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Arboviroses: Transmissão e Manifestações Clínicas

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Stephanie Liberatori
Arboviroses
· São assim designados pelo fato de parte de seu ciclo de replicação ocorrer nos insetos, podendo ser transmitidos aos seres humanos e outros animais pela picada de artrópodes hematófagos.
· Os arbovírus que causam doenças em humanos e outros animais de sangue quente são membros de cinco famílias virais: Bunyaviridae, Togaviridae, Flaviviridae, Reoviridae e Rhabdoviridae..
· Estima-se que haja mais de 545 espécies de arbovírus, dentre as quais, mais de 150 relacionadas com doenças em seres humanos, sendo a maioria zoonótica. São mantidos em ciclo de transmissão entre artrópodes (vetores) e reservatórios vertebrados como principais hospedeiros amplificadores.
· As arboviroses têm se tornado importantes e constantes ameaças em regiões tropicais devido às rápidas mudanças climáticas, desmatamentos, migração populacional, ocupação desordenada de áreas urbanas, precariedade das condições sanitárias que favorecem a amplificação e transmissão viral.
· São transmitidas pelo sangue de pacientes virêmicos, por insetos hematófagos, o que não deixa de ser uma preocupação na doação de sangue em áreas endêmicas.
· As manifestações clínicas das arboviroses em seres humanos podem variar desde doença febril (DF) indiferenciada, moderada ou grave, erupções cutâneas e artralgia (AR), a síndrome neurológica (SN) e síndrome hemorrágica (SH).
· A DF geralmente se apresenta com sintomas de gripe, como febre, cefaleia, dor retro-orbital e mialgia.
· A SN pode manifestar-se como mielite, meningite e/ou encefalite, com mudanças de comportamento, paralisia, paresia, convulsões e problemas de coordenação.
· A AR manifesta-se como exantema ou rash maculopapular, poliartralgia e poliartrite, enquanto que a SH é evidenciada pelas petéquias, hemorragia e choque combinado com uma redução intensa de plaquetas.
Principais arboviroses
DENGUE
· A dengue é uma arbovirose cujo agente etiológico é transmitido por mosquitos do gênero Aedes, especialmente pelo Aedes aegypti.
· A cada ano, estima-se que ocorram cerca de 50 milhões de novas infecções pelos vírus dengue, e dois bilhões e meio de pessoas vivam sob risco de contrair a infecção.
· Agente etiológico: os vírus da dengue (DENV) pertencem à família Flaviviridae e ao gênero Flavivirus,
· É representado por quatro sorotipos, a saber, DENV-1 a DENV-4 e sua transmissão é feita pelo mosquito Aedes aegypti.
· O DENV-2 é o sorotipo mais relevante no mundo, seguido pelo DENV-3, DENV-1 e DENV-414,18. Os sorotipos 1 e 3 foram importados no Brasil, respectivamente, em 1986, 1990 e 2000. O DENV-3 foi predominante na maioria dos estados brasileiros de 2002 a 2006, e, de 2007 a 2009, esta posição foi assumida pelo DENV-2. Depois de uma circulação discreta em 2009, o DENV-1 reemergiu na Região Sudeste, sendo detectado em 50,4% dos pacientes, seguido de 30,5% de DENV-2 e 19,1% de DENV-319,20. O DENV-4 teve uma circulação breve no Brasil em 1982, na região noroeste da Amazônia, em uma epidemia focal, e, em 2010, este sorotipo ressurgiu no Estado de Roraima, sendo, posteriormente, disseminado a diversas regiões do País21. Até o mês de maio de 2014, foram confirmados 483.516 casos da doença, sendo 226 de intensidade grave e 3.026 casos com sinais de alarme, resultando em 119 óbitos, com a prevalência do DENV-1, seguidos pelo DENV-4 e DENV-2.
· Os DENV são os flavivírus mais importantes no Brasil, provavelmente existindo no País desde muitos anos. Há referência de um possível surto da doença causando febre, mialgia e artralgia em 1846, no Estado do Rio de Janeiro. Provavelmente, outros surtos ocorreram no nordeste, sudeste e sul do Brasil no século XIX. Também ocorreram surtos em Curitiba, Estado do Paraná e em localidades do Estado do Rio Grande do Sul, em 1917. Outro grande surto ocorreu no Rio de Janeiro e nas cidades 
· vizinhas, em 1922 e 19236. O DENV foi reintroduzido no Brasil no início da década de 1980 e, desde então, importantes surtos de DENV-1, DENV-2 e DENV-3 têm ocorrido.
Chikungunya
· A infecção pelo vírus chikungunya (CHIKV) é uma arbovirose transmitida por mosquitos do gênero Aedes. Embora o vírus não seja um novo patógeno entre os que circulam em áreas tropicais, até recentemente ele não era conhecido da maioria das pessoas em todo o mundo, incluindo médicos.
· Agente etiológico: o CHIKV é um arbovírus pertencente ao gênero Alphavirus da família Togaviridae. As partículas virais possuem envelope lipoproteico contendo espículas de glicoproteínas virais, capsídeo de simetria icosaédrica e medem cerca de 60 a 70 nm de diâmetro.
· Vetores: transmissão se dá através da picada de fêmeas dos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus infectadas pelo CHIKV. Casos de transmissão vertical podem ocorrer quase que exclusivamente no intraparto de gestantes virêmicos e, muitas vezes, provoca infecção neonatal grave. Pode ocorrer transmissão por via transfusional, todavia é rara se os protocolos forem observados.
· Os sinais e sintomas são clinicamente parecidos aos da dengue – febre de início agudo, dores articulares e musculares, cefaleia, náusea, fadiga e exantema. A principal manifestação clínica que a difere são as fortes dores nas articulações, que muitas vezes podem estar acompanhadas de edema. Após a fase inicial a doença pode evoluir em duas etapas subsequentes: fase subaguda e crônica. A chikungunya tem caráter epidêmico com elevada taxa de morbidade associada à artralgia persistente, tendo como consequência a redução da produtividade e da qualidade de vida.
· Fatores de risco: fatores de risco individuais, tais como idades extremas (neonatos e idosos) e presença de comorbidades podem determinar a gravidade da doença.
· Para doença crônica: idade superior a 45 anos, sexo feminino, doença reumatológica pré-existente, evolução na fase aguda.
