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CRIMINOLOGIA - evolução histórica, teorias, correntes e políticas criminais

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CONCEITO
● Método empírico e indutivo (dedutivo vai do geral para o específico, indutivo pega
situações específicas e vai definindo uma regra); tem por objeto principalmente o
crime, o criminoso, a vítima (fatores vitimológicos), o sistema penal. Multidisciplinar.
EVOLUÇÃO HISTÓRICA
● 1) ideia de retribuição por um mal causado ao coletivo, bem como retribuições
privadas em conflitos particulares em decorrência de paixões que geram uma reação.
Guerra de todos contra todos, estado de natureza. Passa a ser escrito o que pode e o
que não pode (Código de Hammurabi), contrato social. Direito penal nasce para
substituir a vingança.
● 2) Influência do direito romano "poena".
● 3) Na Idade Média buscavam-se elementos para construir o direito. Inquisição como
ferramenta de controle pela Igreja e detenção de poder político, caça ao herege como
forma de aumentar seu poder. Legitimação da tortura, caça as bruxas (parteiras,
líderes comunitárias, curandeiras). Sistema inquisitorial: quem investiga, acusa e julga
é a mesma pessoa. Institucionalização da tortura e barbárie.
● 4) Iluminismo e escola clássica. Desenvolvimento de críticas ao sistema punitivo.
Necessário impor limites ao Estado (Rousseau, Hobbes e Locke). Ler "dos delitos e
das penas". Perspectiva ainda filosófica e crítica ao Estado.
● A criminologia começaria de fato no século XIX com o positivismo.
TEORIAS CRIMINOLÓGICAS
● Positivismo: defendido como marco da criminologia para alguns autores. Pai da
criminologia seria Cesare Lombroso, que estudava o comportamento do criminoso
por meio da anatomia. Teoria do criminoso nato na obra "O homem delinquente".
Determinismo biológico, portanto o criminoso não teria livre arbítrio. Como não tinha
tratamento, era defendida a aplicação da pena perpétua para evitar que aquele
indivíduo cometa crimes, uma vez que ele era intratável. Enrico Ferri cria teorias dos
substitutivos penais e dos relógios quebrados (ideia de que a sociedade é um grande
relógio e cada pessoa é uma peça. O criminoso é uma peça com defeito que deve ser
consertada ou descartada). Rafael Garofalo defendia as práticas imperialistas. No
Brasil, Nina Rodrigues (defendia o embranquecimento da população), Euclides da
Cunha e Afrânio Peixoto eram os positivistas. Erro do positivismo era analisar
somente pessoas encarceradas, que já eram marginalizadas e assim legitimou uma
opressão que já era exercida. Etiquetamento do negro como algo perigoso. Esse
positivismo permanece por meio do direito penal do autor (art. 59, CP); reincidência é
também um etiquetamento, visto que pressupõe que quem já cumpriu uma pena e
comete outro crime tem a vida voltada para o crime e, portanto, merece uma punição
maior, merece ter sua pena agravada; esterilização forçada/manipulação genética.
● Escola de Chicago: preocupação com o crescimento das cidades e influência dos
centros urbanos na criminalidade. Objeto de estudo vira a cidade, como se tivesse
uma vida própria. Dois pontos principais são:
○ mobilidade social - questão da migração, enfraquecimento de laços (no campo
há valores em comum, pessoas já se conhecem, há uma série de fatores que
influenciam a prática de crime) leva pessoa a perder a
solidariedade/reconhecimento, que seria um mecanismo de prevenção, logo o
vai e vem da cidade seria um fator que influencia na prática de crimes;
○ áreas de delinquência - locais refletiriam a moral dos seus habitantes (se a
moral influencia no aspecto do local, morar num ambiente precário
influenciaria na moral do cidadão, cria-se um estereótipo a partir do local onde
a pessoa mora). Ainda permanecem alguns resquícios dessa lógica das áreas
de delinquência, como as práticas de choque de ordem ("limpeza" da cidade
que recai sobre moradores de rua, ambulantes, etc), associação ao tráfico por
morar em favelas (inclusive para agravar pena), UPPs.
