Prévia do material em texto
ESTRUTURAS DE AÇO E MADEIRA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Identificar métodos de soldagem de peças metálicas na fabricação e mon- tagem de estruturas. > Relacionar falhas e métodos de controle de qualidade da solda. > Analisar tipos de juntas e cálculos de resistência de soldagem. Introdução A soldagem é um dos meios utilizados para unir elementos de estruturas metálicas, como pontes, edifícios, coberturas, entre outros. Algumas das vantagens desse processo em relação a outras formas de ligação, como o uso de parafusos e rebites, são a elevada resistência da junta, o menor peso final da estrutura e a flexibilidade associada à possibilidade de realizar a soldagem em campo. No entanto, existem algumas desvantagens que devem ser consideradas: a necessidade de mão de obra altamente qualificada, a impossibilidade de se desmontar a estrutura para a manutenção e a presença de defeitos. Na soldagem de estruturas metálicas na indústria da construção, a coalescência, na maioria dos casos, é obtida por meio da fusão dos metais com o uso de um arco elétrico estabelecido entre as peças a serem unidas e um eletrodo. Entre os processos mais utilizados, estão a soldagem a arco com eletrodo revestido, a soldagem a arco submerso, a soldagem a arco com proteção gasosa e a solda- gem a arco com arame tubular. Cada processo possui características e técnicas operatórias específicas. Os processos com proteção gasosa, por exemplo, são Soldagem em estruturas metálicas Mario Sergio Della Roverys Coseglio versáteis, podem ser realizados de forma manual ou automática e permitem uma boa visibilidade durante a soldagem. Neste capítulo, você verá que a qualidade da solda é um fator de extrema importância e que as devidas ações devem ser tomadas para reduzir ao máximo a ocorrência de descontinuidades, a fim de evitar falhas que podem comprometer a integridade das estruturas. Além disso, você verá como calcular a resistência de soldagem para diferentes tipos de juntas. Processos de soldagem Para que você compreenda melhor o que será apresentado ao longo deste capítulo, o texto é iniciado com uma descrição geral do processo de soldagem e de alguns termos que são utilizados com frequência no meio industrial. A Figura 1 apresenta um esquema básico de um processo típico de sol- dagem. Segundo Marques, Modenesi e Bracarense (2009), a soldagem é uma operação cujo objetivo é promover a união de peças. Como resultado da soldagem, obtém-se a solda, sendo a junta soldada a região onde foi feita a união, como mostrado na Figura 1c. A Figura 1b apresenta uma secção transversal do conjunto durante a soldagem, em que é possível identificar o metal de base (i.e., material das peças que estão sendo soldadas), o metal de adição, a poça de fusão, o eletrodo, o arco e o gás de proteção. Na soldagem a arco, a coalescência ocorre por meio da fusão dos metais, promovida pelo calor intenso gerado por um arco elétrico estabelecido entre as peças a serem soldadas e o eletrodo. Segundo Groover (2003), os eletrodos podem atuar como metal de adição para a junta soldada (eletrodos consumíveis) ou apenas para a formação do arco elétrico. Neste último caso, os eletrodos não são consumíveis, e são feitos de materiais que não se fundem com o calor gerado pelo arco, como, por exemplo, o tungstênio. Figura 1. Visão geral do processo de soldagem a arco: (a) antes da soldagem; (b) durante a soldagem (secção transversal); (c) após a soldagem. Fonte: Adaptada de Groover (2012). Eletrodo Metal de adição Poça de fusão Penetração Junta soldada Aço Gás de proteção Peças a serem soldadas Metal de base Soldagem em estruturas metálicas2 Processos de soldagem De acordo com Groover (2012), os processos de soldagem podem ser divididos em dois grupos principais: soldagem por fusão e soldagem no estado sólido. Na soldagem por fusão, o