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A diferenciação sexual é um processo complexo que envolve muitos genes, incluindo alguns autossômicos. A chave para o dimorfismo sexual é o cromossomo Y, que contém o gene determinante de testículos chamado SRY (região determinante do sexo no Y) em seu braço curto (Yp11). O produto proteico desse gene é um fator de transcrição que inicia uma cascata de genes que determinam o destino dos órgãos sexuais rudimentares. A proteína SRY é o fator determinante do testículo; sob sua influência, ocorre o desenvolvimento masculino; em sua ausência, se estabelece o desenvolvimento feminino. As gônadas aparecem inicialmente como um par de cristas, as cristas genitais ou gonadais . Elas são formadas por proliferação do epitélio celomático e condensação do mesênquima subjacente. As células germinativas não aparecem nas cristas genitais até a sexta semana do desenvolvimento. As células germinativas primordiais se originam no epiblasto, migram através da linha primitiva e, por volta da terceira semana, residem entre as células endodérmicas na parede da vesícula vitelínica, próximo ao alantoide . Durante a quarta semana, elas migram por meio de movimento ameboide ao longo do mesentério dorsal do intestino posterior, chegando às gônadas primitivas no início da quinta semana e invadindo as cristas genitais na sexta semana. Se elas não conseguem alcançar as cristas, as gônadas não se desenvolvem. Assim, as células germinativas primordiais têm uma influência indutora sobre o desenvolvimento das gônadas em ovários ou testículos. Um pouco antes e durante a chegada das células germinativas primordiais, o epitélio do sulco genital prolifera e as células epiteliais penetram o mesênquima subjacente. Ali, elas formam vários cordões de formato irregular, os cordões sexuais primitivos. Tanto no embrião masculino quanto no feminino, esses cordões estão conectados ao epitélio superficial; a diferenciação entre gônada feminina e masculina é impossível neste momento, de modo que as gônadas são chamadas de indiferenciadas. Embora o sexo do embrião seja determinado geneticamente no momento da fertilização, as gônadas não adquirem características morfológicas masculinas ou femininas até a sétima semana do desenvolvimento. Se o embrião for geneticamente masculino, as células germinativas primordiais carreiam um complexo cromossômico sexual XY. Sob a influência do gene SRY no cromossomo Y, que codifica o fator determinante do testículo, os cordões sexuais primitivos continuam a proliferar e a penetrar fundo na medula, formando os testículos ou cordões medulares . Na direção do hilo da glândula, os cordões se fragmentam em uma rede de pequenos fios celulares que, mais tarde, dão origem aos túbulos da rede testicular . Com a continuação do desenvolvimento, uma camada densa de tecido conjuntivo fibroso, a túnica albugínea, separa os cordões testiculares do epitélio superficial . No quarto mês, os cordões testiculares adquirem um formato de ferradura, e suas extremidades são contínuas com aquelas da rede testicular . Os cordões testiculares agora são compostos por células germinativas primitivas e por células de sustentação denominadas células de Sertoli, derivadas do epitélio superficial da glândula. As células intersticiais de Leydig, derivadas do mesênquima original do sulco gonadal, encontram-se entre os cordões testiculares. Elas começam a se desenvolver um pouco depois do início da diferenciação desses cordões. Na oitava semana de gestação, as células de Leydig começam a produção de testosterona, influenciando a diferenciação sexual dos ductos genitais e da genitália externa. Os cordões testiculares permanecem sólidos até a puberdade, quando adquirem um lúmen, formando, assim, os túbulos seminíferos. Uma vez que os túbulos seminíferos são canalizados, eles se juntam aos túbulos da rede testicular, que, por sua vez, entram em contato com os dúctulos eferentes. Esses dúctulos eferentes são as porções remanescentes dos túbulos excretórios do sistema mesonéfrico. Eles