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03FunçãotranscendenteResumo (2)

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CONTEXTO HISTÓRICO DA CONCEPÇÃO DA FUNÇÃO TRANSCENDENTE 
Considerando que a função transcendente é uma ponte entre a consciência e o 
inconsciente, não deve nos surpreender o fato de que Jung escreveu “A Função Transcendente” 
em 1916, quando ele esteve ativamente engajado nessa conexão. Depois de sua ruptura com 
Freud, por volta de 1912, Jung passou vários anos naquilo que ele mesmo denominou de “um 
período de incerteza interior” (MDR, p. 152). Jung chega abertamente a declarar que era até 
mesmo mais do que isso: “de desorientação”. (MDR, p. 152) e que ele vivia “sob o domínio de uma 
pressão interna” (MDR, p. 154). Em resposta a esses distúrbios, Jung meticulosamente revisou não 
apenas uma, mas duas vezes, todos os detalhes da vida dele detendo-se “particularmente nas 
lembranças da infância” (MDR, p. 154). Jung conta que tentara encontrar em seu passado “alguma 
coisa que pudesse ser a causa de uma possível perturbação”. Foi uma tentativa mal sucedida de 
Jung de lidar com aquele turbilhão de forma racional, com uma ênfase na lógica linear da 
consciência. Jung então se rende e decide se submeter a uma conversa com o inconsciente: “Mas 
essa introspecção foi infrutífera e tive que confessar a mim mesmo minha ignorância. Pensei 
então: “Ignoro tudo a tal ponto que simplesmente farei o que me ocorrer”. Abandonei-me assim, 
conscientemente, ao impulso do inconsciente.” (MDR, p. 154). 
 A capitulação de Jung foi um momento seminal para a psicologia analítica porque ela 
reconhecia pela primeira vez na natureza teleológica, propositiva, do inconsciente. De fato, aquela 
decisão pode ser considerada como o nascimento da função transcendente no pensamento de 
Jung – um reconhecimento explícito do fato de que o crescimento psicológico requer uma parceria 
entre a consciência e o inconsciente. 
 Durante os vários anos que se seguiram, Jung se defrontou com as turbulentas forças do 
inconsciente. Ele sonhou de forma abundante, foi tomado por visões simbólicas e dialogou com 
figuras fantasiosas. Visando a lidar com isso, Jung se submeteu a uma série de formas de auto-
cura: Usando pedras ao redor do lago que havia atrás de sua casa, ele construiu uma cidade em 
miniatura, recordou-se de suas experiências e se engajou em interações com as visões que 
apareciam a ele. Jung descreve a produção de imagens inconscientes nestes termos: 
“Uma onda incessante de fantasias se desencadeou com essa atividade; fiz todo o possível para 
não perder a orientação e para descobrir um caminho. Eu estava mergulhado, sem qualquer 
ajuda, num mundo totalmente estranho, onde tudo me parecia difícil e incompreensível. Vivia 
numa tensão extrema e muitas vezes tinha a impressão de que blocos gigantescos desabavam 
sobre mim Os trovões sucediam-se ininterruptamente.” (MDR, p. 157) 
 As descrições dos confrontos de Jung com o inconsciente levaram alguns a acreditar que 
Jung estava substancialmente debilitado, até mesmo do ponto de vista clínico, durante pelo 
menos parte do tempo. De fato, o próprio Jung usa este tipo de linguagem: “às vezes, [a pressão 
interna] era tão forte que cheguei a supor que havia em mim alguma perturbação psíquica”. 
(MDR, p. 154). Se os eventos que se seguiram nos diversos anos que se sucederam à ruptura com 
Freud levaram a um surto ou não, sem dúvida alguma esse período reflete uma luta intensa 
travada por Jung para conversar e chegar a bons termos com os conteúdos do inconsciente. 
 A emergência de Jung tanto da sua ruptura com Freud quanto de sua descida ao 
inconsciente ocorreu em 1916, um ano chave no qual ele escreveu três de suas maiores obras de 
sua fase inicial: “A Função Transcendente” (1957/1960); a “Estrutura do Inconsciente”, que foi 
posteriormente revista e se tornou “Relações entre o Ego e o Inconsciente” e os Sete Sermões aos 
Mortos, publicado anonimamente. Um ano mais tarde, ele escreveu um outro grande trabalho: “A 
Psicologia dos processos inconscientes”, que foi mais tarde revisada e se tornou “Sobre a 
Psicologia do Inconsciente”. Embutido nessas obras está o cerne de muitas das mais importantes 
idéias de Jung que foram de desenvolvidas de forma mais completa mais tarde. Esses conceitos 
básicos, particularmente a função transcendente, surgiram diretamente da conversação entre os 
materiais conscientes e inconscientes a que Jung se submeteu. Nesse sentido, o ensaio “A Função 
Transcendente” é a função transcendente em ação, um produto mediatório surgido diretamente 
de um diálogo entre as forças conscientes e inconscientes em Jung que o transformaram 
psicologicamente e possibilitaram, pelo menos em parte, a sua mudança de paradigma teórico 
durante esse período. 
AS VERSÕES DE 1916 E DE 1958 DO ENSAIO 
A versão de “A Função Transcendente” que nós vemos no Volume 8 das Obras Completas não é o 
trabalho original que Jung escreveu em 1916, mas é uma revisão que ele preparou 42 anos mais 
tarde. Jung escreveu o ensaio na sua forma original em alemão, em 1916, sob o título de “Die 
Transzendent Funktion”. Inexplicavelmente, o artigo não foi publicado até 1957, quando ele foi, de 
acordo com Jung “descoberto por estudantes do Instituto C. G. Jung de Zurique” (Vol. VIII, 
prefácio), traduzido para o inglês e publicado sob o título de “The Transcendent Function” pela 
associação de estudantes do Instituto C. G. Jung, de Zurique, no que Jung chamaria, mais tarde, de 
sua “versão original provisória” (Vol. VIII, prefácio). Em 1958, Jung revisou de forma considerável a 
versão original alemão para republicação em conjunto com um prefácio. 
