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AULA 5 PLANEJAMENTO E SUSTENTABILIDADE URBANA Profª Tharsila Maynardes Dallabona Fariniuk 2 INTRODUÇÃO O acesso universal ao abastecimento de água e ao saneamento básico se refere ao sexto Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da ONU, e deve ser um elemento de muita atenção das gestões em todo o mundo. Nessa aula, discutiremos a questão da gestão dos recursos hídricos no Brasil, em face ao processo de planejamento e gestão urbana. No tema 1, discutiremos sobre a oferta de água nos municípios brasileiros. Traçaremos um panorama sobre o abastecimento de água nas regiões brasileiras e conversaremos também sobre o que significa a insegurança hídrica. Serão também apresentados pontualmente alguns mecanismos para a gestão hídrica local. No segundo tema, falaremos sobre a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), promulgada no ano de 1997 e em contínuas revisões desde então. Estudaremos os princípios essenciais dos planos e também as perspectivas para a revisão dos Planos que está sendo formulada para o horizonte 2022-2040. No tema três, abordaremos um panorama sobre a questão do saneamento básico no Brasil, e refletiremos sobre as assimetrias no atendimento a municípios de todas as regiões, o que está diretamente relacionado às capacidades da gestão pública. Falaremos também sobre o Plano Nacional de Saneamento Básico e demais normativas. No tema quatro, abordaremos a questão do impacto das mudanças climáticas sobre o meio ambiente e sobre a gestão hidrológica e sanitária, algo que está diretamente relacionado com a qualidade de vida das pessoas e com o processo de planejamento urbano. Falaremos também sobre a Política Nacional de Mudanças Climáticas e sobre as diretrizes de adaptação nacional frente aos novos desafios desses setores urbanos. Por fim, no quinto e último tema, abordaremos a questão da inovação em CT& I na gestão hidrológica e sanitária, e estudaremos algumas oportunidades de adoção de novas estratégias nesse processo, bem como áreas promissoras de pesquisa científica. Boa aula, bons estudos! 3 TEMA 1 – A OFERTA DE ÁGUA NOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS Quais regiões do país sofrem mais com a insegurança hídrica? Como se dá a utilização da água em nosso país? Nesse tópico, vamos traçar um panorama sobre o abastecimento de água no Brasil, bem como entender um pouco mais sobre o processo de gestão dos recursos hídricos a nível local. 1.1 Panorama do abastecimento de água no Brasil O Brasil possui 8 grandes bacias hidrográficas; a disponibilidade hídrica se deve principalmente às características de irrigação de grandes rios por todo o território, bem como à variedade climática que ocorre durante o ano em todas as regiões. A chuva é o elemento mais relevante para a manutenção da vazão dos rios e a consequente captação pelos sistemas de abastecimento. Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA, 2020), que regulamenta a gestão de recursos hídricos no Brasil –, até 2020, havia 4466 massas d´água registradas no território, sendo a maior parte delas destinadas para irrigação e para hidroeletricidade (Figura 1). O monitoramento do volume de água disponível ocorre também nas estações fluviométricas e pluviométricas que compõem a Rede Hidrometereológica Nacional (RNH). Figura 1 – Quantidade de reservatórios (massas d´água) do país, divididos por função Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base em ANA, 2020. A demanda por utilização de água no Brasil é maior justamente para fins de irrigação, além do abastecimento urbano. A indústria e o uso animal representam também porções consideráveis do consumo anual de m³. Embora a 4 utilização para fins rurais (agricultura e pecuária) seja bastante significativa, é no meio urbano que aparecem as maiores disparidades e desequilíbrios da utilização da água. E podemos iniciar essa reflexão observando a quantidade de pessoas de possui ou que não possui acesso à água potável por sistema de distribuição, conforme mostra a figura a seguir. Figura 2 – Percentual da população sem acesso à rede de abastecimento de água, por região Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base em Instituto Trata Brasil, 2021a. * Dados relativos a 2018. Essa consideração é muito importante para falarmos de como é importante o processo de gestão dos recursos hídricos de modo equilibrado no processo de planejamento urbano. Garantir a disponibilidade de água em quantidade suficiente é o que chamamos de segurança hídrica. A segurança hídrica demanda: • Atendimento suficiente para as necessidades humanas; • Atendimento suficiente para exercer as atividades econômicas; • Atendimento que permita conservar os ecossistemas aquáticos; • Atendimento que equilibre a dinâmica entre períodos de secas e de cheias. 