● Teoria da anomia: Anomia é a falta de reconhecimento quanto à legitimidade de uma
norma. Há lei, mas um fenômeno social no qual as pessoas não a reconhecem e não a
cumprem. Segundo Durkheim, o crime é um fenômeno normal, é normal haver
comportamentos que vão de encontro ao que é permitido. A queda da criminalidade
pode ser um sintoma de sociedade apática, que não questiona nada. O incremento
também é ruim, podendo significar que lei não significa mais nada ou os costumes
mudaram, vivenciando algo que não se identifica mais na lei. Merton identifica a
sociedade de consumo, que tenta nos convencer a ser feliz e bem-sucedido a partir da
obtenção de produtos mas não distribui de forma igualitária meios e oportunidades
para adquirir o bem, e quando aqueles que querem o bem não tem meio de conseguir
o bem, irão recorrer à prática do ilícito para entrar nessa sociedade de consumo.
● Teoria da associação diferencial de Sutherland: crime não é só praticado por pobres.
Quando você reprime uma demanda, aqueles que a esta estão envolvidos são
buscados meios marginais para se satisfazer. Surgem os crimes de colarinho branco
que viram o objeto de estudo. Crime não é algo que nasce com o sujeito, mas é um
hábito que se adquire. Nas trocas simbólicas o crime é aprendido (vê alguém que já
fez e deu certo, mostra que não é tão ruim).
● Teorias sub-culturais: Cohem em 1955. Delinquência juvenil, estudo do
comportamento em grupo. Jovem quer ser aceito pelo grupo e adota aqueles modelos
de comportamento. Grupo tem valores e moral próprias, diferentes da maioria. A
sociedade não é feita por um grupo único com um único interesse, mas uma série de
grupos e sub-grupos. Quem define a cultura adequada é o grupo dominante,
condenando as demais culturas.
● Teoria do conflito: conflito entre classes dominantes e dominadas. Direito penal é
criado para garantir os interesses da classe dominante em detrimento da classe
dominada. Quem detém maior poder econômico tem mais oportunidades e as exerce
sob a sua visão de mundo, que é de uma pessoa que sempre esteve em vantagem.
● Teoria do etiquetamento: Outsiders de Howard Becker. Determinados conceitos e
julgamentos decorrem do sucesso de um processo de etiquetamento, definir algo
como alguma coisa depende de quem o faz ter sucesso com isso, sucesso em
convencer os demais. A maioria das pessoas já praticou ilícito, mas o direito penal
seleciona quem vai punir. O desvio é uma etiqueta atribuída. A quantidade de crimes
praticados não entra na estatística, mas há maior chance de entrar na estatística aquele
que melhor se enquadra no rótulo de criminoso, se atende ao estereótipo.
CRIMINOLOGIA CRÍTICA
● Última grande teoria. Perspectiva mais de esquerda. Objeto de estudo é o sistema
penal, parte do pressuposto de que é um instrumento de controle que precisa ser
contido e deve-se estar atento e crítico aos arbítrios do Estado. Todas as demais
teorias influenciam-na. Defende uma teoria mais combativa. A seletividade do
sistema ocorre por uma soma de fatores, que devem ser combatidos. O Estado sempre
estará em conluio com o sistema capitalista, que o mantém.
● Criminologia Feminista: estudo da mulher na criminologia, tanto como vítima
quanto criminosa, tantos nos processos de vitimização quanto de criminalização.
Aumento do encarceramento feminismo entre 2000 e 2016, mas queda em 2019.
Aumento dos casos de violência doméstica, principalmente na pandemia (convívio
diário com o opressor). Importunação sexual virou crime. Problemática do aborto.
● Criminologia racial: vulnerabilidade do negro dentro do sistema penal. Alto índice
de pessoas negras no sistema carcerário. Ler estudo da Defensoria sobre audiência de
custódia.