 
O PREFÁCIO 
 Escrito em sua forma final apenas dois anos antes de sua morte, em 1961, e 42 anos 
depois da versão original, o prefácio fornece um insight importante acerca dos pensamentos de 
Jung sobre o significado do ensaio e dos conceitos que ele contêm. Nas passagens de abertura, 
Jung indica que o ensaio pode dar ao leitor “alguma idéia dos esforços de compreensão, exigidos 
pelas primeiras tentativas de se chegar a uma visão sintética do processo psíquico no tratamento 
analítico” (Vol. VIII, prefácio). Uma das maiores divergências da psicologia junguiana de outras 
abordagens constitui a sua rejeição da noção de que as manifestações psicológicas podem ser 
reduzidas exclusivamente a eventos dos anos iniciais de vida, a assim chamada “visão redutiva”. A 
visão sintética junguiana é a de que, além das experiências iniciais da vida, a existência psicológica 
também é influenciada pela energia de elementos de caráter prospectivo do inconsciente que nos 
guiam adiante. Como Jung declara mais tarde, no seu ensaio “O tratamento construtivo do 
inconsciente, isto é, a questão do seu significado e de sua finalidade nos fornece a base para a 
compreensão do processo que se chama função transcendente”(§ 147). De acordo com a 
perspectiva da visão sintética, a psicologia não diz respeito apenas a um escavar e descobrir os 
traumas da infância, mas também acerca de um aprendizado sobre a direção em que a psique está 
nos levando: 
“Jung é crítico do método redutivo porque o sentido completo do produto inconsciente (sintoma, 
sonho, imagem, lapsos de linguagem) não é revelado. Ao conectar uma produção inconsciente ao 
passado, o seu valor presente para o indivíduo pode ser perdido... Jung estava mais interessado 
em onde a vida de uma pessoa a estava levando, em vez de desvendar as supostas causas da 
situação. O ponto de vista dele era teleológico. Jung descreve a orientação dele como “sintética”.” 
(Samuels, Shorter e Plaut, A critical Dictionary of Jungian Analysis, p. 127). 
Jung via o inconsciente como uma chave não só para revelar e curar velhas feridas, mas também 
para se aprender sobre o próprio destino, o telos da sua própria vida. Em contraste com a visão 
redutiva, que procura ligar fenômenos psicológicos aos eventos do passado, a visão sintética 
implica sentido, propósito e destino. Visto nessa forma, o inconsciente assume uma qualidademística. Como declara Jung no prefácio: 
“Depois de quarenta e dois anos, o problema nada perdeu de sua atualidade [...] E esse problema 
se identifica com a questão universal: De que maneira podemos confrontar-nos com o 
inconsciente? [...] Indiretamente, porém, é a questão fundamental, na prática, de todas as 
religiões e de todas as filosofias. O inconsciente, com efeito, não é isto ou aquilo, mas o 
Desconhecimento do que nos afeta imediatamente.” ( Vol. VIII, prefácio). 
 Embora Jung não diga isso explicitamente,o fato de ele colocar com letra maiúscula 
“Desconhecimento” e relacionar isso a “todas as religiões e filosofias” pode nos levar à conclusão 
de que ele acredita que o inconsciente tem um tipo de qualidade divina que nos afeta de um 
modo inexplicável e numinoso. 
 Finalmente, o prefácio informa o leitor que Jung descreverá o método da “imaginação 
ativa”, que ele descreve como sendo “o mais importante auxiliar para a produção daqueles 
conteúdos do inconsciente que se encontram imediatamente abaixo do limiar da consciência”. 
(O.C. Vol. VIII, prefácio – versão em inglês). Jung rapidamente adverte que pelo fato de o método 
da imaginação ativa acessar conteúdos inconscientes, ele “não é um brinquedo de crianças”. Ele 
adverte que conteúdos inconscientes “podem sobrecarregar a mente consciente e possuir a 
personalidade ... e mesmo levar a um genuíno “intervalo psicótico”. De modo que o método só 
“deve ser empregado sob a supervisão de um expert”. ( Vol. VIII, prefácio). 
 No seu curto prefácio, Jung nos fornece importantes informações sobre a função 
transcendente, o método da imaginação ativa e a abordagem sintética. Jung também salienta que 
ele está lidando não só com técnicas, mas também com o que ele vê como sendo o cerne da 
psique: sentido e propósito, nenhum dos quais pode ser procurado ou obtido sem um risco real. 
 
DEFINIÇÕES 
Jung não perde tempo para dizer ao leitor o que ele quer dizer com função transcendente. O 
primeiro parágrafo do artigo dá uma definição inicial do conceito: 
“Por função transcendente não se deve entender algo de misterioso e por assim dizer supra-
sensível ou metafísico, mas uma função que, por sua natureza, pode-se comparar com uma função 
matemática de igual denominação, e é uma função de números reais e imaginários. A função 
psicológica e “transcendente” resulta da união dos conteúdos conscientes e inconscientes.” § 131. 
Jung curiosamente diz que não há nada de sensível ou de metafísico na descrição da função 
transcendente, muito embora ele, no prefácio, tenha dito que ela trata da questão fundamental 
de todas as religiões e de todas as filosofias. Podemos pensar que o Jung científico está reagindo 
ao Jung metafísico. 
Em uma outra passagem, Jung diz: 
“A tendência do inconsciente e a da consciência são os dois fatores que formam a função 
transcendente. É chamada transcendente porque torna possível organicamente a passagem de 
uma atitude para outra, sem perda do inconsciente.” §145. 