ZIKA
· Agente etiológico: o vírus zika é um arbovírus do gênero Flavivírus, família Flaviviridae, identificado pela primeira vez em 1947 na Floresta Zika em Uganda durante um programa de monitorização da febre amarela selvagem.
· VETOR: infecção pelo Zika vírus (ZIKV) é transmitida pelo mesmo vetor do vírus da dengue, o Aedes aegypti.
· É uma doença febril autolimitada (com manifestação de sintomas por 3-6 dias). Os sintomas comuns da infecção pelo vírus incluem febre baixa (entre 37,8ºC e 38,5ºC), conjuntivite não purulenta, dor de cabeça, artralgia normalmente em mãos e pés, em alguns casos com inflamações das articulações, fatiga ou mialgia, astenia, rash maculopapular e, com menos frequência, dor retro-orbital, anorexia, vômitos, diarreia e dor abdominal, aftas. Astenia pós infecção é frequente. Os sintomas desaparecem em até 7 dias. A dor articular pode estar presente até um mês do início da doença; a artralgia não é tão intensa como a que ocorre em chikungunya e não apresenta a cronicidade características de chikungunya.
Epidemiologia
Dengue
· A transmissão dos sorotipos do vírus dengue em uma determinada comunidade e a magnitude das epidemias estão na dependência da conjunção de uma série de fatores, os chamados macro e micro determinantes. 
· Macro determinantes: elevadas temperaturas e umidade relativa do ar, alta densidade populacional, coleta de resíduos sólidos domiciliares e abastecimento de água potável deficientes.
· Micro determinantes: percentual de suscetíveis aos sorotipos circulantes, abundância e tipos de criadouros do mosquito transmissor, altos índices de infestação predial e densidade de fêmeas deste vetor.
· A transmissão dos vírus dengue ao homem se dá mediante a picada da fêmea hematófaga do gênero Aedes.
· A espécie que apresenta maior antropofilia, caráter doméstico e ampla distribuição geográfica é o Aedes (Stegomyia) aegypti (L1nnaeus, 1762), que se caracteriza pela grande capacidade de adaptação às transformações ambientais provocadas pelo homem.
· Os locais preferidos para a postura dos ovos devem conter água relativamente limpa armazenada, sobretudo em objetos construídos pelo homem, tais como barris, caixas d'água, potes de barro, latas, pneus, vasos com flores, calhas de telhados entupidas,vasos de cemitérios, cacos de garrafas etc. Em menor frequência, também pode realizar esta postura em cavidades naturais, como ocos de árvores. Quando estes objetos estão em ambiente arejado e sombrio, há um estímulo maior à oviposição.
· Desde fevereiro de 2020, o Brasil enfrenta uma pandemia do covid-19 e, desde a confirmação dos primeiros casos, observou-se uma diminuição dos registros de casos prováveis e óbitos de dengue. Esta diminuição pode ser consequência de uma subnotificação ou atraso nas notificações das arboviroses associadas a mobilização das equipes de vigilância e assistência para o enfrentamento da pandemia e ao receio da população em procurar atendimento em uma unidade de saúde.
Chikungunya
· Foram notificados 7.778 casos prováveis (taxa de incidência de 3,7 casos por 100 mil hab.) no país. A região Nordeste apresentou a maior incidência com 6,1 casos/100 mil hab., seguida das regiões Sudeste (4,1 casos/100 mil hab.) e Norte (1,9 casos/100 mil hab.).
· Nenhum óbito foi confirmado até o momento para chikungunya e zika.
· No Brasil, o Ae. aegypti encontra-se disseminado em todos os estados, estando amplamente disperso em áreas urbanas. O Ae. albopictus foi identificado em um grande número de municípios, sendo encontrado no peridomicílio e em ambientes naturais ou modificados adjacentes. A ampla distribuição dessas espécies no Brasil torna o país suscetível à propagação do CHIKV no território nacional.
Zika
· Foram notificados 448 casos prováveis, correspondendo a uma taxa de incidência 0,21 casos por 100 mil hab. no país.
· Em humanos o período de viremia é curto, sendo mais frequente a identificação até o quinto dia do início dos sintomas, muito embora o RNA do vírus zika já ter sido identificado no sangue no primeiro dia e até 11 dias após início da doença.
SEMANAS EPIDEMIOLOGICAS
· As informações sobre dengue e chikungunya apresentadas neste boletim são referentes às notificações ocorridas entre as semanas epidemiológicas (SE) 1 e 10 (3/1/2021 a 13/3/2021), disponíveis no Sinan Online. Os dados de zika foram consultados no Sinan Net até a SE 8 (14/2/2021 a 27/2/2021).
· Em comparação com o ano de 2020, houve uma redução de 74,3 % de casos registrados para o mesmo período analisado. De acordo com o diagrama de controle, o país, até o momento, não enfrenta uma epidemia de dengue, pois os casos estão dentro do esperado.
· A região Centro-Oeste apresentou a maior incidência de dengue, com 125,7 casos/100 mil hab., seguida das regiões Norte (84,7 casos/100 mil hab.), Sul (50,2 casos/100 mil hab.), Sudeste (46,4 casos/100 mil hab.) e Nordeste (18,4 casos/100 mil hab.).
Ciclo de transmissão
Dengue
· Os DENV podem ser transmitidos por 2 espécies de mosquitos (Aedes aegypti e Aedes albopictus) e são mantidos na natureza por meio de 2 ciclos: urbano, pela transmissão horizontal homem-mosquito-homem, e silvestre, pela transmissão horizontal macaco-mosquito-macaco.
· O período de transmissibilidade no homem (intrínseco) pode ocorrer 1 dia antes do início da febre até o 6 o dia da doença (às vezes até o 9 o ou mais). No mosquito (extrínseco), após a picada em pessoa infectada, o vírus aloja-se nas glândulas salivares e se replica depois de 8 a 12 dias, sendo capaz de transmitir o vírus durante toda a sua vida (6 a 8 semanas).
Chikungunya
· Na África, o vírus é zoonótico e mantém um ciclo silvestre envolvendo primatas selvagens e diversas espécies de mosquitos. O ciclo urbano é mantido pela transmissão homem-mosquito-homem.
