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^ c a p Í T U L O 13 J Personalidade D urante toda a sua angustiante jornada, Frodo Baggins, 0 herói hobbit da saga O Senhor dos Aneis, sabia que havia uma pessoa que jamais iria desapontá- lo: seu fiel e sempre alegre com p a nheiro Sam Gamgee. M esmo antes de deixa rem a am ada cidade natal, Frodo avisou a Sam que a jornada não seria fácil: “Vai ser muito perigoso, Sam. Já é perigoso agora. É bem provável que nenhum de nós dois volte.” “Se o senhor não voltar, então é certo que eu não voltarei”, disse Sam. “[Os elfos me dis seram] ‘Não o abandone!’ Abandoná-lo?, eu respondi. Isso nunca passou pela minha cabeça. Se ele subir até a Lua, eu vou com ele; e se quais quer daqueles cavaleiros negros tentar impedi- lo, terão que enfrentar Sam Gamgee.” (Tolkien, A Sociedade do Anel, p. 96). E assim foi! Mais tarde na história, quando ficou claro que Frodo teria que se aventurar pela pavorosa terra de M ordor sem 0 restante da sociedade do anel, foi Sam quem insistiu em acom p an h ar Frodo, acon tecesse 0 que acontecesse. Foi Sam quem levantou o espí rito de Frodo com can ções e h istórias da infância de ambos, e foi em Sam que Frodo se apoiou quando quase n ão podia m ais andar. Q uando Frodo foi tom ado pelo poder maléfico do anel que carregava, foi Sam quem impediu Frodo de sucumbir com pletam ente. E, no final, foi Sam quem possibilitou que Frodo chegasse com êxito ao fim da jornada. Sam Gamgee — o alegre, otim ista e em ocio nalm en te estável — n un ca vacilou em sua lealdade ou crença de que eles podiam supe rar a escuridão am eaçadora. O personagem Sam Gam gee de J. R. R. Tolkien, à medida que aparece e reaparece durante toda a trilogia, exibe a distinção e a coerência que definem a personalidade — padrão característico de pensar, sentir e agir de cada indivíduo. Segundo Dan McAdams e Jennifer Pais (2 0 0 6 ) , trata-se da “variação individual única do desenho evolucionário u niversal da n atu reza h u m a n a ” , que se expressa nos traços e na situação cultural de cada um . Os capítulos anteriores enfatizaram nossa sem elhança — com o todos nós evoluí mos, percebemos, aprendem os, lembramos, pensam os e sentim os. Este capítulo enfatiza nossa individualidade. Grande parte deste livro trata da persona lidade. Em capítulos anteriores, consideramos as influências biológicas sobre a personali dade, 0 desenvolvimento da personalidade ao longo da vida e os aspectos relacionados à personalidade com o aprendizagem, m otiva ção, em oção e saúde. Nos capítulos posterio res, estudaremos os transtornos de persona lidade e as influências sociais sobre ela. Neste capítulo, vamos com eçar com duas grandes teorias que se to rn aram parte do nosso legado. Essas duas perspectivas histo ricam ente significativas ajudaram a estabele cer o cam po da psicologia da personalidade e apresentaram algum as questões centrais para a pesquisa e o trabalho clínico atuais. • A teoria psicanalítica de Freud propôs que a sexualidade infantil e as m otivações inconscientes influenciam a personalidade. • A abordagem hum anista enfocou em nossa capacidade interior para o crescim ento e a autorrealização. Essas teorias clássicas, que oferecem pers pectivas m uito interessantes sobre a natureza h u m an a, são com p lem entadas pelo outro aspecto a ser abordado neste capítulo: novas pesquisas científicas mais focadas e realistas sobre aspectos específicos da personalidade. Os pesquisadores de hoje que investigam a personalidade estudam as dimensões básicas da personalidade, as raízes biológicas dessas d im en sões e a in te ra çã o en tre pessoa e ambiente. Também estudam a autoestima, 0 viés em proveito próprio (self-serving bias) ten dencioso e as influências culturais na percep ção do self. Estudam também a mente incons ciente — com descobertas que provavelmente deixariam o próprio Freud surpreso. personalidade padrão característico individual de pensar, sentir e agir. associação livre em psicanálise, um método de explorar o inconsciente em que a pessoa relaxa e diz o que lhe vem à mente, por mais triv ia l ou constrangedor que seja. A PERSPECTIVA PSICANALÍTICA Explorando o Inconsciente O s Teóricos Neofreudianos e Psicodinâmicos Avaliando os Processos Inconscientes Avaliando a Perspectiva Psicanalítica A PERSPECTIVA HUMANISTA Abraham Maslow e a Pessoa Autorrealizada Carl Rogers e a Perspectiva Centrada na Pessoa Avaliando o Self Avaliando a Perspectiva Humanista A PERSPECTIVA DO TRAÇO Explorando os Traços Avaliando os Traços O s Cinco Grandes Fatores Avaliando a Perspectiva do Traço Pensando Criticamente Sobre: Como Ser um Astrólogo ou Quiromante de “Sucesso” A PERSPECTIVA SOCIAL- COGNITIVA Influências Recíprocas Controle Pessoal Em Foco: Rumo a uma Psicologia Mais Positiva Avaliando o Comportamento em Situações Avaliando a Perspectiva Social-Cognitiva EXPLORANDO O SELF O s Benefícios da Autoestima Viés em Proveito Próprio (Self-Serving Bias) Sigmwid Freud. 1856-1939 "Eu era o único trabalhador em um novo campo." psicanálise a teoria da personalidade de Freud que atribui pensamentos e ações a motivos e conflitos inconscientes; técnicas utilizadas no tratamento de transtornos psicológicos procurando expor e interpretar tensões inconscientes. inconsciente de acordo com Freud, um reservatório de pensamentos, desejos, sentimentos e memórias inaceitáveis, na maioria dos casos. De acordo com psicólogos contemporâneos, processamento de informações sobre as quais não temos consciência. A Perspectiva Psicanalítica 1: Qual era a visão de Freud sobre a personalidade e seu desenvolvimento? AMADO OU ODIADO, SIGMUND Freud influenciou pro fundam ente a cultura ocidental. Pergunte a 100 pessoas na rua o nom e de um notável psicólogo falecido, sugere Keith Stanovich (1 9 9 6 , p. 1 ), e “Sigmund Freud será o mais citado”. Na m ente popular, Freud é para a história da psicologia o que Elvis Presley é para a história do rock. A influência de Freud se estende pelas interpretações de livros e de filmes, na psi quiatria e na psicologia clínica. Então, quem foi Freud, e quais foram seus ensinam entos? Muito antes de entrar para a University of Viena em 1873, o jovem Sigmund Freud mostrou sinais de independência e bri lhantismo. Tinha um a mem ória prodigiosa e gostava tanto de ler peças teatrais, poesia e filosofia que certa vez contraiu em um a livraria um a dívida além de suas posses. Na adolescência, quase sempre fazia a refeição n otu rn a em seu pequenino quarto, para não perder tempo de estudo. Freud frequentou a escola de medicina e, depois de formado, m ontou um a clínica particular, especializando-se em transtornos nervosos. Logo, porém, deparou-se com pacientes cujos transtornos não faziam sentido do ponto de vista neurológico. Por exem plo, um paciente perdera todas as sensações em um a das mãos — con tudo, não há nervo sensitivo que, danificado, deixaria a mão inteira dormente e nada mais. A busca de Freud por um a causa para tais transtornos levou sua mente a um a direção destinada a m udar o entendimento hum ano sobre si mesmo. Explorando o Inconsciente Será que alguns transtornos neurológicos podem ter causas psicológicas em vez de fisiológicas? Essa pergunta levou Freud à “descoberta” do inconsciente. A partir dos relatos pessoais de seus pacientes, ele concluiu que a perda de sensibilidade na mão de um a pessoa poderia ser causada pelo medo de tocar os órgãos genitais; que a cegueira ou a surdez inexplicáveis poderiam ser causadas por não desejar ver ou ouvir algo que despertasse intensa angústia. Inicialmente, Freud pensou que o método da hipnose poderia abrir a porta para o inconsciente, mas os pacientes apresentaram uma capacidade desigual para a hipnose. Voltou-se então para a associação livre, simples m ente solicitando ao paciente para relaxar e dizer o que lhe viesse à mente, não im portandoo quanto fosse constrange dor ou trivial. Freud supôs que um a fileira de dominós m en tais havia caído desde o passado distante de seus pacientes até o inquietante presente deles. A associação livre, acreditava, permitia-lhe seguir essa fileira de volta, produzindo um a linha de pensam ento que levaria ao inconsciente do paciente, recu perando e libertando lem branças inconscientes dolorosas, quase sempre da infância. Freud denom inou essa teoria e as técnicas associadas de psicanálise. Um elemento básico na concepção de Freud era o de que a m ente fica, na m aioria dos casos, escondida (FIGURA 1 3 .1 ). Nossa percepção consciente seria a parte do iceberg que flutua acima da superfície. Abaixo da superfície, ficaria a região inconsciente, bem maior, contendo pensam entos, desejos, sentim entos e lem branças. Armazenamos tem porariam ente alguns desses pensam entos em um a área pré-consciente, da qual podemos recuperá-los para a percepção consciente. Um dos maiores interesses de Freud era a grande quantidade de paixões e pensam entos que, segundo ele, nós recalcamos, ou bloqueamos de modo enérgico da nossa consciência, porque seriam por demais perturbadores para serem admitidos. Freud acreditava que, embora não estejamos conscientes deles, esses sentim entos e ideias inquietantes exercem sobre nós um a influência poderosa. Para ele, nossos impulsos não reconhe cidos se autoexpressam em formas disfarçadas — o trabalho que escolhemos, as crenças que alim entam os, nossos hábitos diários, nossos sintom as perturbadores. Mente consciente Pré-consciência (fora da consciência, mas acessível) Mente inconsciente > F IG U R A 13.1 A ideia de Freud sobre a estrutura da mente Os psicólogos adotaram a imagem de um iceberg para ilustrar a ideia freudiana de que a mente está quase que totalmente oculta sob a superfície da consciência. Note que o id é totalmente inconsciente, mas o ego e o superego operam tanto consciente quanto inconscientemente. Diferentemente das partes de um iceberg congelado, no entanto, o id, o ego e o superego interagem. Para o determinista Freud, nada era acidental. Ele defendia que podia vislumbrar o inconsciente infiltrando-se não só atra vés das associações livres, crenças, hábitos e sintomas das pes soas, mas tam bém de seus sonhos e seus atos falhos, falados e escritos. Ele exemplificou com o caso de um paciente com problemas financeiros que, não querendo tom ar pílulas (pills), disse: “Por favor, não me dê contas (bilis), porque não posso engoli-las.” Da m esm a form a, Freud considerava as piadas expressões das tendências sexuais e agressivas recalcadas, e o sonho, a “estrada real para o inconsciente”. O conteúdo lem brado dos sonhos (seu conteúdo m anifesto) era a expressão censurada de desejos inconscientes de quem sonha (o conteúdo latente dos sonhos). Ao analisar os sonhos das pessoas, Freud buscava os conflitos interiores de seus pacientes. Estrutura da Personalidade Na perspectiva de Freud, a personalidade hum ana — incluindo suas emoções e seus esforços — origina-se de um conflito entre moção (impulse) e restrição — entre nossos impulsos biológicos agressivos em busca do prazer e nossos controles sociais inter nalizados sobre esses impulsos. Freud sustentava que a perso nalidade era o resultado de nossos esforços no sentido de resol ver esse conflito básico — para expressar essas moções ( impulses) de modo a produzir satisfação sem trazer também culpa e puni ção. Freud teorizou que os conflitos estão centrados em três sis temas que interagem: id, ego e superego (FIGURA 13.1). O id é um reservatório de energia psíquica inconsciente em luta constante para satisfazer os impulsos básicos para sobreviver, reproduzir e atacar. O id opera sobre o princípio do prazer: busca gratificação imediata. Para entender um a pessoa dominada pelo id, pense nos recém -nascidos que berram por satisfação no m om ento em que sentem necessidade, nem um pouco preocupados com as condições e demandas do mundo lá fora. O u pense nas pessoas que têm um a perspectiva de tempo presente em vez de futuro — aquelas que preferem se divertir agora a sacrificar o prazer de hoje pelo sucesso e feli cidade futuros. Tais pessoas com mais frequência fazem uso de tabaco, álcool e outras drogas (Keough et al., 1 9 9 9 ). À m edida que o ego se desenvolve, a crian ça pequena aprende a enfrentar o m undo real. O ego, operando sobre o princípio da realidade, busca satisfazer os impulsos do id de maneiras realistas que trarão prazer a longo prazo. (Imagine o que aconteceria se, desprovidos de ego, expressássemos nos sos impulsos agressivos ou sexuais não recalcados sempre que os sentíssem os.) O ego con tém nossas percepções, nossos pensam entos, nossos julgam entos e nossas m em órias par cialm ente conscientes. C om eçando a atuar por volta dos 4 ou 5 anos, teorizou Freud, o ego de um a criança reconhece as demandas do supe rego recém -em ergido, a voz de nossa bússola m oral (a cons ciên cia) que força o ego a considerar não só o real m as o ideal. O superego se con centra som ente em com o a pessoa deve se com portar. Luta pela perfeição, julgando as ações e produzindo sentim entos positivos de orgulho ou sentim en tos negativos de culpa. Alguém que tenha um superego extre mam ente forte pode ser virtuoso, porém, ironicam ente, opri mido pela culpa; outra pessoa que tenha um superego fraco pode ser autoindulgente e impiedosa. id contém um reservatório de energia psíquica inconsciente que, de acordo com Freud, luta para satisfazer impulsos sexuais e agressivos básicos. O id opera com base no princíp io d o prazer, exigindo gratificação imediata. ego a parte “executiva” e consciente da personalidade que, de acordo com Freud, serve de mediadora entre as exigências do id, do superego e da realidade. O ego opera com base no princíp io d a rea lid ad e , satisfazendo os desejos do id de maneira a obter o prazer de maneira realista, em vez de dor. superego a parte da personalidade que, de acordo com Freud, representa ideais internalizados e fornece padrões para julgamento (a consciência) e futuras aspirações. Com o as demandas do superego quase sempre são opos tas às do id, o ego luta para reconciliar os dois. É o “execu tivo” da personalidade, mediando as dem andas impulsivas do id, as demandas restritivas do superego e as demandas da vida real do m undo exterior. Se a casta Jane se sentir atraída por John, ela pode satisfazer tan to o id quanto o superego com o, por exemplo, entrando para um a organização volun tária da qual John participa regularmente. Desenvolvimento da Personalidade A análise das histórias de seus pacientes convenceu Freud de que a personalidade se forma durante os primeiros anos de vida. Ele concluiu que as crianças passam por um a série de fases psi cossexuais, durante as quais as energias do id que buscam o prazer ficam concentradas em áreas distintas do corpo sensíveis ao prazer denominadas zonas erógenas (TABELA 13.1). Freud acreditava que, durante a fa se fá lica , os m eninos buscam a estim ulação genital e desenvolvem tan to desejo sexual inconsciente pela m ãe quanto ciúm e e ódio pelo pai, a quem consideram rivais. Devido a esses sentim entos, os m eninos supostam ente tam bém sentem culpa e um medo oculto da punição, talvez por castração, de parte do pai. Freud deu a esse conjunto de sentim entos a denom inação com plexo de Édipo — segundo a lenda grega de Édipo, que, sem saber, m atou o pai e casou-se com a mãe. Alguns psicanalis tas acreditam que as meninas sofrem de um com plexo para lelo cham ado complexo de Electra. As Fases Psicossexuais de Freud Fase Foco Oral (0-18 meses) Prazer centralizado na boca - sugar, morder, mastigar Anal (18-36 meses) Prazer voltado para aliviar os intestinos e a bexiga; enfrentamento de demandas pelo controle Fálica (3-6 anos) Zona de prazer nos genitais; lidando comsentimentos sexuais incestuosos Latência Sentimentos sexuais latentes (6 anos - puberdade)"Sei como é difícil para você botar comida na sua família." Genital Maturação dos interesses sexuais (puberdade em diante) As crianças acabam por enfrentar esses sentimentos am ea çadores, disse Freud, reprim indo-os e tentando se identificar (tentando ser parecidas) com o genitor rival. É com o se algo dentro da criança decidisse: “Se você não pode vencê-lo (o genitor do m esm o sexo), junte-se a ele.” Por esse processo de identificação, o superego das crianças ganha força, à medida que elas incorporam m uitos dos valores dos pais. Freud acre ditava que a identificação com o genitor do m esm o sexo for necia o que os psicólogos hoje cham am de identidade degen ero — nosso senso de ser m acho ou fêmea. Freud supôs que as relações que estabelecemos na prim eira infância — especial m ente com pais e cuidadores — influenciam o desenvolvi m ento de nossa identidade, personalidade e fragilidades. Na perspectiva de Freud, os conflitos não resolvidos durante as fases iniciais da psicossexualidade podem vir à ton a na form a de com portam ento desadaptado no adulto. Em qual quer ponto das fases oral, anal ou fálica, o conflito forte pode bloquear, ou fixar, as energias da pessoa na busca do prazer naquela fase. Por exemplo, Freud acreditava que as pessoas supersatisfeitas ou privadas oralm ente (por desmame precoce ou abrupto) podem se fixar na fase oral. Os adultos com fixa ção na fase oral podem, segundo ele, exibir ou um a depen dência passiva (com o a de um bebê em am am entação) ou u m a negação exagerada dessa dependência — agindo com dureza ou exibindo um sarcasm o mordaz. O u podem ainda continuar buscando gratificação oral no fum ar ou com er em excesso. Dessa m aneira, sugeriu Freud, a personalidade se form a em tenra idade. fases psicossexuais as fases de desenvo lv im ento in fan til (oral, anal, fálica, la tência, gen ita l) durante as quais, de acordo com Freud, as energias que buscam satisfazer o prazer do id concentram -se em zonas erógenas distintas. com plexo de Édipo de acordo com Freud, o desejo sexual do filh o pela mãe e os sentim entos de ciúmes e ó d io pe lo pai rival. id en tificação o processo segundo o qual, de acordo com Freud, as crianças incorporam os valores dos pais no desenvo lv im ento de superegos. fixação de acordo com Freud, foco constante de energias que buscam o prazer em uma fase psicossexual anterior, na qual os con flito s não foram resolvidos. Mecanismos de Defesa 2 : Como Freud achava que as pessoas se defendiam contra a angústia? Freud afirm ou que a angústia é o preço que pagam os pela entrada na civilização. Na condição de membros de grupos sociais, devemos controlar nossos impulsos sexuais agressi vos e não os realizar. Mas às vezes o ego tem e perder o con trole dessa guerra interna entre as demandas do id e as do superego, e o resultado é a nuvem escura da ansiedade des focada, que nos deixa inquietos m as sem saber o porquê. Freud propôs que o ego se protege com mecanismos de defesa. Essas táticas reduzem ou redirecionam a angústia de várias formas, mas sempre distorcendo a realidade. Eis aqui sete exemplos. • O recalque expulsa da consciência os pensam entos e os sentim entos que despertam angústia. Segundo Freud, o recalque é a base de todos os outros m ecan ism os de defesa, cada um dos quais disfarça os impulsos am eaçadores e os impede de alcançar a consciência. Freud acreditava que o recalque explica por que não nos lem bramos do desejo que sentíam os na infância pelo genitor do outro sexo. Contudo, tam bém defendia que o recalque é com frequência incom pleto, que os impulsos recalcados transbordam pela simbologia dos sonhos e pelo ato falho. • A regressão nos permite retroceder a um a fase de desenvolvimento anterior e mais infantil. Assim, quando enfrenta os angustiantes primeiros dias de escola, um a criança pode regredir ao conforto oral de chupar o dedo. Os m acacos jovens, quando ansiosos, retrocedem à fase infantil de se agarrarem à m ãe ou uns aos outros (Suom i, 1 9 8 7 ). M esmo os calouros universitário podem ansiar pela segurança e pelo conforto de casa. • Na form ação reativa, o ego inconscientem ente faz os impulsos inaceitáveis parecerem seus opostos. A cam inho da consciência, a proposição inaceitável “Eu o odeio” torna-se “Eu o am o”. A timidez torna-se ousadia. Os sentim entos de inadequação tornam -se fanfarronices. • A projeção disfarça os impulsos ameaçadores, atribuindo-os aos outros. Assim, “Ele não confia em m im ” pode ser a projeção do verdadeiro sentim ento “Eu não confio nele” ou “Eu não confio em m im m esm o”. Um ditado salvadorenho capta a ideia: “O ladrão acha que todo m undo é ladrão.” • A racionalização ocorre quando inconscientem ente geramos explicações autojustificadas para esconder de nós mesm os os verdadeiros motivos de nossas ações. Assim, os bebedores habituais podem dizer que bebem com os amigos “apenas para serem sociáveis”. Estudantes que não conseguem estudar podem racionalizar: “Só o trabalho sem lazer torna João [ou Joana] um a pessoa sem graça.” m ecanism os de defesa na teoria psicanalítica, os m étodos de p ro teção ao ego que reduzem a angústia d is to rcendo inconscientem ente a realidade. recalque na teo ria psicanalítica, o m ecanism o de defesa básico que tira da consciência pensamentos, sentim entos e m em órias que geram angústia. regressão m ecanism o de defesa psicanalítica em que um ind ivíduo, d ian te de situações angustiantes, regride para uma fase psicossexual mais in fantil, em que parte da energia psíquica perm anece fixada. fo rm ação reativa m ecanism o de defesa psicanalítica em que o ego inconscien tem ente transform a im pulsos inaceitáveis em seus opostos. Assim, as pessoas podem expressar sentim entos que são opostos aos sentim entos inconscientes que geram a angústia. p ro jeção m ecanism o de defesa psicanalítica em que as pessoas disfarçam seus p róprios im pulsos am eaçadores a tribu indo -os a terceiros. rac ionalização m ecanism o de defesa que oferece explicações au to justificadas em lugar dos verdadeiros m otivos inconscientes e mais am eaçadores das nossas ações. "A dama protesta demais, penso eu.” William Shakespeare, Hamlet, 160G • O deslocamento, de acordo com Freud, desvia os impulsos sexuais ou agressivos da pessoa para um objeto ou pessoa que é psicologicamente mais aceitável do que aquela que despertou os sentim entos. Crianças que tem em expressar raiva contra os pais podem deslocar essa raiva chutando o anim al de estim ação da família. Estudantes contrariados com o resultado de um a prova podem descontar no colega. • A negação protege a pessoa contra eventos reais excessivamente dolorosos para serem aceitos, pela rejeição de determinado fato ou de sua gravidade. Pacientes à beira da m orte podem negar a gravidade da própria doença. Os pais podem negar o com portam ento desviante do filho. Cônjuges podem negar provas de que estão sendo traídos. Observe que todos esses m ecanism os de defesa funcionam indiretam ente e inconscientem ente, reduzindo a angústia ao disfarçar nossos impulsos ameaçadores. Assim com o o corpo inconscientem ente se defende contra as doenças, da mesm a m an eira , acred itava Freud, o ego in co n scien tem en te se defende contra a angústia. des locam ento m ecanism o de defesa psicanalítica que transform a im pulsos sexuais ou agressivos em relação a um ob je to ou pessoa mais aceitáveis ou menos ameaçadores, com o acontece quando red irecionam os a raiva para um canal mais seguro. negação m ecanismo de defesa no qual as pessoas se recusam a acred ita r ou mesmo a perceber realidades dolorosas. inconscien te co le tivo conce ito de Carl Jung de reservatório com partilhado e he red itá rio de traços de m em ória dah istória da nossa espécie. teste p ro je tiv o teste de personalidade, com o o de Rorschach ou TAT, que fornece estím ulos am bíguos criados para gerar pro jeções da dinâm ica in terna do indivíduo. Teste de Apercepção Tem ática (TAT) Teste p ro je tivo em que as pessoas expressam seus sentim entos e interesses pessoais por m eio das h istórias que criam sobre cenas ambíguas. “A m u lh er... reconhece □ fato de sua castração e, com isso, a superioridade do homem e sua própria inferioridade; mas ela se rebela contra essa situação indesejada." Sigmund Freud, Sexualidade Feminina, 1931 ANTES DE PROSSEGUIR... >- P ergunte a Si M esmo Como você descreveria a sua personalidade? Que características formam padrões típicos que refletem sua forma de pensar, sentir e agir? > Teste a Sí Mesm o 1 Quais são alguns mecanismos de defesa importantes, de acordo com Freud, e contra o que eles atuam? As respostas às questões Teste a Si Mesmo podem ser encontradas no Apêndice B, no final do livro. Os Teóricos Neofreudianos e Psicodinâmicos 3 : Quais das ideias de Freud foram aceitas ou rejeitadas por seus seguidores? Os escritos de Freud eram controversos, mas logo atraíram seguidores, em sua m aioria médicos jovens e ambiciosos que form aram um círculo em torn o do seu líder voluntarista. Esses psicanalistas pioneiros e outros, a quem agora ch am a mos neofreudianos, aceitavam as ideias básicas de Freud: as estruturas do id, ego e superego da personalidade; a im por tân cia do in con scien te; a form ação da personalidade na infância; e a dinâm ica da angústia e dos m ecanism os de defesa. Mas se afastavam das ideias de Freud em duas ques tões im portantes. Em primeiro lugar, davam m aior ênfase ao papel da m ente consciente quanto à interpretação da expe riência e à relação com o ambiente. Em segundo, questiona vam se o sexo e a agressão seriam m otivações monopoliza- doras. Em vez disso, destacavam m otivações mais nobres e as interações sociais. Os exemplos a seguir ilustram essas tendências. Alfred Adler e Karen Horney concordavam com Freud que a infância é im portante. Mas acreditavam que as tensões sociais, e não as tensões sexuais, da infância são cruciais para a form ação da personalidade (Ferguson, 2 0 0 3 ) . O próprio Adler (que propôs a ideia ainda popular de complexo de infe rioridade) lutou para vencer as doenças e os seus acidentes da infância, e afirmava que m uito do nosso com portam ento é induzido por esforços para superar os sentim entos de infe rioridade da infância, sentimentos que acionam nossos esfor ços em busca de superioridade e poder. Horney afirmou que a angústia da infância, causada pelo senso de desam paro, provoca nosso desejo de am or e segurança. Karen H orney opôs-se às suposições de Freud de que as mulheres têm supe rego fraco e sofrem “inveja do pênis”, e ten tou equilibrar o viés que detectou nessa visão m asculina da psicologia. D iferentem ente de outros neofreudianos, Carl Jung — o discípulo de Freud que se tornou dissidente — atribuiu m enor ênfase aos fatores sociais e con cord ou com Freud que o inconsciente exerce um a influência poderosa. Mas, para Jung, o inconsciente contém mais do que nossos pensam entos e sentim entos recalcados. Ele sustentava que éram os, tam bém , dotados de um inconsciente coletivo, um reservatório com um de imagens derivadas das experiências universais da nossa espécie. Jung afirmou que o inconsciente coletivo expli cava por que, para muitas pessoas, as preocupações espiritu ais são profundam ente arraigadas e por que pessoas em dife rentes culturas com partilham certos m itos e im agens, tal com o a m ãe com o símbolo de nutrição. (O s psicólogos atu ais rejeitam a ideia de experiências herdadas. M uitos acredi tam , porém, que nossa história evolucionista com partilhada m oldou algumas disposições universais.) Freud m orreu em 1 9 3 9 . Desde en tão, algumas de suas ideias foram incorporadas à teoria psicodinâm ica. “A m aioria dos teóricos e terapeutas contem porâneos não com partilha a ideia de que o sexo é a base da personalidade”, observa Drew W esten (1 9 9 6 ) . Eles “não falam sobre ids e egos, e não andam por aí classificando seus pacientes com o personalidades orais, anais ou fálicas”. O que adm item , tal com o Freud, é que m uito de nossa vida m ental é inconsciente, que, com fre quência, lutam os com conflitos internos entre nossos dese jos, nossos medos e nossos valores e que a infância molda nossa personalidade e nossos modos de nos ligarmos às outras pessoas. Avaliando os Processos Inconscientes 4 : O que são testes projetivos, e como são usados? As ferram entas de avaliação da personalidade são úteis para os estudiosos da personalidade ou terapeutas. Essas ferra m entas diferem porque são adaptadas a teorias específicas. Com o os clínicos que trabalham segundo a tradição freudiana tentam avaliar as características da personalidade? A primeira exigência seria ter um a espécie de estrada para o inconsciente, para identificar rem iniscências de experiên cias da primeira infância — algo que vai além da superfície e revela conflitos e impulsos ocultos. (Lembre-se de que Freud acreditava que a associação livre e a interpretação de sonhos podiam revelar o inconsciente.) Os psicanalistas descartam as ferram entas de avaliação objetiva, tais com o questionários do tipo concordo-discordo ou falso-verdadeiro, pois consi deram que elas m eram ente tocam a superfície consciente. Os testes projetivos visam a fornecer esse “raio-X psico lógico” ao apresentar um estímulo ambíguo e, depois, soli citar aos participantes que o descrevam ou que contem um a história sobre ele. Henry M urray introduziu o Teste de Aper- cepção Temática (TAT), no qual as pessoas viam quadros com figuras ambíguas e depois construíam histórias sobre elas (FIGURA 1 3 .2 ). Um uso da narração de histórias tem sido avaliar a m otivação de realização. Ao observar um jovem em devaneio, aqueles que im aginam o que ele está fan ta siando sobre um a realização é visto com o projetando seus próprios objetivos. Teste de Rorschach O teste projetivo mais amplamente utilizado — um conjunto de 10 pranchas com borrões de tin ta criado por Hermann Rorschach; busca identificar os sentimentos das pessoas por meio da análise de suas interpretações desses borrões. “0 Teste de Rorschach está totalm ente desacreditado... Eu o chamo de 'Drácula' dos testes psicológicos, porque ninguém conseguiu ainda cravar uma estaca no coração dessa maldição.” Carol Travis, "Mind Games: Psychological Warfare Between Therapists and Scientists", 2003 O teste mais usado e mais conhecido é o teste Rorschach, em que as pessoas descrevem o que veem em um a série de pranchas com borrões de tinta (FIGURA 1 3 .3 ). O psiquia tra suíço H erm ann Rorschach elaborou-o a partir de um jogo infantil em que ele e os colegas jogavam tinta sobre o papel, dobravam-no e depois contavam o que viam na m ancha resul tante (Sdorow, 2 0 0 5 ) . Você vê animais predadores ou armas? O exam inador pode deduzir que tem os tendências à agressi vidade. Mas será essa suposição razoável? As respostas dos clínicos e críticos diferem. Alguns clíni cos apreciam o Rorschach, oferecendo até m esm o avaliações nele baseadas a juizes sobre o potencial de violência de cri m inosos. O utros o consideram um a ferram enta de diagnós tico, um a fonte de orientações sugestivas, um meio de que brar o gelo inicial de um tratam ento ou ainda um a técnica de entrevista reveladora. A Sociedade de Avaliação da Perso nalidade (2 0 0 5 ) recom enda o “uso responsável” do teste (que não incluiria inferir abuso sexual infantil no passado). E, em resposta às críticas passadas de resultados e interpretações dos testes (Sechrest et al., 1 9 9 8 ), foi desenvolvida um a fer ram enta de codificação e interpretação, assistida por com pu tador e baseadaem pesquisa, que almeja m elhorar a con cor dância entre os avaliadores e aum entar a validade do teste (Erdberg, 1 990 ; Exner, 2 0 0 3 ) . Mas a evidência é insuficiente para os críticos, que insis tem que o teste de Rorschach não é um a ressonância m agné tica em ocional. Eles argum entam que som ente poucas das muitas avaliações derivadas do teste, tais com o as de hostili "Nós não vemos as coisas como elas são; vemos as coisas como somos." □ Talmude > F IG U R A 13.2 Teste TAT O psicólogo pressupõe que as esperanças, os medos e os interesses expressos por este menino nas descrições de uma série de quadros com imagens ambíguas no Teste de Apercepção Temática (TAT) são projeções de seus sentimentos mais íntimos. > F IG U R A 13.3 O Teste de Rorschach Nesse teste projetivo, as pessoas dizem o que veem em uma série de pranchas com borrões de tinta simétricos. Alguns que usam esse teste confiam que a interpretação de estímulos ambíguos revelará aspectos inconscientes da personalidade do participante. Outros o usam para quebrar o gelo inicial de uma terapia ou para completar outras informações. dade e ansiedade, dem onstraram ser válidas (W ood, 2 0 0 6 ) . Além disso, esses críticos afirmam que os testes não são con fiáveis. As avaliações de borrões de tinta diagnosticam muitos adultos normais com o patológicos (W ood et al., 2 0 0 3 , 2 0 0 6 ) . Técnicas alternativas de avaliação projetiva têm resultados pouco melhores. “Mesmo os profissionais mais experientes”, alertaram Scott Lilienfeld, James Wood e Howard Garb (2 0 0 1 ) , “podem ser enganados pela intuição e confiança em ferra m en tas que n ão ap resen tam forte evidência de eficácia. Quando um substancial corpo de pesquisa dem onstra que as velhas intuições estão erradas, está na hora de adotar novas maneiras de pensar”. O próprio Freud provavelmente se sen tiria desconfortável em tentar diagnosticar pacientes com base em testes e se m ostraria mais interessado nas interações tera- peuta-paciente que acontecem durante a aplicação do teste. Avaliando a Perspectiva Psicanalítica Evidências Contraditórias das Pesquisas Modernas 5.* Qual a visão dos psicólogos contemporâneos sobre Freud e o inconsciente? Criticam os Freud a partir de um a perspectiva do início do século XXI, um a perspectiva que por si só está sujeita a revi são. Freud não tinha acesso às pesquisas sobre neurotrans missores ou DNA, ou a tudo que aprendem os desde então sobre o desenvolvimento, o pensam ento e as em oções das pessoas. Assim, dizem os admiradores de Freud, criticar suas teorias com parando-as com os conceitos atuais é com o co m parar o Modelo T, de Henry Ford, com os carros híbridos atu ais. (C om o é tentador julgar as pessoas no passado a partir de nossa perspectiva no presente.) Mas tanto os admiradores quanto os críticos de Freud con cordam que a pesquisa recente contradiz m uitas de suas ideias específicas. Os psicólogos do desenvolvimento consideram nosso desenvolvimento contínuo, não fixado na infância. Eles duvidam que as redes neurais dos bebês estejam am adureci das o suficiente para sustentar o traum a em ocional previsto por Freud. Alguns pensam que Freud superestimou a influência parental e subestim ou a influência (e o abuso) dos pares. Também questionam a ideia de Freud de que a consciência e a identidade de gênero se form am enquanto a criança resolve o complexo de Edipo aos 5 ou 6 anos. Form am os nossa iden tidade sexual mais cedo e nos tornam os fortem ente m asculi nos ou femininos mesmo sem a presença do genitor do mesmo sexo. As ideias de Freud sobre a sexualidade infantil originam- se de seu ceticism o em relação às histórias de abuso sexual infantil contadas por suas pacientes — histórias que alguns estudiosos acreditam que ele atribuiu aos seus próprios dese jos sexuais infantis e conflitos (Esterson, 2 0 0 1 ; Powell e Boer, 1 9 9 4 ). Hoje, entendemos com o o questionamento de Freud pode ter criado falsas m em órias, e tam bém sabemos que o abuso sexual na infância de fato ocorre. C om o vim os no Capítulo 3, novas explicações para os sonhos disputam com a crença de Freud de que eles disfar çam e realizam os desejos. E os atos falhos podem ser expli cados com o com petição entre escolhas verbais semelhantes em nossa rede de m em ória. Alguém que diz “N ão quero fazer isso — é muito am orrecido” pode estar simplesmente m istu rando am olação com aborrecido (Foss e Hakes, 1 9 7 8 ). Os pes quisadores encontram pouco apoio para a ideia de Freud de que os m ecanism os de defesa disfarçam a agressividade e os impulsos sexuais (em bora nossa ginástica cognitiva realmente trabalhe para proteger nossa autoestim a). A história não apoia outra das ideias de Freud — a ideia de que o recalque dos con teúdos sexuais causa transtornos psicológicos. Desde o tempo de Freud até o nosso, a repressão sexual diminuiu; os trans tornos psicológicos não. “Muitos aspectos da teoria freudiana estão de fato desatualizados, e deveriam estar: Freud faleceu em 1939, e resistiu à realização de revisões m ais abrangentes.” Drew Westen, psicólogo (1998) “Por sete anos e meio, trabalhei junto com o Presidente Reagan. Fizemos avanços. Cometemos erros. Tivemos sexo... ops... retrocessos." George W. Bush, 190B “Lembro perfeitam ente do seu nome, mas não consigo lem brar do seu rosto." W.A. Spooner, 1044-1930, professor de Oxford, famoso por seus lapsos lingüísticos (spoonerismosj O Recalque É um Mito? Toda a teoria psicanalítica baseia-se na suposição de Freud de que a m ente hum ana com frequência recalca as experiências dolorosas, banindo-as para o inconsciente, até que ressurjam, com o livros há muito esquecidos em um sótão empoeirado. Se recuperarm os e resolvermos as lem branças dolorosamente recalcadas de nossa infância, a cura emocional virá em seguida. Sob a influência de Freud, o recalque tornou-se um conceito am plam ente aceito, usado para explicar fenômenos hipnóti cos e os transtornos psicológicos. Os seguidores de Freud se valem do recalque para explicar lem branças aparentem ente perdidas e recuperadas de traum as de infância (Boag, 2 0 0 6 ; Cheit, 1998 ; Erdelyi, 2 0 0 6 ) . Em uma pesquisa, 88% dos estu dantes universitários acreditavam que as experiências dolo rosas eram com um ente empurradas para fora da consciência e para dentro do inconsciente (G arry et al., 1 9 9 4 ). Os pesquisadores contemporâneos reconhecem que às vezes poupamos nossos egos negligenciando informações am eaça doras (G reen et al., 2 0 0 8 ) . Ainda assim, muitos argum entam que o recalque, se vier a ocorrer, é um a resposta m ental rara a um traum a terrível. Elizabeth Loftus (1 9 9 5 ) afirma que “O folclore do recalque é [...] em parte refutado, em parte não testado e, em parte não testável”. Mesmo quem testem unhou o assassinato de um dos pais ou sobreviveu aos cam pos de concentração nazistas guarda as lembranças intactas do hor ror (Helmreich, 1992 , 1994 ; Malmquist, 1986 ; Pennebaker, 1 9 9 0 ). “Dezenas de estudos formais não geraram um único caso convincente de recalque em toda a literatura sobre trau m as”, conclui o pesquisador em personalidade John Kihlstrom (2 0 0 6 ) . O m esm o se aplica à literatura mundial, relata uma equipe de Harvard que ofereceu mil dólares a quem fornecesse um exemplo médico ou m esm o ficcional p ré -1800 de uma pessoa saudável que tenha bloqueado um evento traum ático específico e recuperado-o um ano depois ou mais (Pope et al., 2 0 0 7 ) . Certam ente, se isso ocorresse com m uita frequência, alguém teria percebido. Apesar da grande divulgação, nenhum caso desses foi relatado. (Após a publicação deste trabalho, um a pessoa apresentou um a ópera de 1 7 8 6 em que um a m ulher aparentem ente esquece ter en contrad o o am ante m orto após um duelo [Pettus, 2 0 0 8 ] .) Alguns pesquisadores acreditam que o estresse extrem o e prolongado, tal como o estresse vivido por um a criança que sofreu um a grave agressão, pode prejudicar a m em ória dani ficando o hipocampo (Schacter, 1 9 9 6 ). Mas a realidade bem mais com um é que o alto nível de estresse e os horm ônios associados ao estresse realçam a m em ória (veja o Capítulo 8 ). Na verdade, estupro, tortura e outros eventos traum áti cos perseguem os sobreviventes, que os recordam sem querer. Eles ficam m arcados na alm a. “Você vê os bebês”, disse Sally H. (1 9 7 9 ) , sobrevivente do Holocausto. “Você vê mães gri tando. Vê pessoas enforcadas. Você para e vê aquele rosto lá. É algo que não se esquece.” "As descobertas gerais,., desafiam seriamente a noção psicanalítica clássica do recalque." Yacov Rofé, psicólogo. “Does Repression Exist?" 