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RA'M SMARANA, O PLANETA DOURADO - Radha Krishna

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RADHA KRISHNA 
 
RA’M SMARANA 
O PLANETA DOURADO! 
 
EDITORA PONGETI – 1969 
 
 
O HOMEM passeia seu metro e noventa e cinco de ossos e 
músculos bem dispostos pelo quadrado minúsculo do apartamento 
moderno. Move-se com o passo elástico e a graça dominadora de um 
felídeo. Saudável, perfeito, belo exemplar da raça humana... Da 
raça humana? Não! Não mais da raça humana. Antes, sim, MART 
serviria como modelo humano dos mais perfeitos. Agora, porém, não 
seria legítimo apresentá-lo assim. Que raça terráquea poderia 
exibir cabelos iguais aos dele? Sim... Que raça ostentaria aquela 
cor candente tão magnética sob qualquer luz, natural ou 
artificial? E aqueles olhos alongados, de cor e brilho argênteo, 
que raça da TERRA evidenciaria? 
MART é agora aquilo que, na era espacial, se chama "mutante". 
Tornou-se absolutamente visível a alteração de sua constituição 
hereditária. MART apresenta indiscutíveis sinais de mutação. Sua 
pele, antes de agradável tom queimado pelo sol, mudou-se em 
dourado brônzeo. Já não é susceptível a cortes, arranhões, e 
outras eventuais machucaduras a que está sujeita a pele humana. 
Tudo nele revela força, demonstra poder! As variações de baixa 
temperatura da cidade não afetam sua sensibilidade. MART passeia 
de pés desnudos, usando apenas curto calção de banho. Desloca 
maciamente o corpo ágil, de um lado para o outro, enquanto espera. 
Surge, por fim, o GRANDE MENTOR! Mais alto e tão belo quanto 
MART. Embora distintos na cor dos olhos e cabelos, na grandeza da 
força, no alcance do poder, possuem um elemento de afinidade 
perceptível: os movimentos felinos! MART pode vê-lo porque possui 
visão extra-sensorial. ROMA manifesta-se em outra dimensão. 
 Sente-se, RANA  comandou o GRANDE MENTOR, com voz 
impessoal. E passou os longos dedos pelos próprios cabelos 
magníficos, cor de prata líquida  Vamos conversar. 
 Ainda sou MART por enquanto, ROMA!  protestou o rapaz 
obedecendo. 
 Um nome que será devolvido aos romanos. Vale começar a 
esquecê-lo desde já. Foi um empréstimo demorado. Seus antigos 
poderes estão retornando, gradativamente. A isto chamo "o retorno 
de RANA"! Seu aspecto e condições físicas já presentam todos os 
sinais da mutação prevista, o que significa a reconquista de sua 
antiga personalidade. Falta muito pouco agora... RANA é seu nome 
de origem, de herança cósmica. Esqueça os sentimentalismos. Você 
não é mais humano! Ultrapassou as condições do humano comum. 
Obriga-se a reagir de acordo. 
 Tenho direito a usufruir dos "tolos" sentimentalismos 
humanos, pelo menos pelo tempo que me resta na TERRA. 
 É sua escolha. Se prefere assim... Não perca tempo em 
usufruí-los. O tempo está diminuindo... 
 O que quer dizer? 
 Que você terá de despedir-se antes do que prevíamos. Em 
julho, ainda. 
 Em julho? Meus instintos bem diziam... Quase já não resta 
nada! 
 Você aceitou seu antigo cargo de COMANDO de sua Raça, 
reorganizando-a no novo Planeta. É preciso começar a agir como 
seus compromissos exigem. Resistência interna, física ou psíquica 
não lhe faltarão. Sua "usina de força" mostra-se revisada, 
recondicionada, qualificada para seus novos empenhos, encargos e 
necessidades. Recorra à "Central", cada vez que as fraquezas do 
homem comum insurgirem-se no âmago de sua nova fortaleza. 
 PALAVRAS! 
 Não. Fatos! Evidências... já experimentadas por outros. Sei 
que não é fácil. Não disse que era. Mas, é coisa realizável para 
um RANA! 
 Como está sendo processada a técnica de adaptação?  
desconversou MART. 
 Foi processada no seu corpo astral, como avisei antes. Você 
absorveu como "vacina" todo material sutil do Planeta Dourado, 
considerado capaz de manifestar qualquer efeito destrutivo na 
tessitura de seu corpo físico. Sejam microorganismos unicelulares 
ou quaisquer outros. Agora, o processo está encerrado. 
 Quer dizer que estou imunizado à hostilidade do meio 
ambiente? 
 Definitivamente. Sobreviverá, com a aparência que tem 
agora, a três ou quatro novas gerações de sua Raça, sem uma ruga 
adicional. O que equivale a quase mil anos terráqueos. 
 Oh! Meu Deus! Por que tudo isso? 
 Bem... seu nome já indica. Sendo RANA (rei ou grande 
príncipe) de RA'M SMARANA, responsável pela reestrutura de seu 
Povo, obriga-se a posição de PROTETOR. Os elementos de sua Raça, 
ora exilados no planeta NYZZA, sofrerão testes concernentes à 
situação evolucional de cada um. Os que estiverem capacitados para 
fazer jús aos novos empreendimentos, serão transportados como 
você, fisicamente, para o novo planeta herdado. Terão de ser 
submetidos a "tratamentos" preservativos de adaptação. Isso 
periodicamente. Diferente de seu caso, é claro! Em você, o 
processo de profilaxia foi diverso... E não teria sido necessário, 
se soubéssemos que manifestaria qualidades tão oportunas para seus 
encargos. Seu corpo está relevando o fenômeno da radioatividade. 
Esse o motivo por que em julho terá de sair da TERRA. 
 Radioativo! Céus! A que devo a punição? 
 Aconselho-o a não torcer os valores. No que lhe diz 
respeito, não pode ser considerado punição. Conforme mencionei 
antes, aceitou como função reorganizar, encaminhar, proteger e 
comandar sua Raça, como já o havia feito, num longínquo passado. 
Inicialmente, no Planeta Dourado, não obterá meios de defesa 
orgânica para sua gente. Não contará com o privilégio dos engenhos 
maravilhosos e sabedoria majestosa, arquivados no éter. RA'M 
SMARANA constituirá, provisoriamente, um mundo estranho a ser 
paulatinamente conquistado, sem derrotas. Cabe a você, RANA, usar 
deliberada e sabiamente, suas inesperadas propriedades 
radioativas, em doses homeopáticas. Sabe que são dotadas de grande 
poder bactericida. Não esqueça, todavia, a outra face da 
radioatividade: a destruição dos tecidos! Evidentemente, um 
SMARANIANO suportará maior dose de radioatividade, sem prejuízo, 
que qualquer criatura terráquea. Mesmo assim, você aprenderá a 
dosar necessariamente as emanações, evitando conscientemente a 
radiodermite. 
 Como poderei dosar um poder assim? 
 Com a VONTADE, RANA. Há um poder maior que a 
radioatividade: o controle de uma mente poderosa! 
 Quer dizer, então, que estou tornando-me RADÍFERO?  
brincou sem sorrir. 
 Mais ou menos isso. Faz parte de sua mutação natural. É 
preciso que saiba. O PODER ORIGEM é infalível! Meu trabalho de 
cooperação espontânea teve influência tão somente no que diz 
respeito às "vacinas" preventivas. O processo radioativo 
apresentou-se como resultante de uma química inesperada. 
Infiltramos em seu corpo sutil uma dose infinitesimal de AURUM e 
CUPRUM, metais existentes na natureza do Planeta Dourado em estado 
nativo. Como você foi avisado, RA'M SMARANA apresenta os mesmos 
caracteres geológicos do antigo planeta SMARANA. A estrutura atual 
da crosta apresenta depósitos de metais e metalóides, além do 
AURUM e CUPRUM, que parecem compor a natureza arenosa, em grãos e 
pequeninas palhetas. Daí, embora sob a influência colorida do Sol 
duplo, o Planeta manter sempre seu aspecto dourado quente. Enfim, 
o resultado das explorações que levamos a efeito, demonstra que o 
Cuprum e especialmente o Aurum são os agentes mais comuns na 
crosta do novo planeta herdado. Nota-se mesmo a influência desses 
agentes nos vegetais de grande porte e pequenos animais nativos. 
Descobrimos uma espécie de escaravelho dourado. Tem nas costas o 
desenho do signo de Câncer. Você apreciará seu "novo lar", RANA! 
 Espere! Será que o planeta Dourado tem propriedades 
radioativas? 
 Não disse isso. Disse que a dose daqueles metais produziu 
uma química inesperada no seu corpo físico. É preciso notar que, 
seu estágio noreino mineral, em seu planeta de origem, se deu 
exatamente como AURUM CUPROSO, ou seja, ouro misto de cobre. Pode 
ter uma idéia, agora, do POR QUE do processo radioativo? 
 Claro que posso. Contudo, sobram-me indagações. 
 Estou aqui para ajudá-lo. Responderei ao que for possível. 
Pergunte. 
 Como pode ter certeza de que sobreviverei por quase mil 
anos, se os corpos radioativos, segundo o que aprendi, compreendem 
diversos elementos em via de DESINTEGRAÇÃO? 
 Exatamente porque essa proclamada desintegração é 
caracterizada por grande desenvolvimento energético. A duração 
pode ser de um minuto... ou de um milênio. No seu caso, posso 
assegurar, será de um milênio! Não deve guiar-se demais pelas Leis 
que regem o globo terráqueo e suas imediações cósmicas. Os mundos 
são regidos segundo a Natureza de sua criação... e seu destino 
sideral. Ou mais claramente: a LEI manifesta-se sabiamente, sob 
múltiplas formas. Algumas, o homem terráqueo começa a sondar. 
Outras, muitas outras, nem sonha existir! 
 Tem razão... 
 No Planeta Dourado existe apenas um lago de águas 
profundas, radioativas. Será seu túmulo, num futuro bem remoto, 
por mais estranho que pareça no momento. 
 E SHÂNY? Como poderá viver ao meu lado, levando-se em 
consideração as emanações radioativas do meu corpo? 
 Está sendo submetida a um "tratamento" especial, para que 
possa suportar sua vizinhança sem prejuízos maiores. Quando morrer 
e renascer, estará liberta desta preocupação. 
 E os outros? 
 Já disse que está em sua vontade medir, controlar e evitar 
as emanações. Terá apenas que usar o poder da mente. Logo estará 
habituado a isso. 
 Inicialmente, como será a alimentação para meu Povo? 
 Dois tipos de cogumelos, já analisados. Constituirão 
iguaria saborosa e de fácil aquisição. O primeiro tipo, mais 
comum, de cor dourada, nasce em cachos, como o agárico campestre 
da TERRA. A esse, resolvemos chamar DRÍADES, porque florescem nos 
bosques, o segundo, semelhante em forma e coloração a Amanita dos 
Césares, recebeu o nome de NÁIADES. Desenvolve-se nas proximidades 
de rios e fontes. Conta-se também com o fruto de certa palmeira 
que recorda o cocus nucifera. Para começar, estarão perfeitamente 
atendidos no que diz respeito ao assunto alimento. Você contará 
apenas com o ASTER, folhas e frutos. Trata-se de árvore de grande 
porte. Atinge quarenta ou quarenta e cinco metros terráqueos. Pode 
ser comparada ao quercualium (carvalho). Notará nesta árvore 
propriedades magnéticas. Alimenta-se de aurum cuproso. Observará 
sempre grandes depósitos desse metal nas proximidades das raízes 
do ÁSTER. Para você, constituirá alimento de primeira necessidade. 
 Nenhuma variação? 
 Nenhuma... Com exceção, evidentemente, do suco dos frutos 
da Rosa Dourada dos Campos, a Planta SAGRADA! É rara e surge 
sempre nas proximidades do ÁSTER. Alimenta-se do mesmo tipo de 
minério. Não cresce muito. Mantém-se arbusto. Suas flores são de 
lindo aspecto. Apresentam-se em cachos, exatamente como a 
conhecida rosa dos campos terráquea. 
 Tem perfume? 
 Doce e forte como o jasmim. Pétalas carnudas, de aparência 
metálica. Os frutos atingem o tamanho de uma laranja bem 
desenvolvida. O suco de tais frutos aplaca a sede, ajuda a 
renovação energética e a celular. Indicado para você, perigoso 
para seus súditos. Sabe que adquiriu contextura diversa de sua 
gente. 
 Você mencionou, há dois dias, que poderíamos fazer uso 
provisório das edificações já existentes no Planeta Dourado. 
Mantém o que disse? Não haverá perigo para meu Povo? 
 Nenhum. Fizemos inspeção completa. Analisamos, testamos 
cuidadosamente o interior dos edifícios piramidais com engenho de 
absoluta precisão. Não há o que temer. Estão em perfeito estado de 
conservação. Ademais são edificações de grande beleza. Com certeza 
irá apreciá-los. Quando for oportuno, RAI também ficará encantada 
com o aspecto geral. 
 Disse-me RAM que são fabricados com gigantescos tijolos de 
rocha. 
 Sim. Blocos de Euphótide de Smaragdite, outros de Micaxisto 
de Granada e ainda outros de Syenito Nephelínico. Isto quer dizer 
que representam um espetáculo em cores. 
 Em conclusão, vejo que o Planeta Dourado possui rochas 
iguais ou semelhantes às daqui. 
 Semelhantes, RANA. Por esse motivo, aplico os mesmos nomes, 
visando facilitar o reconhecimento do material. RA'M SMARANA é 
como seu vizinho, o KRISHNALOKA, um Planeta rico para o conforto 
dos empreendimentos de uma Raça evoluída. Em julho, quando lá 
chegar, encontrará uma edificação central, circular, inteiramente 
nova. Está sendo construída segundo a arquitetura SMARANIANA. Toda 
em quartzo citrino. Será seu lar constante, por quase um milênio. 
Vamos batizar o edifício com o nome de "MIRANTE DO COMANDO". 
 E a cúpula? 
 Será em quartzo incolor. Para que possa usufruir das 
influências vibratórias do Sol Duplo. Está bem assim, ou prefere 
que haja alguma modificação? 
 Eu não faria melhor. 
 Fico satisfeito em saber que agradará. 
 
