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Teaching English: Developing Competencies and Beliefs

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INGLÊS NA SALA DE 
AULA
 
 
INTRODUÇÃO 3 
 
1. A PRÁTICA DO ENSINO DE INGLÊS: DESENVOLVIMENTO DE 
COMPETÊNCIAS OU LEGITIMAÇÃO DAS CRENÇAS? 5 
Introdução 6 
 
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 11 
O Estudo 15 
Os Resultados 16 
Algumas Considerações 21 
 
3. COGNIÇÃO, EMOÇÃO E REFLEXÃO NA SALA DE AULA: POR 
UMA ABORDAGEM SISTÊMICA DO ENSINO / APRENDIZAGEM 
DE INGLÊS 24 
O Desejo Por Reflexões Epistemológicas na Linguística 
Aplicada 25 
As Ciências Cognitivas e a Biologia do Conhecer 26 
Emoções no Ensino / Aprendizagem de Inglês 29 
São As Histórias que nos Dizem Mais: Emoção, Reflexão e 
Experiência Narrativa 31 
 
4. ARTICULANDO EMOÇÃO, COGNIÇÃO E REFLEXÃO NA SALA 
DE AULA 35 
Reflexões Finais 43 
 
5. MOTIVAÇÃO E DESMOTIVAÇÃO NO APRENDIZADO DE 
LÍNGUAS 48 
Motivação 48 
Desmotivação 51 
 
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 54 
 
 3 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
INTRODUÇÃO 
Esta apostila foi preparada com o intuito de oferecer subsídios à disciplina 
INGLÊS NA SALA DE AULA: como fazer. O objetivo do curso é fornecer um 
conjunto de elementos conceituais, teóricos e empíricos que permitam, a você, 
aluno do IBRA, desenvolver seus estudos e obter o conhecimento que você 
espera, com sucesso. 
Pretendemos sugerir métodos práticos e desenvolver as habilidades 
técnicas e conhecimentos necessários à difícil tarefa de ensinar. Sendo o 
planejamento fator essencial na orientação eficiente de um programa de 
ensino e, a partir da filosofia das escolas e dos objetivos propostos, deverão ser 
determinados os métodos e técnicas que fornecerão diretrizes para um melhor 
controle do processo ensino-aprendizagem. 
Sabe-se que a aplicação de técnicas pelo professor não é um mero processo 
mecânico e que a aprendizagem não está limitada por nenhum conjunto de 
técnicas. Assim, aberto ao professor, estão todos os meios que prometem ser 
produtivos ao trabalho, individualmente ou em grupo, guiando-se em 
experiências que poderão ser úteis e ajude a interpretar e reformular 
experiências vividas. 
Anexamos artigos que versam acerca de pesquisas sobre o ensino e a 
aprendizagem de inglês, bem como sobre o processo de formação de 
professores. Pretendemos, com isso, despertar em você uma formação crítico-
reflexiva, que possibilite desempenho eficaz em suas carreiras profissionais. 
Esperamos que você faça uma excelente leitura e que tenha sucesso em 
seu curso. 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
1. A PRÁTICA DO ENSINO DE INGLÊS: 
DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS OU 
LEGITIMAÇÃO DAS CRENÇAS? 
 
Abstrat 
Although most of the studies in 
the field of teacher education 
advocate that the practicum is the 
main source for the acquisition of 
the knowledge and skills required 
by good teachers (Richards e 
Crookes, 1988; Pimenta, 1997; 
Kulcsar, 1998; Piconez, 1998), 
research adopting a socialization 
framework questions the full impact 
of this stage of professional 
development. 
The study reported here 
intended to investigate the impact 
of the practicum, according to EFL 
student teachers´ own perspectives. 
They were enrolled in a university 
teacher education course in Brazil, 
through which they were exposed 
to new educational experiences 
aimed at contributing to better 
informed pedagogical practices and 
to the development of the 
knowledge base necessary for 
conscious professional work. Using 
semi-structured interviews and 
observation reports as the main 
 
 
6 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
source of data, the analysis revealed 
that although the informants 
acknowledged the importance of 
the teaching practice experiences, 
there were limitations of their 
influence on developing the process 
of learning to teaching within a 
critical reflection mode (Tabachnick 
e Zeichener, 1991). The study also 
revealed that the student teachers 
were at elementary stages of 
professional development, 
according to Furlong & Maynard´s 
(1995) classification. 
Resumo 
A Prática do Ensino de Inglês 
(PEI) é uma das disciplinas que 
compõem o currículo do último ano 
dos alunos de Letras Anglo de uma 
universidade pública no norte do 
Paraná. Durante esse período, os 
futuros professores são expostos a 
novas experiências educacionais 
que pretendem contribuir para uma 
prática pedagógica informada e 
desenvolver bases analíticas para o 
trabalho profissional consciente. 
Embora boa parte dos estudos, 
nessa área, assegure que a 
experiência do estágio é a principal 
fonte para a aquisição de 
conhecimento e habilidades 
essenciais ao bom professor 
(Richards e Crookes, 1988; 
Pimenta, 1997; Kulcsar, 1998;
Piconez, 1998), estudos que se 
fundamentam na perspectiva da 
socialização questionam o impacto 
da prática de ensino no processo de 
aprender a ensinar de maneira 
informada (Lortie, 1975; Feiman-
Nemser e Buchmann, 1989; 
Freeman, 1992). 
Nesse sentido, o relato 
apresentado busca discutir o 
impacto desse componente na 
formação dos alunos de Letras, 
segundo suas próprias perspectivas. 
Para tanto, procedemos a análise de 
entrevistas semi-estruturadas, bem 
como de relatórios dos estágios. Os 
resultados apontam que, embora os 
futuros professores enalteçam esse 
componente curricular, há 
limitações do impacto da PEI sobre 
o processo de aprender a ensinar 
reflexivamente, numa perspectiva 
crítica (cf. Tabachnick e Zeichner, 
1991). 
A análise revela ainda alunos 
professores em estágios 
elementares de seu 
desenvolvimento profissional, 
segundo a classificação de Furlong e 
Maynard (1995). 
 
Introdução 
É comum tomarmos por certa a 
relevância da Prática de Ensino no 
processo de formação de 
 
 
7 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
professores. Quem de nós que 
trabalhamos com alunos nesse 
período já não os ouviu dizendo: “O 
estágio foi a melhor coisa do curso 
porque afinal consegui pôr em 
prática e entender muito do que 
sempre me foi dito”? Ou então: “Por 
que temos tão poucas horas de 
prática se essa se configura como a 
essência do curso de licenciatura”? 
Vistos de forma simples e sem uma 
análise mais criteriosa é realmente 
difícil contestar tais argumentos e 
mais; é impossível não afirmar que 
toda prática de estágio é 
componente fundamental no 
processo de formação dos futuros 
professores. 
E de fato, a Prática de Ensino 
deveria constituir-se no momento 
de síntese do curso de formação de 
professores, buscando não apenas 
integrar teoria e prática, mas 
assumindo a responsabilidade de 
formar profissionais conscientes de 
sua atuação social, capazes de 
contribuir para a mudança da 
realidade em que vivem. Há na 
literatura específica um número 
considerável de trabalhos que 
exploram a influência da prática de 
estágio sobre a formação do futuro 
professor. 
Para alguns pesquisadores, 
esta é, sem dúvida, a principal 
oportunidade que os alunos 
professores têm para adquirir, 
desenvolver e produzir 
conhecimentos e habilidades 
práticas que lhes possibilitem 
desempenho eficaz quando 
professores (e.g. Richards e 
Crookes, 1988; Pimenta, 1997; 
Piconez, 1998). 
Por outro lado, os estudos que 
se fundamentam na perspectiva da 
socialização vão além e questionam 
não somente o impacto do 
componente prático, mas dos 
próprios cursos de formação de 
professores no processo de 
aprender a ensinar. Nessa corrente 
encontram-se estudos que, 
baseados em Lortie (1975), 
entendem que o crédito concedido à 
prática deve ser limitado devido ao 
seu caráter restritivo: trabalho com 
um único professor colaborador; 
pouco acesso a diferentes técnicas 
de ensino; pouca influência do 
professor colaborador sobre o aluno 
mestre, entre outros. Em 
consequência desta estrutura, o 
autor afirma que o estágio não 
desafia a natureza rotineira da 
aprendizagem por observação . 
No entanto, Lortie reconhece 
que a prática informada, capaz de 
avaliaro ensino e de desenvolver 
bases analíticas para o trabalho 
profissional, só pode acontecer por 
meio de experiências de 
 
 
8 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
socialização formal que desafiem as 
experiências trazidas pelos alunos 
professores. 
Da mesma forma, Freeman 
(1992) acredita que a educação do 
professor é uma forma pouco 
significativa de intervenção, a 
menos que lide com as concepções 
de ensino e aprendizagem trazidas 
pelos alunos professores. O autor 
entende que somente a partir da 
articulação do conhecimento tácito 
o futuro professor poderá vir a 
conceituar o ensino de forma 
diferente daquela feita quando era 
apenas aluno. Isso é o que Feiman-
Nemser e Buchmann (1989, p. 136) 
chamam de transição para o 
pensamento pedagógico, que 
consiste em “pensar sobre o que os 
professores fazem em termos do 
que os alunos podem e devem 
aprender”. Portanto, mesmo 
autores que põem em xeque o 
impacto da prática de ensino 
reconhecem que este componente 
do processo de educação formal 
pode colaborar para o 
amadurecimento de perspectivas 
analisadas, até então, somente sob a 
ótica de aluno. 
Nossas experiências como 
formadoras de professores têm nos 
revelado as limitações do impacto 
que se pretende ter sobre os futuros 
profissionais, especialmente se 
analisado sob a ótica do “aprender a 
ensinar reflexivamente”, atingindo 
o domínio crítico dessa reflexão (cf. 
Tabachnick e Zeichner, 1991), no 
qual critérios éticos e morais devem 
ser incorporados. 
Com base na necessidade de 
tornar claros alguns dos aspectos da 
multifacetada tarefa de aprender a 
ensinar, esse estudo pretende 
analisar o impacto da prática de 
ensino sobre o desenvolvimento 
profissional de alunos professores, 
tomando como elemento de análise 
suas próprias percepções. A questão 
que se coloca, portanto, é qual o 
impacto da prática de ensino de 
Inglês no contexto investigado para 
a formação crítico-reflexiva das 
alunas em foco. 
Ter as percepções das alunas 
professoras como ponto de partida 
para analisar e discutir seu processo 
de formação permitirá trazer à tona 
os estágios de desenvolvimento nos 
quais se encontram ao mesmo 
tempo em que possibilitará 
compreender a relação entre o 
 
 
9 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
impacto que desejamos como 
formadores e aquele que elas 
esperam como futuras professoras. 
Assim, iniciamos esse relato 
apresentando os referenciais 
teóricos que serviram como pano de 
fundo para a análise e discussão dos 
dados. Em seguida, 
contextualizamos a pesquisa dentro 
de um estudo maior, a partir do qual 
os dados foram derivados. A 
apresentação dos resultados dá 
destaque ao impacto da prática de 
estágio, segundo os futuros 
professores, tendo em mente as 
implicações da mesma para a 
formação de profissionais críticos e 
autônomos. Finalmente, traçamos 
considerações acerca desse 
componente curricular, levantando 
questões sobre sua relevância para a 
formação de professores. 
 
