Caravana: de viajantes.
Claque, torcida: de espectadores para aplaudir ou patear.
Clientela: de clientes, de advogados, de médicos, etc.
Comitiva, cortejo, séquito, acompanhamento: de pessoas que acompanham outra por dever
ou cortesia.
Comunidade, confraria, congregação, irmandade: ordem de religiosos.
Concílio, conclave, consistório, sínodo, assembléia: de párocos ou de outros padres.
Coro: conjunto, bando de pessoas que cantam juntas.
Elenco: de artistas de uma companhia, peça ou filme.
Equipagem, marinhagem, companha, maruja, tripulação: de marinheiros.
Falange: de heróis, guerreiros, espíritos.
Junta: de credores, de médicos.
Pessoal: de uma fábrica, repartição pública ou escola, loja.
Plêiade ou plêiada: de poetas, artistas, talentos.
Ronda: de policiais que percorrem as ruas velando pela ordem pública.
Turma: de estudantes, trabalhadores, médicos.
 
b) Grupo de animais:
Alcateia: de lobos, panteras ou outros animais ferozes.
Bando, revoada: de aves, pardais.
Cáfila: de camelos.
Cardume, boana, corso (ô), manta: de peixes.
Colmeia, enxame, cortiço: de abelhas.
Correição, cordão: de formigas.
Fato: rebanho de cabras.
Fauna: conjunto de animais próprios de uma região.
Gado: conjunto de animais criados nas fazendas.
Junta, obesana, cingel, jugo, jugada: de bois.
Lote: de burros, grupos de bestasde carga.
Malhada, oviário, rebanho: de ovelhas.
Manada: de cavalos, de porcos, éguas.
Matilha: de cães.
Ninhada: rodada de pintos.
Nuvem, miríade, onda, praga: de gafanhotos, marimbondos, percevejos.
Piara, vara: de porcos.
Récova, récua: de cavalgaduras.
Rebanho, armento, armentio, grei, maromba: de bois, ovelhas.
 
c) Grupo de coisas:
Acervo, chorrilho, enfiada: de asneiras, tolices. Acervo também se aplica aos bens materiais:
É grande o acervo da Biblioteca Nacional.
Antologia, analecto, crestomatia, coletânea, florilégio, seleta: de trechos literários ou
científicos.
Aparelho, baixela, serviço: de chá, café, jantar.
Armada, esquadra, frota: de navios de guerra.
Bateria, fileira: de peças de artilharia.
Braçada, braçado, buquê, ramo, ramalhete (ê), festão: de flores.
Cacho: de uvas, de bananas.
Cancioneiro: de canções. É erro empregar o vocábulo como sinônimo de cantor em
expressões como cancioneiros românticos.
Carrada: de razões.
Chuva, chuveiro, granizo, saraiva, saraivada: de balas, pedras, setas.
Coleção: de selos, quadros, medalhas, moedas, livros.
Constelação: de estrelas.
Cordilheira, cadeia, série: de montes, montanhas.
Cordoalha, cordame, enxárcia: de cabos de um navio.
Feixe, lio, molho (ó): de lenha, capim.
Fila, fileira, linha: de cadeiras.
Flora: conjunto de plantas de uma determinada região.
Galeria: de quadros, estátuas.
Gavela ou gabela, paveia: feixe de espigas.
Herbário: coleção de plantas para exposição ou estudo.
Hinário: de hinos.
Instrumental: de instrumentos de orquestra, de qualquer ofício mecânico, de cirurgia.
Mobília, mobiliário: de móveis.
Monte, montão: de pedras, palha, lixo.
Penca: de bananas, laranjas, chaves.
Pilha, ruma: de livros, malas, tábuas.
Réstia: de cebolas, alhos.
Sequência: série de cartas do mesmo naipe.
Troféu: de bandeiras.
 
Observação: Para outros coletivos e nomes de grupos consulte-se o dicionário.
 