· A transmissão do vírus entre seres humanos, na África, permanece quase exclusivamente rural, com impacto moderado na saúde pública. Isso sugere 3 hipóteses não excludentes: (i) a infecção humana pelo CHIKV é frequentemente confundida com outras doenças; (ii) as infecções são frequentemente assintomáticas; (iii) a população africana é constantemente exposta ao CHIKV mantendo níveis elevados de imunidade. Nessa situação, o vírus pode ser detectado fortuitamente durante levantamentos sorológicos de outros arbovírus, visto que possui grau elevado de reação cruzada com outros arbovírus.
· Nos países asiáticos o CHIKV é transmitido primariamente por mosquitos, com um ciclo epidemiológico semelhante à dengue: ausência de animal reservatório, transmissão homem-mosquitohomem, e grande potencial epidêmico. As epidemias de CHIKV em seres humanos parecem ser desconectadas da transmissão zoonótica. Essas epidemias parecem resultar da imigração do CHIKV para ecossistemas contendo população densa e não imune juntamente com densidade elevada de mosquitos transmissores que se alimentam principalmente de sangue humano.
Zika
Patogenia da dengue
· As primeiras células infectadas, após a inoculação viral, são as células dendríticas na pele, ou células de Langerhans, onde ocorre replicação inicial e posterior migração para os linfonodos.
· O vírus atinge a corrente sanguínea (viremia), provocando a fase febril aguda, que dura, geralmente, de 3 a 5 dias.
· Nesse período, o vírus pode ser isolado a partir de soro ou células mononucleares do sangue periférico do paciente.
· A gênese dos sintomas sistêmicos na dengue não é bem entendida, mas a ativação das células TCD4+ e TCD8+, como resultado da expressão de proteínas na superfície das células dendríticas e macrófagos infectados, e a liberação de citocinas e interleucinas, desempenham papel importante.
· O interferon liberado pelas células T é responsável por uma redução na atividade da medula óssea que tem como consequência a diminuição na produção de células sanguíneas.
· Além disso, os vírus são capazes de induzir a morte de células não infectadas. Assim, as primeiras características observadas em um paciente com dengue são as petéquias (pontos hemorrágicos) espalhadas pelo corpo e plaquetopenia, seguida por uma leucocitose.
· Da corrente sanguínea, os vírus são disseminados a órgãos como fígado, baço, linfonodos regionais, medula óssea, podendo atingir pulmão, coração e TGI.
· Lesões hepáticas: necrose focal dos hepatócitos, tumefação, surgimento de células mononucleares com citoplasma acidófilo e vacuolizado, semelhantes a corpúsculos de Councilman, e hiperplasia e necrose hialina de células de Kupffer.
· Medula óssea: depressão dos elementos medulares, que melhora à medida que a febre diminui.
· Não se conhece inteiramente a patogênese dos casos graves de dengue (dengue hemorrágica e síndrome de choque da dengue), mas acredita-se que alguns fatores sejam determinantes para o agravamento da doença, entre eles, a reinfecção por um segundo sorotipo do DENV, em que as células de memória decorrentes da infecção prévia por outro sorotipo rapidamente começam a sintetizar anticorpos que reagem, mas não neutralizam os vírus.
· Os imunocomplexos formados são fagocitados por monócitos/macrófagos que, por sua vez, são os principais sítios de replicação viral. Com a infecção dessas células, há um aumento da produção de partículas virais que são liberadas, com consequente formação de mais imunocomplexos. Esses complexos ativam o sistema complemento que, através da liberação de anafilatoxinas, leva ao aumento da permeabilidade vascular com extravasamento de plasma para os tecidos, coagulação intravascular e diminuição do volume sanguíneo (hipovolemia) seguida de choque hipovolêmico.
· Além do agravamento devido a reinfecção por um segundo sorotipo do DENV, estudos mostraram que a infecção pelos sorotipos 2 e 3 pode estar associada a casos graves da doença, sem necessariamente ter havido contato prévio com qualquer outro sorotipo. Os sorotipos 1 e 4 são relacionados com quadros mais amenos. Além disso, há grande variação genética entre cada sorotipo, sendo conhecidos até o momento 4 ou 5 subtipos para cada sorotipo. Algumas mutações desses subtipos são associadas ao aumento da virulência, provavelmente aumentando a eficiência da replicação viral ou potencializando a ligação da partícula à célula hospedeira.
Quadros clínicos
Dengue
· A infecção pelos DENV pode ser assintomática ou sintomática. O período de incubação costuma ser de 5 a 7 dias, podendo variarde 2 até 15 dias. O espectro clínico das infecções sintomáticas pode variar desde enfermidade febril indiferenciada até forma grave.
Infecção assintomática/oligossintomáticas
· O percentual de infecções assintomáticas está relacionado com fatores ambientais, individuais, do vetor e do próprio vírus.
· A ocorrência de uma enfermidade febril inespecífica de curta duração, acompanhada de faringite, rinite e tosse branda é mais frequentemente observada em lactentes e pré-escolares.
· Por vezes, este quadro febril pode ser acompanhado apenas de erupção maculopapular, o que dificulta o seu diagnóstico exclusivamente em bases clínicas.
Dengue sem sinais de alarme
· A enfermidade manifesta-se com febre súbita que persiste, em média, por 5 a 7 dias, geralmente acompanhada de cefaleia, dor retro-orbital, mialgias, artralgias, astenia e prostração.
· Nesta fase febril também podem ocorrer manifestações gastrintestinais, tais como náuseas e vômitos, assim como linfadenopatias.
· Exantema maculopapular ou morbiliforme pode aparecer tanto nas primeiras 24 horas da fase febril, quanto no período de defervescência, ou mesmo após o desaparecimento deste; em áreas endêmicas a dengue pode ser a principal doença exantemática, razão pela qual este exantema pode contribuir para o diagnóstico da doença.
· Após a remissão do exantema, pode ocorrer nova elevação da temperatura, caracterizando uma febre de curso bifásico.
· Com a diminuição da febre, o exantema maculopapular pode evoluir para exantema petequial, surgindo petéquias nos membros inferiores e, menos frequentemente, nas axilas, punhos, dedos e palato.