 
 
 
 
 
 
 11 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 
Para discutirmos os dados 
tomaremos como base os 
referenciais teóricos do modelo de 
formação reflexiva (cf. Tabachnick e 
Zeichner, 1991) e dos estágios de 
desenvolvimento dos professores 
(cf. Fuller e Bown, 1975; Furlong e 
Maynard, 1995). 
A concepção de prática 
reflexiva proposta pelo filósofo 
americano John Dewey, no início do 
século, influenciou outros 
educadores contemporâneos, 
dentre os quais Tabachnick e 
Zeichner (1991) que distinguem 
diferentes tipos de reflexão com
base na dicotomia entre o 
pensamento cotidiano, rotineiro e o 
pensamento reflexivo. Assim, eles 
apresentam os domínios: 
 Técnico, que revela 
preocupações com a eficiência dos 
meios ou técnicas utilizadas para se 
atingir os fins, normalmente 
estabelecidos por outras pessoas e 
que, por sua vez, ficam sem serem 
examinados; 
 Prático, no qual predomina a 
necessidade de explicar e esclarecer 
os pressupostos e predisposições 
que norteiam as atividades de 
ensino e de avaliar a adequação dos 
 
 12 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
objetivos, bem como de que forma 
eles foram alcançados. Há, neste 
sentido, a consideração dos fins 
educacionais; 
 Crítico, que incorpora 
critérios éticos e morais no discurso 
da prática. 
As questões centrais 
consideram o benefício dos 
objetivos, atividades e experiências 
educacionais diante dos conceitos 
de equidade, justiça e realização 
concreta para todos os alunos. 
Ortenzi (1997) argumenta que 
reflexões no domínio crítico, que 
idealmente deveria ser alcançado 
pelos professores, são possíveis 
somente na medida em que os 
[futuros] profissionais percebem a 
dimensão política de sua prática. 
 Contudo, refletir sobre o 
ensino com base na aprendizagem 
de conceitos que extrapolem as 
limitações da nossa cultura 
educacional celular (Lortie, 1975) 
exige amadurecimento de questões 
mais elementares, conforme 
esclarecem Fuller e Bown (1975). 
Baseados em uma revisão de 
aproximadamente trezentos 
trabalhos, entre os quais alguns 
empíricos, Fuller e Bown (1975) 
conceituaram fases no 
desenvolvimento dos alunos 
professores e levantaram a hipótese
de que as preocupações são 
sequenciais e cumulativas. 
Assim, antes que o futuro 
professor atinja a maturidade 
profissional e pense no ensino em 
termos do seu impacto sobre os 
alunos e seu crescimento – processo 
que Feiman-Nemser e Buchmann 
(1989) chamam de transição para o 
pensamento pedagógico – ele passa 
por fases reveladas por 
preocupações características. 
Outro estudo bastante 
representativo na área dos estágios 
do desenvolvimento de professores 
em pré-serviço é o de Furlong e 
Maynard (1995) por tentar expandir 
a noção sequencial proposta 
anteriormente. Para estes 
pesquisadores, o desenvolvimento 
do aluno mestre não se dá de forma 
linear, mas simultânea. Com base 
em dados coletados em cinco 
escolas públicas de ensino 
fundamental, com alunos do curso 
de educação primária, os 
pesquisadores elaboraram cinco 
categorias: 
(1) idealismo inicial; 
(2) sobrevivência pessoal; 
(3) lidando com dificuldades; 
(4) atingindo a planície e 
(5) seguindo em frente. 
 
 13 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
Na fase do idealismo inicial, os 
resultados de Furlong e Maynard 
corroboram a descrição de Fuller 
e Bown (1975). Também seus 
alunos professores identificaram-
se muito mais com os alunos 
do que com os professores 
colaboradores e expressaram uma 
imagem idealizada do tipo de 
professor que gostariam de ser – 
caloroso, amigo, entusiasmado, 
atencioso e popular –, do tipo de 
relacionamento que gostariam de 
manter com seus alunos – amigável, 
mas respeitoso –, bem como da 
atmosfera alegre, calorosa e de 
cooperação que gostariam de criar 
em suas salas de aula. 
A crença de que o 
relacionamento pessoal do aluno 
professor com seus alunos é fator 
predominante para sua eficácia 
profissional, é vista por Furlong e 
Maynard como simplista e é 
rapidamente ofuscada pelas 
realidades da sala de aula, assim 
que tem início a prática de ensino. 
Neste momento, surgem as 
preocupações com a sobrevivência 
pessoal, que Furlong e Maynard 
caracterizam como o processo de 
ajustar-se às rotinas e expectativas 
do professor colaborador, de ser 
visto e respeitado como professor 
responsável pela turma e de 
conseguir o controle da sala de aula. 
Ajustar-se às rotinas 
significava, para muitos dos alunos 
professores estudados por Furlong 
e Maynard, copiar o estilo do 
professor, especialmente no que diz 
respeitoao seu relacionamento com 
os alunos. Fazendo isto, eles 
imaginavam não quebrar a rotina e 
ter a chance de conduzir seu 
trabalho mais suavemente. 
Consequentemente, a imagem 
de professor idealizada 
anteriormente cediaespaço ao tipo 
de professor que eles achavam que 
deveriam ser a fim de sobreviverem 
inicialmente. A necessidade de 
serem vistos e respeitados como 
professores da turma relaciona-se 
de forma direta com as questões 
relativas ao controle da disciplina 
em sala de aula. As preocupações 
mais recorrentes estão em preparar 
atividades que mantenham os 
alunos trabalhando e em 
desenvolver procedimentos que 
mantenham-nos em seus lugares. 
Nesta fase, os alunos professores 
temem desviarem-se dos planos 
elaborados e sentem-se 
extremamente frustrados quando 
suas ideias não dão certo e quando 
não conseguem controlar o 
comportamento dos seus alunos. 
A fase seguinte surge a partir 
da segunda ou terceira semana 
quando os alunos professores 
passam a ver as dificuldades da sala 
 
 14 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
de aula e a se preocupar mais com 
seu comportamento profissional. 
Neste período, eles procuram se 
estabelecer como professores, 
normalmente replicando aquilo que 
eles consideram ser o 
comportamento de um professor. 
Furlong e Maynard (1995, p. 
82) apontam que os alunos 
professores “agem como 
professores, mas sem 
necessariamente compreender os 
propósitos subjacentes ou as 
implicações daquelas ações”. Além 
disso, preocupam-se em 
impressionar o professor 
colaborador e, especialmente o 
professor supervisor, responsável 
pela avaliação de sua competência 
profissional. Os alunos professores 
estudados revelaram que, apesar 
dos professores colaboradores os 
encorajarem a ver esta como uma 
experiência de aprendizagem, a 
maior preocupação estava em “fazer 
a coisa certa‟ para ser aprovado na 
disciplina. 
 
Devido à pouca compreensão 
que os alunos professores tinham 
dos pressupostos que 
fundamentavam suas ações, eles 
tentavam impressionar por meio de 
estratégias de ensino e de manejo de 
sala, preparando explicações claras 
e dinâmicas de grupo que os 
mantivessem no controle da 
disciplina. Foi bastante 
característica nesta fase a utilização 
de materiais extras que deixassem 
os alunos ocupados. 
Após terem adquirido 
confiança em seu conhecimento 
pedagógico geral, os futuros 
professores atingem a planície. 
Neste estágio, eles sentem-se como 
“verdadeiros professores‟. 
Contudo, não compreensão dos 
pressupostos que fundamentam 
suas práticas não lhes permite 
ainda perceber a relação entre o 
ensino e a aprendizagem dos 
alunos. A maioria dos alunos 
professores estudados por Furlong 
e Maynard, ao sentirem-se mais 
confiantes e relaxados, passaram a 
apresentar planos e avaliações 
menos elaborados e a perder o 
entusiasmo em tentar novas 
estratégias e atividades. 
Apesar de “verdadeiros 
professores”, neste estágio os 
alunos professores não se 
mostraram capazes de desenvolver 
atividades voltadas à aprendizagem 
 
 15 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
de seus alunos. Para que os alunos 
sigam em frente, ou seja, consigam 
analisar sua prática criticamente, 
compreender as responsabilidades 
de ser um educador, desenvolver as 
habilidades do pensamento 
pedagógico e fazer assim a transição 
para o papel de professor, é 
necessário que haja intervenções 
por parte dos professores 
supervisores voltadas diretamente 
para os propósitos e implicações da 
educação. 
Outros estudos mostram que 
sem desafio e suporte, os alunos 
professores dificilmente atingem 
este estágio. Furlong e Maynard 
(1995) argumentam que na fase do 
seguindo em frente os alunos 
professores eram levados a refletir 
sobre as implicações das atividades 
em termos da aprendizagem de seus 
alunos. Não sem resistência, muitos 
sentiam-se frustrados e até mesmo 
deprimidos, uma vez que este 
processo implica em questionar as 
próprias crenças, muitas já bastante 
arraigadas, sobre ensino e 
aprendizagem. 
 
