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INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS LINGUÍSTICOS Me. Paula Denari GUIA DA DISCIPLINA 2021 1 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Esta disciplina tem o objetivo de apresentar brevemente algumas ideias e noções que constituem o fundamento da linguística contemporânea. Afinal, como afirma Fiorin, “um curso de Letras é o lugar onde se aprende a refletir sobre os fatos linguísticos e literários, analisando-os, descrevendo-os e explicando-os”. Por outro lado, esta não é uma tarefa tão simples já que a Linguística é uma ciência inteiramente desconhecida da maioria dos estudantes e até muitos professores. Durantes as aulas, iremos entender que, diferente do que você imagina, o linguista observa o fenômeno linguístico de forma descritiva e explicativa, não de forma prescritiva. Ou seja, não ditaremos regras, entenderemos os acontecimentos linguísticos. Aqui teremos um recorte dessa ciência, há um universo a descobrir sobre os estudos linguísticos. Esperamos encantá-los e abrir os horizontes para que você conheça mais a respeito da linguagem humana. 2 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 1. PANORAMA HISTÓRICO DA LINGUÍSTICA – LÍNGUA X LINGUAGEM No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Tudo foi feito por ele; e nada do que tem sido feito, foi feito sem ele. Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens. (João 1:1-4) Objetivo Compreender a linguística enquanto Ciência. Entender as diferenças entre língua e linguagem, a partir dos principais teóricos da linguagem. Introdução É interessante observar que, segundo a epígrafe, a origem do mundo se relaciona à linguagem verbal, é ela que tem a capacidade de criar. Veja como isso é importante, será que você compreende a importância da linguagem humana? Somente a partir dela é que somos capazes de nomear, criar, transformar o universo e, acima de tudo, passar adiante o conhecimento. Não há sociedade sem linguagem. Então, vamos entender um pouco mais sobre esse fenômeno. 1.1. A história do estudo da linguagem A linguagem sempre despertou o interesse de pesquisadores. Os primeiros estudos na área surgem no século IV a.C, pelos hindus por questões religiosas. Mais tarde, no século IV a.C, um gramático hindu descreveu e categorizou sua língua, produzindo modelos de análise descobertos somente no final do século XVIII. Já os gregos, empenharam-se em tentar descobrir se existia alguma relação entre a palavra e o seu significado. Em Crátilo, Platão suscita essa questão. Já Aristóteles voltou- se para uma análise mais estrutural da língua, chegou a criar as categorias gramaticais e elaborar uma teoria da frase. Dentre os latinos, destaca-se Marco Terêncio Varrão (116-27 a.C.) que se dedicou à etimologia, sintaxe e morfologia, destacando-se nesta última. Também distinguiu entre derivações e flexões da palavra. 3 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Nos séculos XIII e XIV, os membros de uma escola de filosofia gramatical conhecida como Modismo consideraram que a estrutura gramatical das línguas é una e universal, e que, em consequência, as regras da gramática são independentes das línguas em que se realizam. No século XVI, apesar de manter-se o prestígio do latim como língua universal, viajantes, comerciantes e diplomatas trazem de suas experiências no estrangeiro o conhecimento de línguas até então desconhecidas, com isso e a religiosidade ativada pela Reforma permite a tradução dos livros sagrados em numerosas línguas. Em 1660, a Grammaire Générale ET Raisonnée de Port Royal, ou Gramática de Port Royal, de Lancelot e Arnaud, modelo para grande número de gramáticas do século XVII, demonstra que a linguagem se funda na razão e a gramática é um conjunto de processos mentais, que são universais; portanto, a gramática é universal. O conhecimento de um número maior de línguas vai provocar, no século XIX, o interesse pelas línguas vivas, pelo estudo comparativo dos falares, em detrimento de um raciocínio mais abstrato sobre a linguagem, observado no século anterior. É nesse período que se desenvolve um método histórico, instrumento importante para o florescimento das gramáticas comparadas e da Linguística Histórica. O pensamento linguístico contemporâneo, mesmo que em novas bases, formou-se a partir dos princípios metodológicos elaborados nessa época, que preconizavam a análise dos fatos observados. O estudo comparado das línguas vai evidenciar o fato de que as línguas se transformam com o tempo, independentemente da vontade dos homens, seguindo uma necessidade própria da língua e manifestando-se de forma regular. [Petter, 2010, p. 12] Em 1816, Franz Bopp vai se destacar com seu estudo sobre o sistema de conjugação do sânscrito, comparado ao grego, ao latim, ao persa e ao germânico. Este é considerado o marco do surgimento da Linguística Histórica. A descoberta de semelhanças entre essas línguas e grande parte das línguas europeias vai evidenciar que existe entre elas uma relação de parentesco, que elas constituem, portanto, uma família, a indo-européia, cujos membros têm uma origem comum, o indo-europeu, ao qual se pode chegar por meio do método histórico- comparativo. [Petter, 2010, p. 12] O século XIX foi marcado por uma ascensão das investigações sobre as línguas. Descobriu-se que as transformações do latim em português, espanhol, italiano, francês observadas nos textos escritos, poderiam ter acontecido primeiro na língua falada. 4 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância É no início do século XX, com a divulgação dos trabalhos de Ferdinand de Saussure, o qual estudaremos mais profundamente nas próximas aulas, que a investigação sobre a linguagem – a Linguística – passa a ser reconhecida como estudo científico. Em 1916, é publicado o Curso de Linguística geral, obra fundadora da nova ciência. Até então, a Linguística não era uma ciência autônoma, estava atrelada a outros estudos, como a lógica, a filosofia, a retórica, a história, ou a crítica literária. O século XX permitiu uma mudança de atitude, que se expressa no caráter científico dos novos estudos linguísticos, que estarão centrados na observação dos fatos da linguagem. O método científico supõe que a observação dos fatos seja anterior ao estabelecimento de uma hipótese e que os fatos observados sejam examinados sistematicamente mediante experimentação e uma teoria adequada. O trabalho científico consiste em observar e descrever os fatos a partir de determinados pressupostos teóricos formulados pela Linguística, ou seja, o linguista aproxima-se dos fatos orientado por um quadro teórico específico. Daí ser possível que para o mesmo fenômeno haja diferentes descrições e explicações, dependendo do referencial teórico escolhido pelo pesquisador. [Petter, 2010, p. 13] Nos próximos tópicos vamos trabalhar os conceitos de linguagem e língua, somente a partir da compreensão desses termos, seremos capazes de trabalhar o que é Linguística. 1.2. Língua e linguagem Como dissemos anteriormente, a linguística estabelece relações com muitas ciências e em cada uma dessas relações vamos encontrar uma definição diferente para o que seja língua. Por exemplo, a relação entre a linguística e a biologia vai preferir definir a língua como parte da dotação genética da espécie humana; a da linguística com a sociologia, vai dar mais ênfase aos aspectos socioculturais da língua; a da linguística com a psicologia vai definir a língua como parte da cognição humana. Além disso, em cada uma dessas relações há uma série de estudos com teorias diferentes. E, cada teoria vai preferir definir língua de uma maneira especial, que esteja mais de acordo com suas hipóteses. Portanto, cada definição de língua precisa ser entendida no âmbito de uma teoria particular. Muitas vezes confundimos língua com a produção linguística, ou seja, com a materialidade produzida, ou discurso, já que são essas produções que nos ajudam a 5 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância “enxergar” a língua. Para compreender melhor o conceito de língua, é importante que deixemos claro que essa é apenas uma definição possível. A língua é um conjunto de palavras organizadas por regras gramaticais específicas. É uma convenção que permite que a mensagem transmitida seja sempre compreensível para os indivíduos de um determinado grupo. Assim, tem um caráter social e cultural, sendo usada por uma comunidade específica. Já linguagem também apresenta definições diferentes para Saussure e Chomsky. Nós vamos dedicar um capítulo para esses teóricos, mas já antecipamos suas reflexões a respeito de linguagem. A LINGUAGEM é a capacidade que os seres humanos têm para produzir, desenvolver e compreender a língua e outras manifestações, como a pintura, a música e a dança. Já a LÍNGUA é um conjunto organizado de elementos (sons e gestos) que possibilitam a comunicação. Ela surge em sociedade, e todos os grupos humanos desenvolvem sistemas com esse fim. As línguas podem se manifestar de forma oral ou gestual, como a Língua Brasileira de Sinais (Libras). Saussure concebeu a linguagem heterogênea e multifacetada, já que abarca vários domínios e pertencente ao domínio individual e social; “não se deixa classificar em nenhuma categoria de fatos humanos, pois não se sabe como inferir sua unidade” (Saussure, 1969, p. 17). A linguagem se entrelaça com outras ciências como a psicologia, a antropologia, portanto Saussure separa uma parte do todo linguagem, a língua – um objeto unificado e suscetível de classificação. A língua é uma parte essencial da linguagem; “é um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos” (Saussure, 1969, p. 17). 