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Anemias
Lavínia Vasconcellos Patrus Pena 2022
2022
Anemia = redução da [] de hemoglobina (Hb) e/ou massa eritrocitária, com variações de acordo com idade, sexo, raça e altitude em relação ao nível do mar
Em geral, limiar para definição de anemia = Htc ou Hb abaixo de 2 DV da média da população normal 
Anemia fisiológica do lactente (período entre 6 meses-2 anos de idade em que a criança apresenta fisiologicamente o nível + baixo de Hb) -> suplementação de ferro até 24 meses
Epidemiologia:
· ~2 bilhões de pessoas no mundo com anemia
· 27-50% da população afetada pela deficiência de ferro 
· Anemia ferropriva
· 60% dos casos em todo o mundo 
· Brasil: problema de saúde pública
· 2006: 20,9% de anemia nas crianças de 6-59 meses, sendo que na Região NE ocorreu a maior frequência (25,5%) 
· 2009: prevalência 53% nos 6 meses a 5 anos
· 2020: 18,9% em lactentes 
· Metanálise de 2021: prevalência estimada de 33% em crianças brasileiras, saudáveis e < 7 anos 
· Anemia falciforme e talassemia β: África equatorial e bacia do Mediterrâneo 
· Brasil: imigrantes dessas regiões -> composição étnica de cada região 
Fisiopatologia 
Sangue
· Tecido conjuntivo líquido -> sistema vascular
· Reticulócito -> precursor da hemácia 
Índice reticulocitário: funcionamento da medula óssea 
Índices hematimétricos
	Volume corpuscular médio (VCM)
	80-100 fL
	Hemoglobina corpuscular média (HCM)
	Conteúdo médio quantitativo de hemoglobina, sua [] em uma hemácia – hipocromia ou hipercromia
	27-33 pg
	[] de hemoglobina corpuscular média (CHCM)
	[] média de hemoglobina por RBC (contagem de glóbulos vermelhos)
	31-36%
	Coeficiente de variação do volume da hemácias (RDW)
	Diferença entre o tamanho da maior hemoglobina e da menor
	11-15%
Hemoglobina
· Transporte do O2 dos pulmões aos tecidos (eritrócitos transportam CO2 dos tecidos para os pulmões)
· Captação e liberação do O2: temperatura, pH, [] de CO2, quantidade de 2,3 DPG (proteína facilitadora da liberação de O2)
Compensação: aumento do débito cardíaco, aumento do líquido do espaço extravascular para o intravascular e redistribuição do fluxo sanguíneo para órgãos vitais
Classificação
Fisiológico
· Alterações na produção efetiva dos eritrócitos
· Taxa de produção diminuída
· Distúrbios com destruição ou perda de eritrócitos 
Morfológico: baseado VCM
· Microcíticas (VCM abaixo do normal para sexo e idade)
· Macrocíticas (VCM acima do valor esperado para sexo e idade) 
· Normocítica (VCM dentro dos valores) 
Diagnóstico
História e exame físico: prematuridade, doenças prévias, dieta, icterícia, ingestão de drogas, verminose, alergia, dores esqueléticas e história familiar (consanguinidade, origens geográfica e étnicas, história de esplenectomia, condição socioeconômica)
Idade
· RN: perda sanguínea, isoimunização, anemia hemolítica congênita ou infecção congênita
· Prematuros: desenvolvimento precoce de deficiência de Fe, anemia detectada entre 3-6º mês sugere hemoglobinopatia
· Causas adquiridas de anemia + prováveis nas crianças de + idade, especialmente ferropenia
Sexo
· Algumas causas de anemia hereditária ligadas ao cromossomo X
· Deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD) 
Dieta
· Pobre em Fe, B12, ácido fólico e outros oligoelementos sugerem anemia carencial
· Leite de vaca antes do 1º ano de sugere deficiência de ferro -> aumenta possibilidade de micro sangramentos intestinais levando uma perda sanguínea que leva a uma anemia
· História de pica, geofagia ou pagofagia sugere deficiência de Fe 
Aparecimento de manifestações se relaciona com velocidade e intensidade de instalação, idade em que ocorre e curva de dissociação do O2 da hemoglobina
Maioria das crianças com anemia leve não apresenta sinais ou sintomas
· Algumas crianças com sinais/sintomas inespecíficos: palidez das mucosas (pouca sensibilidade em predizer anemia leve, mas tem boa correlação com a anemia grave), fadiga, cansaço, anorexia e irritabilidade
Sintomas: icterícia, aumento do fígado, baço e linfonodos, petéquias e púrpuras