● Criminologia cultural: analisa as culturas de massa e sub-culturas. Primeira vertente
dá atenção a influência cultural no sistema penal como produção de valores e
estereótipos, segunda vertente está mais atenta à marginalização de determinadas
produções culturais. Exemplo do espetáculo midiático do crime como influenciador
na criação de novos tipos penais com o objetivo de acabar com a impunidade (ideia
equivocada difundida na sociedade de que se deve aumentar o poder punitivo parareduzir a criminalidade). Simbolismo somente para agradar a sociedade diante de um
clamor público. Por outro lado, movimentos culturais e seus grupos são
criminalizados, como funk e marcha da maconha.
● Criminologia Queer: visa a desconstrução do modelo binário e modelo universal
dominante. Se coloca contra o modelo hegemônico. Violência homofóbica e tortura
(mudança na interpretação do Art. 1o, I, c da lei 9455/97 incluindo a discriminação
por orientação sexual).
● Criminologia Verde: relação com os crimes ambientais.
● Criminologia e crimes de Estado: violações de direitos humanos, crimes
econômicos, corrupção. Ainda pouco trabalhado. Pode cair sobre prova ilícita durante
a lava-jato.
POLÍTICAS CRIMINAIS
● Duas vertentes: uma preza mais pela segurança através de políticas públicas, no
entanto sacrificando direitos algumas vezes, outra preserva a segurança mas garante
direitos e liberdades. Defesa da segurança dos direitos (Baratta). Teoria da Justiça de
John Rawls.
● De um lado, direito à segurança. De outro, garantismo, abolicionismo e justiça
restaurativa (e também necropolítica).
● Política de Lei e Ordem: inserida em lógica de governo dentro de um modelo liberal.
Atrelado à revolução iluminista burguesa. O neoliberalismo decorre da lógica de
combate ao crescimento ao socialismo pós-Segunda Guerra. Política do Welfare State,
Estado investindo no social. A partir do momento em que não há mais concorrência
com o potencial socialista, o Estado reduz sua intervenção na economia e passa a
investir menos no bem-estar social, aumentando a pobreza. Aumento da privatização
e redução nos auxílios sociais. Aumentando miséria e desemprego, aumenta a
criminalidade de subsistência (roubo, furto, tráfico de drogas). Ler punição e estrutura
social. Entre a política de lei e ordem, a resposta do Estado passa a ser o investimento
no sistema penal. Uso do sistema punitivo para solucionar problemas decorrentes do
mercado neoliberal. Lógica da lei e ordem é concentrar recursos no sistema punitivo.
No Brasil isso foi observado com as novas leis na década de 90 (crimes hediondos, lei
de drogas, aumento da severidade punitiva). Surgimento da tolerância zero/teoria das
janelas quebradas (um Estado omisso, dando a impressão de abandono, faz com que
os indivíduos pensem que podem fazer o que quiser, logo o Estado tem que mostrar
sua presença por meio de um poder punitivo mais forte).
● Direito Penal do inimigo: desenvolvida por Jakobs. Sempre há uma figura construídas
de uma inimigo na sociedade que precisa ser combatido, que quer contaminar a
sociedade e deve ser enfrentado, sendo legítima qualquer atitude para exterminá-lo
(ex: herege, comunista, russos, drogas/latinos). Hoje o inimigo é o islâmico. Jakobs
afirma que não há violação a dignidade da pessoa humana, porque esta seria própria
do cidadão, e quem pratica determinados crimes demonstra que não mais se adequa na
categoria de cidadão ou mesmo de ser humano, portanto abre mão da sua dignidade e
assim não há violação.
● Política Atuarial: aplicação menor em comparação as demais. Visa trabalhar com
estatísticas e dados a respeito da probabilidade de cometer crimes. No entanto, ignora
causas e desumanização do sistema criminal. Se prende somente aos números e
norteia uma política sob um olhar frio. A intervenção vai recair somente nos locais
que viraram estatísticas. É uma política que enxerga o problema de forma mais
afastada.