Estrutura interna do substantivo
Estrutura interna do substantivo – A estrutura interna ou constitucional do substantivo
(isto é, sua morfologia) consiste, nas línguas flexivas como o português, em geral, na
combinação de um signo lexical expresso pelo radical com signos morfológicos expressos por
desinências e alternâncias, ambos destituídos de existência própria fora dessa combinação.
Entre as desinências que, na flexão, se combinam com o substantivo está a marca de número e,
nas línguas que a possuem, a marca de caso (nominativo, acusativo, etc., como se dá, por
exemplo, no grego, no latim, no alemão). O substantivo, fora da flexão, pode ser dotado da
marca de gênero: menino/menina, gato/gata.23
 
Número
Número – É uma categoria gramatical inerente primariamente ao substantivo, que se refere
aos objetos substantivos considerando-os na sua unidade da classe a que pertencem (é o
número singular) ou no seu conjunto de dois ou mais objetos da mesma classe (é o número
plural). Quando o singular designa vários objetos de uma mesma classe considerados num
todo, temos o coletivo (professorado, alunado, caravana, cardume, etc.).
A classe dos objetos substantivos pode conter unidades descontínuas e discretas: são os
objetos contáveis (homem, casa, cadeira, etc.); a classe pode também ser constituída de
objetos desprovidos de limites internos, como se fossem objetos únicos: são os não
contáveis. Estes objetos únicos ou são massa ou matéria, ou concebidos como tal (ouro, ferro,
céu, etc.), ou uma ideia abstrata (amor, saudade, riqueza, etc.).
Facilmente se pluralizam os substantivos que pertencem ao grupo dos contáveis (homem -
homens; casa - casas); já os não contáveis, em geral, se usam no singular (singularia
tantum). Em alguns desses nomes não contáveis, o plural alude a diferentes espécies ou à
fragmentação: vinhos (o tinto, o branco, o rosé), mares e, por consequência, se apresentam
com variação semântica. [HCv.1, 14, 364; SA.2, 69]
Em português, o significado gramatical plural é obtido com a presença da desinência
pluralizadora -s fonologicamente constituída pela consoante sibilante pós-vocálica diante de
pausa.24 O singular se caracteriza pela ausência desta desinência.
A flexão de número, em português, pelo mecanismo da concordância, se estende ao
adjetivo (e demais adjuntos do substantivo) e ao verbo, quando este entra em concordância de
número com a pessoa do sujeito.
 
A flexão de número dos substantivos
A flexão de número dos substantivos
a) Formação do plural com acréscimo de -s
Forma-se o plural dos substantivos com o acréscimo do morfema pluralizador (desinência
do plural) -s, quando terminados explicitamente por:
1 – vogal ou ditongo oral: livro Õ livros; lei Õ leis; cajá Õ cajás.
2 – vogal nasal tônica ou átona: ímã Õ ímãs; irmã Õ irmãs; dom Õ dons (grafando-se ns);
álbum Õ álbuns; totem Õ totens (para o plural 1tótemes).
3 – ditongos nasais -ãe (tônicos ou átonos) e -ão (átono): mãe Õ mães; bênção Õ bênçãos.
 
b) Formação do plural com acréscimo de -es
Quando não está explícita a vogal temática suprimida no singular deverá ser restituída para
constituir a forma teórica (ás Õ *ase Õ ases) e depois ser acrescida a desinência -s. Isto
ocorre quando o singular termina por:
1 – -s (em sílaba tônica): ás Õ ases; freguês Õ fregueses
Cós serve para os dois números e ainda possui o plural reduplicativo coses.
2 – -z (em sílaba tônica): luz Õ luzes; giz Õ gizes; cicatriz Õ cicatrizes
3 – -r: cor Õ cores; elixir Õ elixires; revólver Õ revólveres
 
c) Plural de nomes gregos em -n
Nos nomes de origem grega terminados em -n, pode-se obter o plural com o acréscimo da
desinência -s, ou recorrer à forma teórica com a recuperação do -e (abdômen Õ *abdomene
Õ abdômenes). Melhor fora dar a estes substantivos feição mais de acordo com o sistema
fonológico do português, eliminando o -n final ou substituindo-o por -m e procedendo-se à
formação do plural com o só acréscimo do -s (abdome Õ abdomes; pólen Õ polem Õ polens,
grafando -ns):
abdômen Õ abdomens ou abdômenes
certâmen Õ certamens ou certâmenes
dólmen (dolmem) Õ dolmens ou dólmenes
espécimen Õ espécimens ou especímenes
gérmen Õ germens ou gérmenes
hífen Õ hifens ou hífenes
pólen (polem) Õ polens ou pólenes
regímen Õ regimens ou regímenes
Observações:
1.ª) éden (melhor seria edem, que o Vocabulário Ortográfico não registra) faz edens.
2.ª) Cânon, melhor grafado cânone, faz cânones.
3.ª) Recorde-se que são acentuados os paroxítonos em -n, e não os em -ens. Daí hífen, mas hifens (sem acento gráfico).
 