Hemograma e contagem de reticulócitos: exames + úteis para avaliação inicial do paciente com anemia
Avaliação quantitativa 
Hematócrito (Ht) pode estar reduzido por anticoagulante: desidratação dos eritrócitos
· Gravidez, IR, IC e podem levar à redução do Ht
[] da Hb dosada por método colorimétrico ou espectrofoto métrico (resultado expresso em g/dL)
Hematimetria (contagem de eritrócitos) feita por método automático -> resultado preciso
VCM avalia o tamanho médio do eritrócito, e seu resultado é expresso em picogramas
CHCM representa [] média de Hb por eritrócito, com resultado expresso em mg/dL ou %
Amplitude de variação no tamanho das hemácias (RDW) tem VR = 11,5 a 14,5% -> dentro da normalidade nos traços alfa e beta talassêmico e encontra-se aumentado na deficiência de Fe
Reticulócitos mostram o número de eritrócitos imaturos
· Contagem de reticulócitos corrigida: 
· Aumento quando produção de eritrócitos está elevada e reduzida nas anemias hipoproliferativas
· VR variam com a idade
Avaliação morfológica 
Macrocitose (aumento de volume dos eritrócitos): insuficiência hepática, hipotireoidismo, deficiências de vitamina B12 e de ácido fólico, mielodisplasia e aplasia de medula óssea
Microcitose (redução de volume dos eritrócitos) ocorre em doenças crônicas
· Associada à hipocromia: pode estar relacionada a síndromes talassêmicas, anemias sideroblástica e ferropriva
Anisocitose: presença de macro e microcitose simultaneamente -> não apresenta especificidade diagnóstica
Policromasia: presença de eritrócitos jovens com DNA citoplasmático que se coram de azul: anemias hemolíticas
Poiquilocitose: variação do formato do eritrócito
Esferócitos: eritrócitos de tamanho pequeno, com forma esférica e hipercromático
· Podem ser vistos na esferocitose e em anemias hemolíticas autoimunes
Eliptócitos/ovalócitos: eritrócitos de forma elíptica que podem estar presentes em eliptocitose, anemias carenciais, talassemias e, + raramente, em outras anemias
Estomatócitos: artefato e raramente têm significado clínico -> estomatocitose e doenças hepáticas
Drepanócitos: eritrócitos em forma de foice -> presentes na AF
Esquizócitos: fragmentos de eritrócitos de tamanhos diferentes e formas bizarras -> ocorrem nas próteses valvulares ou vasculares, na SHU, em grandes queimados, na CIVD
Inclusões: observadas no interior das Hm, relacionadas a várias doenças e causadas por alterações na eritropoiese
· Presença depende também da capacidade do baço de retirar da circulação as Hm
· Principais inclusões que podem estar presentes nas hemácias: 
· Anel de Cabot: figura em forma de anel constituída por filamento fino que resulta de restos mitóticos de mitoses anômalas -> presente nas anemias megaloblásticas e nas mielodisplásicas 
· Corpúsculos de Howel-Jolly: pequeno, basófilo, formado por restos nucleares de mitoses anômalas
· Esplenectomizados com anemia hemolítica ou anemia megaloblástica
· Indicam hipofunção esplênica ou asplenia
· Pontilhado basófilo: são agregados de ribossomos remanescentes, vistos como granulações variáveis em número e tamanho -> presente nas talassemias, na intoxicação pelo chumbo e em defeitos enzimáticos
· Corpúsculo de Heinz: precipitados de Hb desnaturada que podem ser encontrados aderidos a membrana das hemácias -> presente na deficiência de G6PD, hemoglobinopatias e nas anemias hemolíticas por medicamentos 
Outros exames a serem considerados
Avaliação da hematopoese (mielograma e biopsia de medula), de defeitos da membrana (fragilidade osmótica), da reserva de Fe (ferritina), do Fe circulante (Fe sérico, CLTF, IST), de defeitos enzimáticos (dosagens de enzimas eritrocitárias)
Dosagem de B12 e ácido fólico 
Pesquisa genética (suspeita de aplasia congênita de medula, como a anemia de Fanconi), de defeitos da Hb (eletroforeses), de anticorpos (Coombs direto e indireto), de infecções congênitas (principalmente em < de 6 meses de idade), de sangue oculto nas fezes, de sangramentos em TGI e TGU e de disfunções hormonais (TSH, T4 livre e hormônios sexuais)
Testes de função renal ehepática
Sorologias específicas: vírus de Epstein-Barr e parvo vírus B19