6 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Para Saussure, a língua é “um sistema de signos” – um conjunto de unidades que se relacionam organizadamente dentro de um todo. É “a parte social da linguagem”, exterior ao indivíduo; não pode ser modificada pelo falante e obedece às leis do contrato social estabelecido pelos membros da comunidade. A fala é um ato individual; resulta das combinações feitas pelo sujeito falante utilizando o código da língua; expressa-se pelos mecanismos psicofísicos (atos de fonação) necessários à produção dessas combinações. A língua é considerada uma estrutura constituída por uma rede de elementos, em que cada elemento tem um valor funcional determinado. A teoria de análise linguística, herdeira das ideias de Saussure, foi denominada estruturalismo (a quem iremos dedicar um capítulo adiante). Os princípios teórico-metodológicos dessa teoria foram utilizados em outras ciências humanas, até o momento em que se tornou mais contundente a crítica ao caráter excessivamente formal e distante da realidade social da metodologia estruturalista desenvolvida pela Linguística. Noam Chomsky, em seu livro Syntactic Structures, trouxe para os estudos linguísticos uma transformação. Para ele, “linguagem [é] como um conjunto (finito ou infinito) de sentenças, cada uma finita em comprimento e construída a partir de um conjunto finito de elementos”. (1957, p.13). Essa definição abrange muito mais do que as línguas naturais, mas, conforme seu autor, todas as línguas naturais são, seja na forma falada, seja na escrita, linguagens, no sentido de sua definição, visto que: Toda língua natural possui um número finito de sons (e um número finito de sinais gráficos que os representam, se for escrita); Mesmo que as sentenças distintas da língua sejam em número infinito, cada sentença só pode ser representada como uma sequência finita desses sons (ou letras). O que o linguista nos coloca é que temos na Língua Portuguesa, por exemplo, um número finito de sons e sinais que representam esses sons. Poderiam escrever todos os sons da nossa língua. A partir desses sons finitos, podemos produzir um número infinito de sentenças, incontáveis frases. 7 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Cabe ao linguista que descreve qualquer uma das línguas naturais determinar quais dessas sequências finitas de elementos são sentenças, e quais não são, isto é, reconhecer o que se diz e o que não se diz naquela língua. A análise das línguas naturais deve permitir determinar as propriedades estruturais que distinguem a língua natural de outras linguagens. Chomsky postula que essas propriedades são tão abstratas, complexas e específicas que não poderiam ser ensinadas. De alguma maneira, essas propriedades já devem nascer com a criança e são acionadas durante o processo de aquisição da linguagem. Para Chomsky, portanto, a linguagem é uma capacidade inata e específica da espécie, isto é, transmitida geneticamente e própria da espécie humana. Esses pesquisadores dedicam-se à busca de tais propriedades, na tentativa de construir uma teoria geral da linguagem fundamentada nesses princípios. [[Petter, 2010, p. 15] Mais adiante, iremos nos debruçar sobre esses conceitos. Você já deve ter estudado Saussure e Chomsky em outras disciplinas. Esses autores são fundamentais em diferentes estudos. Que tal descobrir um pouco mais sobre a vida de cada um deles? Petter, Margarida. Linguagem, língua, linguística. In Fiorin. Introdução a Linguística. 2010. Contexto 8 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 2. LINGUÍSTICA X GRAMÁTICA “é preciso que exista uma ciência que estude a “língua real” e não apenas a “língua oficial”, caso contrário, estaríamos nos recusando a conhecer e a entender nossa própria realidade linguística e social.” (Aldo Bizzocchi) Objetivo Diferenciar os estudos da linguística dos conceitos da Gramática Tradicional. Introdução Como o termo linguagem pode ter um uso não especializado bastante extenso, podendo referir-se desde a linguagem dos animais até outras linguagens - música, dança, pintura, mímica etc. - convém enfatizar que a Linguística se detém somente na investigação científica da linguagem verbal humana. No entanto, é de se notar que todas as linguagens (verbais ou não-verbais) compartilham uma característica importante - são sistemas de signos usados para a comunicação. Esse aspecto comum tornou possível conceber-se uma ciência que estuda todo e qualquer sistema de signos. Saussure a denominou Semiologia; Peirce a chamou de Semiótica. Nós estudamos semiótica na disciplina Comunicação e Semiótica. A Linguística é, portanto, uma parte dessa ciência geral; estuda a principal modalidade dos sistemas sígnicos, as línguas naturais, que são a forma de comunicação mais altamente desenvolvida e de maior uso. 2.1. O que é Linguística? Uma pintura, uma dança, um gesto, podem expressar, mesmo que sob formas diversas, um mesmo conteúdo básico, mas só a linguagem verbal é capaz de traduzir com maior eficiência qualquer um desses sistemas semióticos. As línguas naturais situam-se numa posição de destaque entre os sistemas sígnicos porque possuem, entre outras, as propriedades de flexibilidade e adaptabilidade, que permitem expressar conteúdos bastante diversificados: emoções, sentimentos, ordens, perguntas, afirmações, como também possibilitam falar do presente, passado ou futuro. Os estudos linguísticos não se confundem com o aprendizado de muitas línguas: o linguista deve estar apto a falar "sobre" uma ou mais línguas, conhecer seus princípios de funcionamento, suas semelhanças e diferenças. A Linguística não se compara ao estudo tradicional da gramática; ao observar a língua em uso o linguista procura descrever e 9 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância explicar os fatos: os padrões sonoros, gramaticais e lexicais que estão sendo usados, sem avaliar aquele uso em termos de um outro padrão: moral, estético ou crítico. As diferenças de pronúncia, de vocabulário e de sintaxe observadas por um habitante de São Paulo, por exemplo, ao comparar sua expressão verbal a dos falantes de outras regiões, como Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Belo Horizonte, muitas vezes o fazem considerar "horrível" o sotaque de algumas dessas regiões; "esquisito" seu vocabulário e "errada" sua sintaxe. Esses julgamentos não são levados em conta pelo linguista, cuja função é estudar toda e qualquer expressão Linguística como um fato merecedor de descrição e explicação dentro de um quadro científico adequado. O linguista procura descobrir como a linguagem funciona por meio do estudo de línguas específicas, considerando a língua um objeto de estudo que deve ser examinado empiricamente, dentro de seus próprios termos, como a Física, a Biologia etc. A metodologia de análise Linguística focaliza, principalmente, a fala das comunidades e, em segunda instância, a escrita. A prioridade atribuída pelo linguista ao estudo da língua falada explica-se pela necessidade de corrigir os procedimentos de análise da gramática tradicional, que se preocupava quase exclusivamente com a língua literária, como modelo único para qualquer forma de expressão escrita ou falada. O prestígio e a autoridade da língua escrita em nossa sociedade, muitas vezes, são obstáculos para os principiantes nos estudos da Lingüística, que têm dificuldade em perceber e aceitar a possibilidade de considerar a língua falada independentemente de sua representação gráfica. É comum ouvir dizer de uma criança ainda não alfabetizada, que pronuncie mola por mora, por exemplo, que "ela troca letra", quando na realidade ela está substituindo um som por outro. Os critérios de coleta, organização, seleção e análise dos dados linguísticos obedecem aos princípios de uma teoria Linguística expressamente formulada para esse fim. Os resultados obtidos são correlacionados às informações disponíveis sobre outras línguas com o objetivo de elaborar uma teoria geral da linguagem. Distinguem-se, aqui, dois campos de estudos: a Linguística geral e a descritiva. A Linguística geral oferece os conceitos e modelos que fundamentarão a análise das línguas; a Linguística descritiva fornece os dados que confirmam ou refutam as teorias formuladas pela Linguística geral. São duas tarefas interdependentes: não pode haver Linguística geral ou teórica sem a base 10 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância empírica da Linguística descritiva. É possível, entretanto, que uma descrição Lingüística tenha outros objetivos, além de oferecer elementos para a análise da Lingüística geral; o trabalho de descrição de uma língua pode estar preocupado em produzir uma gramática ou um dicionário, com o objetivo de dotá-la de instrumentos para sua difusão na forma escrita, como no caso de línguas indígenas, africanas ou outras que ainda não circulem no meio escrito. No século XIX, os linguistas preocuparam-se com o estudo das transformações por que passavam as línguas, na tentativa de explicar as mudanças Lingüísticas. A Lingüística era histórica ou diacrônica. Saussure, no início do século XX, introduziu um novo ponto de vista no estudo das línguas, o ponto de vista sincrônico, segundo o qual as línguas eram analisadas sob a forma que se encontravam num determinado momento histórico, num ponto do tempo. A descrição Linguística observaria "a relação entre coisas coexistentes", que constituiriam o sistema linguístico. Embora defendesse a perspectiva sincrônica no estudo das línguas, Saussure reconhecia a importância e a complementaridade das duas abordagens: a sincrônica e a diacrônica. Em sincronia os fatos são observados quanto ao seu funcionamento, num determinado momento. Em diacronia os fatos são analisados quanto às suas transformações, pelas relações que estabelecem com os fatos que o precederam ou sucederam. 