A função é chamada de transcendente porque ela permite que um indivíduo transcenda a sua 
atitude e chegue a uma nova. Ela potencializa o crescimento psicológico. Além disso, Jung nos diz 
que a mudança ocorre organicamente. Isso prefigura um outro tema a ser abordado mais tarde: a 
de que a função transcendente (e a transformação propiciada por ela) é um processo natural 
produtor de mudança no curso normal dos eventos psíquicos. 
RELACIONAMENTO COMPENSATÓRIO DO INCONSCIENTE COM A CONSCIÊNCIA 
Uma idéia essencial à metapsicologia de Jung e à função transcendente é a de que o inconsciente 
contém material complementar o compensatório àquele da consciência: 
“A experiência no campo da psicologia analítica nos tem mostrado abundantemente que o 
consciente e o inconsciente raramente estão de acordo no que se refere a seus conteúdos e 
tendências. Esta falta de paralelismo, como nos ensina a experiência, não é meramente acidental 
ou sem propósito, mas se deve ao fato de que o inconsciente se comporta de maneira 
compensatória ou complementar em relação à consciência.” § 132. 
 Jung cita quatro razões para a relação complementar e compensatória entre a consciência 
e o inconsciente: 
1) A consciência possui um requisito de um determinado nível de intensidade, de modo que 
os elementos que não apresentam tal nível permanecem no inconsciente; 
2) A consciência tem “funções dirigidas” que inibem todo “material incompatível”, forçando-
os para o inconsciente; 
3) A consciência constitui um “processo momentâneo de adaptação”, ao passo que o 
inconsciente contém não só o material presente, mas também o material do passado do 
indivíduo junto com todos os “traços funcionais herdados que constituem a estrutura do 
espírito humano”. 
4) O inconsciente contém todas as “combinações da fantasia” que ainda não se tornaram 
conscientes, mas que sob circunstâncias favoráveis “entrarão no campo luminoso da 
consciência”. 
Aqui Jung delineia as diferenças significantes entre a concepção dele de inconsciente a visão 
freudiana: Freud via o inconsciente como um depósito de material que era desagradável, violento 
ou poderoso para ser mantido na consciência, enquanto Jung proclama que o inconsciente é um 
sistema psíquico independente em parceria dinâmica com a consciência. Jung acredita que a 
consciência contém material pessoal, adaptativo e dirigido, ao passo que o inconsciente abriga o 
material menos dirigido do passado, traços de comportamento do resto da humanidade (aqui se 
encontra a semente do trabalho posterior de Jung sobre os arquétipos) e material fantasístico. 
Pela primeira vez na psicologia profunda se vê a idéia da consciência e do inconsciente como co-
iguais na psique. A consciência permite que a gente funcione no dia-a-dia de nossas vidas, ao 
passo que o inconsciente compensa e complementa fornecendo símbolo, fantasia, e imagens 
coletivas. 
 Jung dá uma ênfase especial à chamada “natureza determinada e dirigida da consciência” 
(§ 135) e assegura que ela se encontra em tensão constante com o que ele chama de 
contraposições do inconsciente. Embora Jung veja essas qualidades como sendo necessários à 
adaptação em nosso mundo, ele também identifica a desvantagem crucial do então chamado 
“processo dirigido” (§137): ele constantemente faz um julgamento que, pela sua própria natureza, 
exclui o que não é conhecido, o inconsciente, tornando, então, a consciência necessariamente 
unilateral: 
“O julgamento se baseia, por sua vez, na experiência, isto é, naquilo que já é conhecido. Via de 
regra, ele nunca s baseia no que é novo, no que é ainda desconhecido e no que, sob certas 
circunstâncias poderia enriquecer consideravelmente o processo dirigido. É evidente que não 
pode se basear, pela simples razão de que os conteúdos inconscientes estão a priori excluídos da 
consciência. Por causa de tais atos de julgamento, o processo dirigido se torna necessariamente 
unilateral, mesmo que o julgamento racional pareça plurilateral e despreconcebido.. Por fim, até a 
própria racionalidade do julgamento é um preconceito da pior espécie, porque chamamos de 
racional aquilo que nos parece racional. [...] A unilateralidade é uma característica inevitável, 
porque necessária, do processo dirigido, pois direção implica unilateralidade. A unilateralidade é, 
ao mesmo tempo, uma vantagem e um inconveniente.” (§136, 137 e 138). 
 Jung claramente delineia a desvantagem significativa do processo dirigido: ele nos afasta 
do novo e do desconhecido que residem no inconsciente. 
 Além disso, Jung salienta que, quanto mais a contraposição do inconsciente for 
pressionada, maior será a sua força e as chances de que ele irromperá na consciência com 
resultados desagradáveis: 
“A contraposição é inócua, enquanto não contiver um valor energético maior. Mas se a tensão dos 
opostos aumenta, em conseqüência de uma unilateralidade demasiado grande, a tendência 
oposta irrompe na consciência,e isto quase sempre precisamente no momento em que é mais 
importante manter a direção constante. [...] Quanto mais capazes formos de nos afastar do 
inconsciente por um funcionamento dirigido, tanto maior é a possibilidade de surgir uma forte 
contraposição, a qual, quando irrompe, pode ter conseqüências desagradáveis.” (§ 138, 139). 
 Aqui Jung dá voz ao que é amplamente aceito e com freqüência citado na psicologia 
profunda: quando nós ignoramos, subvertemos ou negamos o inconsciente por meio de uma 
ênfase demasiada no processo dirigido, consciente, o inconsciente se manifesta e um modo 
trágico ou desagradável. A esse respeito, esclarece Hillman: 
“Um axioma da psicologia profunda afirma que aquilo que não é admitido à consciência irrompe 
de formas literais, obsessivas e desagradáveis, afetando a consciência precisamente com as 
qualidades que ela tenta excluir.” (Hillman, Revisioning Psychology, p. 46). 