· Na fase febril costumam ocorrer plaquetopenia, leucopenia e linfopenia com a presença de linfócitos atípicos de intensidade variável. Em frequência menor também pode ser observada leucocitose com desvio à esquerda, cuja persistência pode indicar complicação de etiologia bacteriana.
· A convalescença costuma cursar com astenia, hiporexia, depressão e bradicardia; em alguns casos, essa convalescença pode durar semanas ou até meses, caracterizando a chamada síndrome da fadiga crônica pós-dengue, retardando a retomada das atividades cotidianas do paciente.
Dengue com sinais de alarme
· Ao contrário da maioria das enfermidades infecciosas, nas quais o desaparecimento da febre coincide com a melhora do paciente, na dengue o fim do período febril pode representar o momento em que há o agravamento do quadro clínico do doente, marcando o início da fase crítica. Essa característica é típica da dengue: o primeiro dia sem febre é o dia de maior risco para o surgimento de complicações.
· Na maioria das vezes, a fase crítica da dengue tem início quando, entre o 3° e o 5º dia para as crianças, e entre o 4° e o 6º dia para os adultos, a febre cede e a dor abdominal passa a ser intensa e contínua, observam-se derrames cavitários e aumenta a intensidade e frequência dos vômitos. 
· Os derrames cavitários podem não ser clinicamente evidenciáveis, sendo a ultrassonografia abdominal e a radiografia de tórax ferramentas importantes para aumentar a frequência do diagnóstico. 
· É nessa etapa que pode surgir o choque, bem como se tornam mais evidentes a hepatomegalia e outros sinais de alarme.
· É caracterizada pela saída de fluidos e proteínas, predominantemente albumina, do leito vascular para espaços intersticiais e cavidades serosas.
· Resulta na diminuição do volume plasmático, o qual é inversamente proporcional à gravidade do quadro clínico.
· Costuma ser rápido e parece ser mediado por alterações na permeabilidade do endotélio, resultante da perda das junções celulares.
· Nesse grupo de doentes se encontram aqueles cujas manifestações clínicas são mais intensas e que, dependendo da intensidade do extravasamento plasmático, pode colocar a vida em risco. A gravidade do quadro é evidenciada pela existência de sinais de alarme que anunciam a iminência do choque, por isso os profissionais de saúde devem estar atentos para a identificação precoce desses sinais:
· Derrames cavitários;
· Dor abdominal intensa e contínua;
· Elevação brusca do hematócrito, associada à diminuição concomitante da contagem de plaquetas;
· Hepatomegalia igual ou maior que 2 cm;
· Sangramento de mucosas;
· Sonolência e/ou irritabilidade;
· Vômitos persistentes.
· A identificação precoce desses sinais de alarme permite que o paciente seja salvo, desde que receba tratamento oportuno com soluções hidroeletrolíticas em quantidades suficientes para repor as perdas produzidas pelo extravasamento de plasma, por vezes agravada por perdas para o exterior (sudorese, vômitos e diarreias).
· Embora não sendo sinais de alarme, devemos tomar cuidados adicionais com aqueles pacientes com comorbidades que dificultam o manejo clínico do doente, tais como:
· Diabetes melito;
· DPOC;
· Doenças autoimunes, como LES, já que, além do padrão de resposta imune própria da enfermidade há a possibilidade de o paciente estar em uso prolongado de corticosteroides;
· Doenças do aparelho cardiovascular como insuficiência cardíaca e hipertensão arterial sistêmica;
Dengue grave
· De acordo com a nova classificação de casos da Organização Mundial da Saúde, dengue grave é definido pela presença de uma ou mais das seguintes manifestações: (1) extravasamento plasmático grave que pode levar ao choque e/ ou a derrames cavitários, com ou sem desconforto respiratório; (2) hemorragia volumosa e (3) comprometimento visceral grave (WHO, 2009).
· A persistência do aumento da permeabilidade, sem a reposição hídrica adequada, tende a piorar a hipovolemia podendo, inclusive, provocar o choque.
· Este processo fisiopatológico normalmente ocorre quando há a queda da temperatura corporal, geralmente no quarto ou quinto dia de doença, podendo variar entre o terceiro até o sétimo dia, quase sempre precedido pelo surgimento dos sinais de alarme
· Durante a etapa inicial do choque, o mecanismo compensatório que mantém a pressão sistólica normal também pode produzir taquicardia e vasoconstrição periférica com redução da perfusão capilar, resultando em extremidades frias e enchimento capilar mais lento.
· Com a persistência da hipovolemia, a pressão sistólica tende a cair e a diastólica a se manter estável, resultando no estreitamento da pressão de pulso e diminuição da pressão arterial média. Em estágios mais avançados há a descompensação e ambas tendem a desaparecer abruptamente.
· Crianças e adultos com dengue são considerados em choque quando a pressão de pulso (ou seja, a diferença entre as pressões sistólica e diastólica) é igual ou menor do que 20 mmHg, ou quando apresentam sinais de má perfusão capilar, tais como extremidades frias, enchimento capilar lento ou pulso rápido e fraco.
· Em adultos, a pressão de pulso igual ou menor do que 20 mmHg pode indicar um choque mais grave. 
· Quando ocorre hemorragia grave, quase sempre está associada a choque profundo que, associado à trombocitopenia, à hipoxia e à acidose pode provocar falência múltipla de órgãos e coagulação intravascular disseminada. 
· Pode ocorrer hemorragia maciça sem choque prolongado, podendo este sangramento maciço ser critério de definição de dengue grave se o médico assistente assim o considerar. Este tipo de sangramento pode ser visto em casos em que há uso de ácido acetilsalicílico, anti-inflamatórios não esteroides ou corticosteroides
· No entanto, a maioria das mortes por dengue ocorre em pacientes com choque profundo, especialmente se o quadro é agravado por sobrecarga de líquidos. 
· O paciente pode recuperar-se rapidamente após terapia antichoque apropriada. No entanto, o choque não tratado pode evoluir com acidose metabólica e graves sangramentos gastrintestinais e em outros órgãos, podendo o paciente evoluir para o óbito em 12 a 24h.