2.2. Gramática: o ponto de vista normativo-descritivo A gramática tradicional propagou falsos conceitos sobre a natureza da linguagem já que fundamentou sua análise na língua escrita e não reconhece a diferença entre língua escrita e língua falada. A gramática tradicional assumiu uma visão prescritiva, normativa em relação à língua. Tanto que a primeira descrição Linguística de que se tem notícia, a do sânscrito, feita pelo gramático hindu Panini (século IV a.c) surgiu no momento em que a língua sânscrita culta (blasha) precisava ser estabilizada para defender-se da "invasão" dos falares populares (prácritos), portanto num momento em que uma determinada variedade Linguística deveria ser valorizada e difundida. Visto que a norma da correção é prescrita por uma fonte de autoridade, as demais variedades são consideradas inferiores e incorretas. Por outro lado, nas sociedades contemporâneas expressar-se segundo a norma, falar certo continua sendo valorizado, 11 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância porque a correção da linguagem está associada às classes altas e instruídas, é uma das marcas distintivas das classes sociais dominantes. A tarefa do gramático se desdobra em dizer o que é a língua, descrevê-la, e ao privilegiar alguns usos, dizer como deve ser a língua. Abordar a língua exclusivamente sob uma perspectiva normativa contribui para gerar uma série de falsos conceitos e até preconceitos, que vêm sendo desmistificados pela Linguística. Está suficientemente demonstrado que a língua escrita não pode ser modelo para a língua falada. Além do fato histórico de a fala ter precedido e continuar precedendo a escrita em qualquer sociedade, a diferença entre essas duas formas de expressão verifica-se desde sua organização até o seu uso social. Ao comparar as línguas em qualquer que seja o aspecto observado, fonologia, sintaxe ou léxico, o linguista constata que elas não são melhores nem piores, são, simplesmente, diferentes. Tampouco encontram-se evidências de uma língua que esteja próxima do princípio de uma escala evolutiva, que possa ser considerada primitiva em relação a outras já evoluídas. Todas as línguas até hoje estudadas constituem um sistema de comunicação estruturado, complexo e altamente desenvolvido. Nenhum traço da estrutura linguística pode ser atribuído a um reflexo da estrutura diferenciada de uma sociedade agrícola ou de uma sociedade moderna industrializada. Como Soares (1994, p. 40) retifica: (...), tal como não se pode falar de "inferioridade" ou "superioridade" entre línguas, mas apenas de diferenças, não se pode falar de inferioridades ou superioridade entre dialetos geográficos ou sociais ou entre registros. Também aqui, como ocorre em relação ás línguas, cada dialeto e cada registro é adequado ás necessidades e características do grupo a que pertence o falante, ou á situação em que a fala ocorre. 12 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Nossa gramática foi escrita como uma forma de separar a língua portuguesa europeia, considerada de maior prestígio, da língua que se falava nas ruas pelos pobres e negros. PETTER, Margarida. Língua, Linguística e Linguagem. In Introdução a Linguística. Contexto, 2009 13 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 3. ESTRUTURALISMO "O estruturalismo não é uma teoria nem um método; é um ponto de vista epistemológico. Parte da observação de que todo conceito num dado sistema é determinado por todos os outros conceitos do mesmo sistema, e nada significa por si próprio.” (Paul Garvin) Objetivo Compreender as bases do Estruturalismo de Saussure e relacionar com outras correntes linguísticas Introdução O termo estruturalismo em linguística serve para designar uma corrente de pensamento do início do século XX, fundamentada na afirmação de Ferdinand de Saussure de que “a língua não é um conglomerado de elementos heterogêneos; é um sistema articulado, onde tudo está ligado”. Para fundamentar suas afirmações, Saussure estabeleceu uma série de definições e distinções sobre a natureza da linguagem, que se podem resumir em: A diferenciação ente langue (língua), a parte social da linguagem, externa ao indivíduo, e a parole (fala), é o momento individual. A consideração do signo lingüístico. Saussure (1969:18) afirma que “a língua é conhecida como um sistema de signos”, ligação entre o significante (imagem acústica) e um significado (conceito). A relação arbitrária dos signos se define em termos paradigmáticos (imagens de outros elementos na memória) ou sintagmáticos (todos elementos da língua se relacionam com outro, formando cadeias de enunciados). A distinção entre o estudo sincrônico da língua, ou seja, a descrição do estado estrutural da língua em um dado momento, e o estudo diacrônico, descrição da evolução histórica da língua. Os linguistas encontraram nas ideias renovadoras de Saussure o ponto de partida para desenvolver novos métodos e teorias. Foi o caso da chamada Escola de Praga, Escola de Genebra e a Escola de Copenhague. Coseriu (1980) afirma que a Escola de Praga 14 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância surgida em 1925 a 1939 liderou o Círculo Linguístico de Praga, através de seus membros mais influentes, os russos Roman Jakobson e N. S. Trubetskoi. 3.1. Saussure e o Estruturalismo O Estruturalismo surgiu, no início do século XX, com o objetivo de determinar o campo da Linguística. Para compreendê-la é importante retomar alguns conceitos. No Curso de Linguística Geral, é possível perceber que Saussure concebia língua como parte social da linguagem, exterior ao indivíduo que, por si só, não pode nem criá-la, nem modificá-la. É um sistema virtual, uma instituição social, fundada, portanto, em um acordo social. Já a fala aparece como individual que atualiza elementos discriminados dentro do código. Assim: A língua é a condição para a existência da fala, exatamente como a sociedade é a condição para a existência do indivíduo. A linguagem, por outro lado, é a capacidade que o homem tem de comunicar-se com seus semelhantes por meio de signos verbais, é a soma da língua e da fala. Pela característica da transitoriedade da fala, Saussure conclui que o objeto da Linguística propriamente dita é a língua. Além da distinção entre língua e fala, Saussure estabelece uma dicotomia, ele rompe diretamente com a tradição da linguística histórica. Para Saussure, é muito importante distinguirem-se os eixos sobre os quais se situam os fatos que a ciência estuda: sincronia ou diacronia. No primeiro caso, o linguista interessa-se pelas relações entre em um dado momento, fazendo-se abstração de qualquer noção de tempo. No segundo caso, constituem objeto de estudo as relações históricas de um fenômeno, como transformações que sofreu determinado vocábulo. 15 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância A opção pelo estudo da língua em uma perspectiva sincrônica permite separar os fatores internos de um sistema dos fatores externos, histórico-culturais que condicionam esse sistema e conceituar língua como um sistema de valores, onde cada elemento define-se em relação aos outros. A terceira dicotomia: o eixo sintagmático e o paradigmático. No eixo paradigmático, a relação que se estabelece entre as unidades da língua é de oposição. Nenhum signo é igual a outro e nem pode ocupar, é o eixo da escolha que fazemos na construção do enunciado. O eixo sintagmático refere-se à combinação dos elementos. Sistema, Estrutura e Estruturalismo: Reconhecimento de língua como uma estrutura ou sistema. Sistema: Conjunto de princípios verdadeiros ou falsos reunidos de modo que formem um corpo de doutrina. 3.2. Aspectos negativos e positivos do estruturalismo Alguns críticos do estruturalismo afirmam que as teorias estruturalistas consideram que a descrição do corpus é o objeto último do linguista. Considerando acabado, homogêneo e sincrônico sem fazer referência ao falante. Além disso, criticam o fato de os estruturalistas colocarem de lado o valor significativo das formas linguísticas, esquecendo que as significações estão na base da comunicação humana. Numa visão mecanicista, explicam a organização e o funcionamento dessas formas linguísticas através de técnicas cada vez mais objetivas e rigorosas, que não dão conta dos inúmeros fatos e riquezas da língua. A não abordagem do contexto e das relações com os interlocutores também se opõe a outras correntes. Por outro lado, as dicotomias saussurianas permitiram à linguística moderna dar um grande avanço nas pesquisas com a distinção entre sincronia e diacronia, relações sintagmáticas e paradigmáticas. A primeira distinção nos permite conhecer que o falante e ouvinte de uma língua é influenciado pela sociedade e contexto histórico do momento. Através do eixo sintagmático e paradigmático se descobrem as potencialidades da língua, o caráter recursivo dessas regras. 