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CASO CLÍNICO 1 Terapia Nutricional da Criança Gravemente Enferma Universidade de São Paulo Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto Curso de Nutrição e Metabolismo Fisiopatologia da Nutrição Materno-Infantil Caso: A.M.C, sexo feminino, 1 ano e 9 meses. Previamente hígida, sem ocorrências de internações hospitalares anteriores, com neurodesenvolvimento esperado para a idade. Admitida com queixa de quadro febril há 6 dias, chegando a delirar por 2 vezes. Mãe refere que criança não estava se alimentando, nem evacuando, apresentando-se hipoativa, chorosa e enfraquecida. Também havia queixa de oligúria associada à ardência. Paciente foi diagnosticada com pielonefrite que evolui para sepse complicada por meningite bacteriana, evoluiu com necessidade de ventilação mecânica, sendo transferida para a UTI pediátrica. 2 Exame físico e antropométrico: Mal estado geral, gemendo, acianótico, ictérico, taquipneico. Edema em MMII: 2+/4+ Peso: 8 kg Comprimento: 80 cm Dados adicionais Para a classificação do estado nutricional de crianças e adolescentes, utiliza-se as curvas de crescimento da OMS e os pontos de corte definidos pelo SISVAN: 4 1. Classifique o estado nutricional atual da criança segundo as curvas da OMS: Peso atual: 8 kg Idade: 1 anos e 9 meses Comprimento: 80 cm IMC: 12,5 kg/m² < percentil 3 Baixo peso para a idade 5 Peso atual: 8 kg Idade: 1 anos e 9 meses Comprimento: 80 cm IMC: 12,5 kg/m² Escore z entre -3 e -2 Baixo peso para a idade < percentil 3 Magreza Peso atual: 8 kg Idade: 1 anos e 9 meses Comprimento: 80 cm IMC: 12,5 kg/m² Escore z entre -3 e -2 Magreza Peso atual: 8 kg Idade: 1 anos e 9 meses Comprimento: 80 cm IMC: 12,5 kg/m² < percentil 3 Magreza Peso atual: 8 kg Idade: 1 anos e 9 meses Comprimento: 80 cm IMC: 12,5 kg/m² Escore z entre -3 e -2 Magreza Peso atual: 8 kg Idade: 1 anos e 9 meses Comprimento: 80 cm IMC: 12,5 kg/m² Entre p3 e p15 Estatura adequada para a idade Peso atual: 8 kg Idade: 1 anos e 9 meses Comprimento: 80 cm IMC: 12,5 kg/m² 11 Escore z entre -2 e +2 Estatura adequada para a idade Peso atual: 8 kg Idade: 1 anos e 9 meses Comprimento: 80 cm IMC: 12,5 kg/m² Exames bioquímicos: Resultado Referência Classificação Hb(g/dL) 9,4 10,5 a 13,5 ↓ Albumina (g/dL) 2,0 2,5 a 4,7 ↓ Ferritina(ng/mL) 215 7 a 140 ↑ PCR (mg/dL) 3,5 < 0,5 ↑ Glicemia (mg/dL) 128 70 a 100 ↑ Na (mmol/L) 125 135a 145 ↓ Ureia (mg/dL) 49 8 a 36 ↑ Creatinina (mg/dL) 0,6 0,4 a 0,6 - Bilirrubina total (mg/dL) 2,1 0,3 a1,2 ↑ 13 Ingestão alimentar: Mãe refere que criança apresentava queixas de hiporexia e inapetência há 6 dias, com piora progressiva. Nos últimos 2 dias não estava mais aceitando nenhum alimento, ingerindo apenas 1 mamadeira ao dia (composto lácteo Ninho Fases 1). Diluição 7 medidas para cada 180 mL 2,2g de PTN/100 mL 3,2g de LIP/100 mL 8,5g de CHO/100 mL 72 kcal/100mL (0,72 kcal/g) Prescrição dietética hospitalar Dieta enteral pediátrica para > 1 ano Sistema fechado Nutrini Standard 2,5g de PTN/100 mL (60% soro de leite e 40% caseína) 4,4g de LIP/100 mL (óleo de girassol, canola e peixe) 13,0g de CHO/100 mL (maltodextrina) 100 kcal/100mL (1,0 kcal/g) Único para a idade da paciente e que é sistema fechado (UTI). 