* 
* * 
 
Duas semanas passaram. MAHT começa a sofrer a pressão 
hostilizante da ansiedade inevitável. Sente-se como um manômetro 
humano, tentando medir a pressão dos vapores do seu vulcão 
interior. Afinal é o "adeus à TERRA"! Um adeus definitivo... 
 RAI!  pensa MART com o coração doendo  Entre mim e RAI 
uma quantidade de anos luz que não me atrevo a recordar. Aqui na 
TERRA, tudo é diferente. Há coragem suficiente para as pequenas 
distâncias. Estendo o braço e... quase posso tocá-la. Oh! Deus! 
Não é somente o Anjo Cassiel digno do titulo de "PRÍNCIPE DAS 
SOLIDÕES". Não passearei por paragens de ermo e silêncio, mas 
carregarei comigo, onde quer que vá, a solidão do meu amor. Oh! 
DEVAS! Lavas candentes pressionam minha'Alma! Que farei deste meu 
coração condenado? Ah! Quem diria que haveria de me tornar tão 
forte! Infeliz RANA! Desgraçado de ti! Tua sentença tem início 
agora. Um milênio de saudades e amarguras pela frente. Sem direito 
a repouso, sem direito a esquecer! Miserável MESTIÇO! Se em teu 
estágio animal nem mesmo mereceste ser o Pássaro de Fogo, puro 
exemplar de tua bela Raça! Lembra-te bem, agora que podes lamentar 
ainda. Foste a curiosa resultante de um cruzamento entre 
exemplares puros: um RADTL NEGRO e outro PLATINADO. (Espécie de 
pantera). Não herdaste nem o pelo negro metálico de um, nem o 
platinado do outro. Nem mesmo os olhos verdes de ambos! Surgiste 
RADIL DOURADO-ACOBREADO, de olhos argênteos. Solitário até mesmo 
em tua espécie mestiça Como em tudo mais... Agora, cala-te 
desditoso! Chega de prantear tua sentença. Acaso tens direito a 
isso? Com certeza não tens. És o favorito dos DEVAS! Ah! Muita 
razão teve TAGORE quando escreveu: 
 
"SE MEU CORAÇÃO HÁ DE ROMPER-SE, QUE SE ROMPA. 
O MUNDO MARCHARÁ IGUAL. E EU NÃO VIVEREI MENOS". 
 
Penosos eram os pensamentos de MART, quando recebeu a visita 
de RAM. Levantou a olhar com dificuldade. O Colosso de tez escura 
fitou-o afável. MART deslizou as faróis argênteos de seus olhos 
ansiosos pela figura soberba da MAHADEVA. Sua personalidade 
extraterrena envolvia MART num abraço excepcional. 
 Ainda bem que veio!  murmurou  Temi que me deixasse só 
por mais tempo. Quase sufoco! 
 ROMA tem vindo regularmente. É mais útil no momento. Você 
precisa absorver rapidamente uma tonelada de conhecimentos 
indispensáveis sabre o novo planeta. 
 ROMA é um DEVA-COMANDO. Habituado a ordenar. Estou farto 
dele! 
 MART!  censurou o Colosso. 
 Já sei... Reconheço que sou um animal ingrato e rebelde. 
Espera demais de um homem, RAM! 
 Você é mais que um homem, agora. É RANA, COMANDO do novo 
paraíso dos Smaranianos. 
 Diga-me, serão sempreassim tão cruas, tão brutais, as 
experiências da minha Alma exilada? 
 "Cruas" e "brutais" são palavras impostas pela 
sensibilidade exacerbada. Antes, foi submetido a experiências mais 
cruéis, sem protesto. Naquele tempo, podia analisar, medir alturas 
e profundidades com a clareza que convém a um poderoso Líder de 
povos. Hoje, sofre demais a interferência dos sentimentos e 
anseios humanos. Tudo se agrava, quando o homem desconhece a fonte 
de seus poderes, ou os ignora. Quando ele pensa estar só e caminha 
com as forças vacilantes de sua inconsciência. Mas, você! Sabe que 
o manancial do poder está ao seu alcance. Basta que deseje. Basta 
que se mantenha inegoista e não cometa enganos passíveis de 
punição. 
 Não me interessam poderes. 
 Nisso está assentada sua glória. 
 Acaso condena os sentimentos e anseios humanos, RAM? 
 Sabe que não. Considero muito doce, maravilhoso mesmo, ser 
humano. 
 Então? 
 Por isso tenho estado ao seu lado. Como é, comandará homens 
e conquistará devas. 
 Não exagere. Isso... faz você. 
 Não. Eu comando Devas e... tenho conquistado homens para 
encaminhá-los aos esplendores de heranças insuspeitadas. Homens 
como você, ou quase... E ainda outros, inconscientes e humanamente 
ansiosos pela DIVINDADE. 
 Qual! Sinto-me uma toupeira. Nada de ansiedades 
alcandoradas. Nada de altruísmos. Nada... 
 Pare com isso.  A voz profunda do MAHADEVA fez-se ouvir 
como carícia. No entanto, era uma ordem! MART silenciou. Somente 
RAM seria capaz de interessá-lo ante as novas perspectivas do 
Planeta Dourado. Bastaria surgir diante de seus olhos apaixonados 
sob a doce aparência de RAI... Se ELA encontrasse beleza no 
Planeta, MART enxergaria o novo mundo pelos olhos verdes da mulher 
amada. 
 Tenho certeza de que RAI vai gostar do novo SMARANA  
confirmou o Colosso, tendo apreendido os pensamentos de seu 
protegido. 
 Captou bem depressa... 
 Está em condições de evitar isso, se assim desejar. 
Reconquistou poderes que facultarão muita coisa. Barreiras mentais 
de grande alcance, de grande efeito, por exemplo. 
 Para o seu poder seriam nulas. Nem eu desejaria ocultar 
coisa alguma de você. Conhece-me mais profundamente do que eu 
mesmo. Sabe o que quero, sofro, desejo, penso. O que adoro! Que 
sobraria para esconder? Minhas inferioridades? Também as conhece 
todas. Julga-me tão tolo ainda? 
 Insensato, às vezes. 
 Nem toda sua sabedoria inopinável poderá mudar esse estado 
de coisas. O homem que AMA não sonha com liderança de povos nem 
com a conquista dos espaços intercósmicos. Pense bem, RAM! Sou um 
homem. As profundezas e poderes de minha antiga personalidade não 
afetou nem um pouco o homem simples que sou. E creio que 
continuarei sendo. AMO! Se é verdade que recuperei forças, todas 
elas pertencem por direito a este AMOR. Já que a ele cabe a 
responsabilidade dos meus vôos e das minhas vertigens... Esteja 
certo, RAM, este sentimento imperioso constitui o verdadeiro poder 
de minha Alma. 
 Ainda assim, há facetas que contrariam o bom senso. 
 Quais? Mostre-me! Quero advogar minha causa. 
 Não compreende, MART, que é indispensável transpor os 
limites de nossas conveniências, quando se deseja oferendar 
estrêlas ao AMOR? Não vê que é preciso ignorar as exigências e 
sujeições demasiado humanas, para que o sentimento não acabe 
padecendo de inércia? Para que circule em espiral, rumo às alturas 
apoteóticas? Ou tão imaturo é este seu amor que se compraz em auto 
condenar-se à insignificância dos interiores estreitos, à baixa 
concentração de forças e ideais? 
 Sabe que não é assim  protestou subjugado . Sabe que a 
verdade é aquela que acabei de declarar. Não há o menor perigo de 
inércia para o meu amor. Mas, talvez tenha razão quando diz que o 
exponho à insipidez mesquinha dos ambientes limitados. NÃO! Quero 
para meu AMOR as grandes e mais belas dimensões. Para que possa 
florescer inexorável, excedendo a grandiosidade de tudo que 
conheço! 
 