16 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 3.3. Em síntese As teorias estruturalistas refletem um avanço para o desenvolvimento das pesquisas da linguística moderna. Foram de grande importância as teorias dos linguísticos pertencentes a este movimento, tanto os europeus quantos os americanos. Porém o grande destaque é o suíço Ferdinand de Saussure, cujas teorias deram o pontapé para o desenvolvimento da ciência da linguagem, pois foi justamente partindo dessas teorias que os linguistas puderam ampliar os conhecimentos, bem como acrescentar novas concepções a elas Além disso, a nova gramática gerativa transformacional, que iremos estudar na próxima aula, representou um movimento em oposição ao então predominante estruturalismo, mas por outro lado ambos se opõem radicalmente à rigidez do estudo normativo da língua baseado no certo ou errado. Infelizmente, muitas escolas ainda permanecem baseando o ensino na apresentação de regras e na memorização. Estruturalismo Linguístico – disponível em: http://www.giseldacosta.com/wordpress/wp- content/uploads/2015/04/2063971-ESTRUTURALISMO-LINGUISTICO.pdf 1. O Estruturalismo Profª Maria Glalcy Fequetia Dalcim: mariaglalcy@gmail.com maria.dalcim@ifsp.edu.br https://lingualem.wordpress.com 2. Costa. M. A. O estruturalismo. In: MARTELOTTA, Mário Eduardo (Org.). Manual de linguística. São Paulo: Contexto, 2016. Marco Antônio da Costa Mario Eduardo Martelotta 3. Costa. M. A. O estruturalismo. In: MARTELOTTA, Mário Eduardo (Org.). Manual de linguística. São Paulo: Contexto, 2016. Ferdinand Saussure Leonard Bloomfield 17 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 4. GERATIVISMO “os objetivos dos transformacionalistas são mais ambiciosos do que os propósitos explicitamente fixados por qualquer grupo anterior de linguistas, pois pretendem realizar uma descrição de tudo o que constitui a competência linguística do falante nativo.” (Robins,1983, p.186) Objetivo Apresentar em linhas gerais, os principais aspectos que caracterizam a corrente de estudos linguísticos denominada GERATIVISMO. Analisar a concepção de linguagem humana que norteia as pesquisas dessa corrente. Introdução A Teoria Gerativista foi apresentada pelo linguista Noam Chomsky na década 1950. É considerado como o nascimento da Linguística Gerativista o ano de 1957, quando foi publicado o livro Estruturas Sintáticas de Noam Chomsky. A teoria apresentada, inicialmente foi uma resposta e recusa ao Behaviorismo, que caracterizava os indivíduos como tábuas rasas, afirmando que os mesmos não nasciam com capacidade para a linguagem. Para os Behavioristas, a linguagem era adquirida apenas a partir da interação, assumindo caráter externo e social. O Gerativismo defende que a linguagem é uma capacidade inata - a capacidade do ser humano falar e entender uma língua se dá por um dispositivo inato, uma capacidade biológica. Segundo essa teoria, a fala de uma criança, não é mera repetição de algo que já foi dito, a criança é capaz de criar sentenças inéditas. O Gerativismo trabalha com dois princípios - a competência e o desempenho linguístico. A competência seria a nossa habilidade e capacidade de produzir sentenças, é o saber que está em um módulo da nossa mente. Já o desempenho seriam as escolhas que fazemos para nossa fala, o emprego concreto que o ser humano faz da sua língua. 18 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância O gerativismo tornou popular um conceito já conhecido: a língua, a partir de regras finitas, é capaz de gerar infinitos enunciados – que se denomina competência. E esse conceito, não só capacita o falante/ouvinte a gerar e entender o que for necessário à sua expressão/compreensão, mas também exercitar o lado criativo da linguagem. 4.1. A faculdade da linguagem A linguística gerativa surgiu nos Estados Unidos, no final da década de 50, com os trabalhos do linguista Noam Chomsky, professor do Instituto de Tecnologia de Massachussets, o MIT. De lá para cá, o gerativismo passou por diversas modificações e reformulações, que refletem a preocupação dos pesquisadores dessa corrente em elaborar um modelo teórico formal, inspirado na matemática, capaz de descrever e explicar abstratamente o que é e como funciona a linguagem humana. Como dissemos, a linguística gerativa foi inicialmente formulada como uma espécie de resposta e rejeição ao modelo behaviorista de descrição dos fatos da linguagem, que foi dominante na linguística e nas ciências de uma maneira geral durante toda a primeira metade do século XX. “Para os behavioristas, a linguagem humana era interpretada como um condicionamento social, uma resposta do organismo humano aos estímulos que recebia nas interações sociais. Essa resposta, a partir da repetição, seria convertida em hábitos, que caracterizariam o comportamento linguístico de um falante. ” [Kenedy, 2010, p. 127] Portanto, para um behaviorista, a linguagem humana é um fenômeno externo ao indivíduo, um sistema de hábitos, gerado pela repetição. Em 1959, Chomsky apresentou uma crítica à visão comportamentalista da linguagem. Ele ressaltou que um indivíduo humano sempre está construindo frases novas e inéditas, jamais ditas antes pelo próprio falante que as produziu ou por qualquer outro indivíduo. “Por isso, todos os falantes são criativos, desde os analfabetos até os autores dos clássicos da literatura, já que todos criam infinitamente frases novas, das mais simples e despretensiosas às mais elaboradas e eruditas.” [Kenedy, 2010, p. 128]. 19 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Chomsky chegou a afirmar, inclusive, que a criatividade é o que caracteriza o comportamento linguístico humano, aquilo que distingue a linguagem humana dos sistemas de comunicação animal. Sendo assim, se considerarmos a criatividade como a principal característica da linguagem humana, logo refutamos o behaviorismo, já que nele não há espaço para eventos criativos, a resposta é previsível a partir de um dado estímulo. Para Chomsky, a capacidade humana de falar e entender uma língua (pelo menos), isto é, o comportamento linguístico dos indivíduos, deve ser compreendido como o resultado de um dispositivo inato, uma capacidade genética e, portanto, interna ao organismo humano (e não completamente determinada pelo mundo exterior, como diziam os behavioristas), a qual deve estar fincada na biologia do cérebro/mente da espécie e é destinada a constituir a competência linguística de um falante. Essa disposição inata para a competência linguística é o que ficou conhecido como Faculdade da Linguagem. [Kenedy, 2010, p. 128]. Se analisarmos criticamente, ninguém iria discutir que a linguagem seja uma faculdade natural à espécie humana. Afinal, todos os indivíduos humanos foram e são capazes de manifestar a partir de alguns anos de vida e sem receber instrução explícita para tanto, uma competência linguística – a capacidade natural e inconsciente de produzir e entender frases. Nenhum outro ser do planeta, a não ser o próprio homem, é capaz de dominar naturalmente um sistema de linguagem tão complexo como uma língua natural, mesmo após muitos anos de treinamento. E nem mesmo o mais potente e arrojado dos computadores, sejam eles as inteligências que temos em nossos celulares modernos, possui a capacidade linguística de uma criança de menos de 3 anos de idade, como criar ou compreender uma frase completamente nova. Isso não é fascinante? Não é por outra razão que a Faculdade da Linguagem é a característica mental mais marcante que separa os humanos dos demais primatas superiores e do resto do mundo natural. O papel do gerativismo, no seio da linguística, é constituir um modelo teórico capaz de descrever e explicar a natureza e o funcionamento dessa Faculdade, o que significa procurar compreender um dos aspectos mais importantes da mente humana, como afirmou o próprio Chomsky: “Uma das razões para estudar a linguagem (exatamente a razão gerativista) – e para mim, pessoalmente, a mais premente delas – é a possibilidade instigante de ver a linguagem como um “espelho do espírito”, como diz a expressão tradicional. Com isto não quero apenas dizer que os conceitos expressados e as distinções desenvolvidas no uso normal da linguagem nos revelam os modelos do pensamento e o universo do “senso 20 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância comum” construídos pela mente humana. Mais instigante ainda, pelo menos para mim, é a possibilidade de descobrir, através do estudo da linguagem, princípios abstratos que governam sua estrutura e uso, princípios que são universais por necessidade biológica e não por simples acidente histórico, e que decorrem de características mentais da espécie humana” (Chomsky, 1980: 09) 4.2. Diagrama Arbóreo Os diagramas surgiram na década de sessenta, e ao longo do tempo, estudiosos o vem aperfeiçoando. Utilizamos os Diagramas Arbóreos nos processos de analises sintáticas numa frase ou oração; para facilitar a compreensão dos fenômenos da língua e sua fonética tanto quanto a sua estrutura numa forma visual e detalhista. Sendo assim a leitura de uma oração ou frase tem uma maior compreensão e desenvolvimento. A construção desse tipo de estrutura parece como ramificações, de uma forma organizada e conjunta. Buscando assim maior nível de identificação dos pronomes, substantivos, verbos, artigos, preposição, adjetivos e outros. Essa estrutura lembra também uma árvore, ou suas raízes. Então surge o nome (árvore arbórea). Uma oração é sempre constituída por unidades menores significativas. O sintagma, segundo Silva e Koch (2001), é o conjunto de elementos que constituem uma unidade significativa e que mantêm entre si relações de dependência e de ordem. Organizam-se em torno de um elemento fundamental, o núcleo, que pode por si só constituir o sintagma. Os tipos de sintagma dependem do núcleo que o constituem: *Sintagma nominal (SN): quando o núcleo do sintagma é um nome; *Sintagma adjetival (SA): quando o núcleo do sintagma é um adjetivo; *Sintagma verbal (SV): quando o núcleo do sintagma é um verbo; *Sintagma preposicional (SP): quando o núcleo do sintagma é uma preposição. Abaixo, uma oração representada por meio do diagrama arbóreo onde o SN é modificado pelo SA. 21 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102- 44501997000300007 Sautchuk, Inez. Prática de Morfossintaxe - 2ª Ed. 2010 SILVA, M. Cecília P. de Souza e; KOCH, Ingedore Villaça. Linguística Aplicada ao Português: Sintaxe. 