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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS 
Programa de Pós-Graduação em Direito 
 
 
 
 
 
 
Camilla Ayala Felisberto Silva 
 
 
 
 
 
 
O DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO NO 
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: um estudo sobre o tratamento 
diferenciado e a possibilidade de equiparação do direito hereditário de ambos 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Belo Horizonte 
2019
 
 
 
Camilla Ayala Felisberto Silva 
 
 
 
 
O DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO NO 
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: um estudo sobre o tratamento 
diferenciado e a possibilidade de equiparação do direito hereditário de ambos 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação stricto sensu em Direito da Pontifícia 
Universidade Católica de Minas Gerais, como 
requisito parcial para obtenção do título de Mestre 
em Direito. 
 
Orientador: Walsir Edson Rodrigues Júnior 
 
Área de concentração: Direito Privado 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Belo Horizonte 
2019 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FICHA CATALOGRÁFICA 
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais 
 
 Silva, Camilla Ayala Felisberto 
S586d O direito sucessório do cônjuge e do companheiro no ordenamento jurídico 
brasileiro: um estudo sobre o tratamento diferenciado e a possibilidade de 
equiparação do direito hereditário de ambos / Camilla Ayala Felisberto Silva. 
Belo Horizonte, 2019. 
 132 f. 
 
Orientador: Walsir Edson Rodrigues Júnior 
 Dissertação (Metrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. 
Programa de Pós-Graduação em Direito 
 
 1. Direito de família. 2. Herança e sucessão. 3. Casamento (Direito). 4. 
União estável. 5. Cônjuges. 6. Companheiros (Direito de família). I. 
Rodrigues Júnior, Walsir Edson. II. Pontifícia Universidade Católica de 
Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Direito. III. Título. 
 
 
 CDU: 347.6 
Ficha catalográfica elaborada por Fabiana Marques de Souza e Silva - CRB 6/2086 
 
 
 
Camilla Ayala Felisberto Silva 
 
 
O DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO NO 
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: um estudo sobre o tratamento 
diferenciado e a possibilidade de equiparação do direito hereditário de ambos 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação stricto sensu em Direito da Pontifícia 
Universidade Católica de Minas Gerais, como 
requisito parcial para obtenção do título de Mestre 
em Direito. 
 
Área de concentração: Direito Privado 
 
 
 
 
___________________________________________________________________ 
Prof. Dr. Walsir Edson Rodrigues Junior - PUC Minas (Orientador) 
 
___________________________________________________________________ 
Prof.ª. Dr.ª Cláudia Fialho – PUC Minas (Banca Examinadora) 
 
___________________________________________________________________ 
Prof. Dr. Newton Teixeira Carvalho - Escola Superior Dom Helder Câmara (Banca 
Examinadora) 
 
 
 
Belo Horizonte, 8 de março de 2019. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
À minha eterna vovó Naná, fonte de toda força e inspiração. 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 Agradeço primeiramente a Deus, por me oportunizar vivenciar tamanha experiência na 
vida acadêmica, me permitindo acreditar a cada dia o quanto os sonhos são possíveis de serem 
realizados e que eles dependem apenas na nossa fé e confiança. 
 À minha amada e eterna Vovó Naná, que desde sempre dedicou seu tempo a me 
ensinar e me mostrar que o esforço sempre é recompensado e que a vida deve ser vivida de 
forma intensa e deliciosamente proveitosa. 
 À minha mãe, a maior das minhas inspirações pela escolha de lecionar, que com seu 
amor à sala de aula me contagiou a trilhar esse caminho. E ao meu pai, que com a sua 
dedicação e disponibilidade é minha base de sustentação para qualquer escolha que eu faça. 
Amo vocês! 
 À minha irmã, por ser essa companheira de vida, que me ajuda, me apoia, me entende 
e esbanja afeto e alegria por onde quer que passe. 
 Ao Pedro, pela parceria e paciência incomensurável durante todo o tempo. Pelo 
carinho, amor, dedicação e por sempre apoiar minhas escolhas. 
 À Chris e ao Matheus, por serem os melhores amigos e melhores exemplos de esforço 
e dedicação acadêmica, por todo o compartilhamento de alegrias, tristezas, angústias, vitórias 
e realizações dentro de um mestrado. Vocês são essenciais em minha vida! 
 Aos meus amigos pelo carinho, respeito, amizade e solidariedade durante todo esse 
período, principalmente à Ana Carolina, Stephanie, Ju e Luana. 
 Aos meus tios por sempre estarem ao meu lado, se dedicando e me apoiando a cada 
degrau que eu subo na minha escada de realizações. 
 Ao meu orientador, Professor Walsir Edson Rodrigues Júnior, por ser esse exemplo de 
profissional dedicado que inspira tantos discentes e docentes, pelos auxílios sempre que 
solicitado, por ter me dado à honra de acompanhá-lo em estágio de docência, que foi 
fundamental para que eu tivesse a certeza do caminho que venho perseguindo. 
 Aos demais professores e colegas do PPGD – PUC Minas por compartilharem tantas 
ideias; e pelos amigos do SAJ por todo carinho, amizade e apoio. 
 Agradeço, por fim, a todos e todas que torceram por mim nessa fase tão especial da 
minha vida, muito obrigada! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“É necessário fazer outras perguntas, ir atrás das indagações que produzem o novo saber, 
observar com outros olhares através da história pessoal e coletiva, evitando a empáfia 
daqueles e daquelas que supõem já estar de posse do conhecimento e da certeza.” 
 
Mário Sérgio Cortella 
 
 
 
RESUMO 
 
 
O direito sucessório brasileiro no que diz respeito ao cônjuge e ao companheiro passou por 
um longo processo evolutivo, com significativa influência do direito português até chegar à 
fase atual, através do Código Civil de 2002. A codificação civil atual estabeleceu regras 
distintas ao direito hereditário das famílias constituídas por casamento e união estável, 
destacando-se que todo o regramento desta última fora inserido em um único dispositivo, o 
artigo 1.790, que inclusive fora objeto de discussão em sede de repercussão geral, em que se 
reconheceu a sua inconstitucionalidade nos Recursos Extraordinários 646.721 e 878.694, por 
entenderem os julgadores que o referido dispositivo tratava a matéria sucessória do 
companheiro de forma discriminatória e limitada em relação aos direitos sucessórios do 
cônjuge. Parte-se do pressuposto de que as famílias devem receber total proteção estatal, 
garantindo-se o respeito a princípios como a igualdade, a dignidade da pessoa humana e a 
solidariedade familiar. A Constituição da República de 1988 coloca a união estável no mesmo 
patamar de espécie de família em que se encontra o casamento. Assim, utilizando-se do 
método dedutivo, por meio de pesquisa e investigação objetivando uma percepção geral, 
através de uma revisão bibliográfica de fontes presentes na doutrina do direito além da 
legislação e da jurisprudência, buscou-se analisar os aspectos do tratamento diferenciado 
atribuído ao direito sucessório do cônjuge e do companheiro no ordenamento jurídico 
brasileiro e a possibilidade de equiparação como solução, atendendo aos ditames 
constitucionais vigentes e aos anseios sociais modernos. 
 
Palavras-chave: Direito de Família. Direito das Sucessões. Casamento. União Estável. 
Cônjuge. Companheiro. Diferenças. Equiparação. 
 
ABSTRACT 
 
 
The Brazilian succession law about the spouse and the partner went through a long 
evolutionary process,with significant influence of Portuguese Law until culminating in that 
current stage, through the Civil Code of 2002. The current civil codification established 
different rules to the hereditary right of the families constituted by marriage and civil union, 
emphasizing that the entire rule of the latter was inserted into a single device, the article 
1.790, which had even been the subject of discussion in general repercussions, where its 
unconstitutionality was recognized in Extraordinary Judicial Resources 646.721 e 878.694, to 
comprehend the judges that the said device treated the succession matter of partner 
discriminatory and limited manner in relation to the spouse's succession rights. It assumes that 
families must receive entire state protection, certifying respect for principles such as equality, 
dignity of the human person and family solidarity. The Constitution of the Republic of 1988 
places the civil union on the same level as the kind of family in which the marriage is. Thus, 
using the deductive method, through means of research and investigation objectify at a 
general perception, through a bibliographical review of sources present in the doctrine of law 
further to legislation and jurisprudence, sought assay the aspects of the differential treatment 
attributed to the inheritance law of the spouse and the partner in Brazilian legal system and 
the possibility of equating as a solution, according with the current constitutional dictates and 
modern social desires. 
 