conectam a rede testicular ao ducto mesonéfrico, ou wolffiano, que se torna o ducto deferente. A. Corte transversal através do testículo na oitava semana, mostrando a túnica albugínea, os cordões testiculares, a rede testicular e as células germinativas primordiais. O glomérulo e a cápsula de Bowman do túbulo mesonéfrico excretório estão degenerando. B. Testículos e ducto genital no quarto mês. Os cordões testiculares com formato de ferradura são contínuos com os cordões da rede testicular. Repare nos dúctulos eferentes (túbulos mesonéfricos excretórios), que entram no ducto mesonéfrico. Em embriões femininos com um complemento cromossômico sexual XX e nenhum cromossomo Y, os cordões sexuais primitivos se dissociam em conjuntos celulares irregulares. Esses conjuntos, que contêm grupos de células germinativas primitivas, ocupam a porção medular do ovário. Mais tarde, eles desaparecem e são substituídos por um estroma vascular que forma a medula ovariana. O epitélio superficial da gônada feminina, ao contrário do que ocorre no homem, continua a proliferar. Na sétima semana, ele dá origem à segunda geração de cordões, os cordões corticais, que penetram no mesênquima subjacente, mas permanecem próximo à superfície . No terceiro mês, esses cordões se dividem em grupos celulares isolados. As células desses grupos continuam a proliferar e cercam cada oogônia com uma camada de células epiteliais chamadas de células foliculares. Juntas, a oogônia e as células foliculares constituem o folículo primordial. Assim, pode-se dizer que o sexo genético de um embrião é determinado no momento da fertilização, dependendo de o espermatozoide carrear um cromossomo X ou Y. Em embriões com uma configuração cromossômica sexual XX, os cordões medulares das gônadas regridem e se desenvolve uma segunda geração de cordões corticais. Em embriões com um complexo cromossômico sexual XY, os cordões medulares se desenvolvem em cordões testiculares e não se formam cordões corticais secundários Inicialmente, tanto os embriões masculinos quanto os femininos têm dois pares de ductos genitais: os ductos mesonéfricos (wolffianos) e os ductos paramesonéfricos (müllerianos). O ducto paramesonéfrico surge como uma invaginação longitudinal do epitélio na superfície anterolateral do sulco urogenital. Cranialmente, o ducto se abre na cavidade abdominal com uma estrutura com formato de funil. Na região caudal, primeiro ele passa lateralmente ao ducto mesonéfrico e, então, o atravessa ventralmente para crescer caudomedialmente. Na linha média, ele se encontra em contato íntimo com o ducto paramesonéfrico do lado oposto. A ponta caudal dos ductos combinados se projeta na parede posterior do seio urogenital, onde causa uma pequena protuberância, o tubérculo do seio . Os ductos mesonéfricos se abrem no seio urogenital em cada lado do tubérculo do seio. Os ductos genitais no homem são estimulados a se desenvolverem pela testosterona e são derivados do sistema renal mesonéfrico. Alguns dos túbulos excretórios originais, os túbulos epigenitais, estabelecem contato com os cordões da rede testicular e formam os dúctulos eferentes dos testículos . Os túbulos excretórios ao longo do polo caudal dos testículos, os túbulos paragenitais, não se juntam aos cordões da rede testicular. Seus vestígios são chamados coletivamente de paradídimo. Exceto por sua porção mais cranial, o apêndice epididimal, os ductos mesonéfricos persistem e formam os ductos genitais principais. Imediatamente abaixo da entrada dos dúctulos eferentes, os ductos mesonéfricos se alongam e se tornam altamente convolutos, formando o epidídimo (ducto epididimal). Da cauda do epidídimo até a protuberância da vesícula seminal, os ductos mesonéfricos obtêm um revestimento muscular espesso e formam o ducto deferente. A região do ducto além das vesículas seminais é o ducto ejaculatório. Sob a influência do hormônio antimülleriano (AMH; também chamado de substância inibidora mülleriana [MIS]) produzido pelas células de Sertoli,os ductos paramesonéfricos no homem degeneram, exceto por