9ª ed. São Paulo: Cortez Editora, 2000. 22 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 5. SOCIOLINGUÍSTICA Objetivo Descrever um panorama dos estudos da língua como um fato social. Identificar alguns pressupostos básicos da Teoria. Refletir sobre a questão do preconceito linguístico. Introdução Apresentamos a você o quadro geral de pressupostos teóricos da Sociolinguística. Veremos quais eram as ideias dominantes quanto ao estudo da variação e da mudança, bem como de que forma outros teóricos buscaram integrar aos estudos linguísticos possíveis influências sociais. Vamos apresentar alguns postulados dos principais conceitos teóricos que os fundamentam, passando inclusive pela discussão um pouco mais avançada dos problemas de definição de alguns desses conceitos e pela questão do preconceito linguístico. 5.1. Breve histórico da Sociolinguística Para entender melhor a teoria da Sociolinguística, vamos relembrar os estudos da linguagem no século XX. Começamos falando do linguista suíço Ferdinand de Saussure e do linguista americano Noam Chomsky. Como vimos, Saussure é um marco da corrente linguística denominada estruturalismo, segundo a qual a língua é tomada em si mesma, separada de fatores externos. Além disso, é vista como uma estrutura autônoma, valendo pelas relações de natureza essencialmente linguística que se estabelecem entre seus elementos. Ou seja, para Saussure, a linguística tem por único e verdadeiro objeto a língua considerada em si mesma e por si mesma. Saussure postula algumas dicotomias e vai isolando o que, segundo ele, seria de interesse da ciência linguística. a) Langue e parole – a langue é homogênea e social, um sistema de signos, é essencial; já a parole é um ato individual de vontade, é heterogênea, manifestação concreta da primeira; é acessória e acidental. O objeto da linguística, para Saussure, é a langue. 23 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância b) Sincronia e diacronia – correspondem a dois eixos ou perspectivas pelas quais se pode estudar a língua: na sincronia, se faz um recorte da língua em um momento histórico; na diacronia, a língua é analisada como um produto de uma série Langue e parole - Essa dicotomia pode ser traduzida como ‘língua’ e ‘fala’. Entretanto, preferimos manter os termos originais para assegurar a concepção saussureana sempre que nos referirmos a ela. Vale observar que, embora delimite dessa maneira o objeto de estudo da linguística, Saussure admite que a língua seja um fenômeno social, produto de uma convenção estabelecida entre os membros de determinado grupo; porém, os fatores externos ao sistema são deixados de lado por ele – voltaremos a esse ponto mais adiante. Nos Estados Unidos, a visão formal da língua ganha destaque a partir da década de 60, com Noam Chomsky e a corrente denominada gerativismo, segundo a qual a língua é concebida como um sistema de princípios universais e é é vista como o conhecimento mental que um falante tem de sua língua a partir do estado inicial da faculdade da linguagem, ou seja, a competência. O termo “Sociolinguística” apareceu pela primeira vez em 1953, num trabalho de Haver C. Currie. O estudo dessa disciplina desenvolveu-se nas décadas de 50 e 60, nos Estados Unidos, e o interesse despertado pela pesquisa deve-se a. à grande divulgação dos estudos de comunicação e à necessidade de maior aproximação com outros povos, ou de conhecimento melhor da própria comunidade. O ano-chave para o surgimento da Sociolinguística nos Estados Unidos é 1964, com a publicação de livros de Gumperz, Labov, Hymes e a conferência de William Bright em Los Angeles. 24 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 5.2. Sociolinguística A sociolinguística ou sociologia da linguagem, é uma disciplina da linguística que estuda os aspetos resultantes da relação entre a língua e a sociedade, concentrando-se em especial na variabilidade social da língua. Entre sociedade e língua não há uma relação de mera casualidade. Desde que nascemos, um mundo de signos linguísticos nos cerca, e suas inúmeras possibilidades comunicativas começam a tornar-se reais a partir do momento em que, pela imitação ou associação, começamos a formular nossas mensagens. Sons, gestos e imagens cercam a vida do homem moderno, compondo mensagens de toda ordem, transmitidas pelos mais diferentes canais. Em todos, a língua desempenha um papel fundamental, seja ela visual, oral ou escrita. Desse modo, a corrente Sociolinguística, iniciada na década de 60, buscava desenvolver uma nova concepção do estudo da Linguística. A Sociolinguística ocupava uma posição central no processo de rompimento com a visão estruturalista da época. Isso fez com que a Sociolinguística se tornasse uma das candidatas à sucessão do Estruturalismo como modelo hegemônico da ciência Linguística. Assim, atribui-se à Sociolinguística o estudo das relações entre língua e sociedade. Aqui, língua deve ser entendida como um sistema de vários níveis integrados num todo historicamente estruturado. A Sociolinguística se ocupa, do estudo da possível incidência das forças sociais sobre os estratos fonológicos, morfológicos, sintáticos e semânticos das línguas. Foi William Labov que voltou a estudar a relação entre língua e sociedade e na posição, virtual e real, de sistematizar a variação existente e própria da língua falada. É William Labov quem inaugura os estudos desta nova disciplina em 1963, quando analisa o inglês falado na ilha de Martha’s Vineyard, no estado de Massachusetts (EUA). Após esta pesquisa, várias outras surgiram: como a estratificação social do inglês falado na cidade de Nova York (1966); a língua do gueto, entre outros. 25 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Sociolinguística laboviana Também chamada de Teoria da Variação e Mudança ou de Sociolinguística Quantitativa, pois trabalha com resultados estatísticos 5.3. As várias áreas da Sociolinguística A associação com a antropologia – chamada de etnolinguística ou antropologia linguística – deve-se ao fato de a Sociolinguística estender a descrição e análise da língua para incluir aspectos da cultura em que é usada. Nesse âmbito se insere, mais recentemente, a corrente denominada Sociolinguística Interacional, que considera a relação entre os interlocutores, o assunto etc. na análise da conversação. A proximidade com a sociologia resulta na chamada sociologia da linguagem – área que investiga a interação entre esses dois aspectos do comportamento humano: o uso da língua e a organização social do comportamento, ou seja, a organização social do comportamento linguístico, seja em termos de usos, seja em termos de atitudes em relação à língua e aos usuários. A aproximação com a geografia linguística, ou dialetologia, ou ainda geolinguística, deve-se ao interesse pela elaboração de atlas linguísticos; No Brasil, está sendo organizado o Atlas Linguístico do Brasil (ALIB), cujo objetivo é descrever a realidade linguística com vistas a traçar a divisão dialetal do país, tornando evidentes as diferenças regionais. - que, através de pesquisas de campo, mapeiam dados de diferentes regiões, identificando e delimitando traços dialetais. Em suma, a Sociolinguística se ocupa de questões como: variação e mudança linguística, bilinguismo, contato linguístico, línguas minoritárias, política e planejamento linguístico, entre outras. CALVET, L. Sociolingüística: uma introdução crítica. Trad. de Marcos Marcionilo. São Paulo: Parábola, 2002. 26 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 6. FUNCIONALISMO No funcionalismo encontramos a forma concreta em que a língua funciona. Esse sistema procura analisar o aspecto funcional da língua por meio de um tópico e um comentário. A língua, nesse momento é tida na organização enquanto o seu uso e interação. O princípio do funcionalismo afirma que uma expressão pode assumir diferentes funções dependendo do uso que se faz da linguagem. Objetivo Compreender a corrente funcionalista. Relacioná-la com as outras correntes da linguística. Introdução O século XX foi marcado por uma grande mudança no que concerne aos estudos do fenômeno da linguagem, uma vez que houve o deslocamento do historicismo para o descritivíssimo, configurando uma nova tendência de analisar as línguas naturais, denominada de linguística estrutural ou estruturalismo. Com a publicação do Curso de Linguística Geral, de Ferdinand de Saussure (1857-1913), em 1916, inicia-se a linguística moderna, uma vez que, nesse período, passou-se a ter como foco a função que os elementos linguísticos exerciam no sistema. (Fiorin, 2008). 