Keywords: Family Law. Succession Law. Marriage. Civil union. Spouse. Partner. Differences 
Equalization. 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS 
 
 
 
AC – Apelação Civil 
ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade 
ADPF - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 
AI – Agravo de instrumento 
Art. – Artigo 
Coord. – Coordenação 
C. Cív. – Câmara Cível 
Des. – Desembargador 
Ed. – Edição 
JDC – Jornada de Direito Civil 
Jul. – Julgamento 
n. – número 
Org. - Organizadores 
p. – página 
Rel. – Relator 
REsp – Recurso Especial 
REx – Recurso Extraordinário 
v. – Volume 
 
LISTA DE SIGLAS 
 
 
CC/16 – Código Civil de 1916 
CC/02 – Código Civil de 2002 
CJF – Conselho de Justiça Federal 
CNJ – Conselho Nacional de Justiça 
CR/88 – Constituição da República de 1988 
CPC/73 – Código de Processo Civil de 1973 
CPC/2015 – Código de Processo Civil de 2015 
IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família 
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 
STF – Supremo Tribunal Federal 
STJ – Superior Tribunal de Justiça 
TJMG – Tribunal de Justiça de Minas Gerais 
TJRS – Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 13 
 
2 CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL: DIFERENÇAS E SIMILITUDES .................... 17 
2.1 Espécies de Família ........................................................................................................... 22 
2.1.1 Famílias matrimoniais .................................................................................................. 26 
2.1.2 O reconhecimento da União Estável no Direito Brasileiro como entidade familiar ... 29 
2.2 Principais semelhanças e diferenças legítimas entre casamento e união estável ........ 33 
2.2.1 A definição dos marcos de constituição e dissolução .................................................... 35 
2.2.2 A vênia conjugal ............................................................................................................. 36 
2.2.3 A presunção legal de paternidade .................................................................................. 37 
2.2.4 As implicações no Direito das Sucessões ....................................................................... 39 
 
3 O DIREITO DAS SUCESSÕES E A PARTICIPAÇÃO DO CÔNJUGE E DO 
COMPANHEIRO ................................................................................................................... 43 
3.1 Breve análise do Direito das Sucessões ........................................................................... 43 
3.2.1 Aspectos históricos do Direito das Sucessões ................................................................ 45 
3.2.2 Apontamentos sobre o sistema sucessório romano-germânico .................................... 45 
3.2.3 Do Direito Português ao Direito Brasileiro ................................................................... 49 
3.3 A evolução do Direito das Sucessões na legislação brasileira ....................................... 51 
3.3.1 A sucessão legítima e a ordem de vocação hereditária ................................................. 56 
3.3.2 A sucessão do cônjuge no Código Civil de 2002 ........................................................... 60 
3.3.3 A sucessão do companheiro no Código Civil de 2002 ................................................... 66 
3.4 Fundamentos justificadores e função social do Direito Sucessório .............................. 70 
 
4 OS REFLEXOS DO TRATAMENTO DIFERENCIADO ATRIBUÍDO AO 
CÔNJUGE E AO COMPANHEIRO NO DIREITO SUCESSÓRIO ............................... 81 
4.2 A defesa pela manutenção do tratamento desigual entre cônjuges e companheiros 
para fins sucessórios ............................................................................................................... 90 
4.3 A defesa pela inconstitucionalidade do regramento sucessório dispensado ao 
companheiro e a consequente equiparação ao cônjuge ....................................................... 94 
 
5 A PERSISTÊNCIA DOS PROBLEMAS MESMO APÓS OS JULGAMENTOS DOS 
RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS 878.694 E 646.721 PELO STF ............................. 109 
5.1 Direito real de habitação ................................................................................................ 112 
5.2 Reserva de quota-parte ao cônjuge sobrevivente na concorrência com filhos comuns
 ................................................................................................................................................ 115 
5.3 Herdeiro necessário ........................................................................................................ 117 
 
6 CONCLUSÃO .................................................................................................................... 121 
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 125 
13 
 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
 
 Em meio aos organismos sociais e jurídicos o conceito, a extensão e a compreensão de 
família tende a se modificar de acordo com o tempo dentro da sociedade. Conforme aduzem 
Almeida e Rodrigues Júnior (2012), são ―significações diversas condizentes com diferentes 
momentos históricos‖ (ALMEIDA; RODRIGUES JÚNIOR, 2012, p. 1), ou seja, não basta 
fechar o conceito de família atual quando já se tem ciência de que em pouco tempo ele tende a 
se modificar. Entretanto, independentemente do tipo de família, é dever do Estado protegê-la, 
sob o risco de incorrer em forte contrariedade ao disposto no art. 226 da Constituição da 
República de 1988. 
Diante da ampla proteção atribuída às entidades familiares em suas diversas formas 
através da Carta Magna de 1988, questionamentos acerca da aplicação das leis 
infraconstitucionais em sua literalidade – e ainda mesmo através da hermenêutica – vêm 
causando certo desconforto na jurisprudência, na doutrina e até entre os legisladores. Exemplo 
disso é a discussão acerca do tratamento diferenciado que foi atribuído ao cônjuge e ao 
companheiro no direito sucessório a partir do Código Civil de 2002. 
Carlos Maximiliano (1958, p. 19) define direito sucessório como ―o conjunto de 
normas reguladoras da transmissão dos bens e obrigações de um indivíduo em consequência 
de sua morte. No sentido subjetivo, mais propriamentese diria – direito de suceder, isto é, de 
receber o acervo hereditário de um defunto.‖ 
 Ainda seguindo a ideia do referido autor, há que se reconhecer que a família labuta e 
colabora pelo interesse comum com relação aos seus bens, no intuito de aumentar o 
patrimônio não só individual, mas de forma geral, a fim de garantir o próprio futuro. E os 
legisladores tendo ciência e reconhecimento desse esforço mútuo, amparam e desenvolvem o 
direito hereditário. (MAXIMILIANO, 1958). 
 Logo se vê a ligação do direito sucessório com a família, sendo a proteção familiar 
considerada atualmente, também, um dos fundamentos do direito sucessório. Em razão do 
princípio da solidariedade, que fundamenta os deveres de assistência do pai aos filhos, bem 
como do filho ao pai, diante do disposto no art. 229 da CR/88, a transmissão hereditária visa 
proporcionar a propriedade do antecessor, segundo o princípio da afeição real ou presumida. 
(PEREIRA,2018)
14 
 
O direito sucessório relativo ao cônjuge sobrevivente perpassou por uma legislação 
inconstante e mutável até ser regulamentada pelo Código Civil de 2002, vigente até os dias 
atuais. A evolução do direito sucessório brasileiro se assemelhou muito, em matéria de 
vocação do cônjuge, ao direito português. E com o advento do CC/2002, por exemplo, 
permitiu ao cônjuge a posição de herdeiro necessário, sendo-lhe assegurada a legítima, além 
de ter alcançado direitos de extrema pertinência sob a égide da proteção constitucional às 
entidades familiares e seus membros. 
No que diz respeito ao companheiro, a sua sucessão obteve destaque nas disposições 
regulamentadas pelas leis n. 8.971 de 29 de dezembro de 1994 e n. 9.278 de 10 de maio de 
1996. O CC/2002, por sua vez, trouxe praticamente toda a matéria pertinente à vocação 
hereditária do companheiro disposta no artigo 1.790. 
Partindo da premissa de proteção às famílias interligada ao direito sucessório, essa 
pesquisa visa estudar sobre o tratamento desigual que foi atribuído ao cônjuge e ao 
companheiro sobrevivente no Código Civil de 2002, a fim de analisar se a distinção 
estabelecida possui fundamento plausível no ordenamento jurídico. 
O assunto se tornou emblemático e a principal discussão que se tornou pauta nos 
tribunais pátrios fora a indagação a respeito da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do 
CC/2002. O tema foi julgado pelo STF em sede de repercussão geral nos Recursos 
Extraordinários 646.721 e 878.694, sob relatoria dos Ministros Marco Aurélio e Luís Roberto 
Barroso respectivamente, obtendo, por maioria de votos decisão favorável à declaração de 
inconstitucionalidade do referido dispositivo legal. 
Entretanto, ainda que se considere o aludido artigo inconstitucional, continuarão 
existindo questionamentos sobre a sucessão do cônjuge e do companheiro de forma 
comparativa, tendo em vista que ao se declarar inconstitucional o referido artigo não se estará 
equiparando por completo o direito sucessório de ambos. Após a publicação dos acórdãos dos 
referidos recursos, houve ainda a interposição de embargos declaratórios suscitando clareza 
sobre a aplicação dos demais dispositivos que dizem respeito ao direito hereditário do cônjuge 
ao companheiro. Contudo, por unanimidade de votos, o STF rejeitou os embargos, não 
estendendo o julgamento à análise dos demais assuntos que diferenciam os direitos 
sucessórios de ambas as entidades familiares. 
A garantia do direito real de habitação ao companheiro bem como a sua colocação 
como herdeiro necessário e a reserva de quarta parte da herança são pontos que aparentam 
permanecerem nas linhas de discussões jurisprudenciais e doutrinárias, por exemplo. 
15 
 
 
Este estudo, portanto, objetiva aprofundar a análise sobre a possibilidade de 
equiparação dos direitos sucessórios do cônjuge e do companheiro, a fim de reduzirem ao 
máximo, a ponto até mesmo de findarem, as vastas discussões que permeiam o tema há tantos 
anos. 
Para tanto, serão analisados os principais autores que escrevem sobre a matéria, 
fazendo-se, também, uma busca jurisprudencial a fim de analisar a atual realidade jurídica 
brasileira no que diz respeito ao tema proposto. Primeiramente, será feita uma análise sobre o 
Direito de Família, apresentando as diferenças e similitudes entre o casamento e a união 
estável, seguindo de um estudo sobre a evolução do Direito das Sucessões, com ênfase no 
sistema brasileiro sucessório do cônjuge e do companheiro sobrevivente. 
Em seguida, o estudo adentrará em uma análise crítica apontando os problemas 
advindos do tratamento diferenciado que é atribuído ao cônjuge e ao companheiro no direito 
sucessório brasileiro, até a repercussão geral que chegou ao STF através dos Recursos 
Extraordinários aludidos, expondo partes dos votos dos Ministros e as consequências desses 
julgamentos. 
Por fim, serão apresentados os temas que se acredita que permanecerão sendo pontos 
de discussão entre os juristas mesmo após a decisão do STF sobre a inconstitucionalidade do 
artigo 1.790 do Código Civil de 2002. 
A pesquisa desenvolvida utilizou-se de uma abordagem metodológica dedutiva, 
através de métodos procedimentais comparativos e interpretativos, por meio de pesquisas 
bibliográficas em que foram analisadas informações contidas na doutrina e na jurisprudência 
brasileira. 
Dessa forma, o intuito é contribuir com a redução do acúmulo de demandas judiciais 
que trazem em seu bojo discussões comparativas sobre o direito sucessório do cônjuge e do 
companheiro, além de procurar preservar a segurança jurídica e as garantias fundamentais 
dispostas na própria Constituição da República, respeitando princípios constitucionais, 
almejando que a legislação pátria seja progressiva e que acompanhe a realidade fática vivida 
pela maioria dos brasileiros hodiernamente. 
16 
17 
 