Chikungunya
· O período de incubação da doença é de cerca de 2-4 dias, mas isso pode variar. A infecção se inicia de forma abrupta e ocorre ao mesmo tempo em que a viremia está presente os sintomas são: febre, cefaleia, dor nas costas, – mialgia, poliartralgia (sintoma mais característico) e fadiga.A poliartralgia é, frequentemente, bilateral, simétrica e, geralmente, acomete as articulações periféricas (tornozelo, punho, falanges) e grandes articulações (cotovelos, joelhos). Podem surgir exantemas, especialmente, no tórax e na face.
· Nos casos de doença crônica, os sintomas de artralgia e/ou mialgia podem persistir, além de haver casos de manifestações reumáticas, neurossensoriais, exantema, alopecia, acometimento do TGI, hemorragias.
· Nas crianças, as manifestações mais comuns são as dermatológicas (hiperpigmentação, eritema generalizado) e neurológicas (encefalite, convulsões, meningite), além de afecções do TGI, cianose e hemorragias. Em gestantes infectadas, o vírus pode ser transmitido ao feto, especialmente, quando a mãe tem viremia no período pré-parto.
Zika
· O período de incubação da doença varia entre 3 a 12 dias depois da picada do mosquito. historicamente, a Zika nos humanos apresentava um quadro clínico brando e autolimitado, semelhante à gripe/dengue ou, na maioria dos casos, era assintomática o quadro clínico inicial é marcado por – manchas vermelhas (podem ser pruriginosas) no corpo, olhos vermelhos (conjuntivite), febre baixa, dores no corpo, artralgia. Com a recente epidemia, o vírus da zika começou a estar relacionado a doenças graves, incluindo falência de múltiplos órgãos, trombocitopenia e púrpura trombocitopênica.
· Apesar de os casos de meningite e de encefalite em adultos sejam raros, o vírus da zika tem tropismo por células neurais progenitoras, o que explica a sua capacidade de impedir o desenvolvimento encefálico do feto e de causar malformações congênitas, restrição do crescimento intrauterino, microcefalia e danos neurológicos.
Diagnóstico laboratorial
Dengue
· O diagnóstico da dengue depende de fatores clínicos e possível exposição ao vírus, como é o caso de pessoas residentes em áreas endêmicas ou que para lá viajam.
· O diagnóstico da dengue deve ser confirmado pelo fato de as manifestações clínicas serem semelhantes às de outras doenças, como aquelas causadas por outros arbovírus como, por exemplo, chikungunya, o’nyong-nyong, Sindbis, Mayaro, Ross River, entre outros.
· Isolamento viral: o material de escolha é o sangue, soro ou plasma, colhido nos primeiros 3 a 5 dias da doença > de preferência durante o período febril, na fase aguda..
· A inoculação pode ser feita via injeção intratorácica em mosquitos, inoculação no cérebro de camundongos ou em culturas de células de mosquito (p. ex., TRA-284, C6/36, AP-61), seguida da identificação por IF empregando anticorpos monoclonais tipo-específicos.
· Detecção do antígeno: o antígeno procurado geralmente é a proteína NS1, por ser altamente conservado entre os sorotipos.
· Pode ser detectado no soro dos pacientes por meio de imunoensaios, mas esse método perde a sensibilidade quando a infecção é secundária devido à interferência dos anticorpos heterólogos, sendo necessária a utilização de outra forma de diagnóstico.
· Sorologia para pesquisa de anticorpos: produz resultados bem definidos quando realizada em pacientes expostos pela primeira vez a um flavivírus. No entanto, quando a pessoa foi exposta anteriormente a outro flavivírus, a reação é rápida e intensa em função da memória imunológica prévia. Nesse caso, os anticorpos heterólogos são iguais ou mais elevados que os específicos, dificultando a interpretação das reações sorológicas.
· A captura de anticorpos da classe IgM (MAC-Elisa) é o mais utilizado na confirmação de casos suspeitos de dengue.
· Detecção do ácido nucleico viral: a reação em cadeia da polimerase associada à reação de transcrição reversa (RT-PCR) convencional ou em tempo real tem sido aplicada no diagnóstico rápido da infecção.
Chikungunya
· O isolamento do vírus é realizado por inoculação em cultura de células de mosquitos ou de mamíferos, como por exemplo, culturas de células de rim de macaco, de rim de hamster, de embrião de galinha ou de pato e inoculação em camundongos recém-nascidos.
· As 2 principais formas de diagnóstico são: detecção do RNA viral por reação em cadeia da polimerase associada à reação de transcrição reversa (RT-PCR) e sorologia para pesquisa de anticorpos.
· A RT-PCR é útil durante a fase virêmica (0 a 7 dias). 
· Em crianças, o vírus pode ser detectado no fluido das bolhas da erupção cutânea. Os métodos sorológicos como inibição da hemaglutinação (HI), fixação do complemento (FC), imunofluorescência (IF) e ensaio imunoenzimático (EIA) podem ser usados para a pesquisa de anticorpos. 
· A IgM específica para o vírus pode ser detectada por EIA em média a partir do 2 o dia da doença e persiste por várias semanas até 3 meses. 
· A IgG específica é detectada na fase convalescente e persiste por anos. Contudo, a sensibilidade dos testes sorológicos é baixa, sendo possível que ocorra reação cruzada com outros arbovírus como o vírus Mayaro e o vírus o’nyong-nyong. Sorologicamente, o CHIKV é mais próximo do vírus o’nyongnyong.
zika
· O diagnóstico da doença ocasionada pelo vírus Zika é feito através de testes laboratoriais que permitam diferenciar entre chikungunya e zika, já que as manifestações clínicas produzidas são parecidas. Em vários estudos têm sido descritas manifestações neurológicas como meningoencefalite e síndrome de Guillain-Barré em epidemias de chikungunya.
· A sorologia para detecção de anticorpos IgM contra o vírus Zika, usando os testes de ELISA e de Imunofl uorescência, deve ser realizada a partir do 5º dia após o início dos sintomas. Recomenda-se usar soros pareados para detecção de soroconversão (incremento até quatro vezes do título de anticorpos).
· Considerando que pode ter pacientes com história previa de infecção por outros fl avivírus e que pode haver reação cruzada nos testes, é recomendado utilizar antígenos dos fl avivírus que circulam na região, entre eles: dengue (mistura dos sorotipos 1-4), febre amarela, encefalite japonesa, encefalite Murray Valley, vírus do oeste do Nilo e St Louis
Tratamento
Dengue
· Não há tratamento específico para a dengue.
