Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO GUSTAVO HENRIQUE MOREIRA SARKOVAS PROCESSOS DE INTEGRAÇÃO PÓS-AQUISIÇÃO: Um estudo de caso no Brasil RIO DE JANEIRO 2012 Gustavo Henrique Moreira Sarkovas PROCESSOS DE INTEGRAÇÃO PÓS-AQUISIÇÃO: Um estudo de caso no Brasil Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do titulo de Mestre em Administração. Orientadora: Denise Lima Fleck, Ph.D. RIO DE JANEIRO 2012 S245p Sarkovas, Gustavo Henrique Moreira. Processos de integração pós-aquisição: um estudo de caso no Brasil / Gustavo Henrique Moreira Sarkovas. -- Rio de Janeiro: UFRJ, 2013. 132 f.: il.; 31 cm. Orientadora: Denise Lima Fleck Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração, 2013. 1. Mudança organizacional. 2. Administração – Teses. I. Fleck, Denise Lima. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração. III. Título. CDD 658.4 Gustavo Henrique Moreira Sarkovas PROCESSO DE INTEGRAÇÃO PÓS-AQUISIÇÃO: Um estudo de caso no Brasil Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do titulo de Mestre em Administração. Aprovada em ___________________________________________ Orientadora Profª. Denise Lima Fleck, Ph.D. (COPPEAD, UFRJ) ___________________________________________ Profª. Adriana Victoria Garibaldi de Hilal, D.Sc. (COPPEAD, UFRJ) ___________________________________________ Profª. Mônica Esteves Rodrigues, D.Sc. (CEMPRE – Ltda.) AGRADECIMENTOS Aos meus pais, Sergio e Maria Helena, que me deram todo o suporte que precisei durante este período, estando sempre ao meu lado oferecendo bons conselhos, carinho e segurança. À Isabela, minha esposa, pela compreensão e incentivo durante a jornada do mestrado. Sem a sua paciência, o seu apoio e o seu amor eu teria tido muito mais dificuldade para encarar o período do mestrado. À minha irmã, Domenica, pela paciência e dedicação nas inúmeras revisões tanto deste trabalho como em diversos outros durante todo o mestrado. Aos meus amigos, Diogo Leuzinger, João Schuery, Rodrigo Tasca e Luciano Pedroso pela amizade e companheirismo durante os dois anos que passamos no Coppead. Aos meus “irmãos” de orientadora, Camila Caldeira, Flavia Freitas, Laura Rielo, Monique Stony, Raphael Assayag e Rodrigo Tasca por tornarem a caminhada da elaboração da dissertação um pouco menos solitária e estafante. Aos funcionários do Coppead, em especial aos da Secretaria Acadêmica, pela paciência, suporte e carinho durante todo o mestrado. Aos demais amigos da Turma 2010, que tornaram os dias no Coppead mais divertidos e prazerosos. À minha orientadora, Denise Fleck, por todos os ensinamentos do primeiro ao último dia do mestrado. À Adriana Hilal e Mônica Rodrigues, participantes da banca, por aceitarem o convite e por contribuírem para a melhoria da qualidade deste trabalho. À Accenture do Brasil, por ter me concedido a oportunidade de parar de trabalhar por dois anos sem perder os vínculos com a empresa. RESUMO SARKOVAS, Gustavo Henrique Moreira. Processo de integração pós-aquisição: um estudo de caso no Brasil. Rio de Janeiro, 2012. Dissertação (Mestrado em Administração de Empresas) – Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012. As atividades de fusões e aquisições estão entre as principais formas de crescimento das organizações, seja através da melhoria das margens operacionais, do aumento do market-share ou da ampliação do portfólio de produtos. Porém, mesmo apresentando números crescentes, muitas aquisições não alcançam os resultados esperados, porque os processos de integrações pós-aquisição não recebem a atenção que merecem por parte dos gestores. Diante disso, surgiu o interesse em aprofundar os estudos nesta etapa da aquisição, buscando identificar se é possível determinar quando um processo de integração pós-aquisição pode ser considerado como encerrado. O método de pesquisa escolhido para este trabalho foi o estudo de caso, devido às suas características exploratórias. A resposta para a questão central foi obtida através da associação dos tipos de integração apresentados por Haspeslagh e Jemison (1991) com os níveis de cultura de Schein (2004). Para isso, foi elaborado um modelo análogo ao modelo de Schein com três níveis: superficial, intermediário e profundo. A integração de aquisições do tipo preservação não permite, de antemão, precisar seu encerramento. Essa definição vai depender de quanto a adquirente deseja preservar após a integração. Assim, seu encerramento pode ir desde o não identificável até o nível intermediário. Já o tipo simbiose, que tem como característica uma série de interações entre as duas empresas com o objetivo de construir uma nova empresa, não é possível estabelecer sua duração e/ou os marcos limite para que a integração seja considerada como encerrada. A integração de aquisições do tipo absorção deve ser considerada como finalizada quando atinge o nível profundo, pois implica numa consolidação total das operações, organização e cultura das duas empresas. Ou seja, para responder a questão central é preciso identificar inicialmente qual o tipo de integração pós-aquisição predominante. Palavras-chaves: Fusões e Aquisições; Processo de integração pós-aquisição, Níveis de integração; Organizações brasileiras; ABSTRACT SARKOVAS, Gustavo Henrique Moreira. Processo de integração pós-aquisição: um estudo de caso no Brasil. Rio de Janeiro, 2012. Dissertação (Mestrado em Administração de Empresas) – Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012. Mergers and acquisitions are some of the main alternatives for organizations to achieve growth, either through improving operating margins, increasing market share or expanding its portfolio of products. However, even being increasingly more common, many acquisitions do not achieve the expected results, because the post- acquisition integration does not receive the attention they deserve by management. Therefore, we are interested in studying further the acquisition stage, seeking to identify whether it is possible to determine when a process of post-acquisition integration can be considered finished. The research method chosen was a case study, due to its exploratory characteristics. The answer to the central question was obtained by combining the integration’s type presented by Haspeslagh and Jemison (1991) with the levels of culture presented by Schein (2004). For this, it was designed an analogous Schein’s model with three levels: superficial, intermediate and deep. In the case of preservation acquisitions, it is not possible to determine beforehand when the integration is over. This definition will depend on how much the buyer wants to preserve the company and its current operational model after the integration. Thus, its closure can range from unidentifiable to the intermediate level. In the case of a symbiosis integration, where the main goal is to build a new company through a series of interactions between the two companies, it is not possible to establish the duration or the milestones for considering the integration finished. The absorption integration should be considered completed whenit reaches the deepest level, which implies a total consolidation of operations, organization and culture of the two companies. So, to answer the central question it is necessary to identify the predominant type of post-acquisition integration. Key words: Merger and acquisitions; Post-acquisition integration process; Integration levels; Brazilian organizations. LISTA DE ILUSTRAÇÕES FIGURAS Figura 2.1 Como o processo de aquisição afeta os resultados. ..........................................................10 Figura 2.2 Visão convencional das aquisições. . .................................................................................11 Figura 2.3 Modelo de Gerenciamento das Fusão/Aquisição. . ............................................................23 Figura 2.4 Tipos de integração pós-aquisição. . ..................................................................................30 Figura 2.5 Framework de Integração. . ..............................................................................................34 Figura 2.6 Fases do processo “High Road”. . ......................................................................................35 Figura 2.7 Níveis de cultura. .............................................................................................................39 Figura 3.1 The building blocks of a scientific study. . ..........................................................................53 Figura 4.1 Níveis de integração pós-aquisição .................................................................................110 Figura 4.2 Macro categorias identificadas na analise do caso organizadas nos níveis de integração pós-aquisição. .................................................................................................................................113 GRÁFICOS Gráfico 1.1 Total de Transações no Brasil por ano. Adaptação da Pesquisa de Fusões e Aquisições 2012 – 2º trimestre – KPMG............................................................................................................... 4 Gráfico 1.2 Total de Transações no Brasil por ano. Adaptação do Relatório PwC - Fusões e Aquisições no Brasil - Abril de 2012 ..................................................................................................................... 