calor gerado no processo é utilizado para fundir o metal de base, sendo que, em alguns casos, são utilizados metais de adição. Fazem parte desse grupo: soldagem a arco (AW, arc welding), soldagem por resistência (RW, resistance welding) e soldagem oxi-combustível (OFW, oxyfuel gas welding), além de outros tipos, como soldagem com feixe de elétrons (electron beam welding) e soldagem a laser (laser beam welding). Já a soldagem no estado sólido utiliza a pressão ou a combinação de pressão e calor para unir as peças. Como observa Groover (2012), os principais processos que compõem esse grupo são: soldagem por difusão (DW, diffusion welding), soldagem por atrito (FRW, friction welding) e soldagem por ultrassom (USW, ultrasonic welding). Segundo Pfeil e Pfeil (2009), a soldagem a arco é a mais utilizada na indús- tria da construção. Os processos mais comuns são listados a seguir: � Soldagem a arco com eletrodo revestido (SMAW, shielded metal arc welding). � Soldagem a arco submerso (SAW, submerged arc welding). � Soldagem a arco com proteção gasosa (GMAW, gas metal arc welding), também conhecida como solda MIG (do inglês metal inert gas) ou solda MAG (do inglês metal active gas). � Soldagem a arco com eletrodo de tungstênio e proteção gasosa (GTAW, gas tungsten arc welding), também conhecida como soldagem TIG (do inglês tungsten arc welding). � Soldagem a arco com arame tubular (FCAW, flux-cored arc welding). Conforme Wainer, Brandi e Mello (1992), a soldagem a arco com eletrodo revestido é um processo de soldagem em que as peças são unidas pelo calor produzido pelo arco elétrico estabelecido entre um eletrodo reves- tido e o metal de base. Uma representação esquemática desse processo é apresentada na Figura 2a. Segundo Marques, Modenesi e Bracarense (2009), o eletrodo revestido é composto por um núcleo metálico (conhecido como alma do eletrodo), que atua como metal de adição, e um revestimento, que estabiliza o arco elétrico, protege a poça de fusão e a alma do eletrodo, entre outras funções. A soldagem com eletrodo revestido requer um equipamento relativamente simples (fonte de energia, eletrodo, porta eletrodo, cabos, etc.; Figura 2b), o Soldagem em estruturas metálicas 3 que permite tanto a soldagem no local de fabricação quanto a soldagem em campo (MARQUES; MODENESI; BRACARENSE, 2009). Em contraste com essa versatilidade, Marques, Modenesi e Bracarense (2009) destacam a baixa produ- tividade do processo quando comparado com outros tipos de soldagem a arco. Figura 2. Soldagem a arco com eletrodo revestido: (a) representação esquemática do processo; (b) representação básica do equipamento. Fonte: (a) Adaptada de Marques, Modenesi e Bracarense (2009); (b) Adaptada de Wainer, Brandi e Mello (1992). Revestimento Alma Metal de adição Solda Metal de base Poça de fusão Eletrodo revestido Porta eletrodo Eletrodo Peça Pinça para ligação à peça Cabo terra Terminais Fonte de energia Cabo do eletrodo (a) (b) Na soldagem a arco submerso, o arco elétrico estabelecido entre o eletrodo e o metal de base é protegido por um material granular, conhecido como fluxo (Figura 3a). Segundo Marques, Modenesi e Bracarense (2009), as principais fun- ções do fluxo são proteger a região da solda de contaminação pela atmosfera, estabilizar o arco elétrico, fornecer elementos de liga para a solda, entre outras. Além disso, Wainer, Brandi e Mello (1992) adicionam que o fluxo atua como um isolante térmico e evita a ocorrência de respingos durante a soldagem. Soldagem em estruturas metálicas4 Segundo Marques, Modenesi e Bracarense (2009), outro processo que utiliza o fluxo de soldagem para a proteção do arco e do cordão de solda é a soldagem a arco com arame tubular. Nesse caso, a alimentação do fluxo é feita pelo interior do eletrodo. A Figura 3b apresenta uma representação esquemática da soldagem a arco submerso. Observe que o eletrodo