 Assim, Jung estabelece a sua concepção da relação entre a consciência e o inconsciente: 
para cada atitude ou posição na consciência, há uma contraposição complementar, compensatória 
no inconsciente. Miller (2004) salienta que embora Jung utilize a expressão “compensatória ou 
complementar” na versão do ensaio de 1916, os trabalhos posteriores dele tenderam a enfatizar 
os opostos na consciência e no inconsciente. 
“Conforme o pensamento de Jung progrediu, a importância dos opostos no funcionamento 
psíquico aumentou. Quando essa mudança teve efeito, os escritos de Jung começaram a enfatizar 
a natureza compensatória do inconsciente e a dar menos peso e até mesmo a excluir a natureza 
complementar.” (Miller, 2004, p. 16). 
 
ONIPRESENÇA E COMPENSAÇÃO DO INCONSCIENTE 
O próximo passo de Jung no ensaio é o de defender a onipresença do inconsciente na vida 
psicologia, distanciando-se assim ainda mais de Freud. Jung afirma que o tratamento analítico não 
interrompe as intrusões do inconsciente: 
“A terapia analítica nos proporcionou uma profunda percepção da importância das influências 
inconscientes e, com isto aprendemos tanto, para a nossa vida prática, que julgamos insensato 
esperar a eliminação ou a parada do inconsciente depois do chamado término do tratamento. “§ 
140. 
 De fato, ele diz que nós podemos esperar constantes intrusões do inconsciente: essa é a 
natureza da vida psíquica. Em uma adição ao texto original, de 1916, ele afirma: 
“A esperança de Freud no sentido de que se poderia esgotar o inconsciente, não se realizou. A 
vida onírica e as instruções do inconsciente continuam – mutatis mutandis – desimpedidas”. § 
141. 
 A concepção freudiana de inconsciente como um depósito de material reprimido 
significava que com análise suficiente, o inconsciente poderia teoricamente ser tornado 
completamente consciente e esvaziado. Em contraste, Jung via o inconsciente como um 
inexaurível e onipresente parte da vida psíquica. 
 Para Jung, esta é uma verdade psíquica fundamental: o inconsciente está sempre 
presente, influenciando a vida consciente. Mesmo quando algo do inconsciente se torna 
consciente, emerge então uma outra contraposição ao que acabou de se tornar consciente. Em 
vez de encorajar uma atitude falsamente onipotente de que a análise pode ar ao paciente uma 
solução para o inconsciente, Jung reconhece os efeitos do inconsciente e exorta um 
comportamento analítico que assista o paciente ensinando-o como lidar continuamente com ele: 
“A questão fundamental para o terapeuta é não somente como eliminar a dificuldade 
momentânea, mas como enfrentar com sucesso as dificuldades futuras. A questão é esta: que 
espécie de atitude espiritual e moral é necessário adotar frente às influências perturbadoras, e 
como se pode comunicá-la ao paciente? A resposta, evidentemente, consiste em suprimir a 
separação vigente entre a consciência e o inconsciente. Não se pode fazer isto, condenando 
unilateralmente os conteúdos do inconsciente, mas, pelo contrário, reconhecendo a sua 
importância”. (§ 144 e 145). 
 É interessante notar que todo esse trecho não existia na versão de 1916, tendo sido 
acrescentado por Jung na revisão de 1958. Isso mostra a importância do papel do inconsciente na 
compensação da unilateralidade da consciência e do papel que o analista desempenha em assistir 
o paciente a descobrir isso. Além disso, mostra a convicção de Jung a esse respeito e a de que a 
saúde psicológica de um indivíduo requer uma constante troca entre o inconsciente a consciência. 
O MÉTODO CONSTRUTIVO: A IMPORTÂNCIA DE SENTIDO E DE SIGNIFICADO 
 Jung não só acreditava na onipresença do inconsciente, mas também em que nele havia 
um centro de novas atitudes que procuravam nos guiar de um modo teleológico. Jung discordava 
amplamente da afirmação de Freud de que o inconsciente apenas continha material reprimido. Ele 
dizia: 
“O inconsciente possui, além deste, um outro aspecto, incluindo não apenas conteúdos 
reprimidos, mas todo o material psíquico que subjaz ao limiar da consciência. [...] Acentuamos, 
portanto, que além do material reprimido, o inconsciente contém todos aqueles componentes 
psíquicos subliminais, inclusive as percepções subliminais dos sentidos. Sabemos, além disso, 
tanto por uma farta experiência como por razões teóricas, que o inconsciente também inclui 
componentes que ainda não alcançaram o limiar da consciência. Constituem elas as sementes de 
futuros conteúdos conscientes.” (JUNG, O. C. Vol. VII, §203 e 204). 
 Esse é o centro da crença de Jung no método sintético ou construtivo. Em vez de reduzir o 
inconsciente ao que ele representa acerca dos primórdios da vida do indivíduo, Jung insistia em 
que ele fosse recebido como algo que poderia ser construído ou sintetizado como um propósito, 
um sentido, um destino: 
“O inconsciente está em constante atividade, e vai combinando os seus conteúdos de forma a 
determinar o futuro. Produz combinações subliminais prospectivas, tanto quanto o nosso 
consciente; só que elas superam de longe, em finura e alcance, as combinações conscientes. 
Podemos confiar ao inconsciente a condução do homem” (JUNG, O.C. Vol. VII, § 197). 
 A função transcendente está fortemente ligada à visão construtiva da psique. Ela nos 
assiste a mudar de uma velha atitude para a qual a nossa consciência unilateral nos guiava, para 
um novo modo de ser, trazendo-nos para mais próximo do propósito a que nos destinávamos. 