* 
* * 
 
ROMA, o Grande Mentor, retorna para instruir. A expressão 
marcante de seu formoso rosto, permanece fria, impessoal. Veste 
traje inteiriço até os pés, maleável, ajustado às suas formas 
perfeitas. Tem-se a impressão de tecido metálico, de cor 
semelhante aos seus fartos cabelos. Talvez uma roupagem espacial. 
 Como se sente, RANA? 
 Pessimamente. 
 Não me refiro aos seus sentimentos pessoais. Pergunto pelo 
equilíbrio físico. 
 Tudo seguindo como você deseja. 
 OU como deveria desejar. 
 Tem continuado a exploração e análise do Planeta Dourado? 
 Dentro das minhas possibilidades. Encontramos carbonato 
verde de cuprum, cristalizável. Algo semelhante ao Malaquito. Além 
de sulfoarsenieto de prata. Minério vermelho, em filões 
argentíferos, de brilho metalóide. Elementos de grande utilidade 
futura. 
 Conheço-os bem. 
 Os Pássaros de Fogo não sofreram alterações com a mudança 
de mundo. Exploram o Planeta como velhos entendidos. Creio que 
gostará de ver os GARUDAS travestidos de exploradores planetários. 
Há certa dose de humor no fato. 
 Sem dúvida. E o que encontraram mais? 
 Variedades de meteorito, ferro niquelado, alguns silicatos, 
como a bronzita e feldspatos. Nada inaproveitável. Ah! Observamos 
um tipo Coleóptero, de lindas asas azul-elétrico, dotado de 
fosforescência ao entardecer. Lembra ligeiramente o pirilampo, mas 
aparece em grupos coordenados, desenvolvendo curioso bailado. 
 Gosto disso. 
 Levaremos da TERRA a Phénix Dactylífera (tamareira). RAM 
considera a espécie mais energética e facilmente adaptável ao solo 
dourado. Naturalmente multiplicará suas qualidades sob a ação do 
solo aurífero. 
 Hum! Descobriu o local onde deveria encontrar aurum eletrum 
em estado natural? 
 Exatamente como você supôs. Perto de regatos e fontes. O 
aurum argental ou eletrum qualifica o terreno para a edificação do 
TEMPLO, como você deseja, RANA. Testamos o aurum devidamente: 
contém mais de 20% de prata, em estado natural. 
 ÓTIMO! 
 Descobrimos interessantes cavernas, inteiramente formadas 
por elemento mineral parecido com o onyx ambreado da Argélia e o 
onyx vermelho de Marrocos. Enfim, seu novo planeta. representa 
muito mais do que se esperava. Verdadeiro tesouro em minério! 
 RAI gostaria de la? Qual a sua opinião? 
 O parecer de RAI seria caprichoso. Não deve pesar demais no 
que diz respeito aos seus compromissos assumidos. 
 "ROMA locuta, causa finita"  murmurou MART com enfado. 
 SHÂNY estará em RA'M SMARANA quinze dias depois de sua 
chegada  continuou o Mentor, ignorando a irreverência  
Aconselho-o a preparar-se para recebê-la como convém. Qualquer 
desentendimento inicial, trará conseqüências penosas no futuro. 
 "ROMA locuta est"  insistiu MART, teimosamente. 
 Na verdade, meu rapaz, quando ROMA fala geralmente tem 
razão. Nunca se entrega à sujeição de seus anseios. Impugna até 
mesmo seus mais altos desejos. Por isso mesmo pode ver claro. 
 ROMA é um iceberg! Um Deva, acima dos sentimentos e 
sensações humanas. 
 Um Deva, MART, é aquele que aprendeu a COMANDAR e DIRIGIR 
as emoções, sentimentos e sensações humanas. Pode capturá-las e 
mantê-las subordinadas à sua vontade, ou liberá-las para melhor 
senti-las. Você pode investigar um Deva, sem a severidade 
vexatória do homem comum, ignorante. Está qualificado para 
examinar com equidade, imparcialidade e verdadeiro empenho de ver 
certo. 
 Venceu, ROMA! Não precisa ir adiante. Detesto 
reprimendas... que não venham de RAM. Confesso que desta vez não 
consegui sustar o curso de minhas reações. Sua perfeição sobre-
humana tem a faculdade de me enfurecer, de tumultuar meus intentos 
mais disciplinados. Sintomuito! Estar sob seus cuidados deve 
constituir privilégio imerecido para mim... Julgo-o 
invariavelmente. Reprovo-me a seguir. É uma constante infalível! 
Pode estar certo, porém, de que é outra minha preferência. 
 Mesmo assim, esteja certo de que cumprirei minha parte 
neste pequeno trabalho. 
 Com a frieza com que o faz... acredito. 
 Não vamos retornar ao ponto de partida, RANA. Desgosta-me 
desencadear tempestades inúteis. Ouça-me! Não pode aceitar que 
estou tentando cooperar, facilitando, dissolvendo obstáculos em 
sua nova vida? 
 Claro que posso! Faria qualquer coisa, tenho certeza. Muito 
mais até. Seria capaz de construir todas as edificações 
necessárias ao conforto de meu Povo, desde que isso não 
contrariasse meus limites cármicos. Facilitaria tudo para que 
houvessem bilhões de anos luz entre mim e RAI! 
 Insolência inócua, RANA. Julgamento injurioso, infantil e 
prejudicial para você. Sei que minhas atitudes superam a razão 
comum. Mas você devia saber. Pensei que sabia! Quando um Homem AMA 
realmente, nem milhões ou bilhões de anos luz seriam capazes de 
separá-lo da criatura amada. Nem infinitos nem dimensões. Eu não 
seria um Deva-Comando, mas um desgraçado, se assim não fosse. 
Entendeu, meu rapaz? Espero que tenha aprendido sua lição. Se 
merece o carinho, a atenção de RAI, é inteiramente digno de minha 
amizade. Precisa acreditar nisso. Se houveram desajustes em nossos 
entendimentos num remoto passado, isso ficou para trás. Hoje, RAI 
removeu os motivos, estabeleceu um ELO sólido e inevitável. Medite 
sobre isso, RANA. Não sou o iceberg que supõe. RANN, o Sacerdote-
Reinante do Planeta RADDHAY, que é tão seu conhecido, tem 
experiência do que acabo de dizer. Boa noite... meu irmão de 
sentimento. 
 Vai... tão depressa?  balbuciou MART abatido. 
 Só me verá no mês de julho, e em corpo físico. Até lá conto 
que esteja persuadido da exata natureza de meus atos. Quando 
conseguir forças para submeter os desfalecimentos do coração, 
procure RAI. Conciliará as conspirações do ego imprevisível. No 
dia, hora e local combinados, minha NAVE estará à sua espera. Não 
esqueça! A parte essencial é preservar o ânimo. Não consinta que a 
resistência seja corrompida. Asseguro que verá RAI sempre que for 
possível levá-la ao Planeta Dourado. É uma PROMESSA! Fique 
descansado. 
 Não sei se haverá mérito para tanto. 
 Haverá, RANA. Fique tranqüilo. Vá dormir... 
 
* 
* * 
 
RAI acercou-se de MART com cuidado. Seus longos cabelos cor de 
prata tocaram de leve o rosto do rapaz, quando ELA curvou-se para 
ver se ele dormia. 
 Está meditando  convenceu-a RAM, que acompanhava-a . 
Vamos trazê-lo para nosso plano. Será mais adequado.  O Colosso 
moreno pressionou ligeiramente as têmporas de MART, com suas mãos 
grandes, de dedos fortes e alongados. Logo, fez-se estranho vapor 
que se adensando, revelou a forma astral de MART. 
 Graças aos Céus que vocês vieram!  disse ele com 
ansiedade febril nos olhos argênteos. Acercou-se de RAM e beijou-
lhe a mão com grande devoção. Depois, caiu aos pés de RAI, de 
joelhos. Não falou nem se moveu por muito tempo. 
 MART...  disse a mulher com grande doçura na voz  Viemos 
para dar-lhe satisfação. Dói-me vê-lo assim... 
 RAI tem razão, MART. Viemos para contentá-lo... Aflige-nos 
sua atitude. 
MART ergueu o corpo devagar... Não era preciso investigar para 
saber que seu coração estava repleto de amargura. 
 Quase não há nada a dizer, Querida. Meu comportamento, nos 
últimos dias, tem sido insolente... intolerável mesmo. 
 É razoável, MART  consolou RAI, afagando-lhe os fartos 
cabelos  O destino tem sido inexorável... É natural que você se 
torne inconsiderado nestes últimos dias. 
 O destino é sempre implacável para o homem que ainda está 
sujeito ao SAMSARA (cicio de mortes e renascimentos) neste mundo. 
Nada disso me autoriza ao comportamento impertinente que tenho 
tido com ROMA. Ele tem sido incansável. Faz tudo o que está ao seu 
alcance para "amaciar" meu novo exílio. Até mesmo aturando minhas 
irreflexões e rabugices. 
 ROMA é um DEVA. Está capacitado para compreender. 
 Tem sido complacente demais. RAI... Oh! meu amor! Diga-me 
que não esquecerá de mim. Prometa-me! Diga-me que lembrará todos 
os dias. Ah! Céus! Perdido do homem que sonha ser amado. Sei muito 
bem o que valho. Conheço exatamente a expansão que meu sentimento 
conquistou... Os incêndios invencíveis que consubstanciam o meu 
AMOR... Paralelos a perigosos declives: o anseio de ser 
correspondido. Vestígios da fraqueza humana... Endoideço quando 
penso, RAM! RAI tem sido adorada com a devoção de amores sobre-
humanos. Enquanto eu... sou apenas um homem. Débil exemplar, por 
sinal. 
 Esse amor sobre-humano a que se referiu, MART  declarou 
RAM, com sua mansa voz, profunda e forte , não é privilégio de 
DEVAS. Está ao alcance do Homem... Feliz daquele que ama sem 
condições! 
 Quem falou em condições? Posso ser suficientemente débil 
para sonhar com um pouco de retribuição. Mas, isso não quer dizer, 
absolutamente, que... se não houver tal retribuição, haverá 
modificação no meu modo de amar. Nem no valor do meu AMOR, nem em 
sua intensidade! 
 Você considera-se apenas um Homem, MART...  interferiu 
RAI, confortadora  Pois bem! Aí está uma das prerrogativas do 
Homem: amar, sonhando ser amado! Não há nada errado nisso. 
 Minha doce, minha terna RAI!  sorriu o rapaz, triste e 
enternecido  Invejo ROMA. Tenho de confessar. Ele não teme as 
distâncias como eu... como um homem comum. Tem a serenidade 
daquele que não aconchega dúvidas no coração, ou não espera 
dádivas do AMOR. 
 Vamos falar de outra coisa, MART. Está devidamente 
preparado para o dia da viagem? 
 Fisicamente, sim, minha Querida. Sabe que sempre fui forte 
e anormalmente saudável. Agora, sou prodígio de energia constante 
e qualidades multiplicadas. Cada dia descubro que posso fazer mais 
coisas. Posso utilizar forças que o homem comum nem chegou a 
conhecer ainda. Consideram-me ingrato pela indiferença com que 
tenho recebido tais "heranças" cósmicas. 
 Está se tornando muito amargo, MART. Evite isso. Sou eu 
quem pede! Acabará construindo para mim um complexo de culpa que 
resultará mal às minhas tarefas espirituais. 
 Perdoe-me, AMOR! Não é este meu intento. Deixo, apenas, meu 
coração aberto ao seu olhar. Nada poderá desviar esta simplória 
condição humana do meu peito: o temor da separação! Tenho vivido 
na TERRA séculos demais. Tenho morrido e renascido terráqueo por 
muitas, muitas vezes. É razoável que me comporte como um 
terráqueo, agora. 
 Não apenas razoável... É justo. Se não fosse este seu 
comportamento, talvez eu mesma duvidasse da intensidade de seus 
sentimentos. Também tenho vivido muitos séculos no regaço maternal 
da TERRA. Transformei-me por adoção... Hoje sou bem um exemplar 
terráqueo, como você se sente. 
 Quer dizer que me perdoa a fraqueza? 
 É evidente. Não se preocupe demais com os Devas, MART. Pelo 
menos, no que diz respeito a minha pessoa. Os Devas não precisam 
de mim... E eu detesto ser inútil. 
 Compreendo. Olhe! É a última vez que posso contemplá-la 
aqui na TERRA. Não quero transformar isso num pesadelo. Deixe-me 
observá-la apenas um pouco mais... em silêncio. Depois... por 
favor vá embora. As despedidas são sempre sombrias. A minha 
especialmente. Contém sombras demais. Não desejo prolongar essa 
angústia asfixiante! 
 Mal chegamos, MART  falou RAM  Quer mesmo que eu leve 
RAI assim tão depressa? 
 Quero. Prefiro assim. Não sei até onde meu egoísmo 
sentimental poderá submeter-me. Quero que RAI vá embora enquanto 
estou razoavelmente controlado. 
 Está bem. Mas, consideroseu autocontrole excelente, face 
aos últimos acontecimentos gerais. 
 Contudo... insisto. Meu "conhece-te a ti mesmo" é 
extremamente falho ainda. 
 Exagera... 
 Pode ser, mas não confio. RAM! Pelos Céus! Não está 
querendo compreender. Em sua longa jornada experimental por mundos 
e encarnações diferentes, deve ter conhecido uma situação 
semelhante. Não é verdade?... A Hierarquia espiritual que atingiu 
demonstra que é um homem larga e duramente provado. Com certeza, 
algum dia, em algum lugar do Universo, amou sem ser correspondido. 
Tem que saber como estou me sentindo neste instante. 
 Sim...  confirmou o Colosso, pensativo, em sua voz mansa 
e profunda  Certa vez... em Nirodha. Alguém que se chamava RYE... 
Faz muito, muito, muito tempo! 
 E como estão as coisas agora? 
 Importa tanto assim saber? 
 Mais do que supõe. 
 Pois bem. Agora, para RYE sou o Amor Supremo. 
 E ela para você? 
 Quero-lhe muito bem. Muito mesmo. RYE foi um estágio 
expiatório. Ou ainda, uma grande experiência da Alma. Algo muito 
belo, MART. Mas, a Substância do SER criado está sempre em 
movimento. Transpõe isso que se chama vida e morte. Ultrapassa 
duras experiências, tremendas expiações! Transforma sentimentos, 
sensações, sonhos e desejos. Só o Amor verdadeiro pode se manter 
inalterado, constante, depois de submetido às tensões de 
incorretas polarizações, às distorções de correntes 
sobrecarregadas, aos circuitos e às projeções de grandes 
distâncias. Agora, se me permite, despeço-me. 
 
