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Farmacocinética 1 I. RESUMO O objetivo do tratamento medicamentoso é prevenir, curar ou controlar doenças. Para alcançar esse objetivo, doses adequadas de fármaco devem ser ofereci- das aos tecidos-alvo, de forma a serem obtidos níveis terapêuticos, porém não tóxicos. A farmacocinética estuda o movimento de um fármaco no organismo em determinado tempo. As ações farmacológicas e toxicológicas dos fármacos primariamente se relacionam com a sua concentração no plasma. Assim, o clínico precisa reconhecer que a velocidade do início da ação, a intensidade do efeito e a duração da ação do fármaco são controladas por quatro vias fun- damentais do movimento e da modificação do fármaco no organismo (Figura 1.1). Primeiro, a absorção do fármaco desde o local de administração (absor- ção) permite o acesso do agente terapêutico (seja direta ou indiretamente) no plasma. Segundo, o fármaco pode, então, reversivelmente sair da circulação sanguínea e distribuir-se nos líquidos intersticial e intracelular (distribuição). Terceiro, o fármaco pode ser biotransformado no fígado, nos rins ou em outros tecidos (biotransformação). E, por fim, o fármaco e seus metabólitos são eli- minados do organismo na urina, na bile ou nas fezes (excreção). Este capítulo descreve como o conhecimento desses quatro processos (absorção, distribui- ção, biotransformação e excreção) influenciam as decisões clínicas quanto à via de administração de cada fármaco, à quantidade e à frequência de cada dose e aos intervalos de dosagem. II. VIAS DE ADMINISTRAÇÃO DE FÁRMACOS A via de administração é determinada primariamente pelas propriedades do fármaco (p. ex., hidro ou lipossolubilidade, ionização, etc.) e pelos objetivos te- rapêuticos (p. ex., a necessidade de um início rápido de ação ou a de adminis- tração por longo tempo, ou restrição de acesso a um local específico). Há duas vias principais de administração de fármacos, enteral e parenteral. (A Figura 1.2 ilustra as subcategorias dessas vias, bem como outros métodos de administra- ção de fármacos.) UNIDADE I Introdução à Farmacologia Fármaco no local da administração Fármaco no plasma Fármaco e metabólito(s) na urina, na bile ou nas fezes Fármaco nos tecidos Metabólito(s) nos tecidos Absorção (entrada) 1 2 Excreção (saída) 4 Distribuição 3 Biotransformação Figura 1.1 Representação esquemática da absorção, distribuição, biotransformação e excreção. 2 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark A. Enteral A administração enteral ou administração pela boca é o modo mais simples e comum de administrar os fármacos. Quando o fármaco é administrado por via oral, ele pode ser deglutido ou pode ser deixado sob a língua, facili- tando a sua absorção direta na corrente sanguínea. 1. Oral. A administração do fármaco pela boca oferece várias vantagens ao paciente; por via oral, os fármacos são autoadministrados facilmen- te e evitam infecções sistêmicas que podem complicar o tratamento. Além disso, a toxicidade ou dosagens excessivas por essa via podem ser neutralizadas com antídotos, como o carvão ativado. Porém, as vias envolvidas na absorção do fármaco são as mais complicadas, e o fár- maco é exposto ao agressivo ambiente gastrintestinal (GI) que pode limitar sua absorção. Alguns fármacos são absorvidos no estômago; contudo, o duodeno é o principal local de entrada na circulação sistê- mica devido a sua maior superfície absortiva. A maioria dos fármacos absorvidos no trato gastrintestinal (TGI) entra na circulação portal e encontra o fígado antes de ser distribuído na circulação geral. Esses fármacos sofrem biotransformação de primeira passagem no fígado onde eles podem ser extensamente metabolizados antes de alcança- rem a circulação sistêmica [Figura 1.3]. (Nota: a biotransformação de primeira passagem, no intestino ou no fígado, limita a eficácia de vá- rios fármacos quando usados por via oral. Por exemplo, mais de 90% da nitroglicerina são depurados por uma simples passagem através do fígado, razão pela qual este fármaco não é administrado por via oral.) Os fármacos que sofrem biotransformação de primeira passagem significativa devem ser administrados em quantidades suficientes para assegurar que alcancem os órgãos-alvo. A ingestão de fármaco com alimentos ou a sua associação a outros fármacos podem influenciar a absorção. A presença de alimento no estômago retarda o esvaziamen- to gástrico de forma que os fármacos que são destruídos pelo ácido (p. ex., penicilina) se tornam indisponíveis para a absorção (ver p. 364). (O revestimento entérico do fármaco o protege do meio ácido; esse reves- timento pode evitar a irritação gástrica e, dependendo da formulação, a liberação do fármaco pode ser prolongada, produzindo um efeito de liberação sustentada.) 2. Sublingual. A colocação do fármaco sob a língua permite a ele di- fundir-se na rede capilar e, por isso, entrar diretamente na circulação sistêmica. A administração de fármaco por essa via tem várias van- tagens, incluindo a absorção rápida, a administração conveniente, a baixa incidência de infecções, além de evitar que o fármaco passe pelo ambiente agressivo do intestino e que a biotransformação de primeira passagem ocorra. B. Parenteral A administração parenteral introduz o fármaco na circulação sistêmica ou em outro tecido vascular diretamente através das barreiras orgânicas de defesa. Ela é usada para fármacos que são pouco absorvidos no TGI (p.ex., heparina) e para aqueles que são instáveis no TGI (p.ex., insulina). Essa administração também é usada no tratamento do paciente inconsciente ou quando se necessita de um início rápido de ação. Além disso, a administra- ção parenteral tem maior biodisponibilidade e não está sujeita à biotransfor- mação de primeira passagem ou ao agressivo meio gastrintestinal. Ela tam- bém assegura o melhor controle sobre a dose real de fármaco administrada ao organismo. Contudo, a administração parenteral é irreversível e pode causar dor, medo e infecções. Há três vias de administração parenteral: a intravascular (intravenosa ou intra-arterial), a intramuscular e a subcutânea (ver Figura 1.2). Cada via apresenta vantagens e desvantagens. Tópica Adesivo transdermal Oral Retal Inalação Sublingual Parenteral: IV, IM, SC Figura 1.2 Vias comumente usadas para a administra- ção de fármacos. Oral IV Restante do organismo Os fármacos administrados por IV entram diretamente na circulação sistêmica e têm acesso direto às demais partes do organismo. Os fármacos administrados por via oral são primeiro expostos ao fígado e podem ser extensamente biotransformados antes de alcançar as demais regiões do organismo. Figura 1.3 A biotransformação de primeira passagem pode ocorrer com fármacos administrados por via oral. (IV = intravenosa.) Farmacologia Ilustrada 3 1. Intravenosa (IV). A injeção é a via parenteral mais comum. Para fármacos que não são absorvidos por via oral, como o bloqueador neuromuscular atracúrio, em geral não há outra escolha. Com a ad- ministração IV, o fármaco evita o TGI e, assim, a biotransformação de primeira passagem pelo fígado. A via IV permite um efeito rápido e um grau de controle máximo sobre os níveis circulantes do fármaco. Po- rém, diferente dos fármacos usados no TGI, os que são injetados não podem ser retirados por meio de estratégias como êmese ou por uso de carvão ativado. A administração IV pode inadvertidamente introdu- zir bactérias por meio de contaminação no local da injeção, e também produzir hemólise ou causar outras reações adversas pela liberação muito rápida de concentrações elevadas do fármaco ao plasma e aos tecidos. Por isso, a velocidade de infusão deve ser cuidadosamente controlada. Preocupações similares se aplicam aos fármacos injeta- dos por via intra-arterial.2. Intramuscular (IM). Fármacos administrados por via IM podem ser so- luções aquosas ou preparações especializadas de depósito – com fre- quência uma suspensão do fármaco em um veículo não aquoso, como o polietilenoglicol. A absorção dos fármacos em solução aquosa é rápida, enquanto a das preparações de depósito é lenta. À medida que o veí- culo difunde-se para fora do músculo, o fármaco precipita-se no local da injeção. O fármaco então se dissolve lentamente, fornecendo uma dose sustentada durante um período de tempo prolongado. Há, por exemplo, o decanoato de haloperidol de liberação sustentada (ver p. 155), que se difunde lentamente e produz efeito neuroléptico prolongado. 