5 LISTA DE TABELAS Tabela 3.1 Condições relevantes para a escolha da estratégia de pesquisa. ......................................56 Tabela 3.2 Fontes utilizadas para levantamento de informações das empresas estudadas. ...............59 Tabela 3.3 Codinomes utilizados para manutenção do anonimato. ...................................................60 Tabela 3.4 Resumo das informações das entrevistas realizadas .........................................................61 Tabela 3.5 Organização das entrevistas conforme roteiro. ................................................................64 Tabela 3.6 Organização das entrevistas conforme os pontos de convergência. ..................................65 Tabela 4.1 Relação do tipo de abordagem de integração de Haspeslagh e Jemison (1991) e os níveis de integração definidos pelo estudo. ..............................................................................................112 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS FPM - Finance & Performance Management CEO – Chief Executive Officer CFO – Chief Finance Officer WBS – Work Breakdown Structure CIO – Chief Information Officer WBS – Work Breakdown Structure M&A – Merger and Acquisition BPO – Business Process Operation RH – Recursos Humanos HR Rep – Representante de Recursos Humanos MD&I – Market Development & Initiative SLA – Service Level Agreement P&D – Pesquisa e Desenvolvimento PMI – Post-Merger Integration F&A – Fusões e Aquisições TI – Tecnologia da Informação d0 – Data zero MC - Management Consulting SAP OM - SAP Organizational Management 2 1. INTRODUÇÃO................................................................................................................ 4 1.1. OBJETIVO DO ESTUDO............................................................................................. 4 1.2. RELEVÂNCIA DO ESTUDO ........................................................................................ 6 1.3. DELIMITAÇÃO DO ESTUDO ...................................................................................... 7 1.4. PERGUNTAS/QUESTÕES ......................................................................................... 8 1.5. ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO ................................................................................ 8 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA............................................................................................ 9 2.1. IDÉIA ......................................................................................................................... 12 2.1.1. Abordagem de valor nas aquisições ................................................................... 14 2.2. JUSTIFICATIVA PARA AQUISIÇÃO ......................................................................... 15 2.2.1. O processo de tomada de decisão ...................................................................... 15 2.2.2. Objetivos de uma aquisição ................................................................................ 18 2.2.3. Tipos de aquisição .............................................................................................. 22 2.3. INTEGRAÇÃO PÓS-AQUISIÇÃO ............................................................................. 26 2.3.1. Tipos de abordagem da integração ..................................................................... 29 2.3.2. Gerenciamento da Integração ............................................................................. 32 2.3.3. Níveis de Integração ........................................................................................... 38 2.4. RESULTADOS .......................................................................................................... 43 2.5. PROBLEMAS DE PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO .................................... 44 2.6. PROBLEMAS DE PROCESSO DE INTEGRAÇÃO ................................................... 48 3. METODO DE PESQUISA ............................................................................................. 53 3.1. DEFINIÇÃO DO TEMA, DO OBJETO DE PESQUISA E DA PERGUNTA ................. 53 3.2. ESTRATÉGIA DE PESQUISA ................................................................................... 55 3.3. ORGANIZAÇÃO DA PESQUISA ............................................................................. 57 3.4. COLETA DE DADOS ............................................................................................... 57 3.4.1. Levantamento das informações sobre as empresas ........................................... 58 3.4.2. Levantamento das informações sobre o processo de aquisição ......................... 59 3.5. ANÁLISE DOS DADOS ........................................................................................... 63 4. ANÁLISE ...................................................................................................................... 66 4.1. HISTÓRICO DAS EMPRESAS ............................................................................... 66 4.1.1. Adquirente .......................................................................................................... 66 4.1.2. Adquirida............................................................................................................. 67 4.1.3. A operação de aquisição ..................................................................................... 68 3 4.2. CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROCESSO DE AQUISIÇÃO .................................... 69 4.2.1. Ideia ....................................................................................................................70 4.2.2. Justificativa para a aquisição .............................................................................. 72 4.2.3. Integração pós-aquisição .................................................................................... 78 4.2.4. Resultados .......................................................................................................... 85 4.3. MACRO CATEGORIAS INTEGRADAS .................................................................. 86 4.4. IDENTIFICAÇÃO DO ENCERRAMENTO DO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO . 108 5. CONCLUSÃO ............................................................................................................. 116 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................... 121 APÊNDICES ...................................................................................................................... 125 APÊNDICE A – Solicitação de autorização para estudo de caso ............................... 125 APÊNDICE B – Roteiro para entrevistas ..................................................................... 127 APÊNDICE C – Organização das entrevistas conforme roteiro ................................. 129 4 1. INTRODUÇÃO 1.1. OBJETIVO DO ESTUDO Para Tanure e Cançado (2005), as fusões e aquisições (F&A) apresentam a partir dos anos 90 um crescente papel na economia mundial, e em particular na economia brasileira. Estudos da consultoria KPMG (2012) revelam a ocorrência de 7.391 operações de F&A no Brasil de 1994 a 2011 (Gráfico 1.1), sendo que mais de 45% ocorreu com investimento de capital nacional. 175 212 328 372 351 309 353 340 227 230 299 363 473 699 663 454 726 817 0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 19 94 19 95 19 96 19 97 19 98 19 99 20 00 20 01 20 02 20 03 20 04 20 05 20 06 20 07 20 08 20 09 20 10 20 11 Total de Transações no Brasil por ano Gráfico 1.1 Total de Transações no Brasil por ano. Adaptação da Pesquisa de Fusões e Aquisições 2012 – 2º trimestre – KPMG O relatório sobre fusões e aquisições no Brasil da empresa PRICEWATERHOUSECOOPERS (2012) apresenta números diferentes da sua concorrente, conforme Gráfico 1.2, porém demonstra a mesma tendência de crescimento das transações nos últimos anos. Essa tendência só não é verificada no ano de 2009, provavelmente devido aos reflexos da crise econômica mundial do ano anterior. 5 415 389 573 722 645 644 798 749 0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Total de Transações no Brasil por ano Gráfico 1.2 Total de Transações no Brasil por ano. Adaptação do Relatório PwC - Fusões e Aquisições no Brasil - Abril de 2012 Além do crescimento no número de transações de F&A, o valor investido nelas também vem apresentando crescimento. Segundo reportagem da Revista Exame de outubro de 2011, mais de 120 bilhões de reais foram investidos por empresas brasileiras de capital aberto nos últimos cinco anos. Valor que representa um recorde na história do país. O crescimento no número e na quantia investida pode ser explicado devido à importância que as fusões e aquisições estão representando para a estratégia das empresas. Segundo Schraeder e Self (2003), as fusões e aquisições estão se tornando uma opção estratégica popular, pois possibilitam o crescimento, a diversificação e os ganhos de escala que as empresa buscam. Já para Gupta e Roos (2001), as fusões e aquisições se tornaram importantes formas de executar a estratégia corporativa e realocar recursos na economia global. Levando-se em consideração a visão da firma baseada em recursos de Barney (1991), as fusões e aquisições podem contribuir para a transformação acelerada do portfólio de recursos de uma empresa. Para Donahue (2001), em uma economia focada em velocidade, a forma mais rápida das empresas inserirem um novo produto em seus portfólios, ampliarem seus canais de distribuição ou a carteira de clientes é através de uma aquisição e não através do desenvolvimento interno. Lynch e Lind (2002) vão além e dizem que, nos últimos 20 anos, as atividades de fusões e aquisições estão entre as principais formas de crescimento das organizações. Seja com o objetivo de melhorar as margens operacionais, aumentar o market-share, ampliar o portfólio de produtos ou oferecer mais valor para os acionistas, crescer é fundamental. 