 
 
2 CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL: DIFERENÇAS E SIMILITUDES 
 
 Considerada como a base fundamental da sociedade, a família pode ser considerada 
como uma das formações mais antigas e importantes da humanidade, pois o indivíduo por 
natureza tem necessidade em criar vínculos para a sua sobrevivência. Jacques Lacan (2002) 
traz interessante observação ao afirmar que: 
 
Entre todos os grupos humanos, a família desempenha um papel primordial na 
transmissão da cultura. Se as tradições espirituais, a manutenção dos ritos e dos 
costumes, a conservação das técnicas e do patrimônio são com ela disputados por 
outros grupos sociais, a família prevalece na primeira educação, na repressão dos 
instintos, na aquisição da língua acertadamente chamada de materna. Com isso, ela 
preside os processos fundamentais do desenvolvimento psíquico, preside esta 
organização das emoções segundo tipos condicionados pelo meio ambiente, [...]. 
(LACAN, 2002, p. 13) 
 
 A família primitiva era caracterizada por relações sexuais múltiplas envolvendo todos 
os membros do grupo (endogamia), de forma que essas relações impediam de estabelecer, 
com certeza, a paternidade, fazendo com que a filiação só pudesse ser contada pela linha 
feminina, de acordo com o direito materno. Passou-se, então, à monogamia, voltando-se a 
constituição da família através do relacionamento mantido entre um homem e uma mulher, 
por grande influência da religião. (ENGELS, 1984). 
 De acordo com os estudos apresentados por Friedrich Engels (1984), a família 
consanguínea foi a primeira etapa da família: 
 
Nela, os grupos conjugais classificam-se por gerações: todos os avôs e avós nos 
limites da família são maridos e mulheres entre si; o mesmo sucede com seu filho, 
quer dizer, com os pais e mães; os filhos destes, por sua vez, constituem o terceiro 
círculo de cônjuges comuns; e seus filhos, isto é, os bisnetos dos primeiros, o quarto 
círculo. (ENGELS, 1984, p. 37) 
 
 Essa primeira etapa foi substituída pela família punaluana, designação advinda do 
termo ―punalua‖ que significa companheiro íntimo. Nesse tipo de organizaçãofamiliar foram 
excluídos os irmãos carnais das relações sexuais recíprocas. Essa família, também, foi 
responsável por indicar certos graus de parentesco, apresentando as designações sobrinho, 
sobrinha, primo e prima. Em seguida, a família punaluana foi superada pela família 
sindiástica, que adotava o sistema matriarcal, uma vez que a poligamia e a infidelidade 
18 
ocasional eram permitidas aos homens, fazendo com que só fosse possível distinguir de 
maneira acertada a linha ascendente materna. (ENGELS, 1984). Após, houve a substituição 
pela família patriarcal, caracterizada pelo aumento de riquezas do homem que o fez repensar 
sobre se colocar em posição mais importante que a mulher. Isso, porque, como o sistema era 
matriarcal, com a morte do pai seus filhos não herdavam, recebendo somente o que fosse 
deixado pela mãe. O patriarcalismo surge então caracterizando o: 
 
Desmoronamento do direito materno, a grande derrota histórica do sexo feminino 
em todo o mundo. O homem apoderou-se também da direção da casa; a mulher viu-
se degradada, convertida em servidora, em escrava a luxuria do homem, em simples 
instrumento de reprodução. (ENGELS, 1984, p. 61) 
 
 Surge, então, a família monogâmica, desempenhando ―um papel de impulso social em 
benefício da prole, ensejando o exercício do poder paterno.‖ (VENOSA, 2018, p. 3). 
Em Roma, a religiosidade era o pilar da família, baseada no culto aos mortos por meio 
da adoração aos antepassados. Fustel de Coulanges (2009) em sua clássica obra ―A cidade 
antiga‖ aduz que ―a família antiga é uma associação religiosa, mais ainda do que uma 
associação natural‖ (COULANGES, 2009, p. 53) e que o princípio da família não estava no 
afeto natural, mas sim na comunidade do culto. O autor afirma que não foi a religião que criou 
a família, mas foi ela quem lhe concedeu normas e, por isso, os sentimentos naturais não 
importavam para fundamentá-la. No que diz respeito ao direito brasileiro, houve forte 
influência do Direito Romano na codificação e criação do Código Civil de 1916, que se 
caracterizava por um modelo de família patriarcal e hierarquizado. A união de pessoas com o 
intuito de procriar e formar patrimônio para garanti-lo aos herdeiros era o resultado da 
compreensão de família como unidade de produção à época da Revolução industrial, 
importando-se pouco com as relações de afeto, priorizando os valores patrimoniais. 
 No decorrer do tempo, os valores se modificaram e uma nova sociedade passou a ser 
arquitetada através das novas conquistas do homem e do avanço científico. Volta-se mais à 
garantia constitucional da dignidade do indivíduo, por meio de um modelo familiar 
descentralizado e igualitário, buscando acompanhar a realidade. Para Pietro Perlingieri: 
 
A família como formação social, como "sociedade natural", é garantida pela 
Constituição não como portadora de um interesse superior e superindividual, mas, 
sim, em função da realização das exigências humanas, como lugar onde se 
desenvolve a pessoa. A família é valor constitucionalmente garantido nos limites de 
sua conformação e de não contraditoriedade aos valores que caracterizam as relações 
civis, especialmente a dignidade humana: ainda que diversas possam ser as suas 
modalidades de organização, ela é finalizada à educação e à promoção daqueles que 
a ela pertencem. (PERLINGIERI, 2002, p. 243) 
19 
 
 
 
Como se percebe, a constituição da família se deu de forma espontânea no meio social, 
sendo posteriormente estruturada através do direito. A interferência estatal no âmbito familiar 
foi o ponto cerne que levou o legislador a se dedicar ao estudo das famílias e criar um ramo 
no direito totalmente dedicado a esse instituto. (DIAS, 2009). 
 Ocorre que, apesar da tentativa legislativa em manter-se em constante atualização 
sobre o tema, o legislador não consegue acompanhar de forma imediata a realidade social que 
é mutável e que leva consigo as inquietudes das famílias: 
 
A sociedade evolui, transforma-se, rompe com tradições e amarras, o que gera a 
necessidade de constante oxigenação das leis. [...] No entanto, a mais árdua tarefa é 
mudar as regras do direito das famílias. Quando se trata das relações afetivas – 
afinal, é disso que trata o direito das famílias -, a missão é muito mais delicada em 
face de seus reflexos comportamentais que interferem na própria estrutura da 
sociedade. (DIAS, 2009, p. 29) 
 
 Os princípios que regem o Direito de Família, diante da proposta da Constituição de 
1988, também remodelam esse ramo jurídico com frequência. É por isso que o Projeto de Lei 
que pretende instituir o Estatuto das Famílias (PL 470/2013) – projeto esse em que grande 
parte das ideias são capitaneadas pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) – 
prescreve em seu art. 5º que são princípios fundamentais ao Direito de Família “a dignidade 
da pessoa humana, a solidariedade familiar, a igualdade de gêneros, de filhos e das entidades 
familiares, a convivência familiar, o melhor interesse da criança e do adolescente e a 
afetividade.‖ (TARTUCE, 2017a, p. 6) 
 Estabelecer o que caracteriza uma família hodiernamente está muito além da estrutura 
convencional que por tanto tempo foi modelo na sociedade: aquela formada por pai, mãe e 
filhos. A família atual é baseada no conceito eudemonista, rompendo com os paradigmas 
clássicos, estando baseada na busca pela felicidade e solidariedade. ―Assim, enquanto houver 
affectio haverá família, unida por laços de liberdade e responsabilidade, e desde que 
consolidada na simetria, na colaboração, na comunhão de vida.‖ (LÔBO, 2017, p. 15). E o 
Direito, portanto, tende a acompanhar essa premissa, a fim de conseguir proteger as famílias 
de forma ampla, como ordena a Constituição da República de 1988. 
 O sistema jurídico, portanto, busca reconhecer e conceder proteção às relações 
familiares indiscriminadamente, ciente de que a família, no que tange aos seus referenciais, 
―funda-se [...] em sua feição jurídica e sociológica, no afeto, na ética, na solidariedade 
20 
recíproca entre os seus membros e na preservação da dignidade deles.‖ (FARIAS; 
ROSENVALD, 2017, p. 36) 
 Ao afirmar que o Direito se ocupa com a importância social da família, a fim de 
garantir a harmonia das relações sociais, é necessário entender, primordialmente, o que é 
família para, assim, formular o tratamento que lhe será destinado. Conforme asseveram 
Renata Barbosa de Almeida e Walsir Edson Rodrigues Júnior (2012): 
 
Em síntese, se a compreensão da família se condiciona ao ambiente social e o 
Direito pretende dispensar-lhe tutela válida, imperioso é que este se mostre atento às 
eventuais alterações de significado pelas quais a família pode passar. Nessa 
perspectiva é que se creem válidas a verificação e a avaliação de cada um dos 
entendimentos jurídicos sobre a família, constatados no decorrer dos tempos. Por 
meio dessa visão crítica deparar-se-á com certas incongruências do Direito pátrio, e, 
ainda, concluir-se-á, diante do vigente ordenamento jurídico, acerca de um conceito, 
ao menos contemporâneo, de família. (ALMEIDA; RODRIGUES JÚNIOR, 2012, p. 
2) 
 