* 
* * 
 
Alguns minutos mais e as sombras fugiriam. O sol demonstraria 
mais uma vez o mesmo espetáculo real de sempre, numa beleza sempre 
nova. Enquanto isso o homem solitário caminhava descalço pela 
praia deserta. Apesar do frio, tinha o tórax desnudo. Um tórax 
esplêndido, demonstrando saúde, beleza e poder. 
Sutil sibilar, emitido em variações desconhecidas, fez-se 
ouvir bem perto. Rápido em seus movimentos felídeos, o homem cavou 
com as próprias mãos um buraco na areia. Despiu as calças, 
mantendo apenas o pequeno calção interno. Juntou calçado e roupas, 
enterrando-as. Quando levantou a cabeça, viu a grande NAVE que 
pairava silenciosa a 6 ou 7 metros do solo. Não havia luzes. 
Apenas tênue fosforescência revelando um campo magnético. MART 
observou a estranha escada de pequenos discos imantados uns aos 
outros, descendo para ele. Subiu com a agilidade de gato em 
telhados familiares. A escada de discos superpostos desapareceu 
com a mesma rapidez no interior da Nave. 
Na calçada da praia, uma mulher observava quieta. Viu quando a 
mirante triangular, situado na parte superior da Nave circular, 
inflamou-se de luzes coloridas que se sucediam. Nem chegou a 
piscar e já não via coisa alguma. A Nave havia sumido, levando em 
seu interior o belo homem que ela havia seguido pela praia. Puxou 
com violência os cabelos avermelhados. Cabelos que enfeitavam seu 
rosto cansado, embora ainda jovem. 
 Com certeza estou tendo alucinações  pensou a mulher 
aturdida  Com o tempo, pessoas como eu começam a apodrecer em 
vida. Até a mente começa a falhar. Ora!  cogitou com severidade 
 Todo infeliz fabrica belezas inexistentes para tornar respirável 
seus dias vazios. Aquele homem, com certeza nunca existiu. A 
Nave... muito menos probabilidade de ser verdadeira. Isso prova 
apenas que estou envelhecendo e... bebendo demais! 
Assentou-se na calçada fria. Esperou a chegada do Sol que logo 
veio, retumbante de luz, falando de VIDA! Olhou-o por um instante. 
Depois, cobriu o rosto com as mãos trêmulas. O corpo inteiro 
tremeu, sacudido. Soluços de desconforto. O funeral de ilusões, há 
muito tempo mortas! 
 