O Estudo 
O estudo que apresentamos 
agora faz parte de um projeto de 
pesquisa intitulado “Aprendendo a 
ensinar Inglês: um estudo 
longitudinal com estagiários do 
curso de Letras”. Esse projeto foi 
motivado pela necessidade que 
sentíamos de verificar a interação 
entre o conhecimento gerado pelas 
experiências socializadoras e o 
conhecimento gerado pelas 
experiências educacionais na 
universidade em que atuamos. 
Tendo como referenciais 
teóricos estudos que reconhecem a 
importância de experiências 
anteriores aos cursos de formação 
de professores, bem como estudos 
que enfatizam a importância de se 
entender as ações do professor do 
ponto de vista de seu sistema de 
crenças e valores, esse projeto teve 
início em 1999, ano em que os dados 
foram coletados com 14 alunos do 
4º e último ano do curso de Letras 
Anglo de uma universidade pública 
no norte do Estado do Paraná. 
À época da coleta dos dados, os 
alunos professores desse curso 
tinham em seu currículo 68 horas 
de prática do ensino de Inglês 
concentradas no último ano. Essa 
carga horária era distribuída entre 
observação de aulas em escolas 
públicas, confecção de relatórios de 
observação e de regência, 
planejamento supervisionado e 
direção de classe. O conjunto de 
dados coletados inclui 
autobiografia, inventário de crenças 
aplicado no início e final do ano 
 
 16 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
letivo, gravações em áudio de 
sessões de encontros para 
supervisão de estágio, relatórios de 
observação de aulas, relatórios de 
estágio e entrevistas semi-
estruturadas. 
A análise seguinte concentra-se 
nos dois últimos instrumentos, uma 
vez que eles revelam com maior 
propriedade as percepções dos 
alunos sobre seu desenvolvimento 
durante a prática de ensino. O 
relatório de estágio apresentava-se 
como um dos componentes da 
avaliação da disciplina Prática do 
Ensino de Inglês: Estágio 
Supervisionado e tinha o 
propósito de sistematizar as 
reflexões feitas durante as 28 horas 
de regência. 
Era objetivo também do 
relatório permitir uma reflexão 
acerca do desenvolvimento 
profissional dos alunos professores 
e da interação entre suas 
experiências formais e informais. 
Por sua vez, as entrevistas 
semi-estruturadas conduzidas ao 
final do ano letivo pretendiam 
suscitar suas percepções a respeito 
do estágio, bem como do 
componente teórico do curso. O 
presente relato concentra-se em 2 
das 14 alunas professoras 
envolvidas no projeto, que serão 
identificados pelos nomes de 
Adriana e Berenice. Tal escolha 
deu-se de forma aleatória, tendo em 
mente que os resultados 
apresentados pretendem melhor 
compreender o que os 
acontecimentos significam para os 
envolvidos nesse meio sócio-
educacional. 
 
Os Resultados 
Os resultados dos alunos 
professores serão apresentados 
separadamente, tendo como ponto 
de partida suas próprias percepções 
acerca do impacto da prática de 
estágio, e como referencial as 
implicações desse componente 
curricular para a formação de 
profissionais críticos e autônomos. 
Adriana 
Adriana era uma aluna cujo 
ingresso no curso de Letras deu-se 
pelo sonho de aprender e ensinar 
Inglês. Tendo sido forçada a 
abandonar os estudos da língua em 
dois outros momentos de sua vida 
por motivos de ordem material, ela 
via na universidade pública a 
chance de aprender inglês. 
Contudo, o foco na gramática 
trouxe dificuldades extras durante o 
curso e por várias vezes ela dizia 
achar o ensino que havia recebido 
complicado, difícil e 
desestimulante. Contudo, casada e 
 
 17 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
grávida de seu primeiro filho, foi 
sempre uma aluna responsável e 
pontual em suas tarefas durante o 
curso. Diferente de muitos de seus 
colegas, Adriana havia feito 
magistério e tinha alguma 
experiência de sala de aula. Há 
alguns anos trabalhando com 
crianças no ensino primário, ela 
tinha crenças bem marcadas quanto 
ao seu papel. Para ela: o bom 
professor é aquele que tem umrelacionamento amigável com seus 
alunos, deve ser dinâmico, flexível e 
ter senso de humor. 
Consequentemente acreditava 
que: é preciso ensinar a matéria de 
uma forma diferente, dinâmica, 
quebrar a rotina. Assim como a 
grande maioria dos alunos mestres, 
também Adriana afirma ter sido a 
prática de ensino um momento 
importante em seu processo de 
formação. Segundo ela relata em 
seu relatório de estágio: 
Ao final do meu trabalho na 
prática de estágio, concluo que para 
mim a experiência em sala de aula 
foi muito válida e rica, no sentido de 
uma reflexão sobre a atuação do 
professor perante o processo de 
ensino-aprendizagem, e defendo a 
questão de que cabe ao professor o 
sucesso ou fracasso de seu aluno. 
Falar que a prática de ensino 
permitiu uma reflexão sobre a 
atuação do professor nos leva a 
imaginar que Adriana tenha 
sidocapaz de entender sua prática 
sob a perspectiva do aluno, ou seja, 
tenha se tornado capaz de refletir 
criticamente sobre as 
responsabilidades de um educador. 
 Contudo, quando questionada 
durante a entrevista a respeito das 
certezas e dúvidas adquiridas a 
partir do estágio, ela comenta: no 
geral eu posso dizer assim que eu fui 
muito feliz no meu estágio, e tanto 
que gerou até assim um clima de 
amizade mesmo entre os alunos, né, 
que eu já sentia como se fosse 
minha própria sala de aula, né. 
Então, depois que eu saí, como 
eu moro num local próximo à 
escola, às vezes eu encontro com os 
alunos, né, fora da escola “ô 
professora, você não vai voltar dar 
aula pra gente?” e tal. Então, eu 
sinto assim que houve um 
envolvimento, que os alunos 
gostaram. Eu saí satisfeita por mais 
que sempre tem alguma coisa que 
dá pra ser melhorada (...) Então, eu 
 
 18 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
acredito que eu consegui 
desenvolver um trabalho, eu criei 
um clima de envolvimento com os 
alunos sim. 
Aqui é possível notar que 
apesar do impacto testemunhado 
pela aluna professora, sua análise 
não avança para além de questões 
centradas no ensino e nunca na 
aprendizagem. 
Ela avalia, de forma simplista, 
o sucesso de sua prática pelo grau 
de amizade que criou com os 
alunos. Embora reconheça a 
existência de limitações e 
dificuldades em sua prática é 
incapaz de compreender as 
complexidades do ensino. Se 
voltarmos aos estágios descritos 
anteriormente por Furlong e 
Maynard (1995), veremos que ela se 
encontra em uma etapa ainda 
bastante inicial, preocupada em 
lidar com as dificuldades e em 
avaliar a eficácia dos meios 
utilizados para alcançar seu 
objetivo pessoal: o de manter um 
relacionamento amigável e 
despertar o interesse dos alunos. 
Em outros momentos da 
entrevista Adriana também 
demonstra não ser capaz de refletir 
sobre sua atuação pedagógica para 
além do nível técnico. Se por um 
lado esse aspecto pode ser 
considerado elemento essencial 
para uma prática bem sucedida, por 
outro não parece suficiente para a 
construção de um conjunto de 
conhecimentos voltados à 
transformação da ação docente. 
Todas as vezes em que era indagada 
sobre sua prática ela a analisava em 
termos do que fazer e de como fazer: 
A professora levava letra de 
música, levava algum outro tipo de 
material que envolvesse mais, os 
alunos trabalhavam em grupos e eu 
percebia o envolvimento deles na 
aula. Então, eu fiquei imaginando 
como eu poderia trabalhar no meu 
estágio. (...) Mas a gente percebe 
que quando você chega na sala de 
aula com um jogo, com alguma 
coisa que interessa é bem diferente 
a aula, né, o envolvimento. (...) aí eu 
continuei pensando o que fazer nas 
outras aulas pra que continuasse 
aquele interesse, né, e eu percebi o 
seguinte: quando é desenvolvida a 
aula dessa forma, com dinâmicas, 
com materiais extras, eu conseguia 
um envolvimento grande; quando 
eu pedia pra usar o livro... 
A experiência de estágio 
descrita por Adriana como válida e 
rica parece ter servido para 
confirmar e tornar mais fortes as 
crenças trazidas e apresentadas 
desde o início da prática, como as 
que mostramos anteriormente. 
Nesse sentido, o impacto por ela 
 
 19 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
mencionado se distancia 
certamente daquele desejado por 
formadores de professores que 
entendem esse como um momento 
de contribuir para o 
desenvolvimento de uma prática 
pedagógica informada e consciente 
que permita a revisão de 
conhecimentos e crenças 
desenvolvidos no período da 
aprendizagem por observação. 
Além disso, a experiência da 
prática do ensino de inglês parece 
contribuir de sobremaneira para 
confirmação das escolhas, como 
mostra o seguinte trecho: ... dentro 
desse estágio que eu tive realmente 
a certeza da área que eu quero 
trabalhar porque antes eu não tinha 
certeza se era inglês, se era 
português. 
Mas eu acredito que dentro 
desse estágio eu consegui realizar 
um trabalho bom e tenho vontade 
de trabalhar nessa área, mais do que 
com o português. Essa certeza 
parece revelar uma identidade 
tardia com o curso, o que 
certamente traz consequências para 
a construção de imagens pessoais 
que deem conta de compreender e 
lidar com as complexas realidades 
das salas de aula (Ortenzi, Mateus e 
Reis, 1996). 
 