uma pequena porção em suas extremidades craniais, o apêndice testicular. A. Ductos genitais no homem, no quarto mês. Os segmentos cranial e caudal (túbulo paragenital) do sistema mesonéfrico regridem. B. Ductos genitais após a descida dos testículos. Repare nos cordões testiculares com formato de ferradura, na rede testicular e nos dúctulos eferentes que entram no ducto deferente. O paradídimo é formado pelo remanescente dos túbulos mesonéfricos paragenitais. O ducto paramesonéfrico degenerou, exceto pelo apêndice testicular. O utrículo prostático é uma evaginação da uretra. Na presença do estrogênio e na ausência de testosterona e AMH (MIS), os ductos paramesonéfricos desenvolvem-se no ductos genitais principais na mulher. Inicialmente, podem ser reconhecidas três partes em cada ducto: (1) a porção cranial vertical que se abre na cavidade abdominal, (2) uma porção horizontal que atravessa o ducto mesonéfrico e (3) uma parte vertical caudal que se fusiona com sua equivalente do lado oposto. Com a descida dos ovários, as duas primeiras partes se desenvolvem na tuba uterina , e as partes caudais se fusionam para formar o canal uterino. Quando a segunda parte dos ductos paramesonéfricos se move mediocaudalmente, as cristas urogenitais se aproximam gradualmente em um plano transversal. Após a fusão dos ductos na linha média, se estabelece uma prega pélvica transversal larga . Essa prega, que se estende das porções laterais dos ductos paramesonéfricos fusionados até a parede da pelve, é o ligamento largo do útero. A tuba uterina se encontra em sua borda superior, e o ovário, em sua superfície posterior . O útero e o ligamento largo dividem a cavidade pélvica em cavidade retouterina e cavidade vesicouterina. Os ductos paramesonéfricos fusionados dão origem ao corpo e ao colo do útero e à porção superior da vagina. O útero é cercado por uma camada de mesênquima que forma sua cobertura muscular, o miométrio e seu revestimento peritoneal, o perimétrio. Na ausência de testosterona, os ductos mesonéfricos na mulher degeneram. A. Ductos genitais na mulher, no final do segundo mês. Repare no tubérculo paramesonéfrico (mülleriano) e na formação do canal uterino. B. Ductos genitais após a descida do ovário. As únicas porções remanescentes do sistema mesonéfrico são o epoóforo, o paraóforo e o cisto de Gartner. Repare no ligamento suspensor do ovário, no ligamento próprio do ovário e no ligamento redondo do útero. SRY é um fator de transcrição e o gene mestre do desenvolvimento testicular. Aparentemente ele age em conjunto com o gene autossômico SOX9, um regulador transcricional que também pode induzir a diferenciação testicular. SOX9 é conhecido por se ligar à região promotora do gene do AMH (MIS), provavelmente regulando a expressão desse gene. SRY e/ou SOX9 induz inicialmente a secreção de FGF9 pelos testículos, que, por sua vez, age como um fator quimiotático e faz com que os túbulos do ducto mesonéfrico penetrem o sulco gonadal. Sem essa penetração, a diferenciação dos testículos não continua. Em seguida, SRY aumenta a expressão, seja direta ou indiretamente, do fator de esteroidogênese 1 (SF1, do inglês steroidogenesis factor 1), que estimula a diferenciação das células de Sertoli e de Leydig. SF1 com SOX9 aumentam a concentração de AMH, levando à regressão dos ductos paramesonéfricos (müllerianos). Nas células de Leydig, SF1 aumenta a regulação dos genes para enzimas que sintetizam testosterona. A testosterona entra nas células dos tecidos-alvo, onde permanece intacta ou pode ser convertida a di- hidrotestosterona pela enzima 5-α redutase. A testosterona e a di-hidrotestosterona se ligam a um receptor intracelular específico de alta afinidade, e esse complexo receptor-hormônio é transportado para o núcleo, onde se liga ao DNA para regular a transcrição de genes teciduais específicos e seus produtos proteicos. O complexo testosterona-receptor medeia a diferenciação dos ductos mesonéfricos, formando o vaso deferente, as vesículas seminais, os dúctulos eferentes e o epidídimo. Os complexos