possui a forma de um arame, alimentado por um carretel à medida que é consumido. Como observam Wainer, Brandi e Mello (1992), o processo pode ser semiautomático ou automático. Figura 3. Soldagem a arcosubmerso: (a) representação esquemática do processo; (b) repre- sentação básica do equipamento. Fonte: (a) Adaptada de Marques, Modenesi e Bracarense (2009); (b) Adaptada de Wainer, Brandi e Mello (1992). Fluxo Eletrodo Escória Poça de fusão Solda Metal de base Carretel de arame eletrodo Fonte de energia Alimentador de fluxo Sistema de controle Comando da velocidade do eletrodo nu Tubo de contato elétrico do cabeçote Direção de soldagem (a) (b) Soldagem em estruturas metálicas 5 Segundo Marques, Modenesi e Bracarense (2009), na soldagem a arco com proteção gasosa, o calor necessário para a união das peças é obtido por um arco elétrico, formado entre a extremidade de um eletrodo (que possui a forma de arame) e a peça que está sendo soldada, conforme a Figura 4a. Nesse caso, a proteção da região da solda é feita com um gás ou com uma mistura de gases. O processo é conhecido como soldagem MIG, quando o gás é inerte, ou soldagem MAG, quando o gás é ativo. Uma representação esquemática dos equipamentos típicos utilizados nos processos MIG e MAG é apresentada na Figura 4b. Tanto Marques, Modenesi e Bracarense (2009) como Wainer, Brandi e Mello (1992) destacam a versatilidade do processo e outras vantagens, quando comparado com a soldagem com eletrodos revestidos, como: facilidade de automatização, velocidade elevada de deposição, ausência de escória e boa visibilidade durante a soldagem. Vale destacar, também, algumas limitações apontadas por Wainer, Brandi e Mello (1992), como o maior custo do equipa- mento e a necessidade de proteção da solda contra correntes de ar. Figura 4. Soldagem MIG/MAG: (a) representação esquemática do processo; (b) representação básica do equipamento. Fonte: Adaptada de Marques, Modenesi e Bracarense (2009). Tocha Gás de proteção Solda Metal de base Poça de fusão Eletrodo Alimentador de arame ArameTocha Peça Cabos Fonte de energia (+) (-) G á s (a) (b) Soldagem em estruturas metálicas6 Na soldagem a arco com eletrodo de tungstênio e proteção gasosa, também conhecida como soldagem TIG, o arco elétrico que fornece calor para a união das peças é formado entre um eletrodo de tungstênio (não consumível) e a peça. Como observam Wainer, Brandi e Mello (1992), a proteção da região da solda é feita com um gás inerte. Representações esquemáticas desse processo e dos equipamentos utilizados são mostradas na Figura 5a e 5b. Um aspecto importante da soldagem TIG é a alta estabilidade do arco elétrico, que possibilita obter uma solda de boa qualidade (MARQUES; MO- DENESI; BRACARENSE, 2009). Além disso, como o eletrodo não é consumível, Marques, Modenesi e Bracarense (2009) listam a possibilidade da soldagem de chapas finas como uma das vantagens do processo. Figura 5. Soldagem TIG: (a) representação esquemática do processo; (b) representação básica do equipamento. Fonte: (a) Adaptada de Marques, Modenesi e Bracarense (2009); (b) Adaptada de Wainer, Brandi e Mello (1992). Tocha Gás de proteção Solda Metal de base Poça de fusão Metal de adição Regulador de pressão e vazão Reservatório de gás Rede elétrica Unidade de alta frequência PedalMetal base Tocha Sistema de refrigeração (a) (b) Soldagem em estruturas metálicas 7 Nesta seção, vimos que as soldas podem ser classificadas de acordo com dois critérios principais: a posição da junta soldada em relação ao metal de base e a posição relativa das peças soldadas. Além disso, vimos algumas características e as configurações básicas dos processos de soldagem a arco que são utilizados com mais frequência na indústria da construção. Qualidade de peças soldadas Segundo a American Welding Society (2001), a qualidade de uma solda está diretamente relacionada