Berenice 
A experiência de Berenice 
como aprendiz da língua desde 
muito cedo em academias fez com 
que ela se apaixonasse pelo inglês. 
Seu sucesso como aprendiz e o 
apoio de uma de suas professoras a 
motivou para o ingresso no curso. 
Na universidade as sensações 
ficam todas misturadas, pois há 
medo, insegurança, entusiasmo, 
realizações e decepções. Mesmo 
assim, Berenice repete sempre a 
certeza de querer ser professora de 
Inglês. Contudo, sem experiência 
anterior alguma de sala de aula, as 
crenças de Berenice quanto ao papel 
do professor vinham de suas 
vivências como aprendiz de língua, 
como mostra um trecho de sua 
entrevista: 
Olha, eu me via assim como as 
minhas professoras eram no 
ginásio, é... seguia o livro didático 
ali tal, é... qualquer coisa mandava o 
aluno pra diretoria, aquela coisa 
bem autoritária, bem tradicional 
mesmo, né. Ser autoritária e 
tradicional são características de 
sua prática contra as quais ela 
parece lutar o tempo todo. Na 
verdade, essa é antes uma crença 
que concebe o professor como 
autoridade responsável pelo 
estabelecimento e manutenção da 
ordem em sala de aula (Feiman-
 
 20 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
Nemser e Floden, 1986). 
Assim, contrariando os 
resultados de alguns estudos, 
Berenice iniciou sua prática menos 
preocupada em estabelecer um 
relacionamento amigável e caloroso 
com seus alunos e mais voltada para 
o tipo de professora que deseja ser. 
Desta forma, ela relata que no 
início: ... eu me peguei muitas vezes 
realmente mandando o aluno calar 
a boca, realmente querendo pôr o 
aluno pra fora da sala. (...) eu não 
gostaria de dar aula como eu tive 
aula; eu queria ser aquela 
professora amiga, que fosse aquela 
aula gostosa, descontraída. 
E é nesse aspecto que Berenice 
vê o impacto do estágio sobre sua 
formação. É exatamente no que diz 
respeito ao seu comportamento 
como professora, nas suas atitudes 
e posturas com relação aos alunos e 
ao ensino propriamente dito. 
Segundo ela própria afirma durante 
a entrevista: 
“...logo que eu comecei dar aula 
eu queria ser aquela professora bem 
tradicional, autoritária e de repente 
eu me vi e eu trabalhei assim olha 
até a metade do estágio. Aí, eu 
comecei a repensar e até hoje eu 
repenso nisso, eu fico pensando 
nisso, porque eu tô querendo criar 
um modelo de professor como eu 
gostaria de ser como modelo de 
professor. Então, eu fico tentando 
ver os meus professores, os que eu 
tive, os que eu tô tendo ainda esse 
ano, como eles dão aula, o que eu 
gosto, o que eu não gosto, sabe, eu 
tô tentando pegar umpedacinho 
decada e adaptar em mim.” 
Sem dúvida todo o esforço de 
Berenice estava em desenvolver-se 
como professora em termos daquilo 
que ela imaginava que deveria ser. 
Em momento algum ela se refere ao 
estágio como forma de considerar o 
que e como os alunos aprendem. 
Apesar do reconhecido impacto 
atestado por ela, Berenice 
continuou a “ver o professor como 
aluno‟, “tentando pegar um 
pedacinho de cada um” para 
compor seu personagem e não foi 
capaz de “ver-se como professora‟ 
responsável por promover a 
aprendizagem de seus alunos. Em 
todas as suas falas está fortemente 
presente a crença de que o professor 
é o responsável por trazer o aluno 
para sua aula e fazer com que ele 
 
 21 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
goste da sua disciplina, despertar o 
interesse e a atenção dos alunos, 
mostrar que aquilo que está sendo 
ensinado é importante. 
Como vemos, o foco de suas 
reflexões está no professor. Embora 
seja fundamental que o futuro 
professor aprenda a detectar sinais 
de compreensão e confusão na 
aprendizagem dos alunos e que seja 
estimulado a implementar suas 
preocupações nesta área, Berenice 
limita suas reflexões ao papel do 
professor, tomando por certo que 
afinidades pessoais levam 
diretamente ao “gosto” pela 
disciplina e, consequentemente, à 
quase misteriosa aprendizagem. 
Nesse sentido, ela se preocupa 
muito em comportar-se como 
professora, mas sem 
necessariamente compreender os 
propósitos subjacentes ou as 
implicações de suas ações. Esse 
visão ingênua de sua prática a 
coloca em um estágio bastante 
elementar de seu desenvolvimento 
profissional que não permite uma 
reflexão mais crítica de seu papel 
social. 
Mais grave, a prática que 
deveria servir como instrumento 
para a construção de um 
conhecimento criticamente 
informado, que permitisse à 
Berenice pensar sobre suas ações 
pedagógicas em termos do que os 
alunos podem e devem aprender, 
serviu para legitimar as 
experiências trazidas para esse 
contexto. As certezas de Berenice 
após quase um ano de socialização 
formal são as de que gostando 
delaos alunos gostarão de inglês, 
como mostra mais um trecho da 
entrevista: 
A certeza que eu tenho é 
que é isso mesmo que eu quero: 
ser professora. 
(...) Tô com muita expectativa, 
apesar que o governo tá fazendo 
essa bagunça com a educação, né, 
boas expectativas. Quero ser uma 
excelente professora. Quero que 
meus alunos gostem de mim, 
gostem da minha matéria, vou 
trabalhar pra isso. E essa é minha 
principal certeza: de que tô no 
caminho certo. 
A expectativa de promover o 
gosto pela disciplina como forma, 
ou como “o caminho certo” para 
uma prática bem sucedida 
simplifica em muito seu papel de 
educadora, inserida em um 
contexto carregado de 
responsabilidades sociais. 
 
Algumas Considerações 
Os dados apresentados 
 
 22 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
apontam que embora todos os 
futuros professores enalteçam a 
relevância da prática de estágio, há 
limitações do impacto desse 
componente curricular sobre o 
processo de aprender a ensinar 
reflexivamente, numa perspectiva 
crítica (cf. Tabachnick e Zeichner, 
1991). 
A análise revela também que 
tanto Adriana como Berenice 
encontram-se ainda em estágios 
elementares de seu 
desenvolvimento profissional, 
segundo a classificação de Furlong e 
Maynard (1995). Ambas transitam 
entre os estágios de sobrevivência 
pessoal e lidando com as 
dificuldades. A caracterização das 
etapas alcançadas pelas duas 
estagiárias revela que a prática de 
ensino teve um impacto sobre o 
processo de formação de Adriana e 
Berenice, embora em graus 
diferenciados dos idealizados pelos 
supervisores, qual seja o de ser um 
“rito de passagem”. 
Talvez como consequência da 
forma como os estágios estão 
estruturados e pela própria 
ambiguidade de papéis do aluno 
professor, a experiência parece ter 
se configurado mais como 
legitimação das práticas adotadas 
rotineiramente pelos professores 
regentes. 
Em consequência, este estudo 
nos mostra que para as duas alunas 
professoras, mais importante do 
que tornarem-se conscientes do 
papel social do professor de inglês, 
capaz de confrontar seus 
conhecimentos e de considerar a 
qualidade e o valor daquilo que os 
alunos aprendem, importava 
adquirir segurança numa prática 
que elas já conheciam devido aos, 
pelo menos, 14 anos de 
aprendizagem por observação. 
Para nós, educadoras de 
futuros professores, o desafio que se 
coloca é como implementar um 
programa voltado para a formação 
reflexiva numa perspectiva crítica 
que permita a incorporação da 
dimensão política do fazer 
pedagógico e do conceito de 
transformação social nela implícita. 
Em nosso modo de pensar, 
importa não só adotar a reflexão 
como modelo para o 
desenvolvimento profissional de 
futuros professores, mas também 
imprimir-lhe uma qualidade 
diferenciada, ainda na fase pré-
serviço. Quanto mais soubermos 
como interagem as crenças e o 
conhecimento formal nas diversas 
etapas de atuação do futuro 
professor, mais poderemos 
contribuir para esse objetivo.
 
 
 
 
 24 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
3. COGNIÇÃO, EMOÇÃO E REFLEXÃO NA SALA DE 
AULA: POR UMA ABORDAGEM SISTÊMICA DO 
ENSINO/APRENDIZAGEM DE INGLÊS 
Este artigo propõe articular a 
Biologia do Conhecer de Humberto 
Maturana (1998) à pesquisa 
narrativa de Jean Clandinin e 
Michael Connelly (2000), de modo 
a propor uma abordagem sistêmica 
para a pesquisa sobre o ensino e a 
aprendizagem de inglês e superar a 
dicotomia teoria-prática que 
domina comumente a reflexão no 
campo. 
Para tanto, apresento o estudo 
de uma narrativa em contexto de 
sala de aula de inglês que irá lançar 
luzes sobre a natureza histórica das 
relações operacionais entre emoção 
e cognição. 
Defendo que as emoções e a 
história de vida da participante da 
pesquisa especificam suas ações na 
sala de aula. Argumento que a 
construção de narrativas propicia a 
emergência de uma atitude reflexiva 
que possibilita transformações nas 
emoções e ações na conduta de sala 
de aula. Com isso, pretendo 
contribuir para a expansão de 
nossos horizontes reflexivos sobre a 
 
 25 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
inter-relação entre linguagem, 
cognição e emoção, fundamental 
para nossa compreensão da sala de 
aula. 
 
O Desejo Por Reflexões 
Epistemológicas na Linguística 
Aplicada 
Na virada do milênio, 
assistimos a uma explosão de 
artigos, mesas- redondas e debates 
que revisitaram o campo da 
Linguística Aplicada, repensando 
sua história teórico-metodológica e 
seus horizontes epistemológicos. É 
visível o sentimento de renovação 
para o qual acenam pesquisadores 
renomados do campo, e é amplo o 
reconhecimento de que a 
Linguística Aplicada está, de fato, 
fazendo com que sua disciplina 
mãe, a Linguística, repense alguns 
de seus conceitos fundadores 
(RAJAGOPALAN, 2003, p. 77-81). 
É nesse contexto que se insere 
este artigo, que expõe resultados 
parciais de minha pesquisa de 
doutorado, fruto das preocupações 
de um professor de inglês 
interessado no caleidoscópio 
sistêmico de variáveis envolvidas no 
complexo processo de 
ensino/aprendizagem em sala de 
aula. A certeza da importância de 
uma teorização consistente e 
crítica para a escolha de práticas de 
pesquisa que sejam sensíveis às 
diferenças e às variações individuais 
e contextuais e que evidenciem a 
mutualidade entre teoria e prática é 
o que me encoraja a desenvolvê-lo. 
Interessam-me, sobretudo, teorias 
que configuram a cognição e a 
linguagem como fenômenos que 
são dependentes da nossa 
dinâmica biológica e sociocultural, e 
que simultaneamente tanto são 
especificados por essas dinâmicas 
quanto as especificam, num 
processo recursivo e contínuo. 
Essas propostaspodem dar 
origem a diálogos fecundos no que 
concerne ao temário do 
ensino/aprendizagem de línguas. 
Ganhos sistemáticos podem ser 
obtidos se esse processo for 
configurado como um fenômeno 
observado no domínio das 
interações situadas dos seres 
humanos, de maneira dependente 
da nossa dinâmica biológica, em 
especial de nossas emoções, como 
especificadoras das dinâmicas 
relacionais, tanto interpessoais 
quanto com o meio físico. 
Meu principal interesse é 
contribuir para a reflexão 
conceitual já estabelecida na área da 
Linguística Aplicada ao 
Ensino/Aprendizagem de Línguas 
Estrangeiras, ao introduzir aí a 
 
 26 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
Biologia do Conhecer 
(MATURANA, 1998, 2001), aliada à 
pesquisa narrativa (CLANDININ e 
CONNELLY, 2000). Essa 
articulação nos permite 
desenvolver aquilo que Johnson e 
Golombeck (2002, p. 4) chamaram 
de uma epistemologia da prática. 
Primeiramente, apresento a 
fundamentação teórica da 
pesquisa, em seguida uma breve 
exposição de minha pesquisa e 
discussão de seus resultados 
parciais e, por último, proponho 
algumas reflexões sobre o exposto. 
 