receptor-di-hidrotestosterona modulam a diferenciação da genitália externa masculina . Esquema mostrando os genes responsáveis pela diferenciação dos testículos e dos ovários. Tanto nos homens quanto nas mulheres, SOX9 e WNT4 são expressos nas cristas gonadais. Nos homens, a expressão de SRY aumenta a expressão de SOX9, que, por sua vez, ativa a expressão de SG1 e de outros genes responsáveis pela diferenciação testicular, enquanto inibe a expressão de WNT4. Nas mulheres, a falta de inibição de WNT4 aumenta a expressão de DAX1, que, por sua vez, inibe a expressão de SOX9. Assim, sob a influência contínua de WNT4, outros genes-alvo cascata abaixo (talvez TAFII105) induzem a diferenciação ovariana. Formação do útero e da vagina. A. Nona semana. Repare no desaparecimento do septo uterino. B. Final do terceiro mês. Repare no tecido dos bulbos sinovaginais. C. Recém-nascida. Os fórnices e a porção superior da vagina são formados por vacuolização do tecido paramesonéfrico, e a porção inferior da vagina é formada por vacuolização dos bulbos sinovaginais. WNT4 é o gene determinante dos ovários. Esse gene aumenta a expressão de DAX1, um membro da família de receptores hormonais nucleares, que inibe a função de SOX9. Além disso, WNT4 regula a expressão de outros genes responsáveis pela diferenciação ovariana, mas esses genes-alvo não foram identificados. Um alvo pode ser TAFII105, cujo produto proteico é uma subunidade da proteína de ligação TATA para a RNA polimerase nas células ovarianas foliculares. Camundongos fêmeas que não sintetizam essa subunidade não formam ovários. Os estrógenos também estão envolvidos na diferenciação sexual, e, sob sua influência, os ductos paramesonéfricos (müllerianos) são estimulados a formar as tubas uterinas, o útero, o colo do útero e a porção superior da vagina. Além disso, os estrógenos agem sobre a genitália externa no estágio indiferenciado para formar os grandes lábios, os pequenos lábios e a porção inferior da vagina. Logo após a extremidade sólida dos ductos paramesonéfricos entrar em contato com o seio urogenital , duas evaginações sólidas crescem para fora da porção pélvica do seio . Essas evaginações, os bulbos sinovaginais, proliferam e formam uma placa vaginal sólida. A proliferação continua na extremidade cranial da placa, aumentando a distância entre o útero e o seio urogenital. No quinto mês, a protuberância vaginal está completamente canalizada. As expansões em formato de asa da vagina ao redor do final do útero, os fórnices vaginais, são de origem paramesonéfrica . Assim, a vagina tem origem dupla, com a porção superior oriunda do canal uterino e a porção inferior derivada do seio urogenital. O lúmen da vagina permanece separado daquele do seio urogenital por uma lâmina tecidual fina, o hímen , que consiste no revestimento epitelial do seio e uma camada fina de células vaginais. Em geral, ele desenvolve uma pequena abertura na vida perinatal. A mulher pode reter alguns remanescentes dos túbulos excretórios cranial e caudal no mesovário, onde eles formam o epoóforo e o paraóforo, respectivamente . O ducto mesonéfrico desaparece, exceto em uma pequena porção cranial encontrada no epoóforo e, ocasionalmente, uma pequena porção caudal que é encontrada na parede do útero ou da vagina. Mais tarde na vida, ele pode formar o cisto de Gartner. A duplicação do útero resulta da falta de fusão dos ductos paramesonéfricos em uma área específica ou em toda a sua linha de fusão normal. Em sua forma mais extrema, o útero é completamente duplicado (útero didelfo) ; na forma menos grave, o útero apenas apresenta uma discreta endentação na porção média (útero arqueado). Uma das anomalias relativamente mais comuns é o útero bicorno, que tem dois cornos com uma vagina em comum . Essa condição é normal em muitos mamíferos abaixo dos primatas. Em pacientes com atresia parcial ou completa dos ductos paramesonéfricos,a porção rudimentar se encontra como um apêndice do lado mais bem desenvolvido. Uma vez que seu lúmen geralmente não se comunica com a vagina, complicações