1.2 Gestão local para demanda de água A demanda de água em uma sociedade é um fator endógeno (interno), que depende de fatores exógenos (externos), conforme apresenta a figura 3. 5 Figura 3 – Fatores determinantes para o consumo de água Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base em Instituto Trata Brasil, 2020. A insegurança hídrica pode ser combatida por meio de ações de planejamento, em médio e longo prazo, e/ou por ações emergenciais, de reação imediata ao desequilíbrio. Um resumo das ações para combate à insegurança hídrica nos municípios pode ser visualizado no Quadro 1. Quadro 1 – Ações de combate à insegurança hídrica Tempo Tipo de ação Descrição Longo Prazo Soluções estruturantes Investimento em infraestrutura e legislação Planejamento por prioridades de uso Planejamento em mais longo prazo, considerando demandas territoriais Médio Prazo Alocação negociada Articulação institucional e setorial Regulamentação das operações Legislação e regulamentações Curto Prazo Restrição ou suspensão de uso Medidas extremas de rodízio e/ou revezamento para utilização dos recursos Soluções paliativas Soluções pontuais e/ou paliativas Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base em ANA, 2020. 6 E o que esperar para o futuro? Os estudos do Instituto Trata Brasil (2020) nos 100 maiores municípios brasileiros indicam que a demanda por água vai aumentar consideravelmente no Brasil até o ano de 2040. Estima-se que, devido à expansão demográfico e ao crescimento econômico, a demanda irá crescer em 25% nesse período, o que é maior do que a soma do consumo de água em todo o estado de São Paulo no ano de 2017, por exemplo. Na prática, isso indica que precisaríamos de três unidades extras do Sistema Cantareira apenas para dar conta da demanda adicional de água em 2040. Saiba mais Para saber mais sobre a classificação dos corpos d´água no Brasil, consulte a Resolução CONAMA n. 357 de 2005. TEMA 2 – PLANO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS (PNRH) A Política Nacional de Recursos Hídricos foi determinada pela Lei n. 9.333 de 1997, a chamada “Lei das águas” – quando também foi criado o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (Brasil, 1997). Após essa data, foram feitas diversas atualizações na legislação, considerando também novas demandas e novos entendimentos sobre comunidades sustentáveis. 2.1 Panorama da PNRH A PNRH de 1997 possui quatro macro objetivos, sendo eles: 1. Assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos; 2. A utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável; 3. A prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais; 4. Incentivar e promover a captação, a preservação e o aproveitamento de águas pluviais. 7 Figura 4 – Instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos de 1997Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, a partir de Brasil, 1997. Em 2006, foi aprovada a resolução n. 58/2006 que criou o Plano Nacional de Recursos Hídricos, com o intuito de orientar a gestão, em caráter permanente de construção, de participação popular (baseado na gestão urbana democrática) e de atuação multidisciplinar, envolvendo toda uma rede de instituições das três esferas de poder e de diversos níveis hierárquicos. Ao ser promulgado, o Plano visava traçar um panorama da situação de recursos hídricos no Brasil, considerando o cenário até o ano de 2020 para elaboração de programas e metas. Planos de recursos hídricos Diagnóstico da situação dos recursos hídricos, com base em análises de expansão territorial e populacional; Balanço entre disponibilidades e demandas e metas de racionalização do uso de água Classificação dos corpos de água Classificação segundo os usos preponderantes, a fim de assegurar medidas e mais qualidade e de combate à poluição Outorga do direito de uso de água Assegurar o controle quali e quantitativo do uso de água Derivação, captação e distribuição, aproveitamento de potencial energético Cobrança pelo uso da água Reconhecimento e valorização da água como bem econômico e social Incentivo ao uso