 A família, ao longo da história, foi objeto de conceituações conforme lhe era atribuída 
a sua função, sendo ela religiosa, política ou até mesmo econômica. A estrutura, antes, 
patriarcal, conforme já observado, sobrepunha o poder masculino sobre o feminino, 
estabelecendo uma hierarquia rígida e baseada, principalmente, na religião. (LÔBO, 2017). 
 Como bem observam Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2017): 
 
Para os romanos, o casamento era um estado de fato, que produzia efeitos jurídicos. 
Paralelo a ele, existia também a figura do concubinatus, que consistia em toda união 
livre entre homem e mulher na qual não ocorresse a affectio maritalis, efeito 
subjetivo do casamento, que representava o desejo de viver com o parceiro para 
sempre. [...] 
Com a decadênciado Império Romano e o crescimento do Cristianismo, houve uma 
gradativa alteração do significado da família. [...] 
Fundada essencialmente no casamento, que, de situação de fato, foi elevado à 
condição de sacramento, tal modelo se tornou hegemônico na sociedade ocidental. 
(GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 55) 
 
 Se o objetivo era criar gerações que mantivessem as tradições, família passou a estar 
diretamente ligada ao casamento, por meio do qual a mulher se afastava da sua religião de 
origem para passar a fazer parte definitivamente da religião doméstica de seu esposo. A 
autoridade familiar se fundava no homem, por meio de uma estrutura altamente patriarcal e 
hierárquica. Foi esse o modelo que inspirou o Código Civil de 1916, obviamente contando 
com atualizações oriundas da evolução da própria sociedade da época, como, por exemplo, 
visando a perpetuação do patrimônio na família e não mais a veneração ao culto dos 
antepassados. Mas o que torna imperioso destacar é que a legislação brasileira focou em 
21 
 
 
considerar que a família se fundava estritamente no casamento e que seus membros tinham 
funções diversas sendo elas inferiores ou superiores conforme os valores da época. 
 Com o passar dos tempos o conceito de família foi se modificando de acordo com o 
avanço da sociedade e da diversificação dos valores, assumindo, hoje, uma concepção plural 
que diz respeito a indivíduos ligados por vínculos biológicos ou não, no intuito de estabelecer 
o desenvolvimento da personalidade de cada envolvido, formando-se a partir de três 
elementos considerados principais: estabilidade, afetividade e ostensibilidade. ―Família é o 
núcleo existencial integrado por pessoas unidas por vínculo sócioafetivo, teleologicamente 
vocacionada a permitir a realização plena dos seus integrantes.‖ (GAGLIANO; PAMPLONA, 
2017a, p. 49). Para Luiz Edson Fachin (2003): 
 
o ente familiar é um corpo que se reconhece no tempo. Uma agregação histórica e 
cultural como espaço de poder, de laços e de liberdade. Uma aliança composta para 
representar harmonia e paradoxos. Uma agremiação destinatária de projetos e de 
discursos, especialmente da alocução normativa, junção que encarna o elo entre o 
direito, a família e a sociedade [...]‖(FACHIN, 2003, p. 3) 
 
 O conceito de família vai trazer forte influência no direito sucessório, uma vez que as 
pessoas chamadas por lei a herdar são aquelas que compreendem o núcleo familiar. Assim 
como trará efeitos em outros institutos do Direito Civil, confirmando ser ela a ―célula social 
por excelência‖. (PEREIRA, 2017) 
 Base de sustentação do conceito de família na contemporaneidade é caracterizá-la 
como eudemonista, em que se busca garantir, principalmente, a felicidade de cada sujeito que 
dela faça parte. 
 Mister se faz compreender que a família assume diferentes funções a partir dos valores 
e circunstâncias de tempo e lugar, sendo um fenômeno que se mantém em um permanente 
processo de mudança e evolução: 
 
Ao mesmo tempo que é relação privada, é pública – cantada e decantada como base 
da sociedade. Família, um caleidoscópio de relações que muda no tempo de sua 
constituição e consolidação em cada geração, que se transforma com a evolução da 
cultura, de geração para geração. (GROENINGA, 2003, p. 125) 
 
 Norte de todo o ordenamento jurídico pátrio, a dignidade da pessoa humana é 
verdadeira cláusula geral de proteção do indivíduo, que traz consigo, dentro do texto 
constitucional, princípios como a igualdade, a solidariedade, a pluralidade das entidades 
familiares, a proteção da criança e do adolescente, a paternidade responsável, a isonomia dos 
22 
filhos e a tutela especial à família, todos relativos à família. Nas palavras de Guilherme 
Calmon Nogueira da Gama e Leandro dos Santos Guerra (2007, p. 128), a família ―deve ser 
protegida na medida em que atenda a sua função social, ou seja, na medida em que seja capaz 
de proporcionar um lugar privilegiado para a boa vivência e dignificação de seus membros‖, 
independentemente de qual seja a sua formação. 
 A partir da premissa de que a família existe em função de seus componentes, tem-se 
que a promoção da dignidade e a realização da personalidade de cada membro da família seja 
o intuito precípuo que o Direito tenha que garantir quando se volta à regulamentação desse 
instituto. 
Conforme asseveram Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2017, p. 33): 
―Dúvida inexiste de que a família, na história dos agrupamentos humanos, é o que precede a 
todos os demais, como fenômeno biológico e como fenômeno social, motivo pelo qual é 
preciso compreendê-la por diferentes ângulos.‖ Nesse sentido, passa-se, então, a um estudo 
sobre as diferentes espécies de família no direito brasileiro, atribuindo ênfase ao casamento e 
à união estável, observando as similitudes e diferenças existentes entre elas, no intuito de 
estabelecer uma base coerente para o ponto central do presente estudo. 
 
2.1 Espécies de Família 
 
 Faz-se necessário partir de uma visão pluralista de família, que abrange os mais 
diversos arranjos de relacionamentos que se fundam por um elo de afetividade, para entender 
que o modelo atual de família vai muito além do casamento. Pelo caput do artigo 226 da 
Constituição da República de 1988 (CR/88)
1
 percebe-se, sem questionamentos, que a família 
deve ser protegida pelo Estado de forma especial, tendo em vista ser considerada a base da 
sociedade. Nesse diapasão, segue o parágrafo 3º do referido artigo reconhecendo a união 
estável como entidade familiar, através do princípio da isonomia e o parágrafo 4º, atribuindo 
igual proteção às famílias constituídas por qualquer dos pais e seus descendentes. Como bem 
afirma Newton Teixeira Carvalho (2018a, p. 1), ―a Constituição de 1988 é inclusive, ou seja, 
preocupou com a camada da população que estava alijada do direito.‖ 
 
1
 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. 
§ 1º O casamento é civil e gratuita a celebração. 
§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. 
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade 
familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. 
§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus 
descendentes. 
23 
 
 
 Pode-se afirmar que o que conduziu este transcurso permitindo um abrigo 
constitucional à família plural fora o ―redimensionamento jurídico conquistado pela mulher e 
pela filiação, especialmente escudados no princípio da igualdade.‖ (FACHIN, 2003, p. 93). A 
partir dessa recepção de novos modelos sociais de condutas, garantir proteção às diversas 
arquiteturas familiares tornou-se constante intenção do legislador. 
 Entretanto, há que se reconhecer que tal proteção, hodiernamente, não se assenta 
somente nas formas de família prescritas em lei. Conforme entendimento de Cristiano Chaves 
de Farias e Nelson Rosenvald (2017), todas as entidades familiares formadas por seres 
humanos, baseadas na ética, no afeto e na solidariedade, ainda que não explicitamente 
elencadas na Constituição da República de 1988, devem ser admitidas pelo Direito das 
Famílias. 
 Nesse sentido também coaduna Paulo Luiz Netto Lôbo (2002) ao afirmar que: 
 
Não é a família per se que é constitucionalmente protegida, mas o locus 
indispensável de realização e desenvolvimento da pessoa humana. Sob o ponto de 
vista do melhor interesse da pessoa, não podem ser protegidas algumas entidades 
familiares e desprotegidas outras, pois a exclusão refletiria nas pessoas que as 
integram por opção ou por circunstancias da vida, comprometendo a realização do 
princípio da dignidade humana. (LÔBO, 2002, p. 46) 
 
 Dessa forma, verifica-se que o rol elencado no artigo 226 da CR/88 não é taxativo, 
mas exemplificativo, podendo-se considerarque no Direito das Famílias são admitidas todas 
as formas de agrupamento de indivíduos que se baseiam na afetividade e no conceito 
eudemonista. Nas palavras de Paulo Lôbo (2002, p. 55): "Os tipos de entidades familiares 
explicitamente referidos na Constituição brasileira não encerram numerus clausus. As 
entidades familiares, assim entendidas as que preencham os requisitos de afetividade, 
estabilidade e ostensibilidade, estão constitucionalmente protegidas [...]." Trata-se o referido 
artigo, portanto, segundo Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2017), de uma 
―cláusula de inclusão‖, pois ―são o cotidiano, as necessidades e os avanços sociais que se 
encarregam da concretização dos tipos.‖ (FARIAS; ROSENVALD, 2017, p. 73). 
 Também para Renata Barbosa de Almeida e Walsir Edson Rodrigues Júnior (2012), 
qualquer formação dita como familiar deve ser protegida pelo direito, sem exceção: 
 