3. Subcutânea (SC). Essa via de administração, como a IM, requer ab- sorção e é um pouco mais lenta do que a via IV. A injeção SC minimiza os riscos associados à injeção intravascular. (Nota: quantidades mí- nimas de epinefrina, algumas vezes, são combinadas com o fármaco para restringir a sua área de ação. A epinefrina atua como vasocons- tritor local e diminui a remoção do fármaco, como a lidocaína, do local de administração.) Outros exemplos de fármacos utilizados pela via SC incluem os sólidos, como as hastes simples contendo o contraceptivo etonogestrel, que é implantado para uma atividade de longa duração (ver p. 306), e também bombas mecânicas programáveis que podem ser implantadas para liberar insulina em pacientes diabéticos. C. Outras 1. Inalação. A inalação assegura a rápida oferta do fármaco através da ampla superfície da membrana mucosa do trato respiratório e do epitélio pulmonar, produzindo um efeito quase tão rápido como com o obtido pela injeção IV. Essa via de administração é usada para fár- macos que são gases (p. ex., alguns anestésicos) ou aqueles que podem ser dispersos em um aerossol. A via é particularmente eficaz e conveniente para pacientes com problemas respiratórios (como asma ou doença pulmonar obstrutiva crônica), pois o fármaco é ofertado diretamente no local de ação e os efeitos sistêmicos são minimizados. Exemplos de fármacos administrados por esta via incluem o albuterol e os corticosteroides como a fluticasona. 2. Intranasal. Esta via envolve a administração de fármacos diretamen- te dentro do nariz. Incluem-se os descongestionantes nasais como o corticosteroide anti-inflamatório furoato de mometasona. A desmo- pressina é administrada por via intranasal no tratamento do diabete insípido; a calcitonina de salmão, um hormônio peptídico usado no tratamento da osteoporose, também está disponível como aerossol nasal. O fármaco de abuso, cocaína, geralmente é administrado por aspiração intranasal. 4 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark 3. Intratecal/intraventricular. Algumas vezes, essa via de administração é necessária para introduzir fármacos diretamente no líquido cefalorra- quidiano. Por exemplo, a anfotericina B é usada no tratamento da me- ningite criptocócica (ver p. 408). 4. Tópica. A aplicação tópica é usada quando se deseja um efeito loca- lizado do fármaco. Por exemplo, o clotrimazol é aplicado como creme diretamente na pele no tratamento da dermatofitose, e a tropicamida ou o ciclopentolato são instilados diretamente no olho para dilatar a pupila e permitir mensurações de erros de refração. 5. Transdermal. Essa via de administração proporciona efeitos sis- têmicos pela aplicação do fármaco na pele, em geral, por meio de um adesivo cutâneo. A velocidade de absorção pode variar de modo acentuado, dependendo das características físicas da pele no local da aplicação. Essa via é usada com mais frequência para a oferta prolon- gada de fármacos, tais como o fármaco antianginoso nitroglicerina, o antiemético escopolamina e o adesivo anticoncepcional semanal (Or- tho Evra®), que tem uma eficácia similar ao dos comprimidos orais. 6. Retal. Cinquenta por cento da drenagem da região retal não passa pela circulação portal; assim, a biotransformação dos fármacos pelo fígado é minimizada. Como a via de administração sublingual, a via retal têm a vantagem adicional de evitar a destruição do fármaco pe- las enzimas intestinais ou pelo baixo pH no estômago. Ela também é útil se o fármaco provoca êmese, quando administrado por via oral, ou se o paciente já se encontra vomitando ou se está inconsciente. (Nota: a via retal é usada comumente para a administração de antie- méticos.) Porém, com frequência a absorção retal é errática e incom- pleta e vários fármacos irritam a mucosa retal. III. ABSORÇÃO DE FÁRMACOS Absorção é a transferência de um fármaco do seu local de administração para a corrente sanguínea. A velocidade e a eficiência da absorção dependem da via de administração. Para a via IV, a absorção é completa, ou seja, toda a dose do fármaco alcança a circulação sistêmica. A liberação do fármaco por outras vias pode resultar em absorção parcial e, consequentemente, em menor biodisponi- bilidade. A via oral, por exemplo, exige que o fármaco se dissolva nos líquidos GI e, então, penetre as células epiteliais da mucosa intestinal; doenças ou a presença de alimentos podem afetar esse processo. A. Transporte de fármacos a partir do TGI Dependendo das propriedades químicas, os fármacos podem ser transpor- tados do TGI por difusão passiva ou por transporte ativo. 1. Difusão passiva. A força motriz da absorção passiva de um fármaco é o gradiente de concentração através da membrana que separa os compartimentos do organismo; isto é, o fármaco se move da região com concentração elevada para a que tem baixa concentração. A di- fusão passiva não envolve transportador, não é saturável e apresenta baixa especificidade estrutural. A grande maioria dos fármacos tem acesso ao organismo por esse mecanismo. Fármacos lipossolúveis movem-se facilmente através da maioria das membranas biológicas devido sua solubilidade na bicamada lipídica. Já os fármacos hidros- solúveis atravessam a membrana através de canais ou poros aquosos (Figura 1.4). Outros fármacos podem entrar na célula por meio de pro- teínas transportadoras transmembranas especializadas que facilitam a passagem de grandes moléculas. Essas proteínas transportadoras D D D D D D Fármaco ATP ADP D D D D D D Difusão passiva de um fármaco hidros- solúvel através de um poro ou canal aquoso. Difusão passiva de um fármaco lipos- solúvel dissolvido na membrana. Transporte ativo do fármaco mediado por carregador. Figura 1.4 Representação esquemática de fármacos atravessando a membrana celular de uma célula epitelial do TGI. (ATP = trifosfato de adenosina; ADP = difosfato de adenosina.) Farmacologia Ilustrada 5 sofrem alterações conformacionais permitindo a passagem de fárma- cos ou moléculas endógenas para o interior da célula, movendo-as de áreas de alta concentração para área de baixa concentração. Esse processo é denominado de difusão facilitada. Esse tipo de difusão não requer energia, pode ser saturado e inibido. 2. Transporte ativo. Essa forma de entrada de fármacos também en- volve transportadores proteicos específicos que atravessam a mem- brana. Poucos fármacos cujas estruturas se assemelham às de meta- bólitos de ocorrência natural são transportados através da membrana celular usando esses transportadores proteicos específicos. O trans- porte ativo é dependente de energia e movido pela hidrólise de trifos- fato de adenosina (ver Figura 1.4). Ele é capaz de mover fármacos contra um gradiente de concentração – ou seja, de uma região com baixa concentração de fármaco para uma com concentração mais elevada. O processo tem cinética de saturação para o transportador que muito se assemelha à apresentada pela reação enzima-substra- to, que mostra velocidade máxima em níveis elevados de substrato quando todos os locais ativos estão ligados com substrato.13. Endocitose e exocitose. Esse tipo de movimentação de fármacos transporta moléculas excepcionalmente grandes através da membrana celular. Na endocitose, as moléculas do fármaco são engolfadas pela membrana e transportadas para o interior da célula pela compressão da vesícula cheia de fármaco. A exocitose é o inverso da endocitose e é usada pelas células para secretar várias substâncias por um proces- so similar ao da formação de vesículas. Por exemplo, a vitamina B12 é transportada através da parede intestinal por endocitose. Certos neu- rotransmissores (p.ex., norepinefrina) são armazenados em vesículas ligadas à membrana no terminal nervoso e liberados por exocitose. B. Efeito do pH na absorção de fármacos A maioria dos fármacos é ácido fraco ou base fraca.2 Fármacos ácidos (HA) liberam um próton H+ causando a formação de um ânion (A–): HA � H+ + A– As bases fracas (BH+) também podem liberar um H+. Contudo, a forma pro- tonada dos fármacos básicos, em geral, é carregada, e a perda do próton produz a base (B) não ionizada: BH+ � B + H+ 1. Passagem de um fármaco não carregado através da membra- na. Um fármaco atravessa a membrana mais facilmente se ele for não ionizado (Figura 1.5). Assim, para os ácidos fracos, a forma HA não ionizada consegue permear através das membranas, mas o A– não consegue. Para a base fraca, a forma não ionizada, B, consegue pene- trar através das membranas celulares, contudo o BH+ não consegue. Por isso, a concentração efetiva da forma permeável de cada fármaco no seu local de absorção é determinada pelas concentrações relati- vas entre as formas ionizada e não ionizada. A relação entre as duas formas é, por sua vez, determinada pelo pH no local de absorção e pela força do ácido fraco ou base, que é representada pelo pKa (Figura 1Ver Bioquímica Ilustrada, 4ª edição, Artmed Editora, para uma discus- são acerca de cinética enzimática. 2Ver Bioquímica Ilustrada, 4ª edição, Artmed Editora, para uma discus- são acerca do equilíbrio ácido-base. INFO LINK A– HA Membrana lipídica Compartimento corporal Compartimento corporal H+ A– HA H+ BH+ B Membrana lipídica Compartimento corporal Compartimento corporal H+ BH+ B H+ Ácido fraco Base fraca A B Figura 1.5 A. Difusão da forma não ionizada de um áci- do fraco através da membana lipídica. B. Di- fusão da forma não ionizada de uma base fraca através da membrana lipídica. 