racional do recurso Financiamento da infraestrutura e programas que compõe o PNRH Sistema de informações sobre recursos hídricos Banco de dados para a gestão e acesso à informação Descentralização da informação e integração dos sistemas Atualização permanente dos dados para acesso a todos os cidadãos 8 No período entre 2006 e 2020, foram realizadas revisões nas metas e objetivos dos planos, em observância às novas demandas por recursos hídricos. O PNRH 2016-2020, revisão mais recente publicada pelo Ministério do Desenvolvimento Regional (2021), possui 16 prioridades que podem ser sintetizadas nas seguintes ideias principais: • Planejamento de longo prazo para uso racional e conservação das águas; • Aprimorar a disponibilidade dos recursos hídricos; • Propor ações para áreas vulneráveis e mitigação de ocorrências extremas (secas, inundações etc.); • Ampliar o acesso à informação e o conhecimento sobre recursos hídricos e fortalecer a participação social nos processos decisórios; • Integração das políticas hídricas com as políticas de saneamento e setoriais. Saiba mais Para conhecer com mais detalhes cada uma das 16 prioridades, visite a página do Ministério do Desenvolvimento Regional. Disponível em: <https://www.gov.br/mdr/pt-br/assuntos/seguranca-hidrica/plano-nacional-de- recursos-hidricos-1/analise-global-da-implementacao-do-pnrh>. Acesso em: 11 ago. 2021. 2.2 O novo PNRH: 2022 a 2040 Desde 2020, ano em que se encerraram as metas do primeiro Plano promulgado em 2006, começou a se alinharem as metas para os próximos 20 anos. São fatores que interferiram na elaboração das diretrizes: • A vulnerabilidade climática (tema sobre o qual trataremos ainda nesta aula); • Crescimento da demanda e intensificação de conflitos pelo uso da água; • Crescimento da poluição hídrica; • Demandas por novas alternativas de oferta de água; • Demanda por aprimoramento na infraestrutura hídrica (ANA, 2020). Uma das premissas do novo plano – em processo de preparação entre os anos de 2020 e 2021 – é a promoção da integração entre as normativas e diretrizes já estabelecidas em outros níveis: 9 Figura 5 – Premissa de integração de planos: horizonte 2040 Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, a partir de ANA, 2020. A autora Elizabeth Borelli (2020) comenta que uma questão importante a ser observada no futuro é a outorga do direito de uso dos recursos hídricos. A legislação ainda é incipiente no que diz respeito à gestão integrada de todo o ciclo da água, especialmente em termos de alternativas de reaproveitamento da água e de proteção dos ecossistemas. Nas palavras da autora: São poucas e incipientes as iniciativas decorrentes de políticas públicas para fomentar o reuso de águas residuárias, como parte de estratégia e instrumentos de saneamento ambiental e gestão sustentável de águas. A escassez hídrica em algumas regiões do país proporcionou algumas oportunidades para iniciativas isoladas, por corporações diversas (indústrias, estabelecimentos comerciais e condomínios residenciais) para reuso de águas pluviais, mas será necessário se avançar na promoção do reuso seguro de águas residuárias domésticas, industriais e agrícolas. (Borelli, 2020, p.10, grifo nosso) TEMA 3 – PANORAMA DO SANEAMENTO NAS CIDADES BRASILEIRAS A história do saneamento no Brasil se inicia nos períodos colonial e imperial, com a instalação das primeiras estruturas para abastecimento de água e coleta de esgoto. Ainda hoje, séculos depois, percebem-se assimetrias no atendimento do saneamento básico em municípios de todo o Brasil, o que nos revela muito sobre capacidade de gestão pública e necessidades de atualização e aprimoramento constante. Nesse tópico, traçaremos um panorama sobre esse aspecto. 3.1 O acesso ao saneamento no Brasil O saneamento básico é um ciclo composto de 7 etapas, algumas das quais já estudamos em nossa disciplina. Em aulas anteriores, falamos sobre tratamento 10 de resíduos sólidos; nessa aula, já conversamos sobre a gestão dos recursos hídricos. Dessa forma, vamos destacar agora alguns aspectos específicos sobre esgotamento sanitário. Figura 6 – Ciclo do Saneamento Básico Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base em de Instituto Trata Brasil, 2018. O acesso ao esgotamento sanitário no Brasil pode ser sintetizado em 4 tipologias, sendo elas: a) A rede geral de esgoto ou pluvial (alternativa mais adequada); b) Fossas sépticas; c) Fossas rudimentares; d) Destinação em