Como Jung salienta: 
“É chamada de transcendente, porque trona possível organicamente a passagem de uma atitude 
para outra, sem perda do inconsciente. O método construtivo de tratamento pressupõe 
percepções que estão presentes, pelo menos potencialmente, no paciente, e por isso é possível 
torná-las conscientes. Se o médico nada sabe dessas potencialidades, ele não pode ajudar o 
paciente a desenvolvê-las” (§ 145). 
Jung, no trecho abaixo, nos mostra como o processo sintético ou construtivo e a função 
transcendente têm, em suas essências, sentido e finalidade: 
“O tratamento construtivo do inconsciente, isto é, a questão do seu significado e de sua 
finalidade nos fornece a base para a compreensão do processo que se chama função 
transcendente.” (§ 147). 
O PAPEL DO ANALISTA: FAZER A MEDIAÇÃO DA FUNÇÃO TRANSCENDENTE 
Jung afirma que o analista tem um papel central em assistir o paciente em reconhecer e integrar 
os conteúdos do inconsciente: 
“Na prática é o médico adequadamente treinado que faz de função transcendente para o 
paciente, isto é, ajuda o paciente a unir a consciência e o inconsciente e, assim, chegar a uma nova 
atitude.” (§ 146). 
 A afirmação que Jung faz acima não é completamente clara. Como o analista desempenha 
essa função? 
Dirigindo-se ao assunto da transferência, Jung enuncia o que pode ser chamado de “transferência 
construtiva”. O paciente transfere para o analista uma função ainda não desenvolvida: o acesso e 
a integração de material inconsciente para produzir uma transformação de atitude. Jung explicaque o paciente naturalmente se apega ao analista, uma vez que o analista tem aquilo que é 
necessário para o crescimento do paciente: 
“Nesta função do médico está uma das muitas significações importantes da transferência: por 
meio dela o paciente se agarra à pessoa que parece lhe prometer uma renovação de atitude; com 
a transferência, ele procura esta mudança que lhe é vital, embora não tome consciência disto. 
Para o paciente, o médico tem o caráter de figura indispensável e absolutamente necessária para 
a vida. Por mais infantil que esta dependência possa parecer, ela exprime uma exigência de suma 
importância, cujo malogro acarretará um ódio amargo contra a pessoa do analista. Por isso o 
importante é saber o que é que esta exigência escondida na transferência tem em vista: a 
tendência é considerá-la em sentido redutivo, como uma fantasia infantil de natureza erótica. Isto 
seria tomar esta fantasia, que em geral se refere aos pais, em sentido literal, como se o paciente, 
ou seu inconsciente, tivesse ainda ou voltasse a ter aquelas expectativas que a criança outrora 
tinha em relação a seus pais. Exteriormente, ainda é aquela mesma esperança que a criança tem 
de ser ajudada e protegida pelos pais; mas, no entanto, acriança se tornou um adulto e o que era 
normal na criança é impróprio para o adulto. Tornou-se expressão metafórica da necessidade de 
ajuda não percebida conscientemente em situação crítica. Historicamente é correto explicar o 
caráter erótico da transferência, situando sua origem no eros infantil, mas, procedendo desta 
maneira, não entenderemos o significado e o objetivo da transferência, e interpretá-la como 
fantasia sexual infantil nos desvia do verdadeiro problema. A compreensão da transferência não 
deve ser procurada nos seus antecedentes históricos, mas no seu objetivo.” (§ 146). 
INDUÇÃO ARTIFICIAL DOS CONTEÚDOS INCONSCIENTES 
Jung então pondera acerca de uma inconsistência lógica no seu pensamento: Se o inconsciente 
está organicamente em ação fornecendo uma contraposição à consciência, por que deveria ser 
necessário induzir artificialmente um confronto entre os conteúdos conscientes e inconscientes? 
Ele pergunta: “Será absolutamente necessário trazer à tona conteúdos inconscientes? Não basta 
que eles próprios se manifestem por si mesmos?[...] Para que forçar o inconsciente vir à tona?” (§ 
156) “Por que não se pode deixar o inconsciente agir como bem entender?” (§ 159). Primeiro, 
Jung declara aquilo que se tornaria um importante fundamento da sua metapsicologia, a natureza 
auto-regulatória da psique: 
 “Visto que a psique é um sistema auto-regulador, como o corpo vivo, é no inconsciente que se 
desenvolve a contra-reação reguladora.” (§ 159). No entanto, Jung adverte que o mecanismo 
auto-regulador pode ser derrotado pelo excessivo desenvolvimento da mente consciente e que 
isso ocorreu na moderna civilização ocidental: 
“Mas sua influência reguladora é eliminada pela atenção crítica e pela vontade orientada para um 
determinado fim, porque a contra-reação como tal parece incompatível com a direção da atitude. 
Por isso, a psique do homem civilizado não é mais um sistema auto-regulador, mas pode ser 
comparado a um aparelho cujo processo de regulagem automático da própria velocidade é tão 
imperceptível, que pode desenvolver sua atividade ao ponto de danificar-se a si mesma.” (§ 159). 
 Além disso, quando a contraposição inconsciente é suprimida, ele não só perde a sua 
influência reguladora, mas fortalece a função dirigida da mente consciente: 
“Começa, então, a ter efeito acelerador e intensificador no sentido do processo consciente. É 
como se a reação consciente perdesse sua influência reguladora e, como conseqüência, toda a sua 
energia, pois se cria uma situação na qual não somente não há uma reação inibidora, mas sua 
energia parece acrescentar-se à energia da direção consciente.” (§ 160). 