d) Plural dos nomes em -ão tônico
Os nomes em -ão tônico a rigor pertencem à classe dos temas em -o ou em -e, conforme o
plural respectivo: irmãos (= irmão + s), pães (= *pãe + s), leões (= *leõe + s). Para uma
descrição coerente Mattoso propõe que se parta das formas teóricas do plural para se chegar
ao tema, suplementadas pelas regras morfofonêmicas pertinentes, no processo de formação de
plural.
Destacando-se a vogal temática (que passa a semivogal de ditongo em contacto com a
vogal anterior), teremos o radical em -õ (leõ) e o radical em -ã (irmã, pã).
1) os substantivos em -õ com tema em -e fazem o plural com acréscimo da desinência -s:
leão (* leõ + e + s) Õ leões
coração (* coraçõ + e + s) Õ corações
Assim, temos os plurais: questões, melões, razões, etc.
Este grupo é o mais numeroso e, por isso mesmo, tende, no uso espontâneo, a assimilar
outras formas de plural que a língua exemplar não adota. Neste grupo estão incluídos todos os
substantivos abstratos formados com os sufixos -ção, -são e -ão e grande parte de substantivos
concretos.
comoção Õ comoções; adoração Õ adorações
apreensão Õ apreensões; compreensão Õ compreensões
abusão Õ abusões; visão Õ visões
caminhão (camião) Õ caminhões (camiões); barracão Õ barracões
Este radical teórico em -õ aparece evidente em adjetivos e verbos da mesma família do
substantivo, o que é sinal de que este faz o plural em -ões; por exemplo, leonino denuncia o
plural correto de leão: leões.
2) os substantivos em -ã com tema em -o (irmão) fazem o plural com o acréscimo da
desinência -s:
irmão (*irmã + o + s) Õ irmãos
cidadão (*cidadã+ o + s) Õ cidadãos
Este radical teórico em -ã aparece evidente em adjetivos e verbos da mesma família dos
substantivos irmão (irmanar) e cidadão (cidadania).
3) os substantivos em -ã com vogal temática -e (pã - e de pães) fazem o plural com o
acréscimo da desinência -s:
pão Õ (pã + e + s) Õ pães
capitão Õ (capitã + e + s) Õ capitães
Descrito o processo de flexão, cabe perguntar como, partindo da forma teórica do plural, se
chega às formas do singular em -ão. Destacando-se a vogal temática, como já vimos, obtemos
duas estruturas fonológicas para os radicais: em -õ (leõ) e em ã (irmã, pã). Os de tema em -o
não sofrem alteração: irmão; os de tema em -e ou mudam a vogal para -o (pão) ou, se a vogal
do radical for -õ, apresentam duas mudanças: a vogal temática passa de -e a -o e a vogal do
radical passa de õ a ã: leão.
Dada a confluência das formas do singular num único final -ão (diferençadas no plural,
como acabamos de ver), surgem muitas dúvidas no uso do plural, além de alterações que se
deram através da história da língua, algumas das quais se mantêm regional ou popularmente,
em geral a favor da forma plural -ões, por ser a que encerra maior número de representantes.
“O ensino escolar [comenta Mattoso] se esforça para manter os três tipos de plural, ora
apoiando-se na origem latina, ora se inspirando no espanhol (onde há diferença no singular –
razón: razones; hermano: hermanos; pan: panes), ora apelando para as preferências (se bem
que às vezes inconsistentes) de determinados autores, na língua literária, considerados
‘clássicos’[MC.8, 81-82].
Diante do exposto, oferecemos ao leitor relação minuciosa dos dois grupos de substantivos
em -ão que não fazem o plural mais frequente em -ões:
1) plural em -ães:
cão Õ cães escrivão Õ escrivães
capelão Õ capelães tabelião Õ tabeliães
alemão Õ alemães pão Õ pães
capitão Õ capitães maçapão Õ maçapães
mata-cão Õ mata-cães catalão Õ catalães
	As Unidades no Enunciado
	A�
	Classe de palavra e classe verbal
	1 – Substantivo
	Substantivo
	Concretos e abstratos
	Próprios e comuns
	Passagem de nomes próprios a comuns
	Contáveis e não contáveis
	Estrutura interna do substantivo
	Número
	A flexão de número dos substantivos

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