6.1. A língua e a função Saussure, considerado o pai do estruturalismo, destacou que a língua constitui um sistema homogêneo e dinâmico, no qual “as unidades linguísticas obedecem a certos princípios de funcionamento, constituindo um todo coerente”. Logo, percebe-se que cada elemento linguístico só adquire valor na medida em que se relaciona com o todo de que faz parte. Linguistas pós-saussureanos, influenciados pelas ideias de Saussure, passaram a considerar as línguas como entidades autônomas, independentes do uso na situação interativa do discurso. Mais adiante, surge uma nova proposta, a qual enfatiza que as línguas não podem ser analisadas apenas como estruturas autônomas, dissociadas do uso. Destaca-se a noção de função, segundo a qual a língua é entendida como um sistema funcional, ou seja, passa-se a valorizar o uso da língua enquanto voltado para uma determinada finalidade. 27 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Questiona-se a intenção do locutor ao utilizar a língua. Surge o chamado Círculo Linguístico de Praga. Para Martelotta (2006), essa alternância na abordagem estrutural, no que concerne ao estudo da língua ora como uma entidade autônoma, ora como um sistema funcional, influenciou duas grandes tendências teóricas que se fazem presentes nos estudos linguísticos, a saber: o formalismo e o funcionalismo. O formalismo tem como principal teórico e primeiro representante o linguista norte- americano Noam Chomsky, que desenvolveu a teoria gerativa, a partir do final da década de 1950. Sua proposta era analisar, mais do que o desempenho dos falantes (seu uso), a sua competência, o seu conhecimento linguístico subjacente. Assim, “o papel do gerativismo no seio da linguística é constituir um modelo teórico capaz de descrever e explicar a natureza e o funcionamento da faculdade da linguagem”, característica mental da espécie humana (Kenedy In: Martelotta, 2008, p. 129). Logo, sua visão de língua é a de uma entidade autônoma, que não depende do uso, da comunicação na situação social. Quanto ao funcionalismo, suas análises têm como base o princípio de que as funções externas à linguagem influenciam a estrutura gramatical das línguas. Logo, as línguas refletem uma adaptação às diferentes situações comunicativas. Desse modo, enquanto o primeiro modelo teórico tem seu foco de interesse na análise que busca depreender as propriedades comuns, universais da linguagem, o segundo modelo enfatiza a relação entre forma e função, considerando a língua como uma estrutura. 6.2. Função da linguagem Martinet assevera que o termo funcional só tem sentido para os linguistas se correlacionado ao papel que a língua desempenha para os homens em sua experiência comunicativa. Para Dillinger, o termo função é usado na linguística para designar relações entre uma forma e outra, uma forma e seu significado e entre o sistema de formas e seu contexto. Anscombre & Zaccaria, bem como Halliday, afirmam que a função de uma entidade linguística é constituída pelo papel que ela desempenha no processo comunicativo. Diante disso, podemos dizer que, embora os termos função e funcional apresentem diversas definições, às vezes pouco claras, há um ponto em comum entre os diferentes 28 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância autores: o de que esses termos só têm sentido se levados em conta o propósito comunicativo e o contexto discursivo. Entre os diversos autores que estabelecem proposições de funções da linguagem, há propostas de conjuntos de funções variadas, tais como as de Jakobson (1969) e as de Halliday (1977), que são das mais conhecidas. Roman Jakobson, por exemplo, propõe um conjunto de seis funções da linguagem, levando em conta os elementos do processo comunicativo, a saber: contexto (função referencial); remetente (função emotiva); destinatário (função conativa); contato (função fática); código (função metalinguística) e mensagem (função poética). Desse modo, para o autor, cada mensagem pode apresentar mais de uma função da linguagem, presentes em todo ato linguístico. Além dessas dessas funções, existe uma função que é fundamental para que o discurso se desenvolva. Trata-se da função “textual”, a qual permite a organização do discurso: este só se concretiza se o emissor produzir um texto e o receptor for capaz de reconhecê-lo. De acordo com Fiorin (2002), os diversos desdobramentos que o funcionalismo apresenta na atualidade estão em consonância com o fato de que a língua é primordialmente um instrumento de interação social, usado para estabelecer relações comunicativas entre os usuários. Podemos dizer que a teoria funcionalista ganhou força nos Estados Unidos, a partir da década de 70. Segundo Martelotta (2008), com a publicação do texto The Origins of Syntax in Discourse: a case study of Tok Pisin relatives de Gillian Sankoff e Penelope Brown em 1976, inicia-se o desenvolvimento da abordagem funcionalista de vertente norte- americana. Nesse sentido, baseando-se na utilização concreta da língua pelos falantes, os funcionalistas admitem que a gramática é constituída a partir do discurso. Dessa maneira, 29 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância a vertente funcionalista norte-americana compreende a língua como “um objeto maleável, probabilístico e não-determinístico” (Votre & Naro, 1996: 52). Em outras palavras, a gramática de uma língua, para a linguística funcionalista norteamericana, é concebida como um conjunto de regularidades que são convencionalizadas pelo uso concreto nas diferentes situações discursivas. Assim, podemos dizer, então, que gramática funcional tem como pressuposto fundamental a interdependência entre as expressões linguisticas e o contexto e interação social em que elas são proferidas 6.3. Princípios O funcionalismo caracteriza-se por uma concepção dinâmica do funcionamento das línguas. Nessa perspectiva, a gramática é vista como dependente de fatores não só internos, mas também externos à língua. Nesse sentido, Votre et alii (1993) explicitam alguns princípios fundamentais que delineiam um perfil do funcionalismo contemporâneo. O primeiro deles é o princípio da informatividade, que diz respeito ao conhecimento partilhado entre os participantes da interação verbal. Assim, cognitivamente, um indivíduo se comunica com intuito de levar a seu interlocutor uma informação a respeito de alguma coisa, que pode ser do mundo externo ou interno desse emissor, ou, até mesmo, uma tentativa de manipulação desse interlocutor. A iconicidade corresponde à relação motivada entre forma e significado, isto é, entre expressão e conteúdo. De acordo com Votre (1993:10), “a expressão tem a forma que tem por causa do conteúdo que veicula”. Para os funcionalistas, a estrutura da língua reflete, de alguma forma, a experiência do falante, o que implica dizer que o princípio da iconicidade se assenta na relação entre gramática e cognição. A marcação distribui, de maneira escalar, as estruturas da língua entre dois extremos: a categoria marcada e a não-marcada. Assim, as formas linguísticas marcadas são caracterizadas pela baixa frequencia de uso em uma determinada língua, ou seja, são 30 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância formas mais raras. Já as não-marcadas caracterizam-se pela alta frequência de uso, portanto, são mais usuais. CUNHA, M. A. F.; OLIVEIRA, M. R. & MARTELOTTA, M. E. (orgs.). Lingüística Funcional: teoria e prática. Rio de Janeiro: DP& A, 2003. FIORIN, José Luiz. (org.) Introdução à Linguística. 5. ed., 2ª reimpressão.S.Paulo: Contexto, 2008. 31 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 7. A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM Objetivo Discutir como se dá a aquisição da linguagem. Comparar as teorias sobre aquisição da linguagem Introdução Nesta aula pretendemos discutir o que ocorre na Linguística sobre a aquisição da linguagem, isto é, como a criança de um a quatro anos aprende a língua que dominará pouco tempo depois. Vamos refletir sobre as teorias de aquisição da linguagem, isto é, das propostas que tentam explicar como se dá esse desenvolvimento e por que ocorre da maneira como ocorre. 7.1. A aquisição da linguagem Como observado no item, a aquisição da linguagem não é caótica, aleatória. Há uma certa lógica nesse processo já estudada por vários teóricos. O fato de as crianças, por volta dos três anos, serem capazes de fazer uso produtivo de suas línguas suscita a questão de como estas línguas são aprendidas, adquiridas. É a essa questão que as teorias de aquisição tentam responder. Vamos apresentar algumas correntes teóricas em aquisição da linguagem. Seria impossível desenvolver uma descrição detalhada de cada corrente, ou discutir as diversas propostas que se aproximam mais ou menos de uma (ou mais de uma) corrente teórica. Dentro de uma possível simplicidade iremos mostrar um panorama dessa área. 7.2. O behaviorismo Durante a tradição estruturalista da Linguística, era muito comum a visão que previa o aprendizado por meio de estímulos. Skinner (1957) propunha ser capaz de predizer e controlar o comportamento verbal mediante variáveis que controlam o comportamento (estímulo, resposta, reforço) e a especificação de como essas variáveis interagem para determinar uma resposta verbal particular. 