 Jung dá exemplos desse tipo de supressão e da megalomania que dela resulta. Ele conclui 
que é imperativo que nós nos lembremos da importância das influências reguladoras do 
inconsciente para o bem-estar do corpo, da mente e da psique: 
“As pessoas que presenciam estes fatos acontecerem repetidamente sob todas as formas e 
gradações possíveis são obrigadas a refletir. Percebem claramente como é fácil ignorar as 
influências reguladoras e, por isso, deveriam preocupar-se em não perder de vista a regulação 
inconsciente, tão necessária à nossa saúde mental e física.” (§ 165). 
Ao afirmar que a moderna civilização ocidental por meio do seu excessivo desenvolvimento as 
funções dirigidas do ego criou um perigoso desequilíbrio psíquico que inibe a operação natural do 
inconsciente, Jung estabelece o pano de fundo para discutir o papel da função transcendente e da 
imaginação ativa na restauração do equilíbrio da relação entre a consciência e o inconsciente. 
A PRODUÇÃO DE MATERIAL INCONSCIENTE: A IMAGINAÇÃO ATIVA 
O estágio inicial na mecânica atual da função transcendente é a produção de dados do 
inconsciente: “Para produzir a função precisamos do material do inconsciente” (JUNG, O. C. Vol. 
VIII, § 152). Embora Jung posteriormente coloque uma maior ênfase no uso dos sonhos, nessa fase 
inicial ele conclui que eles não são uma fonte apropriada de material inconsciente para os 
propósitos da função transcendente. Ele declara que embora “a expressão mais facilmente 
acessível do processo inconsciente que deparamos em primeiro lugar [sejam] os sonhos” (§ 152) e 
que o sonho seja “um produto puro do inconsciente” (§152), dado que a “a tensão energética 
durante o sono é geralmente muito baixa, os sonhos [...] são também expressões inferiores de 
conteúdos inconscientes” e, são “inadequados ou dificilmente utilizáveis quando se trata da 
função transcendental” (§ 153). 
 A conclusão de Jung acerca da inadequação dos sonhos abriu caminho para o 
desenvolvimento da imaginação ativa, que ele via como sendo mais ativa para a produção de 
“fantasias espontâneas” (§ 155) que tem “um caráter mais ordenado e composto” (§ 152). A 
técnica, que Jung chama de “ajuda artificial” (§ 166) para evocar material inconsciente, pode ser 
usada em resposta a um “estado de ânimo deprimido ou perturbado para o qual não explicamos 
explicação satisfatória” (§166), ou, na falta de um sintoma específico, “apenas um mal-estar 
genérico surdo, incompreensível, uma sensação de resistência contra tudo e contra todos, uma 
espécie de tédio ou de vaga repugnância, ou um vazio indefinível mas pertinaz”. (§169). Jung 
então salienta um outro ponto importante de sua psicologia: dentro do sintoma encontra-se a 
chave acerca da habilidade do paciente em responder ao tratamento: 
 Naturalmente o paciente pode dar qualquer número de razões racionai para o seu estado 
de depressão ou de distúrbio psicológico – “ o mau tempo já é suficiente como causa provocadora 
da situação. Mas nenhuma destas razões apresentadas satisfazem como explicação, pois a 
explicação causal destes estados na maioria dos casos só é satisfatória para quem está de fora, e 
mesmo assim, só até certo ponto. [...] O paciente gostaria muito mais de que lhe respondessem a 
questão de como obter a ajuda, do que a questão da origem ou da finalidade de seu mal. É na 
intensidade do distúrbio emocional que consiste o valor, isto é, a energia que o paciente deveria 
ter a seu dispor, para sanar o seu estado de adaptação reduzida. Nada conseguimos, reprimindo 
este estado de depressão ou depreciando-o racionalmente.” (§ 166). 
 O objetivo não é eliminar o sintoma, mas o de mergulhar na energia trancada dentro dele. 
O objetivo da imaginação ativa é o de encontrar um caminho para dentro do sintoma ou do estado 
emocional. Só então pode o sintoma ser visto de forma construtiva, como estando envolvido no 
impulso de um indivíduo em uma trajetória de propósitos. Como um modo de obter direção a 
partir do sintoma, Jung instrui que o paciente contacte o afetoe registre as fantasias e associações 
que emergem, seguindo-as não importa aonde elas levem: 
“Deve-se tomar, portanto, o estado afetivo inicial como ponto de partida do procedimento, a fim 
de que se possa fazer uso da energia que se acha no lugar errado. O indivíduo torna-se consciente 
do estado de ânimo em que se encontra, nele mergulhando sem reservas e registrando por escrito 
todas as fantasias e demais associações que lhe ocorrem. Deve permitir que a fantasia se expanda 
o mais livremente possível, mas não a tal ponto que fuja da órbita de seu objeto, isto é, do afeto, 
realizando, por assim dizer, uma interminável cadeia de associações cada vez mais ampla. Esta 
assim chamada “associação livre” desvia o indivíduo de seu objeto, conduzindo-o a todos os tipos 
de complexos a respeito dos quais nunca se tem certeza se estão relacionados com o afeto e não 
são deslocamentos que surgiram em lugar dele. É desta preocupação com o objeto que provém 
uma expressão mais ou menos completa do estado de ânimo que reproduz, de maneira um tanto 
quanto concreta e simbólica, o conteúdo da depressão. Como esta não é produzida pela 
consciência, mas constitui uma intromissão indesejada do inconsciente, a expressão assim 
elaborada do estado de ânimo é como uma imagem dos conteúdos e das tendências do 
inconsciente que se congregaram na depressão.” (§ 167) 
 A idéia é a de ajudar o paciente a produzir representações conscientes (imagens, símbolos 
ou associações) de conteúdos inconscientes que estão ligados ao afeto. 
