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Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 1 Sumário INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 3 MANDADO DE SEGURANÇA ................................................................................................. 5 NATUREZA JURÍDICA ........................................................................................................................ 5 FUNDAMENTO NORMATIVO .............................................................................................................. 5 CABIMENTO ................................................................................................................................... 6 Direito líquido e certo ............................................................................................................ 6 Ato de autoridade ................................................................................................................. 8 Prazo .................................................................................................................................... 11 ESPÉCIES ..................................................................................................................................... 14 DESISTÊNCIA ................................................................................................................................ 15 AÇÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADI).................................................. 17 CONCEITO ................................................................................................................................... 17 CABIMENTO ................................................................................................................................. 17 Parâmetro de controle ........................................................................................................ 17 Objeto de controle ............................................................................................................... 19 MANDADO DE INJUNÇÃO .................................................................................................. 25 NATUREZA JURÍDICA ...................................................................................................................... 25 FUNDAMENTO NORMATIVO ............................................................................................................ 25 CABIMENTO ................................................................................................................................. 26 DECISÃO E COISA JULGADA .............................................................................................................. 28 Evolução jurisprudencial ..................................................................................................... 29 Previsão legal ...................................................................................................................... 32 AÇÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (ADO) ......................... 38 CONCEITO ................................................................................................................................... 38 NATUREZA JURÍDICA ...................................................................................................................... 38 CABIMENTO ................................................................................................................................. 38 Parâmetro ........................................................................................................................... 38 Objeto .................................................................................................................................. 39 ADO X MANDADO DE INJUNÇÃO ...................................................................................................... 42 RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL........................................................................................ 44 NATUREZA JURÍDICA ...................................................................................................................... 44 FUNDAMENTO NORMATIVO ............................................................................................................ 47 Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 2 CABIMENTO ................................................................................................................................. 48 Hipóteses ............................................................................................................................. 48 Prazo .................................................................................................................................... 56 Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 3 Introdução Embora a Constituição não seja um diploma primordialmente processual, decorrem dela instrumentos aptos a tutelar direitos trazidos pelo constituinte. A esses instrumentos dá-se o nome de ações constitucionais. As ações constitucionais são um gênero, do qual são espécies: as ações coletivas, os remédios constitucionais, as ações do controle concentrado de constitucionalidade e a reclamação. Ação coletiva é o meio jurisdicional de solução coletiva de conflitos. Em verdade, cuida-se do instrumento pelo qual se busca, junto ao Poder Judiciário, uma tutela coletiva. São ações coletivas a ação civil pública (ACP), a ação popular (AP), o mandado de segurança coletivo (MS coletivo), o mandado de injunção coletivo (MI coletivo) e o habeas corpus coletivo (HC coletivo). Observação: Não trataremos especificamente, na presente obra, da ação de improbidade administrativa. Isso porque a ação de improbidade é uma espécie de ação civil pública. Ao analisarmos este assunto, fizemos as observações que julgamos pertinentes sobre a ação de improbidade. Observação: O MS coletivo e o MI coletivo são, também, espécies de remédios constitucionais. Além deles, recentemente, o STF admitiu o cabimento de HC coletivo. Essas ações, por serem simultaneamente ações coletivas e remédios constitucionais, foram abordadas quando dentro dos respectivos remédios constitucionais. Os remédios constitucionais, por sua vez, são os meios de defesa, jurisdicionais ou não, dos direitos fundamentais. Embora a expressão seja criticada por alguns autores (Manoel Gonçalves Ferreira Filho) e celebrada por outros (André Ramos Tavares), é ampla a sua utilização pelos doutrinadores brasileiros. Observação: Muitos autores limitam a expressão “remédios constitucionais” aos meios jurisdicionais de defesa dos direitos individuais, incluindo em seu Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 4 rol tão somente os habeas corpus, o habeas data, o mandado de segurança, o mandado de injunção e a ação popular. Adotamos, contudo, um conceito amplo de remédios constitucionais, de modo a incluir também o direito de petição, que é um meio não jurisdicional de defesa dos direitos individuais. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 5 Mandado de segurança Natureza jurídica O mandado de segurança é o remédio constitucional voltado à proteção de direitos líquidos e certos, quando não couber outro remédio específico, notadamente o habeas corpus ou o habeas data. Assim, o mandado de segurança possui um caráter subsidiário em relação ao habeas corpus e o habeas data: se o direito líquido e certo vilipendiado for tutelável por meio desses outros dois remédios constitucionais, não será cabível o mandado de segurança. Como o assunto foi cobrado em prova: Na prova para ingresso na carreirade Procurador do Estado/SC (2018), a Banca Examinadora considerou errada alternativa que assim dispunha: “Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, amparado ou não por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”. O erro encontra-se no “amparado”, pois o mandado de segurança não será cabível quando o direito líquido e certo for amparado por habeas corpus ou habeas data. Fundamento normativo O MS é estatuído pela Constituição Federal (art. 5º, LXIX e LXX) e pela Lei do Mandado de Segurança – LMS (Lei 12.016/09). O que dizem a lei e a Constituição? LMS, Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. § 1º Equiparam-se às autoridades, para os efeitos desta Lei, os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 6 como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições. § 2º Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público. § 3º Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas poderá requerer o mandado de segurança. CF, Art. 5º LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Art. 5º, LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados. Cabimento Podem-se sintetizar os requisitos de cabimento do mandado de segurança da seguinte forma: a) Um direito líquido e certo de uma coletividade – compreendido sob a ótica processual, ou seja, como aquele provado independentemente de instrução probatória dentro do processo; b) Ameaçado ou violado por ato abusivo ou ilegal; c) De autoridade pública ou agente revestido de atribuição pública. Direito líquido e certo Para bem compreender o que é o mandado de segurança, bem como quais são as suas hipóteses de cabimento, é preciso, inicialmente, delimitar o que é “direito líquido e certo”. Hely Lopes de Meirelles conceitua o direito líquido e certo como sendo aquele que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração (direito líquido e certo sob a ótica material). Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 7 O brilhante autor paulista, todavia, faz uma arguta observação que é replicada por toda a doutrina brasileira. Na verdade, o que é líquido e certo não é o direito, uma vez que, a rigor, todo direito seria líquido e certo, mas sim as alegações de fato feitas pelo autor. Desse modo, a exigência de “direito líquido e certo” feita pelo constituinte e pelo legislador infraconstitucional é cumprida quando o autor do mandamus produza, junto à petição inicial, prova pré-constituída que comprove os fatos nela alegados (direito líquido e certo sob a ótica processual). É por isso que, como veremos a seguir, não há que se falar em dilação probatória no mandado de segurança, pois é ônus do impetrante produzir todas as provas em um único momento processual: o registro ou distribuição da petição inicial. Embora haja alguma divergência em doutrina acerca da natureza da prova apta a demonstrar a liquidez e certeza das alegações de fato do impetrante, o único tipo de prova admitido no mandado de segurança é a prova documental¸ que é aquela prova composta por um objeto que representa um fato. Discute-se se a prova documentada – aquela que nasce em outro processo como testemunhal ou pericial, por exemplo, e é trazida, como documento, para a ação de mandado de segurança – deve ser admitida: 1) Primeira corrente (Leonardo Cunha): não se admite, assim, a prova documentada, que é aquela prova que não é documental, mas foi reduzida a termo, para fins de admissibilidade do mandado de segurança; 2) Segunda corrente: a prova documentada, sendo documental no processo de mandado de segurança, pode ser juntada à inicial e admitida para comprovar o direito líquido e certo. A ausência de prova pré-constituída acarreta a extinção sem resolução do mérito, posto que não foi preenchido um dos pressupostos de cabimento do writ. Ainda sobre o direito líquido e certo, algumas derradeiras observações devem ser feitas. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 8 A primeira é que a exigência de prova pré-constituída para que a via do mandado de segurança seja admissível não se confunde com a complexidade da matéria (súmula 625 do Supremo Tribunal Federal). Como entende a jurisprudência? Súmula 625 do STF: Controvérsia sobre matéria de direito não impede a concessão da segurança. A segunda observação é que, ainda que o impetrante não comprove, no registro ou distribuição da petição inicial, a matéria fática alegada, esses fatos poderão se tornar incontroversos se a autoridade apontada como coatora, em suas informações, não os controverter. Nessa hipótese, o mandado de segurança deverá ser admitido, ainda que não tenha havido a produção de prova documental no momento oportuno. Ato de autoridade A CF dispõe que não são todos os casos de violação ou ameaça a direito líquido e certo que estão amparados pelo mandado de segurança, mas somente aqueles que forem praticados por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Considera-se autoridade pública todo aquele que, integrando os quadros da Administração Pública, está investido de poder de decisão, podendo editar atos administrativos decisórios. Para fins de cabimento do mandado de segurança, equiparam-se às autoridades, os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições (artigo 1º, §1º da Lei n.