com a sua integridade. Nesse contexto, qualquer solda deve ter um nível de qualidade suficientemente elevado para garantir a confiabilidade da ligação durante toda a vida útil da estrutura. Algumas considerações importantes de projetos de soldas são listadas a seguir (AME- RICAN WELDING SOCIETY, 2001): � as soldas devem ser projetadas para atender a todas as condições a que serão submetidas durante a sua vida útil; � as soldas devem ser realizadas com materiais adequados e de acordo com as recomendações das normas técnicas; � os limites de carga, fadiga e corrosão devem ser considerados durante a instalação, operação e manutenção das soldas. Devido ao calor intenso localizado na região da solda durante a soldagem a arco, que pode afetar também as regiões adjacentes (zonas termicamente afetadas), e outros fatores relacionados com o processo e o projeto, as soldas estão sujeitas a uma série de descontinuidades. Segundo Marques, Modenesi e Bracarense (2009), a descontinuidade refere-se a uma violação ou interrupção estrutura esperada ou típica de uma junta soldada. Já um defeito, segundo a American Welding Society (2001), é uma descontinuidade que torna uma peça ou um produto incapaz de atender às especificações ou aos padrões de aceitação mínimos aplicáveis. Portanto, a presença de descontinuidades pode reduzir o desempenho da solda, de modo que as devidas ações devem ser tomadas para minimizar a sua ocorrência. De acordo com a American Welding Society (2001), as descontinuidades em juntas soldadas obtidas por processos de fusão podem ser agrupadas em três tipos principais: Soldagem em estruturas metálicas8 � Descontinuidades relacionadas com o processo ou procedimento de soldagem: distorção, irregularidades superficiais, penetração incom- pleta, fusão incompleta, inclusões, entre outras. � Descontinuidades metalúrgicas: trincas ou fissuras, porosidade, alte- ração de microestrutura na zona termicamente afetada, entre outras. � Descontinuidades relacionadas com o projeto: concentrações de ten- sões e tipo da junta soldada. A seguir, são apresentadas as origens, causas, consequências e medidas corretivas de três tipos de descontinuidades comuns em soldas de elementos estruturais: distorção, perfil incorreto e trincas. Segundo Marques, Modenesi e Bracarense (2009), a distorção é caracteri- zada por alterações geométricas das peças soldadas, devidas à deformação plástica provocada pelo aquecimento intenso. Como consequência, a distorção altera a forma e as dimensões da peça, o que pode resultar em problemas de montagem. As formas básicas de distorção (contração transversal, contração longitudinal e distorção angular) são apresentadas na Figura 6. Uma das formas de se evitar a distorção é reduzir a quantidade de calor e o volume de material depositado na junta soldada. Conforme Marques, Modenesi e Bracarense (2009), a recuperação de uma peça soldada distorcida pode ser feita por meio de desempenamento (mecânico ou térmico). Figura 6. Formas básicas de distorção em peças soldadas. Fonte: Adaptada de Marques, Modenesi e Bracarense (2009). Contração transversal Distorção angular Contração longitudinal Soldagem em estruturas metálicas 9 A Figura 7, a seguir, apresenta alguns perfis incorretos de soldas de filete: garganta insuficiente, convexidade excessiva, mordedura, dobra, perna insu- ficiente e falta de penetração. As causas práticas para a ocorrência desses defeitos estão, na maioria dos casos, relacionadas com falhas no posicio- namento do eletrodo e com o uso de parâmetros inadequados de soldagem (MARQUES; MODENESI; BRACARENSE, 2009). Figura 7. Perfis inadequados de soldas de filete. Fonte: Adaptada de Marques (2009). Garganta insuficiente Convexidade excessiva Mordedura Dobra Perna insuficiente Falta de penetração Segundo a American Welding Society (2001), a trinca é considerada a forma mais severa