são comuns (útero bicorno com um corno rudimentar) . Se a atresia envolver ambos os lados, pode resultar em atresia do colo uterino . Se os bulbos sinovaginais não se fusionarem ou se nem chegarem a se desenvolver, o resultado é vagina dupla ou atresia vaginal, respectivamente . No último caso, uma pequena bolsa vaginal originária dos ductos paramesonéfricos circunda a abertura do colo do útero. Na terceira semana do desenvolvimento, as células mesenquimais que se originam na região da linha primitiva migram ao redor da membrana cloacal, formando um par de pregas cloacais levemente elevadas . Cranialmente à membrana cloacal, as pregas se unem para formar o tubérculo genital. Caudalmente, as pregas são subdivididas anteriormente em pregas uretrais e posteriormente em pregas anais. Enquanto isso, outro par de elevações, os tubérculos genitais, se torna visível de cada lado das pregas uretrais. Esses tubérculos formam mais tarde as saliências labioescrotais nos homens e os grandes lábios nas mulheres . Entretanto, no final da sexta semana, é impossível distinguir entre os dois sexos. Estágios indiferenciados da genitália externa. A. Aproximadamente 4 semanas. B. Aproximadamente 6 semanas. O desenvolvimento da genitália externa no homem está sob a influência de andrógenos secretados pelos testículos fetais e é caracterizado pelo alongamento rápido do tubérculo genital, que agora é chamado de falo . Durante seu alongamento, o falo puxa as pregas uretrais para frente, de modo que elas formam as paredes laterais do sulco uretral. Esse sulco se estende ao longo do aspecto caudal do falo alongado, mas não chega à sua parte mais distal, a glande. O revestimento epitelial do sulco, que se origina no endoderma, forma a placa uretral . No final do terceiro mês, as duas pregas uretrais se fecham ao redor da placa uretral, formando a uretra peniana . Esse canal não se estende até a ponta do falo. Essa porção mais distal da uretra é formada durante o quarto mês, quando as células ectodérmicas da ponta da glande penetram internamente e formam um pequeno cordão epitelial. Esse cordão, mais tarde, adquire um lúmen, formando assim o meato uretral externo . As protuberâncias genitais, conhecidas no homem como saliências labioescrotais, surgem na região inguinal. Com a continuação do desenvolvimento, elas se movem caudalmente e cada protuberância forma metade do escroto. As duas são separadas pelo septo escrotal . A. Desenvolvimento da genitália externa em um embrião masculino de 10 semanas. Repare no sulco uretral profundo flanqueado pelas pregas uretrais. B. Cortes transversais através do falo durante a formação da uretra peniana. O sulco urogenital está unido pelas pregas uretrais. C. Desenvolvimento da porção glandular da uretra peniana. D. Recém-nascido. Correlações clínicas Na hipospadia, a fusão das pregas uretrais é incompleta e ocorrem aberturas anormais da uretra ao longo da região inferior do pênis, em geral próximo à glande, ao longo do corpo, ou próximo à base do pênis (Figura 16.34). Em raros casos, o meato uretral se estende ao longo da rafe escrotal. Quando a fusão das pregas uretrais falha completamente, é encontrada uma grande fenda sagital ao longo de todo o comprimento do pênis e do escroto. As duas protuberâncias escrotais lembram, assim, os grandes lábios. A incidência de hipospadia é de 3 a 5/1.000 nascimentos, e essa taxa representa uma duplicação nos últimos 15 a 20 anos. As razões para esse aumento não são conhecidas, mas uma hipótese sugere que poderia ser resultado de aumento da concentração de estrógenos ambientais. Epispádia é uma anomalia rara (1/30.000 nascimentos) em que o meato uretral é encontrado no dorso do pênis (Figura 16.34D). Embora a epispádia possa ocorrer como defeito isolado, está associada mais frequentemente à extrofia da bexiga e ao fechamento anormal da parede corporal ventral (Figura 16.16). Micropênis ocorre quando o estímulo androgênico é insuficiente para o crescimento da genitália externa. O micropênis, em geral, é causado por hipogonadismo primário