º 12.019/16). A rigor, o mandado de segurança é cabível contra ato ilegal ou em abuso de poder de qualquer autoridade. Há, contudo, algumas hipóteses que precisam ser analisadas mais detidamente, seja porque a própria lei as excluiu expressamente, seja porque são limítrofes e podem gerar certa dúvida: a) Atos praticados por administradores de empresas públicas, sociedades de economia mista e de concessionárias de Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 9 serviço público: não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial (natureza privada). • Entretanto, a Constituição Federal dá um tratamento diferenciado às empresas públicas e sociedades de economia mista, aplicando-lhes, expressamente, algumas regras de direito público (licitação para contratar bens e serviços relativos à atividade-meioe realização de concurso público para a seleção de sua mão-de-obra), de natureza pública, consequentemente, cabível o mandado de segurança para impugná-los (súmula 333 do STJ). Como entende a jurisprudência? Súmula 333 do STJ: Cabe mandado de segurança contra ato praticado em licitação promovida por sociedade e economia mista ou empresa pública. b) Ato do qual caiba recurso administrativo: não se concederá o mandado de segurança quando se tratar de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução. • Na verdade, para a doutrina e a jurisprudência, o que não se aceita é a impetração de mandado de segurança quando efetivamente o recurso administrativo com efeito suspensivo tenha sido interposto, pois o ato não poderá produzir qualquer efeito e, consequentemente, nenhuma ameaça ou lesão ao direito do impetrante. c) Decisão judicial: não se concederá o mandado de segurança quando o ato impugnado for decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo ou que já tenha transitado em julgado. • Assim, é cabível o mandamus, desde que não haja previsão, em nosso sistema processual, de recurso adequado e eficaz para combater a decisão. Quando o relator conceder efeito suspensivo ope iudicis, por exemplo, o MS não terá vez. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 10 d) Decisão judicial transitada em julgado: não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado, ou seja, como sucedâneo de ação rescisória (súmula 268 do STF). • A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, todavia, já decidiu que o mandado de segurança deverá ser apreciado independentemente de superveniente trânsito em julgado, não podendo ser invocada a sua perda de objeto. Como entende a jurisprudência? Súmula 268 do STF: Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado. STJ: É incabível mandado de segurança contra decisão judicial transitada em julgado, incidindo, portanto, o teor do art. 5º, inciso III, da Lei n. 12.016/2009 e da Súmula n. 268/STF. Precedentes. No entanto, sendo a impetração do mandado de segurança anterior ao trânsito em julgado da decisão questionada, mesmo que venha a acontecer, posteriormente, não poderá ser invocado o seu não cabimento ou a sua perda de objeto, mas preenchidas as demais exigências jurídico-processuais, deverá ter seu mérito apreciado.(STJ, EDcl no MS 22.157/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Rel. P/ Acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 14/03/2019) e) Lei em tese: não cabe MS para impugnar lei em tese (súmula 266 do STF). • Isso não se confunde com a impetração do mandamus para atacar atos legislativos, ou seja, os atos praticados por parlamentares na elaboração da lei (Hely Lopes Meirelles). Como entende a jurisprudência? Súmula 266 do STF: Não cabe mandado de segurança contra lei em tese. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 11 f) Omissões de autoridade pública: a ilegalidade ou o abuso de poder pode ocorrer por meio de uma omissão perpetrada pela autoridade pública, hipótese em que será cabível o mandado de segurança. g) Ato disciplinar: com o advento da atual Lei do Mandado de Segurança, é indiscutível o cabimento. • Observação: a antiga lei de mandado de segurança (Lei n.º 1.533/51) vedada expressamente a utilização do mandado de segurança para atacar atos disciplinares, salvo quando praticados por autoridade incompetente ou com inobservância de formalidade essencial. Como o assunto foi cobrado em concurso? Na prova para ingresso na carreira de Promotor de Justiça/MG (2018), foi considerada incorreta a seguinte afirmação: “Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça, incluídos os administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público, nos atos de gestão comercial”. De fato, como estudamos, não cabe mandado de segurança contra atos de gestão comercial praticados por administradores de empresas públicas, sociedades de economia mista e concessionárias de serviços públicos. Prazo O artigo 23 da Lei n.º 12.019/16, repetindo o teor do artigo 18 da Lei n.º 1.533/51, prevê que o direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado. Cuida-se de prazo de natureza decadencial, e não prescricional, razão pela qual, uma vez iniciado, não há que se falar em interrupção ou suspensão Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 12 de seu decurso. O STJ, no entanto, reconhece a possibilidade da prorrogação deste prazo, desde que o seu termo final caia em dia que não haja expediente forense. Como entende a jurisprudência? O prazo para a impetração do mandado de segurança (art. 18 da Lei nº 1.533/51) tem início no primeiro dia útil após a ciência do ato impugnado. Outrossim, caso o marco final recaia em um feriado forense, prorroga-se o prazo para o primeiro dia útil seguinte. Precedentes do STJ e do STF. O plantão judiciário constitui figura concebida para permitir o exame durante os feriados e recessos forenses das medidas de caráter urgente, ou seja, possibilitar o acesso ao Poder Judiciário ininterruptamente para salvaguardar o direito daquele que se vê na iminência de sofrer grave prejuízo em decorrência de situações que reclamam provimento jurisdicional imediato. O termo final do prazo para impetração do mandado de segurança não se enquadra nesse conceito de emergência, sendo igualmente certo que, caso se albergasse a tese contraposta, o funcionamento contínuo do Poder Judiciário acabaria, na verdade, prejudicando aquele que tivesse interesse na impetração de um writ, pois, ainda que não houvesse urgência no pleito, o prazo para o ajuizamento acabaria por ser reduzido em virtude do plantão. A impetração do mandado de segurança observou o disposto no art. 18 da Lei nº 1.533/51, não havendo que se cogitar de decadência, daí porque os autos devem retornar à Corte de origem para que dê prosseguimento ao feito, sendo induvidoso que a causa não está madura para pronto julgamento na medida em que sequer foram prestadas informações pela autoridade coatora. (RMS 22.573/MS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 09/02/2010) Havia celeuma doutrinária sobre a constitucionalidade ou não deste prazo: 1) Primeira corrente: o prazo é inconstitucional, porque não é dado ao legislador infraconstitucional limitar o cabimento de garantia constitucionalmente assegura. 2) Segunda corrente (súmula 632 do STF): a previsão é constitucional, porque razoável. Como entende a jurisprudência? Súmula 632 do STF: É constitucional lei que fixa o prazo de decadência para a impetração do mandado de segurança Quanto ao início do prazo, deve-se observar que: a) No mandado de segurança repressivo, se inicia quando o ato a ser impugnado se torna operante e exequível, ou seja, quando a ofensa à esfera jurídica do impetrante se concretiza. • A interposição de recurso administrativo com efeito suspensivo impede que o ato produza seus efeitos, de modo que o prazo só começa a ser contado da intimação do seu resultado final. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 13 • O simples pedido de reconsideração administrativo não inibe ou interrompe o prazo de cento e vinte dias, entendimento esse sumulado pelo SupremoTribunal Federal (Enunciado n.º 430 da Súmula do STF). Como entende a jurisprudência? Súmula 430 do STF: Pedido de reconsideração na via administrativa não interrompe o prazo para o mandado de segurança. b) No mandado de segurança preventivo, em que há tão somente uma ameaça ao direito, a ofensa se concretiza quando o ato se perfectibiliza, mas ainda não foi executado. c) No caso de omissão, duas situações devem ser distinguidas, de acordo com o STF: • Caso haja um prazo legal estabelecido para que a autoridade pratique o ato, o prazo do mandado de segurança inicia-se a partir do seu termo final. Como entende a jurisprudência? Esgotado o prazo legal para a prática do ato omissivo pela autoridade impetrada (Regimento Interno do Senado Federal, art. 118, b) começa a correr o prazo de cento e vinte dias, para impetrar mandado de segurança, o qual se esgotou antes da impetração. Decadência verificada. Mandado de segurança não conhecido. (MS 23126, Relator(a): Min. Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, julgado em 30/09/1998). • Se estivermos diante de um ato omissivo continuado, não há que se falar em prazo de impetração, pois a ofensa se renova dia a dia. Como entende a jurisprudência? A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que, em se tratando de relação jurídica de caráter continuado, o prazo para impetrar mandado de segurança renova-se a cada omissão da Administração Pública. Tratando-se de ato comissivo, o prazo de 120 dias para a impetração conta-se a partir do momento em que consumado. (MS 26733 AgR, Relator(a): Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 05/11/2007). Como o assunto foi cobrado em concurso? Na prova para ingresso na carreira de Juiz de Direito do TJ/AL (2019), foi considerada incorreta a seguinte afirmativa: “Quanto ao remédio constitucional mandado de segurança, o pedido de reconsideração na esfera administrativa Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 14 interrompe o prazo decadencial para sua impetração”. De fato, como estudamos, o STF possui entendimento sumulado em sentido contrário. Espécies O mandado de segurança pode ser dividido, tomando por base o momento em que se tutela o direito líquido e certo, em preventivo e repressivo: a) O mandado de segurança será preventivo sempre que o ato ilegal ou abusivo esteja em vias de ser praticado, mas ainda não o foi, para evitar a lesão de direito, que se encontra somente ameaçado, desde que de maneira concreta, não se admitindo o manejo para coibir ameaça em tese de direito, pois faltaria interesse de agir por parte do impetrante. b) O mandado de segurança repressivo, por sua vez, é aquele em que o direito já foi violado e tem por objetivo corrigir tal situação. Assim, concretizada a lesão ao “direito líquido e certo”, fala-se em manado de segurança repressivo, e não mais preventivo. O mandado de segurança pode também ser dividido, caso o critério adotado seja a titularidade do direito líquido e certo que se supõe ameaçado ou violado, em individual e coletivo. Caso o direito seja de titularidade de apenas do indivíduo, teremos o mandado de segurança individual. Por outro lado, caso o direito invocado seja transindividual, o mandado de segurança será coletivo. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso LXX, e a Lei n.