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MATERIAL DE APOIO1 Fernando do Rego Barros Filho2 Leonardo Evangelista de Souza Zambonini3 Introdução Esta será uma série de doze cursos que abordarão temais iniciais de Direito Administrativo, tais como regime jurídico de direito público, contratos, servidores, responsabilidade civil, dentre outros temas. Qual o objetivo de fazermos esses comentários? Dar suporte aos jurisdicionados em conceitos básicos utilizados na Administração Pública, aproxima-los dos demais cursos que oferecemos em nosso site e oferecer um primeiro contato com as principais decisões proferidas pelo TCE-PR. Neste terceiro curso, abordaremos os princípios de direito administrativo. A partir da abordagem constitucional do art. 37 e demais princípios presentes no ordenamento, buscamos uma construção atualizada e sempre ligada às decisões mais recentes do TCE-PR para cada princípio abordado no curso. Assim, o aluno poderá melhorar o entendimento de características básicas do direito administrativo, que servirão para a compreensão tanto da legislação quanto das decisões proferidas pelo Judiciário e Tribunais de Contas. Disciplina constitucional dos princípios O estudo dos princípios do direito administrativo pressupõe o estudo da disciplina constitucional sobre o assunto. Os princípios são o alicerce da Administração Pública. São eles que orientam a sua atuação. A desobediência a algum deles durante determinado ato resulta na nulidade de todos os atos subsequentes. 1 Este material não possui a função de esgotamento do tema, mas tão somente servir como apoio às aulas em vídeo que constam no curso. 2 Analista de Controle do Tribunal de Contas do Estado do Paraná. Currículo na plataforma lattes disponível em <http://lattes.cnpq.br/1039825565487153>. 3 Analista de Controle do Tribunal de Contas do Estado do Paraná. Uma vez que inexiste uma codificação do Direito Administrativo, seus preceitos estão difundidos em leis esparsas. A fonte primordial, porém, é Constituição Federal, sobretudo seu art. 37, em que se situam tanto os princípios explícitos quanto os implícitos. Uma consideração de suma importância para o estudo dos princípios é a de que inexiste hierarquia entre eles. É com base na conjuntura do caso concreto que a preponderância de um ou de outro será definida. Como dito, o dispositivo constitucional base é o art. 37 e se dirige aos Três Poderes da Federação, abrangendo a Administração Pública Direta e Indireta. Sua redação foi expandida pela EC n. 19/1998, que incluiu o princípio da eficiência em seu texto. De seu turno, a Constituição Estadual do Paraná replica redação muito semelhante em seu corpo, acrescendo os princípios da motivação, da razoabilidade e da economicidade. Mas voltando à Constituição Federal, o estudo do primeiro princípio inscrito no art. 37, o da legalidade, parte de uma premissa fundamental: no âmbito da Administração Pública, seu significado é diferente daquele aplicado aos particulares. Com efeito, enquanto a Administração Pública só pode fazer o que estiver autorizada ou determinada por lei, aos particulares aplica-se o disposto no art. 5°, II, do texto constitucional, segundo o qual é permitido fazer tudo aquilo o que a lei não veda. Princípio da legalidade A atuação da Administração é sempre balizada pela Lei e poderá ocorrer tanto de forma vinculada quanto de forma discricionária. Nunca, porém, fora ou em contrariedade à lei. Outra importante decorrência da legalidade administrativa é a de que atos normativos internos, tais como decretos e regulamentos, e os princípios também devem ser compreendidos como lei. A atuação em desconformidade à lei é reprovada pela Constituição, que, então, prevê instrumentos de controle e repressão, tais como a inafastabilidade da tutela jurisdicional, os remédios constitucionais, o controle externo exercido pelo Poder Legislativo e o controle interno das próprias entidades. Pondere-se não existir ponderação no que toca à legalidade: o que a norma determinar deve ser observado. Princípio da impessoalidade O segundo princípio inscrito no art. 37, o da impessoalidade, traz consigo a ideia de generalidade, de imparcialidade e de ausência de benefício pessoal. Ele se manifesta de duas formas: primeiro, impede que a Administração prejudique ou beneficie em específico qualquer indivíduo. Exemplo disso é contemplado no art. 100 da CF, que institui o regime de precatórios, na vedação ao nepotismo e no §1° do art. 37, que veda a promoção pessoal através de publicidade e propaganda públicas. Aliás, em relação a este último dispositivo, o STF entende que tal vedação se estende, inclusive, à promoção do partido político ao qual pertence o agente público. O Tribunal de Contas do Estado do Paraná deu provimento à representação em face da Lei n. 8.666/93, caso em que licitantes, em mesmas condições, tiveram suas propostas julgadas de forma distinta. Para um, houve a aplicação dos critérios previstos no edital. Para o licitante vencedor, não. A outra vertente do princípio da impessoalidade determina que os atos praticados pelo agente público não são a ele imputados, mas à entidade à qual se vincula. Um servidor que emite um parecer, por exemplo, não está emitindo opinião própria, mas do órgão a que pertence. Princípio da moralidade O terceiro princípio previsto no art. 37, o da moralidade, está ligado aos padrões de ética, probidade e decoro do agente público no exercício de suas funções. Trata-se de um princípio complementar à legalidade. Como ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro, não basta a observância da simples legalidade formal. É preciso que o administrador balize sua conduta de acordo com padrões éticos de lealdade e de boa-fé. O administrador deve saber que nem sempre o que é legal é também honesto. Exemplo evidente disso é ilustrado pela doutrina em situação na qual um prefeito não reeleito congela a cobrança de IPTU no final de seu mandato com o objetivo de minorar as arrecadações do Município e, assim, prejudicar o mandatário seguinte. Ao apreciar ação de improbidade administrativa