 Essa seção do ensaio introduz o pensamento seminal de Jung acerca da capacidade da 
psique de fantasiar e representa a sua virada em direção à psicologia imaginal. A premissa de Jung, 
explorada em grande profundidade em seus outros escritos, era a de que por meio das imagens 
ele poderia obter informação do inconsciente. É provável que os conceitos chave da psicologia 
imaginal tenham emergido diretamente da própria descida de Jung ao inconsciente. 
 Jung imaginava que, por meio desse processo, os conteúdos inconscientes se tornavam 
mais poderosos e se moviam para mais próximo da consciência. Ele sentiu que, concedendo 
energia psíquica a elas, as imagens ficariam mais vivas e emergeriam para o âmbito da consciência 
onde elas começariam a promover uma mudança: 
 “O procedimento em questão é uma forma de enriquecimento e ilustração do afeto e é por isso 
que o afeto se aproxima, com seus conteúdos, da consciência, tornando-se, ao mesmo tempo, 
mais perceptível e, conseqüentemente, também mais inteligível. Basta esta atividade para exercer 
uma influência benéfica e vitalizadora. De qualquer modo, ela ocasiona uma situação, porque o 
afeto, anteriormente não relacionado, converte-se em uma idéia mais ou menos clara e articulada, 
graças precisamente ao apoio e à cooperação da consciência. Isto representa um começo da 
função transcendente, vale dizer,da colaboração de fatores inconscientes e conscientes.” (§ 167). 
 A imaginação ativa é usada para coletar material do inconsciente em direção ao limiar da 
consciência e, e, em certo sentido, catalisar a função transcendente. Jung também estava ciente 
de que cada indivíduo é diferente no modo como o inconsciente pode se contactado. Assim, ele 
enfatizou que a imaginação ativa pode assumir diferentes formas em diferentes indivíduos. Ele 
sugeriu o uso de desenhos, pintura, visualização, diálogo imaginal, trabalho com argila e, até 
mesmo, movimentos, tudo dependendo do que ativa as imagens de forma mais efetiva. 
UTILIZAÇÃO DO MATERIAL INCONSCIENTE: A FORMULAÇÃO CRIATIVA E A COMPREENSÃO 
Jung, em seguida, discute como se lida com o material inconsciente gerada pela imaginação ativa. 
Ele identifica “duas tendências principais” que emergem: “o caminho da formulação criativa” e o 
“caminho da compreensão” (§173 – 174). No caminho da formulação criativa, responde-se de uma 
forma intuitiva ou artística, processando-se o material através da geração de motivos estéticos. No 
caminho do entendimento, o indivíduo tende a responder de um modo mais intelectual, e “há 
uma intensa luta para compreender o sentido do produto inconsciente” (§174). 
 Jung salienta que para se engajar o material inconsciente de forma completa, deve-se 
buscar um engajamento tanto das tendências criativas/estéticas quando das intelectuais 
/compreensivas. As duas compensam uma à outra e a supervalorização de uma delas pode levar a 
um resultado desviante. 
“Um dos caminhos em questão parece ser o princípio regulador do outro; ambos estão ligados 
entre si por uma relação compensadora. A experiência confirma esta afirmação. Até onde é 
possível, no momento, tirar conclusões de caráter mais genérico, a formulação estática precisa da 
compreensão do significado material, e a compreensão, por sua vez, precisa da formulação 
estética. As duas se completam, formando a função transcendente. (§ 177). 
 Lidar com o material inconsciente é um exercício que requer tanto entendimento e 
análise, de um lado, quanto estética, intuição e criação, de outro, não sendo nenhum deles por si 
só suficiente. “O caso ideal seria aquele em que os dois aspectos pudessem conviver normalmente 
lado a lado ou se sucedessem ritmicamente um ao outro” (§ 179); isto é, se houvesse uma 
alternação entre criação e entendimento. 
RELAÇÃO DO EGO COM O INCONSCIENTE: UNIÃO DE OPOSTOS 
Jung agora se move para o núcleo da função transcendente. Uma vez que as imagens, o 
simbolismo e o afeto do material inconsciente se manifestaram, a consciência deve interagir com 
eles. Jung propõe uma reconciliação de ambos com uma metáfora que trata da síntese de duas 
posições antitéticas a partir da qual emerge uma terceira: 
“Quando se consegue formular o conteúdo inconsciente e entender o sentido da formulação, 
surge a questão de saber como o ego se comporta diante desta situação. Tem, assim, início a 
confrontação entre o ego e o inconsciente. Esta é a segunda e mais importante etapa do 
procedimento, isto é, a aproximação dos opostos da qual resulta o aparecimento de um terceiro 
elemento que é a função transcendente. (§ 181). 
 Essa passagem é importante, pois é a primeira vez no ensaio que Jung usa a expressão 
“aproximação dos opostos”. 
 Depois de formular uma segunda fase da função transcendente, a aproximação dos 
opostos para a produção de um terceiro (a primeira fase é a emergência do material inconsciente), 
Jung adiciona um outro componente crítico. Embora possa parecer, de algum modo, contra-
intuitivo, dada a importância do inconsciente na psicologia de Jung, ele declara categoricamente 
que é o ego consciente que deve controlar este estágio: “Neste estágio, a condução do processo já 
não está mais com o inconsciente, mas com o ego”. Jung diz que isso é crucial por causa do perigo 
do ego ser invadido pelo inconsciente. Ele adverte que assim como é imperativo que o 
inconsciente não seja subvertido pela direção da consciência, é igualmente importante que o ego 
não seja invadido pelo inconsciente: 
“O ego deve receber o esmo valor, no processo, que o inconsciente e vice-versa. Isto constitui uma 
advertência por demais necessária, pois justamente do mesmo modo como a consciência do 
homem civilizado exerce uma influência limitadora sobre o inconsciente, assim também um 
inconsciente novamente descoberto age perigosamente sobre o eu. Assim como o eu reprimira o 
inconsciente, assim também um inconsciente libertado pode pôr de lado o eu e dominá-lo.” 