* 
* * 
 
Dentro da Nave, ROMA estreitou MART num abraço fraterno. 
 Venha, RANA  disse suavemente  Em poucos minutos 
entraremos no subespaço, onde viajaremos durante 264 horas 
terráqueas. 
 Qual a força propulsora desta Nave?  indagou com ar 
ausente o novo passageiro. Roma viu o brilho argental dos olhos 
daquele que, por fim, havia perdido o nome de MART para sempre. 
Ninguém mais estaria com permissão para chamá-lo assim. Doravante, 
ele seria apenas RANA! Pelos olhos de ROMA cintilou uma faísca de 
ternura. 
 Venha, meu irmão. Vou mostrar-lhe. 
 Parece-me bem grande esta Nave  comentou RANA 
inexpressivo. 
 É uma das menores de ROMAHARSAN. Comporta apenas 150 
tripulantes e 300 passageiros. As maiores suportam o dobro de tudo 
isso. 
 Formidável! 
RANA caminhou pelos corredores espaçosos e confortáveis. 
Dependências metálicas, singularmente lançadas. Atravessou 
pequenas "ruas" circulares, estranhas, mas agradáveis, cuja 
iluminação parecia natural. Quando alcançou o centro da Nave, ROMA 
parou para que e1e observasse melhor. Lá havia vasto cilindro 
central, transparente, através do qual RANA contou 75 homens 
assentados e imóveis, embora de olhos abertos. Assentos 
anatômicos, estreitos, dispostos em círculo, ligados uns aos 
outros. Eram os tripulantes Romaharsanianos, de olhar fixo num 
imenso CONE de LUZ que descia do teto até o chão da Nave. A 
extraordinária Luz oferecia modificações deslumbrantes, em cores e 
movimentos. Os homens mantinham-se de mãos dadas. A direita 
descansando na esquerda do vizinho. Uma espécie de cadeia de 
força! 
 Que fazem eles, ROMA? 
 Aí tem sua resposta à pergunta inicial. Entramos há dez 
minutos no subespaço. Eles são os "Instrumentos" canalizadores e 
controladores da força que move e dirige a astronave no subespaço. 
 Parecem tranqüilos. 
 Surpreende-se? Eles estão concentrados numa freqüência 
altamente dinâmica, em perfeito equilíbrio. São disciplinados para 
isso. 
 Quanto tempo suportarão essa concentração? 
 Vinte e quatro horas terrestres. No planeta KRISHNALOKA, é 
por esse método de força mental aliada à energia cósmica, que se 
movimentam as espaçonaves. 
 Mas, se suportam apenas 24 horas terrestres... 
 Trabalham por turno, RANA. São substituídos pelos outros 
75. E assim por diante. 
 Não ocorre jamais uma eventualidade que incapacite um deles 
por longo período? E sendo diminuído o número de elementos 
atuantes, como se arranjariam? 
 É natural que ocorram coisas assim. Muito raro, porém. Os 
tripulantes são treinados, observados, examinados, disciplinados, 
testados, para cada viagem. Muito raro sair algo errado. 
 Mas, tratando-se da eventualidade?  insistiu RANA. 
 O mirante triangular que se encontra no cimo da Nave não é 
apenas canal daquela Energia que notou. É também repositório de 
equipamentos técnicos indispensáveis. Lá está assentada uma 
máquina pequena, mas proporcional, que utiliza em seus numerosos 
transformadores, a Energia Cósmica. Entretanto, o uso dessa 
máquina só pode ser feito no espaço normal. No caso de uma 
eventualidade, teríamos que retornar rapidamente a ele. Evidente 
que passaríamos a nos deslocar muito mais vagarosamente. 
Seguiríamos, também, uma trajetória espacial muito mais extensa. 
 Compreendo. Impressiona-me a estabilidade que se desfruta 
no interior da Nave. Sinto-me como em terra firme. Posso olhar por 
uma vigia? 
 Pode... mas não verá nada. O subespaço é escuro. 
 "Atalho negro", então? 
 É uma região extraordinária  sorriu ROMA divertido  Vai 
apreciar quando chegar sua vez de estudá-la, futuramente. 
 Acredito. Sinto-o semelhante ao subconsciente do Homem. 
Umbral de atraentes mistérios. 
 O Homem foi criado para penetrar os grandes mistérios. Foi, 
originalmente, equipado para os profundos mergulhos e infinitos 
vôos. Pode transformar-se num "conversor" como num "inversor". 
Está qualificado para amplificar ou reduzir as diferenças de seu 
próprio potencial. É uma questãode tempo. 
 Até lá... arrasta-se inconsciente de seus poderes. Mísero 
verme satisfeito consigo mesmo. Nem quero pensar nisso. O estágio 
da "lama" e muito demorado. 
 Depende... São fases de grande efeito futuro. Nada mais do 
que o Homem exposto à sua própria força. Aprendizado de sucesso 
esse. Infalível, RANA! 
 Um DEVA está agradavelmente instalado para falar da posição 
do Homem, sem se deixar impressionar pelos insucessos de seus 
esforços primários. 
 Um DEVA, meu amigo, passou antes pelo estágio "lama" de que 
falou. Sofreu distorções, conheceu as baixas freqüências de micro 
mundos. Esteve exposto aos efeitos de suas próprias projeções. 
Abusou de seus limites. Viu-se isolado e submetido a resultantes 
de seus pobres ensaios obscuros. 
 Tem razão. Não há fuga possível. O Homem foi criado com o 
destino de AUTO-ENCONTRAR-SE conscientemente. Nada que diga ou 
faça pode mudar isso. Está livre para escolher as trilhas, atrasar 
a "caminhada", criar miragens, desenvolver obstáculos, mas não 
conseguirá mudar o final. Bem... quando poderei ver RAI novamente? 
 Ai está...  começou ROMA com ar malicioso  Qualquer 
assunto que seja tratado por você, acabará em RAI. Refira-se a 
semeadura ou colheita, empreendimentos técnicos ou... 
empacotamento de frutas! Tudo leva a pensar em RAI... Ainda bem! 
ELA não esquecerá de recordar-lhe o Objetivo Único ou conquista da 
Consciência Cósmica. Como vê, qualquer discrepância da rota fatal 
acaba sempre por trazer o suposto evadido de volta à Grande 
Finalidade. Você verá RAI em breve, meu amigo. Não antes de 
encontrar SHÂNY, naturalmente. 
 Não é preciso apagar o colorido das minhas primeiras 
perspectivas. 
 SHÂNY é a mais colorida das perspectivas em RA'M SMARANA. 
 Questão de opiniões. 
 Não posso nem devo persuadi-lo ao contrário. É um problema 
exclusivamente seu. Ninguém poderá ajudá-lo suficientemente. 
Ademais, não há pressa. Seu talento de Líder é o que conta agora, 
nesta etapa. 
 Por falar em SHÂNY... Como se sente em relação a ROMAR? 
Pode responder uma pergunta assim? 
 Sem dificuldade. Sinto-me apoiado, seguro, capaz. Com ela 
sou mais forte, mais sensível aos problemas humanos. Possa amar o 
AMOR com mais intensidade. Com ela, meu amigo, SOU ALGO COMPLETO e 
verdadeiramente útil. É o máximo que posso esclarecer à respeito. 
Para o resto, não encontro possibilidade de definição satisfatória 
em qualquer idioma expresso através de escrita ou fala. 
 Está bem assim  suspirou RANA, com ar de desânimo . Por 
mais que me esforce, sinto-me bem ao contrário. Desagrada-me a 
presença de SHÂNY. 
 Estranho... 
 É assim que me sinto agora. Provavelmente, depois destes 
mil anos punitivos, pensarei e sentirei de outro modo. 
 Precisara de tanto tempo? 
 Acho bem provável. Quando fiz meus estágios nos reinos 
vegetal e animal, fui um Monótipo. Talvez explique minha reação 
diversa. 
 Na verdade, é um tipo tentador como fonte de estudos. Vou 
mostrar-lhe seus aposentos. Venha... 
RANA logo encontrou-se num compartimento razoavelmente amplo, 
agradável aos sentidos físicos e sutis. Tudo combinava com seus 
olhos. Tudo argental! 
 RAI disse-me, certa ocasião, que um dia mandaria fabricar, 
especialmente para ela, uma cama assim!  comentou surpreendido  
Exatamente assim. Em que outro lugar existem essas camas? Em 
ROMAHARSAN? 
 Não. É modelo muito antigo. Nossas primeiras espaçonaves já 
possuíam "camas" assim. Antes, muito remotamente, RAI viajou em 
algumas Naves de ROMAHARSAN. Experimentando este modelo ficou 
entusiasmada. Disse que em nenhuma outra ocasião imaginaríamos 
algo mais confortante. Bem... foi conservado o modelo até hoje, 
embora, todas as outras coisas tenham sido alteradas. Gosta? 
 Percebo!... Sim, gosto muito. Devem ser mesmo confortáveis. 
 Nem um pouco mais do que é estritamente necessário. Observe 
o colchão fixo. 
 Parece espuma de prata  disse RANA experimentando-o. 
 Tem alguma semelhança com os leitos vegetais de KUNTI e do 
KRISHNALOKA. O colchão é fabricado com um componente mineral muito 
energético, que se mantém vivo. Toda essa borda alta que 
representa a cabeceira e declina até os pés, é composta de metal 
altamente sensível. Escolhido especialmente para transmitir bem-
estar. Observe a cabeceira. 
 Ora! Está escrito RANA, em sânscrito! 
 Isso mesmo. A "cama" foi condicionada para você. Não poderá 
ser ocupada por outro. Não daria o mesmo resultado. 
 Mas... Não vou usá-la por muito tempo! Ficará inutilizada, 
depois? 
 Não. Muda-se, apenas, o condicionamento, após severo 
expurgo geral. Enquanto você estiver usando-a, pensará, sentirá 
emoções, desejará... Serão pensamentos, desejos, sensações 
pessoais, convenientes a você. A transmissão deles para outro 
elemento não seria positivo. 
 Estou em tão péssimo conceito? 
 Não compreendeu. Nem mesmo os pensamentos de um Andrógino 
Angélico seriam positivos, no caso. 
Cada um deve repousar sem influências exteriores, para que 
mantenha equilíbrio relativo à sua própria evolução. 
 Compreendi, agora. Perdoe-me a ignorância. 
 Ao alcance de suas mãos, encontrará dois pequenos botões 
triangulares. Quando estiver deitado encontrará mais facilmente. 
Um verde e outro vermelho. Servem para ouvir melodias espaciais. 
Seu próprio padrão vibratório atrairá somente melodias que gostará 
de ouvir. O vermelho liga, e enquanto permanecer ligado conservará 
brilho fosforescente. O verde desliga e, quando o faz, fica 
fosforescente apenas um momento. 
 ROMA! É o melhor de tudo nessa fabulosa Espaçonave!  
elogiou o rapaz satisfeito. 
 Alegra-me que fique contente entre nós. Veja agora isto 
aqui  continuou apertando outro botão triangular vermelho, bem 
longe da cama.  Uma porta corrediça apareceu e logo sumiu 
embutida.  É um aposento de banho a vapor. Não usamos água 
enquanto viajamos. É desnecessária. Nos botões azul, dourado e 
rosa a temperatura do vapor poderá ser controlada para mais ou 
menos. Conseguirá ler muito facilmente o que está escrito neles. É 
sânscrito. 
 Meu caro! Deve ser sânscrito puríssimo. Ninguém conhece 
isso na Terra. O que se conhece por lá é de pureza discutível. 
 Você entenderá, RANA. ÉE sua língua-mãe. Está presente 
desde sua origem. Viva no subconsciente. Se desejar entender, 
basta um pequeno esforço mental. 
 Muito bem, mas...  insistiu o rapaz, olhando ao redor com 
sorriso travesso . Se precisar escrever? Não vejo cadeiras, mesa, 
lápis, papel! 
 Isto também será resolvido a contento  respondeu ROMA 
tranquilamente, apertando outro botão triangular na outra parede. 
Uma outra porta corrediça surgiu e desapareceu, deixando ver uma 
cavidade circular espaçosa. Dentro dela, um assento anatômico. 
 O que vem a ser esta coisa? 
 Pode-se dar-lhe o nome de cadeira, se convier. Nela você 
pode sentar-se comodamente, descansar a cabeça na cavidade 
correspondente. Todo corpo estará repousado. A seguir, liga o 
botão vermelho à sua direita. Feito isto, escreverá, MENTALMENTE, 
o que desejar. 
 Santo Deus! E se errar? 
 Há solução para tudo. Se errar, volte atrás, usando sempre 
a mente. Apague o que não está conforme ou não é desejado. Apague 
mentalmente, como se estivesse usando borracha. Depois, retorne ao 
ponto onde parou. Quando houver terminado, use o botão verde, bem 
à sua esquerda, para desligar a máquina. 
 E o que foi escrito? Onde fica? 
 Logo que for desligada, a máquina expelirá pequenas folhas 
de delicado metal, onde poderá ler o que desejou escrever, ou 
melhor, o que escreveu com o auxilio da mente. Notará que os 
caracteres correspondem à sua caligrafia pessoal. 
 Ah! O que se perde lá na TERRA!  gracejou RANA. Ao lado da "cama", notará um Visiofone. Esta peça nada tem 
de novidade, suponho, para os terráqueos. Transmite a voz, forma e 
cor fielmente. Recebe de igual modo, a grandes distâncias. 
 Sabe, meu amigo, fiquei cansado. Foi coisa demais para o 
pobre RANA. Vou experimentar a cama agora mesmo. 
 De acordo. Não esqueça de compor um diário. Não era isso o 
que pensava, quando procurou mesa, lápis e pape!? 
 Claro! Ajuda a alinhar os pensamentos. Estou encantado com 
seu "VELEIRO", Comandante! Gostaria que RAI pudesse vê-lo. 
 ELA verá... Descanse, agora. Chame-me, se precisar. Estarei 
no Mirante. Use o Visiofone. Aperte o botão em forma de R 
maiúsculo. 
 Obrigado por tudo. Espere um pouco! Como vou apagar a luz? 
 Muito simples. Deite-se e espere. 
 Só isso? 
 Só... Cinco minutos depois, notara que a luminosidade irá 
cedendo, até tornar-se tênue. Quando levantar-se, tudo voltará a 
ficar claro, como agora. 
 Comporto-me como criança espantada, não? Bem... Não sei se 
devo dizer "boa noite" ou "bom dia". Que sugere? 
 Não fará diferença aqui no subespaço. Descanse, RANA. Avise 
quando sentir fome ou precisar de mim. 
 Não se preocupe. Aqueles botões lá adiante, já entendi, são 
componentes vitamínicos para minha alimentação. 
 Sim. Encontrará ao lado das cápsulas o suco do Áster num 
recipiente cristalino. Use-o quando sentir sede. No caso de cansar 
de seus aposentos, procure orientar-se pelas numerosas divisões de 
"SHRI LAKSHMI". Há muito o que ver. 
 "SHRI LAKSHMI"? Foi o que disse? 
 Exatamente. É o registro referência desta NAVE nos 
Departamentos e Espaço-Portos de ROMAHARSAN. 
 Puxa! Estou EM-CAN-TA-DO com seu “VELEIRO", Comandante! 
 Já disse isso. 
 Deixe-me reiterar! 
 