com base na Lei n. 8.429/92 , o STF apontou a definição de uma conduta atentatória ao princípio da moralidade o ato de improbidade, a ensejar a aplicação da Lei n. 8.429, não pode ser identificado tão somente como um ato ilegal. A incidência das sanções previstas na lei carece de um plus, traduzido no evidente propósito de auferir vantagem, causando danos ao erário pela prática de ato desonesto, dissociado da moralidade e dos deveres da boa Administração, lealdade e boa-fé (STJ, REsp. 269.683/SC). Decisão símile foi proferida no sentido de declarar a impossibilidade de o membro do controle interno integrar comissão de avaliação de estágio probatório ou de processo disciplinar, pois comprometida estaria a necessária integridade para avaliar a conformidade dos atos à lei. Princípio da publicidade O penúltimo princípio previsto no art. 37 é o princípio da publicidade. Ele pode ser compreendido em duas acepções: a primeira implica na necessidade de publicação de atos de efeitos externos ou que onerem o patrimônio público. Enquanto não publicados, não gerarão seus efeitos. Exemplo clássico disso é a obrigatoriedade de publicação das leis e dos termos de contrato administrativo. A outra acepção implica no dever de transparência da Administração Pública. Por meio da transparência assegura-se a possibilidade de controle dos seus atos. O dever de publicidade está difundido em vários dispositivos de Lei. A Lei de Licitações, por exemplo, prevê uma série de procedimentos a serem tomados para a publicação das licitações e dos contratos administrativos. O art. 21 em específico exige a publicação prévia em Diário Oficial ou jornal de grande circulação dos avisos de concorrência, tomada de preços, concursos e leilões. Nesse sentido,o TCE-PR já respondeu consulta assentando que a publicidade garante o direito à informação do cidadão e garante a transparência da Administração Pública, conferindo efetividade aos princípios da Constituição. De seu turno, em apreciação de ação em que se discutia convocação tardia de aprovado em concurso público, o STJ entendeu que a publicação da convocação somente em Diário Oficial não é suficiente. Ainda sobre o assunto, o Supremo Tribunal Federal entendeu como legítima a divulgação dos nomes e remunerações dos servidores públicos. No voto, o Min Marco Aurélio consignou que o agente público e o agente político estão na vitrine, são um livro aberto, e o interesse público prevalece sobre o individual. Nós devemos conta aos contribuintes (AgRext. 652.777). Outro interessante entendimento da Corte Suprema assevera que a divulgação do ato no programa Voz do Brasil ou na imprensa não preenche o dever de publicidade. Para concluir, a publicidade se reflete na importante Lei de Acesso à Informação, em diversos dispositivos da Constituição Federal, o que reforça sua função de controle, e na sua força executiva, isto é, em atos que só produzem seus efeitos quando publicado. Princípio da eficiência O derradeiro princípio expresso no art. 37 da Constituição Federal é o princípio da eficiência. Ele foi instituído através da EC n. 19/98 e traduz-se na obtenção do melhor resultado possível com o menor custo. Na lição de Hely Lopes Meirelles, a eficiência é o dever que se impõe a todo agente publico de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa que já não se contenta apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros Maria Sylvia Zanella Di Pietro entende que o princípio pode ser entendido tanto como uma diretriz para a Administração se organizar e promover a melhor prestação de seus serviços quanto como uma forma de atuação do agente público do qual se espera melhores atuações visando a melhores resultados. Dois artigos da CF trazem exemplos práticos desse sentido. O primeiro é o art. 41, que prevê a avaliação periódica de desempenho dos servidores. No mesmo sentido, o §2° do art. 37 prevê a instituição de escolas de aperfeiçoamento de servidores, cuja participação é requisito de promoção na carreira. Infelizmente, é muito comum que a Administração atue completamente em contrassenso a esse princípio, o que reforça a importância da atuação dos órgãos de controle externo, de que os tribunais de contas são exemplo, para coibir esse tipo de incúria, a fim de que a atuação estatal ascenda ao bem comum de forma eficiente. Princípios implícitos Os dois primeiros princípios são os da supremacia e da indisponibilidade do interesse público. Ambos constituem os pilares da Administração Pública. A supremacia preconiza que no eventual conflito entre o interesse individual e o interesse público, prevalecerá este último. Exemplo disso se evidencia na intervenção do Estado na propriedade: desapropriações, requisições administrativas e tombamentos. Outros exemplos são as cláusulas exorbitantes nos contratos administrativos, o exercício do poder de polícia e a presunção de legitimidade de que gozam os atos administrativos. Já o princípio da indisponibilidade veda a renúncia ao interesse da coletividade. O administrador não pode dispor dos interesses públicos cuja guarda lhe foi conferida, como ressalta Maria Sylvia Zanella Di Pietro, responsabilizando-se, inclusive, por omissões. Outro princípio implícito é o da presunção de legitimidade. Por ele, se presume que os atos da Administração Pública estão em conformidade com a Lei. Por força dele, esses atos podem ser imediatamente executados. Tal presunção, contudo, é relativa. Isto é, pode ser afastada mediante prova em contrário, produzida por quem a alega. Destaca-se ainda a existência do princípio da hierarquia, que permite a estruturação dos órgãos da Administração Pública numa relação de coordenação e subordinação, conforme as atribuições definidas em lei. São decorrências dele a possibilidade de delegação e avocação de competência bem como a aplicação de sanções. O princípio da autotutela permite que a Administração faça um controle de seus próprios atos, anulando os ilegais e revogando aqueles considerados inconveniente ou inoportunos. Nesse tema, destacam-se duas súmulas do Supremo Tribunal Federal: 346 e 473.