16 17 2. Estime a necessidade energética e proteica da criança: Peso atual = 8 kg Peso no p50 = 11,2 kg Peso no p15 = 9,8 kg Comprimento = 80 cm IMC = 12,5 kg/m² Fator de estresse da doença: 1,3 ou 30% OMS/FAO (GEB) = (61 x P) - 51 Schofield (GEB) = (16,252) x P + (10,232 x E) - 413,5 DRIs (GET) = [89 x P - 100] + 20 kcal Holliday e Segar (GET) = 1.000 kcal + 50 kcal/kg acima de 10 Holliday e Segar (GET) = 100 kcal/kg 18 Peso atual OMS/FAO (61 x P) - 51 = (61 x 8) - 51 = 437 kcal/dia (x 1,3) = 568,1 kcal/dia DRIs [89 x P - 100] + 20 kcal = (89 x 8 – 100) + 20 = 632 kcal/dia (x 1,3) = 821,6 kcal/dia Schofield (16,252) x P + (10,232 x E) - 413,5 = (16,252 x 8) + (10,232 x 80) - 413,5 = 130,0 + 818,56 - 413,5 = 535,06 kcal/dia (x 1,3) = 696,5 kcal/dia Holliday e Segar 100 kcal/kg = 800 kcal/dia Média = 721,5 kcal/dia Peso no p50 OMS/FAO (61 x P) - 51 = (61 x 11,2) - 51 = 632,2 kcal/dia (x 1,3) = 821,8 kcal/dia DRIs [89 x P - 100] + 20 kcal = (89 x 11,2 - 100) + 20 = 916,8 kcal/dia (x 1,3) = 1.191,8 kcal/dia Schofield (16,252) x P + (10,232 x E) - 413,5 = (16,252 x 11,2) + (10,232 x 80) - 413,5 = 182,0 + 818,56 - 413,5 = 587,0 kcal/dia (x 1,3) = 763,1 kcal/dia Holliday e Segar 100 kcal + 50 kcal/kg acima de 10 = 1.060 kcal/dia Média = 959,1 kcal/dia *Referência de Nutrição Clínica da Criança e na Adolescência 19 Peso no p15 OMS/FAO (61 x P) - 51 = (61 x 9,8) - 51 = 546,8 kcal/dia (x 1,3) = 710,8 kcal/dia DRIs [89 x P - 100] + 20 kcal = (89 x 9,8 - 100) + 20 = 792,2 kcal/dia (x 1,3) = 1.029,8 kcal/dia Schofield (16,252 x P) + (10,232 x E) - 413,5 = (16,252 x 9,8) + (10,232 x 80) - 413,5 = 159,2 + 818,5 - 413,5 = 564,2 kcal/dia (x 1,3) = 733,4 kcal/dia Holliday e Segar 100 kcal/kg = 980 kcal/dia Média = 863,5 kcal/dia Necessidade proteica recomendação: 2 a 2,5 g/kg/dia para lactente 16 a 20g/dia *Referência de Nutrição Clínica da Criança e na Adolescência 21 3. Qual a melhor terapia nutricional a ser empregada? A via parenteral seria mais vantajosa nesse caso? A via enteral deve ser preferível à parenteral devido às vantagens de praticidade, menor custo e efeitos benéficos, como manutenção da integridade da mucosa intestinal e redução de complicações infecciosas. O início da NE deve ser oportuno. Se o TGI estiver funcionando, a paciente deve receber a dieta preferencialmente nas primeiras 24 a 48 horas após a admissão. A função intestinal adequada é evidenciada pela presença de ruídos hidroaéros, ausência de distensão abdominal ou vômitos e pelo resíduo gástrico em pequena quantidade. Se houver necessidade de aprofundar a sedação e as doses elevadas de catecolaminas de efeito alfa adrenérgico, a NE deverá ser interrompida. 