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PEDIATRIA – OTITE MÉDIA AGUDA (OMA) TUTORIA 4 1. OTITE MÉDIA AGUDA (OMA) · Infecção de desenvolvimento rápido de sinais e sintomas de inflamação aguda da orelha média · Definida como a presença de líquido (efusão) preenchendo a cavidade da orelha média sob pressão, com início abrupto dos sinais e sintomas causados pela inflamação dessa região · É uma das doenças infecciosas mais comuns na infância Fatores de risco · Relacionados ao hospedeiro (da própria criança) · < 6 meses de idade é um fator para recorrência · Fenda palatina, síndrome de Down, malformações craniofaciais, imunodeficiência e discinesia ciliar primária possuem risco aumentado · Fatores ambientais · Em meses mais frios (inverno) · Costuma decorrer de infecções das vias aéreas superiores (IVAS) · Creches, berçários e exposição ao tabagismo passivo (↑ risco) · Aleitamento materno é fator de proteção · Chupetas de mamadeiras com bicos de cápsula tipo “empurra e puxa” – fator de risco História natural da doença · 80% das crianças possuem evolução favorável resolução espontânea = independe da adesão ao tratamento ou do tipo da medicação · Resolução espontânea fica evidente quando se opta por observação inicial, com melhora dos sintomas em 60% dos pacientes depois de 24 horas e ausência de sintomas residuais em 80% das crianças após 2-3 dias, sem antibióticos. Patogênese · ↑ prevalência no lactente e criança pequena · Tuba auditiva ventila a orelha média. Durante o repouso, encontra-se fechada. Sua luz é virtual e abre-se de forma intermitente pela contração do músculo tensor do véu palatino durante a deglutição ou o bocejo. · Tuba auditiva da criança: · + curta · + alargada · + flácida · + horizontalizada · Tudo isso facilita a progressão de microrganismos (vírus e bactérias) da rinofaringe para a orelha média · Possui uma relação dos níveis de IgG (a priori materno e depois da própria criança): ↑ IgG = ↓ OMA (durante os 5-6 meses da criança há uma queda no IgG de origem materna = ↑ OMA) · Geralmente desencadeada por um processo infeccioso (em geral IVAS) + grau de disfunção da tuba auditiva + grau de disfunção do sistema imunológico · Comum ser precedida por IVAS ou um “resfriado comum” · Fisiopatologia: acredita-se que a infecção viral provoque um distúrbio no microbioma da nasofaringe pavimentando o caminho para bactérias patogênicas infectarem a orelha média através da tuba auditiva; os vírus agiriam como copatógenos, predispondo à infecção bacteriana. A infecção viral inicia o desenvolvimento da OMA, pavimentando o caminho em direção a uma OMA bacteriana, aumentando a presença de otopatógenos bacterianos na nasofaringe. Microbiologia · Causada por vírus respiratórios e/ou infecção bacteriana no espaço da orelha média, como resultado da resposta do hospedeiro à infecção · Vírus respiratório sincicial (VRS) e adenovírus estão entre os vírus mais associados a OMA · Padrão-ouro para determinar a etiologia bacteriana da OMA é a cultura do fluido da orelha média por meio da timpanocentese, da drenagem através dos tubos de ventilação ou pela otorreia espontânea. · Bactérias são encontradas em 50-90% dos casos de OMA com ou sem otorreia. O Streptococcus pneumoniae, o Haemophilus influenzae não tipável e a Moraxella catarrhalis são os principais otopatógenos bacterianos e frequentemente colonizam a nasofaringe · Com base em achados clínicos · Febre, a otalgia importante e o abaulamento da membrana timpânica (MT) possam ser mais intensos quando o organismo causador for o pneumococo (Streptococcus pneumoniae) · H. influenzae não tipável estaria associada com a OMA bilateral e uma inflamação mais grave da membrana timpânica · OMA acompanhada de conjuntivite purulenta (síndrome otite-conjuntivite) é sugestiva de H. influenzae não tipável. Sinais e sintomas · Otalgia (criança que manipula muito a orelha), o choro excessivo, a febre, as alterações de comportamento e do padrão do sono, a irritabilidade, a diminuição do apetite e até a diarreia. · Otoscopia: membrana timpânica com hiperemia ou opacidade, abaulamento, diminuição da mobilidade e otorreia aguda são sinais típicos · Idade da criança (< 24 meses), a gravidade dos sintomas, a presença de otorreia aguda e a bilateralidade direcionam o tratamento da OMA de maneira mais incisiva. · Portanto, atualmente, a bilateralidade é um marco que indica uma doença mais grave, e a presença de otorreia espontânea indica a certeza da patologia Diagnóstico · Diagnóstico diferencial de otalgia otite externa de crianças que estão expostas a água de piscina: otalgia cursa sem febre, sem história pregressa de IVAS e com relação causa/efeito: a orelha da criança esteve em contato com água de mar ou piscinas, situação mais sazonal, ocorrendo, em geral, no verão. · OMA deve sempre ser confirmada pela otoscopia. São sinais de alteração da MT encontrados na OMA: mudanças de translucidez, forma, cor, vascularização e integridade. O achado mais significativo no diagnóstico da OMA é o abaulamento da MT, com sensibilidade de 67% e especificidade de 97%. A coloração avermelhada da MT pode ser consequência do reflexo da hiperemia da mucosa do promontório, visualizada através de um tímpano normal, que pode gerar confusão durante o exame e acentuar-se quando a criança estiver chorando. Entretanto, a hiperemia da MT pode indicar a fase inicial da OMA, e, na sequência, ocorrer a opacidade e até mesmo a perfuração espontânea da MT com otorreia súbita. Tratamento Recomendação Detalhes 1ª Tratar a dor com analgésicos, independentemente da administração de antibióticos. 