32 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Segundo essa proposta, um estímulo externo provoca uma resposta externa do organismo. Se essa resposta for reforçada positivamente, a tendência é que o comportamento se mantenha. Se a resposta for reforçada negativamente, o comportamento é eliminado. Imagine a situação de uma criança que vê a mãe e quer sair do berço (estímulo). Ela começa a chorar (resposta). Caso a mãe a retire do berço, ela está reforçando positivamente o comportamento da criança, isto é, a criança "aprende" que para sair do berço deve chorar. Se, por outro lado, a mãe não atender a criança (reforço negativo), esta "aprenderá" que não é chorando que vai conseguir sair de lá. O mesmo princípio é usado para o aprendizado da língua. Imagine que a criança vê a mamadeira (estímulo) e diz "papá". Se ela conseguir com isso que lhe deem a mamadeira, será reforçada positivamente, "aprenderá" que quando quiser comida deve dizer "papá". Assim, para Skinner, o aprendizado linguístico era análogo a qualquer outro aprendizado Considerando a aquisição desse modo, o behaviorismo acaba recaindo num processo indutivo de aquisição, porque considera somente os fatos observáveis da língua. Um dos principais problemas da proposta de Skinner no que diz respeito à linguagem é a aquisição do léxico (conforme já apontado por Chomsky, 1959). Outro importante problema para as propostas behavioristas é explicar como produzimos e compreendemos sentenças nunca ouvidas antes. Mas vamos falar de Chomsky mais adiante. 7.3. O conexionismo Os modelos conexionistas têm por objetivo explicar os mecanismos que embasam o processamento mental, e a linguagem é apenas um desses processos. As propostas conexionistas buscam a interação entre o organismo e o ambiente, assumindo a existência de um algoritmo de aprendizagem. Por organismo, entende-se a intrincada rede neural (os trabalhos conexionistas tentam replicar, computacionalmente, o que ocorre no cérebro). Segundo Plunkett (2000), pode-se imaginar que o cérebro é formado por uma rede de unidades de processamento interconectadas e que cada uma dessas unidades é um neurônio que recebe atividade elétrica de outros neurônios, via sinapses, ou seja, conexões que propagam atividade elétrica entre neurônios por neurotransmissores. 33 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Os modelos conexionistas assumem a existência de um algoritmo de aprendizagem interno que permite o aprendizado a partir de experiências. A aprendizagem está vinculada a mudanças nas conexões neurais. 7.4. O inatismo Segundo essa proposta de que o ser humano é dotado de uma gramática inata conforme aponta Chomsky (1965). Sua proposta procura dar conta da competência e criatividade do falante. Se se assume que há um componente inato e independente da cognição, cumpre tentar explicá-lo. Chomsky propõe que a criança tem um dispositivo de aquisição da linguagem inato que é ativado e trabalha a partir de sentenças (input) e gera como resultado a gramática da língua à qual a criança está exposta. Segundo o autor, esse dispositivo é formado por uma série de regras, e a criança, em contato com sentenças de uma língua, seleciona as regras que funcionam naquela língua em particular, desativando as que não têm nenhum papel. De acordo com essa proposta, a criança tem uma Gramática Universal (GU) inata que contém as regras de todas as línguas, e cabe a ela, criança, selecionar as regras que estão ativas na língua que está adquirindo. Mais para a frente, com a Teoria de Princípios e Parâmetro, a concepção do que seja a gramática universal muda. Segundo essa teoria, a gramática universal é formada por princípios, ou seja, "leis" invariantes, que se aplicam da mesma forma em todas as línguas, e parâmetros, "leis" cujos valores variam entre as línguas e dão origem tanto à diferença entre as línguas como à mudança numa mesma língua. O trabalho da criança está em escolher, a partir do input, o valor que um determinado parâmetro deve tomar. 7.5. O inatismo Esta proposta teórica, que vincula a linguagem à cognição, foi desenvolvida a partir dos estudos de Jean Piaget. Para Piaget, a criança constrói o conhecimento com base na experiência com o mundo físico, isto é, a fonte do conhecimento está na ação sobre o ambiente. 34 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Para Piaget, os universais linguísticos são reflexos das estruturas cognitivas universais; o conhecimento linguístico de uma criança em um determinado momento reflete as estruturas cognitivas que foram desenvolvidas antes e que determinam este conhecimento. Piaget propõe que o desenvolvimento cognitivo passa por períodos, estágios: sensório-motor (zero a dezoito meses), pré-operatório (dois a sete anos), operações concretas (7 a 12 anos) e operações formais. Os estágios piagetianos são universais (gerais e invariáveis) e, em cada um, a criança desenvolve capacidades necessárias para o estágio seguinte, provocando mudanças qualitativas no desenvolvimento. 7.6. O interacionismo Vygotsky (1962) também defende que o desenvolvimento da fala segue as mesmas leis, o mesmo desenvolvimento que outras operações mentais. O autor, no entanto, chama a atenção para a função social da fala, e daí a importância do outro, do interlocutor, no desenvolvimento da linguagem. Os estudos de base interacionista apontam para o papel do adulto como quem cria a intenção comunicativa, como o facilitador do processo de aquisição. Assim como Piaget, Vygotsky estava interessado na relação entre língua e pensamento. o autor propõe quatro estágios no desenvolvimento das operações mentais: natural ou primitivo (que corresponde à fala pré-intelectual e ao pensamento pré-verbal); psicologia ingênua (a criança experimenta as propriedades físicas tanto de seu corpo quanto dos objetos, e aplica essas experiências ao uso de instrumentos - inteligência prática); signos exteriores (as operações externas são usadas para auxiliar as operações internas; nesse estágio ocorre a fala egocêntrica); e crescimento interior (em que as operações externas se interiorizam). A aquisição da linguagem é fascinante. Observar como, num período tão curto, a criança passa a dominar uma língua é instigante, desafiador. São muitos os aspectos relativos a essa aquisição: Como esse processo ocorre tão rapidamente? Há um período crítico (idade máxima) para a aquisição? Qual a relação entre a produção e a percepção da linguagem? Existe algum componente da linguagem (fonologia, morfologia, sintaxe...) que é adquirido antes do que outro? Ou algum componente da linguagem serve para a criança 35 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância apoiar-se enquanto adquire outros componentes? Qual a relação entre a aquisição normal e a aquisição por crianças com algum tipo de desvio? Infelizmente não foi possível tratarmos de todos esses aspectos. Os estudos na área são complexos. Vale a pena você buscar conhecer mais profundamente cada um desses estágios. Nunca é demais estudar Chomsky. Você ouvirá muito sobre ele ao longo do curso. Chomsky é um dos maiores teóricos da atualidade. Sobre aquisição de linguagem, veja o vídeo https://www.youtube.com/watch?v=W53UvJoLAwI FIORIN, José Luiz. (org.) Introdução à Linguística. 5. ed., 2ª reimpressão.S.Paulo: Contexto, 2008.. 36 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 8. LINGUÍSTICA E ENSINO Objetivo Compreender de que forma a linguística pode ser aplicada em sala de aula. Como as diferentes teorias subsidiam o ensino. Introdução Com referência ao ensino da língua, tem havido, nos últimos anos, um excesso de teorização, num uso direto das teorias linguísticas modernas, tão prejudicial quanto a proliferação inconsequente de terminologias gramaticais. Além de se promover a análise científica da linguagem, cabe promover a organização dessa análise para o uso em sala de aula. A linguísticas não pode, sozinha, renovar o ensino do vernáculo. Pode, isto sim, dar uma grande parcela de contribuição para essa renovação. O ensino pode beneficiar-se com as informações obtidas pela investigação linguística, com os métodos que orientam essa investigação, mas não com o aparato formal das teorias ou com sua terminologia técnica. Mais ainda: o ensino não deve basear-se exclusivamente numa teoria. As várias teorias se complementam quanto aos fatos analisados. Deve-se, pois, promover um aproveitamento o mais eclético possível dos resultados alcançados pelas investigações teóricas, buscando- se o ponto ideal para o ensino da língua. 