de descontinuidade, pois tende a se propagar quando está sob tensão, o que pode resultar em falhas catastróficas da estrutura. As trincas são formadas quando a tensão no local ultrapassa a resistência do material. Elas podem ser classificadas em dois tipos, segundo a temperatura de formação: trincas a quente e trincas a frio (AMERICAN WELDING SOCIETY,2001). As trincas a quente ocorrem a uma alta temperatura e, em geral, são formadas durante a solidificação. Já as trincas a frio são formadas após a solidificação, como resultado da presença de tensões residuais. Muitas vezes, elas são associadas à fragilização por hidrogênio, que envolve a absorção de hidrogênio durante a soldagem, podendo levar à falha de materiais suscetíveis. A fragilização por hidrogênio pode levar algumas horas para se desenvolver (MARQUES; MODENESI; BRACARENSE, 2009). Por isso, é recomendado que a inspeção da solda não seja feita imediatamente após a soldagem, para que seja possível detectar as trincas formadas. As trincas podem ser formadas tanto no metal de base quando na solda e podem ter diferentes orientações (Figura 8). Segundo Marques, Modenesi e Bracarense (2009), as trincas de soldagem podem ser classificadas de acordo com a sua localização (o número corresponde à posição de cada trinca indicada na Figura 8): Soldagem em estruturas metálicas10 1. trinca de cratera; 2. trinca transversal localizada na zona fundida da solda; 3. trinca transversal localizada na zona termicamente afetada; 4. trinca longitudinal na zona fundida da solda; 5. trinca longitudinal na margem da solda; 6. trinca sob o cordão de solda; 7. trinca na linha de fusão (fronteira entre a zona fundida e a zona ter- micamente afetada); 8. trinca localizada na raiz da solda. Segundo a American Welding Society (2001), evitar o resfriamento rápido, usar procedimentos com baixo teor de hidrogênio, manipular o eletrodo de forma adequada e preaquecer a região da solda são exemplos de práticas que podem contribuir para o aumento da resistência à formação de trincas na solda. Figura 8. Posições típicas de trincas de soldagem. Fonte: Adaptada de Marques, Modenesi e Bracarense (2009). O Quadro 1, a seguir, apresenta, de forma resumida, possíveis causas e medidas preventivas para algumas descontinuidades mais comuns: trincas (na solda e na zona termicamente afetada), penetração incompleta da solda, inclusões e porosidade. Soldagem em estruturas metálicas 11 Quadro 1. Exemplos de causas e medidas preventivas para tipos comuns de descontinuidades em soldas Descontinuidades Exemplos de causas Exemplos de medidas preventivas Trincas Junta com alta rigidez, presença de hidrogênio na atmosfera de soldagem (trincas a frio), calor excessivo (trincas a quente), eletrodos defeituosos e baixa ductilidade do metal de base. Reduzir a tensão residual utilizando métodos mecânicos ou térmicos, reduzir a quantidade de hidrogênio, preaquecer o conjunto ou realizar tratamento pós- soldagem, reduzir o calor fornecido, depositar o metal em camadas mais finas, substituir o eletrodo e adotar tratamento térmico de recozimento. Penetração incompleta Geometria inadequada da junta, calor insuficiente, formação de escória, falta de alinhamento e calor insuficiente. Utilizar geometria adequada para a junta e seguir um procedimento adequado de soldagem. Inclusões Presença de tungstênio na solda, projeto inadequado da junta e presença de óxidos e de escória. Evitar o contato do eletrodo com a peça, aumentar o ângulo do chanfro, utilizar gás de proteção adequado e ajustar a técnica de manipulação do eletrodo. Porosidade Excesso de gases na atmosfera de soldagem, alta taxa de solidificação, contaminação da superfície e excesso de umidade. Utilizar a quantidade recomendada de gás de proteção, usar preaquecimento e remover óleo, graxa e ferrugem da superfície. Fonte: Adaptado de American Welding Society (2001). Existem diferentes técnicas para se inspecionar soldas e detectar a pre- sença de descontinuidades. As principais técnicas não destrutivas, isto é, Soldagem em estruturas metálicas12 aquelas em que as peças examinadas não são destruídas e não perdem a sua funcionalidade, são apresentadas a seguir (AWS, 2001): � Inspeção visual: consiste na análise visual da solda para identificar descontinuidades. É uma técnica útil para verificar se as dimensões da solda estão adequadas e detectar descontinuidades na superfície e falta de alinhamento. Para a maioria das aplicações, a inspeção visual não requer equipamento especializado. � Partículas magnéticas: utilizadas para identificar descontinuidades superficiais (fissuras) e logo abaixo da superfície (poros) em materiais ferromagnéticos. As descontinuidades são detectadas por distorções das linhas de campo. � Líquido penetrante: consiste no uso de um líquido com corante que penetra nas descontinuidades da superfície por capilaridade. É uma técnica aplicada para detectar fissuras na superfície. � Ultrassom: ondas sonoras de alta frequência são direcionadas para a região da solda, e as descontinuidades internas são detectadas por meio da análise dos padrões de reflexão. � Raio X: localiza com precisão descontinuidades internas, como trincas e poros. O princípio básico da radiografia industrial para a inspeção de soldas é o mesmo da radiografia utilizada na medicina. Além das técnicas não destrutivas, as soldas podem ser inspecionadas por meio de análises macroscópica e microscópica. Nesse caso, uma secção transversal da solda é preparada com o uso de técnicas metalográficas e analisada com o uso de microscópio. Segundo a American Welding Society (2001), essa técnica pode ser aplicada para se obter informações mais deta- lhadas sobre a solda, como a presença de inclusões não metálicas, o número de passes, a profundidade da solda e o tamanho da estrutura metalúrgica da zona termicamente afetada. Nesta seção, vimos que é essencial manter níveis adequados de qualidade da solda para evitar falhas que podem resultar em perda de desempenho e colapso de uma estrutura. Portanto, para manter a integridade dos elementos estruturais unidos por soldagem, faz-se essencial utilizar boas práticas para o projeto da junta soldada e para as técnicas operatórias. Soldagem em estruturas metálicas 13 Classificação de soldas e dimensionamento de juntas De acordo com Groover (2012), uma forma geral de classificação de soldas leva em consideração a posição da junta soldada em relação ao metal de base. Segundo esse critério, a solda pode ser de filete, de entalhe ou de orifício. Na solda de filete, o metal de adição é inserido nas faces laterais das peças que estão sendo unidas, como mostrado na Figura 9a. Já na solda de entalhe, o metal de adição é inserido em chanfros, cujos principais formatos são exibidos na Figura 9b. Por fim, na solda de orifício, ou solda de tampão, o material da solda é inserido em um orifício ou em um rasgo feito em uma das peças, como ilustrado na Figura 9c. Figura 9. (a) Soldas de filete, (b) de entalhe e (c) de orifício. Fonte: Adaptada de Groover (2012). Junta soldada Junta soldada I Meio V U J Duplo V V Solda de orifício (a) (b) (c) Soldagem em estruturas metálicas14 Conforme Groover (2012), outra forma de se diferenciar os tipos de solda leva em consideração a posição relativa das peças soldadas. Segundo essa classificação, a junta soldada pode ser de topo, de canto, sobreposta (com transpasse), em ângulo (ou em T) ou de aresta, como ilustrado de forma esquemática na Figura 10. Figura 10. Tipos de juntas. Fonte: Adaptada de Groover (2012). Uma etapa importante do projeto de uma junta soldada é o dimensio- namento, cujo objetivo é garantir que a solda seja capaz de resistir aos es- forços solicitantes durante toda a sua vida útil, garantindo a