º 12.019/16, em seus artigos 21 e 22, trataram, ainda que de forma tímida, do mandado de segurança coletivo. Analisando-se esses dispositivos, surgem uma relevante questão, que se refere a que tipo de direitos transindividuais podem ser objeto do mandado de segurança coletivo. A lei, nos incisos do parágrafo único do artigo 21, limitou o cabimento aos direitos individuais homogêneos e aos direitos coletivos. A doutrina discute a persistência dessa previsão: Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 15 1) Primeira corrente (Hely Lopes Meirelles): os direitos difusos não podem ser objeto do mandado se segurança coletivo, por inexistir direito líquido e certo do impetrante; 2) Segunda corrente (Aluisio Mendes, Hermes Zaneti, Rodolfo Mancuso): o MS é cabível para tutelar direitos difusos, sendo inconstitucional a vedação legal, em desacordo com a autorização geral da Constituição. O STF possui pontuais decisões ventilando a possibilidade do manejo do mandado de segurança também para a tutela de direitos difusos. Inclusive, recentemente, em decisão monocrática, o Min. Gilmar Mendes externou esse entendimento (RE 193382, Rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, julgado em 28/06/1996, e MS 34070 MC, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/03/2016). Igualmente, existe decisão do STJ autorizando que o Ministério Público ajuíze qualquer ação para a tutela de direitos difusos, inclusive o mandado de segurança coletivo. Como entende a jurisprudência? STJ: O novel art. 129, III, da Constituição Federal habilitou o Ministério Público à promoção de qualquer espécie de ação na defesa de direitos difusos e coletivos não se limitando à ação de reparação de danos. Hodiernamente, após a constatação da importância e dos inconvenientes da legitimação isolada do cidadão, não há mais lugar para o veto da legitimatio ad causam do MP para a Ação Popular, a Ação Civil Pública ou o Mandado de Segurança coletivo. Em conseqüência, legitima-se o Parquet a toda e qualquer demanda que vise à defesa dos interesses difusos e coletivos, sob o ângulo material ou imaterial. Deveras, o Ministério Público está legitimado a defender os interesses transindividuais, quais sejam os difusos, os coletivos e os individuais homogêneos. (STJ, REsp 700.206/MG, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 09/03/2010) Desistência O STF, em julgamento com repercussão geral, fixou o entendimento de que o impetrante pode desistir da ação mandamental a qualquer tempo antes Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 16 do trânsito em julgado, independentemente da anuência da autoridade coatora. Como entende a jurisprudência? “É lícito ao impetrante desistir da ação de mandado de segurança, independentemente de aquiescência da autoridade apontada como coatora ou da entidade estatal interessada ou, ainda, quando for o caso, dos litisconsortes passivos necessários” (MS 26.890-AgR/DF, Pleno, Ministro Celso de Mello, DJe de 23.10.2009), “a qualquer momento antes do término do julgamento” (MS 24.584-AgR/DF, Pleno, Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 20.6.2008), “mesmo após eventual sentença concessiva do ‘writ’ constitucional, (…) não se aplicando, em tal hipótese, a norma inscrita no art. 267, § 4º, do CPC” (RE 255.837- AgR/PR, 2ª Turma, Ministro Celso de Mello, DJe de 27.11.2009). Jurisprudência desta Suprema Corte reiterada em repercussão geral (Tema 530 - Desistência em mandado de segurança, sem aquiescência da parte contrária, após prolação de sentença de mérito, ainda que favorável ao impetrante). (STF, RE 669367, Relator(a): Min. Luiz Fux, Relator(A) P/ Acórdão: Min. Rosa Weber, Tribunal Pleno, julgado em 02/05/2013). Desse modo, mesmo após a prolação de sentença de mérito, é possível que impetrante desista o mandamus, desde que antes do trânsito em julgado. Como assunto foi cobrado em concurso? Esse entendimento do STF tem sido objeto de frequente cobrança em provas de concurso público. A título de exemplo, na prova para ingresso na carreira de Juiz de Direito do TJ/AM (2016), foi considerada incorreta a seguinte frase: “Não se admite que o impetrante desista da ação de mandado de segurança sem aquiescência da autoridade apontada como coatora ou da entidade estatal interessada, após prolação de sentença de mérito”. No mandado de segurança coletivo, estende-se o tratamento da ação civil pública, exigindo-se, doutrinariamente, que sejam intimados os colegitimados paraque assumam a ação, salvo se manifestamente infundada. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 17 Ação declaratória de inconstitucionalidade (ADI) Conceito A ação direta de inconstitucionalidade, também conhecida como ação genérica, é a principal ação do controle concentrado. Cuida-se da ação constitucional que tem por finalidade a defesa da ordem constitucional, possibilitando a verificação de compatibilidade entre as normas constitucionais e os atos normativos primários. Cabimento Parâmetro de controle A ADI tem por parâmetro todas as normas constitucionais, expressas ou implícitas, constantes da parte permanente ou transitória. Assim, servem de parâmetro de controle na ADI: a) As normas constitucionais, expressas ou implícitas, constantes do corpo permanente da Constituição, não importando se originárias ou fruto de emenda à constituição; b) As normas previstas no ADCT, desde que não tenham tido sua eficácia exaurida; c) Os tratados de direitos humanos aprovados pelo procedimento de emenda constitucional (artigo 5º, §3º da Constituição Federal); Observação: Tratados internacionais, ainda que sobre direitos humanos, que não forem aprovados pelo procedimento de emenda constitucional não podem ser usados como parâmetro em sede de controle de constitucionalidade1. O preâmbulo, conforme entendimento predominante, tem caráter meramente interpretativo, não fazendo parte do bloco de constitucionalidade e não servindo de parâmetro de controle. 1 STF, Tribunal Pleno, ADI 2.030/SC, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 9.8.2017 (Informativo n.º 872). Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 18 É comum, em doutrina, a afirmação de que a norma constitucional deve estar em vigor para que possa servir de parâmetro de controle em ADI. Tal assertiva baseia-se em antigo entendimento do STF, que já foi superado. Na verdade, desde 2010, com o julgamento da ADI n.º 2.158/PR, o STF passou a adotar o entendimento de que a revogação ou alteração da norma constitucional que serve de parâmetro de controle da ADI não acarreta a sua extinção. Qual é o entendimento da Supremo Tribunal Federal? “Ação Direta de Inconstitucionalidade. AMB. Lei nº 12.398/98-Paraná. Decreto estadual nº 721/99. Edição da EC nº 41/03. Substancial alteração do parâmetro de controle. Não ocorrência de prejuízo. Superação da jurisprudência da Corte acerca da matéria. Contribuição dos inativos. Inconstitucionalidade sob a EC nº 20/98. Precedentes. 1. Em nosso ordenamento jurídico, não se admite a figura da constitucionalidade superveniente. Mais relevante do que a atualidade do parâmetro de controle é a constatação de que a inconstitucionalidade persiste e é atual, ainda que se refira a dispositivos da Constituição Federal que não se encontram mais em vigor. Caso contrário, ficaria sensivelmente enfraquecida a própria regra que proíbe a convalidação (...)” (STF, Tribunal Pleno, ADI 2.158/PR, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 15.9.2010). Servem como parâmetro de controle Não servem como parâmetro de controle • Normas constitucionais expressas ou implícitas do corpo permanente da CF • Normas do ADCT • Tratados de direitos humanos aprovados pelo procedimento do artigo 5º, §3º, da CF • Preâmbulo • Tratados que não foram aprovados pelo procedimento do artigo 5º, §3º, da CF Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 19 Objeto de controle O objeto de controle em uma ação direta de inconstitucionalidade genérica, segundo o artigo 102, inciso I, alínea “a” da CF/88, é lei ou ato normativo federal ou estadual. A Constituição de 1988, ao colocar como objeto da ação direta de inconstitucionalidade as leis e atos normativos quis, com isso, referir-se aos atos primários, ou seja, aos atos que haurem a sua validade diretamente da Constituição. Os atos secundários, que não se fundamentam diretamente na Constituição, mas, antes em outro ato normativo, não serão objeto de controle de constitucionalidade, mas sim de controle de legalidade – deverão ser confrontados com a lei ou ato normativo primário que lhes dão fundamento imediato de validade. No mais, o artigo 102, inciso I, alínea “a” da CF/88 fala em lei e atos normativos. Quanto aos atos, não há dúvida de que, para ser objeto de uma ADI, deverão ser revestidos de indiscutível conteúdo normativo, ou seja, dotados de generalidade e abstração. Não é possível, assim, o ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade contra ato de efeitos concretos. Em relação às leis, embora o STF, em um primeiro momento, exigisse que também as leis veiculassem norma genérica e abstrata para ser objeto de ADI, entende atualmente que qualquer lei, genérica ou específica, abstrata ou concreta, pode ser objeto de ADI. Veja a progressão do entendimento do STF sobre o tema: 1) Primeiro momento: STF exigia que a lei veiculasse norma genérica e abstrata para que pudesse ser objeto de ADI. Caso a lei tratasse de medidas materialmente administrativas, com objeto determinado e destinatários certos, não seria conhecida a ação genérica ajuizada para impugná-la em face da Constituição (ADI n.º 767); 2) Segundo momento: o STF mitigou a rigidez de seu entendimento, passando a admitir o controle abstrato de Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 20 constitucionalidade de leis de efeitos concretos em situações excecionais ou desde que presentes doses reduzidas de abstração (ADIs n.º 2.381 e 2.925); 3) Terceiro momento (hoje): STF abandonou de vez a linha restritiva, passando a entender que o adjetivo “normativo” só se aplica aos atos, sendo possível o controle abstrato de qualquer tipo de lei, inclusive aqueles que veiculem atos de efeitos concretos (ADI n.º 4.048). Qual é o entendimento da Supremo Tribunal Federal? “(...) II. CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE DE NORMAS ORÇAMENTÁRIAS. REVISÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O Supremo Tribunal Federal deve exercer sua função precípua de fiscalização da constitucionalidade das leis e dos atos normativos quando houver um tema ou uma controvérsia constitucional suscitada em abstrato, independente do caráter geral ou específico, concreto ou abstrato de seu objeto. Possibilidade de submissão das normas orçamentárias ao controle abstrato de constitucionalidade (...)” (STF, Tribunal Pleno, ADI-MC 4.048/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 14.5.2008). No mais, a lei ou ato normativo objeto de controle deverá ter sido editado posteriormente à promulgação da Constituição Federal e ainda estar em vigor. Com efeito, o STF entende que não é cabível ADI contra lei ou ato normativo já revogado ou cuja eficácia já tenha se exaurido. Caso a revogação ou a perda da eficácia do ato contestado ocorrer no curso do processo, a ADI ficará prejudicada, salvo se: 1) Ficar demonstrado que houve “fraude processual”; 2) O conteúdo do ato impugnado for repetido em essência em outro diploma legislativo; 3) O julgamento do mérito da ADI pelo STF houver iniciado ou finalizado, sem que tenha havido a comunicação prévia de que houve a revogação da norma atacada. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 21 Qual é o entendimento da Supremo Tribunal Federal? “CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. REVOGAÇÃO DA NORMA OBJETO DA AÇÃO DIRETA. COMUNICAÇÃO APÓS O JULGAMENTO DO MÉRITO. DESPROVIMENTO.1. Há jurisprudência consolidada no Supremo Tribunal Federal no sentido de que a revogação da norma cuja constitucionalidade é questionada por meio de ação direta enseja a perda superveniente do objeto da ação. Nesse sentido: ADI 709, Rel. Min. Paulo Brossard, DJ, 20.05.1994; ADI 1442, Rel. Min. Celso de Mello, DJ, 29.04.2005;ADI 4620-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Dje, 01.08.2012. 2. Excepcionam-se desse entendimento os casos em que há indícios de fraude à jurisdição da Corte, como, a título de ilustração, quando a norma é revogada com o propósito de evitar a declaração da sua inconstitucionalidade. Nessa linha: ADI 3306, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe, 07.06.2011. 3. Excepcionam-se, ainda, as ações diretas que tenham por objeto leis de eficácia temporária, quando: (i) houve impugnação em tempo adequado, (ii) a ação foi incluída em pauta e (iii) seu julgamento foi iniciado antes do exaurimento da eficácia. Nesse sentido: ADI 5287, Rel. Min. Luiz Fux, Dje, 12.09.2016; ADI 4.426, Rel. Min. Dias Toffoli, Dje, 17.05.2011; ADI 3.146/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ, 19.12.2006. 4. Com maior razão, a prejudicialidade da ação direta também deve ser afastada nas ações cujo mérito já foi decidido, em especial se a revogação da lei só veio a ser arguida posteriormente, em sede de embargos de declaração. Nessa última hipótese, é preciso não apenas impossibilitar a fraude à jurisdição da Corte e minimizar os ônus decorrentes da demora na prestação da tutela jurisdicional, mas igualmente preservar o trabalho já efetuado pelo Tribunal, bem como evitar que a constatação da efetiva violação à ordem constitucional se torne inócua. 