Anemias microcíticas
Anemia ferropriva
Desde o pré-natal: deficiência de ferro com repercussões importantes e deletérias de longo prazo no desenvolvimento de habilidades cognitivas, comportamentais, de linguagem, capacidades psicoemocionais e motoras das crianças, prejudicando crescimento e sistema imunológico na infância e na adolescência
Problemas odontológicos 
Impacto negativo permanece mesmo após o tratamento precoce por décadas
Alta prevalência mundial -> problema de saúde pública 
+ impactados: vulnerabilidade social, gestantes e crianças < 2 anos de idade 
Fe = metal + presente no corpo e participa de todas as fases da síntese proteica e dos sistemas respiratórios, oxidativos e anti-infecciosos do organismo
· Maior parte proveniente do próprio sistema de reciclagem de hemácias
· Pequena parte proveniente da dieta: 
· Fontes vegetais ou inorgânicas (ferro não heme: 2-10%) -> sofre intensa influência de no seu processo absortivo -> absorção do ferro não heme presente na dieta é influenciada por: 
· Quantidade (ferro não heme tem um limite de reabsorção)
· Consumo na mesma refeição de alimentos contendo fatores 
· Facilitadores ou inibidores da absorção do ferro 
· Estado de saúde e estado nutricional de ferro do indivíduo 
· Carne e ovos (ferro heme: 20-30%) -> com regulagem própria e independente de ação de mecanismos inibidores ou facilitadores da dieta
Mecanismo da anemia ferropriva:
· Diminuição dos inibidores da absorção de ferro: fitatos (legumes, arroz e grãos), polifenóis (grãos, ervas como o orégano e vinho tinto), achocolatados, chás, cafés e refrigerantes 
· Cálcio: conflitante -> alto: inibe 
· Aumento dos facilitadores da absorção de ferro: ácido ascórbico, vitamina A Forma heme (carnes e vísceras) 
Fatores de risco 
Baixa reserva materna: gestações múltiplas com pouco intervalo entre elas, dieta materna deficiente em ferro, perdas sanguíneas, não suplementação de ferro na gravidez e lactação, doenças crônicas
Aumento da demanda metabólica: prematuridade e baixo peso ao nascer (< 2.500g), lactentes em crescimento rápido (VC > p90), meninas com grandes perdas menstruais, atletas de competição 
Diminuição do fornecimento: clampeamento do cordão umbilical < 1 minuto de vida, AME prolongado (> seis meses), alimentação complementar com alimentos pobres em ferro ou de baixa biodisponibilidade, consumo de leite de vaca antes de 1 ano (após: limita a 500ml/dia), consumo de FI com baixo teor de ferro ou quantidade insuficiente, dietas vegetarianas sem orientação profissional adequada, ausência ou baixa adesão à suplementação profilática
Perda sanguínea: traumática ou cirúrgica, hemorragias gastrintestinal, ginecológica, urológica, pulmonar, discrasias sanguíneas, malária
Má absorção do ferro: síndromes de má absorção (doenças celíaca e inflamatória intestinal), gastrite atrófica
Diagnóstico
SBP recomenda rastreio com 12 meses de idade independente de fatores de risco ou sintomas
· Considera que a profilaxia está sendo feita com suplementação de ferro
Suspeita baseada na presença de fatores de risco: investigação precoce realizada, especialmente na ausência de profilaxia adequada com ferro, por:
· Hemograma + ferritina + PCR 
· Seguir propedêutica de acordo com resultados 
Rastreio da deficiência de ferro: componente importante no acompanhamento da saúde durante a adolescência 
Adolescentes devem ser avaliados, pelo menos 1x/ano, quanto aos fatores de risco para deficiência de ferro, especialmente para aqueles com baixo consumo de ferro na dieta, perda de sangue menstrual intenso ou história de anemia
Triagem laboratorial deve ser realizada se quaisquer fatores de risco importantes forem identificados
Tratamento 
Orientação nutricional para o consumo de alimentos ricos em ferro
Reposição de ferro por via oral: dose terapêutica 3-6 mg/kg/dia de ferro elementar, dose única ou fracionada
· Por 6 meses ou até normalização
· Alta biodisponibilidade, 1h antes das refeições com fonte de vitamina C 
· Efeitos adversos (35-55%): náuseas, vômitos, gosto metálico, pirose, dispepsia, plenitude ou desconforto abdominal, diarreia e obstipação