As Ciências Cognitivas e a 
Biologia do Conhecer 
É comum ouvirmos dizer que o 
processo de aprendizagem de uma 
língua envolve a captação, o 
processamento e o armazenamento 
de formas e significados. Falamos 
cotidianamente sobre a linguagem 
como se ela fosse uma substância 
(LAKOFF e JOHNSON, 1980, p. 4-
10), algo da realidade que pode ser 
quebrado em pedaços e consumido 
por uma determinada faculdade 
mental ou cerebral. 
Essa concepção de 
ensino/aprendizagem como 
depósito gradual de substâncias 
numa mente, aliada à visão de 
linguagem como contêiner de 
conteúdos mentais (ideias) e da 
comunicação como transferência 
desses conteúdos através de um 
tubo (canal) entre nossas cabeças 
funda nossa maneira cotidiana de 
falar e teorizar sobre linguagem e 
cognição (REDDY 1979; MAGRO, 
1999). 
Na metade do século XX, com o 
advento das assim chamadas 
Ciências Cognitivas (GARDNER, 
1994), áreas de pesquisa como a 
Linguística Aplicada e as 
Neurociências foram se 
consolidando como campos de 
pesquisa autônomos. 
Nesses campos, a mente 
humana, a Neurobiologia e suas 
inter-relações com a aprendizagem 
e a linguagem passaram a ser 
construídas conceitualmente em 
termos do processamento e 
armazenamento de informações 
computacionais. Essa 
compreensão, aliada a pesquisas 
pautadas na física e no positivismo 
como modelos paradigmáticos do 
fazer científico, edificaram um 
modelo conceitual canônico para o 
ensino e a aprendizagem de línguas 
marcado por: 
 Uma dissociação entre o fazer 
teórico e o fazer prático; 
 
 27 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
 A idealização de falantes, 
padrões linguísticos, aprendizes, 
contextos e modelos de 
aprendizagem; 
 A ênfase no 
ensino/aprendizagem como 
transmissão e processamento de 
informações; 
 A marginalização de variáveis 
emocionais, históricas e políticas; 
 O reducionismo e 
minimalismo explicativo (aragão, 
2003). 
Nessa perspectiva, em 
conformidade com a tradição 
filosófica ocidental, a compreensão 
da cognição e da linguagem se dá 
pelo isolamento da razão, apontada 
como característica distintiva 
fundamental do ser humano. 
As emoções, nessa tradição, 
são tratadas como irrelevantes ou, 
quando reconhecidas, são 
consideradas secundárias e em 
geral perniciosas, com efeitos 
nocivos sobre a razão. Basta ver 
compêndios como os de Ellis 
(1994), Robinson (2001) e 
Lightbown e Spada (1999). 
 É prática comum colocar as 
“variáveis” afetivas como 
secundárias às cognitivas e 
configurá-las de maneira limitada 
como “variáveis do aprendiz”, a 
partir de arquiteturas conceituais 
dicotômicas e estáticas dos 
indivíduos . 
A Biologia do Conhecer, como 
se denomina o conjunto da obra de 
Humberto Maturana sobre o viver, 
orienta de outro modo nossa 
compreensão dos sistemas vivos, 
em geral, e dos seres humanos, 
em particular; dos processos 
neurofisiológicos que dão origem 
aos fenômenos emocionais e 
interacionais humanos; das 
relações entre os seres humanos 
e desses com o seu meio. 
A Biologia do Conhecer é 
um mecanismo explicativo dos 
sistemas vivos, caracterizados 
como sistemas dinâmicos 
operacionalmente fechados a 
instruções do meio, tratados como 
seres em constante transformação 
no viver e em permanente 
acoplamento estrutural com o meio. 
Com efeito, todo o viver é um 
conhecer, e todo o conhecer é um 
viver. 
 
 28 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
A Biologia do Conhecer nos 
permite abordar sistemicamente os 
processos de ensino/aprendizagem 
e, no que nos interessa aqui, o 
ensino/aprendizagem de inglês. A 
adoção desse modelo nos leva a: 
 Compreender cognição e 
linguagem como atividades 
mutuamente imbricadas, realizadas 
por agentes que co-constroem e 
coordenam ações de maneira 
recursiva em domínios consensuais 
operacionais e contextos relacionais, 
os quais envolvem a distinção de 
objetos e relações entre objetos, a 
distinção de si mesmo 
(autoconsciência) e de outras 
pessoas na convivência; 
 Dirigir nosso foco de 
observação para a dinâmica 
operacional histórica, situada e 
relacional de fenômenos distintos 
em reciprocidade, mútua 
constituição, afetação recíproca, 
sem colapsá-las e sobrepô-las; 
 Em conformidade com isso, 
apontar a reciprocidade de dois 
domínios não intersectantes e não 
redutíveis – a fisiologia e o 
comportamento; 
 Entender que é o aluno, e não 
o meio, que especifica em suas 
interações o que pode ser 
ensinado/aprendido/compreendido
: cognição e comunicação não 
dependem “daquilo que se entrega”, 
mas do que ocorre com aquele ou 
aquela que comumente se diz que 
“recebe”; 
 Em consequência, entender 
que a metáfora do computador / dos 
contêineres para a cognição e a 
linguagem perde seu valor 
explicativo corrente; 
 Apontar que os sistemas 
e os efeitos das perturbações 
interacionais são imprevisíveis e 
não têm relação com seu tamanho: 
uma pequena perturbação pode ter 
efeitos extensivos ou não ter o 
menor impacto ; 
 Reconhecer, em 
conformidade com isso, que tanto a 
variabilidade quanto a congruência 
e a estabilidade de padrões 
interacionais são observáveis, 
pertinentes e merecedoras de 
tratamento científico unificado; 
 Privilegiar descrições densas, 
que evidenciam a dinâmica das 
diversas variáveis que constituem o 
domínio sistêmico em operação, 
sobre as fórmulas dissecadas dos 
tratamentos formais. 
 
 
 
 
 29 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
Emoções no Ensino / 
Aprendizagem de Inglês 
Como falar aqui de emoções e 
compreender sua participação 
nesse processo? Maturana (1998, 
p.15-23) propõe compreendermos 
emoção como um fenômeno 
biológico relacional dos seres vivos, 
em especial, dos mamíferos. Do 
ponto de vista da Biologia, o que 
distinguimos como emoções são 
disposições corporais dinâmicas 
que especificam os domínios de 
ação, os tipos de condutas 
relacionais e interacionais possíveis 
num dado momento. Ao mudar de 
emoção, mudamos de domínio de 
ação, num fluir que Maturana 
chama de emocionar. 
Um domínio de ação é um 
domínio de condutas, 
comportamentos, posturas ou 
atitudes corporais que um 
observador distingue com uma 
emoção: é a emoção, e não a razão, 
que define a ação, embora em geral 
não tenhamos dificuldade de 
justificar racionalmente nossas 
ações. Dessa forma, se se deseja 
saber qual a emoção, deve- se olhar 
a ação. Inversamente, se se quer 
saber qual a ação, basta olhar a 
emoção (MATURANA e BLOCK, 
1996, p.114-115). 
No cotidiano sabemos muito 
bem disso: quando estamos numa 
determinadaemoção, há coisas que 
podemos fazer e outras não, assim 
como há argumentos que aceitamos 
e outros não, dependendo da 
emoção. Lidamos cotidianamente 
com domínios nos quais só são 
possíveis certas ações e não outras, 
embora nem sempre nos damos 
conta disso. 
Portanto, a emoção define o 
que acontece na relação com os 
outros ou com nós mesmos, 
constituindo os espaços das 
dinâmicas relacionais em que nos 
movemos. Se olharmos o nosso 
próprio emocionar de maneira 
reflexiva, poderemos atuar 
coerentemente com ele ou mudar de 
domínio de ação, se assim o 
desejarmos e se isso for possível 
dentre o complexo de variáveis 
envolvidas (MATURANA e BLOCK, 
1996, p. 117-118). 
Nesse espaço do saber sobre o 
saber, do dar-se conta de nossas 
ações e emoções, abrimos a 
 
 30 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
possibilidade de uma atitude 
reflexiva responsável e ética, e de 
uma autoconsciência relacional. E 
essa abordagem é radicalmente 
diferente daquela que advoga o 
controle das emoções. 
Sendo assim, o ponto de 
partida de um processo de 
ensino/aprendizagem tem a ver, 
sobretudo, com um convite – e a 
aceitação mútua – para 
participarmos em conjunto de um 
espaço de convivência. 
Tudo depende dessa emoção, 
dessa possibilidade de nos 
movermos juntos de um lado para o 
outro, de estarmos num mundo de 
uma maneira ou de outra 
constituída no fluir de nossos 
encontros. A partir do emocionar é 
possível efetivarmos, numa 
convivência particular recorrente, 
uma transformação mútua que gere 
condutas adequadas, ou aqueles 
comportamentos que um 
observador, um professor, por 
exemplo, distingue como 
apropriado num contexto 
interacional por ele especificado. 
Nessa perspectiva, aprender 
uma língua estrangeira significa, 
sobretudo, estar disposto a conviver 
com outros numa rede de 
conversações, num linguajar 
constituído numa lógica processual, 
numa racionalidade e numa emoção 
distintas, com as quais estamos 
acostumados a conviver no nosso 
cotidiano. O ensino é um guiar, um 
conduzir numa convivência 
particular em que nos 
transformamos de maneira 
constante. 
Isso alude à compreensão da 
aprendizagem de uma língua não 
como a aquisição de uma entidade, 
mas como um espaço operacional 
de distinções recursivas e de 
coordenação de comportamentos, 
configurado consensualmente a 
partir das ações e emoções 
recorrentes que se realizam numa 
sala de aula e se estabilizam ao 
longo de um tempo recorrente de 
interações dessa natureza. 
Portanto, ensino/ 
aprendizagem é um processo de 
transformação no viver coletivo, 
cuja orientação é definida pela 
maneira segundo a qual um 
professor envolve os alunos no 
desenvolvimento de habilidades 
operacionais que compreende como 
necessárias para viver num domínio 
particular de existência – nesse 
caso, o de coordenação de ações 
recursivas e consensuais, ou o 
linguajar na língua especificada. 
Assim, tomo a aprendizagem e 
o ensino não como fenômenos 
 
 31 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
apartados, nem sustentados por 
uma relação causal, mas como 
fenômenos processuais inter- 
relacionados de múltiplas e 
complexas maneiras. Dessa forma, 
o fenômeno de nosso interesse 
envolve um sistema de elementos 
processuais dinâmicos, relacionais, 
interativos e consensuais históricos, 
constituídos por uma ampla gama 
de componentes socioculturais, 
políticos e emocionais. Isso implica 
conceber a sala de aula como um 
espaço relacional multifacetado, um 
contexto co-constituído por alunos 
e professor no fluir de suas 
interações. 
 