* 
* * 
 
O dia no Planeta Dourado chegou exatamente ao meio. SARSTI, o 
Sol Duplo, derrama sua luz verde suave sabre RA'M SMARANA, 
propiciando a primavera, numa dádiva de tons e brilhos 
misteriantes. Sete metros acima do solo, a NAVE imobilizou-se. A 
escada foi descida. Ouvia-se murmúrio ele vozes. ROMA procurou 
RANA em seus aposentos. 
 Venha  disse simplesmente  Pequena multidão aguarda lá 
fora seu COMANDO. 
 Tem certeza de que chegamos?  inquiriu o rapaz, 
endurecendo os traços fisionômicos. 
 Certamente. Dei uma olhada ligeira. Quase mil elementos de 
sua Raça estão no Pátio Circular do MIRANTE DO COMANDO. Rostos 
ansiosos, RANA. 
 Exagera...  falou ríspido  Estão curiosos, apenas. É 
natural. 
 Engana-se. Não se trata de curiosidade. Precisam de você 
para sentir a segurança de que carecem. Dependem de você para 
serem SMARANIANOS novamente. 
 Ficarão decepcionados, no final. Não poderei evitar isso. 
 Sabe que não será assim, RANA. Descobrirá no coração 
reservas inesperadas para o trabalho que aceitou. Trabalho que lhe 
cabe por direito de origem. Lembre-se disso. Vá! Estão aguardando. 
Talvez você prefira descer em roupas espaciais... 
 Não! Bastam-me estes 27 centímetros de tecido metálico. Sou 
KANA, não é? Pois bem, isso deve bastar. Não haveriam de esperar 
que chegasse com manto carmesim e coroa espetada no crânio, não é? 
 Não, por certo não esperam isso. Sabem que seu antigo LÍDER 
possui mais dignidade do que é exigível para tal liderança. 
O belo homem de cabelos cor de chama viva passou por ROMA 
rapidamente. Atravessou os corredores e mais dependências da NAVE, 
até encontrar a abertura de saída. Seus maxilares estavam 
contraídos, seu olhar frio, quando divisou a multidão embaixo. 
ROMA esperava, em silêncio, logo atrás dele. 
 SHÂNY está lá entre eles  comentou com mau humor  
Haviam-me prometido que ela só seria trazida para cá quinze dias 
depois de mim. Por que a modificação? 
 Ordens superiores. Não tenho parte nisso. 
 Decisão de RAM? 
 Ordens de mais ACIMA, suponho. 
 Foi você quem trouxe SHÂNY? 
 Não. Foi ÁSTYA, o escolhido para essa missão. Ela veio em 
outra Nave, com muitos outros. Não deve preocupar-se com a 
presença dela. Não lhe causará maiores estorvos. A idéia é ajudá-
lo. 
 Péssima idéia, por sinal. Em que SHÂNY poderá prestar 
ajuda? 
 Desça, RANA. Não deve fazê-los esperar mais. 
 Tenha calma! Não sinto a menor urgência em deixar está 
NAVE... Vamos trocar de lugar por algum tempo? Desça e cuide do 
Planeta Dourado e seus novos herdeiros. Ficarei com "SHRI 
LAKSHMI", espaço a fora. 
 Não seria troca impossível. Apenas, não saberia lidar com 
seu povo tão bem quanto você. Da mesma forma, você não saberia o 
que fazer com "SHRI LAKSHMI"... ainda. 
 Obrigado por lembrar-me disso. Ganha sempre, Comandante. 
Vou descer. Vem comigo? 
 Não sou mais necessário. SKRON está capacitado para atendê-
lo, doravante. É ótimo elemento de sua Raça. Seu súdito em épocas 
remotas. Alguém muito fiel. Adora-o! Tenho certeza de que vai 
sentir-se "EM CASA”. 
 Está certo. Cuide de "SHRI LAKSHMI" por nós dois. 
 Não duvide. 
RANA desceu a escada de discos superpostos vagarosamente. Mal 
pisou em terra dourada, a NAVE desapareceu. 
 I'M LONELY...  murmurou sombriamente. Havia desolação no 
seu olhar. 
 Sou SKRON, meu COMANDO!  apresentou-se o gigante de ar 
tranqüilo, cabelos vermelhos e olhos azuis. Cruzou os braços sobre 
o peito maciço, com as mãos fechadas. Velho sinal de submissão e 
respeito, adotado há bilhões de anos atrás pelo Povo de SMARANA.  
Minha hierarquia permitiu que fosse escolhido para imediato na 
execução de suas ordens, Senhor. Se for de seu agrado, 
naturalmente. 
 É do meu agrado, SKRON  respondeu o LÍDER amigável  
Lembro-me de você. Gosto de vê-lo por perto. 
 Lembra-se de mim? De mim, Senhor?  surpreendeu-se o 
homem, com grande emoção  Honra-me, Senhor! Minha inferioridade 
proíbe-me recordar distintamente o que ficou sepultado no tempo. 
Sinto somente que meu Senhor representa para mim a maior 
Hierarquia de nossa Raça. O resto são sombras e muitas dúvidas 
sobre a autenticidade delas. 
 Basta que eu lembre, SKRON. É suficiente. 
Um brado de alegria ecoou pela multidão atenta. 
 RANA! RANA! RANA!  gritavam impetuosos.  Cruzaram os 
braços ao peito, em sinal de submissão e respeito.  Venturosos 
somos nós que temos a ti como LÍDER! Falavam num sânscrito 
puríssimo, que a TERRA desconhecia. RANA entendeu cada palavra. 
Bem havia dito ROMA! Era sua língua-mãe que novamente florescia 
pelos esconderijos insuspeitados de seu Espírito imortal. 
 SHÂNY!  chamou, em tom impessoal  Venha comigo. Vamos 
ocupar oficialmente o MIRANTE DO COMANDO. Pare de ficar 
espreitando, como animal desconfiado. Não vou mordê-la. 
 Fico-lhe muito grata  respondeu irônica  RAM pediu-me 
para não aborrecê-lo. 
 Conselho profundamente sábio. 
 Sinto não ter conseguido inventar, em tempo, uma engenhoca 
que me permitisse ficar invisível a maior parte das horas  
concluiu ela baixinho, mantendo ar de absoluta candidez. 
 Não exigiria tanto. Evite apenas mostrar-se espertinha 
demais. Ou compacta demais, também.  Falavam baixo, conservando 
ar de perfeita compreensão. Ninguém suspeitaria do que realmente 
falavam. Até mesmo SKRON, que estava inteirado do desagrado de 
RANA com relação à moça, mostrou-se satisfeito com o desfecho que 
o caso parecia haver tomado. Afinal, haviam-lhe informado que se 
tratava de situação algo melindrosa. 
 É só avisar  tornou SHÂNY entre dentes  quando ameaçar 
exceder-me. Sugiro um sinalizador nos seus aposentos. Vermelho! 
Encontrarei uma forma de eclipsar-me. Verde! Avançarei até o 
portal, para cumprimentá-lo, formalmente, e procurar saber se 
posso ser útil. 
 Seu senso de humor fatiga-me. Semelhante demais ao meu. 
 O que representa uma honra, Senhor! Posso divisar, agora, 
toda extensão de nosso tédio comum. Talvez queira retornar para NYZZA... Por uns tempos. 
 Oh! Nem pense nisso! Aqui tenho muito mais oportunidade de 
ver RAM. Lamento desencantá-lo, assim, logo de chegada. 
 Esperava isso... Não se pode ter tudo. 
 Ótimo, então. Estamos entendidos, suponho. 
 Tanto quanto é possível, numa situação destas. 
O MIRANTE DO COMANDO estava construído em quartzo citrino, num 
amplo terraço circular que parecia apoiado em grande elevação de 
terreno. Edificação circular, espaçosa, elegante, absurdamente 
simples, estética. Algo exatamente na proporção e gosto de RANA. 
Elevador rápido, macio, silencioso, confortável, cilíndrico, 
transparente. Sete andares compondo o MIRANTE. Os aposentos 
pessoais do LÍDER ficavam no sétimo, os de SHÂNY no sexto, o Salão 
de Audiências no térreo. Os outros andares teriam destino que RANA 
determinasse no futuro. 
No seu aposento de trabalho, o LÍDER emudeceu e estacou. Via-
se um topázio gigante, lapidado em forma de diamante, fixado ao 
chão. Cintilava discretamente sob a cúpula cristalina do MIRANTE, 
espelhando tons suaves, aconchegantes. Era a "mesa" de trabalho. 
Por trás dela, outro topázio semelhante, embora bem menor, 
constituía sua cadeira particular. Cavada anatomicamente, 
mostrava-se confortável e de grande mobilidade, apesar de 
equilibrada apenas no afinamento de suas facetas. RANA passeou os 
olhos, apressadamente, pelas paredes. Haviam fileiras de cavidades 
quadrangulares, onde se encontravam ajustados numerosos discos 
metálicos. Pequena biblioteca de fitas magnéticas, remanescentes 
da Inteligência Smaraniana. Tudo o que havia sobrado. Bastava 
manejar com os botões laterais, para que o COMANDO mergulhasse, 
audivelmente, nas profundezas da Sabedoria de seu POVO. Ele, 
porém, não mostrou-se interessado demais. Aproximou-se da "mesa", 
mansamente, com saudades no olhar. Ali estava a estátua de RAI! A 
forma de RAI tão perfeita como se fosse viva. RANA tocou o sari 
que esvoaçava de leve ao sabor do vento. Perfumava a sândalo. 
Afagou o rosto frio, inerte. Um gemido escapou de seu peito. 
 Não perca o ânimo  aconselhou SHÂNY despreocupada  
Sofrer com isso é infantil. Não esperava que ela fosse de carne e 
osso, não é? ROMA quis dar-lhe satisfação. Lembrou-se de que RANN, 
o Sacerdote-Reinante do planeta RADDHAY havia prometido a estátua 
a você, em certa ocasião. Pensou que estava na hora de efetuar a 
"cobrança". Foi o próprio RANN quem a trouxe. No seu aposento de 
repouso encontrará a caixa de KÊIR (espécie de cristal do planeta 
RADDHAY) que contém os outros saris. RANN explicou que troca 
diariamente as vestes da Estátua. Permite a ilusão da vida. 
Tontice! Um homem maravilhoso como aquele... Belíssimo! 
Aparentemente sábio, sereno, equilibrado... Fiquei impressionada 
com a importância que dava a Estátua. Você precisava ver. Nem 
mesmo entendi por que consentiu presentear-lhe. Olhava-a todo o 
tempo em que conversamos, com amor tal! Suspirou e saiu quase 
correndo, quando deixou-a ficar aí onde está agora. Seus 
estonteantes olhos cor de esmeralda cintilavam num adeus 
silencioso, magoado... Lamentável! 
 Acabou o discurso?  perguntou RANA asperamente. 
 Julguei agradá-lo, contando tudo como se passou! 
 Da próxima vez, por favor, não tente agradar-me. Jamais 
encontrará a fórmula certa. Sua tagarelice consome minha 
tolerância. 
 Coisa muito limitada, pelo que vejo. 
 Singularmente limitada, no que diz respeito a você, 
confesso. Vou precisar de toda minha reserva... para os outros. 
 Suplico que mantenha sua antipatia na graduação atual. Não 
sei como reagiria se regulasse para mais. Quem diria! Um homem tão 
formoso! 
 Emproada! Como era de supor, falta-lhe sabedoria. Agora... 
livre-me de sua presença... sua gata obstinada! 
 Dê-me as coordenadas e desaparecerei. Seu Povo, lá embaixo, 
aguarda as novas diretrizes do COMANDO. 
 Não é problema seu. Oh! Céus! Dizer que fui enganado! 
Prometeram-me alguns magros meses de solidão neste manso 
paraíso... Agora, isso! 
 Está bem "Frigid". Diga-me o que devo dizer a eles e vou 
embora. 
 Onde aprendeu Inglês? 
 RAM ensinou-me. O que quer saber mais? 
 Por que ele esqueceu de ensinar-lhe atitudes convenientes? 
Não quero ver-me obrigado a lixar-lhe a língua. 
 Você! Seria adorável, se não fosse esse humor detestável. 
Que pena! 
 Pare de resmungar e desapareça... Ainda está aí? 
 Estou... Espero suas ordens. Eles estão esperando, lembra-
se? 
 Faça-os dispersar. As ordens chegarão amanhã. Tenho um 
milênio pela frente. Não há pressa. 
 