22 4. Utilizando a dieta enteral Nutrini Standard, como você faria a prescrição dietética para a paciente? Necessidade energética (peso no p15) = 863,5 kcal/dia Dieta polimérica = 1.0 Volume = 863,5 mL/dia Deve-se iniciar com 1/3 das necessidades e no terceiro dia já atingir 100%: Dia 1 (1/3 das necessidades): Dieta enteral polimérica administrada por via NSG, 287,8 kcal/dia, no volume de 287,8 mL/dia distribuídos em 8 vezes (35,9 mL de 3/3h por BIC). Dia 2 (2/3 das necessidades): Dieta enteral polimérica administrada por via NSG, 431,7 kcal/dia, no volume de 431,7 mL/dia distribuídos em 8 vezes (53,9 mL de 3/3h por BIC). Dia 3 e 4 (100% das necessidades): Dieta enteral polimérica administrada por via NSG, 863,5 kcal/dia, no volume de 863,5 mL/dia distribuídos em 8 vezes (107,9 mL de 3/3h por BIC). 23 5. A prescrição atende a necessidade proteica da paciente? 100 mL de Nutrini Standard 2,5g de PTN 100 mL – 2,5g de PTN 863,5 mL – x x = 21,5g de PTN/dia Necessidade proteica estimada 2 a 2,5 g/kg/dia para lactente 16 a 20g/dia A prescrição dietoterápica atende a necessidade proteica estimada para o paciente. 24 6. Em relação a terapia nutricional e o estresse metabólico, deve-se ter cuidado para o risco de hiperalimentação em pacientes críticos. O que isso pode provocar? Qual estratégia devemos adotar para evitar esse risco? A hiperalimentação é uma situação caracterizada pela oferta excessiva de energia ou nutrientes específicos, particularmente nociva em pacientes com capacidade limitada para utilização desses substratos. Além de não reverter o catabolismo, a hiperalimentação pode desencadear aliberação prolongada de mediadores inflamatórios, intensificar a síndrome de resposta inflamatória sistêmica e culminar em disfunção orgânica e aumento da mortalidade. A principal estratégia envolvida é a de evitar a oferta de energia e substratos além do essencial e necessário para a manutenção da homeostase metabólica durante o estresse. 25 7. Por qual motivo a criança está apresentando um quadro de hiperglicemia? Quais os riscos da hiperglicemia para crianças na UTI? A hiperglicemia pode ocorrer em quadros de estresse metabólico devido à liberação de hormônios de estresse (por exemplo, epinefrina e cortisol), liberação de mediadores inflamatórios e estresse oxidativo. Tais condições inibem a liberação e a ação da insulina (resistência à insulina), o que dificulta a captação de glicose nos tecidos periféricos. A hiperglicemia está associada à maior mortalidade, maior risco de infecção, redução da função pulmonar, do esvaziamento gástrico e da motilidade intestinal. 26 8. Quais exames bioquímicos evidenciam um quadro de estresse metabólico? Qual o impacto do estresse metabólico sobre o estado nutricional? Redução da albumina Aumento de ferritina e PCR O estresse metabólico provoca impacto no estado nutricional aumentando o gasto energético da criança, cursando com anorexia, lipólise e intensa proteólise, reduzindo as proteínas plasmáticas circulantes e aumentando a produção de proteínas de fase aguda, juntamente com mediadores pró-inflamatórios. Além disso, há também aumento da pressão sanguínea e frequência cardíaca, liberação de catecolaminas, aumento de cortisol, glucagon, hormônio de crescimento e hormônio antidiurético. 27