São As Histórias que nos Dizem 
Mais: Emoção, Reflexão e 
Experiência Narrativa 
Essa compreensão da dinâmica 
histórica e situada do viver humano, 
no meio com outros, pode ser 
articulada à pesquisa narrativa 
desenvolvida por Jean Clandinin e 
Michael Connelly (2000), e ao 
conceito de descrição densa 
(GEERTZ, 1973), com 
consequências frutuosas. Em 
conformidade com a Biologia do 
Conhecer, a pesquisa narrativa 
argumenta que: 
 A qualidade da experiência 
humana é o foco principal de 
investigação; 
 As vidas humanas são tecidas 
por um processo histórico, situado, 
multifacetado e complexo; 
 O conhecimento é fruto do 
compartilhamento mútuo e 
dialógico com outros num espaço 
particular de convivência; 
 O ato de narrar, que envolve 
o entrelaçamento de emoção e razão 
no linguajar reflexivo, provoca uma 
transformação na maneira como a 
pessoa compreende a si própria e 
aos outros envolvidos em sua 
história; 
 A pessoa advoga por um 
imbricamento entre o narrar, o 
conscientizar e o agir; 
 Em consequência, a 
historicidade narrativa se constitui 
como um agente perturbador de 
atitudes reflexivas, que pode 
produzir um agente consciente, o 
qual se desloca de um círculo 
fechado de ação sem reflexão e passa 
a ser movido de seus desejos e 
escolhas. 
Clandinin e Connelly (2000) 
apontam que nossas identidades 
acadêmicas são construídas por 
histórias pessoais e profissionais e 
 
 32 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
as histórias dos outros constituem 
nosso meio de experiências, de 
modo que o coletivo e o pessoal são 
fios que produzem uma mesma 
imbricada teia. Somos indivíduos 
na coletividade, como sugere a 
Biologia do Conhecer de Maturana. 
Clandinin e Connelly enfatizam que 
vivenciamos os nossos encontros e 
interações cotidianas como 
histórias compostas de narrativas 
diversificadas. Tomando o conceito 
de experiência e continuidade de 
John Dewey, a pesquisa narrativa 
chama a atenção para a relação 
entre as variáveis históricas. Todo 
presente tem um passado e uma 
possibilidade de história futura 
enraizada nesse espaço prévio. Esse 
modo de caracterizar nossa 
experiência projeta importante 
conceituação sobre a construção da 
pesquisa de campo que é, sem 
dúvida, de grande valia para a 
compreensão qualitativa de nossas 
experiências profissionais 
cotidianas. 
Ao narrar histórias, memórias 
e eventos marcantes em sua vida, 
um aluno pode se conscientizar e 
agir coerentemente com seu 
emocionar. Como sugere Telles 
(2004, p. 80-81), no processo de 
recontar seu viver, os alunos 
podem reavaliar histórias antigas e 
partir para outras histórias com as 
quais desejam viver. 
Johnson e Golombeck (2000, 
p.3-5) afirmam, em conformidade 
com Telles e embasados na obra de 
Dewey, que na atividade narrativa 
há um processo de auto- 
conhecimento no qual se pode 
questionar sua própria conduta em 
relação ao seu meio contextual e 
agir em conexão com a 
compreensão de sua experiência e 
desejo. Durante esta atividade o 
aluno passa a ser autor de sua 
própria história, ao compreendê-la 
em sua forma processual e inter-
relacionada a outros eventos 
marcantes (cf. p. ex. TELLES, 
2002). 
O conceito de descrições 
densas, proposto por Geertz (1973), 
busca um tipo de esforço intelectual 
que envolve a observação mais 
completa possível e a interpretação 
cuidadosa de culturas particulares. 
Essa atividade é realizada na 
socialização e na participação 
dialógica do pesquisador no 
conviver com um determinado 
grupo de pessoas. 
Nesse processo de 
investigação, o pesquisador procura 
estabelecer conexões, padrões, 
rupturas e significados das ações no 
emaranhado sistêmico das relações 
experenciais humanas. Isso se dá 
 
 33 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
com a coleta de documentos 
variados de campo, que podem 
apresentar diferentes perspectivas 
dos participantes e do 
pesquisador, processo conhecido 
como triangulação. Com base 
nesses documentos, o pesquisador 
pode estabelecer um 
intercruzamento de dados na 
compreensão multicomponencial 
do processo de transformação na 
convivência.
 
 
 
 35 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
4. ARTICULANDOEMOÇÃO, COGNIÇÃO E REFLEXÃO 
NA SALA DE AULA 
A presente pesquisa, cujos 
resultados preliminares trago à 
reflexão, foi realizada numa sala de 
aula de língua inglesa no curso de 
graduação em Letras de uma 
universidade federal. Selecionei 
para realizá-la uma disciplina na 
qual se dá o primeiro contato dos 
alunos calouros com o 
ensino/aprendizagem de inglês. 
Nessa faculdade, o curso de 
graduação em língua inglesa se 
inicia no nível intermediário. A 
exigência do nível intermediário 
para o início dessa experiência 
para alunos interessados na
habilitação em língua inglesa é 
parte constitutiva do cenário 
emocional da pesquisa. 
O universo da pesquisa 
envolveu dez participantes. O que 
vou expor aqui, no entanto, são 
minhas observações no contato com 
apenas uma aluna, que adotou o 
pseudônimo de Júlia. Em 
conformidade com os marcos 
teóricos adotados, a pesquisa de 
campo consistiu de uma 
diversidade de atividades (cf. p. ex. 
MICCOLI, 1997), nas quais os 
seguintes documentos de campo 
foram produzidos: 
 
 36 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
 Uma narrativa 
autobiográfica escrita; 
 Três transcrições de 
entrevistas semi-estruturadas que 
somadas representam 4 horas; 
 Filmagens de 20 aulas; 
 Notas de campo; 
 Notas realizadas durante 
conversas informais com a 
participante; 
 Uma colagem; 
 Respostas a um questionário 
final; 
 Um diário; 
A narrativa autobiográfica 
escrita pelos participantes versou 
sobre suas histórias de 
aprendizagem de inglês. 
A colagem, um interessante 
instrumento no qual, através de 
desenhos próprios ou imagens 
retiradas de revistas, o participante 
conta sua história, indica como se 
sente, sem as limitações da 
linguagem. Os alunos, em geral, 
narram seu contato com a língua 
inglesa como uma empreitada 
muito difícil, desafiadora, exigente 
e, muitas vezes, assustadora. Júlia 
descreve sua experência no excerto 
abaixo, em sua primeira entrevista: 
R - Você disse também que no 
curso se cobra muito do aluno? 
J - Acho que é a maneira como 
o inglês é colocado na faculdade, é 
como olha, o inglês é difícil, é um 
monstro e ele tem sete cabeças, se 
você não tem no seu currículo uma 
luta de bicho de sete cabeças, você 
não vai passar, entendeu, e sempre 
colocam o inglês assim, como esse 
“big monster” e está todo mundo 
querendo aprender, mas o professor 
está num patamar superior e o 
inglês é uma língua difícil. 
Essa metáfora, “lutar com o 
bicho de sete cabeças”, modula de 
maneira central as condutas 
relacionais de Júlia na faculdade. 
Ela está imersa em lutas com esse 
bicho e pretende vencê-lo a 
qualquer custo. 
Esse desejo, essa disposição 
relacional de querer vencer a luta 
contra o bicho de sete cabeças pode 
explicar, em parte, a perseverança 
de Júlia quanto ao seu aprendizado 
e ao seu sucesso final na disciplina. 
No roteiro para a terceira e 
última etapa do processo de 
reflexão, a colagem, lia-se a seguinte 
orientação: 
 Numa folha, monte uma 
pequena história, um enredo, com 
palavras e imagens que descreva 
esta etapa de seu processo de 
 
 37 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
aprendizagem de inglês na 
faculdade. Pense na sua história 
nesta disciplina e lembre-se de suas 
expectativas, faça uma reflexão. 
Depois dessa atividade, fiz uma 
última entrevista com Júlia para 
esclarecer os sentidos das imagens 
que ela apresentou na colagem. Esta 
história narrada na última 
entrevista e desenhada como uma 
história em quadrinhos resume sua 
trajetória na disciplina: 
J - Então aqui começa a minha 
estória, o que podemos ver de cara é 
que ele (o aluno – personagem da 
história) começa tristonho e 
termina feliz. Ele entra cabisbaixo 
e vai falando “ai que droga de aula 
de inglês” e sai pior ainda, com a 
língua para fora: “puxa vida, achava 
que sabia alguma coisa de inglês, eu 
sou um fracasso”. 
E assim os dias se passaram e o 
aluno se sentia desvalorizado. Aí ele 
acorda cedo na cama dele para ir à 
aula e era um tédio e ele fala: “ai que 
droga, a professora vai ficar 
corrigindo exercícios e pensando 
que está ensinando, e eu fingindo 
que estou aprendendo.” Mas o 
tempo foi passando, mas o tempo só 
não passa como amadurece e o 
aluno foi tomando conhecimento, 
se tornando consciente de que ele é 
capaz e que dá conta, independente
do que os outros digam e (...) 
Aí ele vai saindo da aula de 
inglês, ele passa a se sentir grande e 
confiante, levanta os ombros e 
acredita em si e consegue vencer, 
pena que esta não seja a história de 
todos. Então eu acho assim, que no 
final, hoje estou me sentindo muito 
segura, muito mais segura do que, 
vamos supor, nossa primeira 
entrevista. 
Eu estou me sentindo assim 
nesse semestre, achei que entrei 
para baixo e estou saindo super 
para cima. Eu vi que o meu inglês 
caminhou e eu melhorei meu 
relacionamento com a professora, 
isso também melhorou porque eu 
falei o que quis falar. Teve hora que 
discordei e levantei a voz na sala de 
aula e falei com ela as coisas e 
enfrentei ela. Não tive medo dela e 
isso para mim foi bom e foi bom pra 
eu levantar minha bola, entendeu? 
Dessa pequena história, 
gostaria de destacar: 
 Júlia era aluna repetente; 
 