6 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark 1.6). (Nota: o pKa é uma medida da força da interação de um composto com um próton. Quanto menor o pKa de um fármaco, mais ácido ele é; quanto maior o pKa, mais básico é o fármaco.) O equilíbrio de distribui- ção é alcançado quando a forma permeável de um fármaco alcança uma concentração igual em todos os espaços aquosos do organismo. (Nota: fármacos altamente lipossolúveis atravessam de modo rápido a membrana celular e, em geral, entram nos tecidos com uma velocidade determinada pelo fluxo sanguíneo.) 2. Determinação da quantidade de fármaco que será encontrada em ambos os lados da membrana. A relação do pKa e da razão entre as concentrações ácido-base com o pH é expressa pela equação de Henderson-Hasselbalch3: pH = pKa + log [espécies não protonadas] [espécies protonadas] Para ácidos: pH = pKa + log [A–] [HA] Para bases: pH = pKa + log [B] [BH+] Essa equação é útil na determinação de quanto fármaco será encon- trado em ambos os lados da membrana que separa dois compartimen- tos, os quais apresentam diferentes pHs – por exemplo, estômago (pH 1,0 a 1,5) e plasma sanguíneo (pH 7,4). (Nota: a lipossolubilidade do fármaco não ionizado diretamente determina sua taxa de equilíbrio.) C. Fatores físicos que influenciam a absorção 1. Fluxo de sangue no local de absorção. O fluxo de sangue para o intestino é muito maior do que o fluxo para o estômago; assim, a ab- sorção no intestino é maior do que a que ocorre no estômago. (Nota: o choque reduz drasticamente o fluxo sanguíneo aos tecidos cutâneos, minimizando a absorção de administrações subcutâneas.) 3Ver Bioquímica Ilustrada, 4ª edição, Artmed Editora, para uma discussão acerca da equação de Henderson-Hasselbalch. INFO LINK pKa 32 4 5 6 7 8 9 10 11 pH > pKapH < pKa Quando pH = pKa, HA = A− e BH+ = B pH Quando o pH é menor do que o pKa, as formas protonadas HA e BH+ predominam Quando o pH é maior do que o pKa, as formas desprotonadas A− e B predominam Figura 1.6 A distribuição de um fármaco entre sua forma ionizada e não ionizada depende do pH do ambiente e do pKa do fármaco. Para exemplificar, o fármaco nessa figura foi imaginado com um pKa de 6,5. Farmacologia Ilustrada 7 2. Área ou superfície disponível para absorção. Como o intestino tem uma superfície rica em microvilosidades, ele apresenta uma su- perfície cerca de 1.000 vezes maior do que a do estômago; assim, a absorção de fármacos através do intestino é mais eficiente. 3. Tempo de contato com a superfície de absorção. Se um fármaco se desloca muito rápido ao longo do TGI, como ocorre em uma diarreia intensa, ele não é bem absorvido. Contudo, qualquer retardo no trans- porte do fármaco do estômago para o intestino reduz a sua velocidade de absorção. (Nota: o tônus parassimpático acelera o esvaziamento gástrico, enquanto o tônus simpático [p. ex., causado pelo exercício ou por emoções estressantes] e os anticolinérgicos [p.ex., dicicloverina] o retarda. Assim, a presença de alimento no estômago dilui o fármaco e retarda o esvaziamento gástrico. Portanto, quando um fármaco é inge- rido com o alimento, em geral, será absorvido mais lentamente.) IV. BIODISPONIBILIDADE Biodisponibilidade é a fração do fármaco administrado que alcança a circulação sistêmica. Ela é expressa como a fração do fármaco administrado que tem aces- so à circulação sistêmica na forma química inalterada. Por exemplo, se 100 mg de um fármaco forem administrados por via oral e 70 mg desse fármaco forem absorvidos inalterados, a biodisponibilidade será 0,7 ou 70%. A. Determinação de biodisponibilidade A biodisponibilidade é determinada pela comparação dos níveis plasmáti- cos do fármaco depois de uma via particular de administração (p. ex., admi- nistração oral) com os níveis plasmáticos do fármaco obtidos por injeção IV, na qual todo o fármaco entra na circulação rapidamente. Quando o fármaco é administrado por via oral, somente parte da dose aparece no plasma. Lançando a concentração plasmática do fármaco contra o tempo, pode-se mensurar a área sob a curva (ASC). Essa curva reflete a extensão da ab- sorção do fármaco. (Nota: por definição, isso é 100% do fármaco injetado por via IV.) A biodisponibilidade de um fármaco administrado por via oral é a relação da área calculada para a administração oral comparada com a área calculada para a injeção IV (Figura 1.7). B. Fatores que influenciam a biodisponibilidade 1. Biotransformação hepática de primeira passagem. Quando um fármaco é absorvido a partir do TGI, ele entra na circulação portal antes de entrar na circulação sistêmica (ver Figura 1.3). Se o fármaco é rapidamente biotransformado pelo fígado, a quantidade de fárma- co inalterado que tem acesso à circulação sistêmica diminui. Muitos fármacos, como propranolol ou lidocaína, sofrem biotransformação significativa durante uma simples passagem através do fígado. 2. Solubilidade do fármaco. Fármacos muito hidrofílicos são pouco absorvidos devido à sua inabilidade em atravessar as membranas ce- lulares ricas em lipídeos. Já os fármacos extremamente hidrofóbicos são também pouco absorvidos, pois são totalmente insolúveis nos líquidos aquosos do organismo e, portanto, não têm acesso à super- fície das células. Para que um fármacoseja bem absorvido, ele deve ser basicamente hidrofóbico, mas ter alguma solubilidade em solu- ções aquosas. Essa é uma das razões pelas quais vários fármacos são ácidos fracos ou bases fracas. Alguns fármacos são muito lipos- solúveis e são transportados nas soluções aquosas do organismo em transportadores proteicos como a albumina. TempoC on ce nt ra çã o pl as m át ic a do fá rm ac o Biodisponibilidade = ASC oral ASC injetada x 100 Fármaco injetado Fármaco administrado por via oral Fármaco administrado ASCASC (oral) (injetada) ASCASC Figura 1.7 Determinação da biodisponibilidade de um fármaco. 8 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark 3. Instabilidade química. Alguns fármacos, como a benzilpenicilina, são instáveis no pH gástrico. Outros, como a insulina, são destruídos no TGI pelas enzimas. 4. Natureza da formulação do fármaco. A absorção do fármaco pode ser alterada por fatores não relacionados com a sua estrutura quími- ca. Por exemplo, o tamanho da partícula, o tipo de sal, o polimorfismo cristalino, o revestimento entérico e a presença de excipientes (como os agentes aglutinantes e dispersantes) podem influenciar a facilidade da dissolução e, por conseguinte, alterar a velocidade de absorção. C. Bioequivalência Dois fármacos relacionados são bioequivalentes se eles apresentam bio- disponibilidades comparáveis e tempos similares para alcançar o pico de concentração plasmática. Dois fármacos relacionados com biodisponibili- dades significativamente diferentes são ditos bioinequivalentes. D. Equivalência terapêutica Dois fármacos são terapeuticamente equivalentes se eles têm eficácia e segurança comparáveis. (Nota: a eficácia clínica com frequência depende da concentração sérica máxima e do tempo necessário [após a adminis- tração] para alcançar o pico de concentração. Portanto, dois fármacos que são bioequivalentes podem não ser equivalentes terapeuticamente.) V. DISTRIBUIÇÃO DE FÁRMACOS Distribuição de fármacos é o processo pelo qual um fármaco reversivelmente abandona o leito vascular e entra no interstício (líquido extracelular) e/ou nas células dos tecidos. A passagem do fármaco do plasma ao interstício depen- de principalmente do fluxo sanguíneo, da permeabilidade capilar, do grau de ligação do fármaco às proteínas plasmáticas e tissulares e da hidrofobicidade relativa do fármaco. A. Fluxo sanguíneo A velocidade do fluxo sanguíneo nos tecidos capilares varia bastante como resultado de uma distribuição desigual do débito cardíaco aos vários órgãos. O fluxo sanguíneo para o cérebro, para o fígado e para os rins é maior do que para os músculos esqueléticos, sendo que o tecido adiposo recebe fluxo ain- da menor. Esse diferencial explica parcialmente a curta duração da hipnose produzida por um bolus de injeção IV de tiopental (ver p. 135). O elevado fluxo sanguíneo, juntamente com a elevada lipossolubilidade do tiopental, permite a esse fármaco mover-se de modo rápido para o sistema nervoso central (SNC) e produzir anestesia. A lenta distribuição aos músculos esqueléticos e ao tecido adiposo diminui a concentração plasmática de modo suficiente, de forma que a concentação elevada no SNC se reduz e a consciência é re- cuperada. Ainda que o fenômeno ocorra com todos os fármacos em alguma extensão, a redistribuição é responsável pela duração extremamente curta da ação do tiopental e de compostos com estrutura química e propriedades farmacológicas similares. B. Permeabilidade capilar A permeabilidade capilar é determinada pela estrutura capilar e pela natu- reza química do fármaco. 