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COMO O AMBIENTE E O MANEJO AFETAM A SAÚDE DAS ABELHAS 
 
Mesa Redonda - Patologia Apícola 
 
David De Jong 
Depto. de Genética, FMRP-USP 
14.049-900 Ribeirão Preto, SP 
e-mail: ddjong@fmrp.usp.br
 
 
 
Fatores que influenciam a expressão da enfermidade 
 Para que apareça uma enfermidade é necessária uma série de condições especiais. É necessário 
um hóspede susceptível. Os pátogenos ou parasitas têm que chegar até a fase da abelha adequada ao 
seu desenvolvimento. Há que ter um número de concentração de patógenos ou parasitas suficientes 
para iniciar uma infecção ou infestação. Os organismos invasores têm que se multiplicar em número 
suficiente para sustentar o processo de infecção. É necessário um meio de transmissão para chegar até 
outros indivíduos ou colméias. As condições climáticas e outros fatores ambientais, podem resultar em 
uma diminuição da resistência das abelhas que permitam o início da infestação. 
 Um fator muito importante é a localização do apiário. Cuidamos muito das condições de vida de 
nossos filhos, do cachorro, dos animais domésticos, porém, os critérios de seleção do apiário, 
geralmente, não consideram efeitos microclimáticos que podem criar condições de stress nas colméias. 
Em um apiário com a terra muito molhado, com água parada, onde não há nenhum movimento de ar ou 
onde há demasiado vento frio, as enfermidades são muito mais aparentes. Em climas frios, as colméias 
necessitam de muito sol. Todavia, em climas muito tropicais também encontramos mais problemas com 
enfermidades em colméias que estão constantemente na sombra. Um pouco de cuidado com o 
posicionamento do apiário e observações cuidadosas sobre os efeitos de pequenas trocas, pode permitir 
uma redução importante nos problemas com enfermidades, especialmente as que consideramos 
provenientes de stress, como por exemplo a Cria Pútrida Européia, Nosemosis e Cria Gessificada. Vi 
um exemplo muito claro desta situação na Coréia de Sul em 1986. A Cria Gessificada, causada pelo 
fungo, Ascosphaera apis, havia recentemente entrado naquele país, e os apicultores procurarem minha 
opinião sobre uma cura. Muitos dos apiários eram colocados ao lado de campos de arroz das águas, 
em condições que provocavam bastante estresse nas colônias, favorecendo o desenvolvimento da 
doença, entretanto os apicultores somente queriam saber de algum tratamento químico para contornar o 
problema. Outros apiários colocados em condições menos frios e úmidos tinham menos problemas com 
a doença. Antes de pensar em tratar, há que ajudar as abelhas com condições ambientais adequadas. 
Quando fiz pesquisas com Cria Gessificada, durante o meu mestrado nos EUA, tive que encontrar 
maneiras de provocar a doença, porque durante verão os sintomas reduziram a tal ponto que ficou 
difícil continuar a pesquisa. Desenvolvi vários tipos de manejo que serviram o propósito. Um era de 
dividir as colméias, de modo que colméias pequenas haviam de cuidar de áreas de cria menos 
compactos. Desequilíbrios no controle da temperatura da câmera de cria causarem uma piora sensível 
da doença. Também coloquei as colméias na sombra, diretamente sobre o chão, e em áreas com pouca 
ventilação. Todas estas manipulações causaram pioras na saúde das colméias, demonstrando por um 
lado, uma boa maneira de estudar doenças, e por outro lado, o que um apicultor não deve fazer. 
 No Brasil, há apiários colocados no meio de florestas fechadas, com bastante sombra e pouco 
movimento do ar. Nestes casos, é comum ver que as colméias têm mais problemas com doenças, 
 