integridade da estrutura. Para mostrar como o dimensionamento é feito na prática, a seguir, são apresentados dois exemplos de cálculo para a verificação estrutural de ligações soldadas típicas utilizadas em estruturas metálicas. Exemplo 1 Considere que uma solda de filete (obtida por soldagem a arco submerso) em uma junta soldada do tipo T é submetida a uma carga de tração com magnitude de 40 kN, como mostrado de forma esquemática na Figura 11. Suponha que a espessura daschapas seja de 12 mm. Figura 11. Junta soldada em T (solda de filete). Fonte: Adaptada de Pfeil e Pfeil (2009). Soldagem em estruturas metálicas 15 Para efeito de cálculo, a secção transversal de uma solda de filete é con- siderada como um triângulo retângulo, como mostrado na Figura 12. Esse modelo teórico considera que o filete tem lados iguais (designados pela letra b), embora seja possível que, na prática, os valores sejam diferentes. O menor lado do triângulo é conhecido como perna do filete, ao passo que a interseção entre as faces das peças soldadas é conhecida como raiz da solda. Já a hipotenusa do triângulo é conhecida como face do filete, ao passo que a distância entre a raiz e a face é conhecida como garganta ou espessura do filete. Para o dimensionamento de filetes com lados iguais, adota-se t = 0,7b. Figura 12. Secção transversal teórica de um filete com lados iguais. Fonte: Adaptada de Pfeil e Pfeil (2009). t b b t = 0,7b A resistência de cálculo do metal de solda pode ser obtida por meio da seguinte expressão (PFEIL; PFEIL, 2009): onde: Aw = área efetiva da solda; fw = tensão resistente do metal da solda; γw = coeficiente de ponderação da resistência. A área efetiva da solda, Aw, é obtida multiplicando-se a espessura do filete (t = 0,7b) pelo comprimento do filete, : Aw = 0,7b . Segundo Pfeil e Pfeil (2009), a escolha da dimensão do filete deve levar em consideração a espessura das chapas, como mostrado no Quadro 2. Para este exemplo, como a espessura Soldagem em estruturas metálicas16 das duas chapas é de 12 mm, o tamanho mínimo da perna da solda é de 5 mm, ou seja, b = 0,5 cm. Quadro 2. Tamanho mínimo da perna de uma solda de filete Menor espessura do metal de base na junta (mm) Tamanho mínimo da perna, (mm) Até 6,35 3 De 6,35 até 12,5 5 De 12,5 até 19 6 Acima de 19 8 Fonte: Adaptado de Associação Brasileira de Normas Técnicas (2008). A tensão resistente do metal de solda é obtida a partir da especificação do eletrodo. Considere que o eletrodo do tipo E60 de aço carbono tenha sido escolhido para realizar a solda e que o material tenha uma resistência de 415 MPa. Portanto, fw = 41,5 kN/cm2. O coeficiente de ponderação da resistência, γw, depende das combina- ções de carga (PFEIL; PFEIL, 2009) γw = 1,35 para combinações normais ou de construção e γw = 1,15 para combinações excepcionais. Neste exemplo, será adotado o primeiro caso (γw = 1,35). Com as informações obtidas até aqui, é possível determinar a resistência de cálculo do metal de solda, conforme a seguir: Observe que a área de cada filete (0,7 × 0,5 cm × 10 cm) foi multiplicada por 2, pois o filete é duplo. Em seguida, é preciso comparar a resistência de cálculo obtida (Rd = 129 kN) com o esforço solicitante de cálculo, Sd, obtido multiplicando-se a força de tração que atua no sistema (40 kN) por um fator (coeficiente de ponderação das ações) que atua como coeficiente de segu- rança. Para tanto, três efeitos são levados em consideração: a ocorrência simultânea de ações, a variabilidade das ações e a incerteza associada à avaliação das ações. Para este exemplo, foi considerado um fator de 1,5, que, segundo Pfeil e Pfeil (2009), equivale a uma ação permanente (peso próprio Soldagem em estruturas metálicas 17 dos elementos que compõem a estrutura e os equipamentos sob condições normais). Assim: Como Rd > Sd, a junta soldada suporta, com folga, a carga de tração de 40 