valas ou corpos hídricos (Ministério do desenvolvimento urbano, 2019). No Brasil, ainda há diversos municípios que sofrem com problemas de esgotamento sanitário, com pouca ou nenhuma estrutura para a condução adequada dos dejetos. Isso fica ainda mais visível em locais onde há esgotos a céu aberto, tornando insalubres as áreas habitacionais e prejudicando os ecossistemas hídricos. O acesso à rede de coleta de esgoto ainda não é universalizado no país; em determinadas regiões do país, a problemática é mais 11 intensa. O déficit em saneamento é calculado a partir da dinâmica entre pessoas que tem ou não acesso à rede coletiva de esgoto, categorizadas, ainda, entre o recebimento adequado ou inadequado dos serviços ou, ainda, o não recebimento (não atendimento) de tais serviços (Ministério do desenvolvimento regional, 2019). A figura 7 apresenta o percentual da população sem acesso à rede, o que nos provoca múltiplas reflexões sobre assimetrias sociais, sobre processos de gestão e sobre implementação de infraestruturas. Figura 7 – A insalubridade dos esgotos a céu aberto Crédito: Guentermanau/Shutterstock. Figura 8 – Percentual da população sem acesso à rede de coleta de esgoto, por região Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base em Instituto Trata Brasil, 2021a. * Dados relativos a 2018. 12 Por outro lado, vale ressaltar também que, segundo levantamento anual do Instituto Trata Brasil com os 100 maiores municípios brasileiros (2021b), no ano de 2021, diversos municípios se destacaram na avaliação de indicadores do saneamento básico, como, por exemplo, Nova Iguaçu (RJ), Santo André (SP) e os municípios de Curitiba, Londrina, Maringá, Cascavel e Ponta Grossa, no Paraná. Alguns municípios do estado do Pará, tais como São João do Meriti, Ananindeua e Santarém, figuram como os com avaliação mais crítica, com menos de 5% de atendimento total de esgoto nas condições adequadas. 3.2 Plano Nacional de Saneamento Básico e demais normativas No Brasil, temos diretrizes normativas para o saneamentobásico, orientadas pela Lei n. 11.445 de 2007, que criou o Comitê Interministerial de Saneamento Básico, e que foi atualizada pela Lei n. 14.026 de 2020. Essa legislação atualiza até algumas prerrogativas da Lei n. 6.766/79, que infere sobre o parcelamento de solo urbano. Isso nos indica a importância da questão do saneamento para o planejamento do espaço urbano. A legislação define os seguintes instrumentos de gestão do saneamento básico: • Planejamento: para orientação das ações da prestação adequada de serviços; • Regulação: para normatizar o padrão de qualidade dos serviços e a metodologia de cálculo de tarifas e taxas; • Fiscalização: para acompanhar a qualidade e o desempenho dos serviços públicos; • Prestação de serviços: o atendimento em si, adequado às demandas da comunidade; • Controle social: Acesso à informação, representação e participação na política de saneamento urbano. No ano de 2019, foi publicado o PLANSAB (Plano Nacional de Saneamento Básico), que apresenta diversas diretrizes para os horizontes de 2023 e de 2033. Esse plano é complementado por planos setoriais e municipais. Entre as diretrizes do PLANSAB, está a implantação de um módulo de gestão municipal dentro das hierarquias do SINISA (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento), o que descentraliza a adoção de medidas e volta o olhar para iniciativas mais 13 pontuais, por meio de diagnósticos e ações locais. Além disso, o PLANSAB prevê a coleta de esgoto de 93% dos domicílios brasileiros em áreas urbanas até 2023. TEMA 4 – O IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS NA GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS E SANEAMENTO Os efeitos das mudanças climáticas não geram apenas desastres naturais; eles estão relacionados diretamente com o acesso aos recursos hídricos e com o equilíbrio dos sistemas de drenagem e de saneamento. Ou seja, inferem sobre a qualidade de vida das pessoas e sobre o processo de planejamento urbano. 