5. Embargos de declaração desprovidos” (STF, Tribunal Pleno, ADI 951 ED/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 27.10.2016). Feitas essas observações, podem ser objeto de ADI: a) Emendas à Constituição; Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 22 Observação 1: Por se tratar de manifestação do poder constituinte derivado reformador, o parâmetro de controle das ECs é diverso dos demais atos normativos. A edição de ECs está limitada formal, material e circunstancialmente (artigo 60 da CF/88), sendo esses limites o parâmetro de controle das emendas. Observação 2: As normas constitucionais originárias não podem ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade, pois não se submetem ao controle de constitucionalidade como um todo (STF, Tribunal Pleno, RE 543.974/MG, Rel. Min. Eros Grau, j. 26.03.2009). b) Leis complementares e leis ordinárias; c) Leis delegadas; Observação: Além do controle via ADI, há previsão no artigo 49, inciso V da CF/88 de controle político repressivo, com a possibilidade de sustação da lei delegada caso ela ultrapasse os limites da delegação. d) Medidas provisórias; e) Decretos legislativos e resoluções legislativas; Observação: Não se pode confundir decreto legislativo com decreto regulamentar. Este é ato normativo secundário, expedido pelo Chefe do Poder Executivo com a finalidade de pormenorizar as disposições gerais e abstratas da lei, viabilizando sua aplicação em casos específicos. Aquele é ato normativo de competência exclusiva do Poder Legislativo, com eficácia análoga a de uma lei. f) Tratados internacionais; Observação: No caso dos tratados internacionais de direitos humanos introduzidos pelo procedimento do artigo 5º, §3º, da CF/88, o parâmetro de controle será tão somente os limites impostos no artigo 60 da CF/88 ao poder constituinte derivado reformador. g) Decretos autônomos; Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 23 h) Resoluções do CNJ e do CNMP; i) Legislação estadual; j) Legislação distrital, quando editada no âmbito de competência estadual; Qual é o entendimento da Supremo Tribunal Federal? Enunciado n.º 642 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “Não cabe ação direta de inconstitucionalidade de lei do Distrito Federal derivada da sua competência legislativa municipal”. k) Regimento interno de Tribunal; l) Resolução do Tribunal Superior Eleitoral; Como o assunto foi cobrado em concurso? PGR – Procurador da República (2017) Assinale a alternativa incorreta: a) Lei distrital editada no exercício de competência municipal não é passível de controle abstrato de constitucionalidade no âmbito do STF. b) É possível, em sede de controle abstrato de constitucionalidade, a invalidade de uma norma que se extrai, a contrario sensu, de um texto legal, mas que não está contida em qualquer fragmento linguístico. c) Nas chamadas “sentenças aditivas de princípio” ou “sentenças delegação”, a Suprema Corte, em decisões no controle abstrato de constitucionalidade, exorta o legislador a agir, delineando as diretrizes que deve seguir. d) A coisa julgada, em controle abstrato de constitucionalidade, significa que a decisão permanecerá eficaz sobre hipóteses idênticas, salvo se o STF adotar nova compreensão sobre o tema ou o Legislativo vier a editar lei em sentido contrário ao entendimento adotado naquela decisão. Gabarito: A. Essa afirmativa está incorreta porque os atos municipais não podem ser objeto de ADI, mas sujeitam-se a controle concentrado de constitucionalidade via ADPF. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 24 Não podem ser objeto de controle via ADI: a) Normas constitucionais originárias; b) Atos normativos secundários; c) Leis anteriores à Constituição; d) Lei municipal; e) Proposta de emenda constitucional ou projeto de lei; f) Enunciado de Súmula; g) Sentenças normativas; h) Convenções coletivas de trabalho; i) Respostas do Tribunal Superior Eleitoral. Como o assunto foi cobrado em concurso? VUNESP – TJ/MT – Juiz de Direito (2018) Assinale a alternativa que aponta um tipo de ato ou espécie normativa que, como regra, é passível de controle abstrato de constitucionalidade: a) Regimentos Internos dos Tribunais; b) Decreto regulamentar não autônomo do Chefe do Executivo; c) Súmula vinculante; d) Normas constitucionais originárias; e) Resolução que autoriza processo contra o Presidente da República. Gabarito: A. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 25 Mandado de injunção Natureza jurídica O mandado de injunção é o remédio constitucional que tem por finalidade por finalidade suprir eventuais omissões do Poder Público que obstaculizem o exercício de um direito ou de uma garantia previstos na Constituição, para sanar a crise de inefetividade das normas constitucionais, principalmente aquelas que conferiam direitos. Durante a Constituinte de 1987 e 1988, uma das preocupações que permeou os debates foi com a efetiva garantia do generoso rol de direitos fundamentais que estava ali sendo construído, já que, durante toda a nossa história, sempre houve um altíssimo grau de insinceridade normativa, de modo que direitos eram previstos nas Constituições, mas não eram observados no mundo dos fatos. Fundamento normativo Embora alguns autores apontem que o mandado injunção deite raízes remotamente no instituto inglês da equity, e mais proximamente no writ of injunction do direito norte-americano, ou, ainda, no Direito Português, a verdade é que se trata de instrumento sem exato paralelo no Direito Comparado. A morada do mandado de injunção é o artigo 5º, inciso LXXI da CF/88. O que diz a Constituição? Art. 5º LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e Esse dispositivo, conforme decidido pelo STF ao analisar questão de ordem no MI 107/DF, é autoaplicável, não dependendo da edição de norma jurídica para que o mandado de injunção seja utilizado. Como entende a jurisprudência? Mandado de injunção. Questão de ordem sobre sua auto-aplicabilidade, ou não. Em face dos textos da constituição federal relativos ao mandado de injunção, e ele ação outorgada ao titular de direito, garantia ou prerrogativa a que alude o artigo 5., LXXI, dos quais o exercícioesta inviabilizado pela falta de norma regulamentadora, e ação que visa a obter do poder Judiciário a declaração de inconstitucionalidade dessa omissão se estiver caracterizada a mora em regulamentar por parte do poder, órgão, entidade ou autoridade de que ela dependa, com a finalidade de que se lhe de ciência dessa declaração, para que adote as providencias Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 26 necessárias, à semelhança do que ocorre com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (artigo 103, par-2., da carta magna), e de que se determine, se se tratar de direito constitucional oponível contra o estado, a suspensão dos processos judiciais ou administrativos de que possa advir para o impetrante dano que não ocorreria se não houvesse a omissão inconstitucional. Assim fixada a natureza desse mandado, e ele, no âmbito da competência desta corte - que esta devidamente definida pelo artigo 102, i, 'q' -, auto- executavel, uma vez que, para ser utilizado, não depende de norma jurídica que o regulamente, inclusive quanto ao procedimento, aplicável que lhe e analogicamente o procedimento do mandado de segurança, no que couber. Questão de ordem que se resolve no sentido da auto-aplicabilidade do mandado de injunção, nos termos do voto do relator. (MI- QO 107, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 23/11/1989, publicado em 21/09/1990, Tribunal Pleno) Todavia, recentemente, atendendo aos anseios da doutrina, foi editada a Lei n.º 13.300/16 com a finalidade de disciplinar o processo e julgamento do mandado de injunção individual e coletivo, trazendo importantes novidades. Cabimento Para que o mandado de injunção seja cabível, é necessário que estejam presentes dois requisitos: a) A existência de norma constitucional de eficácia limitada que verse sobre direitos, liberdades e prerrogativas constitucionais; • Dessa forma, não é admissível mandado de injunção para conferir efetividade às normas de eficácia plena e aplicabilidade imediata. • Apesar da dicção constitucional, prevalece em doutrina que pode ser tutelado todo e qualquer direito fundamental, seja ele individual, coletivo, difuso ou social (Dirley da Cunha Jr). b) A inviabilização do exercício desse direito, liberdade ou prerrogativa constitucional por seu titular em virtude da ausência de norma regulamentadora. • A esse respeito, a doutrina tem entendido que a omissão não se limita à edição de leis ordinárias e complementares, devendo-se abranger toda e qualquer providência Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 27 regulamentadora para tornar efetiva a norma constitucional (José Afonso da Silva). O que dizem a lei e a Constituição? LMI, Art. 2º Conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta total ou parcial de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Parágrafo único. Considera-se parcial a regulamentação quando forem insuficientes as normas editadas pelo órgão legislador competente. Art. 12 Parágrafo único. Os direitos, as liberdades e as prerrogativas protegidos por mandado de injunção coletivo são os pertencentes, indistintamente, a uma coletividade indeterminada de pessoas ou determinada por grupo, classe ou categoria. CF, Art. 5º LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Como esse assunto foi cobrado em concurso? (FGV – 2019 – DPE/RJ – Técnico Superior Jurídico) Joana estava impossibilitada de fruir determinado direito constitucional em razão da ausência de norma regulamentadora, que deveria ter sido editada pelo Congresso Nacional. Esse estado de mora legislativa vinha sendo reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal nos últimos cinco anos, em diversos mandados de injunção anteriores, tendo o Congresso Nacional descumprido sistematicamente o prazo fixado para que a mora fosse sanada. Considerando a sistemática estabelecida pela ordem jurídica, em especial pela Lei nº 13.300/2016, a injunção requerida por Joana deve ser: a) indeferida, considerando a inexistência de interesse processual, pois a mora legislativa já fora reconhecida; b) deferida, para determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição da norma regulamentadora; c) deferida, para que o impetrado tome ciência da mora legislativa e adote as providências necessárias à sua superação; Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 28 d) indeferida, pois a existência de mandados de injunção anteriores denota o caráter coletivo da temática, o que impede a atuação isolada de Joana; e) deferida, para estabelecer o modo como se dará o exercício do direito ou as condições em que o interessado pode promover ação própria visando a exercê-lo. A alternativa E foi considerada correta. Por fim, faz-se necessário destacar que a omissão inconstitucional em regulamentar direito, liberdade ou prerrogativa constitucional pode ser: a) Na omissão total, a inércia estatal é absoluta, inexistindo qualquer norma regulamentadora; b) Na omissão parcial, a norma editada pelo órgão competente é insuficiente, não disciplinando por inteiro a questão classe. Como o assunto foi cobrado em concurso? Na prova para ingresso na carreira de Juiz de Direito do TJ/AC (2019), foi considerada incorreta a seguinte proposição: “Não será cabível o mandado de injunção quando houver regulamentação da matéria por normas editadas pelo órgão legislador competente, ainda que insuficientes”. De fato, como estudamos, se a norma regulamentadora não disciplinar por completo o direito, haverá omissão parcial, abrindo-se a via do mandado de injunção. Decisão e coisa julgada Existem três posições teóricas a respeito dos efeitos da decisão proferida em um mandado de injunção: a) Posição não concretista: a decisão tem o condão apenas de decretar a mora do Poder, órgão ou autoridade com atribuição para editar a norma regulamentadora, com declaração da inconstitucionalidade da omissão e notificação do órgão competente para a adoção das providências cabíveis. O fundamento é o princípio da separação dos poderes (artigo 2º da CF), que impediria o Poder Judiciário de editar uma norma regulamentadora. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 29 b) Posição concretista intermediária: concedida a ordem, o Poder Judiciário deve, primeiro, comunicar o Poder, órgão ou autoridade omisso, concedendo prazo para que a norma regulamentadora seja editada. Transcorrido o prazo sem que a omissão seja sanada, o Poder Judiciário asseguraria o exercício direito, criando a norma regulamentadora para o caso concreto. c) Posição concretista direta: reconhecendo o Poder Judiciário que há mora na edição da norma regulamentadora, deve garantir de plano o imediato exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa que está sendo obstaculizado por ausência de regulamentação, criando a norma regulamentadora para o caso concreto. Para aqueles que adotam a posição concretista, há ainda divergência sobre os limites subjetivos da decisão que regulamenta o direito, liberdade ou prerrogativa. a) Posição concretista individual: a decisão teria efeitos inter partes, assegurando, portanto, o exercício do direito apenas para o impetrante do mandado de injunção. b) Posição concretista geral: os efeitos da decisão seriam erga omnes, ou seja, o direito passaria a ser assegurado a todos, e não somente ao impetrante. Evolução jurisprudencial Na jurisprudência do STF, a adoção das posições passou por uma evoluçãocronológica que pode ser assim resumida: a) Primeiro momento: o STF tradicionalmente adotava a posição não concretista (Tribunal Pleno, MI 107-3, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 31/10/1990). • Tal solução, no entanto, foi alvo de duras críticas por parte da doutrina, que apontava que a adoção da posição não concretista, embora tecnicamente parecesse perfeita, esvaziaria por completo o novo remédio constitucional, tanto Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 30 que as decisões em mandado de injunção acabaram não tendo nenhuma eficácia prática. b) Segundo momento: aumento do grau de concretude, com o STF permitindo soluções outras, embora continuasse a adotar a posição não concretista. No julgamento do MI 283, ficou decidido que, em caso de persistência da mora do Congresso Nacional, a parte prejudicada pela não edição do ato normativo poderia ajuizar uma ação de reparação por perdas e danos. No caso do MI 232-1/RJ, o STF adotou, excepcionalmente, a posição concretista intermediária individual. Como entendia o Supremo Tribunal Federal? Mandado de injunção. - Legitimidade ativa da requerente para impetrar mandado de injunção por falta de regulamentação do disposto no par. 7. do artigo 195 da Constituição Federal. - Ocorrência, no caso, em face do disposto no artigo 59 do ADCT, de mora, por parte do Congresso, na regulamentação daquele preceito constitucional. Mandado de injunção conhecido, em parte, e, nessa parte, deferido para declarar-se o estado de mora em que se encontra o Congresso Nacional, a fim de que, no prazo de seis meses, adote ele as providencias legislativas que se impõem para o cumprimento da obrigação de legislar decorrente do artigo 195, par. 7., da Constituição, sob pena de, vencido esse prazo sem que essa obrigação se cumpra, passar o requerente a gozar da imunidade requerida. (MI 232, Relator(a): Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado em 02/08/1991) c) Terceiro momento: adoção da posição concretista direta individual, deferindo à impetrante, servidora pública, a aposentadoria especial, mesmo não tendo sido editada lei complementar que regulamentasse o disposto no artigo 40, §4º da CF/88. Como entendia o Supremo Tribunal Federal? Conforme disposto no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição Federal, conceder-se- á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 31 A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada. (...) Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada. (...)Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral - artigo 57, § 1º, da Lei nº 8.213/91. (MI 721, Relator(a): Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 30/08/2007) d) Quarto momento: adoção da posição concretista direta geral, menos de dois meses após, no julgamento conjunto dos MIs 670, 708 e 712, concedendo a ordem para reiterar a declaração do estado de mora do Congresso Nacional por não editar norma que regulamentasse o direito de greve dos servidores públicos e, em razão da omissão sistemática e recorrente, o Supremo determinou a aplicação genérica, no que coubesse, da Lei n.º 7.783/89, que regulamenta o direito de greve para os trabalhadores particulares. Qual é a posição do Supremo Tribunal Federal? No julgamento do MI no 107/DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 21.9.1990, o Plenário do STF consolidou entendimento que conferiu ao mandado de injunção os seguintes elementos operacionais: i) os direitos constitucionalmente garantidos por meio de mandado de injunção apresentam-se como direitos à expedição de um ato normativo, os quais, via de regra, não poderiam ser diretamente satisfeitos por meio de provimento jurisdicional do STF; ii) a decisão judicial que declara a existência de uma omissão inconstitucional constata, igualmente, a mora do órgão ou poder legiferante, insta-o a editar a norma requerida; iii) a omissão inconstitucional tanto pode referir-se a uma omissão total do legislador quanto a uma omissão parcial; iv) a decisão proferida em sede do controle abstrato de normas acerca da existência, ou não, de omissão é dotada de eficácia erga omnes, e não apresenta diferença significativa em relação a atos decisórios proferidos no contexto de mandado de injunção; iv) o STF possui competência constitucional para, na ação de mandado de injunção, determinar a suspensão de processos administrativos ou judiciais, com o intuito de assegurar ao interessado a possibilidade de ser contemplado por norma mais benéfica, ou que lhe assegure o direito constitucional invocado; v) por fim, esse plexo de poderes institucionais legitima que o STF determine a edição de outras medidas que garantam Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 32 a posição do impetrante até a oportuna expedição de normas pelo legislador. (...) Apesar dos avanços proporcionados por essa construção jurisprudencial inicial, o STF flexibilizou a interpretação constitucional primeiramente fixada para conferir uma compreensão mais abrangente à garantia fundamental do mandado de injunção. A partir de uma série de precedentes, o Tribunal passou a admitir soluções "normativas" para a decisão judicial como alternativa legítima de tornar a proteção judicial efetiva (CF, art. 5o, XXXV). Precedentes: MI no 283, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 14.11.1991; MI no 232/RJ, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 27.3.1992; MI nº 284, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. para o acórdão Min. Celso de Mello, DJ 26.6.1992; MI no 543/DF, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 24.5.2002; MI no 679/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 17.12.2002; e MI no 562/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 20.6.2003. Em razão da evolução jurisprudencial sobre o tema da interpretação da omissão legislativa do direito de greve dos servidores públicos civis e em respeito aos ditames de segurança jurídica, fixa-se o prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso Nacional legisle sobre a matéria. (...) Mandado de injunção conhecido e, no mérito, deferido para, nos termos acima especificados, determinar a aplicação das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis. (MI 670, Relator: Min. Maurício Corrêa, Relator P/ Acórdão: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007) Previsão legal Com a edição da Lei do Mandado de Injunção (lei 13.300/16), a questão dos efeitos da decisão que concede a ordem em mandado de injunção foi, finalmente, positivada em nosso ordenamento jurídico. O que diz a lei? Art. 8º Reconhecido o estado de mora legislativa, será deferida a injunção para: I - determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição da norma regulamentadora; II - estabelecer as condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados ou, se for o caso, as condições em que poderá o interessado promover ação própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora legislativa no prazo determinado. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 33 Parágrafo único. Será dispensada a determinação a que se refere o inciso I do caput quando comprovado que o impetrado deixou de atender, em mandado de injunção anterior, ao prazo estabelecido para a edição da norma. Art. 9º A decisão terá eficácia subjetiva limitadaàs partes e produzirá efeitos até o advento da norma regulamentadora. § 1º Poderá ser conferida eficácia ultra partes ou erga omnes à decisão, quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração. § 2º Transitada em julgado a decisão, seus efeitos poderão ser estendidos aos casos análogos por decisão monocrática do relator. § 3º O indeferimento do pedido por insuficiência de prova não impede a renovação da impetração fundada em outros elementos probatórios. A lei consigna que, reconhecido o estado de mora legislativa, será deferida a injunção para: a) determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição da norma regulamentadora; e b) estabelecer as condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados ou, se for o caso, as condições em que poderá o interessado promover ação própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora legislativa no prazo determinado. Assim, o legislador pátrio adotou, como regra, a posição concretista intermediária, pois o Poder Judiciário, após reconhecida a mora, deverá fixar prazo para que o impetrado regulamente o direito, liberdade ou prerrogativa e, somente após findo o prazo, poderá estabelecer as condições para o seu exercício efetivo. No entanto, o comando prevê uma exceção, em que o Judiciário deverá imediatamente regulamentar ele próprio o direito, quando ficar comprovado que o impetrado deixou de deixou de atender, em mandado de injunção anterior, ao prazo estabelecido para a edição da norma. Aqui, será adotada a posição concretista imediata. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 34 No tocante aos efeitos subjetivos, a LMI dispõe que a decisão terá eficácia subjetiva limitada às partes e produzirá efeitos até o advento da norma regulamentadora (posição concretista individual). Contudo, poderá ser conferida eficácia ultra partes ou erga omnes à decisão, quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração (posição concretista geral). A lei também prevê que, transitada em julgado a decisão, seus efeitos poderão ser estendidos aos casos análogos por decisão monocrática do relator, em interessante preocupação com a isonomia extraprocessual. Como o assunto foi cobrado em concurso? As questões envolvendo mandado de injunção gravitam, majoritariamente, em torno dos efeitos da decisão nele proferida. Na prova para ingresso na carreira de Defensor Público/PR (2017), foi considerada incorreta a seguinte afirmação: “A lei que o regulamenta, em contrariedade à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não permite a extensão dos efeitos da decisão para além das partes, já que se trata de processo constitucional subjetivo que visa assegurar o exercício de direitos do impetrante”. Como estudamos, o artigo 9º da Lei n.º 13.300/06 confere efeitos erga omnes à decisão no mandado de injunção se isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração. No mandado de injunção coletivo, com a edição da legislação própria, optou-se por adotar, como regra, a posição concretista intermediária coletiva. Mesmo na impetração individual, como visto, após o trânsito em julgado, poderá haver extensão dos efeitos aos casos análogos, ampliando a extensão subjetiva em prol da isonomia. O que diz a lei? LMI: Art. 13. No mandado de injunção coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente às pessoas integrantes da coletividade, do grupo, da classe ou da categoria substituídos pelo impetrante, sem prejuízo do disposto nos §§ 1º e 2º do art. 9º. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 35 Art. 9º § 2º Transitada em julgado a decisão, seus efeitos poderão ser estendidos aos casos análogos por decisão monocrática do relator. Como esse assunto foi cobrado em concurso? (CESPE – 2018 – PGE-PE – Procurador do Estado) De acordo com lei que disciplina o mandado de injunção, uma vez transitada em julgado a decisão final, o relator poderá, monocraticamente, estender seus efeitos a casos análogos. A alternativa foi considerada correta. (VUNESP – 2019 – Câmara de Piracicaba – Advogado) Determinada categoria de servidores públicos ajuizou mandado de injunção para obtenção de um direito constitucional em razão da falta da respectiva norma regulamentadora, obtendo decisão favorável para usufruir desse direito. Assim, considerando o que dispõe o direito brasileiro a respeito desse instituto, é correto afirmar que a) a decisão judicial terá eficácia subjetiva limitada às partes e produzirá efeitos até eventual edição da norma regulamentadora, ainda que a aplicação da norma lhe seja mais favorável. b) sem prejuízo dos efeitos já produzidos, a decisão poderá ser revista, a pedido de qualquer interessado, quando sobrevierem relevantes modificações das circunstâncias de fato ou de direito. c) transitada em julgado a decisão, seus efeitos não mais poderão ser estendidos aos casos análogos por decisão monocrática do relator. d) se, eventualmente, a norma regulamentadora for editada antes da decisão, não ficará prejudicada a impetração, devendo o processo ter regular prosseguimento com resolução de mérito. e) a decisão terá eficácia ultra partes ou erga omnes e produzirá efeitos que prevalecerão sobre a norma regulamentadora. A alternativa B foi considerada correta. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 36 Quanto aos efeitos temporais da decisão, a LMI trouxe uma interessante novidade: a possibilidade de ação revisional da decisão proferida em mandado de injunção. Sobrevindo relevantes modificações das circunstâncias de fato ou de direito, a decisão poderá ser revista, a pedido de qualquer interessado, não havendo prejuízo dos efeitos já produzidos anteriormente. Essa ação observará, no que couber, o procedimento estabelecido na própria Lei n.º 13.300/16. O que diz a lei? LMI: Art. 10. Sem prejuízo dos efeitos já produzidos, a decisão poderá ser revista, a pedido de qualquer interessado, quando sobrevierem relevantes modificações das circunstâncias de fato ou de direito. Parágrafo único. A ação de revisão observará, no que couber, o procedimento estabelecido nesta Lei. Outro aspecto importante é o da norma regulamentadora legislativa superveniente. Nessa sucessão temporal entre a norma criada pelo Judiciário e a superveniente norma legislativa, a nova norma produzirá efeitos ex nunc em relação aos beneficiados por decisão transitada em julgado – apenas para o futuro, portanto. A exceção fica por conta de a aplicação da norma editada lhes ser mais favorável, hipótese em que será imediatamente aplicada, retroagindo. Por outro lado, caso a norma regulamentadora seja editada antes da decisão, o processo deverá ser extinto sem resolução do mérito, em virtude da perda do interesse de agir superveniente. O que diz a lei? LMI: Art. 11. A norma regulamentadora superveniente produzirá efeitos ex nunc em relação aos beneficiados por decisão transitada em julgado, salvo se a aplicação da norma editada lhes for mais favorável. Parágrafo único. Estará prejudicada a impetração se a norma regulamentadora for editada antes da decisão, caso em que o processo será extinto sem resolução de mérito. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 37 Como o assunto foi cobrado em concurso? Na prova para ingresso na carreira de Promotor de Justiça/PR (2016), foi considerada incorreta a seguinte assertiva: “A norma regulamentadora superveniente produzirá efeitos ex nunc em relação aos beneficiados por decisão transitada em julgadoproferida em mandado de injunção, salvo se a aplicação das regras da decisão judicial lhes for mais favorável”. A alternativa é cópia quase exata do disposto no artigo 11, caput, da Lei n.º 13.300/16, mas troca, na parte final, “norma editada lhes for mais favorável” por “decisão judicial lhes for mais favorável”, razão pela qual está errada. No mandado de injunção, existe a possibilidade de repropositura da demanda julgada improcedente por insuficiência de provas, no caso de direitos difusos ou coletivos – coisa julgada secundum eventum probationis, ou seja, condicionada ao grau de prova obtido no processo. Essa nova ação, quando na modalidade coletiva, pode ser intentada por qualquer dos legitimados, inclusive por aquele que moveu a primeira demanda. Aplica-se aqui o já dito sobre a ação civil pública. O que diz a lei? LMI, Art. 9º § 3º O indeferimento do pedido por insuficiência de prova não impede a renovação da impetração fundada em outros elementos probatórios. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 38 Ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão (ADO) Conceito A ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão (ADO) é a ação do controle concentrado de constitucionalidade que tem por finalidade dar plena eficácia às normas constitucionais que dependem da edição de um ato normativo infraconstitucional. Com efeito, não é somente por meio de um agir que a Constituição pode ser violada, mas também por uma omissão. Quando algum dos três Poderes deixa de fazer algo que a Constituição impõe, há um grave abalo à ordem jurídica constitucional. Natureza jurídica A ADO tem natureza jurídica de ação do controle concentrado- principal de constitucionalidade. Ela, assim como a ADI e a ADC, é veiculada por um processo objetivo, pois não há propriamente um conflito de interesses concreto a ser resolvido, mas sim a verificação de compatibilidade entre um não agir e a Constituição. Cabimento Parâmetro O parâmetro de controle da ADO é mais restrito do que aquele das ADI e ADC, abarcando somente as normas constitucionais de eficácia limitada, ou seja, as normas que dependam da edição de norma infraconstitucional para que sejam plenamente eficazes. As normas de eficácia plena e as normas de eficácia contida, por não dependerem de complemento para que sejam aplicáveis, não poderão servir de parâmetro de controle em ADO. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 39 Objeto O objeto da ADO é a omissão normativa inconstitucional, ou seja, o descumprimento de um dever de legislar imposto pela norma Constitucional. Com efeito, o deixar de fazer inconstitucional pode ser perpetrado por qualquer dos três Poderes, em qualquer das três funções. Todavia, para ser objeto de uma ADO, essa omissão tem que ter cunho normativo. O STF, corroborando essa assertiva, não conhece de ADO que vise à prática de um ato administrativo concreto. A omissão normativa, embora mais afeta ao Poder Legislativo, também pode ocorrer no âmbito do Poder Executivo, quando se deixa de editar atos normativos secundários gerais, tais quais decretos e resoluções, e no âmbito do Poder Judiciário, ao deixar de regulamentar questão que deveria ter sido prevista em seu Regimento Interno. A omissão inconstitucional pode ser: a. Total: É a omissão que ocorre quando a abstenção em legislar é integral; b. Parcial: É a omissão que ocorre nos casos em que o legislador atua, mas de forma incompleta ou deficiente. Atenção! Servem como parâmetro de controle Normas constitucionais de eficácia limitada Não servem como parâmetro de controle Normas constitucionais de eficácia plena Normas constitucionais de eficácia contida Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 40 Na omissão parcial, como há uma atuação do legislador, ainda que deficitária, o STF possui entendimento de que é cabível tanto a ADI quanto a ADO. Nessa hipótese há, portanto, fungibilidade entre elas. Apesar de a Suprema Corte admitir a impugnação da omissão parcial via ADI, é importante ter em mente que a declaração de inconstitucionalidade da norma incompleta pode não ser a técnica adequada para solucionar o problema, principalmente nos casos em que há violação do princípio da isonomia. Aqui, duas situações devem ser distinguidas. Na primeira, o legislador edita propositalmente um ato normativo que contemple somente alguns grupos ou situações (exclusão explícita). Nessa hipótese, a declaração de inconstitucionalidade da norma por violação do princípio da igualdade, com a sua consequente retirada do ordenamento jurídico, mostra-se adequada. Na segunda, o legislador contempla somente alguns grupos ou situações, esquecendo-se de outros, por não ter apreciado corretamente a realidade fática subjacente (incompletude normativa). Neste segundo caso, declarar inconstitucional a norma, retirando-a do ordenamento jurídico, agravaria ainda mais a omissão inconstitucional. Por essa razão, a declaração de inconstitucionalidade por omissão, apelando ao legislador que edite norma mais ampla, é a técnica que mais bem soluciona o problema. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 41 Questão interessante e assaz relevante é saber em que momento ocorre a omissão inconstitucional. Isso porque, para falarmos em uma omissão inconstitucional, é indispensável que o não agir do legislador seja cotejado com o fator tempo, ou seja, deve-se perquirir qual o lapso temporal dentro do qual o legislador deveria e poderia editar o ato normativo integrador da norma constitucional limitada. Quando a própria norma constitucional estipula um prazo, essa análise é simples, configurando-se a omissão legislativa com o fim do prazo sem que o ato normativo tenha sido editado. Quando não houver prazo expressamente previsto, deverá ser feito um juízo de razoabilidade, em que se avalia qual o tempo razoável para que a medida legislativa fosse tomada, sob pena de se configurar a omissão injusta. O STF, embora já tenha entendido de forma diversa no passado, entende que ainda que esteja em tramitação projeto de lei para regulamentar a norma constitucional de eficácia limitada, a ADO não deve ser extinta, devendo prosseguir o seu curso. Por outro lado, se a norma constitucional que não tinha sido regulamentada for revogada, a ADO deverá ser extinta por perda superveniente do objeto, uma vez que a omissão inconstitucional deixou de existir. Atenção! Omissão inconstitucional Total Parcial Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 42 No julgamento conjunto do MI n.º 4733 e da ADO n.º 26, o STF reconheceu que a não edição de lei criminalizando a homofobia é uma omissão inconstitucional. Consignou-se, nessa oportunidade, que o artigo 5º, XLI da CF/88, ao afirmar que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais, traz um dever específico de legislar. Ademais, as práticas “homotransfóbicas” podem ser enquadradas como espécie de racismo social, o que atrai a incidência do artigo 5º, XLII da CF/88. Para sanar tal omissão, além de notificar o Congresso Nacional, determinou- se a aplicação prospectiva e analógica da Lei n.º 7.716/89, que prevê o crime de racismo. ADO x mandado de injunção A CF/88, em razão do histórico de inefetividade das promessas constitucionais em nosso país, deu um especial tratamento à omissão inconstitucional. Buscando reverter esse quadro e dar efetividade às suas disposições, criou dois instrumentos aptos a resolver a problemática de inércia na edição de ato normativo regulamentador de norma constitucional de eficácia limitada: a ADO e o mandadode injunção. Embora possuam a mesma finalidade, esses institutos possuem nítidas diferenças entre si. São elas: a) A ADO é uma ação do controle principal e abstrato de constitucionalidade, ao passo que o mandado de injunção é um remédio constitucional. b) A finalidade da ADO é concretizar a norma constitucional, garantindo- se a efetividade da Constituição. O mandado de injunção, por sua vez, também busca dar concretude ao texto constitucional, mas isso serve apenas como um meio para que se torne viável o exercício de direitos fundamentais. Trata-se, portanto, de garantia individual. c) A ADO somente é cabível após transcorrido o prazo previsto na Constituição para que a norma regulamentadora seja editada ou, quando o Texto Maior for silente, após transcorrido lapso temporal Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 43 razoável. O mandado de injunção, por outro lado, não depende de nenhum prazo para ser impetrado. d) A legitimidade ativa para o ajuizamento de ADO está adstrita aos legitimados previstos no artigo 103 da CF/88, enquanto que o mandado de injunção pode ser impetrado por qualquer pessoa que titularize o direito fundamental que está sendo obstaculizado pela não edição da norma regulamentadora. e) A competência para julgamento de ADO está concentrada no STF – ou, no caso da ADO estadual, no Tribunal de Justiça. Já em relação ao mandado de injunção, a Constituição de 1988 prevê que vários órgãos judiciais terão competência para julgá-lo, a depender do ente que descumpriu seu dever de legislar. f) A decisão definitiva em uma ADO que tenha por objeto a inércia na edição de ato normativo primário pelo Poder Legislativo declarará a mora legislativa e notificará o Congresso Nacional. Já no mandado de injunção, o Poder Judiciário concederá um prazo para que a omissão seja suprida e, caso esse comando não seja obedecido, editará norma que permita o exercício do direito fundamental obstaculizado, até a edição de lei regulamentadora (artigo 8º da Lei n.º 13.300/16). g) Os efeitos subjetivos da decisão definitiva em ADO são erga omnes, como sói ocorrer em processos objetivos. No mandado de injunção, os efeitos são, em regra, inter partes, somente sendo erga omnes ou ultra partes quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração (artigo 9º, caput e §1º da Lei n.º 13.300/16). Em razão dessas diferenças entre os dois institutos constitucionais, o STF possui entendimento no sentido de que não há fungibilidade entre a ADO e o mandado de injunção. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 44 Reclamação constitucional Natureza jurídica A reclamação possui, atualmente mais do que nunca, a natureza jurídica de ação constitucional. No entanto, existiu, por anos, enorme divergência acerca da natureza da reclamação, podendo-se apontar as seguintes posições – algumas das quais ainda mantidas, apesar do atual contorno dado pelo Código Fux: 1) Primeira corrente (Vinicius Lemos, Alcides de Mendonça Lima, Min. Amaral Santos): a reclamação é um recurso (ou sucedâneo recursal). 2) Segunda corrente (Egas Moniz de Aragão): a reclamação é um incidente processual. 3) Terceira corrente (Orozimbo Nonato): a reclamação é um remédio incomum. 4) Quarta corrente (José Frederico Marques): a reclamação é uma medida de Direito Processual Constitucional. 5) Quinta corrente (Min. Djaci Falcão): a reclamação é uma medida processual de caráter excepcional. 6) Sexta corrente: a reclamação é uma espécie de correição parcial, possuindo natureza administrativa disciplinar. 7) Sétima corrente (Pedro Lenza): a reclamação é um instrumento de caráter mandamental e natureza constitucional. 8) Oitava corrente (Ada Grinover): a reclamação é uma simples postulação perante o órgão que proferiu a decisão, buscando seu cumprimento. 9) Nona corrente: a reclamação é um exercício do direito constitucional de petição. 10) Décima corrente (Luiz Fux, Pontes de Miranda, Fredie Didier, Leonardo Carneiro da Cunha, Antônio Gaio Jr, Humberto Dalla, Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, Rennan Thamay, Daniel Neves, José Miguel Garcia Medina, Teresa Arruda Alvim): a reclamação é uma ação, porque: Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 45 i. Depende de provocação dos legitimados; ii. Possui natureza jurisdicional e contenciosa; iii. Não corre na mesma relação processual em que o ato atacado foi praticado; iv. Não está elencada em lei federal como recurso; v. Não há prazo fixado em lei para sua apresentação; vi. Não tem como objetivo a reforma ou anulação de decisão, mas a cassação ou preservação da competência; vii. É ação de competência originária dos tribunais (como enuncia a Constituição); viii. Independe de sucumbência (é possível que o vencedor queria, por exemplo, fazer cumprir a decisão que o beneficiou); ix. Independe de anterior processo judicial (podendo decorrer de um ato administrativo, por exemplo); x. Possui os elementos constitutivos da ação: parte, causa de pedir e pedido; xi. Exige o preenchimento das condições da ação e dos pressupostos processuais; xii. Exige o recolhimento de custas. De todo modo, a reclamação também funciona, salvo para os que a consideram um recurso, como sucedâneo recursal, pois ataca decisões judiciais, apesar de não ser recurso. Na jurisprudência, o STF, reconhecendo a multiplicidade de posições, concluiu, em um primeiro momento, que a reclamação é uma manifestação do direito constitucional de petição (art. 5º, XXXIV), tendo antes o reputado um instrumento de extração constitucional. Uma consequência dessa visão era a permissão de previsão do cabimento da reclamação em Constituições dos Estados, para os tribunais de justiça. Como entendia a jurisprudência? A reclamação, qualquer que seja a qualificação que se lhe de - Ação (Pontes de Miranda, "Comentarios ao Código de Processo Civil", tomo V/384, Forense), recurso Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 46 ou sucedaneo recursal (Moacyr Amaral Santos, RTJ 56/546-548; Alcides de Mendonca Lima, "O Poder Judiciario e a Nova Constituição", p. 80, 1989, Aide), remedio incomum (Orozimbo Nonato, "apud" Cordeiro de Mello, "O processo no Supremo Tribunal Federal", vol. 1/280), incidente processual (Moniz de Aragao, "A Correição Parcial", p. 110, 1969), medida de Direito Processual Constitucional (Jose Frederico Marques, " Manual de Direito Processual Civil", vol 3., 2. parte, p. 199, item n. 653, 9. ed., 1987, Saraiva) ou medida processual de caráter excepcional (Min. Djaci Falcao, RTJ 112/518-522) - configura, modernamente, instrumento de extração constitucional, inobstante a origem pretoriana de sua criação (RTJ 112/504), destinado a viabilizar, na concretização de sua dupla função de ordem político-jurídica, a preservação da competência e a garantia da autoridade das decisões do Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, "l") e do Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, I, "f"). (Rcl 336, Relator(a): Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/1990) A natureza jurídica da reclamação não é a de um recurso, de uma ação e nem de um incidente processual. Situa-se ela no âmbito do direito constitucional de petição previsto no artigo 5º, inciso XXXIV da Constituição Federal. (ADI 2212, Relator(a): Ellen Gracie, Tribunal Pleno, julgado em 02/10/2003) Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, porém, o STF passou a reconhecer a natureza de ação da medida e, do mesmo modo, o STJ. Como entende a jurisprudência? Com a vigência do Código de Processo Civil de 2015, consolidou-se o entendimentodoutrinário e jurisprudencial no sentido de que o instituto da reclamação possui natureza de ação, de índole constitucional, e não de recurso ou incidente processual. (STJ, EDcl na Rcl 33.747/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 12/12/2018) Em razão disso, a doutrina (Fredie Didier, Leonardo Cunha, Daniel Neves) aponta as seguintes consequências – ainda que algumas suscitem divergência (analisadas à frente): a) Formação de coisa julgada material; b) Cabimento de tutela provisória; c) Exigência de capacidade postulatória; Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 47 d) Pagamento de custas e condenação em honorários; e) Preenchimento dos requisitos da petição inicial. A título de observação, vale mencionar que o Código de Processo Penal Militar menciona a reclamação para o Superior Tribunal Militar, dentro do capítulo que trata dos recursos, o que leva parte da doutrina (Fredie Didier e Leonardo Cunha) a considerar que, excepcionalmente nesse caso, a natureza jurídica seja recursal. Fundamento normativo O histórico normativo da reclamação passa, em linhas gerais, pelas seguintes etapas: i) Ausência de previsão: inicialmente, o Supremo Tribunal Federal admitia a reclamação com base na teoria dos poderes implícitos, necessário para dar efetividade ao poder explícito de julgar; ii) Previsão no Regimento Interno do STF de 1957: incorporação a nível regimental. • Observação: com o advento da Constituição de 1967, as disposições regimentais passaram a ter força de lei federal. iii) Constituição Federal de 1988: previsão expressa do cabimento da reclamação para preservar a competência e a autoridade das decisões do STF e do STJ. O que diz a Constituição? Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões. Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar, originariamente: f) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões. iv) Lei 8.038/90: trata do procedimento da reclamação, junto com os demais processos que tramitam nos tribunais de cúpula. v) EC n.º 45/04: cria a súmula vinculante e prevê o cabimento de reclamação em caso de descumprimento, mesmo que administrativo. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 48 • Observação: a lei 11.417/2006 trata do cabimento da reclamação pelo descumprimento de enunciado de súmula vinculante. vi) CPC/15: trata da reclamação amplamente, trazendo cabimento, legitimados, procedimento, pela primeira vez em um código. Observação: o CPC/15 revogou a lei 8.038/90, na parte que tratava da reclamação, mas não o fez em relação à lei 11.417/06. Cabimento Hipóteses Partindo da Constituição Federal e do Código de Processo Civil, pode-se organizar as hipóteses típicas e taxativas de cabimento da reclamação da seguinte maneira: 1. Preservação de competência de tribunal; 2. Garantia da autoridade de decisão de tribunal, onde se incluem: 2.1. Ofensa a súmula vinculante; 2.2. Ofensa a decisão em controle concentrado de constitucionalidade; 2.3. Ofensa a precedente fixado em: 2.3.1. Incidente de resolução de demandas repetitivas; 2.3.2. Incidente de assunção de competência; 2.3.3. Recurso extraordinário com repercussão geral; 2.3.4. Recurso extraordinária ou recurso especial repetitivos. O que dizem a Constituição e a lei? Constituição Federal; Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 49 Art. 103-A § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar, originariamente: f) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões. Art. 111-A § 3º Compete ao Tribunal Superior do Trabalho processar e julgar, originariamente, a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões. CPC: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: I - preservar a competência do tribunal; II - garantir a autoridade das decisões do tribunal; III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência; § 5º É inadmissível a reclamação: II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. Preservação da competência Quanto à hipótese de preservação de competência, podemos citar o caso de um juiz que realiza juízo de admissibilidade de apelação, impedindo o envio do recurso ao tribunal (enunciado 208 do Fórum Permanente de Processualistas Civis) ou que suspende uma ação em razão do ajuizamento de ação rescisória. Do mesmo modo, quando uma autoridade administrativa pratica ato privativo de um tribunal (exemplo: instauração de inquérito para investigar deputado federal, por autoridade que não o STF). Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 50 Garantia da autoridade O Código destaca como hipótese autônoma e genérica de cabimento a garantia da autoridade do tribunal. Posteriormente, se desdobra essa previsão em outras específicas, para que sejam observados os precedentes judiciais. Independente de haver uma decisão vinculante para todos, porém, pode caber a reclamação, buscando que se observe a autoridade do tribunal por uma decisão proferida no próprio processo. Por exemplo, pode ser que o juiz indefira um pedido de tutela provisória, o tribunal, em agravo de instrumento, reforme a decisão, mas o juiz se negue a cumpri-la. Garantia de observância de precedentes e súmula vinculante Certas decisões, porém, constituindo precedentes judiciais (em um sentido amplo, ou seja, por obrigar o Judiciário e, quanto ao controle de constitucionalidade, os outros poderes), autorizam o cabimento de reclamação, para que sejam efetivamente seguidos. Por conta disso, a reclamação funciona como um instrumento concreto para garantir sua observância, completando a previsão mais genérica do Código Fux. O que diz a lei? CPC: Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão: I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II - os enunciados de súmula vinculante; III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados. Súmula vinculante Quanto à hipótesede ofensa a súmula vinculante (do STF, obviamente), cabe recordar o tratamento legal específico, na lei 11.417/06. O que diz a lei? Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 51 Lei 11.417/06: Art. 7º Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação. § 1º Contra omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será admitido após esgotamento das vias administrativas. § 2º Ao julgar procedente a reclamação, o Supremo Tribunal Federal anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial impugnada, determinando que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso. O cabimento contra atos administrativos (por ação ou omissão), aqui, é explícito, com a peculiaridade de se exigir o esgotamento prévio da via administrativa. Discute-se a constitucionalidade do comando: 1) Primeira corrente: a norma é inconstitucional, por violar a inafastabilidade jurisdicional (art. 5º, XXXV, da CF), exigindo o curso administrativo forçado, previsto mais amplamente na CF/67, mas, na CF/88, apenas para a justiça desportiva (art. 217, §1º). 2) Segunda corrente (Daniel Neves, Gilmar Mendes): a norma é constitucional, não havendo ofensa ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, porque a vida judicial permanece aberta através de outras medidas (ação pelo procedimento comum, mandado de segurança) e porque, na prática, haveria uma substituição da multidão de recursos extraordinários por uma multidão de reclamações. 3) Terceira corrente (Fredie Didier, Leonardo Cunha): a norma é, em tese, constitucional. In concreto, porém, poderia ser afastada, em controle difuso, se presente interesse de agir, demonstrando o reclamante a razão pela qual não pode aguardar o encerramento do trâmite administrativo. Controle concentrado de constitucionalidade No tocante às decisões proferidas em ações de controle concentrado de constitucionalidade, importa sublinhar que o cabimento da reclamação em razão de sua inobservância já era tranquilo, antes do CPC/15, dentro da noção de “garantir a autoridade” dos tribunais. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 52 Duas observações são relevantes, aqui. A primeira é a questão da fração da decisão que vincula a todos - se apenas o dispositivo ou se também os fundamentos (transcendência dos motivos determinantes), como analisado no estudo do controle de constitucionalidade. A segunda é a possibilidade de utilização da reclamação para a revisão do entendimento. De acordo com o Supremo Tribunal Federal, é possível que, no exame de uma reclamação, o tribunal reanalise a matéria jurídica decidida no controle concentrado e conclua em sentido diverso, desde que haja significativa mudança das circunstâncias fáticas ou da percepção jurídica, como destacado pelo Min. Gilmar Mendes. A conclusão não é pacífica, sequer na corte: o Min. Teori Zavascki se posicionou em sentido oposto, enxergando que a reclamação, nesse caso, teria natureza rescisória e que de duas uma: ou o tribunal julgava procedente a reclamação e fazia cumprir o entendimento, ou julgava a improcedente. Isso porque o juízo, nessa via, é apenas da autoridade do decidido. Como entende a jurisprudência? Reclamação como instrumento de (re)interpretação da decisão proferida em controle de constitucionalidade abstrato. Preliminarmente, arguido o prejuízo da reclamação, em virtude do prévio julgamento dos recursos extraordinários 580.963 e 567.985, o Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamação. O STF, no exercício da competência geral de fiscalizar a compatibilidade formal e material de qualquer ato normativo com a Constituição, pode declarar a inconstitucionalidade, incidentalmente, de normas tidas como fundamento da decisão ou do ato que é impugnado na reclamação. Isso decorre da própria competência atribuída ao STF para exercer o denominado controle difuso da constitucionalidade das leis e dos atos normativos. A oportunidade de reapreciação das decisões tomadas em sede de controle abstrato de normas tende a surgir com mais naturalidade e de forma mais recorrente no âmbito das reclamações. É no juízo hermenêutico típico da reclamação – no “balançar de olhos” entre objeto e parâmetro da reclamação – que surgirá com maior nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no controle de constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a determinada decisão do STF, o Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua própria decisão. E, inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisão-parâmetro da reclamação, se entender que, em virtude de evolução Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 53 hermenêutica, tal decisão não se coaduna mais com a interpretação atual da Constituição. Reclamação constitucional julgada improcedente. (Rcl 4374, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013) Precedentes (IRDR, IAC, RE e Resp repetitivos e RE com repercussão geral) Se houver tese jurídica previamente fixada em um IRDR (incidente de resolução de demandas repetitivas), IAC (incidente de assunção de competência), recurso extraordinário ou recurso especial repetitivos ou em um recurso extraordinário com repercussão geral, não observada por julgador a ela obrigado, será cabível a reclamação. Com a modificação operada pela lei 13.256/16, ainda na vacatio do CPC/15, o regramento acerca dos recursos repetitivos e do recurso extraordinária com repercussão geral ficou um pouco confuso. O primeiro ponto relevante é o próprio cabimento da reclamação. Apesar de retirada a hipótese do rol do caput, o §5º, II, a contrario sensu, esclarece o cabimento, de acordo com ampla doutrina. O que diz a lei? Redação originária: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: III - garantir a observância de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; IV - garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de precedente proferido em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência. § 5º É inadmissível a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão. Redação atual: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência. Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 54 § 5º É inadmissível a reclamação: I – proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada; II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. O entendimento que prevalece, doutrinariamente, é o do cabimento, portanto, após o esgotamento das instâncias ordinárias – ou seja, no mesmo momento em que caberia o recurso especial ou o recurso extraordinário. A justificativa para a modificação é bastante prática e estrutural: os tribunais superiores não teriam condições de receber milhares de reclamações contra atos de juízos de primeiro grau, cabendo aos tribunais locais fiscalizarem a aplicação desses precedentes. O Supremo Tribunal Federal, inclusive,vem seguindo tal linha, admitindo reclamações após a interposição de todos os recursos ordinários. Como entende a jurisprudência? A erronia na observância de pronunciamento do Supremo formalizado, em recurso extraordinário, sob o ângulo da repercussão geral, enseja, esgotada a jurisdição na origem considerado o julgamento de agravo, o acesso ao Supremo mediante a reclamação. (Rcl 26874 AgR, Relator: Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado em 12/11/2019) A reclamação constitucional com fundamento na erronia de aplicação de entendimento do STF firmado de acordo com a sistemática da repercussão geral admite como objeto tão somente decisão judicial proferida no exercício da competência conferida à Corte de origem quanto à apreciação de recurso extraordinário pelo Código de Processo Civil, sob pena de se subverter o instituto e tornar inócua a inovação normativa introduzida pela EC nº 45/04. Precedente plenário. (Rcl 20892 AgR, Relator: Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, julgado em 15/03/2016) O Superior Tribunal de Justiça, no entanto, em debatido julgamento, decidiu não ser cabível reclamação para controle da aplicação de precedente Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 55 firmado em recurso especial repetitivo, mesmo que esgotadas as instâncias ordinárias. A decisão, bastante criticada pela doutrina – sobretudo, por desconsiderar uma evidente interpretação no sentido do cabimento a partir da negativa de cabimento somente antes de utilizados todos os recursos no tribunal local -, também se fundamenta em argumentos de administração judiciária e mesmo do próprio papel do STJ, enquanto Corte de Precedentes. Como entende a jurisprudência? Em sua redação original, o art. 988, IV, do CPC/2015 previa o cabimento de reclamação para garantir a observância de precedente proferido em julgamento de "casos repetitivos", os quais, conforme o disposto no art. 928 do Código, abrangem o incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) e os recursos especial e extraordinário repetitivos. Todavia, ainda no período de vacatio legis do CPC/15, o art. 988, IV, foi modificado pela Lei 13.256/2016: a anterior previsão de reclamação para garantir a observância de precedente oriundo de "casos repetitivos" foi excluída, passando a constar, nas hipóteses de cabimento, apenas o precedente oriundo de IRDR, que é espécie daquele. Houve, portanto, a supressão do cabimento da reclamação para a observância de acórdão proferido em recursos especial e extraordinário repetitivos, em que pese a mesma Lei 13.256/2016, paradoxalmente, tenha acrescentado um pressuposto de admissibilidade - consistente no esgotamento das instâncias ordinárias - à hipótese que acabara de excluir. Sob um aspecto topológico, à luz do disposto no art. 11 da LC 95/98, não há coerência e lógica em se afirmar que o parágrafo 5º, II, do art. 988 do CPC, com a redação dada pela Lei 13.256/2016, veicularia uma nova hipótese de cabimento da reclamação. Estas hipóteses foram elencadas pelos incisos do caput, sendo que, por outro lado, o parágrafo se inicia, ele próprio, anunciando que trataria de situações de inadmissibilidade da reclamação. De outro turno, a investigação do contexto jurídico-político em que editada a Lei 13.256/2016 revela que, dentre outras questões, a norma efetivamente visou ao fim da reclamação dirigida ao STJ e ao STF para o controle da aplicação dos acórdãos sobre questões repetitivas, tratando-se de opção de política judiciária para desafogar os trabalhos nas Cortes de superposição. Outrossim, a admissão da reclamação na hipótese em comento atenta contra a finalidade da instituição do regime dos recursos especiais repetitivos, que Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 56 surgiu como mecanismo de racionalização da prestação jurisdicional do STJ, perante o fenômeno social da massificação dos litígios. Nesse regime, o STJ se desincumbe de seu múnus constitucional definindo, por uma vez, mediante julgamento por amostragem, a interpretação da Lei federal que deve ser obrigatoriamente observada pelas instâncias ordinárias. Uma vez uniformizado o direito, é dos juízes e Tribunais locais a incumbência de aplicação individualizada da tese jurídica em cada caso concreto. Em tal sistemática, a aplicação em concreto do precedente não está imune à revisão, que se dá na via recursal ordinária, até eventualmente culminar no julgamento, no âmbito do Tribunal local, do agravo interno de que trata o art. 1.030, § 2º, do CPC/15. (Rcl 36.476/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 05/02/2020) Prazo Não sendo substituta da ação rescisória, a reclamação não pode ser ajuizada após o trânsito em julgado da decisão que enseja seu cabimento. Esse entendimento, consagrado em súmula do STF, foi positivado no Código de Processo de 2015. Como entende a jurisprudência? Súmula 724 do STF: “Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal”. Essa reclamação só é cabível se a decisão objeto dela - na hipótese, despacho que julgou deserto agravo de instrumento contra a decisão que não admitiu recurso extraordinário - ainda não transitou em julgado, pois a reclamação não e sucedâneo de ação rescisória. (Rcl 365, Relator(a): Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado em 28/05/1992) Decisão reclamada que declarou a prejudicialidade do recurso extraordinário em decorrência do provimento do recurso especial pelo Superior Tribunal de Justiça. Alegação de afronta à decisão desta corte que determinou a devolução do feito à origem nos moldes do artigo 543-B, do Código de Processo Civil. Ato desprovido de conteúdo decisório. Acórdão recorrido que não mais existia, por substituído, quando Aprofundando em Ações Constitucionais José Roberto Mello Porto Danniel Adriano 57 do juízo de admissibilidade do recurso extraordinário. Decisão reclamada transitada em julgado. Súmula 734/STF. (Rcl 24810 AgR, Relator(a): Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 11/02/2020). O que diz a lei? CPC: Art. 988 § 5º É inadmissível a reclamação: I – proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada. Por conta disso, com alguma razão, há quem afirme que a reclamação possui prazo para ajuizamento, que coincide com aquele previsto em lei para a interposição do recurso cabível (Daniel Neves). Ou seja, no mínimo os cinco dias para a oposição de embargos de declaração. Por outro lado, mesmo que, antes do julgamento da reclamação, sobrevenha o trânsito em julgado da decisão, a reclamação deverá ser julgada, como o Código expressamente afirma. O que diz a lei? CPC: Art. 988 § 6º A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação. Nesse sentido, aliás, o STF decide há bastante tempo (Rcl 2280, Relator Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, julgado em 01/04/2008). Introdução Mandado de segurança Natureza jurídica Fundamento normativo Cabimento Direito líquido e certo Ato de autoridade Prazo Espécies Desistência Ação declaratória de inconstitucionalidade (ADI) Conceito Cabimento Parâmetro de controle Objeto de controle Mandado de injunção Natureza jurídica Fundamento normativo Cabimento Decisão e coisa julgada Evolução jurisprudencial Previsão legal Ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão (ADO) Conceito Natureza jurídica Cabimento Parâmetro Objeto ADO x mandado de injunção Reclamação constitucional Natureza jurídica Fundamento normativo Cabimento Hipóteses Preservação da competência Garantia da autoridade Garantia de observância de precedentes e súmula vinculante Súmula vinculante Controle concentrado de constitucionalidadePrecedentes (IRDR, IAC, RE e Resp repetitivos e RE com repercussão geral) Prazo