6 As aquisições têm o potencial de transformar as empresas e contribuir para a modificação da corporação. Elas auxiliam na renovação da posição da firma no mercado a uma velocidade que dificilmente seria atingida através do desenvolvimento interno. Oferecem a possibilidade de obter os benefícios da combinação de ativos e de dividir capacitações que não seriam alcançadas por parcerias. Mais precisamente, aquisições podem trazer novas capacitações que seriam difíceis de desenvolver ou podem trazer a oportunidade de alavancar as já existentes a níveis mais significativos (Haspeslagh& Jemison, 1991). O interesse por um determinado mercado, normalmente emergente, e a rapidez em conseguir capacitação para estarem aptas à competição movem certas empresas a incorporar o conhecimento detido por outras ao invés de desenvolvê-lo internamente. Como o desenvolvimento do conhecimento necessário pode ter um custo elevado e requer disponibilidade de tempo muitas vezes incompatível com a oportunidade de inserção no mercado desejado, a aquisição de outra organização que já passou pelo processo de aprendizagem e que dispõe de capacitação e de sucesso no mercado parece uma solução interessante para enfrentar essas dificuldades. A aparente rapidez da solução esconde, no entanto, problemas típicos de gestão da mudança em fusões e aquisições, ressaltados os aspectos culturais. Este estudo buscou entender como ocorreu o processo decisório da adquirente, passando pela decisão de compra, a forma como isso foi gerido dentro das duas empresas e como foi feito o processo de integração. Neste ultimo assunto, o foco principal foi verificar a possibilidade de determinar quando um processo de integração pós-aquisição poderia ser considerado como encerrado. Devido à ausência de literatura que tratava deste assunto específico, foi necessária a elaboração de um novo modelo, associando os tipos de integração (Haspeslagh e Jemison, 1991) com os níveis de cultura (Schein, 2004). 1.2. RELEVÂNCIA DO ESTUDO O grande número de operações de fusão e aquisição realizadas no país, o crescimento na quantia despendida para tal e a diferença na percepção da adquirida e adquirente em relação ao término do processo de integração das duas empresas 7 pós-aquisição justificam a busca pela compreensão dos possíveis níveis que uma integração pode alcançar. Nesse sentido, a relevância acadêmica do presente trabalho reside em sua contribuição para o segmento dos estudos de fusões e aquisições, mais especificamente no que tange ao fenômeno de integração de empresas pós- aquisição. A relevância deste estudo para as organizações consiste na contribuição para as empresas que têm as fusões e aquisições como parte de sua estratégia corporativa. A pesquisa também se mostra relevante tanto para estudiosos do assunto e para executivos que atuem ou queiram atuar neste setor, quanto para aqueles que busquem mais informações sobre fusões e aquisições, independentemente de as empresas analisadas serem pertencentes ao setor de prestação de serviços. 1.3. DELIMITAÇÃO DO ESTUDO A pesquisa delimita-se ao estudo de caso do processo de aquisição de uma empresa nacional média do setor de prestação de serviços por uma multinacional com atuação no mesmo setor. O trabalho se propõe a estudar as diversas fases que um processo de aquisição percorre, focando principalmente na integração das empresas. Nesta etapa, são estudados os diversos níveisde profundidade de uma integração, com o objetivo de responder a questão central que busca verificar se é possível determinar quando um processo de integração pós-aquisição pode ser considerado como encerrado. A quantidade de entrevistas realizadas foi limitada – nove no total - pelo número de gestores, tanto da adquirida como da adquirente, que tiveram participação no processo pré e pós-aquisição. Este estudo não aborda as questões financeiras envolvidas na aquisição, pois quando foi concedida a autorização para a realização desta pesquisa, a adquirente informou que não seria oferecida nenhuma informação sobre os valores negociados. Além disso, também foi solicitada a manutenção do anonimato tanto dos nomes das empresas como das pessoas envolvidas no processo. No tocante à delimitação temporal, as entrevistas com funcionários das duas empresas foram realizadas entre os meses de março e julho do ano de 2011. Como 8 a aquisição ocorreu no início do ano de 2010, não foi possível analisar uma etapa do framework desenvolvido por Haspeslagh e Jemison (1991) que trata dos resultados alcançados com a integração. 1.4. PERGUNTAS/QUESTÕES A principal questão que este trabalho busca responder é: É possível determinar quando um processo de integração pós-aquisição pode ser considerado como encerrado? Para isso, também serão respondidas questões secundárias como: De que forma ocorre o processo de integração entre a empresa adquirida e adquirente?; Existem diferentes níveis de profundidade em uma integração pós-aquisição?; Quais são esses níveis? 1.5. ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO Este trabalho está dividido em cinco capítulos. Primeiro é a introdução, com apresentação e justificativa da escolha do tema, das questões de estudo e da organização do trabalho. O segundo capítulo refere-se à revisão de literatura, que busca fundamentar o estudo com conceitos sobre fusões e aquisições, analisando todas as etapas dessas operações. Para isso, foi utilizado o framework proposto por Haspeslagh e Jemison (1991), que apresenta as diversas etapas percorridas por uma empresa que decide crescer desta forma. O terceiro capítulo refere-se à metodologia utilizada para a realização deste trabalho. O quarto capítulo destina-se à apresentação das duas empresas estudadas, a descrição do processo de aquisição, a identificação dos níveis de integração alcançados e a resposta de se é possível determinar quando um processo de integração pós-aquisição pode ser considerado como encerrado. O ultimo capítulo refere-se às conclusões encontradas no estudo. Os apêndices apresentam o roteiro utilizado com suporte durante as entrevistas e o correio eletrônico enviado solicitando autorização da empresa adquirente para realizar o estudo de caso. 9 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Para Haspeslagh e Jemison (1991) as “aquisições têm o potencial único de transformar as firmas e contribuir para a renovação da corporação. Elas podem ajudar a empresa a renovar uma posição no mercado a uma velocidade que não seria alcançada através de desenvolvimento interno”. Além disso, os autores afirmam que as aquisições oferecem a possibilidade de combinar recursos e dividir capacitações, que não seriam possíveis através de parcerias. Se nos aprofundarmos ainda mais, as aquisições podem trazer para as empresas as capacitações que seriam difíceis de serem desenvolvidas internamente ou que podem, ainda, alavancar as existentes a níveis muito mais significativos. A frase “a diferença entre o sucesso e o fracasso nas aquisições está intimamente ligada às formas como são conduzidos os processos de tomada de decisão e a integração pós-aquisição” apresenta, de forma sucinta, as ideias dos autores. Quando bem estruturados, esses dois processos se tornam a base para a renovação estratégica da empresa resultante. O problema é que, normalmente, as decisões são tomadas de forma apressada pelos gestores, que acabam se frustrando no futuro com os resultados não alcançados. Além do tempo, outro fator que pode influenciar no sucesso da aquisição é a motivação do negócio. Muitas vezes, as empresas acreditam que a aquisição trará determinado benefício, mas quando o negócio é fechado, os executivos percebem que o objetivo nunca foi alcançado e que, se tivessem tido mais tempo e feito análises mais elaboradas e completas, os resultados poderiam ter sido diferentes. Porém, não é só no processo de aquisição que as dificuldades existem. Mesmo que a aquisição aparente seja positiva para a empresa, ainda é preciso alcançar as sinergias durante o processo de integração. Ou seja, para que a empresa tenha sucesso, os dois processos devem ocorrer de forma bem sucedida. É preciso deixar clara para os funcionários a direção que deve ser seguida durante esse processo. Não se pode esperar que eles saibam o que a empresa tem como objetivo e que o alcance sem um direcionamento. Haspeslagh e Jemison (1991) questionam os motivos pelos quais algumas empresas conseguem lidar com essas questões melhor do que outras. Dizem que a resposta pode estar na definição de como as firmas criam valor, como as aquisições 10 contribuem para essa atividade e como os gestores solucionam os problemas de utilização das aquisições como parte da estratégia de renovação corporativa. Eles dizem que “entender o processo de criação de valor, no entanto, requer uma mudança conceitual na empresa, de foco no retorno financeiro imediato ou posição no mercado para capacitações que podem sustentar a posição e os resultados financeiros no longo prazo”. Haspeslagh e Jemison (1991) afirmam a existência de quatro tipos de desafios que as empresas devem enfrentar no gerenciamento das aquisições. São eles: Assegurar que estejam alinhadas com a estratégia de renovação corporativa; Desenvolver um processo de tomada de decisão pré-aquisição que permita a avaliação da aquisição “certa” e desenvolva uma justificativa para