1. Estrutura capilar. A estrutura capilar varia bastante em termos de fração da membrana basal, que é exposta pelas junções com frestas entre as células endoteliais. No cérebro, a estrutura capilar é contínua Estrutura de um capilar cerebral Fármaco ionizado Fármacos lipossolúveis Passagem mediada por transportador Processo podal do astrócito Célula endotelial cerebral Membrana basal Membrana basal Permeabilidade de um capilar cerebral B Estrutura das células endoteliais no fígadoA C Fármaco Junção com fresta Grandes fendas permitem ampla passagem do fármaco entre o sangue e o interstício hepático. Junção estreitada Nas junções estreitadas, duas células vizinhas se unem fisicamente formando uma parede contínua que impede a entrada de vários fármacos no cérebro. Figura 1.8 Corte transversal de capilares hepáticos e cerebrais. Farmacologia Ilustrada 9 e não existem junções com frestas (Figura 1.8). Isso contrasta com o fígado e o baço, onde uma grande parte da membrana basal é ex- posta a capilares descontínuos e grandes, através dos quais podem passar grandes proteínas plasmáticas. a. Barreira hematoencefálica (sangue-cérebro). Para entrar no cérebro, o fármaco precisa passar através das células endoteliais dos capilares do SNC ou ser transportado ativamente. Por exem- plo, o transportador específico de aminoácidos neutros transporta levodopa para o interior do cérebro. Em contraste, fármacos lipos- solúveis entram facilmente no SNC, pois podem se dissolver na membrana das células endoteliais. Fármacos ionizados ou pola- res em geral fracassam em entrar no cérebro, pois são incapazes de atravessar as células endoteliais do SNC, que não apresentam junção com frestas. Essas células firmemente justapostas formam junções estreitadas que constituem a barreira hematoencefática. 2. Estrutura do fármaco. A natureza química do fármaco influencia forte- mente sua habilidade de atravessar membranas celulares. Fármacos hi- drofóbicos, que têm distribuição uniforme de elétrons e nenhuma carga elétrica, movem-se facilmente através da maioria das membranas bioló- gicas. Esses fármacos podem dissolver-se na membrana lipídica e, por conseguinte, permear toda a superfície da célula. O principal fator que influencia a distribuição dos fármacos hidrofóbicos é o fluxo sanguíneo para a área considerada. Já os fármacos hidrofílicos, que podem apre- sentar distribuição não uniforme de elétrons ou uma carga positiva ou negativa, não penetram facilmente as membranas celulares e, portanto, precisam passar através das junções com frestas. C. Ligação de fármacos a proteínas plasmáticas A ligação reversível às proteínas plasmáticas sequestra os fármacos de forma não difusível e retarda sua transferência para fora do compartimento vascular. A ligação é relativamente não seletiva com a estrutura química e acontece em locais da proteína onde em geral se ligam compostos endógenos como a bilirrubina. A albumina plasmática é a principal proteína ligadora e pode atuar como uma reserva de fármaco, isto é, à medida que a concentração do fármaco livre diminui, devido à eliminação por biotransformação ou excreção, o fármaco ligado se dissocia da proteína. Isso mantém a concentração de fármaco livre como uma fração constante do fármaco total no plasma. VI. VOLUME DE DISTRIBUIÇÃO O volume de distribuição é um volume hipotético de líquido no qual o fármaco se dispersa. Embora ele não tenha base física ou fisiológica, é útil, algumas vezes, para comparar a distribuição de um fármaco com os volumes dos com- partimentos de água no organismo (Figura 1.9). A. Compartimentos de água no organismo Logo que o fármaco entra no organismo, a partir de qualquer via de ad- ministração, ele tem o potencial de distribuir-se em qualquer um dos três compartimentos funcionalmente distintos de água, ou ser sequestrado em um local celular. 1. Compartimento plasmático. Se um fármaco apresenta massa mo- lecular muito elevada ou se liga extensamente às proteínas plasmá- ticas, ele é muito grande para se mover para fora através das fendas endoteliais dos capilares e, assim, é efetivamente aprisionado dentrodo compartimento vascular (plasmático). Como consequência, o fár- Volume intracelular Volume intracelular Volume extracelular Volume intersticial Volume intersticial Volume plasmático Plasma 10 litros 4 litros 42 litros 28 litros 14 litros Água corporal total Figura 1.9 Tamanho relativo dos vários volumes de dis- tribuição de um indivíduo com 70 kg. 10 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark maco se distribui em um volume (o plasma) que é cerca de 6% da massa corporal ou, em uma pessoa com 70 kg, cerca de 4 L de líqui- do. A heparina (ver p. 236) mostra esse tipo de distribuição. 2. Líquido extracelular. Se um fármaco apresenta baixa massa mole- cular, mas é hidrofílico, ele pode se mover através das fendas endote- liais dos capilares para o líquido intersticial. Contudo, fármacos hidro- fílicos não se movem através das membranas celulares lipídicas para entrar na fase aquosa do interior da célula. Por conseguinte, esses fármacos se distribuem em um volume que é a soma da água plas- mática e da água intersticial, as quais, juntas, constituem o líquido extracelular. Isso corresponde a cerca de 20% da massa corporal ou a cerca de 14 L em uma pessoa com 70 kg. Os antibióticos aminogli- cosídeos (ver p. 377) mostram esse tipo de distribuição. 3. Água corporal total. Se um fármaco apresenta baixa massa mole- cular e é hidrofóbico, ele não só pode se movimentar para o inters- tício através das fendas, como também deslocar-se para o líquido intracelular através das membranas celulares. Neste caso, o fármaco se distribui em um volume de cerca de 60% da massa corporal ou cerca de 42 L em uma pessoa com 70 kg. O etanol apresenta esse volume de distribuição aparente (ver a seguir). 4. Outros locais. Na gestação, o feto pode captar fármacos e, assim, aumentar o volume de distribuição. Fármacos que são muito lipos- solúveis, como o tiopental (ver p. 135), também podem apresentar volumes de distribuição anormalmente elevados. B. Volume de distribuição aparente Um fármaco raramente se associa de forma exclusiva a um único compar- timento de água corporal. Ao contrário, a grande maioria dos fármacos se distribui em vários compartimentos, com frequência ligando-se avidamente a componentes celulares – por exemplo, lipídeos (abundantes em adipóci- tos e membranas celulares), proteínas (abundantes no plasma e no interior das células) ou ácidos nucleicos (abundantes no núcleo das células). Por essa razão, o volume no qual o fármaco se distribui é denominado volume de distribuição aparente, ou Vd. Outra forma útil de pensar nessa constante é como coeficiente de partição do fármaco entre o plasma e o restante do organismo. 1. Determinação do Vd a. Distribuição do fármaco na ausência de eliminação. O volume de distribuição no qual o fármaco se distribui, Vd, é determinado pela injeção de uma dose-padrão do fármaco, a qual é inicial- mente contida no sistema vascular na sua totalidade. O fármaco pode mover-se do plasma para o interstício e para o interior das células, causando a diminuição da concentração no plasma com o decorrer do tempo. Admita, para simplificar, que o fármaco não é eliminado do organismo; ele então alcança uma concentração uniforme, que é mantida com o passar do tempo (Figura 1.10). A concentração no interior do compartimento vascular é a quantida- de total de fármaco administrado dividida pelo volume no qual se distribuiu, Vd: C = D/Vd ou Vd = D/C em que C = a concentração plasmática do fármaco e D = a quan- tidade total do fármaco no organismo. Por exemplo, se forem ad- ministrados 25 mg de um fármaco (D = 25 mg), e a concentração plasmática é 1 mg/L, então Vd = 25 mg/1 mg/L = 25 L. 1 0,5 0 1 32 Tempo Co nc en tra çã o sé ric a Injeção rápida do fármaco Fase de distribuição 1,5 0 Figura 1.10 Concentrações do fármaco no soro após uma injeção única do fármaco no tempo = 0. Admite-se que o fármaco se distribui, mas não é eliminado. Farmacologia Ilustrada 11 b. Distribuição do fármaco quando ocorre eliminação. Na reali- dade, os fármacos são eliminados do organismo, e o lançamento da concentração plasmática contra o tempo apresenta duas fases. A redução inicial na concentração plasmática ocorre devido à fase rápida de distribuição, na qual o fármaco é transferido do plasma para a água intersticial e intracelular. Essa fase é seguida de uma mais lenta, a fase de eliminação, na qual o fármaco abandona o compartimento plasmático e é eliminado do organismo – por exemplo, pela excreção renal ou biliar ou por biotransformação hepática (Figura 1.11). A velocidade com