 
 
mailto:ddjong@fmrp.usp.br
 
em comparação com colméias que estão mais ao sol. No sul, encontrei um apiário pequeno abaixo de 
um telhado, ao lado de um pequeno rio, e um outro apiário em uma clareira ampla, a menos de 100 
metros de distancia. As colméias na sombra estavam sempre doentes, e as outras não tinham sinais de 
doenças. Na duvida, o apicultor pode colocar algumas colméias de cada uma de varias situações de 
sombra, para ver o que acontece. 
 Afinal, geralmente a localização dos apiários é feito empiricamente, sem conhecer os reais 
conseqüências das diferenças nas microclimas devido a sombra, sol, vento, movimento do ar, proteção 
contra vento, umidade do solo, e outros fatores ambientais. Este é uma área que merece mais 
investigação. 
 Temos que reconhecer também que os apiários modernos, com 50 ou mais colméias, muito 
perto uma das outras, em linha reta, com caixas iguais, todas da mesma cor, quase sem plantas ou 
outras marcas entre elas, não reproduzem muito bem a natureza. Normalmente, colméias silvestres são 
bastantes separadas, apresentam-se bem diferentes, com árvores separando-as, etc. Em apiários 
modernos, abelhas infestadas de uma colméia rapidamente podem infectar ou reinfectar outras. Toda 
enfermidade tem uma tendência de se dissipar. Colocando as caixas muito próximas, faz com que a 
dispersão seja muito mais efetiva, o que pode resultar em uma forte re-infestação. Podemos ajudar um 
pouco ordenando o apiário de uma maneira que as abelhas possam localizar suas próprias colméias 
mais facilmente. No entanto, a proximidade de muitas colméias definitivamente aumenta os problemas 
com doenças e parasitas. Por exemplo, quando comparamos infestações com o ácaro Varroa em 
colméias silvestres, encontramos infestações mais baixas do que em apiários. No entanto, em condições 
aonde há varias colônias silvestres concentrados em uma pequena área, as infestações também são 
altas. 
 Nas enfermidades bacterianas ou fungosas, as abelhas tentam tirar as larvas e pupas mortas. No 
processo, elas se contaminam com esporos e bactérias e estes acabam entrando no alimento comum da 
colméia. Sendo que as abelhas estão constantemente trocando comida entre elas, através de um 
processo que chamamos de "trofilaxia" logo, esporos são encontrados no aparelho bucal das abelhas 
nutrizes e estas passam a infectar as larvas a serem alimentadas. Assim o ciclo continua. Infelizmente, o 
mel também fica contaminado. Conforme a colônia enfraquece, por causa da doença, abelhas de outras 
colônias começam a fazer pilhagem, levando mel contaminado para suas próprias colônias, e a doença 
espalha. Nos paises aonde tem Cria Pútrida Americana, toda colônia doente ou morta tem que ser 
rapidamente retirada do apiário para que a doença seja controlada. Pela mesma razão, não pode usar 
mel ou pólen de outros apiários, e especialmente de outros paises, para alimentar as abelhas. 
 Durante uma florada forte, a quantidade muito grande de comida que passa pelas abelhas, tende 
a diluir a concentração de esporos no mel, reduzindo a probabilidade de infecção nas larvas. Por esta 
razão, às vezes encontramos uma remissão temporária que pode ou não ser seguida de novo ciclo 
destruidor da doença. As abelhas possuem certos mecanismos que também podem reduzir o número de 
esporos e, portanto, o risco de infecção. Elas constantemente estão se limpando e, mesmo internamente, 
uma válvula entre o papo de mel e o ventrículo, chamada de proventrículo, ajuda a limpar a comida 
processada pela abelha adulta. 
 
 
Criar resistência 
 As condições necessárias para criar resistência são um número muito grande de colméias e uma 
pressão para que as colméias com mais características de resistência sejam mais produtivas. A pressão 
normal é uma dose moderada dos organismos que provocam a enfermidade. Quando não há 
enfermidade, não há seleção. Imediatamente podemos concluir que quando tratamos as colméias, 
eliminamos a possibilidade de seleção. Em alguns paises, há o costume de tratar as doenças das abelhas 
 