2000 "Durante o Holocausto, muitas crianças... foram forçadas a suportar o insuportável. Para aqueles que continuam a sofrer a dor ainda está presente, muitos anos depois, tão real quanto no dia em que ocorreu." Eric Zillm er, M olly Harrower, B a rry R itz le r e Robert Archer. The Ouest lo r the N azi Personality, 1995 A Mente Inconsciente Moderna Freud estava certo em pelo m enos um ponto: nós realm ente tem os acesso limitado a tudo que acontece em nossa m ente (Erdelyi, 1 9 8 5 , 1 9 8 8 , 2 0 0 6 ; Kihlstrom, 1 9 9 0 ) . Em experi mentos, as pessoas aprenderam a antecipar em que quadrante na tela do com putador determ inado caractere apareceria, m esm o antes de conseguirem articu lar a regra subjacente (Lewicki, 1 992 , 1 9 9 7 ). Pesquisas confirm am a realidade do ap ren d izad o im p líc ito in con scien te (F letch er et al., 2 0 0 6 ; Fresch e Rünger, 2 0 0 3 ) . Nossa m ente de duas vias ( tw o-track m in d ) abarca um vasto domínio não visível. No entanto, a noção de “iceberg” que os psicólogos pes quisadores têm hoje em dia difere da visão de Freud — tanto que, argum enta Anthony Greenwald (1 9 9 2 ) , chegou a hora de abandonar a visão freudiana do inconsciente. Conform e vimos em capítulos anteriores, m uitos pesquisadores agora consideram o inconsciente não um fom entador de paixões e crítico repressivo, m as um a modalidade do processam ento de inform ação que ocorre sem o nosso conhecim ento. Para esses pesquisadores, o inconsciente envolve • os esquemas que controlam autom aticam ente nossa percepção e nossas interpretações (Capítulo 6 ). • a pré-ativação (prim in g ) por meio de estímulos para os quais não atentam os conscientem ente (Capítulos 6 e 8 ) . • a atividade do hemisfério direito que possibilita à m ão esquerda do paciente que sofreu cisão cerebral executar um a instrução que o paciente não consegue verbalizar (Capítulo 2 ) . • o processam ento paralelo de diferentes aspectos da visão e do pensam ento (Capítulos 6 e 9 ). • as recordações implícitas que operam sem lem brança consciente, m esm o entre aqueles que têm amnésia (Capítulo 8 ). • as em oções que se intensificam instantaneam ente, antes de um a análise consciente (Capítulo 1 2 ). • o autoconceito e os estereótipos que autom ática e inconscientem ente influenciam o m odo com o processamos as inform ações sobre nós mesm os e sobre os outros (Capítulo 1 6 ). Mais do que nos damos conta, voamos no piloto autom á tico. N ossas vidas são conduzidas pelo processam ento da inform ação de form a inconsciente e não visível. Essa com preensão do processam ento inconsciente da inform ação é m ais parecida com a visão pré-freudiana de um a corrente subterrânea de pensam entos da qual as ideias criativas em er gem espontaneam ente (Bargh e Morsella, 2 0 0 8 ) . Pesquisas recentes tam bém fornecem algum apoio para a ideia freudiana dos m ecanism os de defesa (m esm o que não funcione exatam ente com o Freud supôs). Por exemplo, Roy Baumeister e colegas (1 9 9 8 ) descobriram que as pessoas ten dem a ver suas fraquezas e atitudes nos outros, fenôm eno que Freud cham ou de projeção e que os m odernos pesquisa dores cham am de efeito do fa lso consenso, isto é, a tendência a superestim ar a extensão em que os outros com partilham nossas crenças e nossos com p ortam en tos. As pessoas que sonegam impostos ou ultrapassam o limite de velocidade ten dem a achar que muitas outras pessoas fazem o m esm o. As evidências, no entanto, são escassas para outras defesas, tais com o o deslocam ento, que são ligadas à energia instintiva. Existe mais evidência para defesas, tais com o a form ação rea tiva, que defendem a autoestim a. Os m ecanism os de defesa, conclui Baumeister, são m enos motivados pelos impulsos em ebulição que Freud supôs do que pela necessidade de prote ger nossa autoim agem. teoria do gerenciamento do terror teoria da angústia relacionada com a morte; explora as respostas emocionais e comportamentais das pessoas a fatores que lembram sua morte iminente. Finalm ente, a história recente apoia a ideia de Freud de que nós nos defendem os co n tra a angústia. N ovam ente, porém , a ideia contem porânea difere da de Freud. Jeff Gre enberg, Sheldon Solomon e Tom Pyszczynski (1 9 9 7 ) acredi tam que uma fonte de angústia é “o terror resultante da cons ciência que tem os da vulnerabilidade e da m orte”. Mais de 2 0 0 experim entos que testaram sua teoria do gerencia m ento do terror m ostraram que pensar sobre a mortalidade — por exem plo, escrevendo um texto cu rto sobre o ato de m orrer e as emoções associadas — provoca várias defesas para gerenciar o terror. Por exem plo, a angústia com a m orte aum enta o preconceito — desprezo pelos outros e estim a por si m esm o (Koole et al., 2 0 0 6 ) . Diante de um m undo am eaçador, as pessoas agem não só para m elhorar sua própria autoestim a, m as tam bém para aderir m ais fortem ente a um a visão geral que responda a questões sobre o significado da vida. A perspectiva da morte promove sentim entos religiosos, e convicções religiosas pro fundas perm item que as pessoas sejam m enos defensivas — tendam a defender com m enos ênfase suas visões de mundo — quando são lembradas da m orte (Jonas e Fischer, 2 0 0 6 ; Norenzayan e Hansen, 2 0 0 6 ) . Além disso, elas se apegam aos relacionam entos íntimos (M ikulincer et al., 2 0 0 3 ) . Os even tos do 11 de Setembro nos Estados Unidos — um a terrível experiência do terror da m orte — fizeram com que as pessoas que ficaram presas no W orld Trade C enter gastassem seus últimos m om entos ligando para seus entes queridos, e leva ram a m aioria dos n orte-am erican os a en trar em con tato com familiares e amigos. As Ideias de Freud como Teoria Científica Os psicólogos tam bém criticam a teoria de Freud por suas lim itações científicas. Lembre-se, do Capítulo 1, de que boas teorias científicas explicam as observações e oferecem hipó teses que podem ser testadas. As teorias de Freud repousam sobre poucas observações objetivas e oferecem poucas hipó teses para se verificar ou rejeitar. (Para Freud, suas próprias lem branças e interpretações das livres associações, sonhos e atos falhos dos pacientes eram evidências suficientes.) Qual é o problema mais sério com a teoria de Freud? Ela oferece explicações a p osteriori a respeito de qualquer carac terística (do hábito de fum ar em um a pessoa, do medo de cavalos em outra, da orientação sexual em ou tra), porém não pred iz tal com p ortam en to ou tais traços. Se você fica com raiva pela a m orte de sua m ãe, você ilustra a teoria freudiana, porque “as suas necessidades não resolvidas de dependência na infância são am eaçadas”. Se você não fica com raiva, tam bém ilustra a teoria, porque “você está reprimindo sua raiva”. Isso, com o disseram Calvin Hall e Gardner Lindzey (1 9 7 8 , p. 6 8 ) , “é com o apostar em um cavalo depois da corrid a”. Uma boa teoria faz previsões que podem ser testadas. Por tais razões, alguns pesquisadores fazem duras críticas a Freud. Veem Freud e sua teoria com o um edifício em decom posição, construído nosp ântanos de sexualidade infantil, recalque, análise de sonhos e especulação a posteriori. “Quando nos colocam os no lugar de Freud, descobrimos que estam os olhando cada vez mais para a direção errada”, diz John Kihls- trom (1 9 9 7 ) . Para o mais m arcante crítico de Freud, Frede- rick Crews (1 9 9 8 ) , o original sobre as ideias de Freud não é bom, e o que é bom não é original (a m ente inconsciente é uma ideia que rem onta aos tempos de Platão). “Não quero a lc a n ç a r a im ortalid ad e por m eio do meu trab a lh o ; quero s e r im o rta l sem p re c isa r m orrer." Woody Allen “B u squ ei ao Senhor, e Ele m e respondeu, e de todos os m eus tem ores m e livrou." Salmo 34:4 "N ossos arg u m en to s são como os de um hom em que diz: 'Se h o u vesse um gato in v isív e l n a poltrona, esta p a re ce ria v azia ; m as a p o ltron a p arece de fato vazia; p ortanto , tem um gato in v is ív e l nela." C.S. Lewis, FourLoves, 1958 Então, será que a psicologia deve afixar a ordem “Não Res suscitar” sobre essa antiga teoria? Os defensores de Freud con testam. Criticar a teoria freudiana por não fazer predições que possam ser testadas é, dizem eles, com o criticar o beisebol por não ser um esporte aeróbico. É justo culpar algo por não ser aquilo que nunca pretendeu ser? Ao contrário de muitos psi canalistas que o sucederam, Freud nunca declarou que a psi canálise era um a ciência profética. Ele simplesmente declarou que, olhando para trás, os psicanalistas poderiam encontrar significado em nosso estado de espírito (Rieff, 197 9 ). Os defensores de Freud tam bém n otaram que algumas de suas ideias são duradouras. Foi Freud quem cham ou nossa atenção para o inconsciente e para o irracional, para nossas defesas contra a angústia, para a im portância da sexualidade hum ana e para a tensão entre nossos impulsos biológicos e nosso bem -estar social. Foi Freud quem desafiou nossas auto- justificativas, quem puncionou nossas pretensões e nos lem brou do nosso potencial para o mal. N a ciência, o legado de Darwin persiste, e o de Freud vai expirando (Bornstein, 2 0 0 1 ) . Praticam ente 9 entre 10 cursos universitários norte-am ericanos que abordam a psicanálise estão, de acordo com um a pesquisa de âmbito nacional, fora dos departam entos de psicologia (C ohen, 2 0 0 7 ) . Na cultura popular, o legado de Freud continua vivo. Algumas ideias que m uitas pessoas julgam ser verdadeiras — a de que as experi ências na in fân cia m oldam a personalidade, a de que os sonhos têm significados, a de que m uitos com portam entos têm motivações disfarçadas — fazem parte desse legado. Seus conceitos do início do século XX penetraram em nossa lin guagem no século XXL Sem com preender suas fontes, pode mos falar de ego, recalque, projeção, com plexo (com o em “com plexo de inferioridade”), rivalidade entre irm ãos, lapsos de lin guagem e fixação . “As premissas de Freud podem ter passado por um declínio constante de aceitação no m undo acadêmico por m uitos an o s”, notou M artin Seligm an (1 9 9 4 ) , “m as Hollywood, os program as de entrevistas, m uitos terapeutas e o público em geral ainda as apreciam ”. ANTES DE PROSSEGUIR... > Pergunte a Si Mesmo Antes de ler este capítulo, o que você sabia sobre Freud, e quais eram suas impressões sobre ele? Elas mudaram de alguma maneira depois de ler as informações aqui apresentadas? >- Teste a Si M esmo 2 Como a ciência da psicologia atual avalia a teoria de Freud? As respostas às questões Teste a Si Mesmo podem ser encontradas no Apêndice B, no final do livro. A Perspectiva Humanista 6: Como os psicólogos humanistas veem a personalidade, e qual era seu objetivo ao estudar a personalidade? NA DÉCADA DE 1960 , ALGUNS PSICÓLOGOS DA PERSO NALIDADE m ostraram -se insatisfeitos com a negatividade da teoria freudiana e a psicologia m ecanicista do behavio- rism o de B.F. Skinner. Indo em direção contrária à do estudo de Freud sobre motivações básicas de pessoas “doentes”, os psicólogos hum anistas voltaram sua atenção para o modo com o as pessoas “saudáveis” se esforçam por obter autodeterminação e autorrealizacão. Em contraste com a objetividade científica do behaviorismo, eles estudaram as pessoas por meio de suas experiências e sentim entos relatados por elas mesmas. Dois teóricos pioneiros — Abraham Maslow (1 9 0 8 -1 9 7 0 ) e Carl Rogers (1 9 0 2 -1 9 8 7 ) — propuseram a perspectiva de um a terceira fo rça com ênfase no potencial hum ano. autorrealização de acordo com Maslow, uma das necessidades psicológicas essenciais que surge após as necessidades físicas e psicológicas básicas terem sido atendidas e a autoestima ser alcançada; a motivação para realizar o potencial do indivíduo. aceitação positiva incondicional de acordo com Rogers, uma atitude de aceitação total em relação ao outro. Abraham Maslow e a Pessoa Autorrealizada Maslow propôs que somos motivados por um a hierarquia de necessidades (Capítulo 11). Se nossas necessidades fisiológicas são atendidas, ficamos preocupados com segurança pessoal; se atingimos um senso de segurança, buscamos então amar, ser amados e am ar a nós mesmos; com nossas necessidades de am or satisfeitas, buscamos autoestima. Tendo alcançado a autoestima, finalmente buscamos a autorrealização (o pro cesso de realizar nosso potencial) e de autotranscendência (sig nificado, propósito e com unhão para além do eu). Maslow (1 9 7 0 ) desenvolveu suas ideias estudando pessoas saudáveis e criativas em vez de casos clínicos complicados. Ele baseou sua descrição de autorrealização em um estudo de pessoas que pareciam notáveis por terem levado um a vida rica e produtiva — entre eles Abraham Lincoln, Thomas Jeffer- son e Eleanor Roosevelt. M aslow relatou que essas pessoas tinh am em com um certas características: aceitavam -se tal com o eram e tinham consciência de si mesm as; eram fran cas e espontâneas, afetuosas e solícitas e não se deixavam afetar pela opinião dos outros. Seguras por saberem quem eram , seus interesses eram centrados nos problemas, e não em si m esm as. Elas con cen travam suas energias em um a determ inada tarefa, a qual viam com o sua missão na vida. A m aioria desfrutava de poucos relacionam entos íntim os em vez de m uitos relacionam entos superficiais. M uitas foram movidas por grandes experiências pessoais ou espirituais que vão além da consciência com um . Essas, segundo Maslow, são qualidades adultas maduras, qualidades que se encontram nas pessoas que aprenderam o suficiente sobre a vida para serem compassivas, para terem superado seus sentimentos confusos em relação aos pais, para terem descoberto sua vocação, para terem “adquirido cora gem bastante para serem impopulares, para não se envergo nharem de serem abertam ente virtuosas etc.". O trabalho de M aslow com estudantes universitários o levou a especular que aqueles propensos a se torn ar adultos autorrealizados eram simpáticos, solícitos, “particularm ente afetuosos com os mais idosos que m erecem seu afeto” e “preocupados com a crueldade, a malvadeza e o espírito de gangue encontrados com tan ta frequência entre as pessoas jovens”. Carl Rogers e a Perspectiva Centrada na Pessoa O psicólogo hum anista Carl Rogers estava de acordo com mui tos dos pensamentos de Maslow. Rogers acreditava que as pes soas são basicamente boas e dotadas de tendências para a autor realização. A não ser que estejamos em um ambiente que iniba o crescimento, cada um de nós é com o um broto pequenino, pronto para o crescim ento e para a realização. Rogers (1 9 8 0 ) acreditava que um clima favorável ao crescimento exigia três condições: autenticidade, aceitação e empatia. Segundo Rogers, as pessoas nutrem nosso crescimento com auten ticidade - sendo francas em seus sentim entos, retirando as m áscaras e sendo transparentes e reveladoras. As pessoas tam bém nutrem o crescimento com aceitação — oferecendo-nos o que Rogers cham ou de aceitação posi tiva incondicional. Essa é um a atitude de benevolência, uma atitude que nos valoriza m esm o tendo con hecim en to dos nossos defeitos. É um alívio profundo deixar nossos disfarces caírem , confessar nossos piores sentim entos e descobrir que ainda somos aceitos. Esperamos desfrutar dessa experiência gratificante em um bom casam ento, em um a família unida ou em um a amizade ín tim a na qual não sentim os m ais a necessidade de nos explicar. No m elhor dos relacionam en tos, estam os livres para ser espontâneos sem receio de perder a estima do outro. Finalmente, as pessoas nutrem o crescim ento com em pa tia — com partilhando e espelhando nossos sentim entos e refletindo nossos significados. “R aram ente ouvim os com compreensão sincera e verdadeira empatia”, disse Rogers. “No en tan to , ouvir, nessa condição especial, é um a das forças mais potentes para a m udança que eu con heço.” Para Rogers, autenticidade, aceitação e empatia são a água, o sol e os nutrientes que possibilitam às pessoas crescerem com o vigorosos carvalhos, pois, “na medida em que são acei tas e valorizadas, as pessoas tendem a desenvolver um a ati tude mais favorável em relação a si m esm as” (Rogers, 1980 , p. 116). Na medida em que as pessoas são ouvidas com empa tia, “torna-se possível para elas escutar com mais precisão o fluxo das experiências interiores”. O escritor Calvin Trillin (2 0 0 6 ) recorda um exemplo de autenticidade e aceitação parental em um acam pam ento para crianças com transtornos graves, onde sua esposa, Alice, tra balhava. L., um a “criança m ágica”, sofria de um transtorno genético que a obrigava a se alim entar através de um tubo e a cam inhar com m uita dificuldade. Alice recorda, Um dia, quando estávamos brincando de lenço atrás, eu estava sentada atrás dela e ela me pediu para segurar sua correspondên cia enquanto era a vez dela de ser perseguida em torno do círculo. Levou algum tempo para que ela completasse o circuito e eu pude ver que por cima da pilha de correspondência estava uma bilhete de sua mãe. Então, fiz um a coisa terrível... Sim plesmente não resisti, tinha que saber o que os pais dessa criança poderiam ter feito para que ela fosse tão espetacular, para que se tornasse o ser hum ano mais entusiasmado, otim ista e esperançoso que eu já tinha visto. Dei uma olhada no bilhete e meus olhos caíram na seguinte frase: “Se Deus nos tivesse oferecido todas as crianças do mundo para escolher, L., nós escolheríam os apenas você.” Antes de L. voltar ao lugar dela no círculo, mostrei o bilhete para Bud, que estava sentado do meu lado. “Rápido, leia isto”, eu sus surrei, “é o segredo da vida”. Maslow e Rogers teriam sorrido sabiamente. Para eles, a característica central da personalidade é o autoconceito — todos os pensam entos e sentim entos que tem os em resposta à pergunta “Q uem sou eu?”