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Medicina | Larissa Marzagão Ferreira Delírio: crenças fixas e inflexíveis às evidências conflitantes ou contrárias. Podem ser: → Persecutório: crença de estar sendo prejudicado, assediado, perseguido. → Referência: crença de que comentários, gestos e estímulos ambientais são direcionados à própria pessoa. → Grandeza: crença de ser muito famoso, rico ou ter alguma habilidade especial. → Erotomaníacos: a pessoa crê que alguém, geralmente uma pessoa famosa ou importante, está apaixonado por ela. → Niilistas: crença de que acontecerá alguma tragédia. → Somáticos: crença de que órgãos estão se fragmentando ou que não possui cérebro, por exemplo. → Conteúdo bizarro: são aqueles impossíveis de serem reais por se expressarem como a crença de perda de controle sobre seu corpo e sua mente. Pode ser: retirada de pensamento, inserção de pensamento ou delírios de controle (suas ações estariam sendo manipuladas por terceiros). Alucinações: são alterações na sensopercepção. São vívidas, claras e involuntárias. Exemplos: alucinações visuais (ver o que não está lá) e auditivas (ouvir o que não está lá). Desorganização do pensamento/discurso (transtorno do pensamento formal): percebida pelo discurso do indivíduo. Este muda de um tópico para outro tópico constantemente (organização frouxa de ideias ou afrouxamento das associações) e as respostas a perguntas podem ter uma relação oblíqua ou simplesmente não ter relação alguma (tangencialidade). Comportamento motor grosseiramente desorganizado ou anormal: desde comportamento “tolo e pueril” até a agitação imprevisível. → Comportamento catatônico: redução acentuada da reatividade ao ambiente; ausência total de respostas verbais e motoras (mutismo e estupor); atividade motora excessiva sem propósito ou causa óbvia (excitação catacônica). Não é patognomônico da esquizofrenia. → Sintomas negativos: caracterizados pela expressão emocional diminuída (redução de expressões faciais, da prosódia e da linguagem corporal), avolia, alogia, anedonia e falta de sociabilidade. A avolia é a redução nas atividades autoiniciadas, motivadas e com uma finalidade. A alogia, por sua vez, é a redução do discurso; a anedonia, a redução no prazer de estímulos positivos e, por fim, a falta de sociabilidade se expressa pela redução nas interações sociais. Caracteriza-se por distorções fundamentais e características do pensamento e da percepção, bem como afeto inadequado ou embotado. A esquizofrenia afeta 1% da população mundial e é uma das dez doenças que mais incapacitam os indivíduos afetados. Convém ressaltar que o diagnóstico de delírio deve ser ponderado à luz do contexto sociocultural e religioso do indivíduo. Em algumas religiões, por exemplo, admite-se que é possível que um espírito assuma o corpo de alguém, e isso deve ser levado em consideração pelo clínico. Logo, deve-se ter a crítica sobre o contexto social do paciente. Medicina | Larissa Marzagão Ferreira Atinge mulheres e homens em taxas similares, no entanto, a doença tem início mais precoce em homens – dos 20 aos 25 anos – e mais tarde em mulheres – dos 25 aos 30 anos, aproximadamente. A taxa de suicídio é 10 vezes maior do que na população em geral e mais frequente no sexo masculino. Acredita-se que algumas pessoas herdam apenas uma vulnerabilidade genética e, ao serem submetidas a um fator de risco ambiental, podem desenvolver a doença. → Alguns fatores de risco ambientais já foram consistentemente associados à esquizofrenia: complicações obstétricas, infecção pré-natal, desnutrição materna e hipoxia no parto, consumo de Cannabis, migração, nascimento em áreas urbanas mais densas populacionalmente e idade paterna acima dos 40 anos ao nascimento. Geralmente, inicia-se na adolescência ou nos primeiros anos da idade adulta. Pode ser precedido por um período prodrômico, no qual há alterações súbitas no comportamento (isolamento social, crenças esquisitas e anormalidades) e declínio funcional. A consciência clara e a capacidade intelectual estão preservadas, mas os déficits cognitivos podem surgir como consequência do curso da doença. O paciente pode ver a si próprio como o pivô de todos os acontecimentos. → Aspectos insignificantes da vida comum podem parecer extremamente importantes, fazendo com que situações cotidianas adquiram significados