 38 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
 Júlia iniciou o curso com 
baixa autoestima, constrangida, 
desacreditada, calada e 
decepcionada com a professora, 
consigo mesma e com o curso, mas 
terminou com autoestima, confiante 
em si mesma e com uma boa relação 
com a professora; 
 Júlia conseguiu vencer o 
bicho de sete cabeças, perceber que 
é capaz e que a professora deseja 
ajudá-la, e não fazê-la fracassar; 
 Acredito que o processo 
narrativo-reflexivo ajudou Júlia a 
desenvolver a autoconsciência de 
que precisava para deixar para trás 
algumas experiências 
decepcionantes, confiar em si 
mesma e participar das aulas em pé 
de igualdade com os colegas e com a 
professora. 
Em outras palavras, Júlia 
precisava mudar seu domínio de 
ações. À medida que deixa de se 
preocupar com o que outro está 
pensando a seu respeito, há uma 
mudança radical no que é capaz de 
realizar em sala de aula. Júlia 
trabalha, há pouco mais de um ano, 
numa escola infantil. Acredita que o 
objetivo de ensinar inglês para as 
crianças é semear o amor pelo 
aprendizado da língua inglesa. 
Sobre sua história pessoal e 
condição sócio- econômica, conta,
em sua narrativa autobiográfica 
redigida no início do curso, que: 
J - Venho de família simples, 
que sempre batalhou e estudei 
sempre em escolas públicas, cujo 
ensino não era de muita qualidade. 
Iniciei o meu contato com a língua 
inglesa ouvindo e traduzindo 
músicas da Madona aos 12 anos. 
Sempre pedi a meus pais que me 
matriculassem em um cursinho de 
inglês, mas realmente não tínhamos 
dinheiro e teria que aprender 
sozinha. 
Esse aspecto de sua história 
auxilia a explicar sua tenacidade, 
persistência, determinação e o 
enorme desejo de domar o “bicho de 
sete cabeças”. No início de seu 
diário reflexivo, diz: “É claro que 
não vou desistir. É por isso que 
estou aqui hoje. Vou repetir quantas 
vezes forem necessárias (...) a 
coragem de nunca abandonar a nau 
é para mim o que há de mais 
valioso”. Numa conversa informal 
que tivemos na cantina, perguntei 
como encarava o processo de 
aprendizagem naquele semestre. 
Respondeu que estava subindo uma 
montanha e que tinha que deixar 
alguns pesos para trás. De fato, o 
que Júlia percebeu ao longo do 
semestre, à medida que 
avançávamos em nossas reflexões, 
era que deveria deixar para trás e 
superar as experiências negativas 
 
 39 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
que funcionavam como um 
bloqueio, limitando o seu 
desenvolvimento, sobretudo sua 
fluência oral. Além disso, precisava 
superar um pensamento 
depreciativo associadoa um 
sistemático discurso negativo de 
fracasso e reprovação de si mesma. 
Júlia veio estudar Letras com o 
desejo de se tornar professora de 
inglês. Como sua situação 
socioeconômica a impedia de 
frequentar um curso de inglês, tinha 
que aprender sozinha, conforme 
relata: 
J - Não tinha como praticar a 
língua, pois no colégio as aulas eram 
ministradas em português. Comecei 
a escrever pequenas frases em 
inglês nas cartas que escrevia a um 
amigo que sempre teve um bom 
nível na língua. Como era iniciante, 
errava muito. Ele, como era 
adolescente, também me 
ridicularizava na frente de todos os 
nossos amigos, ao invés de me 
corrigir à parte. O que poderia ter 
sido a alavanca para o crescimento 
tornou-se a areia movediça que me 
fez sentir inferior a todos. Sentia-
me incapaz de conseguir aprender 
uma segunda língua. Cresci com 
este sentimento de inferioridade, 
até chegar na faculdade. 
A interação com o colega 
marcou Júlia de uma forma
profunda e, posso dizer, é um dos 
marcos históricos cuja identificação 
Clandinin e Connelly (2000) 
consideram importante. De alguma 
maneira, esse sentimento de 
inferioridade, a autoavaliação 
negativa e a baixa autoestima 
acompanharam Júlia durante quase 
todo o seu processo de 
aprendizagem até então. O medo, o 
constrangimento e a insegurança 
que relata em suas narrativas 
limitavam seu campo de ação na 
sala de aula. Em nossas conversas e 
entrevistas, sempre procurava 
refletir sobre essas emoções. 
Sentava na frente junto a 
alguns colegas também repetentes, 
mas não participava das atividades 
propostas pela professora. Eu sentia 
que ela estava sempre em algum 
outro lugar. Para ela, falar inglês na 
sala é como “pisar em ovos” ou 
como “se o ar tivesse facas”. Essas 
metáforas nos auxiliam a 
compreender a dinâmica relacional 
de medo, cautela e desconfiança que 
levavam Júlia a participar pouco 
das atividades que envolviam o 
 
 40 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
uso de inglês em sala de aula. 
Numa conversa informal que 
tivemos no final de uma aula, 
procurei abordar a questão de sua 
participação nas tarefas da sala de 
aula. No primeiro mês, observei que 
não perguntava, não interagia com 
outros na turma. Indaguei-a sobre 
essa situação recorrente e esta foi 
sua resposta: “quando converso 
inglês sinto que o outro está sempre 
me corrigindo, é como se o ar tivesse 
facas, estou sempre pisando em 
ovos, parece que estão me julgando, 
avaliando, criticando.” 
Essa sensação de estar 
permanentemente exposto e 
julgado (cf. p. ex. MICCOLI, 1997) é 
um traço recorrente não só de Júlia, 
mas também dos outros 
participantes da pesquisa. Todos, 
com exceção de uma participante, 
relatam desse modo seu extremo 
desconforto ao falar inglês em 
público. Em linhas gerais, há um 
sentimento de bloqueio limitador 
da ação, de extrema preocupação 
consigo mesmo e com a opinião 
alheia, acompanhado de um 
sentimento de observação julgadora 
contínua de que os demais 
presentes podem estar criticando 
sua conduta. Acompanha esse 
desconforto o medo de errar, medo 
de fazer perguntas, medo do que o 
outro pode estar pensando sobre 
você, o constrangimento, a 
vergonha e o retraimento 
interacional. 
À medida que construía sua 
autoconfiança, a sensação de pisar 
em ovos foi se dissipando. Porém, 
até a última entrevista e nas últimas 
aulas, percebia que Júlia ainda 
oscilava em sua insegurança. 
Entretanto, depois da nossa 
segunda entrevista, observei uma 
mudança significativa. Na 
entrevista decidi enfatizar a sua 
preocupação com a opinião e a 
avaliação dos outros, esse 
sentimento de pisar em ovos na sala 
e a sensação de facas no ar. Num 
determinado momento, introduzi 
esse tema em nossa reflexão, ao 
qual retornei sistematicamente: 
 R - Você faz perguntas, né? J 
- Faço. 
 R - O que te leva a fazer uma 
pergunta? J - Do que surgir na hora. 
 R - E você tem algum medo e 
receio de fazer pergunta? 
 J - Agora não (risos), porque 
agora acho que eu escrachei...(risos) 
R - (risos) Por que agora não, Júlia? 
 J - Estou mais segura, 
Rodrigo, graças a Deus, estou mais 
segura nesse curso. Acho que estou 
melhorando no inglês. Eu acho que 
tenho capacidade (...) 
 
 41 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
Procurei enfatizar essa questão 
na tentativa de torná-la mais 
consciente. No trecho seguinte, 
pergunto como está “o alpinista” na 
aprendizagem de inglês, com o 
intuito de fazê-la perceber que 
poderia superar suas dificuldades e 
a sensação de desconforto: 
 R - Qual que é o problema do 
inglês, Júlia? 
 J - Acho que o problema do 
inglês, no semestre passado 
principalmente, foi esse, foi um 
pouco do medo, desse medo de me 
achar incapaz, o medo de não dar 
conta, né? 
 R - E como está o alpinista, 
Júlia? 
 J - (risos) Acho que ele está 
subindo legal, Rodrigo, acho que ele 
está usando as ferramentas que 
devia, acho que ele está subindo com 
mais confiança. 
 R - Qual é a origem desse 
medo, Júlia? 
 J - É a crítica, o medo da 
crítica para mim, a Nati (uma colega 
de sala), por exemplo, não tem esse 
medo. 
 R - Medo do olho do outro? 
 J - É... por que que tenho esse
medo do olho? 
 R - Você tem alguma 
sugestão para superar isso? 
 J - Yoga (risos). Estou 
brincando, não sei, mas alguma 
coisa desse tipo. R - De criar 
autoconfiança? 
 J - De trabalhar isso com 
você, com o seu pessoal. 
 R - Então se você se 
preocupar menos com o olho dele, 
com os seus erros... J - Mas eu 
preocupo demais, sabe, para falar 
esse pouquinho de inglês, algumas 
frases. Aí já vi que na minha cabeça 
aqui fervendo, será que estou 
falando isso certo? Será que o 
Rodrigo está corrigindo minha 
pronúncia? Será que eu tenho algum 
erro? 
 R - Está passando da hora, 
vamos para a aula? J - Vamos, está 
na hora. 
Júlia foi para a sala, enquanto 
desci até a cantina. Quando voltei, 
Júlia estava sentada junto com os 
colegas que mais participavam 
oralmente da aula. Acompanhei 
quem detinha o turno durante 
uma atividade de resolução de 
problemas. Nessa atividade, havia 
um crime a ser solucionado e, a 
partir dos hóspedes da casa, os 
alunos tinham que provar quem era 
 