a aquisição, independentemente das pressões por maior velocidade, falta de informações completas e sigilo; Gerenciar o processo de integração pós-aquisição para criar o valor esperado; Promover o aprendizado obtido internamente na empresa. Em toda aquisição, os processos de tomada de decisão e integração têm impacto na ideia, na qualidade da justificativa, na forma de integração e nos resultados. Haspeslagh e Jemison (1991) resumiram essa identificação através da Figura 2.1. Figura 2.1 Como o processo de aquisição afeta os resultados. Fonte: Haspeslagh & Jemison, 1991. O que os autores apresentam com os dois aspectos abordados refere-se à perspectiva de processo. Essa perspectiva considera a mudança de foco do 11 resultado da aquisição para o foco nas forças que causaram o referido resultado, isto é, “a transferência de capacitações que conduzirão à vantagem competitiva” da empresa (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.12). Segundo eles, na perspectiva de processo, a aquisição não é um evento independente, limitado ao momento em que as empresas se unem. Não é na transação em si que os benefícios esperados se concretizam, mas sim na forma como são conduzidos os processos imediatamente após a aquisição. Ainda de acordo com eles, sob essa abordagem, as aquisições podem ser formas de renovação das corporações. Os autores afirmam que a visão de processo é conflitante com a visão tradicional das aquisições, que é defendida por gestores e acadêmicos. Na forma tradicional, as aquisições são vistas como processos pontuais efetuados por meio de negociações únicas, onde o preço é o principal parâmetro. O processo de tomada de decisão é sequencial, baseado na avaliação financeira e na análise pré-aquisição. Além disso, acredita-se que o valor da aquisição possa ser medido, de forma acurada,no momento em que é realizada. Essa visão é apresentada pelos autores conforme a Figura 2.2. Figura 2.2 Visão tradicional das aquisições. Adaptação de Haspeslagh & Jemison, 1991. A partir da diferenciação das duas perspectivas, Haspeslagh e Jemison (1991) dizem que não existe uma abordagem universal para lidar com as aquisições. Eles sugerem uma abordagem baseada na “estratégia que deve ser utilizada em cada aquisição, e na consciência das exigências organizacionais por autonomia, quando elas são centrais no atingimento dos objetivos da aquisição” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.13). A partir das duas visões apresentadas – tradicional e de processo – foi escolhida a visão de processo como framework para delimitar o escopo deste 12 estudo. Essa decisão foi tomada devido à crença de que realmente as fusões e aquisições não são eventos estanques, mas sim um processo com início, meio e fim e que devem estar alinhados com as estratégias corporativas. Dessa forma, a revisão bibliográfica está dividida em ideia, justificativa para a aquisição, integração pós-aquisição, resultados, problemas de processo de tomada de decisão e problemas de processo de integração. O primeiro ponto a ser tratado será a ideia, ou seja, assegurar que a aquisição esteja alinhada com a renovação estratégica da empresa. 2.1. IDÉIA O processo de aquisição de uma empresa por outra, segundo Haspeslagh e Jemison (1991), tem o potencial de transformar firmas e possibilitar a renovação das corporações de uma maneira mais rápida que um processo natural de crescimento, ou até de parcerias. Porém, o mais importante é que esse processo pode trazer à corporação capacitações que não teria desenvolvido sozinha, ou ainda alavancar capacitações de forma a atingir níveis superiores de serviço e posição de mercado. O conceito de criação de valor foi revisado pelos autores a partir de diferentes pontos de vista e, consequentemente, formas de se entender: a) o conceito do mercado de capitais, b) a abordagem sob a ótica dos envolvidos direta ou indiretamente no processo (stakeholders), e, finalmente, a mais explorada pelos autores, c) a perspectiva gerencial, que será abordada nesse trabalho. a) Valor sob a ótica do Mercado de capitais: Sob esta ótica, a visão do valor nas aquisições está diretamente relacionada à questão de geração de valor para os acionistas da empresa. Essa visão indica que o valor de mercado de uma empresa pode ser entendido como uma estimativa imparcial de todas as informações públicas disponíveis sobre seu fluxo de caixa futuro e os riscos relacionados a ela. De acordo com essa ótica, qualquer aquisição que cause um aumento no valor de mercado da empresa resultante da aquisição – retirando-se todos os efeitos de flutuações de preço imediatamente subsequentes à aquisição – é positiva. Já a 13 aquisição em que há redução no valor de mercado da empresa resultante é negativa. É possível perceber que esta é uma visão bastante simplista. Seu aspecto positivo é fazer pensar no resultado, no objetivo de criação de valor à frente das razões gerenciais. Analisa-se a empresa num contexto de mercado, de toda a economia e não apenas internamente, fora do contexto dos interesses gerenciais. A perspectiva do mercado de capitais está limitada à definição do mesmo, isto é, ao aumento das receitas ou rendimentos sob seus ativos imobilizados. Por outro lado, não sugere a maneira como pode ser gerado esse incremento pelos gestores em processos de aquisição. b) Valor sob a ótica dos envolvidos direta ou indiretamente no processo (stakeholders): O valor de uma empresa num processo de aquisição pode também ser visto na perspectiva de todos os envolvidos nessa transformação, a saber: os empregados, as comunidades relacionadas direta ou indiretamente à empresa, seus clientes e fornecedores. Cada um deles se relaciona com o processo e pode ser fator crítico de sucesso de uma aquisição. Os empregados apreciam uma empresa por diversos aspectos, como a empregabilidade, aderência à cultura da organização e formas de se atingir objetivos pessoais. As comunidades também dão valor a uma empresa pelos benefícios que ela prove à área em que se situam, como empregos, tipos de pessoas atraídas à área da comunidade, e o próprio envolvimento dos seus empregados para a vida da região. Os clientes valorizam uma organização em função de sua habilidade de atender às demandas por produtos ou serviços. Finalmente, os fornecedores valorizam o relacionamento pela demanda por seus produtos ou serviços, mas também por elas fornecerem informações do mercado, que podem ser valiosas para eles, através dessa demanda. Todas essas vertentes devem ser estudadas num processo de aquisição, ou ao menos consideradas, já que decisões podem implicar em reações até adversas. Nesses casos, dependendo do grau de influência de cada participante no contexto da aquisição, o processo pode ser dificultado e seus objetivos inviabilizados. 14 c) Valor sob a ótica gerencial: Essa visão combina tanto a questão dos resultados financeiros, quanto a questão dos envolvidos no processo de aquisição. Nesta perspectiva, apesar da análise do fluxo de caixa ser considerada como base para o estudo de uma aquisição, os gestores envolvidos tomam a decisão através do julgamento de seus benefícios de longo prazo, estratégicos, tecnológicos e mercadológicos. Porém, o que se vê na prática é que muitos gestores acreditam na importância da visão de longo prazo, mas são pressionados na quantificação e comprovação dos resultados imediatos que acabam por se adaptar ao conceito puramente financeiro e de curto prazo. Esse é um dos grandes desafios das aquisições: “equilibrar a performance dos resultados financeiros de curto prazo com as demandas estratégicas de longo prazo” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.22). 2.1.1. Abordagem de valor nas aquisições As pesquisas de Haspeslagh e Jemison (1991) apresentam duas formas distintas de aumentar a riqueza dos acionistas de uma empresa através das aquisições: a captação e a criação de valor. A captação de valor através de aquisição envolve a transferência de valor dos antigos acionistas ou outros stakeholders para os acionistas da empresa adquirente. Esse processo é geralmente pontual e limitado ao momento em que a transação ocorre. A captura pode ser feita através da compra de ativos desvalorizados, benefício de impostos, aumento de dívidas ou desmobilização de ativos. A capacidade de capturar valor através de aquisições está relacionada à existência de um grupo de pessoas experientes dentro da empresa que dominem assuntos referentes a direito, finanças e gestão e consigam analisar e decidir os melhores negócios. É valido destacar que focar unicamente na captura de valor “mascara a necessidade de foco no gerenciamento do processo de legítima criação de valor” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.27). Os autores dizem que, apesar dos benefícios da captura serem substanciais para decidir por uma aquisição, eles não são duradouros e, portanto, são contrários à estratégia de longo prazo das empresas. 15 Já a criação de valor, segundo os Haspeslagh e Jemison (1991), é um fenômeno de longo prazo, que resulta de ações gerenciais e interações entre as empresas. Ela está relacionada com a obtenção de sinergias, ou seja, com a transferência de capacitações entre as empresas para melhorar a posição competitiva e consequentemente sua performance. A melhor maneira de entender o processo de criação de valor é “ver a firma como um conjunto de capacitações, inseridas em uma estrutura organizacional, que, quando aplicadas aos cenários de mercado, podem criar e sustentar elementos de vantagem competitiva” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991,pp.23). Esses elementos produzem resultados para a empresa e criam valor para os acionistas. Essa visão está alinhada com a de Barney (1991) que diz que “a firma é dita como tendo vantagem competitiva quando implementa uma estratégia de criação de valor que não está sendo implementada simultaneamente por nenhum dos seus concorrentes atuais ou potenciais” (BARNEY, 1991, pp.102). Já a sustentabilidade da vantagem competitiva é alcançada quando nenhuma outra empresa é capaz de alcançar os benefícios da estratégia aplicada. 