. Se nosso autoconceito for posi tivo, tendem os a agir e a ver o m undo positivamente. Se for negativo — se aos nossos olhos estivermos m uito longe do nosso eu ideal —, disse Rogers, sentim o-nos insatisfeitos e infelizes. Um objetivo valioso para terapeutas, pais, profes sores e amigos é, portanto, segundo ele, ajudar os outros a se conhecer, a se aceitar e a ser verdadeiros consigo mesmos. Avaliando o Self 7 : Como os psicólogos humanistas avaliaram o sentido do self? Os psicólogos hum anistas algumas vezes investigaram a per sonalidade pedindo às pessoas que respondessem a questio nários para avaliar seu autoconceito. Um questionário, ins pirado por Carl Rogers, pedia que elas se descrevessem com o realm ente eram e com o gostariam de ser. Q uando o self ideal e o self real são muito parecidos, disse Rogers, o autoconceito é positivo. Q uando avaliava o crescim ento pessoal de seus pacientes durante a terapia, ele procurava classificações suces sivamente mais próxim as entre o self real e o self ideal. Alguns psicólogos hum anistas acreditavam que qualquer avaliação padronizada da personalidade até um questionário, é “despersonalizante”. Em vez de forçar a pessoa a responder a categorias restritas, esses psicólogos consideram que entre vistas e conversas íntim as possibilitam um a com preensão m elhor das experiências únicas de cada pessoa. Avaliando a Perspectiva Humanista 8 : Como a perspectiva humanista influenciou a psicologia? Que críticas ela enfrentou? Algo que se diz a respeito de Freud tam bém pode ser dito sobre os psicólogos hum anistas: seu impacto tem sido generalizado. As ideias de Maslow e de Rogers influenciaram o aconselha m ento, a educação, a criação das crianças e a administração. au toconce ito todos os nossos pensam entos e sentim entos, em resposta à pergunta: “ quem sou eu?” Eles tam bém influenciaram — às vezes de modo não inten cional — m uito da psicologia popular de hoje. Um autocon ceito positivo é a chave para a felicidade e o sucesso? A acei tação e a empatia ajudam a nutrir sentimentos positivos sobre si m esm o? As pessoas são basicam ente boas e capazes de se aperfeiçoar? Muitas pessoas respondem sim, sim e sim. Res pondendo a um a pesquisa de opinião do Instituto Gallup e da N ewsweek feita em 1992 , 9 em 10 norte-am ericanos clas sificaram a autoestima com o um fator muito im portante para “m otivar um a pessoa a trabalhar com afinco e ser bem -suce dida". A mensagem da psicologia hum anista foi ouvida. A proem inência da perspectiva hum anista desencadeou um a onda de críticas. Prim eiro, disseram os críticos, seus conceitos são vagos e subjetivos. Considere a descrição de Maslow de pessoas autorrealizadas com o francas, espontâ neas, afetuosas, com autoaceitação e produtivas. Essa é um a descrição científica? Não será apenas um a descrição dos ide ais e valores pessoais de Maslow? Maslow, observou M. Brews- ter Smith (1 9 7 8 ) , ofereceu impressões de seus heróis pesso ais. Imagine outro teórico que tivesse um grupo diferente de heróis — talvez N apoleão, John D. Rockefeller e o ex-vice- presidente dos EUA Dick Cheney. Esse teórico provavelmente descreveria as pessoas autorrealizadas com o “não coibidas pelas necessidades dos outros”, “motivadas pela realização” e “obcecadas pelo poder”. Os críticos tam bém se opuseram à ideia de Carl Rogers de que “a única pergunta que im porta é: ‘Estou vivendo de um modo que é profundam ente gratificante para m im e que real m ente m e expressa?’” (citado por W allach e W allach, 1 9 8 5 ). O individualismo incentivado pela psicologia hum anista — confiar e agir de acordo com os próprios sentim entos, ser verdadeiro consigo mesmo, satisfazer a si mesmo — pode levar à satisfação excessiva dos próprios desejos, ao egoísmo e à erosão das restrições m orais (C am pbell e Specht, 1 9 8 5 ; W allach e W allach, 1 9 8 3 ). De fato, são aqueles que olham para além de si m esm os que estão mais propensos a vivenciar o apoio social, a desfrutar da vida e a enfrentar o estresse do m odo eficaz (Crandall, 1 9 8 4 ). Os psicólogos hum anistas co n tra-argu m en taram que o prim eiro passo para am ar os outros é, na verdade, um a auto aceitação segura e não defensiva. De fato, pessoas que se sen tem intrinsecam ente amadas e aceitas — pelo que são, e não apenas por suas realizações — exibem atitudes m enos defen sivas (Schimel et al., 2 0 0 1 ) . Um a derradeira acusação feita contra a psicologia hum a nista é que ela não leva em con ta a realidade da nossa capa cidade hum ana para o mal. Diante do aquecim ento global, da superpopulação do planeta e da expansão das arm as nucle ares, podemos ficar apáticos diante de duas possibilidades: o otim ism o ingênuo que nega a am eaça ( “As pessoas são basi cam ente boas; tudo será resolvido” ) e o desespero sombrio ( “N ão há esperança; por que ten tar?”). A ação requer rea lismo suficiente para fom entar preocupação e otimismo sufi ciente parafornecer esperança. A psicologia hum anista, dizem os críticos, incentiva a esperança necessária, mas não o rea lismo igualmente necessário acerca do mal. ANTES DE PROSSEGUIR... > Pergunte a Si Mesmo Você já teve aiguém na vida que o aceitou incondicionalmente? Você acha que essa pessoa o ajudou a se conhecer melhor e a desenvolver uma imagem melhor de si mesmo? > Teste a Si Mesmo 3 O que significa ter “empatia”? Ser “autorrealizado"? As respostas às questões Teste a Si Mesmo podem ser encontradas no Apêndice B, no final do livro. A Perspectiva do Traço 9 : Como os psicólogos utilizam os traços para descrever a personalidade? Em vez de se concentrar em forças inconscientes e em opor tunidades de crescim ento frustradas, alguns pesquisadores tentam definir a personalidade em term os de padrões de com portam ento estáveis e duradouros, tais com o a lealdade e o otimismo de Sam Gamgee. Essa perspectiva rem onta, em parte, a um encontro extraordinário ocorrido em 1919, quando Gor- don Allport, um curioso estudante de psicologia de 22 anos, entrevistou Freud em Viena. Allport logo descobriu quanto o fundador da psicanálise estava querendo encontrar motivos ocultos, até m esm o em seu com portam ento durante a entre vista. Essa experiência por fim levou Allport a fazer o que Freud não fez: descrever a personalidade em term os de traços fun dam entais — os com portam entos e os motivos conscientes característicos das pessoas (tal com o a curiosidade profissio nal que motivou Allport a ir ao encontro de Freud). Encontrar Freud, disse Allport, "ensinou-m e que ela [a psicanálise], por todos os seus méritos, pode mergulhar muito fundo, e que os psicólogos fariam bem em dar total reconhecim ento aos m oti vos m anifestos antes de sondarem o inconsciente”. Allport veio a definir a personalidade em term os de padrões de com portam ento identificáveis. Ele estava menos preocupado em explicar os traços individuais do que em descrevê-los. C om o Allport, Isabel Briggs Myers (1 9 8 7 ) e sua m ãe, Katharine Briggs, queriam descrever diferenças de persona lidade im portantes. Elas ten taram classificar as pessoas de acordo com os tipos de personalidade propostos por Carl jung, baseados em suas respostas a 12 6 perguntas. O Indica dor de Tipo M yers-Briggs (M BTI), disponível em 21 idiomas, é aplicado a mais de 2 milhões de pessoas por ano, princi palmente para fins de aconselham ento, treinam ento em lide rança e desenvolvimento de equipes de trabalho (CPP, 2 0 0 8 ) . Esse indicador oferece escolhas, tais com o “Você costum a dar mais valor ao sentim ento do que à lógica, ou à lógica mais do que ao sen tim ento?”. Depois con ta as preferências dos participantes e as rotula com o indicando, digamos, um tipo “sentim ental” ou “racional” e as devolve à pessoa em term os acolhedores. Aos tipos sentim entais, por exemplo, é dito que são sensíveis aos valores e “empáticos, apreciativos e gentis”; aos tipos racionais diz-se que “preferem um padrão objetivo da verdade” e que são “bons em análise”. (Todos os tipos têm seus pontos fortes, por isso todo m undo se afirm a.) A m aioria das pessoas concorda com o perfil anunciado do seu tipo. Afinal, ele reflete suas preferências declaradas. Também podem aceitar seus rótulos com o base para parce rias com colegas de trabalho e para a designação de tarefas supostam ente adequadas a seus tem peram entos. Um relató rio am ericano do N ational Research Council, no entanto, observou que, apesar da popularidade do teste nos negócios e orientações de carreira, seu uso inicial ultrapassou as pes quisas por seu valor de previsão de desempenho profissional, e que “a popularidade desse instrum ento na ausência de vali dade científica com provada é problem ática” (D ru ckm an e Bjork, 1991 , p. 101 ; ver tam bém Pittenger, 1 9 9 3 ) . Apesar de as pesquisas sobre o MBTI se acum ularem a p artir dessas advertências, o teste se m antém principalm ente com o um instrum ento de aconselham ento e orientação profissional ( coach in g ), e não de pesquisa. traço um padrão característico de com portam ento ou uma disposição para sentir e agir, con form e avaliado por relatos pessoais e re la tórios de pares. Explorando os Traços Classificar as pessoas com o tendo um ou outro tipo distinto de personalidade não capta plenam ente a individualidade delas. Então, de que outro modo podemos descrever suas per sonalidades? Podem os descrever um a m açã considerando várias dim ensões de traço s — relativam en te grande ou pequena, verm elha ou verde, doce ou ácida. Ao colocar pes soas em várias dimensões de traços sim ultaneam ente, os psi cólogos podem descrever incontáveis variações individuais de personalidade. (Lembre-se, do Capítulo 6, de que varia ções em apenas três dimensões de cores — matiz, saturação e luminosidade — criam muitos milhares de cores.) Quais dimensões de traços descrevem a personalidade? Se você tivesse um encontro m arcado com um desconhecido do sexo oposto, que traços de personalidade poderiam lhe dar um a impressão precisa da pessoa? Allport e seu colega H. S. Odbert (1 9 3 6 ) con taram literalm ente todas as palavras em um dicionário não resumido com as quais se poderia descre ver as pessoas. Q uantas palavras havia no dicionário? Quase 1 8 .0 0 0 ! Com o, então, os terapeutas podem condensar a lista de traços básicos em um núm ero manejável? Ansioso Rigoroso Sóbrio Pessimista Reservado Não social Calado INTROVERTIDO Passivo Cuidadoso Pensativo Pacífico Controlado Confiável INSTÁVEL Temperamental Bem-humorado Calmo ESTÁVEL Sensível Inquieto Agressivo Excitável Volúvel Impulsivo Otimista Ativo ------------EXTROVERTIDO Sociável Despachado Falante Reativo Fácil de lidar Alegre Despreocupado Líder > F IG U R A 13.4 Duas dimensões da personalidade Os cartógrafos podem nos dizer muito sobre o uso de duas coordenadas (norte-sul e leste- oeste). Hans Eysenck e Sybil Eysenck usaram dois fatores primários de personalidade - extroversão-introversão e estabilidade-instabilidade — como coordenadas para descrever a variação de personalidade. As combinações variadas definem outros traços mais específicos. (De Eysenck e Eysenck, 1963.) Análise Fatorial Um m étodo tem sido propor traços, tais com o ansiedade, que algumas teorias consideram básicos. Uma técnica mais recente é a an álise fa to r ia l, o procedim ento estatístico des crito no Capítulo 10 para identificar conjuntos de itens de testes que indicam com ponentes básicos de inteligência (tais com o habilidade espacial ou habilidade verbal). Imagine que pessoas que se descrevem com o sociáveis tam bém tendam a dizer que gostam de agitação, de pregar peças nos outros e que não gostam de ficar lendo em silêncio. Tal conjunto de com portam entos estatisticamente correlacionados reflete um traço, ou fator básico — neste caso, um traço denom inado extroversão. Os psicólogos britânicos Hans Eysenck e Sybil Eysenck acreditam que podemos reduzir muitas de nossas variações individuais norm ais a duas ou três dim ensões, incluindo ex troversão-in troversão e estab ilidade-in stab ilidade em ocional (F IG U R A 1 3 .4 ). O Q uestionário de P ersonalidade de Eysenck foi respondido por pessoas em 35 países em todo o mundo, desde a China até Uganda e Rússia. Quando as respostas das pessoas são analisadas, os fatores extroversão e emotividade inevitavelmente emergem com o dimensões básicas da perso nalidade (Eysenck, 1 990 , 1 9 9 2 ) . Os Eysencks acreditavam que esses fatores são geneticam ente influenciados, e as pes quisas apoiam essa crença. Biologia e Personalidade Exames da atividade cerebral dos extrovertidos som am -se à lista crescente de traços e estados m entais que foram explo rados com procedim entos de im agens do cérebro. (A lista inclui inteligência, impulsividade, vícios, m entira, atração sexual, agressividade,em patia, experiência espiritual e até m esm o atitudes racistas ou políticas [O lson, 2 0 0 5 ] .) Tais estudos indicam que os extrovertidos buscam estímulos por que sua excitação cerebral norm al é relativamente baixa. Exa mes feitos por PET m ostram que um a área do lobo frontal envolvida na inibição do com portam ento é m enos ativa em extrovertidos do que em introvertidos (Johnson et al., 1 9 9 9 ). A dopam ina e a atividade neural ligada à dopam ina tendem a ser mais altas nos extrovertidos (W acker et al., 2 0 0 6 ) . A biologia influencia nossa personalidade tam bém de outras m aneiras. Com o você deve lem brar dos estudos sobre adoção e gêmeos no Capítulo 4, nossos genes têm m uito a dizer sobre o tem peram ento e o estilo de com portam ento que ajudam a definir nossa personalidade. Jerom e Kagan, por exem plo, atribuiu as diferenças de timidez e inibição nas crianças à reatividade do sistem a nervoso au tôn om o delas. Dado um sistem a nervoso au tôn o m o reativo, respondem os ao estresse com m aior ansiedade e inibição. A criança destemida e curiosa pode se tornar um alpinista ou um m otorista que gosta de dirigir em alta velocidade. Samuel Gosling e seus colegas (2 0 0 3 ; Jones e Gosling, 2 0 0 5 ) relatam que as diferenças de personalidade entre cães (em term os de energia, afeto, reatividade e inteligência) são tão evidentes e tão consistentem ente avaliadas quanto as dife renças de personalidade hum anas. M acacos, chim panzés, orangotangos e até m esm o pássaros têm personalidades está veis (W eiss et al., 2 0 0 6 ) . Entre os parídeos (um parente euro peu do chapim n orte-am ericano), pássaros ousados inspecio nam m ais rapidam ente novos objetos e exploram árvores (G roothuis e Carere, 2 0 0 5 ; Verbeek et al., 1 9 9 4 ). Por meio da reprodução seletiva, os pesquisadores podem produzir aves mais ousadas ou mais tímidas. Os dois tipos têm seu lugar na história natural. Nos anos mais difíceis, os pássaros ousados provavelmente encontrarão alimento; nos anos de fartura, os pássaros mais tímidos se alim entarão com menos riscos. Avaliando os Traços 10: O que são inventários de personalidade, e quais são seus pontos fracos e fortes como instrumentos de avaliação de traços? Se traços estáveis e duradouros guiam nossas ações, seria pos sível criar testes válidos e confiáveis desses traços? Existem várias técnicas de avaliação derivadas dos conceitos de traço — algumas mais válidas do que outras (veja a seguir a seção “C om o Ser um Astrólogo ou Q u irom an te de ‘Sucesso’” ). Algumas traçam o perfil dos padrões de com portam ento de um a pessoa quase sempre oferecendo avaliações rápidas de um único traço, tal com o extroversão, ansiedade ou autoes tim a. Os inventários de personalidade — questionários mais longos nos quais as pessoas respondem a itens que abrangem um a vasta gama de sentim entos e com portam en tos — foram criados para avaliar vários traços de um a vez. O inventário clássico de personalidade é o Inventário Multifásico de Personalidade de M innesota (M M PI). Embora avalie tendências “anorm ais” e não os traços nor mais de personalidade, o MMPI ilustra um a boa m aneira de com o desenvolver um inventário de personalidade. Um de seus criadores, Starke H athaw ay ( 1 9 6 0 ) , co m p arou seu esforço ao de Alfred Binet. Binet, com o você deve se lembrar do Capítulo 10, desenvolveu o primeiro teste de inteligência selecionando itens que discrim inavam crianças que teriam problemas em progredir norm alm ente em escolas francesas. Os itens do MMPI tam bém foram obtidos empiricamente. Ou seja, a partir de um amplo conjunto de itens, Hathaway e seus colegas selecionaram aqueles nos quais determinados grupos de diagnósticos diferiam. Depois eles agruparam as perguntas em 10 escalas clínicas, incluindo escalas que ava liavam tendências depressivas, masculinidade-feminilidade e introversão-extroversão. Inicialmente, Hathaway e seus colegas apresentaram cen tenas de declarações do tipo “falso” ou “verdadeiro” ( “N in guém me en ten d e”; “Eu ten h o tod a a com p reen são que m ereço”; “Eu gosto de poesia” ) a grupos de pacientes psico logicam ente perturbados e a pessoas “n orm ais”. Eles retive ram toda e qualquer declaração — por mais tola que pudesse parecer — cuja resposta do grupo de pacientes diferisse das respostas do grupo norm al. “Nada no jornal me interessa, exceto as histórias em quadrinhos” pode parecer insensato, mas acontece que as pessoas deprimidas estavam mais incli nadas a responder “verdadeiro”. (N ão obstante, há quem se divirta ao zombar do MMPI propondo itens com o: “C horar me deixa com lágrim as nos olhos” , “G ritos frenéticos me deixam nervoso” e “Eu fico na banheira até parecer um a uva- passa” [Frankel et al., 1 9 8 3 ] .) O M M PI-2 atual contém tam bém escalas clínicas para avaliar, por exemplo, atitudes no trabalho, problemas familiares e raiva. Em contraste com o caráter subjetivo da m aioria dos tes tes projetivos, preferidos pelos psicanalistas, os inventários de personalidade são pontuados objetivamente — a tal ponto que um com putador pode aplicá-los e corrigi-los. (O co m p utador tam bém pode fornecer descrições de pessoas que deram respostas semelhantes anteriorm ente.) A objetividade, entretanto, não garante a validade. Por exemplo, aqueles que se subm etem ao MMPI com o propósito de conseguir um emprego podem dar respostas socialm ente desejáveis para causar boa impressão. Mas, ao fazer isso, essas pessoas tam bém podem m arcar muitos pontos na escala de m entira , que avalia até que ponto um a pessoa está fingindo para causar boa impressão (ao responder “falso” a afirmativas universal m ente verdadeiras do tipo “Às vezes fico com raiva”). A obje tividade do MMPI contribui para que ele encontre grande aceitação e tenha sido traduzido para mais de cem línguas. inven tá rio de pe rsona lidade um questioná rio (em gerai com opções do t ip o verdadeiro-falso ou concordo- discordo ) em que as pessoas respondem a perguntas criadas para avaliar uma am pla gama de sentim entos e com portam entos; u tilizad o para avaliar traços de personalidade selecionados. Inven tá rio M ultifás ico de Personalidade de M innesota (MMPI) o teste de personalidade mais am plam ente pesquisado e u tilizado na prá tica clínica. O rig ina lm ente desenvolv ido para id en tifica r transto rnos em ocionais (a inda considerado seu uso mais ap rop riado), este teste agora é u tilizado para m uitas outras fina lidades de seleção. teste o b tid o em piricam ente um teste (com o o MMPI) desenvolvido testando-se diversos itens e depois selecionando aqueles que m elhor caracterizam os grupos. Os Cinco Grandes Fatores 11: Que traços parecem fornecer informações mais úteis sobre a variação de personalidade? Os atuais pesquisadores do traço supõem que as primeiras dimensões de traço , tais com o as dim ensões in trovertido/ extrovertido e instável/estável elaboradas por Eysenck, são im portantes, m as não representam todas as dim ensões da personalidade. Um conjunto de fatores levemente ampliado — denom inado os Cinco G randes (B ig Five) — apresenta um resultado mais preciso (C osta e M cCrae, 1 999 ; John e Sri- vastava, 1 9 9 9 ) . Se um teste especifica onde você está nas TABELA 13.2 Os " C inco G randes" Fatores da P ersonalidade Dimensão de Traço Extremos da dimensão Realização ou Organizado ■*----------- ----------- >- Desorganizado conscienciosidade Cuidadoso < ----------- ----------- ► Descuidado Disciplinado < ----------- ----------- *- Impulsivo Socialização Amável —----------- ----------- i- Cruel Confiável ■*----------- ----------- ► Suspeito Prestativo -í----------- ; Egoísta Neuroticismo (estabilidade vs Calmo ■*------- >■ Ansioso instabilidade emocional) Seguro ^ ► Inseguro Autossatisfação -<-►- Autopiedade Abertura para a experiência Imaginativo Preferênciapor variedade Independente Prático Preferência por rotina Conformado Extroversão Sociável Retraído Divertido ■<r~-------------------- ► Sóbrio Afetuoso ■<-------- -------- ► Reservado Fonte: Adaptado de McCrae e Costa (1986, p. 1002). cinco dimensões m ostradas na TABELA 1 3 .2 (realização ou conscienciosidade, socialização, neuroticismo ou estabilidade, abertura para experiência e extroversão), ele diz muito sobre sua personalidade. Em todo o m undo — em 56 nações e 2 9 idiomas de um estudo (Schm itt et al., 2 0 0 7 ) — as pessoas descrevem as outras em term os aproxim adam ente coerentes com essa lista. Os C inco Grandes não são a palavra final, m as, por ora, o núm ero que está ganhando na loteria da per sonalidade é cinco. Os Cinco Grandes — atual “moeda cor rente da psicologia da personalidade” (Funder, 2 0 0 1 ) — repre sentam o tópico de pesquisa de personalidade mais ativo desde o iníco dos anos 1 9 9 0 e, atualm ente, são o que m elhor nos aproxim a das dimensões básicas de traço. A onda recente da pesquisa dos C inco Grandes explora várias questões: • Até que ponto esses traços são estáveis? Na vida adulta, os Cinco Grandes traços são bem estáveis, com algumas tendências (instabilidade em ocional, extroversão e abertura para experiência) diminuindo um pouco nas décadas que seguem o com eço e o meio da idade adulta e outras (socialização e realização ou conscienciosidade) aum entando (M cC rae et al., 1 999 ; Vaidya et al., 2 0 0 2 ) . A realização ou conscienciosidade aum enta mais na casa dos 2 0 anos, à medida que as pessoas am adurecem e aprendem a lidar com o trabalho e seus relacionam entos. A socialização aum enta mais na casa dos 30 anos e continua a aum entar até os 6 0 (Srivastava et al., 2 0 0 3 ) . • Até que ponto são herdados? A hereditariedade de diferenças individuais varia com a diversidade das pessoas estudadas, mas norm alm ente fica em 50% ou um pouco mais para cada dimensão, e as influências genéticas são semelhantes em diferentes nações (Loehlin et al., 1 998 ; Yam agata et al., 2 0 0 6 ) . • Os Cinco Grandes traços predizem outros atributos pessoais? Sim, e aqui estão alguns exemplos: pessoas altam ente sociáveis tendem a ter notas mais altas na escola e