(§183). 
 Esse trecho é de suma importância. A despeito de todo o seu trabalho com o inconsciente, 
Jung não advoga a dominação da consciência pelo inconsciente, mas, sobretudo uma parceria de 
igual entre os dois. Os opostos da consciência e do inconsciente se aproximam para entrarem em 
acordo um com o outro. 
RESULTADO FINAL: DIÁLOGO CRIANDO A EMERGÊNCIA DO TERCEIRO 
Tendo emergido o material inconsciente e o ego se engajado completamente, a função 
transcendenteculmina em um tipo de conversação entre os dois. Jung vislumbra um diálogo no 
qual tanto a consciência quanto o inconsciente têm algo a dizer: 
“A confrontação, portanto, não justifica apenas o ponto de vista do eu, mas confere igual 
autoridade ao inconsciente. A confrontação é conduzida a partir do eu, embora deixando que o 
inconsciente também fale [...] É exatamente como se se travasse um diálogo entre duas pessoas 
com direitos iguais, no qual cada um dos interlocutores considerasse o outro capaz de lhe 
apresentar um argumento válido e, por conseqüência, achasse que valeria a pena aproximar os 
pontos de vista contrastantes, mediante uma comparação e discussão minuciosa e exaustiva, ou 
distingui-los claramente um do outro.” (§186). 
 A analogia do diálogo é de fundamental importância para a concepção de Jung de função 
transcendente, que ele vê como um tipo de troca de informação entre duas entidades de igual 
para igual. 
 Um outro salto conceitual é feito quando Jung faz uma analogia entre a habilidade em se 
dialogar com o “outro” intrapsiquicamente (por meio da função transcendente) e 
interpessoalmente (nos relacionamentos). Ele enfatiza que a inabilidade para ouvir os outros 
inibirá a habilidade de ouvir o outro intrapsíquico, e a inabilidade de dialogar com o inconsciente 
impedirá os relacionamentos humanos. 
 “Todos os que têm em vista uma confrontação consigo próprios devem contar sempre 
com esta dificuldade geral. Na medida em que o indivíduo não reconhece o valor do outro, nega o 
direito de existir também ao “outro” que está em si, e vice-versa. A capacidade de diálogo interior 
é um dos critérios básicos da objetividade.” (§ 187). 
 Em essência, Jung está dizendo que a habilidade em dialogar tanto com o outro externo 
quanto com o outro interno é central para os seus conceitos de individuação e de bem-estar 
psicológico. 
 Jung finalmente chega à derradeira declaração acerca da função transcendente, que 
incorpora a idéia de uma troca entre a consciência e o inconsciente, agora rotulado por Jung como 
opostos, a partir da qual flui algum tipo de nova situação ou de novo elemento: 
“O alternar-se de argumentos e de afetos forma a função transcendente de opostos. A 
confrontação entre as posições contrárias gera uma tensão carregada de energia que produz algo 
de vivo, um terceiro elemento que não é um aborto lógico, consoante o princípio tertium non 
datur, mas um deslocamento a partir da suspensão entre os opostos e que leva a um novo nível de 
ser, a uma nova situação. A função transcendente aparece como uma das propriedades 
características dos opostos aproximados. Enquanto estes são mantidos afastados um do outro – 
evidentemente para se evitar conflitos – eles não funcionam e continuam inertes. (§ 189). 
PASSAGENS FINAIS: A LIBERAÇÃO E A CORAGEM DE SE SER SI-MESMO. 
O último parágrafo do ensaio, termina onde o ensaio começa: prestando homenagem à 
importância do inconsciente para a saúde psicológica. Jung diz que o processo de se lidar com a 
contraposição do inconsciente implica toda a psique e que ele, em última instância, expande a 
consciência: 
“Como o processo de confrontação com o elemento contrário tem caráter de totalidade, nada fica 
excluído dele. Tudo se acha envolvido na discussão, embora se tenha consciência de alguns 
fragmentos. A consciência é ampliada continuamente, ou – para sermos mais exatos – poderia ser 
ampliada pela confrontação dos conteúdos até então inconscientes, se se desse ao cuidado de 
integrá-los.” (§ 193). 
Mas Jung nos adverte que a função transcendente não é algo automático: ela necessita de 
coragem, perseverança e de esforço por parte do indivíduo: 
“E mesmo quando se tem suficiente inteligência para compreender o problema, falta coragem e 
autoconfiança, ou a pessoa é espiritual e moralmente demasiado preguiçosa ou covarde para fazer 
qualquer esforço.” (§193). 
Isso fornece uma importante resposta à noção de que a função transcendente seja um processo 
psíquico inato. Aqui, pelo menos, Jung vê a função transcendente como algo que pode ser afetado 
pela vontade e pela coragem de uma pessoa, um conceito que vai de encontro com a concepção 
de uma função transcendente puramente “natural”. 
A conclusão de Jung indica tanto o modo como um indivíduo pode produzir a função 
transcendente e como a função transcendente é parte integral do processo de individuação: 
“Mas quando há os pressupostos necessários, a função transcendente constitui não apenas um 
complemento valioso do tratamento psicoterapêutico, como oferece também ao paciente a 
inestimável vantagem de poder contribuir, por seus próprios meios, com o analista, no processo 
de cura e, deste modo, não ficar sempre dependendo do analista e de seu saber, de maneira 
muitas vezes humilhante. Trata-se de uma maneira de se libertar pelo próprio esforço e encontrar 
a coragem de ser ele próprio.” (§ 193). 
Traduzido com adaptações de “MILLER, J. The Transcendent Function. New York: State University 
of New York, 2004. p. 10-30.”)