ou por disfunção hipotalâmica ou hipofisária. Por definição, o comprimento do pênis é 2,5 desvios-padrão abaixo da média (medido ao longo da superfície dorsal desde o púbis até a ponta do pênis estirado até a resistência). Pênis bífido ou pênis duplo pode ocorrer se o tubérculo genital se dividir. Os estrógenos estimulam o desenvolvimento da genitália externa feminina. O tubérculo genital se alonga apenas um pouco e forma o clitóris; as pregas uretrais não se fusionam como ocorre no homem, mas se desenvolvem nos pequenos lábios. As protuberâncias genitais aumentam e formam os grandes lábios. O sulco urogenital é aberto e forma o vestíbulo. Embora o tubérculo genital não se alongue extensivamente na mulher, ele é maior do que o masculino durante os estágios iniciais do desenvolvimento. De fato, a utilização do comprimento do tubérculo como critério (monitorado por ultrassonografia) resultou em erros na identificação do sexo durante o terceiro e o quarto meses de gestação. Desenvolvimento da genitália externa em um embrião feminino de 5 meses (A) e na recém-nascida (B). Correlações clínicas Uma vez que o desenvolvimento sexual de homens e de mulheres começa de modo idêntico, não é surpreendente que ocorram anomalias na diferenciação e na determinação sexuais. Genitália ambígua pode aparecer como um grande clitóris ou um pênis pequeno. Assim, o recém-nascido pode apresentar aparência tipicamente feminina, mas um grande clitóris (hipertrofia clitoriana), ou tipicamente masculina, com um pênis pequeno que é aberto em sua superfície ventral (hipospadia). Em alguns casos, essas anomalias resultam em indivíduos com características de ambos os sexos, que podem ser chamados de hermafroditas. Entretanto, hermafroditas verdadeiros têm tecidos gonadais masculino e feminino, e isso ainda não foi descrito em seres humanos. Em vez disso, esses indivíduos têm ovotestículos, gônadas com tecido testicular e ovariano. Eles podem ser tipicamente femininos ou tipicamente masculinos, ou podem ser intermediários em termos de desenvolvimento genital. Em 70% dos casos, o cariótipo é 46,XX, e, em geral, há um útero. As genitálias externas são ambíguas ou predominantemente femininas, e a maioria desses indivíduos é criada como mulher. Algumas vezes, o sexo genotípico (cromossômico) não corresponde ao fenótipo (aparência física). Por exemplo, a causa mais comum de ambiguidade sexual é a hiperplasia suprarrenal congênita (HSRC). Anomalias bioquímicas nas glândulas suprarrenais resultam em diminuição da produção de hormônios esteroides e aumento do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). Na maioria dos casos, a 21-hidroxilação é inibida. As mulheres com essa condição podem ter uma gama de características sexuais que variam desde a masculinização parcial com um grande clitóris até virilização e aparência masculinas. Em uma forma mais rara de HSRC, há deficiência de 17α-hidroxilase, o que resulta em mulheres com anatomia interna e externa feminina no nascimento, mas as características sexuais secundárias não aparecem na puberdade por causa da incapacidade de as suprarrenais ou os ovários produzirem hormônios sexuais. Consequentemente, não há desenvolvimento das mamas nem crescimento dos pelos pubianos. Em homens com deficiência de 17α-hidroxilase, a virilização é inibida. Outra causa de ambiguidade sexual é a síndrome da insensibilidade aos andrógenos. Os acometidos são homens (têm o cromossomo Y e testículos), mas não há receptores androgênicos ou os tecidos não respondem ao complexo receptor di-hidrotestosterona. Consequentemente, os andrógenos produzidos pelos testículos não são efetivos na indução da diferenciação da genitália masculina. Uma vez que esses pacientes têm testículos e existe a substância inibidora mülleriana, o sistema paramesonéfrico é suprimido e não hátubas uterinas nem útero. Em pacientes com a síndrome da insensibilidade completa aos andrógenos existe vagina, mas ela em geral é curta ou pouco desenvolvida. Os testículos são encontrados frequentemente nas regiões inguinal