na universidade (C onard, 2 0 0 6 ; Noftle e Robins, 2 0 0 7 ) . Tendem tam bém a ser do tipo m atutino (às vezes, cham adas "cotovias”); as do tipo vespertino ( “corujas”) são m arginalm ente extrovertidas (Jackson e Gerard, 1 9 9 6 ). Q uando o cônjuge de um a pessoa tem um escore baixo em socialização, estabilidade e abertura para experiência, a satisfação m atrim onial e sexual pode sofrer (Botwin et al., 1997 ; D onnellan et al., 2 0 0 4 ) . Ao explorar tais questões, a pesquisa dos Cinco Grandes revigorou a psicologia do traço e valorizou a im portância da personalidade. Avaliando a Perspectiva do Traço 12: As pesquisas apoiam a consistência dos traços de personalidade ao longo do tempo e em várias situações? Será que os traços de nossa personalidade são estáveis e dura douros? Ou será que nosso com portam ento depende de onde e de com quem estam os? J. R. R. Tolkien criou personagens, com o o leal Sam Gamgee, cujos traços de personalidade m an tinham a consistência através do tempo e independentemente dos lugares. O teatrólogo italiano Luigi Pirandello tinha um ponto de vista diferente. Para ele, a personalidade estava sem pre mudando, talhada de acordo com a situação ou com um papel em particular. Em uma das peças de Pirandello, Lamberto Laudisi se autodescreve para a senhora Sirelli: “Eu realmente sou o que a senhora acha que eu sou; em bora, m inha cara senhora, isso não impeça que eu realmente tam bém seja o que o seu marido, a m inha irmã, a m inha sobrinha e a senhora Cini acham que eu sou — porque eles tam bém estão absoluta mente certos!” Ao que ela respondeu: “Em outras palavras, o senhor é uma pessoa diferente para cada um de nós.” P F N C A N D 0 r R I T I T A M F N T F ç n R D F •• J 1 b 11 J M 11 L n 1 1 1 L n n l b 11 1 C J U D n L Como Ser um Astrólogo ou Quiromante de “Sucesso” Será que podem os iden tifica r os traços das pessoas pelo a li nham ento dos planetas e das estrelas na hora do nascimento? Pela caligrafia? Pelas linhas das palmas de suas mãos? Os astrônom os zom bam da ingenuidade da astro log ia — desde que os astró logos form ularam suas predições, há m ilê nios, as conste lações têm m udado (K elly , 1997, 1998). Os hum oristas debocham : "Sem querer o fender” , escreve Dave Barry, "mas, se você levar o ho róscopo a sério, seus lobos fron ta is são do tam anho de ervilhas." Em vez disso, os psicó logos perguntam : Será que isso funciona? Será que os astró logos podem d rib la r o acaso usando a data de nascim ento para iden tificar uma pessoa a pa rtir de uma breve descrição de sua personalidade? Será possível uma pessoa reconhecer seu p róprio horóscopo em meio a vários outros? As respostas consistentes têm sido: não, não e não (B ritish Psychological Society, 1993; Carlson, 1985; Kelly, 1997). Por exem plo, um pesquisador exam inou dados do censo de 20 milhões de pessoas casadas na Inglaterra e Gales e descobriu que “o signo astro lóg ico não tem im pacto nenhum sobre a probabilidade de casar — e permanecer casado — com alguém de qualquer ou tro s igno” (Voas, 2008). Sobre os grafólogos, que fazem predições a partir de amos tras de caligrafia, tam bém já se descobriu que não usam mais do que o acaso quando ten tam d iscern ir as ocupações da pessoa, exam inando várias páginas de sua caligrafia (Beyers tein e Beyerstein, 1992; Dean et al., 1992). No entanto, os g ra fó lo go s — e estudan tes novatos de ps ico log ia — com fre quência irão perceber corre lações entre a caligrafia e a per sonalidade, mesmo quando não há nenhuma (K ing e Koehler, 2000). Se todas essas correlações percebidas somem quando sub m etidas a um exame mais a tento , com o se exp lica que os astró logos, qu irom antes e observadores de bolas de crista l convençam milhões de pessoas em to d o o m undo a pagar por seus conselhos? Ray Hyman (1981), um qu irom ante que se to rnou um pesquisador da psicologia, revelou os m étodos ilu sórios que são utilizados. A prim eira técn ica, o “ estoque de d iscurso persuasivo” , baseia-se na observação de que, em alguns aspectos, cada um de nós não é igual a mais ninguém e, em outros, somos tod os iguais. O fa to de algum as coisas serem verdade iras para todos nós possib ilita que o "v iden te ” faça declarações que pareçam im pressionantem ente corretas: “ Você se p re o cupa mais com as coisas do que deixa transparecer, mesmo para os seus melhores am igos.” A lgum as dessas declarações geralm ente verdadeiras podem ser reunidas em uma descri ção de personalidade. Im agine que você se subm eta a um teste de personalidade e depo is receba o seguinte esboço de caráter: Você tem grande necessidade de ser admirado e estimado pelas pessoas. Você tende a ser crítico consigo mesmo... Você se orgu lha de si mesmo por ter ideias próprias e não aceitar a opinião dos outros sem provas satisfatórias. Você acha insensato ser muito franco ao revelar-se para os outros. Às vezes, você é extrovertido, afável, sociável; outras vezes, é introvertido, cauteloso e reservado. Algum as de suas aspirações não são muito realistas (Davies, 1997; Forer, 1949). Em experimentos, estudantes universitários receberam ava liações triv ia is com o essa, extraídas das declarações de um livro de astro log ia vendido em bancas de jornais. Quando eles acham que o falso feedback fo i fe ito exclusivam ente para eles e quando este é favo ráve l e bastante genera lizado, quase sem pre classificam a descrição com o "b o a ” ou "exce len te ” (Davies, 1997). Mesmo aqueles que são céticos em relação à astrologia, quando recebem uma descrição lisonjeira de um astró logo com eçam apensar que “afinal, ta lvez haja alguma coisa com essa tal astro log ia" (G lick et al., 1989). Já foi d ito que um astró logo é alguém "preparado para lhe d izer aquilo que você acha de si m esm o” (Jones, 2000 ). O psicó logo francês Michael Gauguelin colocou um anún cio em um jornal de Paris oferecendo um horóscopo pessoal de graça. Noventa e quatro por cento daqueles que recebe ram o horóscopo e log iaram a descrição com o acurada. De quem era o ho róscopo que todos eles receberam ? Do Dr. Petiot, fam oso assassino em massa na França (Kurtz, 1983). Essa aceitação é denom inada efe ito Barnum, em hom enagem à máxima do grande showm an P. T. Barnum: “A cada m inuto nasce um o tá rio .” Outra técnica adotada pelos videntes é “ in te rp re ta r” nos sos trajes, nosso aspecto físico, nossos gestos e nossa reação ao que eles estão dizendo. Imagine-se no papel de um vidente que recebe a visita de uma jovem senhora, de trin ta e poucos anos. Hyman descreveu a m ulher com o “ usando jo ias caras, uma aliança de casam ento e um ve s tid o p re to de te c id o barato. O viden te observador tam bém notou que ela estava usando sapatos próprios de quem tem problem as nos pés” . Será que essas pistas sugerem algo? Com base nessas observações, o v iden te passou a im pres sionar a cliente com suas intuições. Ele pressupôs que a mulher fora consultá -lo , com o fazia a m aioria de suas clientes, por causa de um problem a financeiro ou sentim ental. O vestido p re to e a aliança levaram -no a conc lu ir que o m arido dela havia m orrido recentem ente. As joias caras sugeriram que, durante o casamento, sua vida fora financeiram ente con fo r tável, mas o vestido barato lhe sugeriu que a m orte do m arido a deixara em situação difícil. Os sapatos ortopéd icos s ign ifi caram que ela agora con tava consigo mesma mais do que estava acostumada, indicando que desde a m orte do m arido ela estava traba lhando para se sustentar. Com base nessas conclusões, o v idente adivinhou corre tam ente que a m ulher estava im aginando se não deveria se casar novam ente, na esperança de m elhorar sua situação financeira. Não é à toa, d izem os céticos, que, quando os médiuns não conseguem ver quem se m anifestou para eles, seus clientes não conse guem reconhecer a mensagem direcionada para eles (0 'K ee ffe e W iseman, 2005). Se você não fo r tão astuto com o esse vidente, praticam ente não faz diferença, segundo Hyman. Se uma pessoa o procura para uma adivinhação, com ece com um com entário cu ida doso: “ Sinto que você está tendo alguns problem as u ltim a mente. Você não parece m uito segura quanto ao que fazer. Eu tenho a sensação de que ou tra pessoa está envo lv ida .” Depois d iga -lhe o que ela quer ouvir. M em orize a lgum as "declarações Barnum ” extraídas de manuais de astro log ia e cartom ancia e use-as generosam ente. Diga às pessoas que é responsabilidade delas cooperarem , relacionando suas m en sagens às experiências específicas delas. Mais tarde elas lem brarão que você predisse aqueles detalhes específicos. For mule as declarações com o perguntas, e, quando de tectar uma resposta positiva, afirm e a declaração com mais ênfase. Final mente, seja um bom ouvinte, e depois, com palavras d ife ren tes, revele às pessoas o que elas lhe revelaram anteriorm ente. Se você as enganar, elas voltarão. M elhor ainda: cu idado com aqueles que, ao exp lo ra r as pessoas com essas técnicas, estão mais preocupados em ob ter a fortuna do que em revelá-la. “Sarnas tão diferentes de nós mesmos quanto o somos dos demais." Michel de Montaigne, Ensaios, 1588 Em termos gerais, as influências externas e temporárias sobre o comportamento são o foco da psicologia social, e as influências internas e permanentes são o foco da psicologia da personalidade. Na verdade, o comportamento sempre depende da interação das pessoas com as situações. A mudança e a consistência podem coexistir. Se todas as pessoas se tornassem um pouco menos tímidas com o tempo, haveria mudança de personalidade, mas também relativa estabilidade e previsibilidade. • A Controvérsia Pessoa-Situação Quem, então, representa melhor a personalidade humana: o coerente Sam Gamgee de Tolkien ou o incoerente Laudisi de Pirandello? Ambos. O nosso comportamento é influen ciado pela interação da nossa disposição interior com o nosso ambiente. Contudo, persiste a pergunta: qual delas é mais importante? Nós somos mais como Tolkien ou como Piran dello imaginou que fôssemos? Quando examinamos essa controvérsia pessoa-situação, bus camos traços genuínos de personalidade que persistem atra vés do tempo e entre situações. Algumas pessoas são segura mente conscienciosas e outras inconstantes, algumas alegres e outras tristes, algumas expansivas e outras tímidas? Se con siderarmos a amizade um traço, as pessoas amigáveis devem agir amigavelmente em tempos e lugares diferentes. Será que agem? No Capítulo 5, analisamos pesquisas que acompanharam a vida de pessoas ao longo do tempo. Observamos que alguns estudiosos (especialmente aqueles que estudaram lactentes) ficaram impressionados com a mudança de personalidade; outros foram surpreendidos com a estabilidade da persona lidade durante a vida adulta. Como ilustra a FIGURA 13.5, Correlação o,8 dos escores Q 7 de traços ao longo de 0/6 7 anos 0,5 0,4 I J0 — — --- Crianças Estudantes Aos 30 anos Entre 50 e 70 anos > FIGURA 13.5 Estabilidade da personalidade Com a idade, os traços de personalidade tornam-se mais estáveis, conforme refletido na correlação dos escores dos traços com escores de acompanhamento sete anos mais tarde. (Dados de Roberts e DelVecchio, 2000.) I Crianças Estudantes Aos 30 anos Entre dados extraídos de 152 estudos de longo prazo revelaram que escores dos traços de personalidade se mantinham estáveis sete anos depois e que, à medida que as pessoas envelheciam, sua personalidade se estabiliza. Os interesses podem mudar — um ávido colecionador de peixes ornamentais pode se tor nar um ávido jardineiro. As carreiras podem mudar — um vendedor determinado pode se tornar um assistente social determinado. Os relacionamentos podem mudar — um côn juge hostil pode recomeçar com um novo parceiro. Mas a maioria das pessoas reconhece seus traços como próprios, observam Robert McCrae e Paul Costa (1994), “e é bom que reconheçam. O reconhecimento, por parte de uma pessoa, da inevitabilidade da sua personalidade única é [...] o auge da sabedoria de uma vida inteira”. Assim, a maioria das pes soas, inclusive a maioria dos psicólogos, provavelmente con cordaria com a posição de Tolkien da estabilidade dos traços de personalidade. Além disso, nossos traços são socialmente significativos. Influenciam nossa saúde, nossa forma de pen sar e nosso desempenho no trabalho (Deary e Mathews, 1993; Hogan, 1998). Estudos que acompanham vidas ao longo do tempo demonstram que os traços de personalidade concor rem com status socioeconômico e capacidade cognitiva como fatores preditores de taxas de mortalidade, divórcio e reali zação ocupacional (Roberts et al., 2007). Embora nossos traços de personalidade possam ser ao mesmo tempo estáveis e potentes, a consistência de nossos comportamentos específicos em situações diferentes é uma outra questão. Como apontou Walter Mischel (1968, 1984, 2004), as pessoas não agem com uma coerência previsível. Os estudos de Mischel sobre a realização ou conscienciosi dade de universitários revelaram apenas uma modesta rela ção entre um estudante ser consciencioso em uma ocasião (digamos, chegar pontualmente às aulas) e ser igualmente consciencioso em outra ocasião (digamos, entregar os traba lhos dentro do prazo). Pirandello não ficaria surpreso. Se você já observou o quanto é extrovertido em determinadas situa ções e reservado em outras, talvez também não se surpreenda (embora, para certos traços, afirma Mischel, você pode se autoavaliarcorretamente como mais consistente). Essa inconsistência no comportamento também torna os resultados dos testes de personalidade previsores fracos de comportamento. Por exemplo, os escores das pessoas em tes tes de extroversão não predizem bem até que ponto elas serão realmente sociáveis em uma dada ocasião. Se nos lembrar mos de tais resultados, diz Mischel, seremos mais cautelosos ao rotular e classificar indivíduos. Com anos de antecedên cia, a ciência pode nos dizer a fase da lua para qualquer data. Com um dia de antecedência, os meteorologistas podem, com frequência, predizer 0 tempo. Mas estamos muito longe de podermos predizer como você se sentirá e agirá amanhã. No entanto, o comportamento médio das pessoas em termos de extroversão, felicidade ou negligência pode ser previsível em diversas situações (Epstein, 1983a,b). Quando se avalia a timidez ou a amabilidade de uma pessoa, essa coerência pos sibilita àqueles que a conhecem melhor concordarem com a avaliação (Kenrick e Funder, 1988). Ao registrar momentos das experiências diárias das pessoas por meio de dispositivos de gravação usados no corpo, Matthias Mehl e seus colegas (2006) confirmaram que pessoas extrovertidas realmente falam mais. (Já tentei inúmeras vezes parar de tagarelar e de contar piadas nos meus jogos de basquete com amigos. Infe lizmente, minutos depois, volto a falar em excesso.) Como nossos melhores amigos podem verificar, nós realmente temos traços de personalidade influenciados geneticamente. E esses traços se manifestam, afirmam Samuel Gosling e seus colegas em uma série de estudos, em nossas(os): • preferências musicais. Os amantes de música clássica, jazz, blues e folk tendem a ser abertos a novas experiências e verbalmente inteligentes; já os amantes de música country, pop e religiosa tendem a ser animados, expansivos e conscienciosos (Rentfrow e Gosling, 2003, 2006). Em um primeiro encontro, os estudantes em geral revelam suas preferências musicais; ao fazerem isso, estão trocando informações sobre sua personalidade. • quartos e escritórios. Nossos espaços pessoais revelam nossa identidade e deixam um resíduo comportamental (roupa suja espalhada ou mesa de trabalho arrumada). E isso ajuda a explicar por que uma inspeção de apenas alguns minutos em nossos espaços de vida e trabalho pode permitir que alguém avalie com razoável precisão nossa conscienciosidade, nossa abertura para novas experiências e até mesmo nossa estabilidade emocional (Gosling et al., 2002). • sites pessoais. Um site pessoal ou um perfil no Facebook também são uma forma de autoexpressão? Ou será que é uma oportunidade para as pessoas se apresentarem de forma falsa ou enganadora? O primeiro caso prevalece (Gosling et al., 2007; Marcus et al., 2006; Vazire e Gosling, 2004). Os visitantes de sites pessoais rapidamente obtêm informações importantes sobre a extroversão, conscienciosidade e abertura para a experiência dos donos das páginas. • e-mail. Se você alguma vez já achou que poderia identificar a personalidade de alguém com base na forma como a pessoa redige seu e-mails, acertou!! As avaliações das personalidades de outras pessoas com base apenas em seus e-mails estão correlacionadas aos escores de personalidade de fato obtidos em medidas como de extroversão e neuroceticismo (Gill et al., 2006; Oberlander e Gill, 2006). Os extrovertidos, por exemplo, usam mais adjetivos. Em situações formais e não familiares — por exemplo, como convidados na casa de uma pessoa de outra cultura —, nossos traços podem permanecer ocultos enquanto ficamos atentos às dicas sociais. Em situações informais e familiares — uma reunião com amigos —, nós nos sentimos menos constrangi dos, o que possibilita que nossos traços aflorem (Buss, 1989). Em tais situações, nossos estilos expressivos — nossa anima ção, nossa maneira de falar e de gesticular — são impressio nantemente consistentes. É por isso que esses pequenos frag mentos de comportamento — às vezes não mais do que três pequenos vídeos de 2 segundos de um professor — podem ser reveladores (Ambady e Rosenthal, 1992, 1993). Algumas pessoas são naturalmente expressivas (e, por tanto, talentosas em mímica e charadas); outras são menos expressivas (e, portanto, melhores no jogo de pôquer). Para avaliar o controle voluntário das pessoas sobre sua expressi vidade, Bella DePaulo e colegas (1992) solicitaram às pessoas que agissem o mais expressivamente ou inibidamente possí vel enquanto expunham suas opiniões. Suas notáveis desco bertas: as pessoas inexpressivas, mesmo quando fingiam expressividade, eram menos expansivas do que as pessoas expansivas ao agirem naturalmente. De modo semelhante, as pessoas expressivas, mesmo quando tentavam ser inibidas, eram menos inibidas do que as pessoas inexpressivas ao agi rem naturalmente. É difícil ser alguém que você não é, ou não ser o que você é. Mesmo o uso de palavras em conversas expressa nossa personalidade. Por exemplo, em entrevistas demoradas, as pessoas expressivas e assertivas utilizaram mais palavras que expressam certeza, como “Sempre gostei de computadores e da internet, e isso é certamente onde desejo concentrar minha atenção” (Fast e Funder, 2008). A irreprimibilidade da expres sividade explica por que podemos avaliar dentro de alguns segundos até que ponto uma pessoa é expansiva. Imagine este experimento de Maurice Levesque e David Kenny (1993). Eles reuniram grupos de quatro universitárias em torno de uma mesa e pediram para que cada uma simplesmente dis sesse o próprio nome, o período que estava cursando, a cidade em que nasceu e a residência na universidade. Julgando a partir desses poucos segundos de comportamento verbal e não verbal, as mulheres deveriam adivinhar a loquacidade umas das outras. (Como você acha que se sairia ao adivinhar a loquacidade de uma pessoa com base em apenas um vis lumbre do seu comportamento?) Mais tarde, quando corre lacionados à real loquacidade das mulheres exibida em uma série de fitas de vídeo de conversas individuais, os julgamen tos rápidos se mostraram razoavelmente corretos. Apesar das variações de comportamento de cada situação, a personali dade se revela. Alguém que pareceu ser esperto e expansivo em determinada situação tende a parecer esperto e expansivo em outra (para outra pessoa). Quando julgamos um traço expressivo como a expansividade, pequenas amostras de com portamento podem ser reveladoras. Nossos espaços expressam nossas personalidades Mesmo sem nunca ter visto uma pessoa, é possível perceber alguns aspectos da personalidade alheia dando uma olhada em seus websites, quartos ou escritórios. Assim, o que você deduz sobre o pesquisador Samuel Gosling, da University of Texas? Para resumir, podemos dizer que, a qualquer momento, a situação imediata influencia poderosamente o comporta mento da pessoa, sobretudo quando a situação faz exigências claras. Podemos predizer melhor o comportamento de um motorista em relação aos semáforos conhecendo as cores dos sinais do que conhecendo a personalidade do motorista. Assim, os professores podem perceber certos alunos como moderados (com base no comportamento deles durante as aulas), mas os amigos podem percebê-los como bem desor deiros (com base no comportamento deles em festas). Extrair a média de nosso comportamento em diversas ocasiões revela, portanto, que temos traços distintos de personalidade. Os traços existem. Somos diferentes. E as nossas diferenças são importantes. ANTES DE PROSSEGUIR... >■ P ergunte a S i M esmo Onde você se colocaria nas cinco dimensões da personalidade (realização ou conscienciosidade, socialização, neuroceticismo ou estabilidade emocional, abertura para experiência e extroversão)? Onde seus parentes e amigos colocariam você? > Teste a S i Mesmo 4 O que é a controvérsia pessoa-situação? As respostas às questões Teste a Si Mesmo podem ser encontradas no Apêndice B. no final do livro. A PerspectivaSocial-Cognitiva ......... .............. • • í-?