que o fármaco é elimi- nado em geral é proporcional à sua concentração (C); ou seja, a velocidade para a maioria dos fármacos é de primeira ordem e mostra uma relação linear com o tempo se for lançado o ln C (em que lnC é o log natural de C, ao invés de C) contra o tempo (Figura 1.12). Isso ocorre porque os processos de eliminação não estão saturados. c. Cálculo da concentração do fármaco quando a distribuição é instantânea. Admita que o processo de eliminação iniciou no mo- mento da injeção e continua por toda a fase de distribuição. Assim, a concentração do fármaco no plasma, C, pode ser extrapolada para o tempo zero (o momento da injeção) para determinar C0, que é a concentração que teria sido alcançada se a fase de distri- buição tivesse ocorrido instantaneamente. Por exemplo, se 10 mg de um fármaco são injetados em um paciente, e a concentração plasmática é extrapolada para o tempo zero, a concentração é C0 = 1 mg/L (Figura 1.12), então Vd = 10 mg/1 mg/L = 10 L. d. Distribuição desigual do fármaco entre os compartimen- tos. O volume de distribuição aparente supõe que o fármaco se distribui de forma uniforme em um compartimento simples. Contu- do, a maioria dos fármacos distribui-se de maneira desigual entre vários compartimentos, e o volume de distribuição não descreve o volume físico real, e sim, reflete a proporção de fármaco nos espaços extraplasmáticos em relação ao espaço plasmático. En- tretanto, o Vd é útil porque pode ser usado para calcular a quan- tidade de fármaco necessária para alcançar uma determinada concentração plasmática. Por exemplo, admita que a arritmia de um paciente cardíaco não esteja bem controlada devido aos ní- veis plasmáticos inadequados de digitálicos. Suponha que a con- centração desse fármaco no plasma é C1, e o nível desejado de digitálicos (conhecido de estudos clínicos) é uma concentração maior, C2. O clínico precisa saber quanto de fármaco adicional deve ser administrado para levar os níveis de fármaco circulantes de C1 para C2. (Vd) (C1) = quantidade de fármaco inicialmente no organismo (Vd) (C2) = quantidade de fármaco necessária no organismo para alcançar a concentração plasmática desejada A diferença entre os dois valores é a dosagem adicional necessária, o que significa Vd(C2 – C1). 2. Efeito de um Vd elevado na meia-vida (t1/2)do fármaco. Um Vd ele- vado tem influência importante na meia-vida do fármaco, pois a sua eliminação depende da quantidade de fármaco ofertada ao fígado ou aos rins (ou outro órgão onde ocorre a biotransformação) por unidade de tempo. A oferta de fármaco aos órgãos de eliminação depende não só do fluxo sanguíneo, como também da fração de fármaco no plasma. Se o Vd é elevado, a maior parte do fármaco está no espaço extraplas- mático e indisponível para os órgãos excretores. Portanto, qualquer 1 3 42 Fase de eliminação 0 Injeção rápida do fármaco Co nc en tra çã o sé ric a 1,5 1 0,75 0,50 0,25 Fase de distribuição Tempo Figura 1.11 Concentrações do fármaco no soro após uma injeção única do fármaco no tempo = 0. Admite-se que o fármaco se distribui e sub- sequentemente é eliminado. 43 2 1 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 t1/2 0 1 3 42 A extrapolação até o tempo “0” fornece o C0, o valor hipotético de concentração do fármaco previsto se a distribuição fosse obtida instantaneamente. Tempo Co nc en tra çã o sé ric a Injeção rápida do fármaco Fase de distribuição Fase de eliminação C0 = Figura 1.12 Concentração sérica após uma injeção sim- ples do fármaco no tempo = 0. Os dados fo- ram lançados em uma escala log. 12 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark fator que aumente o volume de distribuição pode levar a um aumento na meia-vida e prolongar a duração de ação do fármaco. (Nota: um valor de Vd excepcionalmente elevado indica considerável sequestro do fármaco em algum órgão ou compartimento do organismo.) VII. LIGAÇÃO DOS FÁRMACOS A PROTEÍNAS PLASMÁTICAS As moléculas do fármaco podem se ligar a proteínas plasmáticas (em geral albumina). Os fármacos ligados são farmacologicamente inativos; somente o fármaco livre, não ligado, pode atuar no alvo nos tecidos, proporcionando uma resposta biológica, e estar disponível para os processos de eliminação. (Nota: a hipoalbuminemia pode alterar o nível de fármaco livre.) A. A capacidade ligadora da albumina A ligação dos fármacos à albumina é reversível e pode mostrar capacidade baixa (uma molécula de fármaco por molécula de albumina) ou elevada (inúmeras moléculas do fármaco se fixam em uma única molécula de al- bumina). Os fármacos também podem ligar-se com afinidades variáveis. A albumina tem a maior afinidade para fármacos aniônicos (ácidos fracos) e fármacos hidrofóbicos. A maioria dos fármacos hidrofílicos e neutros não se liga à albumina. (Nota: vários fármacos são propositalmente hidrofóbicos, pois essa propriedade permite a absorção após administração oral.) B. Competição pelos locais de ligação Quando dois fármacos são administrados, cada qual com elevada afinida- de pela albumina, eles competem pelos locais de ligação disponíveis. Os fármacos com alta afinidade pela albumina podem ser divididos em duas classes, dependendo se a dose (a quantidade de fármaco encontrada no organismo sob condições usadas clinicamente) é maior ou menor do que a capacidade de ligação da albumina (quantificada como o número de mi- limoles de albumina multiplicado pelo de locais de ligação (Figura 1.13). 1. Fármacos da Classe I. Se a dose do fármaco é menor do que a capacidade de ligação da albumina, então a relação dose/capacidade é baixa. Os locais de ligação são muitos em relação ao fármaco dis- ponível, e a fração ligada é alta. Esse é o caso para os fármacos da Classe I, que inclui a maioria dos agentes clinicamente úteis. 2. Fármacos da Classe II. Esses fármacos são administrados em do- ses que excedem bastante o número de locais de ligação da albumi- na. A relação dose/capacidade é alta, e uma proporção relativamente alta de fármaco existe no estado livre, não ligado à albumina. 3. Importância clínica do deslocamento de fármaco. Essa divisão na classificação de fármacos é importante quando um paciente que está tomando um fármaco da Classe I, como a varfarina, recebe um fármaco da Classe II, como uma sulfonamida. A varfarina está ligada à albumina em grande proporção, e só pequena parcela está livre. Isso significa que a maior parte do fármaco está preso a albumina e é inerte em termos de ação farmacológica. Quando a sulfonamida é administrada, ela desloca varfarina da albumina, levando a um rápido aumento na concentração livre de varfarina no plasma, pois quase 100% agora estarão livres, se comparados à baixa proporção inicial. (Nota: o aumento da concentração de varfarina pode aumentar os terapêuticos e os efeitos tóxicos, como sangramentos.) Fármacos de Classe I: a dose é menor do que o número de locais de ligação disponíveis A maioria das moléculas do fármaco está ligada à albumina, e a concentração de fármaco livre é baixa. Albumina Fármaco Fármacos de Classe II: a dose é maior do que o número de locais de ligação Administração de fármacos da Classe I e II A maioria das moléculas de albumina tem fármaco ligado, e a concentração de fármaco livre é significativa. O deslocamento do fármaco de Classe I ocorre quando um fármaco de Classe II é administrado simultaneamente. A B C Figura 1.13 Ligação de fármacos das Classes I e II à al- bumina quando os fármacos são administra- dos sozinhos (A, B) ou juntos (C). Farmacologia Ilustrada 13 C. Relação do deslocamento de fármaco com o Vd O impacto do deslocamento de fármaco da albumina depende tanto do Vd como do índice terapêutico do fármaco (ver p. 33). Se o Vd é elevado, o fármaco deslocado da albumina se distribui para a periferia, e a alteração na concentração de fármaco livre no plasma não é significativa. Se o Vd é baixo, o fármaco recém-deslocado não se move para os tecidos na mesma proporção, e o aumento de fármaco livre no plasma é mais acentuado. Se o índice terapêutico do fármaco é pequeno, esse aumento na concentração pode ter consequências clínicas significativas. (Nota: clinicamente, o des- locamento de fármaco da albumina é uma das mais significativas fontes de interação de fármacos.) VIII. BIOTRANSFORMAÇÃO DE FÁRMACOS Os fármacos são eliminados com mais frequência por biotransformação e/ou excreção na urina ou na bile. A biotransformação transforma os fármacos li- pofílicos em produtos polares mais facilmente excretados. O fígado é o princi- pal local de biotransformação, mas ela pode ocorrer, para certos fármacos, em outros tecidos, como os rins e o intestino. (Nota: alguns fármacos são admi- nistrados como compostos inativos [denominados pré-fármacos] e devem ser biotransformados nas suas formas ativas.) A. Cinética da biotransformação 1. Cinética de primeira ordem. A transformação metabólica dos fár- macos é catalisada por enzimas, e a maioria das reações obedece a cinética de Michaelis-Menten4. v = velocidade de biotransformação do fármaco = Vmáx [C]Km + [C] Na maioria das situações clínicas, a concentração do fármaco, [C], é muito menor do que a constante de Michaelis, Km, e a equação se reduz para: Vmáx [C] Km v = velocidade de biotransformação do fármaco = Isto é, a velocidade de biotransformação do fármaco é diretamente proporcional à concentração do fármaco livre, e é observada uma ci- nética de primeira ordem (Figura 1.14). Isso indica que uma fração constante do fármaco é biotransformada por unidade de tempo. 