ou labial, mas a espermatogênese não ocorre. Além disso, aumenta o risco de tumores testiculares, e 3% desses indivíduos desenvolvem malignidades antes dos 50 anos de idade. Outros pacientes têm síndrome da insensibilidade leve aos andrógenos ou síndrome da insensibilidade parcial aos andrógenos. Na forma leve, ocorre virilização em graus variáveis, mas a genitália ambígua pode ocorrer na forma parcial, incluindo clitoromegalia ou um pênis pequeno com hipospadia. Em geral, há criptorquidia. A deficiência de 5-α-redutase é outra condição que causa genitália ambígua em homens e se deve à incapacidade de converter a testosterona em di-hidrotestosterona devido à falta da enzima redutase. Sem di- hidrotestosterona, a genitália externa não se desenvolve normalmente e os indivíduos podem parecer homens, mas com o desenvolvimento genital comprometido com hipospadia, ou podem parecer mulheres com clitoromegalia. Outras condições podem estar associadas à diferenciação sexual anormal. Por exemplo, a síndrome de Klinefelter, com o cariótipo 47,XXY (ou outras variações como XXXY), é o distúrbio cromossômico sexual mais comum e ocorre com uma frequência de 1/1.000 homens. Os pacientes apresentam diminuição da fertilidade, testículos pequenos e níveis diminuídos de testosterona. A ginecomastia (mamas aumentadas) é observada em aproximadamente 33% dos indivíduos afetados. A não disjunção dos homólogos XX é a causa mais comum. Na disgenesia gonadal, não há oócitos, e os ovários aparecem como gônadas em estrias. Os indivíduos são fenotipicamente femininos, mas podem ter vários complementos cromossômicos, incluindo XY. A disgenesia gonadal feminina XY (síndrome de Swyer) é resultado de mutações pontuais ou de deleções no gene SRY. Os indivíduos parecem mulheres normais, mas não menstruam nem desenvolvem características sexuais secundárias na puberdade. Os pacientes com a síndrome de Turner também têm disgenesia gonadal. Eles têm um cariótipo 45,X e estatura baixa, palato alto e arqueado, pescoço alado, tórax em escudo, anomalias renais e cardíacas e mamilos invertidos. Os testículos desenvolvem-se no retroperitônio, na região abdominal, e precisam se deslocar caudalmente e atravessar a parede abdominal até chegarem ao escroto. A passagem pela parede abdominal ocorre através do canal inguinal, com cerca de 4 cm de comprimento e situado logo acima da metade medial do ligamento inguinal. A entrada no canal é pelo anel inguinal profundo (interno) próximo ao tubérculo púbico. Próximo ao final do segundo mês, o mesentério urogenital liga os testículos e os mesonefros à parede abdominal posterior. Com a degeneração dos mesonefros, a ligação funciona como um mesentério para a gônada. Caudalmente, ele se torna ligamentoso e é conhecido como ligamento genital caudal. A partir do polo testicular caudal, projeta-se uma condensação mesenquimal rica em matriz extracelular, o gubernáculo . Antes da descida dos testículos, essa faixa de mesênquima termina na região inguinal entre os músculos oblíquos externo e interno do abdome, em diferenciação. Mais tarde, conforme os testículos começam sua descida na direção do anel inguinal interno, forma-se uma porção extra-abdominal do gubernáculo, que cresce da região inguinal para as protuberâncias escrotais. Quando os testículos atravessam o canal inguinal, essa porção extra-abdominal entra em contato com o assoalho escrotal (o gubernáculo também se forma nas mulheres, mas nos casos normais ele permanece rudimentar). Os fatores que controlam a descida dos testículos não estão completamente esclarecidos. Entretanto, parece que a protrusão da porção extra-abdominal do gubernáculo induz migração intra-abdominal, que o aumento da pressão intra-abdominal devido à projeção do órgão leva à passagem através do canal inguinal e que a regressão da porção extra-abdominal do gubernáculo completa o movimento dos testículos até o escroto. Normalmente, os testículos alcançam a região inguinal por volta da 12a semana de gestação e chegam ao escroto na 33a semana . O processo é influenciado