kN. Exemplo 2 Agora, considere que seja necessário determinar o comprimento, , da solda de filete mostrada na Figura 13. A chapa central tem espessura de 12 mm, ao passo que as chapas soldadas nas suas faces superior e inferior têm espessura de 10 mm. Figura 13. Exemplo de dimensionamento de uma solda de filete. Fonte: Adaptada de Pfeil e Pfeil (2009). Assim como no exemplo anterior, o primeiro passo consiste em determinar o tamanho do filete. Utilizando os dados do Quadro 2 para uma espessura de 10 mm (a menor espessura do conjunto), sabe-se que b = 0,5 cm. Assim, a área da solda pode ser determinada da seguinte forma (4 filetes, sendo que cada filete possui um comprimento ): Desse modo, a resistência de cálculo é dada por (PFEIL; PFEIL, 2009): Soldagem em estruturas metálicas18 O esforço solicitante, assumindo uma condição de ação permanente (peso próprio dos elementos que compõem a estrutura e os equipamentos sob condições especiais ou de construção), é (PFEIL; PFEIL, 2009): O comprimento, , pode, então, ser determinado igualando-se a resistência à solicitação, ou seja (PFEIL; PFEIL, 2009): Assim, = 9,7 cm. Segundo Pfeil e Pfeil (2009), é recomendado que cada filete tenha um comprimento maior ou igual à distância que os separa (que, neste caso, é de 100 mm, como mostra a Figura 12), de modo que pode ser adotado um comprimento = 100 mm. Pfeil e Pfeil (2009) destacam que, no dimensionamento de soldas, é preciso verificar, também, a resistência de cisalhamento associada ao estado-limite de escoamento do metal. Os dois exemplos apresentados demonstram a lógica da verificação estru- tural de ligações soldadas e do dimensionamento de filetes de solda. Como visto, é importante incluir, nos cálculos, os devidos fatores de ponderação para as solicitações e para as resistências de projeto, levando em consideração a severidade das condições de carregamento e as incertezas envolvidas. Neste capítulo, vimos que a soldagem a arco elétrico é o processo de soldagem mais utilizado para a união de elementos estruturais, e que cada variante do processo (eletrodo revestido, arco submerso, MIG/MAG, TIG e arame tubular) tem características e técnicas operatórias específicas. Vimos também que as soldas estão sujeitas à descontinuidades (p. ex., trincas, que são consideradas as mais severas), de modo que medidas preventivas devem ser tomadas para evitar as suas ocorrências e reduzir os riscos de falha. Além disso, vimos que o calor intenso na região da solda gera tensões residuais que podem resultar em distorção e empenamento de peças soldadas, o que pode ser reduzido com o uso de tratamentos térmicos. Por fim, vimos exemplos de verificação estrutural de soldas de filete, que destacaram a importância de se considerar todas as condições de carregamento na região da solda para dimensionar a ligação. Soldagem em estruturas metálicas 19 Referências AMERICAN WELDING SOCIETY. Welding handbook, volume 1: welding science and tech- nology. 9. ed. Miami: AWS, 2001. 932 p. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 8800: Projeto de estruturas de aço e de estruturas mistas de aço e concreto de edifícios. Rio de Janeiro: ABNT, 2008. 237 p. GROOVER, M. P. Fundamentals of modern manufacturing: materials, processes, and systems. 5. ed. Danvers: John Wiley & Sons, 2012. MARQUES, P. V.; MODENESI, P. J.; BRACARENSE, A. Q. Soldagem: fundamentos e tecnologia. 3.° ed. Belo Horizonte: UFMG, 2009. 362 p. (Série Didática). PFEIL, W.; PFEIL, M. Estruturas de aço. 8. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2009. 380 p. WAINER, E.; BRANDI, S. D.; MELLO, F. D. H. Soldagem: processos e metalurgia. São Paulo: Blucher, 1992. 504 p. Leitura recomendada BELLEI, I. H. Edifícios industriais em aço: projeto e cálculo. 6. ed. São Paulo: Pini, 2010. 493 p. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Soldagem em estruturas metálicas20