* 
* * 
 
Dez dias de entrosamento com o Planeta Dourado. Dez dias que 
haviam aproximado RANA de sua gente. Onde ele passava era 
observado, reverenciado, amado! 
RANA quase não dorme. Duas horas de repouso por "entardecer". 
Em RA'M SMARANA, como no seu vizinho KRISHNALOKA, não há noite. E 
só aurora e entardecer. Uma estação semelhante à Primavera para a 
semeadura, enquanto SARSTI mostra sua face verde. Outra, 
comparável ao Verão, para a colheita, quando a estrela dupla 
apresenta sua face rosicler. 
RANA é um dínamo. Trabalha constantemente. Sua mente poderosa 
revolve os Arquivos do Tempo. Busca, recolhe, cataloga, transforma 
expressões de preceitos, exposições remotas da Inteligência de um 
Povo. Cabe a ele equipar sua gente para nova vida. Tem de 
construir instrumentos de que necessitam para alcançar situação de 
maior conforto. O LÍDER precisa prover o Povo. Precisa defendê-lo. 
Por isso, esquadrinha, investiga as possibilidade imediatas, para 
pôr-se em ação. 
 Senhor!  soa a voz de SKRON, tirando-o do profundo 
mergulho mental  Pedem-lhe audiências, hoje. 
 Quantos? 
 Dois, por enquanto. Sinto incomodá-lo. 
 Está tudo bem, SKRON. Desça para o Salão. Estarei lá num 
instante. 
 Perfeitamente, Senhor . SKRON bateu no peito com os 
braços em cruz. Voltando-se, entrou no elevador, ligando-o para o 
andar térreo. Duas pessoas aguardavam, quietas. Logo, RANA ocupou 
o assento central. 
 Que venha o primeiro  disse ele. 
 Venha...  falou SKRON para o homem que aguardava . Fale 
confiante. Ele é nosso amparo, nossa esperança. Através dele 
reconquistaremos o que é verdadeiramente BOM para nós. Fale! 
 Senhor!  articulou, batendo no peito com os braços em 
cruz  Vim pedir ajuda. 
 Fale, meu irmão... 
 Há dois dias vem se manifestando um processo exantemático 
no meu corpo. Isto é, aqui no peito. Inicialmente, julguei tratar-
se de reação natural. Afinal, estamos em contato com 
microorganismos diferentes daqueles do planeta que deixamos. Seria 
natural. Mas, o processo agravou-se. Tenho 9 filhos... Temo 
contaminá-los. Observe o senhor mesmo. 
RANA fixou o busto sólido do Smaraniano. Erupção estranha 
modificava a cútis sadia. Desenhava arabescos em tons sombrios. 
 Sente dor? 
 Não muita. Pior é a sensação desagradável do contato 
intruso, que me debilita e incapacita para a realização do meu 
trabalho. 
 Qual a sua função? 
 Eu, minha mulher e meu filho mais velho somos geólogos. 
Veja! Minha temperatura modifica-se em curtos períodos. Ora, 
mostra-se demasiadamente alta. Agora, por exemplo, desceu demais! 
 Não se preocupe. Qual sua identificação? 
 IKEN, Geólogo, Classe Veterana. 
 Aproxime-se mais IKEN. Não se preocupe. Feche os olhos até 
que eu mande abri-los novamente. Fique calmo. Não pense em nada. 
Repouse a mente. 
SKRON, de longe, viu o corpo do LÍDER inflamar-se levemente. 
Como uma lâmpada que se acende aos poucos. Os olhos argênteos 
emitiram pequenos jatos de luz fosforescente. Um momento, e logo o 
corpo de RANA voltou ao normal. SKRON notou que o COMANDO estava 
cansado pelo esforço despendido paracontrolar mentalmente a 
radioatividade. Aproximou-se em silêncio e observou o busto de 
IKEN. A erupção havia sumido. Nenhum traço dela restava. 
 Fez bem em vir logo, IKEN  falou RANA . Foi fácil 
combater o micróbio. Sentiu alguma coisa? 
 Apenas agradável calor, Senhor. 
 Ótimo. Volte para sua família. Não há mais perigo. Se 
houver reincidência, o que duvido, procure-me imediatamente. Sem 
deixar passar nem mesmo um dia. 
 Assim farei, Senhor. 
 Vá, agora, IKEN  aconselhou SKRON . O homem fez seu 
cumprimento, retirando-se a seguir com olhar profundo, onde havia 
mais que gratidão. 
 Chame o segundo, SKRON  disse Rana com ar cansado. 
 Poderíamos transferi-la para outro dia, Senhor. Está 
exausto! 
 É questão de momentos, amigo. Chame a mulher. 
RANA tinha a cabeça pendida, quando a jovem aproximou-se, 
tímida. Pensava em RAI... A moça esqueceu de cumprimentá-lo. 
Olhava-o embevecida! Muda e perdida em enlevos. O LÍDER ergueu sua 
formosa cabeça acobreada: era chama viva! Fitou-a vagamente. Por 
fim, surpreendeu-se com a expressão estática que havia no rosto da 
jovem. 
 Em que posso servi-la, menina? O que deseja? 
 Eu... eu...  gaguejou perturbada  Quero... apenas vê-lo! 
confessou num murmúrio desesperado. 
 Minha filha!  censurou SKRON, paternal  Nosso LÍDER está 
cansado. Não se comporte como criança tola. Fale com clareza. 
 Falei... 
 É razoável que fique perturbada diante de nosso COMANDO, 
mas... acalme-se e diga o que quer? 
 Deixe-a, SKRON!  deliberou RANA  Está assustada. 
Aproxime-se menina. Como é seu nome? Sente-se aqui ao meu lado. 
 Chamo-me RIMY, Senhor. Nada tenho a pedir. Tracei... um 
plano pouco decente para vir aqui. Inventei um mal-estar, problema 
inexistente. Um motivo para ser recebida. Forjei a sensação de 
asfixia que vi uma mulher sofrer. Tinha de vê-lo, Senhor! Poderá 
compreender e perdoar? 
 Claro que posso, RIMY. Continue... 
 Bem... Pareceu-me um plano bem elaborado. Mas, quando vi o 
que aconteceu há pouco com IKEN... 
 O que aconteceu de tão especial, RIMY?  encorajou RANA 
suavemente. 
 Meu Senhor curou-o instantaneamente! Faltou-me coragem para 
prosseguir simulando. 
 Por que era tão importante ver-me, RIMY? 
 Não teria paz se não o fizesse. Preciso vê-lo para dormir. 
Foi assim desde o primeiro dia em que meu Senhor pisou o solo de 
RA'M SMARANA. Vi-o descendo da NAVE ROMAHARSANIANA. Algo explodiu 
dentro do meu peito! Centelhas estranhas, agitação anormal, calor 
impetuoso, tristeza sem explicação, ansiedade mortal! Coisas 
confusas, meu Senhor. Só uma está bem claro. Preciso vê-lo para 
repousar o coração. Tem de ser todos os dias. Tem que permitir. 
Sei que não é pedido assim tão razoável, mas... deve atender-me. 
 Compreendo perfeitamente  A voz de RANA mostrava-se 
cansada. Grande tristeza nublava o brilho de seus olhos. Fitou a 
mocinha e, num salto, cobriu-lhe os olhos com uma das mãos, 
enquanto com a outra tocou de leve os cabelos vermelhos da jovem, 
bem na altura do pescoço. Sua mão forte incandesceu ligeiramente. 
O animal que subia encrespou-se e morreu. Quase não era possível 
notá-lo nos cabelos de RIMY. Tinha o corpo acobreado, comprido, 
dotado de inúmeras pernas. 
 Está tudo bem, agora  informou o COMANDO, algo pálido  
Era um myriápode. Animal semelhante a skolopendra terrestre. Muito 
venenoso. Mas, tudo passou. Está morto, agora.  Com um soluço, 
RIMY aninhou-se nos braços de RANA. 
 Acalme-se, menina!  pediu, confuso, confortando-a . Foi, 
talvez, pequena punição porque veio aqui com propósito de mentir. 
É boa menina, sinto-o. Não quero que minta novamente. Não chore, 
vamos! Volte para casa. 
 Estou perdoada?  perguntou na defensiva, saindo de má 
vontade dos braços do LÍDER. RANA viu uns olhos azuis fitando-o 
avidamente. Mas, não! Não eram totalmente azuis. Tinham algo de 
verde. Eram muito doces e belos, Lembravam os olhos de RAI. 
 Não sou nenhuma divindade, RIMY. O perdão é coisa 
discutível. Vá para junto de sua família. 
 Vai permitir que o veja todos os dias? 
 Sem dúvida. SKRON! Leve-a daqui. É uma menina... que logo 
amadurecerá, fatalmente. 
 Por que fala assim, meu Senhor? 
 Por que RIMY descobriu o amor dentro do peito... Só por 
isso. 
A jovem afastou-se a contra-gosto. Seu coração, porém, estava 
satisfeito. Havia experimentado os braços do LÍDER. Conhecia o 
calor de sua ternura. 
 O que quer aqui, SHÂNY?  indagou RANA, observando a moça 
que surgia de trás das colunas. 
 Pergunta ou repreensão? 
 Estou cansado. Diga o que quer e vá embora. 
 Será indispensável tanta secura? Infringi algum 
regulamento? Ou não devia ter assistido a tocante cena que se 
desenrolou neste nobre salão? 
 Não lhe conferi direitos especiais sobre minhas ações. 
Anote isso para não esquecer  disse o rapaz, reprimindo a cólera 
 Desista desse controle disfarçado, SHÂNY. 
 Sabe que não é inteligente oferecer resistência tão 
constante? Poderia ser mais accessível. Facilitaria as coisas para 
nós dois. 
 Não tenho interesse em facilitar nada. E não se trata de 
resistência, mas necessidade que sinto de solidão para "sentir", 
"pensar" e trabalhar convenientemente. Entendeu? 
 Solidão que diz respeito apenas a mim. Ainda há pouco, 
notei que transbordava de ternura por aquela jovem  insurgiu-se. 
 Prometia vê-la todos os dias. Não pode negar que experimentou 
por ela calor especial. 
 Não vou negar coisa alguma. Ora, não me amole! Não lhe devo 
satisfações. 
 Apesar disso, presumo que posso exigir meu legítimo direito 
de ficar mais tempo ao seu lado. 
 Legítimo, por quê? Os direitos no Planeta Dourado são 
estabelecidos por mim. Resultam daquilo que considero correto ou 
não. Acontece que sua proximidade não me convém  explicou com 
acento neutro. 
 O que há com você, homem? Não sou tão repulsiva, assim, 
afinal! 
 Não disse que era. Na verdade, SHÂNY, é adorável  Sua voz 
denunciava amargura, desencanto.  Ninguém é tão bela, 
exteriormente. Exceto, talvez, RYE! Levando-se em conta o exotismo 
de sua pele. 
 Luminosa exposição! Não vi onde quer chegar. 
 Acabará vendo, qualquer dia destes. Haverá tempo para isso. 
 Olhe bem para ele, SKRON!  disse SHÂNY, movendo-se com 
graciosa desenvoltura.  Maravilha supostamente humana! Fenômeno 
reversível. Por mais que se tente arrancá-lo de sua saudade, 
regressa sempre ao estado inicial. Contudo, deve ser constituído 
de prismas diversos. Hei de encontrar o caminho para ele, SKRON! 
Prometo que não desistirei facilmente. 
 Isso não levará a nenhuma conclusão agradável  argumentou 
o gigante de olhos azuis, tentando contornar o mal-estar ambiente. 
 Não interfira neste assunto. SKRON! Esta pequena tem má 
índole. Gosta de irritar, desde que seja notada. Não há 
conciliação passível entre nós. Breve estaremos habituados a isso. 
Todo começo é maçante. 
 Ouviu, SKRON? Ele não está sujeito às leis naturais. É um 
MONSTRO! Nada lhe causa efeito. 
 Outros tiveram a mesma opinião, querida. Não é novidade. 
Agora, chega de discurso, sua mestiça empanturrada de vaidade. 
Reserve sua astúcia e arrogância para outro que não lhe conheça o 
íntimo. Preste bem atenção! Não quero mulheres nos meus 
calcanhares. Isto também se aplica a você. Estamos combinados? 
 Venceu, mas não vou permitir que aquela moça volte ao 
Mirante! 
 São coisas que cabem a mim decidir  corrigiu impaciente  
Agora, saia! Acabou a "gasolina", como costumava dizer RAI... 
 Ora! Estamos apenas no primeiro "round", meu "amor"!  
pronunciou SHÂNY, retirando-se, com fingida jovialidade. 
 