· O tratamento é sintomático, consistindo em hidratação e emprego de antitérmicos e antieméticos.
· A recomendação é que não sejam utilizados medicamentos contendo ácido acetilsalicílico, que podem aumentar o risco de sangramento.
· Medicamentos contendo dipirona também não devem ser utilizados porque podem ocasionar erupções na pele semelhantes àquelas observadas na dengue. 
· Não devem ser administrados anti-inflamatórios não hormonais contendo ibuprofeno, diclofenaco, nimesulida, cetoprofeno, entre outros, pelo risco de efeitos colaterais, como hemorragias digestivas e reações alérgicas.
· O paracetamol, recomendado para o tratamento dos sintomas como dor e febre, deve ser administrado nas doses e intervalos prescritos pelo médico, uma vez que em doses altas podem causar lesão hepática.
· Nos casos mais graves, é importante a reposição de fluidos e eletrólitos, administração de plasma e concentrado de plaquetas.
Chikungunya
· No momento, também não há antiviral eficiente para o tratamento da chikungunya. Dessa forma, o tratamento é sintomático e baseado em analgésicos não salicilados e drogas anti-inflamatórias não esteroidais.
Zika
· O tratamento dos casos sintomáticos é baseado no uso de acetaminofeno (paracetamol) ou dipirona para o controle da febre e manejo da dor.
· No caso de erupções pruriginosas, os anti-histamínicos podem ser considerados. No entanto, é desaconselhável o uso ou indicação de ácido acetilsalicílico e outros drogas anti-inflamatórias devido ao risco aumentado de complicações hemorrágicas descritas nas infecções por síndrome hemorrágica como ocorre com outros flavivírus.
Manejo clínico do paciente – Coura
Caso suspeito de dengue
· Deve ser considerado um caso suspeito de dengue a pessoa que apresente doença febril aguda com duração máxima de até 7 dias, acompanhada de pelo menos dois dos seguintes sintomas: cefaleia; dor retro-orbitária; mialgia; artralgia; prostração ou exantema associados ou não à presença de hemorragias.
· Além desses sintomas, deve-se levar em consideraçãoque a doença apresenta caráter sazonal em associação a períodos chuvosos e de elevadas temperaturas.
· Após a avaliação e conduta inicial, mesmo que o paciente seja encaminhado para outro serviço de saúde, deve-se garantir o suporte de vida adequado para encaminhamento e prestar orientações quanto à rede assistencial. Esta triagem inicial é de fundamental importância para estabelecer o correto tratamento do doente. Por isso, recomenda-se que o profissional de saúde responsável por esta avaliação atente para:
· Data início da febre;
· Diurese (frequência, volume e hora da última micção);
· Mudanças no nível da consciência, irritabilidade, sonolência, letargia;
· Presença de comorbidades;
· Presença de evacuações diarreicas;
· Presença de sinais de alarme;
· Quantidade de líquidos ingeridos por via oral...
· Uso de medicamentos, sobretudo antiagregantes plaquetários, anticoagulantes, anti-inflamatórios e imunossupressores.
· Quando da realização do exame físico, não se esquecer de avaliar:
· Estado mental com a escala de Glasgow;
· Estado de hidratação;
· Estado hemodinâmico;
· Ocorrência de derrames cavitários, taquipneia e respiração de Kussmaul;
· Ocorrência de dor abdominal e hepatomegalia;
· Ocorrência de manifestações hemorrágicas espontâneas ou provocadas pela prova do lado.
· A prova do laço deve ser realizada naqueles doentes que não apresentem sangramentos espontâneos. Para tal, verificar a PA do paciente e calcular o valor médio (sistólica + diastólica dividida por 2); insuflar o manguito até o valor médio e manter por cerca de 3 a 5 min. Após, contar o número de petéquias no quadrado equivalente à polpa digital do polegar, considerando-se a prova positiva se houver 20.
· Prova do laço positiva não é patognomônica de forma grave de dengue e pode ocorrer em outras situações clínicas que cursam com alteração da permeabilidade capilar ou trombocitopenia (idade avançada ou coagulopatias).
· Prova do laço é importante para a triagem de pacientes com potencial alteração da permeabilidade vascular.
· Não há contraindicações para realização da prova do laço em doenças crônicas (diabetes melito, hipertensão arterial sistêmica etc.), mas deve-se ter cuidado ao realizá-la em pessoas idosas, devido à fragilidade cutânea e vascular próprias da idade.
· Na primeira consulta deve-se solicitar hemograma completo para todos os casos. O diagnóstico sorológico de dengue deve seguir a orientação dos serviços de epidemiologia, lembrando que o mesmo não é necessário para o correto manejo clínico do doente.
· Ao final da história clínica e do exame físico o profissional deverá ter condições de responder as seguintes indagações:
· É dengue?
· Em que fase se encontra o doente? (febril, crítica ou de recuperação)
· Há sinais de alarme?
· O doente tem comorbidades?
· O doente tem condições que possam dificultar o manejo?
· Como se encontra o estado hemodinâmico e hidratação?
· O doente está em choque?
· O doente necessita de hospitalização?
· As respostas possibilitarão classificar o doente em três grupos de estadiamento: grupos A, B e C.
Grupo A – dengue sem sinais de alarme
· Podem ser acompanhados nas Unidades Básicas de Saúde e no domicílio, sem necessidade de internação hospitalar.
· Ausência de sinais de alarme e choque;
· Ausência de sangramentos de mucosas;
· Toleram volumes adequados de líquidos por via oral;
· Estão urinando pelo menos uma vez a cada seis horas;
· Não estão no dia da defervescência;
· Não têm comorbidades nem vivem em condições de risco social.
· São condutas adequadas:
· Orientar tratamento em domicílio, se possível com observações escritas para facilitar a adesão do doente;
· Orientar o paciente quanto à necessidade de repouso no leito;
· Prescrever ingesta oral de líquidos de modo sistemático e abundante, sendo recomendados para adultos 60 a 80 ml/kg/dia (1/3 do volume em soro oral e, para os 2/3 restantes, complementar com água, suco de frutas, leite, chá, água de coco, sopa); para as crianças oferecer soro oral de maneira precoce e abundante (1/3 das necessidades basais, complementando-se o restante com água, suco de frutas, leite, chá, água de coco, sopa, leite materno);
· Prescrever analgésicos e antitérmicos se necessário, alertando o paciente para o risco da automedicação
· Paracetamol:
· Criança: 1 O mg/kg/ dose de 6/ 6
· Adulto: 500 mg/dose de 6/6 h ou ate o máximo 750 mg de 6/6 h
· Dipirona:
· No Brasil, a dipirona é utilizada de rotina nas doses usuais, tanto por via oral quanto intravenosa.