● Encarceramento em massa: adotada nos EUA e Brasil (terceira maior população
carcerária do mundo). Quase 1/3 corresponde a presos provisórios (houve uma
redução, que pode ser atribuída às audiências de custódia).
● Outro lado: segurança dos direitos.
● Abolicionismo penal: leva em conta a seletividade penal que visa aquele que
corresponde ao estereótipo criminoso, afirmando que se somente uma pequena
quantidade de quem comete crime é punido, se essa punição for suprimida a
sociedade continuará a mesma. Louk Hulsman afirma que a execução da pena visa a
confirmar a vigência da norma, não resolve o problema em si, além de resultar no
etiquetamento daquele que é punido. PPL somente incrementa a exclusão social. "O
sistema penal é um monstro que só olha pra trás". A proposta é acabar com o sistema
penal. No entanto, na ausência do direito penal, se o conflito é devolvido à sociedade,
pode-se voltar ao estágio anterior à existência do direito penal, onde predominava as
formas vingativas para resolução de problemas.
● Garantismo Penal de Ferrajoli: sem direito penal, não há também limites ao Estado.
Concorda com todos os diagnósticos do abolicionismo, mas propõe uma nova solução
para evitar a vingança privada. Direito penal é uma garantia do indivíduo contra
possíveis arbítrios do Estado. Direito penal surge numa concepção contratualista, para
substituir a vingança por meio da apropriação do Estado, que passa a intervir nos
conflitos. Porém, o Estado deve exercer seu poder punitivo dentro de limites. Entra a
questão da dignidade da pessoa humana, aproximando o direito de um fundamento
éticos, sobretudo reconhecidos pelos direitos humanos. O fundamento interno seria a
Constituição. A dignidade da pessoa humana segundo o imperativo categórico de
Kant, tudo deve ser feito numa projeção universal, tem que valer pra todo mundo. A
dignidade é comum a todos, é entender o ser humano como um fim em si mesmo, não
podendo ser usado como um meio. Toda a lógica do sistema penal tem que reconhecer
isso. Não basta averiguar somente a legalidade normal da lei, mas seu conteúdo,
fazendo uma análise sob a perspectiva material.
● Realismo de esquerda: associa o problema do sistema penal ao capitalismo,
principalmente com a falha na distribuição de renda. Realismo marginal: a
criminologia deve ser construída a partir da realidade.
● Justiça restaurativa: busca a substituição das penas penais, principalmente por meio de
conciliação. Resolução 225 de 2016 do CNJ.
● Política Criminal de Drogas: quantos aos discursos que legitimam o controle, primeira
perspectiva vincula o usuário de drogas a um doente, pessoa que precisa ser
medicada. Outra é cultural, relaciona a uma imagem de rebelde. Moral, quem usa
drogas é ocioso, improdutivo, desleixado. Por fim, a política criminal que vincula a
droga a outros crimes. A droga se torna um problema criminal após a 2a Guerra
Mundial, devido a um estoque de morfina que teve que ser distribuída. Acontece o
mesmo na guerra do Vietnã com o consumo de heroína. Assim, começa o problema da
droga nas famílias brancas americanas, gerando uma exigência de intervenção do
Estado. Ideologia da defesa social: uso do direito penal para controlar conflitos, com
leis mais duras e polícia mais rigorosa. Década de 80 veicula a ideia de que o
traficante é um inimigo externo, adotando como normal a execução deste indivíduo e
fazendo uso de uma lógica de guerra. Política criminal de derramamento de sangue de
Nilo Batista fala desse enfrentamento bélico. Necropolítica: descaso com a vida
alheia, política de descarte.
● Criminalização dos protestos e movimentos sociais: violação de liberdade de reunião.
● Manicômios e reforma psiquiátrica: lei 10216/2001. Regra do art. 96 do CP é
tratamento ambulatorial, internação deve ser apenas quando necessário. STF entende
que o tempo da medida de segurança não pode ultrapassar o tempo correspondente à
pena máxima do delito cometido.

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