* 
* * 
 
Arrastados estavam passando os dias, segundo o conceito do 
LÍDER. SHÂNY tornara-sedemasiado ciumenta. Complicava as coisas 
mais singelas. RANA preferia que fosse diferente. Não pretendia 
molestar nem ser molestado. A cessação de palavras nos lábios da 
moça não significava trégua nem calmaria. Estava mudando... para 
pior... Obstinava-se em criar obstáculos para RIMY. Esta, por sua 
vez, mostrava-se disposta ao duelo. Protestava com vigor, exigia 
atenções de seu LÍDER. RANA acabou constrangido. Essa classe de 
problemas contrariava toda esperança de tranqüilidade. Revoltava-
se contra as circunstâncias que o haviam colocado como centro de 
ridículas disputas. Não fora arrancado de seu mundo para esse tipo 
de entretenimento! Aceitara pagar alto preço por altos objetivos. 
Nada que incluísse aquilo! Cabia-lhe a instrução espiritual e 
encaminhamento de um Povo. Estava em suas mãos proceder o 
desenvolvimento de princípios indispensáveis à natureza do novo 
sistema de vida física e mental que estava destinado ao Povo 
Smaraniano. Era urgente ensinar que a inteligência do Homem não 
está destinada a colocá-lo na posição de deuses. Iminente recordar 
a quase extinção da Raça... pela vaidade! Imprescindível lembrar 
que construiriam novamente máquinas, fabulosos engenhos. Mas, não 
seriam simplesmente novas oportunidades de experimentar o sabor da 
posse de uma inteligência privilegiada. Seriam ensejos que 
deveriam levar o Smaraniano à conclusão de que o Homem está 
destinado à heranças insuspeitadas. Para que possam deduzir que a 
inteligência do Homem está consagrada ao Serviço das ALTITUDES 
CÓSMICAS. Isto sim, era o que cabia a RANA demonstrar. 
Especialmente, que os mais grandiosos engenhos concebidos pela 
mente do Homem, não constituíam um FIM, mas um MEIO de melhor 
atingir ao FIM inevitável. 
Destas coisas falava RANA ao seu Povo, bem ao pé do MIRANTE, 
quando percebeu a presença de RAM, ROMA e RAI, em corpos astrais. 
Tão contente ficou que, instantâneo, largou o próprio corpo físico 
ali mesmo, onde estava assentado, na curiosa rocha dourada. SKRON 
viu-o escorregar para o chão, como estátua sem alma. Não se 
preocupou. Sabia que seu COMANDO não havia morrido, não estava 
passando mal, nem mesma havia desmaiado. Possuía avanço evolutivo 
suficiente para ver e ouvir além dos ouvidos e olhos físicos. Por 
isso mesmo fora escolhido para auxiliar de RANA. Tranquilamente 
fez dispersar o POVO. RIMY, porém, que nada via ou ouvia adiante 
da matéria densa do plano físico, desesperou-se. Jogou-se ao solo, 
abraçando o corpo bem amado. Estava literalmente transtornada. 
SHÂNY interferiu violenta. 
 Deixe-o em paz, RIMY! Não pode tocá-lo, enquanto não está 
consciente. Deixe-se de encenações. Não sou sensível a elas. Saia 
daqui! 
 O que ama tem direitos que o amor concede  refutou a 
outra, argumentando por entre soluços. 
 Pois bem, discuta seus direitos com o Amor. Comigo não 
adianta! Encontrará constantes objeções. Sou contra as 
prerrogativas em excesso que lhe são concedidas. Sabe muito bem 
disso. Vamos! Estou esperando. Saia daí!  insistiu SHÂNY, com 
sinais evidentes de có1era mal contida. Não sendo atendida, 
pressionou o ombro da jovem, maguando-o com as afiadas unhas. 
 SHÂNY está certa, RIMY  aparteou SKRON, impessoal  
Ninguém deve tocar o corpo do COMANDO, nem ficar tão perto, 
enquanto estiver desacordado. RANA está bem, asseguro-lhe. Eu 
ficarei ao lado do corpo, enquanto meu Senhor estiver fora. Vamos, 
menina, seja disciplinada! 
 Vejo que tomou o lado dela. A beleza de SHÂNY impede o 
raciocínio correto dos homens. Pois bem... vou ficar! Experimente 
tirar-me daqui! 
Enquanto a desagradável cena desenrolava-se diante do corpo 
inerte, outra ocorria mais adiante. Nada desagradável... para o 
COMANDO, pelo menos. RANA beijava as mãos de RAI com verdadeiro 
arrebatamento íntimo. Mal cumprimentou ROMA. Fitou RAM e falou sem 
ressentimentos: 
 Não vou agradecer por haverem trazido RAI. Sei que pensaram 
apenas no meu trabalho, na minha missão, não em mim. Isso não é 
acusação, mas... pura constatação. Tenho certeza de que agem 
segundo seus elevados conceitos de certo e errado. Notaram que 
minhas forças psíquicas estavam refluindo rapidamente. Sabiam ser 
inútil qualquer outra maneira de contornar o fato. Está bem... 
quero somente permissão para vaguear um pouco por aí... com ela. 
 Não perca tempo  aconselhou ROMA.  Tem meia hora. 
Despeço-me por antecipação. Meu corpo físico encontra-se em minha 
Nave, lá adiante, no KRISHNALOKA. Não pretendo privá-lo de seu 
tempo integral... RAM levará RAI de volta. Não irão precisar de 
mim. 
 Até breve, então. Venha RAI  disse o rapaz satisfeito, 
procurando a mão da mulher. Prendeu-a docemente na sua mão grande 
e forte  Daremos uma "olhada" no MIRANTE DO COMANDO. Depois, 
mostrar-lhe-ei flores exóticas, cascatas, riachos, lagos, 
cogumelos e todas as coisas belas de RA'M SMARANA, que não 
consegui apreciar devidamente... sem os seus OLHOS por perto. 
 Vejo que ainda não está conciliado com o Planeta Dourado. 
 E muito cedo ainda. Antes, cabe-me reorganizar o Povo. 
Buscar nos esconsos da Raça o "lugar oculto". Explorar profundezas 
humanas... Investigar conflitos entre o coração e a mente. Quando 
tudo estiver mais ou menos encaminhado, então, conceder-me-ei 
oportunidade para estreitar ligações exigíveis entre mim e RA'M 
SMARANA. 
 Talvez tenha razão... 
 Tenho... acredite, querida. 
 Essa brisa perfumada, sopra contínua, RANA? 
 Custa-me ouvi-la chamar-me RANA. MART é um nome de grande 
efeito para meu coração. Recorda-me outros contatos com você... 
Outros tempos mais doces. Um passado melhor... 
 RAM disse-me que, doravante, seria negativo chamá-lo MART. 
Caso encerrado. Não me cabe discuti-lo. 
 É... 
 Não respondeu minha pergunta. 
 Ah! Sim...  falou com extrema doçura  Você perguntava 
acerca da brisa. Essa aragem gostosa que sopra como enredos de 
Primavera na TERRA. É a primeira vez que estou a senti-la. É 
provável que ela seja contínua. Não sei. Vou observar... RAI! 
 Sim. 
 Se me convertesse em vapor e pudesse segui-la sempre, o que 
diria? 
 Diria que o vapor dissipa-se, consome-se depressa. 
 Eu também... longe de você. 
 Não tem direito a reconcentrar-se assim, RANA. Está 
destinado aos grandes vôos do Espírito. Não deve, nem há como 
evadir-se, meu amigo. 
 Posso tornar sem efeito tudo o que foi começado, não posso? 
 Claro que pode. Mas, não o fará! 
 Tem razão  disse, olhando-a nos olhos  Não o farei... 
por você. Todavia, isso não abranda o fato de que fui despojado de 
tudo. Até do direito de morrer, como os outros. 
 Não será assim para sempre. 
 Não  murmurou, amargo  Não será para sempre. Por mil 
anos... apenas. É um grande conforto! 
 Com certeza não podia ser diferente, quando se é o EIXO 
principal de engrenagem altamente valiosa. 
 Hum... Fui exercitado sem saber. Submetido a duros treinos, 
durante trinta e cinco anos desta vida. Induzido, sutilmente, a 
reassumir os caracteres de EIXO que sustém e movimenta numerosas 
peças na direção esperada. O mal, RAI, e que posso decepciona-LOS. 
Posso revelar-me vulnerável ainda. Susceptível a movimentos 
regressivos. 
 Refere-se a fraqueza ou insubordinação? 
 Não sei, em sã consciência. Pode ser uma coisa, outra, ou 
ambas. 
 Está se tornando amargo, meu amigo!  repreendeu RAI 
fracamente. 
 Não se impressione  assegurou o rapaz, afagando de leve 
os cabelos cor de prata da mulher.  É uma questão de ângulos. 
Faceta extensível do meu tremendo caleidoscópio interior. No 
momento que estou ao seu lado, nada é fixo. Desejos, sonhos, 
emoções fraquezas, altruísmo, ideais... Nada existe em definitivo 
em mim, além do meu amor. Essa