· Depende do tipo de ferro usado
Tratamento de casos graves ou refratários
· Reposição parenteral de ferro
· Transfusão sanguínea -> hemoglobina < 5g/dl ou sinais de descompensação cardíaca
Prevenção 
Gestantes e lactantes até o 3º mês pós-parto: suplementação com ferro via oral 
Aleitamento materno exclusivo e prolongado 
Introdução de alimentos complementares: aumento do consumo de alimentos fontes de ferro 
Não fornecer leite de vaca até 1 ano de idade
Prevenção por suplementação no lactente 
Anemia de doenças crônicas
2ª causa + prevalente nos pacientes com anemia
1ª causa em pacientes internados ou com doença crônica 
Ativação imune e inflamação: infecção crônica, doenças autoimunes, neoplasias, DRC, ICC, doença pulmonar crônica, obesidade 
Talassemias 
Anemia clínica e laboratorialmente semelhante à ferropriva, mas não responde tratamento com ferro
Mutações: Beta ou Alpha
Redução ou ausência na síntese de 1 ou + cadeias de globina
Sintomas +/- graves: fadiga, irritabilidade, atraso no crescimento, falta de apetite, deficiência do sistema imunológico 
Diagnóstico diferencial
	
	Anemia ferropriva
	Talassemia
	Anemia doença crônica 
	VCM 
	↓
	↓
	↓ de 20-30% 
	Fe sérico 
	↓
	Normal ou ↑
	↓
	Ferritina 
	↓
	Normal ou ↑
	Normal ou ↑
	CTLF 
	↑
	Normal 
	↓
	Saturação 
	↓
	Normal ou ↑
	>15% 
	Ferro medular 
	Ausente
	Presente 
	Presente 
	↑ de Hb A2, F, H 
	Ausente
	Presente 
	Ausente 
Anemias normocíticas
Membranopatias congênitas, hemoglobinopatias, enzimopatias, defeitos metabólicos, destruição imunomediada 
Reticulócitos: função da medula óssea
Anemias hemolíticas por defeitos intrínsecos das hemácias
Anemia das doenças crônicas
Outras: perda sanguínea aguda, hiperesplenismo etc. 
Aumento da destruição dos eritrócitos por: anemias hemolíticas adquiridas, causas imunológicas (auto ou aloimunes) drogas, infecções (malária), agentes químicos e físicos e outras doenças (nefropatias)
Manifestações clínicas: palidez, icterícia, hepatoesplenomegalia, litíase biliar (hemólise crônica)
Manifestações laboratoriais: anemia, reticulocitose, aumento de bilirrubina indireta e da LDH
Esferocitose: anemia hemolítica + comum por defeito na estrutura da membrana celular
· História Familiar positiva (80% dos casos)
· Anemia, hemólise, reticulocitose, icterícia e esplenomegalia
· Alterações do hemograma e curva de fragilidade osmótica 
Deficiência de G6PD: herança ligada ao X
· Crises de hemólise aguda -> estresse oxidativo
· Icterícia neonatal + intensa e/ou prolongada
· Hemograma, reticulócitos e avaliação da atividade enzimática
Anemia falciforme
Doença hereditária (HbSS) + comum no Brasil 
Falcização das hemácias -> fenômenos vaso-oclusivos 
Teste do pezinho (desde 1998 -> 3.500 crianças /ano)
Clínica: palidez, desnutrição, icterícia, asplenia, esplenomegalia, litíase biliar 
Anemia com reticulocitose, hemácias em foice 
Eletroforese de Hb: predomínio da Hb S
Situações de urgência/emergência: crise álgica (dor e edema), síndrome torácica aguda, acidente vascular cerebral, priapismo e sequestro esplênico 
Tratamento
· Auto cuidado
· Centro de referência: Hemominas
· Toda a medicação necessária SUS
· Hidroxiureia (redução em 68 a 84% das crises) + Quelantes orais + ATB profilático 
Tratamento das crises: analgésicos, antibiótico, oxigenoterapia, hidratação, transfusão de sangue 
Anemias macrocíticas
Incomum em crianças
Megaloblásticas: deficiência de vitamina B12 e ácido fólico 
Não megaloblásticas: mielodisplásicas, hepatopatias crônicas, anemias hemolíticas, anemia aplásica 
Anemia megaloblástica
Eritropoiese ineficaz -> disfunção do metabolismo do DNA, em que há prejuízo na divisão celular 
Exames iniciais: 
· Hemograma: anisocitose, neutrófilos hipersegmentados
· Leucopenia e plaquetopenia
· Reticulócito: normal ou diminuído
· Aumento de LDH e Bb indireta
Diagnóstico: dosagem de vitaminaB12, ácido fólico e metabólitos (homocisteína e ácido metilmalônico)
Tratamento: mudança alimentar e reposição de B12 e ácido fólico 
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