· ATENÇÃO:
· É contraindicado o uso de salicilatos e anti-inflamatórios não hormonais (ácido acetilsalicílico, ibuprofeno, diclofenaco, nimesulida, entre outros);
· Orientar o paciente e/ou seus familiares/cuidadores sobre os sinais de alarme, especialmente no primeiro dia do desaparecimento da febre, e orientar o que fazer frente ao surgimento dos mesmos
· Após consulta e avaliação clínica, informar ao paciente que ele poderá realizar o tratamento no domicílio, porém orientado para retornar à unidade de saúde identificada no Cartão de Acompanhamento do Paciente com Suspeita de Dengue, se possível diariamente ou ao menos no primeiro dia do desaparecimento da febre ou em caso de surgimento de sinais de alarme. Retornar para a Unidade de Saúde em 24 h para nova avaliação
· Orientar para limpeza e destruição de possíveis focos domiciliares de A. aegypti;
· Preencher a ficha de notificação individual de casos.
· Na prática clínica diária, a maioria dos casos atendidos nas unidades de saúde é composta por pacientes classificados neste Grupo A.
· Muitos pacientes apresentam náuseas e vômitos durante o curso da doença, no entanto, deve-se evitar o uso de medicação antiemética para não mascarar possível sinal de alarme.
· Em situações nas quais a gravidade do quadro exija, os antieméticos mais utilizados são metoclopramida, bromoprida e alizaprida, nas posologias usuais.
Grupo B – dengue com sinais de alarme
· São doentes que devem ser encaminhados para um hospital ou policlínica especializada. 
· Presença de sinais de alarme;
· Presença de comorbidades ou de situação que torne o manejo mais complexo;
· Vivendo em condições de risco social.
· São condutas adequadas no caso de dengue com sinais de alarme:
· Solicitar hemograma completo (hematócrito, contagem de plaquetas e de leucócitos);
· A ausência do hemograma não deve atrasar o início da hidratação;
· O monitoramento dos sinais vitais deve ser constante (temperatura, frequência cardíaca, frequência respiratória, pressão arterial, enchimento capilar, diurese);
· Administrar unicamente soluções isotônicas, tais como solução salina a 0,9% e lactato de Ringer;
· Reavaliar: se persistirem os sinais de alarme e a diurese for menor que 1 mL /kg/h, repetir a conduta anterior (1 O m.t'/kg em lh) mais uma ou duas vezes;
· Reavaliar: se houver melhora dos sinais de alarme e a diurese for igual ou maior do que 1 mL /kg/h, reduzir a infusão para 5 a 7 mL /kg/h, por 2 a 4 h, e continuar reduzindo progressivamente o volume infundido se houver sinais de melhora clínica;
· Reavaliar o estado clínico do paciente e solicitar hematócrito:
· Se o hematócrito for igual ou houver um aumento mínimo, continuar a infusão com 2 a 3 mL/kg/h por outras 2 a 4 h;
· Se houver piora dos sinais vitais ou aumento rápido do hematócrito, manejar como choque;
· Se houver piora dos sinais vitais e uma queda brusca do hematócrito, considerar hemorragia grave e tratar como sangramento grave;
· Reavaliar o estado clínico do paciente, repetir o hematócrito e revisar a velocidade de infusão de líquido;
· Reduzir gradualmente a velocidade de infusão de líquidos de acordo com a evolução do doente, isto é, com a finalização da fase crítica, período em que há maior volume de fuga plasmática para o espaço extravascular. A normalização da diurese pode ser um indicativo dessa situação, assim como a presença de hematócrito abaixo do valor de base para o doente;
· O fato de o paciente apresentar sinais de alarme e estar em hidratação venosa não impede que se administrem líquidos por via oral,de acordo com a tolerância do doente.
· Condutas adequadas no caso de dengue sem sinais de alarme, mas com comorbidade ou risco social ou situação especial:
· Solicitar hemograma completo (hematócrito, contagem de plaquetas e de leucócitos);
· A ausência do hemograma não deve atrasar o início da hidratação;
· O monitoramento dos sinais vitais deve ser constante, incluindo o controle da diurese, da temperatura e evolução do hematócrito
· O monitoramento clínico também deve incluir os sinais de alarme, pois o caráter dinâmico da doença exige constante reavaliação do doente e, quando necessário, reclassificar o doente;
· Estimular a ingesta de líquidos por via oral; se não tolerar a ingesta líquida oral ou se estiver ingerindo pouco líquido:
· Administrar unicamente soluções isotônicas, tais como solução salina a 0,9% e lactato de Ringer com ou sem glicose;
· Geralmente, esses pacientes reiniciam a ingesta líquida oral depois de algumas horas de hidratação IV;
· A avaliação do estado clínico e do volume de líquidos infundidos, incluindo a repetição do hematócrito deve ser contínua;
· O volume de líquido a ser infundido deve ser o mínimo necessário para manter boa perfusão de órgãos e diurese de pelo menos 1 mL /kg/h; geralmente esses líquidos intravenosos são necessários por apenas 24 a 48 h.
· A comorbidade presente no doente desse grupo deve ser avaliada continuamente, de acordo com os protocolos clínicos de cada caso.
Grupo C – dengue grave
· Compõem esse grupo pacientes que necessitam de atendimento imediato, devendo receber hidratação venosa vigorosa (fase de expansão) em qualquer unidade de saúde em que se encontre e deve ser transferido, preferencialmente em ambulância com suporte avançado, para um hospital de referência com leitos de UTI.