4.1 Efeitos das mudanças climáticas A preocupação com aquecimento global não é algo totalmente recente; alguns pesquisadores acreditam que já havia traços dessa preocupação desde o século XIX. Porém, apenas no final do século XX, especialmente a partir dos anos 90, que a temática ganhou mais força nos debates mundo afora. No Brasil, essa questão passou a fazer parte das políticas públicas apenas na década de 2000, principalmente após a promulgação do Estatuto da Cidade, definido pela Lei n. 10.257/2001, que estabeleceu algumas diretrizes para sustentabilidade na gestão democrática urbana. As mudanças climáticas ocorrem devido à pressão sobre o meio ambiente, incluindo fatores como a expansão urbana sem planejamento, a existência de ilhas de calor e a pouca permeabilidade do solo. Embora o impacto imediato seja sobre o meio ambiente em si, há também muito impacto sobre a sociedade, e são justamente as camadas mais vulneráveis e menos favorecidas da população que sofrem os maiores efeitos das mudanças climáticas. Figura 9 – Algumas consequências das mudanças climáticas 14 Fonte: elaborado pela Fariniuk, 2021, a partir de Iberdrola, [S.d.]. No Brasil, a captação de água depende fundamentalmente do regime de chuvas e vazão dos rios. Dessa maneira, as mudanças climáticas afetam especialmente o processo de abastecimento no país e, por outro lado, afetam a vazão dos rios, causando problemas de inundações e desequilíbrios nos sistemas de esgotamento sanitário. Figura 10– Enchente Crédito: Narongpon Chaibot/Shutterstock. Especificamente no caso dos recursos hídricos e do saneamento básico, podemos elencar os seguintes impactos das mudanças climáticas. Quadro 2 – Impactos das mudanças climáticas na gestão de recursos hídricos e saneamento 15 Fator Consequência Elevação das temperaturas na atmosfera e nos oceanos Alteração nos índices de umidade do ar, intensificando eventos críticos como chuvas intensas e/ou secas prolongadas Aumento da evaporação e mudança no padrão de circulação de ventos Menor disponibilidade hídrica e aumento da demanda por água. Aumento da temperatura das águas e vazão mais baixa Redução da qualidade da água e poluição mais acentuada nos corpos hídricos Intensificação de chuvas Alagamentos e deslizamentos causados pela alta vazão de várzeas e pela impermeabilização do solo Prolongamento de secas e estiagens Risco de colapso nos sistemas de abastecimento de água Elevação do nível do mar Penetração de água salina nos lençóis e sistemas de abastecimento urbanos Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base em Veiga et al., 2019. 4.2 Política Nacional de Mudanças Climáticas Em 2009, foi estabelecida a Lei n. 12.187 (Brasil, 2009), que instituiu uma normatização específica para mitigação das mudanças climáticas e criou o PNA (Plano Nacional de Adaptação), que, entre outras premissas, fornece as diretrizes relacionadas à gestão de recursos hídricos. Figura 11 – Adaptação na gestão de recursos hídricos frente às mudanças climáticas 16 Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base em MMA, 2016, e Veiga et al., 2019. TEMA 5 – INOVAÇÃO E TECNOLOGIA NA GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS E SANEAMENTO A todo momento, surgem novas tecnologias, cada vez menores e mais sofisticadas, e é importante que as gestões municipais aproveitem de maneira estratégica esse potencial tecnológico, inclusive na gestão hidrológica e sanitária. Vamos estudar algumas dessas oportunidades de aplicação e também áreas de interesse na pesquisa de CT&I. 5.1 Oportunidades de inovação na gestão hidrológica e sanitária Abastecimento urbano •Integração dos recursos hídricos com demais setores urbanos •Dinâmica disponibilidade x disponibilidade •Racionalização do uso e qualidade das águas Irrigação •Planos de contingência •Melhoria do monitoramento de previsibilidade sobre a disponibilidade de água para irrigação Energia •Aumento da capacidade de reservação •Integração entre reservatórios •Soluções locais para geração de energia complementar Indústria •Investimento em fontes alternativas de energia, uso racional e reuso de água •Tecnologias para redução de poluentes em corpos hídricos •Planos de contingência para eventos hidrológicos extremos Qualidade da água e do meio •Monitoramento sistemático qualidade da água e do meio •Planos de segurança, controle e vigilância •Investimentos na recuperação de APPs e no tratamento de efluentes 17 Essa área da gestão municipal pode se beneficiar de estratégias inovadoras em três níveis: a) Pela utilização da estratégia em si, em processos de planejamento e produtos; b) Por meio de inovação em nível institucional, em processos de mudança de cultura organizacional; c) Com a adoção de tecnologias propriamente ditas, tais como sensores, placas, drones e ferramentas de medição, fiscalização e monitoramento (da qualidade das águas, das vazões, das infraestruturas