2. Cinética de ordem zero. Com poucos fármacos, como o ácido acetil- salicílico, o etanol e a fenitoína, as doses são muito grandes. Por isso, [C] é muito maior do que Km, e a equação de velocidade se torna: Vmáx [C] [C] v = velocidade de biotransformação do fármaco = = Vmáx A enzima é saturada pela concentração elevada de fármaco livre, e a velocidade da biotransformação permanece constante no tempo. Isso 4Ver Bioquímica Ilustrada, 4ª edição, Artmed Editora, para uma discus- são acerca da cinética de Michaelis-Menten. INFO LINK Dose do fármaco Em doses elevadas, a bio- transformação do fármaco é de ordem zero – ou seja, constante e independente da dose do fármaco. Em baixas doses, a bio- transformação do fárma- co é de primeira ordem – ou seja, proporcional à dose do fármaco. Ve lo ci da de d e bi ot ra ns fo rm aç ão d o fá rm ac o 100 50 0 0 Figura 1.14 Efeito da dose do fármaco na velocidade da biotransformação. 14 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark é denominado cinética de ordem zero (também referida clinicamente como cinética não linear). Uma quantidade constante do fármaco é biotransformada por unidade de tempo. B. Reações da biotransformação de fármaco Os rins não conseguemeliminar os fármacos lipofílicos de modo eficiente que facilmente atravessam as membranas celulares e são reabsorvidos nos túbulos distais. Portanto, os fármacos lipossolúveis primeiro devem ser biotransformados no fígado usando dois grupos gerais de reações, deno- minadas Fase I e Fase II (Figura 1.15). 1. Fase I. As reações de Fase I convertem moléculas lipofílicas em mo- léculas mais polares, introduzindo ou desmascarando um grupo fun- cional polar, como –OH ou –NH2. A biotransformação de Fase I pode aumentar, diminuir ou deixar inalterada a atividade farmacológica do fármaco. a. Reações de Fase I utilizando o sistema P450. As reações de Fase I envolvidas com mais frequência na biotransformação de fármacos são catalisadas pelo sistema citocromo P450 (também denominado oxidase microssomal de função mista): Fármaco + O2 + NADPH + H+ → Fármacomodificado + H2O + NADP+ A oxidação ocorre com a ligação do fármaco à forma oxidada do citocromo P450, e, então, o oxigênio é introduzido em uma etapa redutora, acoplada a NADPH:citocromo P450 oxidorredutase. b. Resumo do sistema P450. O sistema P450 é importante para o metabolismo de várias substâncias endógenas (esteroides, lipídeos, etc.) e para a biotransformação de substâncias exóge- nas (xenobióticos). O citocromo P450, designado como CIP, é composto de várias famílias de isozimas contendo heme que se localizam na maioria das células, mas são encontradas princi- palmente nas do fígado e do TGI. O nome da família é indica- do por um algarismo arábico seguido de letra maiúscula para a subfamília (p. ex., CIP3A). Outro número é acrescentado para indicar a isozima específica (CIP3A4). Há vários genes diferen- tes e várias enzimas diferentes, assim os vários P450 são co- nhecidos como isoformas. Seis isozimas são responsáveis pela grande maioria das reações catalisadas pelo P450: CIP3A4, CIP2D6, CIP2C9/10, CIP2C19, CIP2E1 e CIP1A2; as porcenta- Oxidação, redução, e/ou hidrólise Produtos de conjugaçãoFármaco Fase II Alguns fármacos entram diretamente na Fase II de biotransformação. Fase I Após a Fase I, o fármaco pode ser ativado, perma- necer inalterado ou, com mais frequência, inativado. O fármaco conjugado geralmente é inativo. Figura 1.15 Biotransformação dos fármacos. Farmacologia Ilustrada 15 gens de fármacos hoje disponíveis que são substrato para essas isozimas são 60, 25, 15, 15, 2 e 2%, respectivamente. (Nota: um fármaco específico pode ser substrato para mais de uma isozima.) Quantidades consideráveis de CIP3A4 são encontra- das na mucosa intestinal, respondendo pela biotransformação de primeira passagem de fármacos como o clorpromazina e o clonazepam. Como esperado, essas enzimas exibem conside- rável variabilidade genética, que tem implicações para regimes de dosagens individuais e, até mais importante, como determi- nantes da resposta terapêutica e do risco de efeitos adversos. O CIP2D6, em particular, revelou polimorfismo genético5. Muta- ções resultam em capacidades muito baixas de biotransformar substratos. Algumas pessoas, por exemplo, não obtêm benefício do analgésico opiáceo codeína, porque não tem a enzima que o O-desmetila para ativá-lo. Essa reação é CIP2D6-dependente. A frequência desse polimorfismo em parte é determinada racial- mente, com a prevalência de 5 a 10% em caucasianos euro- peus comparada com menos de 2% em asiáticos do sudoeste. Polimorfismos similares foram caracterizados para a subfamília CIP2C. Embora o CIP3A4 exiba uma variabilidade interindividual maior que 10 vezes, nenhum polimorfismo foi identificado para essa isozima P450. c. Indutores. As enzimas dependentes de citocromo P450 são um alvo importante de interações farmacocinéticas de fármacos. Uma dessas interações é a indução de algumas isozimas CIP. Certos fármacos, mais notadamente fenobarbital, rifampicina e carba- mazepina, são capazes de aumentar a síntese de uma ou mais isozimas CIP. Isso resulta no aumento da velocidade de biotrans- formação de fármacos e pode levar a reduções significativas nas concentrações plasmáticas dos fármacos biotransformados por essas isoenzimas CIP, como mensurado pela ASC, concomitante com a redução do efeito farmacológico. Por exemplo, a rifampi- cina, um fármaco antituberculose (ver p. 402), diminui de modo significativo a concentração plasmática dos inibidores de HIV pro- tease6, diminuindo sua capacidade de suprimir a maturação do vírus HIV. A Figura 1.16 relaciona alguns dos mais importantes indutores para isozimas CIP representativas. As consequências do aumento da biotransformação de fármacos incluem: 1) menor concentração do fármaco no plasma; 2) menor atividade do fár- maco, se o metabólito é inativo; 3) aumento da atividade, se o metabólito é ativo e 4) redução do efeito terapêutico do fármaco. Além de fármacos, substâncias naturais e poluentes podem indu- zir isoenzimas CIP. Por exemplo, os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (encontrados como poluentes no ar) podem induzir a CIP1A. Isso tem implicações para certos fármacos; por exemplo, amitriptilina e varfarina são biotransformadas pelo P4501A2. Os hidrocarbonetos policíclicos induzem o P4501A2, o qual diminui a concentração terapêutica destes fármacos. d. Inibidores. A inibição da atividade das isozimas CIP é uma fonte importante de interações de fármacos que leva a efeitos adver- 5Ver Bioquímica Ilustrada, 4ª edição, Artmed Editora, para uma discussão acerca do polimorfismo genético. 6Ver Microbiologia Ilustrada, 2ª edição, Artmed Editora, para uma discus- são acerca dos inibidores de HIV protease. INFO LINK Isozima CIP2C9/10 Isozima CIP2D6 Isozima CIP3A4/5 SUBSTRATOS COMUNS INDUTORES SUBSTRATOS COMUNS INDUTORES SUBSTRATOS COMUNS INDUTORES Varfarina Fenitoína Ibuprofeno Tolbutamida Fenobarbital Rifampicina Desipramina Imipramina Haloperidol Propanolol Carbamazepina Ciclosporina Eritromicina Nifedipino Verapamil Carbamazepina Dexametasona Fenobarbital Fenitoína Rifampicina Figura 1.16 Algumas isozimas P450 representativas. 16 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark sos graves. A forma mais comum de inibição é pela competição pela mesma isozima. Alguns fármacos, contudo, são capazes de inibir reações para as quais nem são substratos (p. ex., cetoco- nazol) provocando também interações. Numerosos fármacos são capazes de inibir uma ou mais vias de biotransformação CIP-de- pendente da varfarina. Por exemplo, o omeprazol é um inibidor importante de três das isozimas CIP responsáveis pela biotrans- formação da varfarina. Se os dois fármacos são tomados juntos, a concentração plasmática de varfarina aumenta, o que aumenta a inibição da coagulação, o risco de hemorragias e outros san- gramentos graves. (Nota: os inibidores CIP mais importantes são eritromicina, cetoconazol e ritonavir, pois eles inibem várias isozi- mas CIP.) A cimetidina bloqueia a biotransformação da teofilina, clozapina e vafarina. Substâncias naturais presentes no suco de toranja (grapefruit) podem inibir a biotransformação de fármacos inibindo a CIP3A4. Fármacos como anlodipino, claritromicina e indinavir, que são biotransformados por esse sistema, têm seus níveis sanguíneos aumentados, bem como seu efeito terapêutico e/ou tóxico. A inibição da biotransformação dos fármacos pode causar aumento dos níveis plasmáticos na medicação de longa duração, prolongar os efeitos farmacológicos e aumentar a toxici- dade causada pelo fármaco. e. Reações de Fase I que não envolvem o sistema P450. Essas reações incluem a oxidação de aminas (p. ex., oxidação de ca- tecolaminas ou histamina), a desidrogenação do álcool (p. ex., oxidação do etanol), as esterases (p.ex., biotransformação da pra- vastatina no fígado) e a hidrólise (p. ex., procaína). 