2ª Dar antibiótico para OMA, bilateral ou unilateral, em crianças com 6 meses ou mais, com sinais e sintomas graves (otalgia e temperatura alta – 39 °C) ou sintomas persistentes por pelo menos 48 horas. 3ª Dar antibiótico para OMA bilateral em crianças < 24 meses, sem sinais ou sintomas graves (otalgia moderada há menos de 48 horas, temperatura < 39 °C). 4ª Monitorar de perto a evolução ou prescrever antibiótico para OMA em criança entre 6-23 meses, sem sinais ou sintomas graves (otalgia < 48 horas, temperatura < 39 °C). Se a evolução mostrar piora ou falhar em melhorar dentro de 48-72 horas após observação sem antibiótico, então, deve-se dar antibiótico. 5ª Observar de perto a evolução do quadro ou prescrever antibiótico para OMA uni ou bilateral em crianças com idade acima de 24 meses, sem sinais ou sintomas graves (otalgia leve há < 48 horas, temperatura < 39 °C). Se a evolução mostrar piora ou falhar em melhorar dentro de 48-72 horas após observação sem antibiótico, então, deve-se dar antibiótico. ANTIBIOTICOTERAPIA Aspecto Detalhes Indicações para Amoxicilina - 50 mg/kg/dia - 90 mg/kg/dia? Depende mecanismo de resistência - Não recebeu nos últimos 30 dias. - Não possui conjuntivite purulenta. - Não é alérgica à penicilina. Duração do Tratamento - Crianças com idade > 2 anos e sintomas graves: 10 dias. - Crianças entre 2-5 anos com OMA moderada: 7 dias. - Crianças < 6 anos com OMA leve: 5-7 dias. Alternativas em Caso de Alergia à Penicilina - Macrolídeo. - Clindamicina (também para pneumococo resistente). AB com cobertura adicional (betalactamase) se recebido amoxicilina nos últimos 30 dias ou tenha conjuntivite purulenta associada ou histórico de OMA recorrente que não responde à amoxicilina - Clavulanato associado à amoxicilina. - Cefalosporina de segunda geração (cefuroxima). - Cefalosporina de terceira geração (ceftriaxona, para casos com vômitos ou diarreia). Troca de AB se falha terapêutica - Se não houver melhora ou houver piora em 48-72 horas. Situações que demandam AB oral imediato - Crianças sem boa evolução sistêmica. - Doença grave ou persistente. - ↑ risco para complicações (idade < 6 meses, comorbidades preexistentes, imunodeficiências) - OMA bilateral em crianças < 2 anos. - Otorreia aguda por perfuração espontânea da membrana timpânica. Resumo Tratamento OMA não complicada Idade OMA com otorreia OMA (uni ou bilateral) com sintomas graves* OMA bilateral sem otorreia OMA unilateral semotorreia < 6 meses ATB 6m a 2 anos ATB ATB ATB ATB ou observação ≥ 2 anos ATB ATB ATB ou observação ATB ou observação *Sinais de gravidade: aparência tóxica, otalgia persistente > 48h, febre alta (≥ 39°C) nas últimas 48h ou acompanhamento posterior duvidoso Resumo Antibioticoterapia 1ª escolha Alergia à penicilina Falha terapêutica (após 48-72h) Alternativa Amoxicilina ▸ 50 mg/kg/dia (SBP) ▸ 90 mg/kg/dia (Nelson) ▸ VO, 12/12h, 10 dias Cefdinir ▸ 14 mg/kg/dia ▸ VO, 12/12h, 10 dias Amoxicilina + clavulanato ▸ 90 mg/kg/dia ▸ VO, 12/12h, 10 dias Ceftriaxona ▸ 50 mg ▸ IM ou EV, 1x/dia, 3 dias Cefuroxima ▸30 mg/kg/dia ▸ VO, 12/12h, 10 dias Amoxicilina + clavulanato (se otite-conjuntivite ou uso recente de amoxi) ▸90 mg/kg/dia ▸ VO, 12/12h, 10 dias Cefpodoxima ▸ 10 mg/kg/dia ▸ VO, 12/12h, 10 dias Ceftriaxona ▸ 50 mg ▸ IM ou EV, 1x/dia, 3 dias Clindamicina ▸ 30-40 mg/kg/dia ▸ 8/8h, com ou sem cefalosporina de 3ª geração Ceftriaxona ▸ 50 mg ▸ IM ou EV, 1x/dia, 3 dias · Quanto às indicações para procedimentos de drenagem ou evacuação da efusão da orelha média (timpanocentese e/ou miringotomia) durante episódio de OMA, elas estão restritas a resposta insatisfatória à antibioticoterapia, imunodeficiências, doença grave e complicações supurativas, como mastoidite. · ubos de ventilação podem estar indicados na OMA recorrente (3 episódios em 6 meses, ou 4 em 1 ano, com 1 dos episódios nos últimos 6 meses). Prevenção · Redução de fatores de risco passíveis de serem modificados e a vacinação · Evitar a exposição à fumaça do tabaco, reduzir o uso de chupetas e ↓ tamanho do grupo das creches e/ou berçários, bem como promover aleitamento materno exclusivo por ao menos 6 meses ou mais. · Nos casos de OMA recorrente, não devem ser prescritos antibióticos como profilaxia das recidivas. image1.png