 42 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
o culpado. Júlia manteve o turno 
por trechos longos e entrou num 
embate conversacional com a 
aluna-participante Nati, a colega 
que Júlia achava ser superior a ela. 
Num determinado momento, a 
conversa começou a circular de 
maneira aberta na sala, de forma 
que poucas pessoas tomavam o 
turno conversacional. Mas nesse dia 
Júlia falou muito mais do que de 
costume. Alguma mudança radical 
ocorreu no que Júlia podia fazer na 
sala. Sua emoção, seu domínio de 
ação, sua atitude naquele meio 
relacional haviam se transformado. 
Era como se, durante aquela aula, 
tivesse deixado o espaço de sala de 
aula no qual pisava em ovos e 
driblava as facas que estavam no ar. 
Sua emoção ou, para 
relembrarmos o modo como estou 
aqui definindo esse fenômeno, sua 
disposição corporal para ação havia 
mudado, assim como mudou o seu 
ambiente interacional. Foi como se 
uma outra dinâmica tivesse entrado 
em cena. Observei que essa 
mudança se estendeu às aulas 
seguintes. Júlia descreveu em sua 
colagem e na entrevista final que 
falar inglês com fluência seria como 
“vestir a capa de um rei”. 
Naquele dia, Júlia colocou sua 
coroa de rainha. Falou com fluência
e desenvoltura durante toda a aula. 
Fiquei atônito. Selecionei o trecho 
final de nossa última entrevista, 
quando procurei explorar os efeitos 
de nossa concatenação de reflexões 
acerca de sua experiência na 
aprendizagem de inglês, para 
reproduzi-lo aqui, na íntegra: 
 R - Como avalia que esse 
processo de reflexão pode estar 
auxiliando nessa consciência de que 
você já sabealguns caminhos a 
percorrer? 
 J - Eu acho que a sua 
presença na sala me dava segurança. 
Eu pensava assim: tem um 
doutorando na sala e esse trabalho 
que a gente fez, me fez pensar, me 
fez refletir mesmo sobre a minha 
capacidade, sobre a minha falta de 
confiança em mim mesma. Vi que 
não é por aí, que eu sei que alguma 
coisa eu sei, tanto que estou aqui. 
Minhas notas nesse semestre foram 
boas, mas ainda tem muito para 
aprender, mas estou muito mais 
confiante. Fui vendo que o professor 
da faculdade não é o rei e talvez eu 
também não vou ser nenhuma 
rainha para ninguém. Vai ver que 
vou ser essa rainha para mim, mas 
eu posso não ser para as outras 
pessoas que vão chegar e vão me 
contestar. Espera aí, não é assim que 
pronuncia, não é assim que se fala. 
Não, isso está errado! Mas eu vi que 
 
 43 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
posso contestar também, não 
preciso me sentir inferior e nem me 
curvar para a professora de inglês da 
faculdade. Eu vi isso esse semestre 
na faculdade. Esse processo que a 
gente fez de reflexão nesse semestre 
me fez ver isso, que posso refletir e 
que posso discutir, que posso 
argumentar e me fez crescer. Isso 
me fez crescer muito. Hoje estou me 
sentindo bem melhor com relação 
ao inglês, bem segura de mim 
mesmo. 
 R - É, acho que assisti isso, 
Júlia, aí, depois da segunda 
entrevista. 
 J - Me sinto muito mais 
segura, o pisar em ovos pode até 
continuar, mas agora eu sei onde é 
que estou pisando, sabe, sei onde 
estão os ovos. 
 R - É, e acho que mudou. Eu 
sinto que isso mudou na 
documentação filmada e observei na 
sala, eu vejo que mudou, talvez, 
como você mesma falou, tenham 
outras coisas também. Sua vida 
pessoal está melhor, né? 
 J - É, pode isso ser também 
(risos). R - Né (risos). 
 J - A segurança vem das 
coisas que você me fala, o fato de 
você falar essas coisas pra mim, me 
fez caminhar melhor, que eu podia 
dar conta, só que não conseguia 
enxergar isso, que se eu posso fazer 
isso assim é assumir a capa do rei e 
aí tenho de prestar contas da minha 
realeza. Se diz que é rei, cadê? A 
responsabilidade fica maior, sabe? 
 
Reflexões Finais 
Júlia mudou. Eu mudei. Júlia 
vive hoje um outro domínio de ação, 
uma outra emoção, diferente 
daquela na qual estava no início de 
nossa conversação. Acredito que 
hoje vivemos uma outra maneira de 
nos colocarmos na relação com os 
outros. 
Nesse conversar, nesse dar 
voltas em conjunto, entrelaçando o 
emocionar com o conversar 
(MATURANA, 1998, p.34), 
concatenando reflexões de 
autoconsciência em conjunto, nos 
transformamos sempre de uma 
maneira inevitável, embora nem 
sempre perceptível. Maturana e 
Block (1996) apontam que a 
reflexão é um ato de emoção no 
desapego, no qual se sai de uma 
certeza, de uma condição que nos 
cega e abre-se a mão para ver o que 
antes não víamos. O saber e a 
certeza negam a reflexão, pois não 
se reflete sobre o que se tem como 
certo. Na reflexão admitimos que 
não agimos mais numa certeza, e aí 
há um deslocamento. 
 
 44 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
Quando refletimos, vivemos 
uma mudança na corporalidade e 
uma mudança na conduta, e aí 
podemos fazer coisas que antes não 
podíamos. A história de vida de 
Júlia e nossas conversações haviam 
modulado uma nova conduta, assim 
como as próprias emoções vividas 
na sala modificaram sua vida 
pessoal e acadêmica, numa dialogia 
constante. Nosso conversar, nosso 
recontar participaram desta dança 
emocional e racional, especificando 
e modulando domínios possíveis 
nas concatenações de reflexões que 
desenvolvemos em conjunto. 
Podemos promover espaços de 
reflexão em conjunto de várias 
formas. O primeiro passo é 
conhecer um pouco das trajetórias 
de aprendizagem entre alunos e 
professor. Isso pode ser iniciado 
através da escrita de uma narrativa 
autobiográfica sobre a história 
pessoal e escolar do aluno e do 
professor. O objetivo central é 
relatar as experiências prévias com 
a língua inglesa, os prazeres e 
desprazeres na aprendizagem da 
língua, assim como descrever 
crenças e estratégias de 
aprendizagem. Os alunos e o 
professor podem compartilhar suas 
histórias, em pares ou em pequenos 
grupos. 
Pode ser feita também uma
colagem descritiva, usando 
desenhos ou figuras que encorajem 
a reflexão sobre questões como o 
sentimento predominante nas 
aulas, a sensação de falar inglês na 
sala, como é ou como poderia ser a 
sensação de falar inglês com 
fluência, as estratégias utilizadas 
para otimizar a aprendizagem, e, se 
se pretende ser professor, que 
imagem pode simbolizar esse papel. 
A colagem pode ser um artifício 
produtivo para quem tem 
dificuldade de discorrer 
verbalmente sobre seus 
sentimentos e emoções. Realizada 
essa atividade, o professor pode 
entrevistar os alunos para explorar 
pontos da colagem e da narrativa. 
O professor pode ainda 
organizar entrevistas entre os 
alunos, levando-os a ler as 
narrativas dos colegas e a montar 
um questionário para aprofundar a 
reflexão. Pode-se manter também 
um diário que relate as emoções 
vividas na sala ou uma troca de 
cartas entre os alunos e o professor. 
É necessário orientá-los para o foco 
 
 45 
INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
reflexivo de sua escrita, para que 
não fiquem apenas no nível 
descritivo. Conversas em pares ou 
em grupo sobre emoções envolvidas 
na aprendizagem também podem 
ser fomentadas. Os alunos podem 
gravar as apresentações orais uns 
dos outros, ou situações de 
interação oral, e depois refletir 
sobre as mesmas em sessões de 
auto-observação reflexiva com o 
professor ou aluno com aluno. De 
fato, não há uma receita geral. 
Antes de entrar na sala como 
pesquisador e escutar as histórias e 
experiências de Júlia (e dos outros 
participantes), não esperava que as 
ações de nossos alunos pudessem 
ser balizadas de tal maneira por 
nossas emoções, nossa auto-
observação/consciência e nossas 
histórias de vida. Foi marcante 
compreender que falar inglês na 
sala de aula envolve uma gama de 
variáveis muito maior que a 
combinação de gramática e 
vocabulário na interação 
comunicativa. 
Comunicar em inglês na sala 
envolve questões como as histórias 
de interações prévias do aluno com 
a língua e todo o seu entorno de 
significados pessoais, emocionais, 
identitários, de atribuição de poder 
na sala, e as várias faces do medo, 
como medo do próprio julgamento
e dos outros ali presentes, 
constrangimento relacional, 
vergonha, autoestima, confiança e 
insegurança, ansiedade, 
preocupação e culpa. 
Atualmente, compreendo de 
maneira sistêmica que quanto 
maior a empatia entre professor e 
aluno melhores são os resultados. 
Há uma distância entre o mundo 
do aluno e o do professor na sala de 
aula. 
Esses mundos envolvem 
distintas crenças que podem gerar 
conflitos pela falta de um co-
emocionar mais harmônico e 
congruente. No entanto, uma 
maneira de encurtarmos as 
distâncias é participarmos do 
mundo deles, de suas conversações, 
de suas histórias, e convidá-los a 
participarem das nossas. 
Precisamos dar vozes a todos 
na sala de aula, pois é conversando 
que podemos nos entender melhor, 
por conhecermos as semelhanças e 
diferenças entre nossas histórias e 
emocionares. Como apontei, temos 
a nossa disposição diversas 
maneiras de fomentar essa atitude 
reflexiva na sala: uso de diários, 
narrativas, autobiografias, 
discussões em grupo, leituras 
coletivas de narrativas, filmagem e 
auto-observação de cenas de sala de 
aula em que estamos expostos, 
 
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INGLÊS NA SALA DE AULA 
 
colagens, entre outras. Basta 
estarmos dispostos a entrar nesse 
emaranhado inter-relacional 
sistêmico e também admitir, como a 
própria Júlia apontou no 
questionário final, que “A reflexão é 
para todos, mas nem todos são para 
a reflexão”. Claro,