 
preventivamente com antibiótico. A decorrer dos anos ocorre uma seleção, tanto das abelhas como das 
bactérias. Encontramos abelhas totalmente sem resistência natural, e por outro lado, as bactérias ficam 
selecionadas para alta resistência aos antibióticos. Já encontrei regiões aonde todas as colméias estavam 
em tratamento constante, durante mais de 20 anos, todas cheias de antibióticos, porem doentes, e umapicultor com 3.000 colmeias na mesma região, que nunca tratava, tinha as colméias sem sinal de 
doença. 
 A multiplicação das colméias é através da linha maternal (enxameagem) e paternal (produção de 
zangões sãos e competitivos). Uma colméia sã produz mais enxames em comparação com uma colméia 
enferma. Também as colméias mais saudáveis produzem mais zangões. Assim, colônias resistentes 
deixam mais descendentes do que colônias doentes. 
 Quando pensamos sobre o manejo moderno do apiário, entendemos que estamos interferindo 
com o processo natural de seleção. Evitamos a enxameagem e colocamos quadros bons que tenham 
poucas células para zangões. Também criamos rainhas sem pensar em seleção para resistir às 
enfermidades. Depois de muitas gerações será criada uma abelha que só será produtiva quando for 
protegida artificialmente contra as enfermidades e parasitas. 
 Na situação atual da apicultura, onde se tem alto preço do mel, tem aumentado os custos de 
produção e tem um rechaço de méis com qualquer concentração de antibióticos ou acaricidas, temos 
que pensar outra vez sobre a opção de criar abelhas resistentes às enfermidades. 
 Existem muitas evidências que demonstram a resistência das abelhas contra as enfermidades, 
especialmente para: enfermidades bacterianas, tais como a Cria Pútrida Européia e a Cria Pútrida 
Americana; enfermidades micóticas, Cria Gessificada; Ácaros parasitas, Acarosis e Varroasis. Há que 
manejar as abelhas de uma maneira que incentiva a seleção para resistência. 
 
Efeitos do favo sobre as abelhas 
 Entre as invenções que permitiram a apicultura moderna, esta incluída a cera alveolada, que 
permite a construção de favos uniformes, em quadros que podem ser manipulados. A cera alveolada 
também abriu a possibilidade de manipulações cujas conseqüências para as abelhas são pouco 
conhecidas. O problema envolve o tamanho (largura) das células, e a reciclagem dos favos. O apicultor 
pode controlar o tamanho das células do favo, fornecendo cera alveolada com a forma da base da célula 
maior ou menor. Porém, a tendência histórica tem sido fornecer favos com células maiores, porque 
resulta na produção de abelhas maiores, com probóscides maiores e maior capacidade de alcançar e 
transportar néctar. Entretanto não há prova objetiva da vantagem de trabalhar assim. Ademais, estudos 
recentes têm discutido amplamente o uso de um satisfatório diâmetro da célula do favo natural. 
Colônias com favos naturais novos pareceram enxamear menos e indicaram uma construção mais 
rápida dos favos pelas abelhas, além de colônias mais saudáveis e mais produtoras de mel, com células 
de menor tamanho, porém ainda não existem dados concretos ou pesquisas que abordem esta questão. 
A partir de 1956, com a introdução da abelha africana no Brasil iniciou-se o processo de 
africanização, inicialmente com um impacto altamente negativo causado pela agressividade das abelhas 
e desconhecimento de métodos de manejo dessas abelhas. Porém, durante este processo de 
africanização dos apiários brasileiros, notou-se também que as abelhas que estavam predominando 
sobre as tradicionais Apis mellifera mellifera (abelhas européias) eram menores que estas, assim como 
a espessura do favo e a largura das células. 
 
A controvérsia sobre o tamanho correta da célula no favo é particularmente importante para a 
apicultura no Brasil porque sabe-se que as abelhas Africanizadas naturalmente produzem células de 
favo com um diâmetro médio de 4,7 - 4,9 mm, enquanto os apicultores geralmente fornecem cera 
 
 
 
 
alveolada tipo européia com dimensões das células de 5,2 - 5,4 mm. Inclusive muitas colméias têm 
favos com ambos os tipos de células. Essas diferenças no tamanho da célula do favo poderiam afetar o 
desenvolvimento da colméia, principalmente a longevidade das abelhas, a divisão do trabalho, a 
morfologia e peso das abelhas, o desempenho da colméia, susceptibilidade a doenças, a população final 
e produção de mel, porém, esta possibilidade tem sido pouco estudada. 
 Já encontramos que quando há favos feitos com células grandes, a partir de cera alveolada, a 
infestação com o ácaro Varroa aumenta, em comparação com a infestação em favos de cria feitos pelas 
próprias abelhas, com células menores. Há efeitos também sobre o tamanho e a longevidade das 
abelhas. Neste caso, ainda não temos recomendações especificas. Apenas podemos dizer que é um 
assunto que merece estudos cuidadosos, para determinar se o tipo de favo que escolhemos afeta ou não 
a produtividade das abelhas, tanto ao nível do Brasil, como em todo o mundo. 
 
 
 
	Efeitos do favo sobre as abelhas

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