-’ •••* * * * *............. VAV * t * 1 3 : Na visão dos psicólogos da perspectiva social- cognitiva, que influências m útuas m o ld am a personalidade de um indivíduo? A CIÊNCIA PSICOLÓGICA MODERNA considera que os indivíduos são organismos biopsicossociais. A perspectiva social-cognitiva da personalidade, proposta por Albert Ban dura (1986, 2006, 2008), enfatiza a interação dos nossos traços com as nossas situações. Assim como o que é inato e o que é adquirido atuam conjuntamente, o mesmo ocorre com os indivíduos e suas situações. perspectiva social-cognitiva considera que o comportamento é influenciado pela interação entre os traços das pessoas (incluindo sua forma de pensar) e seu contexto sociai. Os teóricos da vertente social-cognitiva acreditam que aprendemos muitos de nossos comportamentos por condi cionamento ou pela observação das outras pessoas, mode lando nosso comportamento conforme o comportamento delas. (Esta é a parte “social”.) Também enfatizam a impor tância dos processos mentais: o que pensamos sobre as situ ações que vivenciamos afeta nosso comportamento. (Esta é a parte “cognitiva”.) Em vez de enfocar somente como nosso meio ambiente nos controla (behaviorismo), os teóricos da perspectiva social-cognitiva enfocam como nós e o meio ambiente interagimos: como interpretamos eventos externos e respondemos a eles? Como nossos esquemas, ou memórias, e nossas expectativas influenciam nossos padrões de com portamento? determinismo reciproco influências de comportamento, cognição interna e ambiente que interagem. Influências Recíprocas Bandura (1986, 2006) chamou a interação entre pessoas e o ambiente de determ inism o recíproco. Segundo ele, “o comportamento, os fatores internos e as influências ambien tais operam como determinantes interligados” (F IG U R A 1 3 .6 ). Por exemplo, os hábitos das crianças de assistir à tele visão (comportamento passado) influenciam suas preferên cias televisivas (fator pessoal), que influenciam de que maneira a televisão (fator ambiental) afeta seu comporta mento atual. As influências são mútuas. Considere três meios específicos em que indivíduos e ambientes interagem: 1. Pessoas diferentes escolhem ambientes diferentes. A escola que você freqüenta, o tipo de literatura que lê, os programas de televisão a que assiste, o tipo de música que ouve, os amigos com quem se associa — tudo faz parte do ambiente que você escolheu, parcialmente com base em suas disposições (Ickes et al., 1997). Você escolhe seu ambiente e ele então o molda. 2 . Nossa personalidade molda a m aneira como inter pretam os os eventos e reagim os a eles. As pessoas ansiosas, por exemplo, são acostumadas com eventos potencialmente ameaçadores (Eysenck et al., 1987). Por conseguinte, percebem o mundo como ameaçador e rea gem de acordo. 3. Nossa personalidade ajuda a criar situações às quais reagim os. Muitos experimentos revelam que o modo como vemos e tratamos as pessoas influencia o modo como elas, por sua vez, nos tratam. Se esperamos que uma pessoa fique zangada conosco, podemos tratá-la com indi ferença, despertando a verdadeira raiva que esperamos. Se tivermos um temperamento tolerante e positivo, pro vavelmente gostaremos de amizades íntimas e condescen dentes (Donnellan et al., 2005; Kendler, 1997). Fatores cognitivos internos (pensamentos e sentimentos sobre atividades arriscadas) Comportamento Fatores ambientais (aprendendo (amigos do bungee-jump) bungee-jump) > FIGURA 13.6 Determinismo recíproco A perspectiva social-cognitiva propõe que nossas personalidades são moldadas pela interação de nossos traços pessoais (incluindo nossos pensamentos e sentimentos), nosso ambiente e nosso comportamento. Influências biológicas • temperamento geneticamente determinado • reatividade do sistema nervoso autônomo • atividade do cérebro Influências psicológicas • Respostas aprendidas • processos de pensamento inconscientes • expectativas e interpretações Personalidade Influências socioculturais • Experiências na infância • Influência da situação • Expectativas culturais • Apoio social > FIGURA 13.7 Abordagem biopsicossocial do estudo da personalidade Como acontece com outros fenômenos psicológicos, a personalidade é estudada com bons resultados em múltiplos níveis. Centenas de estudos já compararam pessoas que diferem quanto ao modo de perceber o controle. De um lado estão aquelas que possuem o que o psicólogo Julian Rotter chamou de lócus de controle externo — a percepção de que o acaso ou forças externas determinam seu destino. Do outro lado estão aquelas que percebem um lócus de controle interno e acreditam que, em grande parte, controlam seu próprio des tino. Estudos e mais estudos mostram que os “internos” pro gridem mais na escola, agem com mais independência, têm uma saúde melhor e se sentem menos deprimidos do que os “externos” (Lefcourt, 1982; Ng et al., 2006). Além disso, são mais capazes de adiar a gratificação e lidar com vários tipos de estresse, incluindo problemas conjugais (Miller et al., 1986). controle pessoal como as pessoas percebem o controle que possuem sobre seu ambiente, em vez de se sentirem perdidas. lócus de controle externo percepção de que a sorte ou forças além do controle pessoal determinam o próprio destino. lócus de controle interno percepção de que você controla seu próprio destino. De algum modo, somos tanto os produtos como os arqui tetos de nossos ambientes. Se tudo isso suscita uma lembrança familiar, pode ser por que essa questão se assemelha e reforça um tema recorrente na psicologia e neste livro: o comportamento emerge da atua ção recíproca das influências internas e externas. A água fervente torna um ovo duro e uma batata macia. Um ambiente ame açador transforma uma pessoa em herói e outra em patife. A todo momento, nosso comportamento é influenciado por nossa biologia, nossas experiências sociais e culturais e nossa cognição e temperamento (FIGURA 1 3 .7 ). Controle Pessoal 1 4 : Quais são as causas e as conseqüências do controle pessoal? Ao estudarem de que maneiras interagimos com nosso meio ambiente, os psicólogos social-cognitivos enfatizam nosso senso de controle pessoal — se aprendemos a nos ver no controle do nosso meio ambiente ou sendo controlados por ele. Os psicólogos têm duas maneiras básicas de estudar o efeito do controle pessoal (ou qualquer fator de personali dade). Primeira: correlacionar os sentimentos de controle das pessoas com seu comportamento e suas realizações. Segunda: experimentar, aumentando ou diminuindo o senso de con trole das pessoas e observando os efeitos. Lócus de Controles Interno e Externo Considere seus próprios sentimentos de controle. Você acre dita que a sua vida está além do seu controle? Que o mundo é conduzido por umas poucas pessoas poderosas? Que con seguir um bom emprego depende principalmente de se estar no lugar certo na hora certa? Ou você acredita mais forte mente que o que acontece com você é resultado de suas pró prias ações? Que uma pessoa comum pode influenciar deci sões governamentais? Que ser bem-sucedido é uma questão de trabalho duro, e não de sorte? Diminuindo e Fortalecendo o Autocontrole O autocontrole — a habilidade de controlar impulsos e adiar a gratificação —, por sua vez, prediz boa adaptação, melhores notas e sucesso social, observam June Tangney e colaborado res (2004). Estudantes universitários que planejam as ativi dades diárias e passam o dia conforme planejado também são menos propensos à depressão (Nezlek, 2001). desamparo aprendido desamparo e resignação passiva que um animal ou humano aprende quando é incapaz de evitar eventos adversos repetidos. Nenhum de nós, entretanto, tem um autocontrole inva riável. Assim como ocorre com um músculo, o autocontrole enfraquece temporariamente depois de um esforço, recupera- se com descanso e fica mais torte com o exercício,relatam Roy Baumeister e Julia Exline (2000). Exercer sua força de vontade pode diminuir sua energia mental e até mesmo o açúcar no sangue e a atividade neural associada ao foco men tal (Inzlicht e Gutsell, 2007). Em um experimento, pessoas famintas que resistiram à tentação de comer biscoitos de cho colate desistiram logo quando confrontadas com uma tarefa entediante. As pessoas se tomam menos contidas em suas respostas agressivas à provocação e em sua sexualidade depois de gastar sua força de vontade em tarefas de laboratório, como sufocar a tendência de dizer em voz alta a cor das palavras (por exemplo, “vermelho” mesmo que a palavra escrita em vermelho fosse verde). (DeWall et al., 2007; Gaillot e Bau meister, 2007). Mas dar às pessoas açúcar para aumentar a energia (em limonadas adoçadas naturalmente em vez de artificialmente) — como aconteceu em um experimento — fortaleceu sua resistência em atividades que exigiam esforço mental (Masicampo e Baumeister, 2008). A longo prazo, o autocontrole requer atenção e energia. As pessoas que praticam a autorregulação por meio de exer cícios físicos e programas de estudo com gerenciamento do tempo podem desenvolver sua capacidade de autorregulação. O maior autocontrole é percebido no desempenho de tarefas de laboratório e em atitudes relacionadas a alimentação, bebida, tabagismo e atividades domésticas (Oaten e Cheng, 2006a,b). Desenvolva sua autodisciplina em uma área da vida e o autocontrole fortalecido poderá se transferir para outras áreas também. Desamparo Aprendido versus Controle Pessoal As pessoas que se sentem impotentes e oprimidas quase sem pre percebem o controle como sendo externo. Essa percepção pode aprofundar seus sentimentos de resignação. Com efeito, foi exatamente isso o que Martin Seligman (1975, 1991) e outros pesquisadores descobriram em experimentos tanto com animais quanto com pessoas. Cães presos em coleiras que receberam choques repetidos, sem oportunidade de evitá- los, aprenderam um sentido de desamparo. Mais tarde, colo cados em outra situação em que podiam escapar da punição simplesmente pulando um obstáculo, os cães agachavam-se como se não tivessem esperança. Em contraste, os animais capazes de escapar dos choques na primeira situação apren deram o controle pessoal e facilmente escaparam dos cho ques em uma nova situação. Confrontadas repetidamente com eventos traumáticos sobre os quais não têm controle, as pessoas, também, passam a se sentir impotentes, desesperançadas e deprimidas. Os psi cólogos denominam essa resignação passiva de desamparo aprendido (FIGURA 1 3 .8 ). Parte do choque que sentimos em culturas não familiares se origina do senso de controle, que diminui quando não estamos certos de como as pessoas no novo ambiente irão responder (Triandis, 1994). Da mesma forma, pessoas a quem é dado pouco controle sobre seu mundo em prisões, fábricas, colégios e clínicas de repouso experimentam baixa de moral e aumento de estresse. Medidas que aumentam o controle — permitir aos prisioneiros que arrumem as cadeiras e con trolem as luzes e a TV da sala, ter os trabalhadores partici pando nas tomadas de decisão, oferecer aos pacientes das clínicas de repouso escolhas sobre seu ambiente — melhoram notadamente a saúde e o moral (Humphrey et al., 2007; Ruback et al., 1986; Wener et al., 1987). Quando os entre vistadores do Gallup perguntaram aos trabalhadores se eles podiam personalizar seu ambiente de trabalho, os que res ponderam sim tinham 55% mais chances de relatar maior envolvimento com o trabalho (Krueger e Killham, 2006). Quem trabalha em casa tende a se sentir satisfeito com o tra balho e produtivo, especialmente quando tem controle sobre o seu tempo (Gajendran e Harrison, 2007). (Quem trabalha em casa três ou mais dias por semana, no entanto, sente-se mais isolado dos colegas.) Eventos ruins incontrolãveis Falta de controle percebida Comportamento de desamparo generalizado ► FIGURA 13.8 Desamparo aprendido Quando animais e pessoas experimentam ausência de controle sobre eventos ruins repetidos, com frequência aprendem o desamparo. Em um estudo famoso feito com pacientes de clínicas de repouso, 93% daqueles que foram incentivados a exercer maior controle tornaram-se mais alertas, mais ativos e mais satisfeitos (Rodin, 1986). Como concluiu a pesquisadora Ellen Langer (1983, p. 291), “o controle percebido é básico para o funcionamento humano”. Ela recomenda que “tanto para os jovens quanto para os idosos” é importante que crie mos ambientes que realcem o senso de controle e a eficácia pessoal. Não é à toa que tantas pessoas gostem de iPods e TiVos, que proporcionam controle sobre o conteúdo e a hora certa para o seu entretenimento. O veredito desses estudos é tranquilizador: em condições em que prevalecem a liberdade pessoal e a autonomia, as pes soas prosperam. Não é de admirar que os cidadãos em socie dades democráticas estáveis relatem altos níveis de satisfação (Inglehart, 1990, 2009). Pouco antes da revolução democrá tica na antiga Alemanha Oriental, os psicólogos Gabriele Oettingen e Martin Seligman (1990) compararam a lingua gem corporal dos homens da classe trabalhadora nos bares de Berlim Oriental e de Berlim Ocidental. Comparados com suas contrapartes do outro lado do Muro, os operários do lado ocidental, que tinham maior atribuição de poder, riam com mais frequência, sentavam-se eretos em vez de curvados e tinham os cantos da boca levantados em vez de caídos. Um pouco de liberdade e controle é melhor do que nada, observa Barry Schwartz (2000,2004). Mas será que o aumento constante de opções disponíveis gera mais felicidade? Na ver dade, não. Schwartz observa que o “excesso de liberdade” visto hoje nas culturas ocidentais contribui para diminuir a satisfação com a vida, aumenta a depressão e leva às vezes à paralisia. Mais opções para os consumidores, como na hora de comprar um carro ou telefone, nem sempre são bênçãos. Depois de escolher entre 30 marcas de geleia ou chocolate, as pessoas manifestam menos satisfação do que aquelas que escolhem entre meia dúzia de opções (Iyengar e Lepper, 2000). Essa tirania da escolha leva a uma sobrecarga de informação e a uma maior probabilidade de lamentarmos não ter feito outras escolhas. Otimismo versus Pessimismo Uma medida de quanto você se sente impotente ou eficaz é saber onde você está em relação ao otimismo e ao pessimismo. De que modo característico você explica os eventos positivos e negativos? Talvez você tenha conhecido estudantes cujos estilos de atribuição sejam negativos — que atribuem baixo desempenho à sua falta de habilidade ( “Não consigo fazer isso”) ou a situações que estão muito além de seu controle (“Não há nada que eu possa fazer quanto a isso”). Tais estu dantes são mais propensos a continuar tirando notas baixas do que os estudantes que adotam a atitude mais esperançosa nas quais o esforço, bons hábitos de estudo e autodisciplina podem fazer diferença (Noel et al., 1987; Peterson e Barrett, 1987). Embora as simples fantasias não tendam a fornecer o combustível para a motivação e para o sucesso, expectati vas positivas genuínas fornecem (Oettingen e Mayer, 2002). Otim ism o e Saúde A saúde também se beneficia de um otimismo básico. Como vimos no Capítulo 12, a desespe rança e a depressão diminuem as defesas do sistema imuno- lógico. Em repetidos estudos, os otimistas sobreviveram aos pessimistas ou viveram com menos enfermidades. Quando casais de namorados lidam com conflitos, os otimistas e seus parceiros consideram que estão fazendo algo construtivo. Ten dem a se sentir mais apoiados e satisfeitos com as soluções e £ M FOC Rumo a uma Psicologia Mais Positiva Durante seu prim eiro século de existência, a psicologia, com - preensivelm ente, dedicou m u ito de sua atenção para enten der e aliviar os estados negativos. Os psicólogos estudaram o abuso e a ansiedade, a depressão e a doença, o preconceitoe a pobreza. Com o salientou o Capítulo 12, o núm ero de a rti gos sobre emoções negativas selecionadas desde 1887 supe rou o de em oções positivas em 17 para 1. Martin Seligman (2002), presidente da Am erican Psycho logical Association, em 1988, observou que em épocas pas sadas, tem pos de relativa paz e prosperidade possib ilitaram às cultura:, desviar a atenção dos cuidados com as fraquezas e danos para p rom over “ as qualidades mais altas da v ida ” . A próspera Atenas do século V a lim entou a filosofia e a dem o cracia. A notável Florença do século XV alim entou as belas- artes. A Ing laterra v itoriana, inflam ada com a generosidade do im pério britânico, alim entou a honra, a disciplina e o dever. A m edida que construím os este novo milênio, Seligman acre d ita que as prósperas culturas ocidentais terão oportun idade semelhante para criar, com o "m onum ento humano e especí fic o ” , uma psicologia mais positiva — uma psicologia p reo cupada não apenas com as fraquezas e os danos, mas ta m bém com a força e a v irtude. Graças à sua própria liderança e a um investim ento de 30 milhões de dólares, o m ovim ento da nova psicologia positiva ganhou força (Seligman, 2004). A psicologia positiva d iv ide com a psicologia humanista o interesse em aum entar a realização humana, mas sua origem e sua m etodo log ia são científicas. Dessas raízes cresceram não só os novos estudos sobre a fe lic idade e a saúde (Capí tu lo 12), mas tam bém a m udança de ênfase da desesperança e da depressão aprendidas para o otim ism o e a prosperidade. "A psico log ia p o s it iv a ” , segundo Seligm an e seus colegas (2005), “ é um term o geral para o estudo das emoções posi tivas, traços positivos do cará ter e institu ições voltadas para o crescim ento” . V istos em con junto, a satisfação com o passado, a fe lic i dade com o presente e o o tim ism o em relação ao fu tu ro d e fi nem o prim eiro p ilar do m ovim ento: em oções positivas. A fe li cidade, afirm a Seligman, é o p rodu to de uma vida prazerosa, com prom etida e significativa. A psicologia positiva tra ta da construção não só de uma vida prazerosa, diz Seligman, mas tam bém de uma vida boa que recorre às habilidades da pessoa, e de uma vida signifi cativa, que aponta para além da própria pessoa. O segundo pilar, po rtanto , o caráter positivo, põe em foco a exploração e o aum ento de v irtudes ta is com o c ria tiv idade , coragem , com paixão, in tegridade, autocontro le , liderança, sabedoria e espiritualidade. As pesquisas atuais exam inam as raízes e os fru tos de tais virtudes, às vezes por meio do estudo de ind i víduos que as exem plificam de maneiras extraordinárias. O terce iro pilar, grupos, com unidades e culturas positivos, busca cria r uma eco log ia social positiva , inc lu indo famílias saudáveis, v iz inhanças so lidárias, escolas eficazes, m ídia socialm ente responsável e d iá logo civil. Será que a psicologia terá uma missão mais positiva neste século? Sem m enosprezar a necessidade de reparar os danos e curar as doenças, os defensores da psicologia positiva espe ram que sim. Com periódicos com o Am erican Psychologist e British Psychologist dedicando edições