8.1. Teorias Linguísticas e Descrições Pedagógicas Torna-se necessária numa reflexão sobre teorias linguísticas e descrições pedagógicas, para que se veja a aplicabilidade dos modelos linguísticos ao ensino da língua. É impossível a aplicação direta das teorias linguísticas às descrições pedagógicas, uma vez que há divergência de objetivos entre elas. Não se pode esperar milagres da linguísticas. Deve ela ficar fiel aos seus limites e alcançar, dentro deles, a sua plenitude. O ensino pode e deve beneficiar-se das aquisições da linguística. Não há, porém, atualmente, um modelo linguístico diretamente aplicável ao ensino da língua. Caberia uma colaboração estreita, no nível universitário, entre o professor de português e o professor de linguística, buscando uma compreensão mais elevada do 37 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância sistema e funcionamento da língua. Ambos trabalham com o mesmo material: a língua. Cabe considerar os pontos convergentes entre a linguística e o ensino da língua para o maior número de conclusões práticas. Cabe, outrossim, o conhecimento das teorias existentes com base em princípios pedagógicos e não linguísticos. A gramática pedagógica pode e deve fazer uso de aquisições de diferentes teorias. A mudança a ser implementada só deverá ser levada a cabo se for verificado seu real interesse pedagógico. A mudança de terminologia, por exemplo, é de interesse nacional e não deste ou daquele autor, professor, entidade ou instituição, daí a necessidade de um trabalho conjunto entre linguistas, professores, pedagogos, autores de manuais didáticos e autoridades governamentais. A tarefa de escolher, dentre as informações contidas na(s) gramática(s) científica(s) da língua - há que havê-la(s) -, do que é pedagogicamente relevante deveria ser intentada pelo linguista aplicado e pelo autor de manuais pedagógicos. É importante deixar claro que ao se defender a necessidade de um olhar mais particular em relação à teoria x prática de ensino, em nenhum momento isso significa dizer que exista uma teoria ou um teórico cujo trabalho científico foi elaborado com a única e exclusiva função de ser aplicado a problemas relativos ao ensino de linguagem. O que se quer buscar é uma utilização do potencial explicativo de determinada teoria linguística para a interpretação e possível resolução dos problemas que afetam a área de atuação em sala de aula. Não se pode esquecer que se está aqui referindo à atuação de professores de LM formados em cursos de licenciatura e, enquanto tal, requer, claro, um entendimento teórico voltado para a prática. 8.2. Influência da Linguística nos Livros Didáticos A influência da linguística moderna nos livros didáticos não tem sido positiva. Temos visto gramáticas supostamente pedagógicas mais parecendo manuais de linguística. Na ânsia de mostrar vanguardismo de ideias, autores de livros didáticos utilizam, melhor, manipulam, de forma muitas vezes equivocada, nomenclaturas e teorias linguísticas, com o objetivo único de promover seus livros. 38 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Tem havido, nos últimos anos, um excesso de teorização, num uso direto das teorias linguísticas modernas, tão prejudicial quanto a proliferação inconsequente de terminologias gramaticais. Nenhum falante domina a língua como um todo. Os falantes nativos só possuem uma interseção de variantes. Ao ensino caberá aumentar o número de variantes dominadas pelo aluno, tornando-o capaz de usar eficazmente a língua nas diversas situações que vai vier, vivenciar. Mas o ensino da língua não deve ter como único objetivo o de capacitar o aluno para usá-la de modo eficaz e adequado. Deverá ele igualmente fornecer a esse aluno conhecimento sobre o funcionamento da língua, dando-lhe condições para compreender e apreciar a(s) sua(s) literatura(s). Cabe ao ensino estimular a reflexão linguística, para que o aluno tome consciência da língua e das suas possibilidades, estimulando-o igualmente à criatividade linguística, orientando-o para a percepção de que os recursos para tal criatividade estão à disposição de todos, no sistema da língua. O ensino de línguas pode e deve beneficiar-se com as informações obtidas pelas investigações linguísticas, com os métodos heurísticos que orientam essas investigações, mas não com o aparato formal das teorias e com sua terminologia técnica. Mais ainda, o ensino não deve basear-se exclusivamente numa teoria. As várias teorias se complementam quanto aos fatos analisados. Deve-se, pois, promover um aproveitamento o mais eclético possível dos resultados alcançados pelas investigações teóricas. É esse o ponto ideal para o ensino do vernáculo. Em 1997/1998, os PCNs de Língua Portuguesa (BRASIL, 1998) que defende princípios postulados por Vygotsky e por Bakhtin, - cujas respectivas teorias focalizam a origem social da linguagem e do pensamento, por meio de situações significativas e de interação humana12 -, assumem essa proposta de trabalho com o conteúdo enquanto determinados dentro do enquadre do funcionamento social e contextual do gênero. 39 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância COSERIU, Eugênio. “Do sentido da língua e a literatura”, in Confluência. Revista do Instituto da Língua Portuguesa do Liceu Literário Português, n.º 5, Rio de Janeiro, Ed. Lucerna Ltda/ 1º semestre/1993.p.29-47. 40 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 9. LINGUÍSTICA E PRECONCEITO NA ESCOLA Objetivo Refletir sobre o preconceito linguístico em sala de aula. Apontar estratégia de trabalho com as diferentes línguas existentes. Introdução O preconceito linguístico é, segundo o professor, linguista e filólogo Marcos Bagno, todo juízo de valor negativo (de reprovação, de repulsa ou mesmo de desrespeito) às variedades linguísticas de menor prestígio social. Normalmente, esse prejulgamento dirige- se às variantes mais informais e ligadas às classes sociais menos favorecidas, as quais, via de regra, têm menor acesso à educação formal ou têm acesso a um modelo educacional de qualidade deficitária. Apesar de comum, é difícil algum professor admitir que tenha esse tipo de preconceito. Por isso, vamos refletir sobre uma pesquisa realizados em docentes de uma escola de esfera pública municipal, situada no município de Maribondo – AL. A pesquisa foi realizada com o corpus constituído por (4) questionários devidamente respondidos pelos docentes, é possível ver a opinião dos professores em relação à variação linguística em sala de aula, na relação professor/aluno, e constatar a prática do preconceito linguístico. Por mais que os docentes não afirmem serem contra a variação da norma-padrão da língua portuguesa, eles afirmam que o papel da escola é ensinar aos discentes a norma- padrão, não os obrigando a segui-la rigorosamente. Com isso, a pesquisa constatou que os professores buscam corrigir seus alunos diante do uso da variação, ou seja, os mesmos não são contra, mas buscam ensinar seus alunos o uso do português-padrão. Ao final da aula, vale uma reflexão por parte dos docentes: como lidar com a variação linguística dentro da sala de aula, como reagir ao ver os discentes usando o português não padrão? Isto é certo ou errado? Como a prática do preconceito linguístico pode prejudicar os docentes? 41 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância O preconceito linguístico em sala de aula: Atitudes dos docentes. Disponível em: https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/direito/o- preconceito-linguistico-em-sala-de-aula-atitudes-dos-docentes/55786 9.1. O preconceito linguístico O preconceito é um juízo preconcebido o qual se manifesta em atos discriminatórios que intimidam a vítima. Existem várias formas de preconceito, racial, social, sexual, dentre outros. Nosso foco, nesta aula, é refletir sobre o preconceito linguístico, especificamente o que ocorre em sala de aula. O preconceito linguístico é visto constantemente em todos os lugares, sempre vindo da parte de falantes do português padrão. Na maioria das vezes, as “vítimas” são os falantes do português não padrão, já que se trata de pessoas sem nenhuma escolaridade ou então moradores da zona rural. Alguns dos falantes do português padrão, afirmam que o domínio da norma culta é um instrumento de ascensão social, o que para BAGNO (2007, p. 69) é mito. Ora, se o domínio da norma culta fosse realmente um instrumento de ascensão na sociedade, os professores de português ocupariam o topo da pirâmide social, econômica e política do país. O que não é verdade, nós, professores, recebemos salários indignos. Por outro lado, um grande fazendeiro que tenha apenas alguns poucos anos de estudo primário, mas que seja dono de milhares de cabeças de gado, de indústrias agrícolas e detentor de grande influência política em sua região vai poder falar à vontade sua língua de “caipira”, com todas as formas sintáticas consideradas “erradas” pela gramática tradicional, porque ninguém vai se atrever a corrigir seu modo de falar. Logo, será que o preconceito não é econômico? Segundo Bagno, na obra Preconceito Linguístico: o que é, como se faz (1999), o preconceito linguístico deriva da construção de um padrão imposto por uma elite econômica e intelectual que considera como “erro” e, consequentemente, reprovável tudo que se diferencie desse modelo. https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/direito/o-preconceito-linguistico-em-sala-de-aula-atitudes-dos-docentes/55786 https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/direito/o-preconceito-linguistico-em-sala-de-aula-atitudes-dos-docentes/55786 42 Introdução dos Estudos Linguísticos Universidade Santa Cecília - Educação a Distância Marcos Bagno foi um dos principais autores a discutir o preconceito linguístico. É importante que você conheça sua obra. A principal consequência do preconceito linguístico é a acentuação dos demais preconceitos a ele relacionados. Isso significa que o indivíduo excluído em uma entrevista de emprego, por se utilizar de uma variedade informal da