Tornar efetivo o direito fundamental de constituir família requer, dentre outras 
providências, ao menos partir do pressuposto de que famílias possíveis são todas 
aquelas que forem eleitas autonomamente pelos envolvidos, sejam, ou não, já 
24 
conhecidas juridicamente. Lembre-se de que, para proteção de tal direito, é dever do 
sistema jurídico – instrumento estatal – não impedir, em princípio, quaisquer 
formações familiares. Mesmo na incerteza, há que se tender para o reconhecimento 
destas. O paradigma há de ser: in dubio pro familae. (ALMEIDA; RODRIGUES 
JÚNIOR, 2012, p. 62) 
 
O casamento foi o primeiro tipo de família constitucionalizado, por muito tempo 
considerado o único modelo familiar aceito. Divide hoje o espaço no artigo 226 da CR/88 
com a união estável e as famílias monoparentais, explicitadas no referido dispositivo legal, 
como já aludido. As famílias matrimoniais e a união estável serão analisadas de forma mais 
acurada em momento oportuno deste estudo, razão pela qual se passa ao exame das famílias 
monoparentais e às demais formas de família existentes atualmente. 
Estando expressa a sua proteção no §4º do artigo 226 da CR/88, são chamadas famílias 
monoparentais aquelas onde há somente a presença de um dos pais na titularidade do vínculo 
familiar e sua descendência. Têm, portanto, como principal característica, a unilinearidade, 
ressaltando a relação de parentesco em linha reta como formadora de uma entidade familiar. 
Conforme já aduzido, a Constituição da República de 1988 não limitou os tipos de 
família, tornando imperioso, então, apresentar alguns dos demais arranjos familiares que 
hodiernamente fazem parte do cotidiano social e que já são plenamente reconhecidas pela 
doutrina brasileira. 
Famílias recompostas, também chamadas de famílias reconstruídas, pluriparentais ou 
mosaico (DIAS, 2009), são aquelas formadas por uma multiplicidade de vínculos, fomentados 
pela dissolução de um relacionamento anterior e união de novos sujeitos que trazem consigo 
seu antigo arranjo familiar e, muitas das vezes, acabam tendo filhos em comum. Que se trata 
de um modelo de família admitido atualmente não se tem dúvidas; mas, apesar desse fato, é 
um assunto que provoca outras questões doutrinárias que o tema aqui proposto não permite 
aprofundar. Vale, no entanto, asseverar que o número de famílias recompostas além de 
extenso cresce mais a cada dia e vem trazendo consigo algumas mudanças no ordenamento, 
como a Lei nº 11.924/2009 que admitiu que o(a) enteado(a) pudesse pleitear em juízo a 
averbação do nome do padrasto ou madrasta, acrescendo o sobrenome desse ao seu. (LÔBO, 
2017) E em 2017, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou o Provimento nº 63 (em 17 
de novembro de 2017), que permitiu o reconhecimento da filiação socioafetiva diretamente 
perante o Cartório de Registro Civil, de maneira totalmente administrativa, desde que 
atendido os requisitos. Isso porque, com a recomposição das famílias, nasce, por muitas 
vezes, o interesse pelo reconhecimento da paternidade socioafetiva, além de trazer discussões 
25 
 
 
acerca da multiparentalidade, que inclusive foi tese de repercussão geral (Recurso 
Extraordinário 898.060). 
Comumente conhecido como concubinato adulterino, denomina-se hoje família 
simultânea à existência de um sujeito que mantém mais de um núcleo familiar. Conforme 
afirmam Renata Barbosa de Almeida e Walsir Edson Rodrigues Júnior (2012, p. 72): ―A 
matéria é recheada de conturbações, sendo, muitas vezes, motivo até de reações perplexas. 
Tudo isso porque a discussão remonta a um dos parâmetros sociais de maior carga dogmática, 
qual seja, o ideal da monogamia.‖ Inobstante todas as discussões que permeiam o assunto, o 
Direito não pode negar a existência dessas famílias excluindo-as do âmbito do direito das 
famílias e sucessório, pois são relações que já repercutem no mundo jurídico. (DIAS, 2009) 
De acordo com Sérgio Resende de Barros (2003) anaparental é a família constituída 
sem a presença dos pais. Maria Berenice Dias (2009) vai além, afirmando que a convivência 
familiar para resultar na entidade anaparental independe se os sujeitos que a ela façam parte 
sejam parentes ou não. Fato é que para constituir-se uma entidade familiar tal realidade 
necessita cumprir os requisitos gerais necessários: ―que as pessoas estejam juntas porque 
mantêm entre si laços de afeto e, sobretudo, que o façam com pretensões de estabilidade, da 
qual naturalmente decorrerá a ostensibilidade.‖ (ALMEIDA; RODRIGUES JÚNIOR, 2012, 
p. 75) 
As uniões homoafetivas hoje são indubitavelmente reconhecidas como entidades 
familiares, mas para tanto foi necessário um vasto e prolongado embate entre doutrina, 
jurisprudência e legislação. O ordenamento jurídico brasileiro sempre foi expresso em afirmar 
que família somente se constituía entre homem e mulher, ignorando a existência de inúmeros 
relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo, que preenchiam os requisitos de entidades 
familiares. Somente em 2011, pela ADI 4277, o STF decidiu que a união homoafetiva tratava-
se de espécie do gênero união estável; e em 2012, a partir do REsp 1183378, o STJ deliberou 
sobre a legalidade e constitucionalidade do casamento direto entre pessoas do mesmo sexo, 
deixando a união homoafetiva de ser considerada entidade familiar autônoma, passando a ser 
determinada como família matrimonial ou como uma união estável. (LÔBO, 2017) 
 As formas de família são, portanto, inesgotáveis. ―Tendo por epicentro o afeto e por 
centro o lar por ele constituído e mantido, os direitos humanos familiais – tanto o direito 
fundamental à família, quanto os direitos operacionais da família – não mais podem ser 
recusados a nenhuma forma de entidade familiar.‖ (BARROS, 2003, p. 154) A proteção, 
26 
portanto, deve ser ampla e acompanhar a evolução social atendendo aos anseios que ela 
despertar. 
 A fim de concluir a base da presente pesquisa, mister se faz expor uma sucinta 
apresentação sobre as duas formas de família que são os pilares da discussão ora apresentada: 
as famílias matrimoniais e as uniões estáveis. 
 
2.1.1 Famílias matrimoniais 
 
 Até 1889, com o advento da República e a laicização do Estado, somente era aceito 
como casamento aquele instituído pela forma religiosa, de maneira que o casamento civil 
apenas surgiu em 1891. (DIAS, 2009) O Código Civil de 1916 praticamente definiu como 
família o casamento, fazendo com que qualquer modelo de família fora dos parâmetros do 
casamento fosse considerada ilegítima e sequer recebia proteção estatal, projetando efeitos 
apenas no âmbito obrigacional. 
 A partir da Constituição de 1988 o próprio Estado reconheceu outras formas de família 
– artigo 226 e parágrafos da CR/88 – estabelecendo, também, a igualdade entre seus membros 
e rompendo por definitivo com a definição de casamento como sinônimo de família, passando 
a considerar família como gênero que abrange várias espécies de entidades familiares. 
O conceito de casamento por muito tempo foibaseado em uma definição que 
estabelecia a união entre homem e mulher apenas. Entretanto, conforme já aludido, tanto 
doutrina quanto jurisprudência já assentiram sobre a possibilidade de casamento entre pessoas 
do mesmo sexo, fazendo com que a definição do instituto, hoje, tenha por base a norma 
constitucional e a absoluta igualdade entre as pessoas humanas. Flávio Tartuce (2017) define 
casamento ―como a união de duas pessoas, reconhecida e regulamentada pelo Estado, 
formada com o objetivo de constituição de família e baseado em um vínculo de afeto.‖ 
(TARTUCE, 2017a, p. 47). Nesse sentido, também corroboram Cristiano Chaves de Farias e 
Nelson Rosenvald (2017): 
 
Pode-se dizer que o casamento é uma entidade familiar estabelecida entre pessoas 
humanas, merecedora de especial proteção estatal, constituída, formal e 
solenemente, formando uma comunhão de afetos (comunhão de vida) e produzindo 
diferentes efeitos no âmbito pessoal, social e patrimonial. (FARIAS; ROSENVALD, 
2017, p. 176) 
 
 Quanto à natureza jurídica do casamento ainda pairam divergências doutrinárias, 
existindo três teorias: teoria institucionalista, que se refere à natureza institucional do 
27 
 
 
casamento, ou seja, seria o casamento uma situação jurídica que, apesar de nascer da vontade 
das partes, reflete parâmetros pré-estabelecidos pelo legislador, recebendo da lei forma, 
normas e efeitos. (MONTEIRO, 2016); teoria contratualista, tratando o casamento com uma 
natureza puramente negocial, como um contrato de natureza especial, por se tratar de ato que 
decorre da vontade dos sujeitos. Tal teoria é defendida por Caio Mário da Silva Pereira (2017, 
p. 90) que ―considera o casamento um ‗contrato especial‘, dotado de consequências 
peculiares, mais profundas e extensas do que as convenções de efeitos puramente 
econômicos, ou ‗contrato de Direito de Família‘, em razão das relações específicas por ele 
criadas.‖; e para os doutrinadores que não concordam com nenhuma das duas teorias expostas 
em sua completude, como Flávio Tartuce (2017a), criou-se a teoria mista ou eclética, segundo 
a qual ―casamento é uma instituição quanto ao conteúdo e um contrato especial quanto à 
formação‖ (TARTUCE, 2017a, p. 49). 
 Para tanto, acredita-se ser mais adequado definir a natureza jurídica do casamento 
considerando-o ―um negócio jurídico sui generis, por se formar a partir do consenso dos 
nubentes e por ter efeitos ex lege e efeitos ex voluntade.‖ (ALMEIDA; RODRIGUES 
JÚNIOR, 2012, p. 95). Merece, portanto, a importante observação trazida por Cristiano 
Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2017): 
 