inteiras à psicologia positiva , com a publicação de vários livros, com cientis tas in terligados traba lhando com grupos de pesquisas m undiais e com novos prêm ios e incentivos à pesquisa, cursos de férias, institu tos prom ovendo bolsas de estudo em psicologia posi tiva, com tu d o isso, esses ps icó logos têm m o tivo para ser positivos. com seus relacionamentos (Srivastava et al., 2006). Espere boas coisas dos outros e, com frequência, conseguirá alcançá- las. Esses estudos ajudaram Seligman a propor uma psicolo gia mais positiva (veja o quadro Em Foco: Rumo a uma Psi cologia Mais Positiva). psicologia positiva estudo científico do funcionamento humano ótimo; tem por objetivo descobrir e fomentar o desenvolvimento de potencialidades e virtudes que capacitam os indivíduos e as comunidades a prosperar. “Oh, Deus, con ced a-nos a g ra ça de a c e ita r com seren id ad e as co isa s que não podem os m udar, coragem p ara m udar as co isa s que podem ser m udadas e sab ed o ria p a ra poder d istin g u i-la s .” Reinhold Niebuhr, A P rece da Serenidade, 1943 2001; Showers, 1992). Estudantes que preocupados em não irem bem nos exames estudam mais a matéria e tiram notas altas quase sempre superam seus colegas igualmente capazes mas excessivamente confiantes. Edward Chang (2001) relata que, comparados com os estudantes euro-americanos, os estu dantes asiático-americanos expressam um pessimismo um tanto maior — o que, segundo ele suspeita, ajuda a explicar sua impressionante realização acadêmica. O sucesso requer otimismo bastante para fornecer esperança e pessimismo sufi ciente para evitar a complacência. Queremos que os pilotos das companhias aéreas estejam atentos aos piores desfechos possíveis. “0 pessim ism o é como o otim ism o, só que m enos perigoso." Mignon McLaughlin, The N eurotic’s N otebook, 1963 Excesso de Otimismo Não só o pensamento positivo em face das adversidades pode gerar bons resultados: uma pitada de realismo também pode fazê-lo (Schneider, 2001). Expli cações autodepreciativas de fracassos passados podem enfra quecer a ambição, mas a ansiedade realista quanto a possíveis fracassos futuros pode ser o combustível do esforço energé tico para se evitar o temido destino (Goodhart, 1986; Norem, ' “Não a ch e i que a co n te ce ria comigo." Earvin “Magic" Johnson, M yLiíe, 1993 [após contrair o HIV] O otimismo excessivo também pode nos deixar cegos para os riscos reais. Neil Weinstein (1980, 1982, 1996) mostrou como nossa tendência natural para o pensamento positivo pode promover “um otimismo não realista quanto a eventos futuros da vida". A maioria dos jovens no fim da adolescên cia se considera como muito menos vulnerável ao vírus da AIDS do que seus pares (Abrams, 1991). A maioria dos estu dantes universitários acha que é menos predisposta a desen volver problemas com bebidas, a desistir do curso ou a sofrer um ataque cardíaco aos 40 anos do que seus colegas de classe. Muitos usuários de cartão de crédito, irrealisticamente oti mistas quanto à forma de utilizar seus cartões, escolhem opções com baixas tarifas e altos juros (Yang et al., 2006). Esses e outros que negam com otimismo os efeitos do fumo, aventuram-se em relacionamentos fadados ao fracasso e se sabotam de várias outras maneiras lembram-nos que, como o orgulho, o otimismo cego pode causar muito estrago. Nossa tendência natural a pensar de modo positivo parece desaparecer, entretanto, quando estamos nos preparando para receber algum feedback, como quando estamos prestes a rece ber os resultados de exames (Carroll et al., 1998). (Você já percebeu que, à medida que um jogo se aproxima do final, o resultado parece mais duvidoso quando seu time está ganhando do que quando ele está perdendo?) As ilusões posi tivas também desaparecem depois de uma experiência pessoal traumática — como desapareceram para as vítimas de um terremoto catastrófico ocorrido na Califórnia, que tiveram de abandonar a ilusão de serem menos vulneráveis a terre motos do que as outras pessoas (Helweg-Larsen, 1999). Cegueira Diante da Própria Incom petência Por iro nia, quase sempre as pessoas apresentam confiança excessiva quando são mais incompetentes. Isso acontece porque é pre ciso ter competência para reconhecer a competência, obser vam Justin Kruger e David Dunning (1999). Eles descobri ram que a maioria dos estudantes que haviam tirado notas abaixo da média em testes de gramática e lógica acreditava que havia tirado notas acima da média. Se você não sabe o que é um bom uso de gramática, você não pode se dar conta de que o seu é fraco. Esse fenômeno da “ignorância quanto à própria incompetência" tem um paralelo, como posso ates tar,na dificuldade das pessoas com problemas de audição de reconhecer sua própria perda de audição. Não estamos “em negação”, mas simplesmente não tomamos consciência do que não ouvimos. Se não escuto meu amigo me chamando pelo nome, o amigo observa minha falta de atenção. Mas para mim não aconteceu nada. Ouço o que eu ouço — o que, para mim, parece bastante normal. A dificuldade de reconhecer a própria incompetência ajuda a explicar por que tantos estudantes com resultados fracos se surpreendem quando tiram notas baixas numa prova. Se você não percebe todas as palavras que deixou passar quando joga palavras cruzadas num tabuleiro, pode se achar bem esperto — até alguém lhe mostrar a verdade. Como Deanna Caputo e Dunning (2005) demonstraram em experimentos que recriam esse fenômeno, nossa ignorância do que não sabemos ajuda a manter a confiança em nossas próprias habi lidades. Para avaliar a competência de alguém e prever seu desem penho, muitas vezes vale a pena convidar outras pessoas para avaliar, observa Dunning (2006). Com base em estudos em que tanto os indivíduos quanto seus conhecidos preveem seu futuro, podemos arriscar alguns conselhos: se você for um médico que está se formando e quiser prever se terá bons resultados no exame de habilidades cirúrgicas, não avalie a si mesmo, peça a seus colegas que façam uma previsão sin cera. Se você for um oficial da Marinha e precisa avaliar suas capacidades de liderança — não avalie a si mesmo, mas peça aos seus colegas oficiais que o façam. E se você está apaixo nado e quer prever se o relacionamento vai durar, não dê ouvidos ao seu coração, mas preste atenção no que o seu colega de quarto diz. “G jogador [de palavras cruzadas de tabuleiro] tem sorte... Ele não faz ideia de todas as possibilidades que deixa de concretizar em cada jogada, de quantas palavras ou jogadas perfeitas passam despercebidas." Stefan Fatsis, Word Freak, 2DD1 Avaliando o Comportamento em Situações • ............................................ ............................... 15: Q u e princípio subjacente orienta os psicólogos da perspectiva social-cognitiva em sua avaliação do co m p o rtam en to e das crenças individuais? Os pesquisadores da perspectiva social-cognitiva exploram como as pessoas interagem com as situações. Para prever o comportamento, em geral, observam o comportamento em situações realistas. A ideia, embora efetiva, não é nova. Um exemplo ambi cioso foi a estratégia do exército norte-americano na Segunda Guerra Mundial para avaliar os candidatos a missões de espio nagem. Em vez de usarem testes escritos, os psicólogos do Exército submeteram os candidatos a condições secretas simu ladas. Testaram sua habilidade de lidar com o estresse, de resolver problemas, de manter a liderança e de aguentar inten sos interrogatórios sem revelar seus disfarces. Embora tenha sido demorada e cara, essa avaliação de comportamento em uma situação realista ajudou a prever sucessos futuros em missões de espionagem reais (OSS Assessment Staff, 1948). Os estudos modernos indicam que os exercícios de centros de avaliação são mais reveladores de algumas dimensões, como a capacidade de comunicação, do que outros, como o impulso para a realização (Bowler e Woehr, 2006). As organizações militares e educacionais e muitas empre sas que constam na lista das 500 maiores companhias indus triais publicada anualmente pela revista Fortune continuam adotando essa estratégia em suas avaliações de centenas de milhares de pessoas todos os anos em centros de avaliação (Bray et al., 1991, 1997; Thornton e Rupp, 1997). A AT&T observa os candidatos a cargos de gerência executando traba lhos gerenciais simulados. Muitas universidades avaliam as habilidades potenciais de professores de nível universitário observando-os lecionar, e o potencial dos estudantes de pós- graduação via estágios e aulas para alunos da graduação. As Forças Armadas avaliam seus soldados observando-os em exer cícios militares. A maioria das cidades norte-americanas com 50.000 habitantes ou mais usa centros de avaliação para che car a força policial e o corpo de bombeiros (Lowry, 1997). Esses procedimentos exploram o princípio de que a melhor maneira de se predizer o comportamento futuro não é nem por meio de testes de personalidade nem pela intuição do entrevistador. Em vez disso, são os padrões de comportamento passado da pessoa em situações semelhantes que contribuem para uma melhor avaliação (Mischel, 1981; Ouellette e Wood, 1998; Schmidt e Hunter, 1998). Desde que a situação e a pes soa permaneçam muito parecidas, a melhor previsão de desem penho futuro no trabalho é o desempenho no trabalho pas sado; a melhor previsão de notas futuras são as notas passa das; a melhor previsão de agressividade futura é a agressividade passada; a melhor previsão do uso de drogas no adulto jovem é o uso de drogas durante o ensino médio. Se você não pode checar o comportamento passado da pessoa, o melhor a fazer é criar uma situação de avaliação que simule as demandas da tarefa a fim de que possa ver como a pessoa lida com elas. • O N ew York Times analisou cem casos de assassinos v io len tos responsáveis por crimes ocorridos durante a segunda m etade do século XX; 55 dos crim inosos tinham norm alm ente acessos de raiva, e 63 já haviam m anifestado com portam ento v io len to (G oodstein e Glaberson, 2 0 0 0 ). A m aioria deles não “ surtou” sem antes dar algum sinal. • Avaliando a Perspectiva Social-Cognitiva 16: Qual foi a contribuição da perspectiva social- cognitiva para o estudo da personalidade, e que críticas enfrentou? A perspectiva social-cognitiva sobre a personalidade sensibi liza os pesquisadores no que diz respeito a até que ponto as situações afetam os indivíduos e são afetadas por eles. Mais do que em outras perspectivas, sua formação vem da pesquisa psicológica sobre aprendizagem e cognição. Mas os críticos afirmam que a perspectiva social-cognitiva é tão concentrada na situação que deixa de apreciar os traços internos da pessoa. Onde está a pessoa nessa visão de perso nalidade?, perguntam seus críticos; e onde estão as emoções humanas? É verdade, a situação realmente guia nosso com portamento. Entretanto, dizem os críticos, em muitas circuns tâncias nossos motivos inconscientes, nossas emoções e nos sos traços mais visíveis transparecem. Os traços de persona lidade já mostraram como podem predizer o comportamento no trabalho, no amor e no lazer. Nossos traços biologicamente influenciados são realmente importantes. Considere Percy Ray Pridgen e Charles Gill. Eles passaram pela mesma situação: ganharam juntos um prêmio de US$ 90 milhões na loteria (Harriston, 1993). Quando Pridgen soube dos números sor teados, começou a tremer descontroladamente, agarrado a um amigo atrás da porta de um banheiro, enquanto confir mava a conquista, e depois caiu em pranto. Quando Gill soube da notícia, contou à esposa e depois foi dormir. ANTES DE PROSSEGUIR... > Pergunte a Si Mesmo Você é um pessimista? Tem baixas expectativas e atribui os maus eventos à sua incapacidade ou a circunstâncias que estão além do seu controle? Ou você é um otimista, quem sabe até uma pessoa que com frequência exibe um “otimismo exagerado”? De que maneira qualquer das duas tendências influenciou a sua escolha referente aos estudos ou disciplinas cursadas? > Teste a Si Mesmo 5 Como o desamparo e o otimismo aprendidos influenciam o comportamento? Pis respostas às questões Teste a Si Mesmo podem ser encontradas no Apêndice B. no final do livro. self na psicologia contemporânea, considerado o centro da personalidade, o organizador dos nossos pensamentos, sentimentos e ações. efeito holofote percepção exagerada de que os outros estão O D s e r v a n d o e avaliando nossa aparência, desempenho e fracassos (como se imaginássemos um holofote sobre nós). autoestima sentimento individual de valor que pode ser alto ou baixo.Explorando o Self . ................................................................ ......................... ».* ] • • • * • • • 17: U m a elevada au toestim a nos ajuda ou atrapalha? A PREOCUPAÇÃO DA PSICOLOGIA COM O senso de self das pessoas existe pelo menos desde que William James, em seu Princípios de Psicologia (1890), dedicou mais de cem pági nas ao assunto. Em 1943, Gordon Allport lamentou que o self se “perdera de vista”. Nem mesmo a ênfase da psicologia humanista no self instigou muita pesquisa científica, mas ajudou a renovar o conceito e a mantê-lo vivo. Agora, mais de um século depois de James e fora da psicologia humanista, o self é um dos tópicos mais vigorosamente pesquisados da psicologia no Ocidente. Todo ano aparece uma abundância de novos estudos sobre autoestima, autorrevelação, autocons ciência, autoesquema, automonitoração e assim por diante. Por trás das pesquisas está a suposição de que o self, como organizador de nossos pensamentos, sentimentos e ações, é o centro da personalidade. Um exemplo de pensamento sobre o self é o conceito de selves possíveis por Hazel Markus e colegas (Cross e Markus, 1991; Markus e Nurius, 1986). Os seus selves possíveis incluem sua visão do self que você sonha vir a ser — o eu rico, o eu bem-sucedido, o eu amado e admirado. Também incluem o self que você teme vir a ser — o eu desempregado, o eu soli tário, o eu academicamente fracassado. Tais possíveis selves nos motivam estabelecendo objetivos específicos e invocando a energia para trabalharmos rumo a esses objetivos. Alunos de medicina da Universidade de Michigan obtêm notas mais altas se passarem por um programa em que se imaginam como médicos bem-sucedidos. Com frequência os sonhos dão origem a realizações. “0 primeiro passo para uma vida melhor é imaginá-la." Biscoito da sorte chinês A partir de nossa perspectiva autocentrada, também supo mos que os outros estão nos observando e avaliando. Thomas Gilovich (1996) demonstrou esse efeito holofote solici tando individualmente a estudantes da Cornell University que vestissem uma camiseta com estampa de Barry Manilow antes de entrarem em sala de aula. Sob o efeito da autocons ciência, os estudantes que trocaram de camiseta imaginaram que quase metade dos colegas de classe notaria a troca quando eles entrassem. Na verdade, apenas 23% notaram. Essa ausên cia de atenção não se aplica somente a nossas roupas estra nhas e nossos cabelos em desalinho, mas também ao nosso nervosismo, nossa irritação ou nossa atração — menos pes soas do que supomos os notam (Gilovich e Savitsky, 1999). Os outros também estão menos cientes do que supomos da variabilidade — os altos e baixos — da nossa aparência e do nosso desempenho (Gilovich et al., 2002). Mesmo depois de uma mancada (disparar o alarme da biblioteca, aparecer para o jantar com roupas não apropriadas), nos sobressaímos menos do que imaginamos (Savitsky et al., 2001). Saber do efeito holofote pode ser revelador. Ajudar oradores que pre cisam falar em público a compreender que seu nervosismo natural não está tão aparente assim para a platéia melhora o seu desempenho (Savitsky e Gilovich, 2003). Os Benefícios da Autoestima Como nos sentimos em relação a nós mesmos também é importante. Uma autoestim a elevada — um sentimento de valor pessoal — é positiva. As pessoas que se sentem bem em relação a si mesmas (que concordam inteiramente com decla rações dos questionários de autoafirmação do tipo “É diver tido conviver comigo”) passam menos noites sem dormir, cedem com menos facilidade a pressões para se conformar, são menos propensas a usar drogas, mais persistentes diante de tarefas difíceis, menos tímidas e solitárias, menos propen sas a ver rejeição onde não existe e são, simplesmente, mais felizes (Greenberg, 2008; Leary, 1999; Murray et al., 2002; Watson et al., 2002). Além disso, a autoestima de hoje às vezes antecipa realizações futuras. Em um estudo com 297 estudantes universitários finlandeses, os índices de autoes tima foram bons indicadores de conquistas no âmbito do trabalho, salário e satisfação profissional uma década depois (Salmela-Aro e Nurmi, 2007). Será que a autoestima elevada é realmente a “armadura que protege as crianças” dos problemas da vida? Alguns psicólogos têm dúvidas (Baumeister, 2006; Dawes, 1994; Leary, 1999; Seligman, 1994,2002). Embora o autoconceito acadêmico das crianças — sua confiança de que podem se sair bem em deter minada matéria — preveja a realização acadêmica, isso não se aplica à autoimagem geral (Marsh e Craven, 2006; Swann et al., 2007; Trautwein et al., 2006.) Talvez a autoestima simples mente reflita a realidade. Talvez sentir-se bem resulte de se sair bem. Talvez a autoestima seja o efeito colateral de enfrentar desafios e superar dificuldades. Talvez seja o medidor que lê em voz alta o estado de nossas relações com os outros. Se for assim, empurrar o “medidor” para que fique artificialmente mais alto não seria como forçar o ponteiro de combustível do carro a mostrar “cheio”? E se os problemas e fracassos derrubam a autoestima, será que a melhor maneira de elevarmos a auto estima não dependeria tanto de repetirmos às crianças o quanto elas são maravilhosas, mas de seu próprio enfrentamento e realizações conquistadas com esforço? "Fala-se muito de autoestim a atualmente. Isso me parece bem básico. Se você quiser se sen tir orgulhoso de si mesmo, precisa fazer coisas de que se orgulhe." Oseola McCarty, trabalhadora de uma lavanderia no Mississippi, após doar IIS$ 150.0DD para a University of Southern Mississippi Todavia, o efeito da baixa autoestima realmente aparece em experimentos. Diminua temporariamente a autoimagem das pessoas (por exemplo, dizendo-lhes que foram mal no teste de aptidão ou depreciando sua personalidade) e elas ficarão mais propensas a depreciar outras pessoas ou a expressar pre conceito racial exacerbado (Ybarra, 1999). As pessoas nega tivas quanto a si mesmas também tendem a ser extremamente sensíveis a críticas e a gostar de julgar (Baumgardner et al., 1989; Pelham, 1993). Em experimentos, aqueles a quem se deixa inseguros quase sempre se tornam excessivamente crí ticos, como que para impressionar os outros com seu próprio brilhantismo (Amabile, 1983). Tais descobertas são coerentes com as suposições de Maslow e Rogers de que uma autoima gem saudável gera bons resultados. Aceite a si mesmo e será mais fácil aceitar os outros. Desdenhe de si mesmo e você estará sujeito ao fenômeno dafloccinaucinihilipilification1, isto é, o ato de considerar algo inútil. De forma mais simples, algumas pessoas “amam ao próximo como a si mesmas”; outras detestam o próximo como a si mesmas. As pessoas que são negativas em relação a si mesmas também tendem a ser negativas em relação a outras coisas e aos outros. viés em proveito próprio (self-serving bias) tendência a se perceber de modo favorável. Viés em Proveito Próprio (Self-Serving Bias) Carl Rogers (1958) certa vez discordou da doutrina religiosa segundo a qual os problemas da humanidade emergem do amor-próprio ou do orgulho. Ele observou que a maioria das pessoas que ele havia conhecido “desprezava a si mesma, via- se como inútil e desagradável”. Mark Twain tinha uma opi nião semelhante: “Nenhum homem, na mais íntima priva cidade do seu ser, tem qualquer respeito considerável por si mesmo.” Na verdade, a maioria de nós tem uma boa reputação de nós mesmos. Em estudos de autoestima, mesmo aqueles que apresentam baixos resultados demonstram estar a meio cami nho de pontuações mais altas. (Uma pessoa que tem auto estima “baixa” responde a declarações como “Eu tenho boas