2.2. JUSTIFICATIVA PARA AQUISIÇÃO 2.2.1. O processo de tomada de decisão Segundo Haspeslagh e Jemison (1991), muitas vezes a tomada de decisão sobre uma aquisição é vista como um processo analítico (apresentado na Figura 2.2), realizado em etapas sequenciais que se inicia com a definição dos objetivos, passa pelas fases de busca e classificação dos candidatos, segue para as avaliações estratégica e financeira e, finalmente, termina na negociação em si. Na realidade, essa tarefa é muito mais complexa, pois a motivação para a tomada de decisão não passa somente pela definição de comprar ou não e o preço a ser pago. Ela deve ser justificada de acordo com os objetivos estratégicos da empresa. Nesse sentido, os autores afirmam que “a qualidade da justificativa da aquisição está intimamente relacionada com a performance da aquisição” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.41). A justificativa da aquisição pode ser entendida como a forma e/ou os argumentos utilizados para vender internamente a 16 ideia para as empresas. Normalmente, essas justificativas são apresentadas para aqueles que decidem através de dossiês. Conforme apresentado anteriormente, as aquisições normalmente apresentam justificativas. Haspeslagh e Jemison (1991) identificaram, através de suas pesquisas em dossiês utilizados para vender internamente a ideia nas empresas, justificativas semelhantes sobre os motivos da aquisição, das projeções financeiras e das sinergias esperadas. Porém, encontraram uma grande variedade de níveis de detalhamento. Com base nisso, identificaram seis dimensões ou critérios para julgar cada uma: a) Qualidade da avaliação estratégica; b) Visão amplamente compartilhada do objetivo da aquisição; c) Especificações detalhadas das fontes de benefícios e potenciais problemas pós-aquisição; d) Considerações pelas condições organizacionais; e) Período de implementação; e f) Preço máximo. a) Qualidade da avaliação estratégica A qualidade da avaliação estratégica é um ponto chave na justificativa da aquisição, pois é ela que direciona o potencial de criação de valor da operação. Essa avaliação leva em consideração a contribuição da aquisição para a estratégia da empresa, assim como o impacto da estratégia na posição competitiva da empresa. b) Visão amplamente compartilhada do objetivo da aquisição Em um processo de aquisição estratégica é necessário que o objetivo seja conhecido, aprovado e compartilhado por todos os envolvidos na tomada de decisão. Em outras palavras, “uma lógica estratégica comum compartilhada por todos os tomadores de decisão chave é pré-condição para a obtenção de consenso na abordagem de implementação de uma organização” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.48). É importante destacar que a presença de múltiplos argumentos não é necessariamente um empecilho. O problema pode ocorrer quando não houver um entendimento comum ou acordo sobre qual desses argumentos será o foco inicial das atividades de criação de valor. 17 c) Especificações detalhadas das fontes de benefícios e potenciais problemas pós-aquisição Os benefícios devem ser tangibilizados, bem como os potenciais problemas decorrentes da aquisição. Muitas vezes são considerados apenas os benefícios imediatos, faltando a indicação de outros ganhos decorrentes do processo. Em outras, entretanto, não há um estudo dos riscos decorrentes de determinadas situações pós-aquisição, que podem inclusive afetar o preço estudado para a aquisição. d) Considerações pelas condições organizacionais Apesar dos ganhos de sinergia serem ponderados no processo de tomada de decisão, muitas vezes estão limitados à estrutura de custos e finanças gerais da organização. As condições organizacionais sob as quais a aquisição ocorrerá e como podem ser medidas são muitas vezes ignoradas. Sendo assim, os recursos organizacionais – pessoas, espaço físico, interfaces de infraestrutura de comunicação e tecnologia – devem ser analisados dentro do processo de tomada de decisão, no contexto da empresa pós-aquisição. e) Período de implementação Os autores destacam a importância de um estudo de todo o tempo do processo. É crítico, para uma integração bem sucedida, uma visão clara de “como começar, o quão rápido se deve proceder, e como chegar lá” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.50). f) Preço máximo O preço máximo deve ser considerado como o último componente de uma justificativa de qualidade para a tomada de decisão. O preço máximo deve ser calculado através da expectativa de potencial criação de valor combinado com a avaliação dos riscos de implementação. 18 2.2.2. Objetivos de uma aquisição As aquisições podem contribuir de diversas formas para a estratégia de negócio de uma empresa. Haspeslagh e Jemison (1991) apresentam três objetivos que elas podem ter: aquisição de uma capacitação específica, aquisição de uma plataforma e aquisição de uma posição de negócio existente. a) Aquisição de uma capacitação específica: ocorre quando a empresa demanda uma determinada capacitação com o objetivo de implementar uma estratégia de negócio e adquire outra empresa com esse intuito. b) Aquisição de uma plataforma: ocorre quando a empresa adquirida é viável mesmo antes da compra, mas somente será mantida pela adquirente se receber investimentos adicionais. c) Aquisição de uma posição de negócio: ocorre quando a empresa adquirente deseja ampliar seu porte ou abrangência de mercado através da compra de uma posição de mercado. Seu principal objetivo é crescer no ambiente competitivo em que a empresa se encontra. Já Lynch e Lind (2002) apresentam outros motivos pelos quais as empresas optam por uma aquisição. Eles dizem que “nos últimos 20 anos, as atividades de fusões e aquisições estão entre as principais formas de crescimento das organizações. Seja com o objetivo de melhorar as margens operacionais, aumentar o market-share, ampliar o portfólio de produtos ou oferecer mais valor para os acionistas, crescer é fundamental” (Lynch, J.G. & Lind, B., 2002). Eles continuam dizendo que as racionalizações pela escolha das fusões e aquisições como forma de crescimento das organizações, mesmo sendo muitas vezes uma estratégia arriscada, podem ser explicadas pelos seguintes motivos: a tentativa de crescimento orgânico normalmente demora um grande período de tempo para alcançar a fatia do mercado desejado; os investimentos em pesquisa e desenvolvimento provaram ser pouco lucrativos e muito caros; foram identificadas 19 como oportunidades únicas no mercado; ou, simplesmente, os executivos acreditam que podem alcançar o sucesso onde outros falharam. McGee (2006) corrobora com os pensamentos de Lynch e Lind quando diz que as “aquisições oferecem uma maneira rápida de ganhar uma posição de mercado em um produto já estabelecido” (McGEE, J. 2006, pp.1). Ele ainda apresenta a ideia de que, em comparação com as outras formas de crescimento ou diversificação, as aquisições superam as dificuldades relacionadas ao tempo e à escassez de recursos para desenvolvimento interno. Ele continua afirmando que, em indústrias maduras, com grande número de concorrentes jáestabelecidos, a entrada através de aquisição pode evitar uma reação competitiva. Penrose em sua obra clássica “The Theory of the Growth of the Firm”, de 1959, em que descreve as maneiras nas quais as empresas crescem e o quão rápido elas o fazem, afirma que uma das formas de crescimento é através das fusões e aquisições. No capitulo que estuda esse assunto, a autora afirma que em princípio existem dois métodos de expansão de uma firma: através da construção de um novo estabelecimento e da criação de novos mercados para si, ou então pela aquisição de um estabelecimento e os mercados de alguma firma já existente. “Se uma expansão planejada for considerada lucrativa independentemente das posições vigentes de outros produtores ou na distribuição da propriedade de determinados ativos produtivos, então a firma somente optará por crescer através de uma aquisição se essa for considerada menos custosa do que uma expansão interna. Se por outro lado for procurada uma mudança na posição dos produtores existentes ou uma alteração na distribuição do controle de determinados ativos produtivos, as aquisições poderão constituir o único meio para atingir esses objetivos. Em qualquer caso, somente haverá aquisição se houver firmas desejosas de dispor de seus ativos, incluindo seus privilégios, a um preço igual ou menor do que o seu valor para potenciais compradores.” (PENROSE, E. 2006, pp.239-240) Em resumo, podemos dizer que, sempre que a aquisição for considerada a melhor forma de crescimento para uma empresa, ela certamente ocorrerá. Já Bower (2001), em seus estudos sobre as atividades de M&A, patrocinados pela Harvard Business School, identificou cinco razões pelas quais uma aquisição pode ocorrer. Ele acredita que, conhecendo cada tipo, as chances de obter sucesso são maiores. Os tipos apresentados são: Supercapacidade; Desdobramento 20 geográfico; Extensão de linha de produto e mercado; Lógica