especiais e pareçam destinados especificamente para o indivíduo. São frequentes as perturbações sensoperceptivas, particularmente a auditiva (paciente ouve vozes que comentam sobre seu comportamento ou dão ordens). Pode haver ilusões em que cores e sons parecem vívidos ou alterados. O quadro clínico pode precipitar de forma aguda inicialmente, como uma psicose, mas mais frequentemente assume um curso insidioso e crônico, com deterioração progressiva da funcionalidade do paciente Subtipos: Paranoide: predominam delírios e alucinações, principalmente auditivas. Afeto menos embotado e com menor incongruência. Alterações de humor são comuns, como irritabilidade, raiva, receio, suspeita. Sintomas negativos não predominam. Hebefrênica ou desorganizada: mudanças afetivas, delírios e alucinações fugazes (não predominantes), maneirismo (gestos extravagantes, prolixo ou afetados). Sintomas negativos que evoluem rapidamente. Pensamento e discurso desorganizados e incoerentes. Comportamento irresponsável, imprevisível, apragmático, com tendência a solidão. Início mais precoce (entre 15 e 25 anos). Catatônica: há proeminência de perturbações psicomotoras, que podem variar de hipercinesia e estupor ou obedicência automática e negativismo. Posturas forçadas podem ser mantidas por longo período de tempo, com rigidez generalizada, e episódios de ação violenta podem ser notáveis. Indiferenciada: não se enquadra em nenhum subtipo, apresentando características mistas dos outros subtipos. Residual: fase “tardia” da esquizofrenia, que ocorre após um período da doença (compreendendo um ou mais episódios psicóticos com critérios para esquizofrenia). Predominam sintomas negativos. . Medicina | Larissa Marzagão Ferreira Medicina | Larissa Marzagão Ferreira O objetivo inicial do tratamento farmacológico é o controle dos sintomas psicóticos. → De preferência, tratar ambulatorialmente ou em casa para diminuir o trauma para o paciente e ansiedade nele e em seus familiares. → Nos casos em que sejam avaliados, principalmente, o risco de suicídio, o alto do grau de agitação e a agressividade do paciente ou a não compreensão acerca da sua condição, a internação pode ser necessária. Se indicada, a internação deve ser a mais curta possível. Fase aguda: Tratamento do episódio psicótico aguda que dura de algumas semanas a poucos meses. O objetivo é a remissão dos sintomas e o manejo de situações de risco para o paciente. Feito o diagnóstico, deve-se introduzir um antipsicótico. Pode ser típico ou atípico, tendo esse último menor propensão a causar sintomas extrapiramidais, porém tem custo mais elevado. Embora os efeitos antipsicóticos já possam ser observados em poucos dias, em alguns casos, preconiza-se um período de 4 a 6 semanas para decidir sobre a resposta ao tratamento. Os anticolinérgicos (biperideno entre 2 e 6 mg/dia) podem ser prescritos caso surjam sintomas extrapiramidais, cuja presença costuma indicar maior sensibilidade ao medicamento e/ou que a dose do AP pode estar excessiva. → Assim, com o controle do quadro psicótico, a dose do AP deve ser reduzida, até a mínima dose eficaz, e o anticolinérgico retirado. Agitação psicomotora: Diante de um paciente agressivo com doença aguda, o médico e a equipe clínica devem fornecer estrutura, reduzir a estimulação e tentar tranquilizar verbalmente e acalmar a pessoa, minimizando a situação o quantoantes. Se possível, a administração oral de medicamentos é preferível à administração parenteral. A menor dose eficaz deve ser administrada, sendo, caso necessário, gradativamente aumentada. O controle emergencial pode incluir sedação e, como última opção, reclusão e isolamento. Há evidências a favor da combinação de benzodiazepínicos e AP típico (p. ex., lorazepam 4 mg e haldol 5 mg) como estratégia para tais Medicina | Larissa Marzagão Ferreira situações, porém, em virtude da melhor tolerabilidade, um agente neuroléptico atípico (como a olanzapina) pode ser utilizado, quando possível. → Essas medidas complementares são necessárias para aliviar o sofrimento, a insônia e os distúrbios comportamentais secundários à psicose. Fase de manutenção: Feita após remissão dos sintomas psicóticos e controle dos sintomas positivos. O objetivo nessa fase é manter a remissão dos sintomas, melhorar a qualidade de vida, promover a reabilitação funcional, o