etc.). Além disso, há múltiplas oportunidades de inovação na área, conforme apresenta a figura a seguir: Figura 12 – Oportunidades de inovação na gestão hidrológica e sanitária Controle de perdas nos sistemas de abastecimento Economia do recurso água Reaproveitamento dos recursos Recuperação de redes envelhecidas Micro e macromedição de sistemas de abastecimento Substituição ou adoção de equipamentos hidráulicos de baixo consumo Aprimoramento de normas técnicas Estratégias de CT&I para padrões de desempenho e certificações Educação para a economia Reutilização de água de esgotos domésticos após tratamento para fins não potáveis (irrigação, proteção contra incêndio etc.) Reaproveitamento em processos industriais de resfriamento, proteção de vapor etc. Coleta de água da chuva Redução da poluição difusa de origem Inovações no sistema de esgotamento sanitárioTecnologias para captação e consequente Diagnósticos de relação chuva-vazão Tecnologias para operação independente 18 diminuição da pressão sobre os recursos locais Simulações de captação para relação demanda x disponibilidade Mitigação de redução dos resíduos sólidos nos sistemas de drenagem pluvial Tecnologias compensatórias de drenagem pluvial entre redes pluviais, fluviais e de esgotamento Modelagem matemática para avaliação de efetividade dos sistemas Capacitação técnica para operação e manutenção dos sistemas Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base em Nascimento; Heller, 2005. É importante considerar que todas essas estratégias se iniciam por processos de pesquisa e diagnóstico. E são múltiplas as oportunidades de pesquisa em CT&I no Brasil nessa área, das quais destacamos algumas (aproveite essa menção para identificar potenciais de pesquisa que você pode realizar futuramente): • Sustentabilidade hídrica de regiões semiáridas; • Gestão urbana integrada de recursos; • Impacto das mudanças climáticas na gestão de recursos hídricos; • Prevenção e controle de eventos extremos; • Metodologias de avaliação da qualidade da água e comportamento dos sistemas; • Capacitação de recursos humanos na área; • Infraestruturas, inovação e tecnologias (Tucci; Cordeiro, 2004). 5.2 Desafios em CT&I na gestão municipal hidrológica e sanitária Todo processo de quebra de paradigmas e de adoção de novas estratégias envolve uma série de desafios; na gestão municipal voltada para inovações na área hidrológica e sanitária, não é diferente. Segundo o material da Confederação Nacional dos Municípios (2015), alguns desafios da gestão municipal na implementação de novas estratégias são: 19 • Capacitação profissional (interna, inclusive); • Arranjos políticos, institucionais e burocráticos; • Cultural: reação organizacional frente às mudanças; • Apropriação e aceite das novas estratégias pela população; • Criação de ambiente de ideias e não de insegurança. O PLANSAB, em sua versão atualizada de 2019, elabora cenários para política de saneamento e gestão hídrica no Brasil, colocando cinco eixos condicionantes a serem considerados no futuro: Figura 13 – Eixos condicionantes para o futuro da política hídrica no Brasil Fonte: elaborado por Fariniuk, 2021, com base PLANSAB, 2019. A questão da inovação na gestão municipal será ainda abordada futuramente, em nossa disciplina. 20 REFERÊNCIAS ANA. Conjuntura Recursos Hídricos Brasil 2020. Brasília: ANA, Ministério do Desenvolvimento Regional, 2020. Disponível em: <http://conjuntura.ana.gov.br/static/media/conjuntura-completo.23309814.pdf>. Acesso em: 11 ago. 2021. BORELLI, E. Uma análise da gestão da água e saneamento no Brasil sob a perspectiva da agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável. In: VIII SINGEP – Simpósio Internacional de Gestão de Projetos, Inovação e Sustentabilidade; 8th CIK. Outubro, 2020. Disponível em: <http://submissao.singep.org.br/8singep/arquivos/406.pdf>. Acesso em: 11 ago. 2021. BRASIL. Lei n. 9433 de 8 de janeiro de 1997. Brasília: Diário Oficial, 8 de janeiro de 1997. _____. Lei n. 11.445, de 5 de janeiro de 2007. Brasília: Diário Oficial, 5 de janeiro de 2007. _____. Lei n. 12.187, de 29 de dezembro de 2009. Brasília: Diário Oficial, 29 de dezembro de 2009. _____. Lei n. 14.026, de 15 de julho de 2020. Brasília: Diário Oficial, 2020. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. CNM Anais do Seminário sobre Iniciativas Inovadoras de Gestão Municipal. Brasília: CNM, 2016 IBERDROLA. 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