de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) e Convergência industrial. A seguir, é apresentada uma breve descrição de cada tipo. a) Supercapacidade O objetivo estratégico da empresa adquirente é eliminar parte do excesso de capacidade, ganhar participação no mercado e criar uma operação mais eficiente. Esse tipo de aquisição é mais comumente identificado em indústrias maduras como, por exemplo, automobilística, aço e petroquímica. O adquirente normalmente encerra as operações das instalações menos competitivas, elimina os gestores menos eficazes e racionaliza os principais processos. Com isso, a empresa consegue ampliar sua participação no mercado, ter uma operação mais eficiente, ter melhores gestores, maior influência no mercado e a indústria como um todo reduz o excesso de capacidade. b) Desdobramento geográfico O objetivo estratégico deste tipo de aquisição é proporcionar a expansão geográfica de uma empresa de sucesso mantendo suas unidades operacionais locais, caso isso seja importante para seu relacionamento com os consumidores. Esse tipo de aquisição, diferentemente do anterior, ocorre normalmente em indústrias que ainda estão em estágios preliminares no seu ciclo de vida. Busca alcançar economias de escala e escopo, normalmente associadas às grandes indústrias. Costumeiramente, são do tipo de negócio ganha-ganha e, por isso, são mais fáceis de obter sucesso. Ser adquirido por uma empresa grande pode auxiliar uma menor a resolver uma gama de problemas, como: sucessão, acesso a capital e tecnologias mais modernas, marketing em nível nacional e a ameaça de competidores maiores. Já para o adquirente, as vantagens estão relacionadas à oportunidade de entrar em mercados regionais e ter um gerenciamento local. Além disso, a imposição dos seus processos possibilita a transformação dos negócios em mais eficientes. As empresas de contabilidade, os bancos, as cadeias de hotéis e as consultorias de tecnologia normalmente atuam desta forma. 21 c) Extensão de linha de produto e mercado O objetivo estratégico deste tipo de aquisição é ampliar a linha de produção ou a cobertura internacional de uma empresa. Muitas vezes se assemelha com o desdobramento geográfico, pois busca aquisições em cidades ou estados adjacentes. Em geral, representa um movimento ainda maior, que é a internacionalização dos mercados. A obtenção de sucesso nesse tipo de aquisição depende, em parte, do tamanho relativo das empresas envolvidas. Caso elas sejam do mesmo tamanho, os problemas enfrentados serão similares ao de Supercapacidade. Por outro lado, se os tamanhos forem bastante diferentes, as chances para o sucesso são grandes, pois a maior imporia seus processos e valores à menor. d) Lógica de P&D Esse tipo de aquisição normalmente é utilizado por empresas de alta tecnologia ou biotecnologia que, ao invés de desenvolver internamente em seus setores de Pesquisa e Desenvolvimento, preferem comprar as tecnologias já desenvolvidas por outras empresas. O principal objetivo é alcançar uma posição de mercado de forma mais rápida. Como diz o presidente e CEO da Cisco, John Chambers, “se você não dispõe dos recursos para desenvolver um componente ou produto dentro de seis meses, terá que comprar o que precisa ou perderá a oportunidade” (BOWER, 2001, pp. 99). Do ponto de vista das empresas adquiridas, esse tipo de aquisição também tem lógica, pois recebem uma grande quantidade de recursos financeiros que possibilitam a manutenção do desenvolvimento de novas tecnologias. Além disso, elas sabem que, por serem normalmente muito menores, não têm como competir de forma igualitária. Então, ao invés de serem esmagadas pela concorrência, acabam se aliando às grandes empresas para sobreviverem. O grande desafio enfrentado pelas empresas adquirentes é a manutenção das pessoas mais importantes da adquirida. O conhecimento desses indivíduos é mais importante do que os produtos que eles desenvolvem. O verdadeiro ativo adquirido é o conhecimento. Por isso, é muito importante que exista alguma forma de manutenção dessas pessoas. Outro desafio é garantir que os funcionários da adquirente não atrapalhem a aquisição, principalmente com a síndrome do “not 22 invented here”, termo usado para descrever um comportamento de aversão à compra e uso de produtos já existentes, normas ou conhecimentos por causa de sua origem externa. Normalmente, é usado de forma pejorativa. As razões para não querer usar o trabalho dos outros são variadas, mas podem incluir o medo por falta de entendimento e a falta de vontade de valorizar o trabalho dos outros. e) Convergência industrial Esse tipo de aquisição, diferentemente das demais apresentadas anteriormente, que alteravam o relacionamento entre os diferentes players de uma indústria, “envolve a invenção de uma indústria ou de um modelo de negócios baseado numa hipótese não comprovada: a de que grandes sinergias podem ser alcançadas através da combinação de recursos de indústrias existentes, cujas fronteiras parecem estar desaparecendo” (BOWER, 2001, pp.100). O desafio deste tipo é maior do que os demais, pois o “sucesso não depende somente de como você compra e integra, mas também, e principalmente, da aposta que se faz a respeito das fronteiras da indústria” (BOWER, 2001, pp. 100). 2.2.3. Tipos de aquisição Muitas fusões e aquisições podem ser consideradas de sucesso. Lynch e Lind (2002) afirmam, a partir de suas pesquisas, que é possível identificar tipos de aquisições, e que algumas parecem ser mais fáceis de serem gerenciadas e apresentarem sucesso. Das pesquisas, surgiram duas dimensões – disparidade e goodwill/boa vontade – que, combinadas, podem facilitar a identificação de candidatas, o planejamento e o resultado da aquisição. Quando são organizadas em um gráfico com dois eixos, essas dimensões identificamos diferentes tipos de aquisição, assim como a abordagem que deve ser utilizada e a probabilidade de sucesso. Os autores definem disparidade entre os negócios como “o grau em que o modelo de negócio básico das empresas é diferente ou similar” (LYNCH & LIND, 2002, pp.6). Por exemplo, se uma agência de viagens compra uma seguradora, pode-se dizer que o grau de disparidade entre as duas é grande. Fusões e aquisições entre negócios com produtos, mercados e canais de distribuição 23 similares - disparidade baixa - tendem a ser mais bem sucedidas do que entre negócios muito diferentes. Já goodwill/boa vontade nos negócios é definido como “o prêmio pago” pela adquirente devido “às expectativas de lucros futuros pagos pela empresa adquirida” (LYNCH & LIND, 2002, pp.7). Alguns exemplos do que pode ser considerado são: cultura organizacional, qualidade do corpo gerencial, os conhecimentos contidos na empresa, e os relacionamentos com clientes e fornecedores. Analisando a disparidade e o goodwill/boa vontade através do “modelo de gerenciamento das fusões e aquisições” (Figura 2.3) pode-se identificar quatro tipos de aquisições: Aquisição planejada e próspera (The plan and prosper acquisition) Aquisição de retorno em longo prazo (The stand and hold acquisition) Aquisição de fusão e crescimento (The merge and grow acquisition) Aquisição de segmentação ou venda (The segment or sell acquisition) Com exceção da aquisição de segmentação ou venda, não existe um tipo melhor do que o outro. Eles são diferentes e, por isso, demandam abordagens diferenciadas para alcançarem o sucesso. Planejada e Próspera Retorno em longo prazo Fusão e Crescimento Segmentação ou Venda Alto Goodwill/ boa vontade Baixo Goodwill/ boa vontade Baixa Disparidade Alta Disparidade Figura 2.3 Modelo de Gerenciamento das Fusão/Aquisição. Adaptação de Lynch & Lind, 2002. 24 Lynch e Lind (2002) definiram cada um dos tipos da seguinte forma: a) Aquisição planejada e próspera (Alto goodwill/boa vontade / Baixa disparidade) Esse tipo de aquisição é caracterizado pela similaridade das indústrias, canais de distribuição e mercados de atuação das duas empresas. Já as práticas de gestão e as equipes de vendas apresentam expertises diferentes como, por exemplo, o relacionamento com os clientes, que é uma forma de criar valor para as empresas. Dessa forma, o planejamento adequado para a sucessão, a “mistura” de culturas diferentes e os incentivos para que as pessoas contribuam para o sucesso da aquisição são algumas estratégias que podem ser utilizadas. De forma resumida, como a disparidade entre as duas empresas é baixa, é importante identificar e reter o goodwill/boa vontade, pois é ele que garantirá o relacionamento com os clientes e a manutenção do know-how da empresa. b) Aquisição de retorno em longo prazo (Alto goodwill/boa vontade / Alta disparidade) Este tipo de aquisição pode ser entendido como uma compra de ações como forma de investimento de longo prazo. A principal preocupação da adquirente é encontrar formas efetivas de medição da evolução dos negócios, assim como meios de assegurar a transferência de conhecimento e a sucessão dentro da adquirida. Por se tratar da aquisição de uma empresa de sucesso, é importante que isso seja levado em consideração no momento em que a integração for pensada, pois a tentativa de integração total pode levar à redução ou destruição de valor. A mensagem deixada pelos autores é simples: “Não estrague o sucesso existente”. c) Aquisição de fusão e crescimento (Baixo goodwill/boa vontade / Baixa disparidade) Este tipo de aquisição é considerado como o tipo clássico, pois sua estratégia é ganhar market-share. A chave para o sucesso é a integração rápida e cuidadosa, além da velocidade com que as redundâncias são cortadas. O objetivo principal é 25 