monitoramento e o manejo dos efeitos colaterais das medicações. É importante reforçar com o paciente a necessidade de manter a adesão ao tratamento. A monoterapia antipsicótica deve ser preferida. Em relação à dosagem da medicação, recomenda-se usar a dose mínima eficaz, ou seja, a menor dose que mantenha os sintomas em remissão. Manejo de efeitos colaterais: É necessário que seja realizada uma investigação ativa de efeitos colaterais para que, se presentes, eles possam ser manejados. A ocorrência de efeitos colaterais está relacionada com pior qualidade de vida dos pacientes e, consequentemente, pior adesão e maiores dificuldades para superação da doença. Sintomas extrapiramidais: Os SEP constituem complicações neurológicas decorrentes do uso de AP e englobam manifestações agudas, como a distonia aguda, o parkinsonismo e a acatisia, e tardias, que ocorrem após o uso crônico de AP, como a discinesia tardia. Distonia aguda: contrações ou espasmos musculares dolorosos localizados ou no corpo todo. Tratamento imediato com o uso de agentes anticolinérgicos, preferencialmente via intramuscular [(biperideno 5 mg, 1 ampola intra- muscular (IM)]. Acatisia: sensação subjetiva de inquietação interna, que impele o paciente a mexer-se constantemente para alívio desses sintomas. Para seu manejo agudo, podem ser utilizados: betabloqueador (propranolol de 40 a 120 mg/dia), benzodiazepínicos (clonazepam 2 a 6 mg/dia ou lorazepam 1 a 3 mg/dia) ou anticolinérgico (biperideno 2 a 8 mg/dia) associado ou não às medicações anteriores. Parkinsonismo: tríade clássica: tremor, bradicinesia e rigidez muscular (pode levar ao aparecimento do sinal da “roda denteada”). O tratamento desses sintomas pode ser realizado com anticolinérgico (biperideno 2 mg a cada 8 h), pelo mínimo tempo possível. Discinesia tardia: movimentos estereotipados, involuntários e repetitivos que ocorrem principalmente na musculatura orofacial. Piora com a ansiedade e melhora com o sono. A maioria dos tratamentos para discinesia tem se mostrado sem efeito significativo em ensaios clínicos. A troca do AP por clozapina ou outros AP atípicos, como a quetiapina, pode ser tentada Quando houver SEP, pode-se considerar reduzir a dose do AP ou trocá-lo, porém avaliando bem e de forma individualizada devido aos riscos de recaída. O uso dos APS ainda pode causar síndrome neuroléptica maligna, síndrome metabólico, disfunção sexual e hiperprolactinemia. → Quando presentes, devem ser avaliadas e tratadas, considerando reajuste de dose do AP em uso ou sua troca, caso seja possível. Esquizofrenia refratária: Resposta terapêutica insuficiente (menos de 40% de melhora) após emprego de pelo menos dois AP, sendo um deles atípico, nas doses recomendadas por pelo menos 4 a 6 semanas. A adesão deve ser verificada. Medicina | Larissa Marzagão Ferreira A clozapina é o AP indicado para os casos refratários. Não é indicada como primeira opção de tratamento pelo risco de efeitos colaterais graves, como agranulocitose e convulsões. → Fazer controle com hemograma nas primeiras 18 semanas de tratamento e, após, mensalmente. A clozapina se mostrou associada a uma redução consistente nas taxas de suicídio e de comportamento suicida persistente. Em caso de não resposta à clozapina, recomenda-se associação com outro AP ou eletroconvulsoterapia (ECT). Antipsicóticos injetáveis de longa duração: Uma parcela significativa dos pacientes costuma não aderir ao tratamento, mesmo após várias recaídas. Nesses casos, recomenda-se a manutenção com AP injetáveis de longa ação (AILA), os quais são um instrumento valioso para o manejo da não adesão. Como sua aplicação é realizada pelos profissionais de saúde, torna-se mais fácil identificar falhas quando estas ocorrem, possibilitando uma intervenção mais precoce nos casos de uma nova crise. Tratamento não farmacológico: A modalidade da abordagem psicossocial deve ser escolhida de acordo com a evolução do quadro e das possibilidades do paciente, sendo focadas principalmente ao aconselhamento e à psicoterapia de apoio, às abordagens psicoeducacionais e às intervenções familiares. A terapia cognitivo-comportamental tem sido usada para melhorar distorções cognitivas, reduzir a distraibilidade e corrigir erros de julgamento, e, segundo alguns estudos, tem-se mostrado eficaz no controle da sintomatologia positiva residual.