por hormônios, incluindo andrógenos e MIS. Durante a descida, a irrigação sanguínea para os testículos proveniente da aorta é retida, e os vasos testiculares se estendem de sua posição lombar original até os testículos no escroto. Independentemente da descida dos testículos, o peritônio da cavidade abdominal forma uma evaginação em cada lado da linha média na parede abdominal ventral. Essa evaginação, o processo vaginal, acompanha o trajeto do gubernáculo testicular até as protuberâncias escrotais . Assim, o processo vaginal, acompanhado pelas camadas muscular e fascial da parede corporal, evagina na protuberância escrotal, formando o canal inguinal . Os testículos descem através do anel inguinal e acima da borda do osso púbico, e estão no escroto por ocasião do nascimento. Os testículos são cobertos, então, por uma prega refletida do processo vaginal . A camada peritoneal que recobre os testículos é a camada visceral da túnica vaginal; o remanescente do saco peritoneal forma a camada parietal da túnica vaginal . O canal estreito que conecta o lúmen do processo vaginal à cavidade peritoneal é obliterado no nascimento ou um pouco depois. Descida dos testículos. A. Durante o segundo mês. B. Na metade do terceiro mês. O revestimento peritoneal da cavidade corporal invagina na protuberância escrotal, onde forma o processo vaginal (túnica vaginal). C. No sétimo mês. D. Um pouco após o nascimento.. A conexão entre a cavidade abdominal e o processo vaginal pelo canal inguinal e no escroto se fecha normalmente no primeiro ano após o nascimento. Se essa conexão permanecer aberta, as alças intestinais poderão descer para o escroto, causando uma hérnia inguinal indireta congênita . Algumas vezes, a obliteração é irregular, deixando pequenos cistos ao longo de seu trajeto. Mais tarde, esses cistos podem secretar fluido, formando hidrocele dos testículos e/ou do cordão espermático . Em 97% dos recém- nascidos do sexo masculino, os testículos estão no escroto antes do nascimento. Na maior parte dos casos restantes, a descida se completa durante os três primeiros meses pós-natais. Entretanto, em menos de 1% dos recém-nascidos, um ou ambos os testículos não descem. A condição é chamada de criptorquidia e pode ser causada por diminuição da produção de andrógenos (testosterona). Os testículos que não desceram não conseguem produzir espermatozoides maduros, condição que está associada a 3 a 5% de incidência de anomalias renais. Além de serem cobertos por camadas peritoneais derivadas do processo vaginal, os testículos se tornam revestidos por camadas derivadas da parede anterior do abdome, por onde eles passam. Assim, a fáscia transversal forma a fáscia espermática interna; o músculo oblíquo interno do abdome dá origem à fáscia cremastérica e ao músculo cremastérico; e o músculo oblíquo externo do abdome forma a fáscia espermática externa. O músculo transverso do abdome não constitui uma camada, uma vez que ele se curva sobre essa região e não cobre o trajeto de migração. A descida das gônadas é consideravelmente menor nas mulheres do que nos homens, e os ovários finalmente se localizam logo abaixo da sonda da pelve verdadeira. O ligamento genital cranial forma o ligamento suspensor do ovário, enquanto o ligamento genital caudal forma o ligamento próprio do ovário e o ligamento redondo do útero . O último se estende até os grandes lábios. 1.Durante o desenvolvimento do sistema urinário, são formados três sistemas. Quais são eles e quais partes de cada um, se alguma, permanecem no recém-nascido? 2.Um recém-nascido aparentemente do sexo masculino não tem testículos no escroto. Mais tarde, é determinado que ambos encontram-se na cavidade abdominal. Qual é o termo dado a essa condição? Expliquea origem embriológica desse defeito. 3.É dito que as genitálias externas masculina e feminina têm similaridades. Quais são elas e quais são suas origens embriológicas? 4.Após vários anos tentando engravidar, uma mulher jovem procura orientação médica. O exame revela útero bicorno. Como essa anomalia poderia ocorrer?