ideias” seguidas de termos como às vezes ou de vez em quando.) Além disso, uma das recentes conclusões mais provocativas e bem estabelecidas da psicologia diz respeito ao nosso potente viés em proveito próprio (self-serving bias) — nossa dis posição a nos percebermos de modo favorável (Mezulis etal., 2004; Myers, 2008). Considere estas descobertas: As pessoas assumem a responsabilidade mais por boas ações do que por más, e mais por sucessos do que por fracas sos. Os atletas, com frequência, creditam suas vitórias às suas próprias proezas e seus fracassos a má sorte, arbitragem ruim ou desempenho excepcional do outro time. Depois de rece ber notas baixas em uma prova, a maioria dos estudantes, em seis estudos, criticou a prova e não a si mesmos. Em for mulários de sinistros, motoristas já explicaram acidentes nos seguintes termos: “Um carro invisível apareceu não sei de onde, bateu no meu carro e desapareceu.” “Quando cheguei ao cruzamento, o mato brotou, obscurecendo minha visão, e eu não vi o outro carro.” A pergunta “O que eu fiz para merecer isso?” é a que normalmente fazemos diante de nos sos problemas, e não diante dos sucessos, que, em geral, acha mos merecer. A maioria das pessoas se julga melhor do que a média. Isso é verdade para quase todas as dimensões subjetivas e socialmente desejáveis. Em levantamentos nacionais, a maio- ’Não resisti e inseri este termo. Trata-se da maior palavra não técnica da primeira edição do Oxford English Dictionary, o mais completo dicio nário da língua inglesa. ria dos executivos se considera mais ética do que a média de seus colegas. Em vários estudos, 90% dos gerentes e mais de 90% dos professores universitários estimaram seu desempe nho como superior ao de seus pares médios. Na Austrália, 86% das pessoas estimaram seu desempenho no trabalho como acima da média e apenas 1% como abaixo da média. O fenômeno, que reflete a superestimação da própria pessoa em vez da subestimação dos outros (Epley e Dunning, 2000), é menos evidente na Ásia, onde as pessoas valorizam a modés tia (Heine e Hamamura, 2007). Mesmo assim, o viés em proveito próprio tem sido observado no mundo todo: entre estudantes holandeses, australianos e chineses; motoristas japoneses; indianos hindus; e franceses de todas as escalas sociais. Em todos os 53 países pesquisados, as pessoas expres saram autoestima acima da média da escala mais amplamente usada (Schmitt e Allik, 2005). Por ironia, as pessoas até mesmo se consideram mais imu nes do que os outros ao viés em proveito próprio (Pronin, 2007). O mundo, ao que parece, é como Garrison Keillor escreveu em Lago Wobegon — um lugar em que “todas as mulheres são fortes, todos os homens são bonitos e todas as crianças estão acima da média”. O mesmo vale para os ani mais de estimação. Três em quatro donos de animais acredi tam que o seu é mais esperto do que a média (Nier, 2004). “Amar a si mesmo é □ começo de um romance duradouro." Oscar Wilde, 0 Marido Id ea l , 1B95 • Exibimos orgulho de grupo — a tendência a ver nosso grupo (escola, país ou raça) como superior. Além disso, o orgulho, como a religião e a literatura nos lembram, quase sempre antecede a queda. As percepções ego ístas são a base dos conflitos que vão desde culpar o cônjuge por discórdias matrimoniais a afirmar arrogantemente a pró pria superioridade étnica. As pessoas que têm ego muito grande, quando sentem sua autoestima ameaçada, podem fazer mais do que humilhar os outros: podem reagir violen tamente. O “orgulho ariano” foi o combustível das atrocida des nazistas. “Essa tendenciosidade tem o efeito de tornar as guerras mais fáceis de iniciar e mais difíceis de terminar”, observam Daniel Kahneman e Johathan Renshon (2007). Podemos ver essas tendências mesmo em crianças, onde a receita para brigas freqüentes combina autoestima elevada com rejeição social. As crianças mais agressivas tendem a ter alta autoestima e a ser desconsideradas por outras crianças (van Boxtel et al., 2004). Da mesma forma, um adolescente ou adulto cheio de si que se sente diminuído por um insulto é alguém potencialmente perigoso. Brad Bushman e Roy Bau meister (1998) experimentaram esse “lado negro da autoes tima”. Pediram a 540 universitários voluntários que escre vessem um parágrafo, que receberia de outro suposto estu dante um comentário elogioso ( “Ótimo texto!”) ou crítico ( “Um dos piores textos que já li!”). Em seguida, os autores dos textos participavam de um jogo de tempo de reação com o outro estudante. Depois que ganhavam, podiam agredir o oponente com ruídos de qualquer intensidade durante qual quer período de tempo. “0s autorretratos nos quais acreditamos, quando temos liberdade para expressá-los, são incrivelmente mais positivos do que revela a realidade.” Shelley Taylor, Positive Illusions, 19B9 O viés em proveito próprio vai contra a psicologia popu lar. “Todos nós temos complexo de inferioridade”, escreveu John Powell (1989, p. 15). “Aqueles que parecem não ter tal complexo estão apenas fingindo.” Mas descobertas adicionais eliminam quaisquer dúvidas (Myers, 2008): • Lembramos e justificamos nossas ações passadas de modo a nos colocarmos em destaque. • Exibimos uma confiança inflada em nossas crenças e nossos julgamentos. • Superestimamos o modo desejável como agiríamos em situações nas quais a maioria das pessoas se comporta menos do que admiravelmente. • Com frequência, buscamos informações que nos são favoráveis e que nos distinguem. • Acreditamos mais rapidamente nas descrições lisonjeiras de nós mesmos do que nas não lisonjeiras, e nos impressionamos com testes psicológicos que nos fazem parecer bem. • Fortalecemos nossa autoimagem ao superestimar a trivialidade de nossas fraquezas e subestimar a normalidade de nossas habilidades. • Consideramos que fazemos contribuições superiores à média do nosso grupo (e o mesmo acontece com nossos colegas de equipe, o que explica por que as estimativas sobre as contribuições dos membros do grupo em geral somam mais de 100%). "As defesas entusiasmadas do movimento pela autoestima variam, em grande parte, da fantasia ao nonsense. Os efeitos da autoestima são pequenos, limitados, e nem sempre bons." Roy Baumeister (1995) Você é capaz de adivinhar o resultado? Depois da crítica, aqueles que tinham autoestima excessivamente alta foram “excepcionalmente agressivos”. A tortura auditiva deles durou três vezes mais do que a daqueles que tinham autoestima normal. Ao que parece, o “egotismo ameaçado”, mais do que a baixa autoestima, predispõe à agressão. “Incentivar as pes soas para que se sintam bem em relação a si mesmas quando elas não merecem” causa problemas, conclui Baumeister (2001). "Convencidos, os indivíduos presunçosos se tornam agressivos contra aqueles que furam suas bolhas de amor- próprio.” Depois de monitorar a autovalorização nas várias últimas décadas, a psicóloga JeanTwenge (2006;Twengeetal., 2008) relata que a nova geração — ela chama de Geração Eu — expressa mais narcisismo (concordando com mais frequência com declarações do tipo: “Se eu comandasse o mundo, ele seria um lugar melhor” ou “Acho que sou uma pessoa espe cial”). A concordância com essas declarações está correlacio nada ao materialismo, ao desejo de ser famoso, a expectativas exageradas, mais conexões com poucas relações que envol vam compromisso, mais apostas e mais traição, tudo isso aumentando à medida que o narcisismo cresce. Apesar dos perigos comprovados do orgulho, muitas pes soas rejeitam a ideia do viés em proveito próprio, insistindo em que ela negligencia os que se sentem inúteis e antipáticos e parecem desprezar a si mesmos. Se o viés em proveito pró prio prevalece, por que tantas pessoas depreciam a si mes mas? Por três razões: às vezes, o menosprezo direcionado à própria pessoa é estratégia sutil, pois evoca afagos tranquili zadores. Dizer “Ninguém gosta de mim” pode evocar, pelo menos, “Mas nem todo mundo conhece você!”. Outras vezes, tal como antes de um jogo ou uma prova, os comentários autodepreciativos nos preparam para possíveis fracassos. O treinador que exalta a força superior do futuro oponente torna uma derrota compreensível, e uma vitória notável. E, finalmente, a autodepreciação também pertenceao velho self de alguém. As pessoas são muito mais críticas de seus selves passados do que atuais — mesmo quando não houve mudança (Wilson e Ross, 2001). “Quando eu tinha 18 anos, era um idiota; hoje sou mais sensível.” Do ponto de vista deles, cabeça-dura ontem, campeão hoje. Mesmo assim, é verdade: todos nós algumas vezes, e alguns de nós na maioria das vezes, realmente nos sentimos infe riores — especialmente quando nos comparamos com aque les que estão um ou dois degraus acima na escada de prestí gio, aparência, renda ou habilidade. Quanto maiores forem a profundidade e a frequência com que temos esses senti mentos, mais infelizes, e até deprimidos, seremos. Mas, para a maioria das pessoas, o pensamento tem uma tendenciosi- dade naturalmente positiva. Embora reconhecendo o lado obscuro tanto do viés em proveito próprio quanto da autoestima, alguns pesquisadores preferem isolar os efeitos dos dois tipos de autoestima — defensiva e segura (Kernis, 2003; Lambird e Mann, 2006; Ryan e Deci, 2004). A autoestima defensiva é frágil. Concen- tra-se em se autossustentar, o que faz com que os fracassos e as críticas pareçam ameaçadores. Tal egotismo expõe o indi víduo a ameaças percebidas, que alimentam a raiva e a desor dem, observam Jennifer Crocker e Lora Park (2004). Assim, como a baixa autoestima, a autoestima defensiva está corre lacionada a um comportamento agressivo e antissocial (Don nellan et al., 2005). A autoestima segura é menos frágil, porque depende menos das avaliações externas. O indivíduo sente-se aceito pelo que é, não pela sua aparência, riqueza ou fama, e isso alivia as pressões e promove o sucesso e o foco para além de nós mes mos. Perdendo o foco em nós mesmos nos relacionamentos e buscando objetivos maiores do que o nosso self, Crocker e Park acrescentam, poderemos alcançar uma autoestima mais segura e maior qualidade de vida. ANTES DE PROSSEGUIR... > Pergunte a Si Mesmo Com que possíveis selves você sonha — ou teme? Até que ponto esses selves imaginados motivam você agora? >- T este a S i M esmo 6 Em uma pesquisa de opinião do Instituto Gallup, feita em 1997, os norte-americanos brancos estimaram que 44% de seus compatriotas brancos eram altamente preconceituosos (atribuindo a eles 5 ou mais pontos em uma escala de 10). Quantos avaliaram a si mesmos como altamente preconceituosos? Apenas 14%. Que fenômeno esse comportamento ilustra? As respostas às questões Teste a Si Mesmo podem ser encontradas no Apêndice B, no final do livro. “Se você se com p arar com os outros, ta lvez se to rn e orgulhoso e am argo: pois sem pre h av erá algu ém m elhor ou p ior do que você." Max Ehrmann, “Desiderata", 1927 r e v i s ã o do c a p í t u l o : Personalidade A Perspectiva Psicanalítica 1 : Qual era a visão de Freud sobre a personalidade e seu desenvolvimento? O tratamento de transtornos emocionais levou Sigmund Freud a crer que eles eram fruto de dinâmicas inconscientes, que ele procurava analisar através da associação livre e dos sonhos. Ele chamava sua teoria e técnicas de psicanálise. Ele considerava que a personalidade se compunha de impulsos psíquicos que buscavam o prazer (o id), um executivo orientado para a realidade (o ego) e um conjunto internalizado de ideais (o superego). Ele acreditava que as crianças se desenvolvem através de fases psicossexuais, e que nossas personalidades são influenciadas pelo modo como resolvemos os conflitos associados a esses estágios e se nos mantivemos fixados em algum deles. 2 : Como Freud achava que as pessoas se defendiam contra a angústia? As tensões entre as demandas do id e do superego provocam a angústia. O ego resiste através de mecanismos de defesa, especialmente o recalque. 3 : Quais das ideias de Freud foram aceitas ou rejeitadas por seus seguidores? Os neofreudianos Alfred Adler, Karen Horney e Carl Jung aceitaram muitas das ideias de Freud. Mas Adler e Horney afirmaram que temos outras motivações além do sexo e da agressão e que o controle consciente do ego é maior do que o suposto por Freud; Jung, por sua vez, propôs a existência de um inconsciente coletivo. Os teóricos psicodinâmicos concordavam com a visão de Freud de que os processos mentais inconscientes, os conflitos internos e as experiências da infância são influências importantes sobre a personalidade. 4 : O que são testes projetivos, e como são usados? Os testes projetivos procuram avaliar a personalidade apresentando estímulos ambíguos criados para revelar o inconsciente. Apesar de os testes projetivos, como as manchas de Rorschach, serem dúbios em termos de confiabilidade e validade, muitos clínicos continuam a adotá-los. 5 : Qual a visão dos psicólogos contem porâneos sobre Freud e o inconsciente? Os pesquisadores atuais da psicologia observam que a teoria freudiana oferece explicações posteriores aos fatos e que o recalque raramente ocorre. As pesquisas atuais sobre o processamento de informações confirmam que nosso acesso a tudo o que ocorre na mente é muito limitado, mas isso não reforça a visão freudiana do inconsciente. Ao contrário, o inconsciente consiste em esquemas que controlam nossas percepções; pré-ativação (priming); processamento paralelo que ocorre sem nossa percepção consciente; memórias implícitas de habilidades aprendidas; emoções ativadas instantaneamente; e autoconceitos e estereótipos que filtram informações sobre nós mesmos e sobre os outros. Também são poucos os defensores da ideia de mecanismos de defesas. O efeito de falso consenso da psicologia (a tendência a superestimar a concordância alheia com nossas crenças e comportamentos), no entanto, guarda alguma semelhança com a projeção freudiana, e a formação reativa também parece ocorrer. Contudo, Freud atraiu a atenção da psicologia para o inconsciente, para o esforço de lidar com a angústia e a sexualidade e para o conflito entre os impulsos biológicos e as restrições sociais. Seu impacto sobre a cultura foi enorme. A Perspectiva Humanista 6 : Como os psicólogos humanistas veem a personalidade, e qual era seu objetivo ao estudar a personalidade? Os psicólogos humanistas procuram desviar a atenção da psicologia para o potencial de crescimento de pessoas saudáveis. Abraham Maslow acreditava que, se as necessidades humanas básicas fossem atendidas, as pessoas se desenvolveriam rumo à autorrealização. Para fomentar o crescimento dos outros, Carl Rogers aconselhava que fôssemos genuínos, tolerantes e empáticos. Nesse clima de consideração positiva incondicional, ele acreditava que as pessoas desenvolveriam uma autoconsciência mais profunda e um autoconceito mais realista e positivo. 7 : Como os psicólogos humanistas avaliaram o sentido do self? Os psicólogos humanistas avaliaram a personalidade através de questionários em que as pessoas reportavam seus autoconceitos e em terapia, procurando compreender as experiências pessoais subjetivas alheias. 8 : Como a perspectiva humanista influenciou a psicologia? Que críticas ela enfrentou? A psicologia humanista ajudou a renovar o interesse da psicologia pelo conceito de self. Ainda assim, os críticos da psicologia humanista alegaram que seus conceitos eram vagos e subjetivos, seus valores eram ocidentais e autocentrados e suas pressuposições ingenuamente otimistas. A Perspectiva do Traço 9 : Como os psicólogos utilizam os traços para descrever a personalidade? Em vez de explicar os aspectos ocultos da personalidade, os teóricos do traço procuram descrever nossas características estáveis e duradouras. Utilizando a análise fatorial, os pesquisadores isolaram dimensões importantes da personalidade. Predisposições genéticas influenciam diversos traços. 10: 0 que são inventários de personalidade, e quais são seus pontos fracos e fortes como instrumentos de avaliação de traços? Os inventários de personalidade (como MMPI) são questionários para mensurar uma ampla variedade de sentimentos e comportamentos. Ositens são empiricamente testados, e os testes têm pontuação objetiva. Entretanto, as pessoas podem mentir em suas respostas para criar uma boa impressão; além disso, a facilidade dos testes por computador pode levar ao uso equivocado dessas avaliações. 1 1 : Que traços parecem fornecer informações mais úteis sobre a variação de personalidade? As Cinco Grandes dimensões da personalidade — neuroceticismo ou estabilidade emocional, extroversão, abertura para a experiência, socialização e realização ou ( C o n t in u a ) consciensiosidade — oferecem um quadro razoavelmente abrangente da personalidade. 1 2 : As pesquisas apoiam a consistência dos traços de personalidade ao longo do tempo e em várias situações? Apesar de os traços das pessoas persistirem ao longo do tempo, seus comportamentos variam muito de uma situação para outra. Apesar dessas variações, o comportamento médio de uma pessoa em diferentes situações tende a ser razoavelmente uniforme. A Perspectiva Social-Cognitiva 1 3 : Na visão dos psicólogos da perspectiva social- cognitiva, que influências mútuas moldam a personalidade de um indivíduo? A perspectiva social-cognitiva aplica princípios de aprendizagem, cognição e comportamento social à personalidade, com especial ênfase nas formas como nossa personalidade influencia e é influenciada pela interação com o ambiente. Ela pressupõe o determinismo recíproco — segundo o qual os fatores pessoais-cognitivos interagem com o ambiente para influenciar o comportamento das pessoas. 1 4 : Quais são as causas e as conseqüências do controle pessoal? Estudando como as pessoas variam em seu lócus de controle (externo ou interno) percebido, os pesquisadores constataram que um senso de controle pessoal ajuda as pessoas a lidar com a vida. A pesquisa sobre desamparo aprendido evoluiu para os efeitos do otimismo e do pessimismo, que levou a um movimento mais amplo por uma psicologia positiva. 1 5 : Que principio subjacente orienta os psicólogos da perspectiva social-cognitiva em sua avaliação do comportamento e das crenças individuais? Os pesquisadores da perspectiva social-cognitiva estudam a interação das pessoas com as situações. Eles tendem a acreditar que a melhor maneira de prever o comportamento de alguém em uma determinada situação é observar o comportamento da pessoa em situações semelhantes. 1 6 : Qual foi a contribuição da perspectiva social- cognitiva para o estudo da personalidade, e que criticas enfrentou? Apesar de ser falha por não enfatizar suficientemente a importância das dinâmicas inconscientes, emoções e traços internos, a perspectiva social-cognitiva aprimora os conceitos psicológicos bem-estabelecidos da aprendizagem e da cognição e nos faz lembrar do poder das situações sociais. Exploração do Self 1 7 : Uma elevada autoestima nos ajuda ou atrapalha? Na psicologia contemporânea, o self é considerado o centro da personalidade, o organizador de nossos pensamentos, sentimentos e ações. As pesquisas confirmam os benefícios de uma autoestima elevada; mas também advertem quanto aos perigos de uma autoestima irrealisticamente alta. O viés em proveito próprio (self-serving bias) nos leva a uma autopercepção favorável, muitas vezes nos fazendo superestimar nossas habilidades e subestimar nossas falhas. Termos e Conceitos para Lembrar personalidade projeção Inventário Multifásico de Personalidade associação livre racionalização de Minnesota (MMPI) psicanálise deslocamento teste obtido empiricamente inconsciente negação perspectiva social-cognitiva id inconsciente coletivo determinismo recíproco ego teste projetivo controle pessoal superego Teste de Apercepção Temática lócus de controle externo fases psicossexuais (TAT) lócus de controle interno complexo de Édipo teste de Rorschach desamparo aprendido identificação teoria do gerenciamento do terror psicologia positiva fixação autorrealização self mecanismos de defesa aceitação positiva incondicional efeito holofote recalque autoconceito autoestima regressão traço viés em proveito próprio (self-serving formação reativa inventário de personalidade bias)