reduzir os gastos aos valores pré-aquisição enquanto busca-se a maximização das receitas. d) Aquisição de segmentação ou venda (Baixo goodwill/boa vontade / Alta disparidade) Este tipo é o menos desejado pelos executivos por duas razões. Primeiro, os gestores da aquisição têm pouca chance de alavancar seus conhecimentos do negócio. Segundo, a empresa adquirida oferece poucos conhecimentos e relacionamentos que possam ser úteis para o adquirente. Normalmente, este tipo de aquisição ocorre quando a compradora tem interesse em realizar uma integração vertical. Estes diferentes tipos de aquisição demandam estratégias distintas para serem bem sucedidas, porém elas estão fora do escopo de estudo deste trabalho. Já Haspeslagh e Jemison (1991) observaram em suas pesquisas que, na maioria das aquisições, há uma relação entre a estratégia da empresa e o oportunismo da possibilidade de aquisição. Em um extremo, encontram-se as aquisições “planejadas”, em situações onde há o planejamento sistemático, com uma estratégia bem definida resultante desse processo de planejamento ou de levantamento formal das possibilidades existentes no mercado. No outro extremo, há as aquisições “oportunistas”, impulsionadas pela oportunidade surgida no mercado, e não pela busca proativa, onde a justificativa do processo não leva a esclarecimento da estratégia. Os autores defendem que as aquisições diferem na questão de se tornarem verdadeiramente estratégicas ou não. Definem como aquisições estratégicas aquelas nas quais a justificativa do processo não sirva apenas para a aprovação da aquisição, “mas também para o esclarecimento da estratégia na qual a aquisição está contextualizada e da base em que a integração pode ser guiada” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.46). Sintetizam, em outras palavras, que “oportunismo no início é bom, contanto que a justificativa final esteja clara e definida” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.46). 26 2.3. INTEGRAÇÃO PÓS-AQUISIÇÃO Conforme destacam Haspeslagh e Jemison (1991), “enquanto há ingredientes comuns no processo, cada aquisição se apresenta aos gestores de uma maneira diferente e força uma escolha sobre a abordagem da integração” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.138). Há duas dimensões que auxiliam na escolha da abordagem da integração: sua relação com a empresa adquirida, ou seja, a natureza da interdependência que deve ser estabelecida entre as empresas para viabilizar a transferência esperada de capacitação estratégica, e a forma como se espera a criação de valor, isto é, como preservar intactas essas capacitações adquiridas logo após a aquisição. Elas são descritas a seguir. a) Necessidade de Interdependência Estratégica A criação de valor após a aquisição tende a ser um dos objetivos de uma empresa ao adquirir outra. Para que o processo de aquisição seja bem conduzido, devem ocorrer a análise, a negociação, a venda interna e, finalmente, o entendimento de que operando juntas geram um valor que não ocorreria caso não existisse a aquisição. Por outro lado, muitas vezes os gestores desse processo não dão a devida atenção à integração como um todo, “por causa das incertezas sobre os fundamentos do negócio adquirido, em função das diferenças organizacionais ou culturais, ou pelo medo de serem rejeitados” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.139). A transferência das capacitações estratégicas, essencial para a geração de valor, demanda a geração e a administração das interdependências entre as empresas. Os autores indicam, no entanto, que essa interação é dificultada pelos gerentes da empresa adquirida que, naturalmente, desejam manter suas identidades e formas de trabalho. Sendo assim, um fator determinante no processo de integração é a natureza da interdependência entre as empresas e como essadependência recíproca é gerenciada. A natureza da interdependência na aquisição depende da forma como o valor será criado. Como o valor pode ser criado de acordo com o tipo de capacitação transferida, isso pode ocorrer através do compartilhamento de recursos 27 operacionais, da transferência de habilidades funcionais ou da transferência de habilidades gerenciais. Ainda pode ocorrer através da combinação de benefícios sem transferência de capacitações, mas com benefícios puramente financeiros. A transferência das capacitações através do compartilhamento de recursos implica em um processo de dissolução total das fronteiras entre as áreas que serão compartilhadas pelas empresas. Dessa forma, o valor é criado através da combinação das duas entidades em nível operacional, de forma que praticamente se sobreponham e as duplicidades sejam eliminadas. A criação de valor pela transferência de habilidades funcionais ocorre de maneira diferente, já que as habilidades são inerentes a pessoas, grupos de pessoas, práticas e procedimentos. Ela pode acontecer pela transferência das pessoas nos limites das organizações ou, ainda, através do compartilhamento de informações, conhecimentos técnicos e funcionais entre as empresas. O valor também pode ser criado com a transferência de habilidades gerenciais através da melhora na prática estratégica ou operacional, de coordenação ou controle das atividades. Eles podem ocorrer de duas formas: envolvimento direto na tomada de decisão das empresas ou através da utilização de tecnologia, conceitos e processos de trabalho, uma da outra, de forma a melhorar a sua atividade operacional e administrativa. A combinação de benefícios, apesar de não ser uma forma de transferência de capacitações, pode também contribuir. Isso ocorre através da geração de benefícios econômicos ou de abrangência, que podem viabilizar outras atividades e acelerar o crescimento da empresa constituída. A pesquisa de Haspeslagh e Jemison (1991) sugere que, independente da variedade e quantidade de sinergias possíveis, o importante é reconhecer um dos tipos de transferência de capacitação como sendo a dominante na criação inicial de valor. É através dela que se poderá determinar o grau de interdependência estratégica necessária para que o processo de integração seja bem conduzido. b) Necessidade de Autonomia Organizacional Tão importante quanto o processo de transferência das capacitações estratégicas é a manutenção das mesmas durante e após o processo de integração. Entretanto, um dos paradoxos apresentados pelos autores foi que o próprio 28 recebimento das capacitações pode destruí-las. De acordo com seus estudos, “enquanto a transferência de capacitações requer diferentes graus de ruptura ou dissolução das fronteiras (entre as empresas), a preservação das capacitações requer proteção dessas fronteiras e, consequentemente, autonomia organizacional” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.142). O que ocorre nessas circunstâncias é que, em função das pressões por tomada de decisão e planejamento da integração, os gestores envolvidos no processo acabam comprometendo-se com determinadas atitudes futuras para conseguir a adesão e aceitação da aquisição pelos gestores da empresa adquirida. Muitas dessas atitudes, porém, podem não ser cumpridas em função da realidade encontrada ou ainda podem ser cumpridas e prejudicar o processo de integração. Haspeslagh e Jemison condenam essa prática. Eles defendem que as pessoas devam, sim, ser respeitadas, mas que isso não é sinônimo de fazer tudo o que elas desejam apenas para obter “aprovações” por parte da organização adquirida: “se os gestores perdem a noção de que a tarefa estratégica de uma aquisição é a criação de valor, eles podem conceder muito rapidamente a autonomia ou incorrer no perigo ‘sem mudanças - porém todas as sinergias esperadas’” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.143). Um dos maiores desafios de um gestor é saber lidar com a necessidade de autonomia organizacional pós-aquisição. Os autores sugerem três questões que podem facilitar a identificação do grau de autonomia mais adequado para cada situação (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.143): “(i) a autonomia organizacional é essencial para preservar a capacitação estratégica que compramos? (ii) caso positivo, que grau de autonomia deve ser permitido? (iii) em quais áreas especificamente a autonomia é importante?” A sugestão é que a autonomia deva ser dada à unidade adquirida se a sobrevivência das capacitações estratégicas nas quais a aquisição está baseada dependa da preservação da cultura organizacional de onde veio. Traduzindo, o importante não é o grau de diferença entre as culturas da empresa adquirente e da adquirida, e sim “se a manutenção dessas diferenças, em longo prazo, irá servir como um objetivo útil” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.144). 29 Há situações em que uma grande autonomia para a empresa é importante, quando a adquirente não tem experiência em certo negócio e as habilidades encontradas na adquirida são inseparáveis da cultura em que se encontram. Há outros casos em que, pelo contrário, as diferenças organizacionais não estão como no contexto de benefícios esperados. Existem ainda as situações mistas, onde a proteção é importante somente nas áreas ou unidades de negócio em que as capacitações são importantes. Os gerentes envolvidos nas aquisições dificilmente possuem informações para julgar a cultura da empresa a ser comprada e o grau de similaridade entre as organizações previamente à compra. Sendo assim, a abordagem sugerida é a de “dar um foco inicial nas capacitações estratégicas que devem ser mantidas” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.145). Esse foco facilita aos gerentes a distinção entre as necessidades estratégicas e as desejadas com a aquisição e, além disso, auxilia também na análise de custo-benefício de se dar ou não a autonomia à empresa comprada. 