Parece-nos, via de consequência, que no alvorecer do século XXI, com a 
possibilidade de dissolução consensual do casamento em cartório, se tornaram 
despiciendas as discussões acerca da natureza jurídica do matrimônio, eis que o 
ordenamento jurídico brasileiro, de certo modo, confirma que a sua formação e a sua 
extinção dependem, fundamentalmente, da vontade das partes, o que é sinal 
indicativo indiscutível da sua natureza negocial. Naturalmente, trata-se de um 
negócio jurídico especial, de índole familiar, não se submetendo, diretamente, a 
todas as regras do direito contratual, em face de sua estruturação existencial. 
(FARIAS; ROSENVALD, 2017, p. 180) 
 
 Sobre as finalidades do casamento importante observar que, assim como seu conceito, 
trata-se de um tema que vem sofrendo constantes mudanças de paradigmas conforme a 
evolução da sociedade. Não cabe mais, por exemplo, falar-se em procriação como uma 
finalidade do casamento, uma vez que ter ou não ter filhos parte do livre planejamento 
familiar escolhido por cada casal, sendo inclusive assegurado pelo §7º do artigo 226 da 
CR/1988, de forma que é vedado ao Estado e às instituições privadas intervirem de forma 
coercitiva nesse planejamento. Nesse mesmo sentido também não são consideradas 
finalidades do casamento, como outrora, a legalização das relações sexuais, a atribuição do 
28 
nome ao cônjuge ou a reparação de erros do passado. Como Cristiano Chaves de Farias e 
Nelson Rosenvald (2017) afirmam, estabelecer comunhão de afetos pode ser considerada 
como a finalidade precípua do casamento, ou seja, é ter como base a autonomia privada para 
garantir o livre desenvolvimento de cada membro que faça parte da relação. 
 O Código Civil de 2002 disciplina o casamento no Subtítulo I, nomeado ―Do 
Casamento‖, dentro do Título I (Do Direito Pessoal) que por sua vez encontra-se disposto no 
Livro IV, Do Direito de Família. Entre os artigos 1.511 e 1.590 estão regulamentados os 
assuntos basilares sobre o casamento, como capacidade, impedimentos, procedimento de 
habilitação, formas de dissolução entre outros, o que demonstra o cuidado que teve o 
legislador ao tratar dessa entidade familiar na legislação pátria. 
 Dentre os assuntos relacionados à temática, mister se faz destacar sobre o regime de 
bens no casamento, que inclusive interfere diretamente no Direito Sucessório. Existem hoje 
expressamente contemplados no Código Civil brasileiro quatro regimes de bens: comunhão 
universal de bens, comunhão parcial de bens, separação de bens e participação final nos 
aquestos, estando dispostos entre os artigos 1.639 a 1.688 do referido códex. Entretanto, é 
permitido ao casal criar um regime por meio do pacto antenupcial, fazendo um regime misto 
utilizando mais de um dos elencados no Código Civil, ou até mesmo instituindo um novo não 
previsto em lei, conforme elucida o Enunciado 331 da IV Jornada de Direito Civil do 
Conselho da Justiça Federal: 
 
Art. 1.639. O estatuto patrimonial do casal pode ser definido por escolha de regime 
de bens distinto daqueles tipificados no Código Civil (art. 1.639 e parágrafo único 
do art. 1.640), e, para efeito de fiel observância do disposto no art. 1.528 do Código 
Civil, cumpre certificação a respeito, nos autos do processo de habilitação 
matrimonial. (Enunciado 331, IV JDC, CJF) 
 
 Dentre os regimes de bens tipificados na legislação pátria, a comunhão parcial de bens 
é a regra caso os nubentes não escolham o regime, sendo esse caracterizado pela repartição 
―entre três massas de bens: duas relativas aos bens próprios de cada cônjuge e uma aos bens 
comuns. Cada um deles compreende um ativo e um passivo.‖ (LÔBO, 2017, p. 316) A 
comunhão universal de bens compreende a união de todo o acervo patrimonial dos sujeitos 
existente tanto antes quanto após o casamento, de forma que, quando do fim da relação 
conjugal, todo o patrimônio é dividido igualmente entre os cônjuges. 
 Na separação de bens ―cada um é titular de seu próprio patrimônio, quer tenha sido 
adquirido antes ou na constância do casamento. Quando da separação nada há a dividir, e cada 
um ficará com os bens que lhe são próprios.‖ (DIAS, 2009, p. 208) 
29 
 
 
 A comunhão universal de bens se caracteriza pela universalidade patrimonial entre os 
consortes, de forma que todos os bens de cada um se agregam tornando-se uma única massa 
patrimonial. Essa comunhão, no entanto, não é absoluta, sendo alguns bens excluídos 
conforme apresenta o art. 1.668 do CC/2002. 
Pouco utilizado na prática, mas disposto no ordenamento jurídico pátrio, o regime de 
participação final nos aquestos consiste na conciliação da liberdade da separação de bens com 
a associação daquilo que é obtido de maneira lucrativa na constância do casamento, como 
ocorre na comunhão parcial. Trata-se de um regime de bens que sofre inúmeras críticas e 
questionamentos da doutrina em razão das dificuldades de sua implantação e aplicação de 
suas regras, mas não é um regime incompatível com a cultura brasileira. (ALMEIDA; 
RODRIGUES JÚNIOR, 2012) 
Sendo o casamento uma comunhão de vida, dele ―emergem efeitos pessoais e 
patrimoniais, estruturando-se conjunto de direitos e deveres informado pelos princípios da 
igualdade substancial e da direção diárquica da sociedade conjugal.‖ (FACHIN, 2003, p. 174) 
Numerosossão, portanto, os efeitos jurídicos do casamento, que podem ser divididos entre 
efeitos pessoais, que estabelecem direitos e deveres recíprocos entre os cônjuges; sociais, que 
indicam a projeção de consequências da relação conjugal para com a sociedade; e 
patrimoniais, que dizem respeito aos impactos econômicos decorrente das núpcias, estando 
inteiramente ligados aos regimes de bens escolhidos pelos consortes. (FARIAS; 
ROSENVALD, 2017) 
Feitas tais considerações a respeito das famílias matrimoniais, para rematar a fase 
introdutória da presente pesquisa, passa-se então à análise dos principais aspectos do 
reconhecimento da união estável como família no ordenamento jurídico brasileiro, para que 
haja, futuramente, uma averiguação comparativa de ambas as entidades e os reflexos no 
direito sucessório. 
 
2.1.2 O reconhecimento da União Estável no Direito Brasileiro como entidade familiar 
 
 Apesar de ainda ser assunto constante nas discussões entre juristas, a existência de 
uniões estáveis remonta desde sempre na história da humanidade. No direito romano, a união 
que não fosse matrimonial era considerada uma espécie de casamento inferior, denominado 
concubinato (latim: concubinatus - cum (com) e cubare (dormir)) (LÔBO, 2017), 
30 
nomenclatura essa até hoje utilizada, apesar da recepção do ordenamento jurídico atual quanto 
às famílias não matrimoniais. Conforme aduz Rodrigo da Cunha Pereira (2006, p. 223), ―a 
expressão 'concubinato' carrega consigo um estigma e um preconceito. [...] Historicamente, 
concubinato traduziu uma relação de 'menos-valia', menor, quase uma depreciação moral, 
principalmente para as mulheres.‖ Tal fato explica porque, inobstante a contemporaneidade e 
os avanços ocorridos, famílias não constituídas através do casamento ainda são tratadas de 
maneira inferior em certos aspectos. 
 No ordenamento jurídico brasileiro houve significativa demora em reconhecer a união 
estável como entidade familiar, pois a sociedade tão somente compreendia como família 
aquelas advindas do casamento. (BIRCHAL, 2008) Somente com o advento da Constituição 
da República de 1988 é que houve o reconhecimento da união estável como família, no §3º do 
artigo 226: 
 
A união estável, nomenclatura adotada a partir da redação dada ao §3º do art. 226, 
da CR/88, chegou a este status também como resultado da evolução dos costumes de 
parte do povo brasileiro que, por escolha, optou por ela e, também, pelos cidadãos 
que, por falta de opção (às vezes em estado de miséria), estão unidos em entidade 
familiar, sem a dispendiosa e complicada habilitação e celebração do casamento 
civil, pois que gratuita somente é esta última, sendo dispendioso o processo de 
habilitação (quase um salário mínimo, fora as taxas de certidões). (BIRCHAL, 2008, 
p. 120) 
 
 Compreendida, atualmente, como a convivência pública, contínua e duradoura entre 
duas pessoas naturais com o intuito de constituir família, os direitos dos companheiros foram 
paulatinamente sendo concedidos conforme as alterações ocorridas na jurisprudência e nas 
discussões doutrinárias. (WELTER, 1999) A união estável somente recebeu específica 
regulamentação normativa através das Leis 8.971/1994 e 9.278/1996, criadas logo após a 
Constituição de 1988. 
 Pela Lei nº 8.971/94, garantiu-se aos companheiros, entre outros, o direito a alimentos 
entre si e ao companheiro supérstite, em razão da extinção da união estável pela morte do 
outro, direito sucessório relativo à herança do falecido e direito à meação do patrimônio 
obtido pela colaboração das partes. Além disso, impôs como requisitos que os companheiros 
fossem solteiros, divorciados ou viúvos, que o relacionamento tivesse convivência mínima de 
cinco anos ou a existência de filhos. Em 1996 adveio a Lei nº 9.278/96, que alterou os 
pressupostos de constituição da união estável, além de incluir outros direitos e deveres aos 
companheiros, afastando a exigência temporal, mas sem fazer cessar a existência da lei 
anterior. 
31 
 