· Extravasamento plasmático grave, que pode provocar choque acompanhado ou não de desconforto respiratório;
· Hemorragias graves (volumosas);
· Envolvimento visceral grave;
· São condutas adequadas:
· Assegurar bom acesso venoso, de preferência em dois locais diferentes;
· Solicitar hemograma completo (hematócrito, contagem de plaquetas e de leucócitos);
· A ausência do hemograma não deve atrasar o início da hidratação;
· O monitoramento dos sinais vitais deve ser contínuo, no mínimo a cada 15 min;
· Iniciar reidratação IV com solução cristaloide isotônica (solução salina a 0,9% ou lactato de Ringer) a uma velocidade de 20 mL/kg/em 30 min. Observar a evolução do paciente e, havendo o desaparecimento dos sinais de choque, diminuir a velocidade de hidratação para 1 O mL/kg/ em 1 a 2 h e repetir o hematócrito;
· Se o paciente melhorar clinicamente e o segundo hematócrito revelar diminuição da hemoconcentração, diminuir gradualmente a infusão;
· A infusão intravenosa de líquidos pode ser necessária por 24 a 48 h; quando possível, iniciar a ingestão de líquidos via oral;
· Se depois do primeiro bolo de hidratação IV o paciente continuar hemodinamicamente instável, com sinais de choque, repetir uma segunda etapa de solução cristaloide isotônica e solicitar novo hematócrito após a infusão;
· Se após o volume infundido nesta segunda etapa a hemoconcentração diminuir, o paciente melhorar clinicamente e houver o desaparecimento dos sinais de choque, continuar reduzindo o volume infundido, tal como referido anteriormente para o paciente que apresentou evolução favorável;
· No entanto, se após este segundo bolo de hidratação IV o paciente continuar instável e o hematócrito continuar alto, quando comparado com o de base, deve-se administrar um terceiro bolo de cristaloide na mesma dose. Havendo melhora clínica, diminuir progressivamente a hidratação IV.
· Se o paciente continuar instável e o hematócrito diminuir:
· Avaliar a possibilidade de sangramentos e necessidade urgente de transfusão de sangue ou derivados;
· Avaliar a função da bomba cardíaca (miocardiopatia, miocardite) e necessidade de aminas vasoativas;
· Avaliar presença de possíveis comorbidades ou condições coexistentes, tais como cardiopatias, pneumonias, vasculopatias, nefropatias, diabetes, gravidez e obesidade;
· Lembrar que acidose persistente aumenta o risco de hemorragias.
· Se o paciente continuar instável (choque persistente) e/ou o hematócrito persistir elevado, quando comparado com o de base, apesar do tratamento vigoroso com cristaloides, pode-se avaliar a possibilidade de administrar de modo excepcional solução coloide na razão de 1 O a 20 mL/kg/ em 30 min a l h.
· Não esquecer a possibilidade de hiper-hidratação, por isso averiguar sinais de insuficiência cardíaca congestiva e tratar com diuréticos e oxigenoterapia se houver necessidade, além de suspender a infusão IV.
· Como critérios de alta hospitalar sugere-se que os pacientes preencham todos os cinco critérios a seguir:
· Melhora do quadro clínico com ausência de febre durante 24 h, sem uso de terapia antitérmica;
· Hematócrito normal e estável por 24h;
· Plaquetas em elevação e acima de 50mil/mm³;
· Estabilização hemodinâmica durante 24h;
· Derrames cavitários em reabsorção e sem repercussão clínica.
Prevenção
· Reduzir o número de mosquitos por meio da eliminação de criadouros sempre que possível, ou manter os reservatórios e qualquer local que possa acumular água, totalmente cobertos com telas/capas impedindo o acesso das fêmeas grávidas. 
· De forma complementar, deve ser realizada a proteção individual com uso de repelentes pela população.
· Muitos estudos vêm sendo realizados para a produção e licenciamento de uma vacina contra 1 ou mais sorotipos do vírus da dengue. No Brasil, o Instituto Butantan iniciou a 2 a fase clínica de um estudo que busca comprovar a eficácia e a segurança em seres humanos de uma vacina contra a dengue, empregando vírus modificado por engenharia genética. Essa é a 1 a vacina contra a dengue de produção 100% nacional a ser testada em seres humanos no país. A formulação é tetravalente, ou seja, imuniza contra os 4 sorotipos do vírus, e foi desenvolvida há mais de uma década pelo National Institute of Health (NIH) dos EUA, chegando ao Brasil por meio de transferência tecnológica.
· O controle deve ser feito por meio da eliminação dos vetores artrópodes empregando medidas como: evitar picada de mosquito com o uso de espirais ou vaporizadores elétricos, mosquiteiros, repelentes e telas protetoras; eliminar os locais de procriação de mosquitos pela vedação de depósitos de água como caixas d’água, tanques, tinas, poços e fossas; evitar o acúmulo de lixo para reduzir os possíveis criadouros de mosquitos; fazer o controle químico com utilização de larvicidas; tornar o controle biológico uma realidade, com a introdução de organismos no ambiente que atacam, parasitam ou competem com o mosquito, reduzindo assim a sua população e campanhas de educação em saúde informando às comunidades sobre as doenças transmitidas por mosquitos, bem como as medidas adequadas para combatê-las.
Chikungunya: a visão do clínico de dor. Anita Perpetua Carvalho Rocha de Castro1, Rafaela Araújo Lima1, Jedson dos Santos Nascimento. Rev Dor. São Paulo, 2016.
Chikungunya : manejo clínico / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. – Brasília: Ministério da Saúde, 2017.
Virologia humana/Norma Suely de Oliveira Santos, Maria Teresa Villela Romanos, Marcia Dutra Wigg. – 3. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.
Dinâmica das doenças infecciosas e parasitárias/ José Rodrigues Coura. - 2. ed. - Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
Boletim Epidemiológico | Secretaria de Vigilância em Saúde | Ministério da Saúde 2 Volume 52 | Nº 10 | Mar. 2021
ZIKA ABORDAGEM CLÍNICA NA ATENÇÃO BÁSICA. SVS | Secretaria de Vigilância em Saúde SAS | Secretaria de Atenção a Saúde ZIKA ABORDAGEM CLÍNICA NA ATENÇÃO BÁSICA 2016
Melissa Falcão, Antonio Carlos Bandeira, Kleber Luz, Alberto Chebabo. Guia de manejo da infecção pelo vírus zika Versão 19/03/2016. Sociedade Brasileira de Infectologia.

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