2.3.1. Tipos de abordagem da integração Analisando as dimensões apresentadas, Haspeslagh e Jemison (1991) sugerem três abordagens a elas relacionadas dentro do processo de integração. Ou seja, os tipos de abordagem da integração dependem do nível de autonomia organizacional demandada e da necessidade de dependência recíproca estratégica, conforme pode ser observado na Figura 2.4. 30 Preservação Simbiose ?? Absorção Necessidade de interdependência estratégica N ec es sid ad e de a ut on om ia Alta Al ta Baixa Ba ix a Figura 2.4 Tipos de integração pós-aquisição. Adaptação de Haspeslagh & Jemison, 1991. A análise dos níveis de autonomia organizacional e interdependência estratégica é bastante útil, visto que auxilia uma companhia a determinar as formas mais adequadas para a transferência e manutenção das capacitações entre as empresas. Ou seja, são decisões sobre a abordagem da integração que melhor se adequará dentro do cenário encontrado. Apenas um dos quadrantes não foi estudado por Haspeslagh e Jemison – destacado pelo símbolo ‘??’. Ele se refere a aquisições onde a empresa não possui interesse de integrar e criar valor com algo, exceto ganhos financeiros e compartilhamento de riscos. Por isso, foram denominadas atividades de “manutenção”. Será descrito o passo-a-passo sugerido por Haspeslagh & Jemison para uma integração focada na geração de valor em função de cada uma das abordagens. a) Absorção Aquisições com integração do tipo absorção são aquelas que possuem alta necessidade de interdependência estratégica, porém baixo grau de autonomia organizacional para atingi-la. Nesse caso, a integração implica numa consolidação total das operações, cultura e organização das duas empresas. 31 O objetivo dessa formade aquisição é dissolver quaisquer fronteiras, virtuais ou não, entre as empresas. A chave do sucesso dessa integração passa “a ser muito mais uma questão de tempo do que o quanto de integração deve ocorrer” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.147). Devido a esse fato, a empresa adquirente deve ter em mente suas convicções e habilidades para conseguir absorver o valor esperado das capacitações e, simultaneamente, ter cuidado com aspectos culturais que possam limitar e dificultar a não autonomia organizacional. b) Preservação Na preservação há uma alta necessidade de autonomia organizacional, porém baixa interdependência estratégica entre as empresas adquirente e adquirida. O mais importante nesse processo é a manutenção da fonte dos benefícios adquiridos intacta. Em aquisições do tipo preservação é importante identificar como o valor pode ser criado dado o preço pago pela transação. Nesse tipo de aquisição, a tendência natural é entender os benefícios como recursos, geralmente financeiros, angariados à empresa compradora pela comprada. Os autores destacam, porém, que, “nos casos bem sucedidos de (aquisições do tipo) preservação, o dinheiro não foi o principal fator” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.148). Segundo eles, o valor nessas aquisições pode ser traduzido como “educação”, ou seja, “criado através de uma série de interações que trouxeram mudanças positivas na ambição, tomada de risco e profissionalização do corpo gerencial da empresa adquirida” (HASPESLAGH & JEMISON, 1991, pp.148-149). c) Simbiose O processo de simbiose é dos mais complexos em termos de desafios gerenciais. Conforme pode ser visualizado na Figura 2.4, ele demanda tanto alto grau de interdependência estratégica como de autonomia organizacional, ou seja, a transferência das capacitações deve ocorrer, porém devem ser preservadas em contexto diferente do existente na empresa adquirente. Nesta situação, ambas as empresas continuam a existir e tornam-se reciprocamente dependentes. Esse processo leva tempo e exige cuidados, em função da dificuldade de se manter a cultura e a organização das empresas 32 enquanto as capacitações são transferidas. Para a integração do tipo simbiose ser bem sucedida, as empresas devem buscar extrair as qualidades originais uma da outra. 2.3.2. Gerenciamento da Integração Como é possível gerar valor através de uma aquisição? Julian Birkinshaw (1999), em seu artigo, afirma que a resposta para muitos managers é que a criação de valor se dá depois da formalização do negócio, através do processo de racionalização dos ativos, das atividades de integração e da mudança de cultura dos empregados. Mas qual desses processos deve ter a prioridade? Esse é um dos principais dilemas que a maioria dos managers envolvidos em uma aquisição deve enfrentar. Birkinshaw (1999) afirma que, nos últimos anos, a literatura sobre o processo de integração pós-aquisição apresenta um novo componente que é a velocidade. Não importa qual será a prioridade dos managers, desde que seja feito rapidamente. Ele cita diversos autores que falam sobre isso, entre eles está Feldman (1995, apud BIRKINSHAW, 1999) que diz que “esse é um período para movimentação rápida: o melhor momento para mudança é quando a mudança já está ocorrendo”. Já Galpin e Robinson (1997, apud BIRKINSHAW, 1999) dizem que “os adquirentes mais bem sucedidos são aqueles que se arriscam antes da reviravolta em detrimento da perda certeira por inatividade”. Smith e Quella (1995, apud BIRKINSHAW, 1999) afirmam que a integração pós-aquisição é “como arrancar um Band-Aid: pode ser demorado e dolorido, ou rápido e indolor”. Existe uma categoria especifica de aquisição que deve ser tratada de forma diferenciada: aquela em que o conhecimento da empresa adquirida é um ativo crítico. Nesse caso, um processo de integração lento e focado inicialmente na “integração das pessoas” é o mais propenso ao sucesso. O autor diz que as “aquisições de conhecimento intensivo devem ser controladas com mais cuidado” (BIRKINSHAW, 1999, pp.33), pois tratam com os profissionais que detém o conhecimento da empresa. Com foco nas empresas de conhecimento intensivo, o autor apresenta um framework para a integração. 33 2.3.2.1. Caminhos para a integração Embora uma distinção simples entre rápido e devagar possa ser utilizada para caracterizar a maioria dos processos de integração, Birkinshaw (1992) afirma que a realidade é mais complexa porque diversos processos ocorrem concomitantemente. Baseado nisso, o autor desenvolveu um framework em que o processo de integração possa seguir por dois objetivos distintos: a integração das tarefas e a integração das pessoas. A integração das tarefas se refere a como as atividades das duas empresas serão combinadas para gerar maior sinergia (adição de valor). Isso envolve a transferência de aptidões (capabilities) de uma empresa para a outra, e o compartilhamento dos recursos entre as duas. Tipicamente, envolve a racionalização das atividades, através de downsizing e da venda de ativos. Já a integração das pessoas se refere ao processo de gerar satisfação – e, em consequência, uma identidade compartilhada – entre os funcionários da nova empresa que se formou através da aquisição. No período imediatamente após a formalização da aquisição, a integração das pessoas deve evitar qualquer tipo de atitude negativa que a mudança e a incerteza possam trazer. Nos anos seguintes, esta integração tem como objetivo gerar uma cultura organizacional unificada. Birkinshaw (1999) diz que, muitas vezes, as duas formas de integração são conflitantes. Porém, o objetivo final das duas é muito claro (mesmo que difícil de ser alcançado): uma aquisição bem sucedida. Desta forma, a rota que será seguida para alcançar o objetivo, assim como os trade-offs de cada uma, são fontes de conflitos contínuos entre as pessoas responsáveis pelo processo de integração. A figura 2.5 apresenta o framework de integração das atividades e das pessoas. 34 Figura 2.5 Framework de Integração. Adaptação de Birkinshaw, 1999. O caminho “Low Road” é aquele que busca, inicialmente, a integração das atividades para alcançar as sinergias no processo. Somente em seguida é que a integração das pessoas com a nova organização é realizada. No caminho “High Road”, ao contrário do anterior, a busca inicial é pela integração das pessoas, sendo a integração das tarefas deixada para um segundo momento. Esse é um caminho mais demorado, pois trata das questões humanas antes das questões financeiras. Birkinshaw (1999) afirma que o caminho “Low Road” pode parecer mais curto, com a promessa de sinergias imediatas. Porém, se os gestores desconsiderarem os valores e expectativas dos funcionários, podem acabar criando um processo de integração mais demorado e com mais problemas. As empresas que decidem pelo “High Road”, por outro lado, abordam as dificuldades primeiramente das questões humanas e, depois que estas estão solucionadas, iniciam o processo de busca por sinergias. O foco da pesquisa do autor está na “High Road” e ele subdivide esse caminho em três fases distintas, conforme a Figura 2.6. 35 Figura 2.6 Fases do processo “High Road”. Adaptação de Birkinshaw, 1999. Fase 1. Ações Iniciais: os primeiros passos para reafirmar a importância dos funcionários da empresa adquirida e envolvê-los na tomada de decisão da nova organização são tomados pela gerência da empresa adquirente. Essa fase pode ser iniciada antes do fechamento do negócio e durar mais de seis meses depois da oficialização. As principais atividades nessa fase são: Criar uma liderança para a integração (pessoa