 
No Código Civil de 2002 essa espécie de família recebeu apenas cinco dispositivos 
específicos (artigos 1.723 a 1.727, CC/2002), o que demonstra que a iniciativa foi relevante, 
mas insuficiente: 
 
O atual Código Civil mesclou, nessa matéria, evoluções e retrocessos. Isso torna 
imperioso reiterar, uma vez mais, a necessidade de se tomar a Carta Magna, e seus 
respectivos princípios normativos, por parâmetro de coerência disciplinador, a fim 
de se prezar por uma exegese compatível com a qualidade familiar que a união 
estável tem e com as peculiaridades que lhe são inerentes. (ALMEIDA; 
RODRIGUES JÚNIOR, 2012, p. 280) 
 
O reconhecimento da união estável, hoje, não depende de coabitação, conforme 
entendimento disposto na Súmula 382 do Supremo Tribunal Federal e se da por livre e 
espontânea manifestação da vontade das partes, podendo a matéria ser discutida em ação 
judicial própria. Aplicam-se à união estável os mesmos impedimentos legais relativos ao 
casamento e, importante reassaltar, que é possível converter a união estável em casamento, 
conforme inclusive preceitua a legislação no §3º do art. 226 da CR/88. 
 Não tendo os companheiros adotado um regime de bens específico em contrato escrito, 
a relação é regida pela comunhão parcial de bens como regra, aplicando-se toda a legislação 
relativa ao casamento no que tange à matéria. Há, portanto, presunção legal de comunhão de 
bens adquiridos durante a união, não cabendo a discussão sobre a necessidade de prova do 
esforço comum, sendo a presunção legal absoluta. (LÔBO, 2017) 
Assim como ocorre no casamento, da união estável emanam-se consequências em 
campos diversos, trazendo efeitos de cunho patrimoniais e pessoais. No que tange aos efeitos 
pessoais, ―são aqueles mesmos existentes no espaço interno de qualquer outra relação 
familiar, dizendo respeito aos companheiros, nas relações entre si e para com a sociedade 
como um todo.‖ (FARIAS; ROSENVALD, 2017, p. 488) Obviamente, os efeitos pessoais da 
união estável, inobstante semelhantes aos do casamento, possuem ressalvas nos aspectos em 
que as referidas entidades familiares se distinguem legitimamente; como, por exemplo, não há 
presunção de paternidade de filhos nascidos na constância da relação convivencial. 
A respeito dos efeitos patrimoniais da união estável, há que se ressaltar que, as 
consequências que decorrem depois de extinta a relação por morte, são assuntos amplamente 
discutidos e que serão mais bem abordados nos capítulos subsequentes deste estudo. 
Importante salientar que a Ação Direta de Constitucionalidade (ADI) 4277 e a 
Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, foram resultados de um 
32 
grande avanço quanto ao reconhecimento das famílias homoafetivas como uniões estáveis, o 
que foi de grande valia para a garantia dos direitos fundamentais da dignidade da pessoa 
humana e da igualdade. Assim como é imperioso asseverar, também, a Resolução 175 do 
Conselho Nacional de Justiça de 14 de maio de 2013 que dispôs sobre casamento civil ou 
conversão da união estável em casamento de pessoas do mesmo sexo. 
Afora todo o progresso alcançado no que diz respeito à união estável no ordenamento 
jurídico brasileiro, um interessante paradoxo é levantado por Rodrigo da Cunha Pereira 
(2006) no tocante ao constante hábito de sempre tentar-se adequar a união estável aos moldes 
do casamento: 
 
Por mais que a união estável seja o espaço do "não-instituído", à medida que é 
regulamentada, vai ganhando contornos de casamento. Com isso, aos poucos, vai 
deixando de ser uma "união livre", como, aliás, muitas vezes denominada, para ser 
uma união "amarrada" às regras impostas pelo Estado. Esse é um paradoxo com o 
qual teremos de aprender a conviver: ao mesmo tempo em que não querermos a 
intervenção do Estado em nossas relações mais íntimas, buscamos sua interferência 
para lhe dar legitimidade e proteger a parte economicamentemais fraca. Com isso, 
aqueles que não querem se adequar às formalidades e regras do casamento civil 
ficam sem alternativa, pois a regulamentação da união estável está cada vez mais 
próxima à de um casamento. (PEREIRA, 2006, p. 229) 
 
 Entretanto, cabe asseverar que o que se pretende com esse hábito constante é garantir a 
tais famílias as mesmas proteções e garantias existentes às famílias matrimoniais. Não se 
pretende igualar casamento a união estável, até mesmo porque existem diferenças legítimas 
que os diferenciam substancialmente. Mas naquelas questões em que não existem 
fundamentos plausíveis que justificam o tratamento discriminatório, é necessário debater e 
procurar equiparar, sob o risco de ferir prontamente princípios basilares dispostos na 
Constituição da República. 
De acordo com dados estatísticos do IBGE, a população brasileira atualmente vive 
majoritariamente em famílias convivenciais, por meio da união estável. 
 
As estatísticas mostram um acentuado crescimento e até mesmo a superação 
numérica de relacionamentos estáveis em detrimento do casamento civil, e estudos 
sociais e jurídicos apontam diversas causas tidas como responsáveis pelo constante 
crescimento das famílias informais e, não obstante a importância desse crescimento 
das entidades familiares informais, mas que cada vez mais estão se formalizando por 
meio de contratos escritos de uniões estáveis, e do ponto de vista legal ainda seguem 
em vigor gritantes diferenças entre as duas principais famílias constitucionais, do 
casamento e da união estável. (MADALENO, 2016, p. 8) 
 
Partindo da premissa de que a afetividade é um dos princípios basilares da família, a 
finalidade da união estável é bastante similar, senão idêntica à finalidade do casamento. A 
33 
 
 
família eudemonista, que busca valorizar os interesses afetivos e existenciais entre seus 
integrantes, ganha constantemente espaço maior nos entendimentos recentes, fazendo com 
que casamento e união estável sejam, ao mesmo tempo, tão próximas e tão distantes em suas 
particularidades. 
 
2.2 Principais semelhanças e diferenças legítimas entre casamento e união estável 
 
Diante da pluralidade familiar reconhecida pela Constituição de 1988 resta claro que 
não é somente o casamento que é reconhecido como família no direito brasileiro, mas 
inúmeras outras formas de uniões entre indivíduos que se unem no intuito de promover o 
desenvolvimento de seus membros, compartilhando experiências e fazendo realçar a liberdade 
de escolha e a dignidade da pessoa humana em suas relações. A própria Constituição procura 
proteger as famílias indistintamente, justamente por ter como fundamentos principais um 
ideário liberal, solidário igualitário e democrático, que deve ser aplicado a todo ordenamento 
jurídico. (VELOSO, 2010) 
Na comparação entre casamento e união estável percebe-se uma quantidade 
significativa de semelhanças, mas com algumas diferenças substanciais e extremamente 
pertinentes ao Direito. 
O casamento pode ser considerado o modelo de família mais bem protegido e 
disciplinado pela lei, certamente por ser, historicamente, a forma mais tradicional de se 
constituir família. É caracterizada por uma grande quantidade de formalidades que devem ser 
observadas para que possa ser considerada válida. Já a união estável, por sua vez, é a união 
livre entre pessoas cuja convivência seja pública, continua e duradoura, com o intuito claro de 
constituição de família, não necessitando de qualquer formalidade para a sua configuração. 
Diante das transformações que a sociedade vem sofrendo, uma similaridade entre 
casamento e união estável é o fato de que, para configuração dessas famílias, não se exige que 
tenham filhos ou que precisem viver sob o mesmo teto. É opção particular das partes 
envolvidas o planejamento da vida em comum no que diz respeito à filiação e à moradia em 
conjunto ou não. 
Os impedimentos matrimoniais dispostos no art. 1.521 do CC/2002 são também 
aplicáveis à união estável, conforme preceitua o §1º do art. 1.723 da mesma legislação. Maria 
Berenice Dias (2014), em sentido contrário, assevera que não se devem estender tais 
34 
impedimentos à união estável, pois essa entidade familiar padece de atuação estatal para se 
concretizar, tendo a sua existência condicionada ao mundo fático, não necessitando de 
intervenção do Estado para impor impedimentos como o faz com o casamento. 
Dentre os deveres recíprocos entre o casal, assim dispõe Código Civil de 2002: 
 
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges: 
I - fidelidade recíproca; 
II - vida em comum, no domicílio conjugal; 
III - mútua assistência; 
IV - sustento, guarda e educação dos filhos; 
V - respeito e consideração mútuos. 
 
Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de 
lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos. 
(BRASIL, 2002). 
 
Sem adentrar na seara de cada um dos deveres mencionados e a necessidade de 
estarem expostos na legislação vigente, percebe-se que entre o casamento e a união estável 
buscou o legislador assemelhar uma entidade familiar da outra. Ainda que disposto que, para 
os cônjuges, exista o dever de fidelidade recíproca, para o companheiro existe o dever de 
lealdade. E de acordo com o dicionário da língua portuguesa Silveira Bueno (2007), ao se 
procurar o significado de fidelidade, encontra-se como sendo sinônimo de lealdade. Logo, 
diante da equivalência conceitual de ambas as palavras, pode-se se afirmar que de fato há sim 
muito mais semelhanças que diferenças. 
Sobre a escolha do regime de bens, tanto no casamento quanto na união estável, se não 
há uma escolha expressa das partes sobre algum regime específico, a lei dispõe que será 
regido pela comunhão parcial de bens. 
Casamento e união estável encontram seus fundamentos em princípios e características 
comuns, tendo na essência mais conteúdos de aproximação que de divergência. Hoje, com o 
conceito eudemonista de família, cujo afeto é o pilar de sustentação de toda proteção jurídica 
aos membros que dela façam parte, pode-se afirmar que muitos são os pontos de congruência 
dos aspectos relativos a ambas as entidades familiares. 
Estabelecer os principais pontos de divergência entre casamento e união estável acaba 
por transmitir certa complexidade, na medida em que coloca interesses antagônicos no mesmo 
patamar: o princípio da proteção às famílias e a necessidade de tratamentos distintos ante a 
natureza de cada entidade familiar. 
Entre as principais diferenças legítimas existentes entre casamento e união estável, 
cabe apontar a formalidade e informalidade na constituição de cada uma dessas famílias, a 
35 
 
 
eficácia erga omnes do regime de bens, a presunção legal de paternidade e, principalmente, os 
impactos sucessórios desse tratamento desigual, que serão abordados separadamente neste 
momento. 
 
2.2.1 A definição dos marcos de constituição e dissolução 
 
 O casamento tem como característica a solenidade, sendo estabelecido através de ato 
formal, por meio de registro civil e é dissolvido, conforme preceitua o art. 1.571 do CC/2002, 
pela morte, divórcio, separação, anulação ou nulidade do casamento. Gera, portanto, um 
documento hábil e capaz de certificar o marco inicial da relação, instituindo imediatamente a 
família, tão logo cumpridas as formalidades constitutivas. 
Já a união estável, ao contrário, para comprovar o seu marco inicial, necessita 
preencher os requisitos estabelecidos no art. 1.723 do CC/2002 para que tenha seu 
reconhecimento deferido juridicamente. Ainda que exista um contrato de convivência, tal 
documento se presta a ―estipular regras patrimoniais específicas para nortear os efeitos 
patrimoniais da relação.‖ (FARIAS; ROSENVALD, 2017, p. 508). Logo, a eficácia do 
contrato de convivência fica condicionada à presença dos demais requisitos constitutivos da 
união estávelpara caracterizar a existência da entidade familiar. 
Dessa forma aduz Paulo Lôbo (2017): 
 
Ao contrário do casamento que tem início em ato jurídico certo e público, a união 
estável, relação jurídica derivada de estado de fato, apresenta reais dificuldades em 
identificá-la. O termo inicial é importante tendo em vista que os deveres dos 
companheiros promanados de suas relações pessoais e patrimoniais dependem deles 
para sua exigibilidade. Desde quando há os deveres de lealdade e assistência Desde 
quando os bens adquiridos por qualquer dos companheiros ingressaram na 
comunhão? (LÔBO, 2017, p. 166) 
 
Assim, a partir do registro civil o indivíduo atesta seu estado civil de casado a 
terceiros, diferentemente da união estável, que, mesmo o companheiro possuindo um contrato 
de convivência, não será possível gerar efeitos erga omnes, além de permitir questionamentos 
sobre a real existência da união estável a qualquer momento. (RODRIGUES JÚNIOR, 2014). 
Verifica-se, portanto, que, naquilo que depender de comprovação da data inicial da 
união, esta não será possível assimilar às normas que regem o casamento. As diferenças entre 
ambas as entidades familiares, nesse aspecto, estão justamente no fato de que, na essência, o 
36 
casamento possui uma prova pré-constituída, um documento capaz de comprovar sua 
existência, ao contrário da união estável que necessita se subsumir a requisitos e evidenciar 
esses marcos por outros meios para reconhecer e dissolver o relacionamento. Esse fato 
implicará diretamente certos efeitos jurídicos distintos entre essas famílias. 
 
2.2.2 A vênia conjugal 
 
 Dentre as determinações expressas no Código Civil (BRASIL, 2002) a respeito do 
casamento, o artigo 1.647 é claro em dizer que, sem autorização do outro (salvo no regime de 
separação absoluta), nenhum dos cônjuges pode ―I - alienar ou gravar de ônus real bens 
imóveis; II – pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III – prestar fiança ou 
aval; IV – fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam 
integrar futura meação.‖ (BRASIL, 2002). Trata-se da figura jurídica originalmente conhecida 
por ―outorga uxória‖, que atualmente é comumente chamada de ―vênia/autorização conjugal‖. 
 Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2017a, p. 318) definem a vênia 
conjugal como ―a manifestação de consentimento de um dos cônjuges ao outro, para a prática 
de determinados atos, sob pena de invalidade.‖ Com o casamento e, consequentemente, a 
escolha pelo regime patrimonial, nascem efeitos sociais aos indivíduos que interferem, 
inclusive, nas relações com terceiros. Assim, no que diz respeito ao casamento, conforme 
aludido, dependendo do regime de bens adotado, certos atos só podem ser praticados com a 
autorização do outro cônjuge, sob o risco de anulação. 
 Caso um dos cônjuges se negue ou esteja impossibilitado de conceder a vênia, caberá 
ao juiz suprir essa outorga. E, conforme preconiza o art. 1.649 do CC/2002, se nem mesmo o 
juiz suprir a falta de autorização quando necessária, o ato praticado tornará anulável e o outro 
cônjuge poderá pleitear a anulação, até dois anos após terminada a sociedade conjugal. 
 No que diz respeito à união estável, a necessidade do consentimento do companheiro 
para a prática dos atos descritos no art. 1.647 do CC/2002 não é matéria pacífica. Para Paulo 
Lôbo (2017) as exigências do referido artigo devem ser estendidas à união estável, tendo em 
vista que a expressão ―no que couber‖ do art. 1.725 (―Na união estável, salvo contrato escrito 
entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da 
comunhão parcial de bens.‖) (BRASIL, 2002), que inclui a exigência de outorga entre as 
regras do casamento que são aplicáveis à união estável. Para esse autor, a falta de autorização 
do companheiro prejudica o ato e enseja a sua anulação. O terceiro de boa-fé que se sentir 
lesado em razão da ―omissão do estado civil de companheiro em união estável do alienante, 
37 
 
 
tem contra este, além da pretensão de devolução do que pagou, pretensão à indenização por 
perdas e danos.‖ (LÔBO, 2017, p. 171) 
 Para uma segunda corrente, essa outorga pode ser exigida tão somente no casamento, 
―por se tratar de norma restritiva de direitos que não comporta interpretação extensiva ou 
analogia.‖ (TARTUCE, 2017a, p.). Walsir Edson Rodrigues Júnior (2014) também aponta 
sobre a inconveniência de se possibilitar a anulação do negócio jurídico em detrimento do 
terceiro de boa-fé por gerar insegurança e até mesmo inviabilizar novos negócios jurídicos. 
Nessa mesma linha Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves de Farias (2017), que inclusive 
aduzem que, por não existir na união estável qualquer documento público capaz de gerar os 
mesmos efeitos de um registro de casamento, não se pode garantir proteção a terceiros de 
eventuais prejuízos. 
 Como a união estável não compreende formalização constitutiva não é razoável exigir 
que terceiros tenham conhecimento da sua existência e a necessidade dessa autorização para 
viabilizar o negócio jurídico. Essa é, portanto, uma das diferenças entre casamento e união 
estável que pode ser considerada necessária, por ser uma diferença externa, em relação a 
terceiros e que gera efeitos à sociedade de forma geral. ―A relação convivencial é informal, 
não solene, não podendo estar marcada pelas formalidades típicas do casamento‖ (FARIAS; 
ROSENVALD, 2017, p. 342) e ao terceiro de boa-fé não se pode impor a incumbência de ter 
ciência da existência de uniões estáveis. 
 
2.2.3 A presunção legal de paternidade 
 
 Presumem-se do marido os filhos concebidos na constância do casamento, conforme 
preconiza o art. 1.597 do CC/2002: 
 
Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos: 
I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência 
conjugal; 
II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por 
morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento; 
III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; 
IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, 
decorrentes de concepção artificial homóloga; 
V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia 
autorização do marido. (BRASIL, 2002) 
 
38 
 A discussão se inicia, entretanto, quando surge o questionamento acerca da aplicação 
dessa regra à união estável. Isso porque, no que diz respeito ao casamento, há uma prévia 
comprovação da existência da relação conjugal capaz de sugerir que o filho concebido na 
constância do casamento é fruto do casal. Com a certidão de casamento é possível identificar 
se a presunção de paternidade deve ou não ser aplicada no caso concreto. Não havendo uma 
prova pré-constituída da família, não há como aplicar a presunção por total falta de controle 
jurídico para tanto. 
 A união estável, conforme já aludido, não possui um registro público que comprove 
seu marco inicial e, ainda que os companheiros tenham feito contrato de convivência, esse se 
presta tão somente como um dos meios de provas para demonstrar a existência da união. 
Dessa forma, a princípio, aplicar a tais entidades familiares o dispositivo em questão poderia 
resultar em prejuízos patrimoniais a supostos pais de relacionamentos que sequer foram 
devidamente reconhecidos. 
 Todavia, parte da doutrina defende a aplicação da presunção legal de paternidade a 
ambas as entidades familiares, baseando-se no texto constitucional que determina a proteção 
do Estado às famílias e a proibição de tratamento discriminatório entre filhos: 
 
Ao aplicar a presunção de paternidade somente no casamento, está o Código Civil 
criando duas diferentes categorias de filhos: os filhos de pessoas casadas (que gozam 
de presunção e podem exigir, automaticamente, os seus direitos decorrentes

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