2. Fase II. Essa fase consiste em reações de conjugação.Se o me- tabólito resultante da Fase I é suficientemente polar, ele pode ser excretado pelos rins. Contudo, vários metabólitos de Fase I são muito lipofílicos para serem retidos pelos túbulos renais. Uma reação sub- sequente de conjugação com um substrato endógeno – como ácido glicurônico, ácido sulfúrico, ácido acético ou aminoácido –, produz um composto polar em geral mais hidrossolúvel e terapeuticamente inativo. Uma exceção notável é o glicuronídeo-6-morfina, que é mais potente do que a morfina. A glicuronidação é a reação de conjugação mais comum e mais importante. Os neonatos são deficientes nesse sistema de conjugação, tornando-os particularmente vulneráveis a fármacos como o cloranfenicol, inativado pelo acréscimo de ácido glicurônico (ver p. 382). (Nota: os fármacos que possuem um grupo –OH, –NH2 ou –COOH podem entrar diretamente na Fase II e ser conjugados sem uma reação de Fase I prévia.) Os fármacos conju- gados altamente polares podem então ser excretados pelos rins ou com a bile. 3. Reversão da ordem das fases. Nem todos os fármacos sofrem rea- ções de Fase I e II nessa ordem. Por exemplo, a isoniazida é acetilada inicialmente (reação de Fase II) e, então, hidrolisada a ácido nicotíni- co (reação de Fase I). IX. ELIMINAÇÃO DE FÁRMACOS A eliminação de fármacos do organismo ocorre por meio de numerosas vias, sendo a mais importante por meio dos rins na urina. Outras vias incluem a bile, os intestinos, os pulmões e o leite nas lactantes. Um paciente com insuficiência renal pode sofrer diálise extracorpórea, a qual remove pequenas moléculas, como fármacos. Túbulo proximal Cápsula de Bowman Alça de Henle Túbulo distal Túbulo coletor O fármaco livre entra no filtrado glomerular.1 Secreção ativa.2 Reabsorção passiva de fármacos não ionizados e lipossolúveis, que foram concentrados no interior do lúmen em concentração maior do que a do espaço perivascular. 3 Na urina: fármaco ionizado insolúvel em lipídeos Figura 1.17 Eliminação de fármacos pelos rins. Farmacologia Ilustrada 17 A. Eliminação renal dos fármacos 1. Filtração glomerular. Os fármacos chegam aos rins pelas artérias renais, que se dividem para formar o plexo capilar glomerular. Os fár- macos livres (não ligados à albumina) difundem-se através das fendas capilares para o espaço de Bowman como parte do filtrado glomeru- lar (Figura 1.17). A velocidade de filtração glomerular (125 mL/min) é cerca de 20% do fluxo plasmático renal (600 mL/min). (Nota: a lipos- solubilidade e o pH não influenciam a passagem dos fármacos para o filtrado glomerular.) 2. Secreção tubular proximal. Os fármacos que não foram transferidos para o filtrado glomerular saem dos glomérulos através das arteríolas eferentes, que se dividem formando um plexo capilar ao redor do lú- men no túbulo proximal. A secreção ocorre primariamente nos túbulos proximais por dois mecanismos de transporte ativo (requerem trans- portador) que exigem energia, um para ânions (p. ex., formas desproto- nadas de ácidos fracos) e outro para cátions (p.ex., formas protonadas de bases fracas). Cada um desses sistemas de transporte apresenta baixa especificidade e pode transportar inúmeros compostos; assim, pode ocorrer competição entre fármacos pelos transportadores em cada um dos sistemas (p. ex., ver probenecida, p. 513). (Nota: prematu- ros e recém-nascidos têm esse mecanismo secretor tubular incomple- tamente desenvolvido e, assim, podem reter certos fármacos.) 3. Reabsorção tubular distal. Enquanto o fármaco se desloca em dire- ção ao túbulo contorcido distal, sua concentração aumenta e excede a do espaço perivascular. O fármaco, se neutro, pode difundir-se para fora do lúmen retornando à circulação sistêmica. A manipulação do pH da urina, para aumentar a forma ionizada do fármaco no lúmen, pode ser usada para minimizar a extensão da retrodifusão e, assim, aumen- tar a depuração de um fármaco indesejável. Como regra geral, ácidos fracos podem ser eliminados alcalinizando a urina, enquanto a elimi- nação de bases fracas pode ser aumentada por acidificação da urina. Esse processo é denominado “prisão iônica”. Por exemplo, um paciente apresentando dose excessiva de fenobarbital (um ácido fraco) pode re- ceber bicarbonato, que alcaliniza a urina e mantém o fármaco ionizado, diminuindo, assim, a reabsorção. Se a dosagem excessiva é com uma base fraca, como a cocaína, a acidificação da urina com NH4Cl leva à protonação do fármaco e aumenta a sua depuração. 4. Papel da biotransformação de fármacos. A maioria dos fármacos é lipossolúvel e, sem modificação química, difundiria-se para fora do lúmen tubular renal quando a sua concentração no filtrado se torna maior do que a do espaço perivascular. Para minimizar essa reabsor- ção, os fármacos são modificados em metabólitos mais polares, princi- palmente, pelo fígado, usando dois tipos de reações: as de Fase I (ver p. 14) – que envolvem o acréscimo de grupos hidroxila ou a remoção de grupos bloqueadores das hidroxilas, carboxilas ou amino –, e as de Fase II (ver p. 16), que usam conjugação com sulfato, glicina ou ácido glicurônico para aumentar a polaridade do fármaco. Os conjugados são ionizados, e as moléculas carregadas não conseguem difundir-se de volta, ou seja, para fora do lúmen renal (Figura 1.18). B. Aspectos quantitativos da eliminação renal de fármacos A depuração plasmática (clearance) é expressa como volume de plasma do qual todo o fármaco foi removido em determinado tempo – por exemplo, como mL/min. A depuração equivale à quantidade de fluxo plasmático renal multiplicada pela taxa de extração; como normalmente eles são invariáveis, a depuração é constante. Túbulo proximal Alça de Henle Túbulo distal Fármaco Metabólito ionizado ou polar Biotransforma- ção de Fase I e II Fármaco Reabsorção passiva de fármaco não ionizado, lipossolúvel Figura 1.18 Efeito da biotransformação de fármacos na reabsorção no túbulo distal. 18 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark 1. Taxa de extração. Essa taxa é a relação entre a concentração de fár- maco no plasma do lado arterial ao lado venoso dos rins. O fármaco entra no rim em concentração C1 e sai em concentração C2. A taxa de extração é = C2/C1. 2. Velocidade de excreção: a velocidade de excreção é determinada pela equação: Velocidade de excreção = (depuração) (concentração plasmática) mg/min mL/min mg/mL A eliminação de um fármaco, em geral, segue a cinética de primeira ordem, e a sua concentração no plasma cai exponencialmente com o tempo. Isso pode ser usado para determinar a meia-vida, ½, do fármaco (o tempo durante o qual a sua concentração no equilíbrio diminui de C para ½C): t½ = ln 0,5/ke = 0,693 Vd /CL em que ke = constante de velocidade de primeira ordem para a elimi- nação do fármaco do organismo e CL = depuração. C. Depuração corporal total A depuração corporal total (sistêmica) CLtotal ou CLt, é a soma das depurações dos vários órgãos biotransformadores e eliminadores. Os rins são, com fre- quência, os principais órgãos de excreção; contudo, o fígado também contri- bui para a perda de fármaco por meio da biotransformação e/ou da excreção com a bile. Um paciente com insuficiência renal pode, algumas vezes, ser beneficiado pelo fármaco que é excretado por essa via para o intestino nas fezes, em vez da via renal. Alguns fármacos também podem ser reabsorvidos através da circulação entero-hepática, prolongando, assim, sua meia-vida. A depuração total pode ser calculada usando-se a seguinte equação: CLtotal = CLhepática + CLrenal + CLpulmonar + CLoutras Não é possível mensurar e somar essas depurações individuais. Contudo, a depuração total pode ser derivada de equações em estado de equilíbrio: CLtotal = ke Vd D. Situações clínicas queresultam em alterações na meia-vida do fármaco Quando o paciente apresenta uma anormalidade que altera a meia-vida do fármaco, são necessários ajustes na dosagem. É importante ser capaz de prever em quais pacientes o fármaco provavelmente tem sua meia-vida al- terada. A meia-vida do fármaco é aumentada por: 1) diminuição do fluxo plasmático renal ou do sanguíneo hepático – (p. ex., em choque cardiogê- nico, insuficiência cardíaca ou hemorragia); 2) diminuição na velocidade de extração (p.ex., na doença renal) e 3) diminuição da biotransformação (p. ex., quando outros fármacos inibem a biotransformação ou na insuficiência hepática, como na cirrose). Ela pode ser diminuída por: 1) aumento do fluxo sanguíneo hepático; 2) menor ligação às proteínas e 3) aumento da biotrans- formação. X. CINÉTICA DA ADMINISTRAÇÃO CONTÍNUA Foram descritos até aqui os processos farmacocinéticos que determinam as velo- cidades de absorção, distribuição e eliminação de um fármaco. A farmaco-cinética Farmacologia Ilustrada 19 também descreve as alterações quantitativas tempo-dependentes da concentra- ção plasmática do fármaco e a quantidade total dele no organismo após sua administração por várias vias, sendo as mais comuns a infusão IV e a oral com doses/intervalos de tempo fixos (p. ex., “um comprimido a cada quatro horas”). As interações dos processos descritos determinam o perfil farmacocinético do fármaco. O significado de identificar a farmacocinética de um fármaco não é só a definição de fatores que influenciam sua concentração e persistência no organis- mo, mas também a adaptação do uso terapêutico do fármaco que tem elevado potencial tóxico. (Nota: a seguinte discussão supõe que o fármaco administrado se distribui em um único compartimento corporal. Na realidade, a maioria dos fármacos se equilibra entre dois ou três compartimentos e, assim, apresenta comportamento cinético complexo. Contudo, o modelo simples é suficiente para demonstrar o conceito.) A. Cinética de infusão IV Com a administração IV contínua, a velocidade de entrada do fármaco no organismo é constante. Na maioria dos casos, a eliminação do fármaco é de primeira ordem, ou seja, uma fração constante da substância é depu- rada por unidade de tempo. Portanto, a velocidade do fármaco que deixa o organismo aumenta proporcionalmente com o aumento da concentração no plasma e, a cada ponto no tempo, isso é proporcional à concentração plasmática do fármaco. 1. Níveis sanguíneos do fármaco no estado de equilíbrio. Após o início da infusão IV, a concentração plasmática do fármaco aumenta até que a velocidade do fármaco eliminado do organismo equilibra precisamente a quantidade introduzida. Assim, o estado de equilíbrio é alcançado quando a concentração plasmática do fármaco perma- nece constante. (Nota: a velocidade de eliminação do organismo = [CLt][C], em que CLt é a depuração corporal total [ver p. 18] e C é a concentração plasmática do fármaco.) Duas questões podem ser feitas sobre a obtenção do estado de equilíbrio. Primeira, qual é a relação entre a velocidade de infusão do fármaco e a sua concentra- ção plasmática alcançada no platô ou estado de equilíbrio? Segunda, quanto tempo é necessário para alcançar a concentração do fármaco no estado de equilíbrio? 2. Influência da velocidade de infusão do fármaco no estado de equilíbrio. A concentração plasmática de equilíbrio de um fármaco ocorre quando a velocidade de eliminação é igual à velocidade de infusão (Figura 1.19), como descrito pela seguinte equação: Css = Ro/ke Vd = Ro/CLt em que Css = a concentração de equilíbrio do fármaco, Ro = a veloci- dade de infusão (p. ex., mg/min), ke é a constante de velocidade de eliminação de primeira ordem e Vd, o volume de distribuição. Como ke, CLt e Vd são constantes para a maioria dos fármacos mostrando cinética de primeira ordem, Css é diretamente proporcional a Ro; isto é, a concentração plasmática de equilíbrio é diretamente proporcional à velocidade de infusão. Por exemplo, se a velocidade de infusão du- plica, a concentração plasmática finalmente alcançada no estado de equilíbrio é duplicada (Figura 1.20). Além disso, a concentração de equilíbrio é inversamente proporcional à depuração do fármaco CLt. Assim, qualquer fator que diminui a depuração, como doença hepá- tica ou renal, aumenta a concentração de equilíbrio de um fármaco infundido (admitindo que Vd permaneça constante). Fatores que au- mentam a depuração do fármaco, como o aumento da biotransforma- ção, diminuem a concentração de equilíbrio do fármaco infundido. Nota: a maior velocidade de infusão não altera o tempo necessário para alcançar o estado de equilíbrio; somente a concentração de equilíbrio, Css, se altera. Região de equilíbrio Baixa velocidade de infusão (Ro mg/min) TempoInício da infusão Alta velocidade de infusão (2 vezes Ro mg/min) Co nc en tra çã o pl as m át ic a do fá rm ac o Css 0 Figura 1.20 Efeito da velocidade de infusão na concen- tração de equilíbrio do fármaco no plasma. Entrada de fármaco Saída de fármaco Figura 1.19 No equilíbrio, a entrada (velocidade de infusão) é igual à saída (velocidade de eliminação). 20 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark 3. Tempo necessário para alcançar a concentração de equilíbrio do fármaco. A concentração do fármaco aumenta desde zero, no início da infusão, até alcançar o nível de equilíbrio Css (Figura 1.21). A velocidade para atingir o estado de equilíbrio é alcançada por um processo de primeira ordem. a. Acesso exponencial ao estado de equilíbrio. A constante de velocidade para alcançar o estado de equilíbrio é a constante de velocidade para a eliminação corporal total do fármaco, ke. Assim, 50% da concentração de equilíbrio final do fármaco, observados após o tempo decorrido entre a infusão (t) é igual a t½, em que t½ (meia-vida) é o tempo necessário para que a concentração do fár- maco se altere em 50%. Após outra meia-vida, a concentração do fármaco alcança 75% do Css (ver Figura 1.21). A concentração do fármaco é 90% da concentração de equilíbrio final em 3,3 ve- zes o t½. Portanto, por conveniência, pode-se supor que o fármaco vai alcançar o estado de equilíbrio em cerca de 4 meias-vidas. O tempo necessário para alcançar uma fração específica do estado de equilíbrio é descrito pela equação: f = 1 – e –ket em que f é o deslocamento proporcional (p. ex., 0,9 se o tempo para alcançar 90% da concentração de equilíbrio for calculado) e t, o tempo decorrido desde o início da infusão. b. Efeito da velocidade de infusão do fármaco. O único determi- nante da velocidade que faz com que o fármaco alcance o estado de equilíbrio é t½ ou ke, e essa velocidade é influenciada somente pelos fatores que afetam a meia-vida. A velocidade para alcançar o estado de equilíbrio não é afetada pela velocidade de infusão. Embora um aumento na velocidade de infusão de um fármaco aumente a velocidade na qual uma determinada concentração plasmática é alcançada, ele não interfere no tempo necessário Tempo Co nc en tra çã o pl as m át ic a do fá rm ac o 0 50 75 90 100 Início da infusão do fármaco Interrupção da infusão do fármaco; inicia a depuração 3,3 t1/2 2 t1/2 t1/2 Css = 0 0 3,3 t1/2 2 t1/2 t1/2 Noventa por cento da concentração de equilíbrio é alcançada em 3,3 t½. A depuração do fármaco é exponencial com a mesma constante de tempo que durante a infusão. Por exemplo, a concentração do fármaco cai a 50% do valor de equilíbrio em t½. Cinquenta por cento da concentração de equilíbrio é alcançada na t½. Concentração de equilíbrio do fármaco Figura 1.21 Velocidade para alcançar a concentração de equilíbriode um fármaco no plasma. Farmacologia Ilustrada 21 para atingir a concentração final de equilíbrio. Isso ocorre porque a concentração de equilíbrio do fármaco aumenta diretamente com a velocidade de infusão (ver Figura 1.20). c. Velocidade de declínio do fármaco quando a infusão é inter- rompida. Quando a infusão é interrompida, a concentração plas- mática do fármaco diminui (se esgota) até zerar com a mesma trajetória temporal observada para alcançar o equilíbrio (ver Figu- ra 1.21). Essa relação é expressa como: Ct = C0 – e–ket em que Ct é a concentração a qualquer tempo, C0 é a concentra- ção plasmática inicial, ke é a constante de velocidade de elimina- ção de primeira ordem e t é o tempo decorrido. d. Dose de ataque. Um retardo na obtenção dos níveis plasmáticos desejados do fármaco pode ser clinicamente inaceitável. Portanto, uma dose de ataque do fármaco pode ser injetada como dose ini- cial para alcançar com rapidez os níveis plasmáticos desejados, seguido de infusão, para manter o estado de equilíbrio (dose de manutenção). Em geral, a dose de manutenção pode ser calcula- da como: Dose de ataque = (Vd) (concentração plasmática de equilíbrio desejada) B. Cinética do regime dose fixa/intervalo de tempo fixo A administração de um fármaco por doses fixas em vez de infusão contínua com frequência é mais conveniente. Contudo, doses fixas, administradas a intervalos de tempo também fixos, resultam em flutuações tempo-depen- dentes nos níveis de fármaco circulante. 1. Injeção IV única. Para simplificar, suponha que o fármaco se distribui de modo rápido em um único compartimento. Como a velocidade de eliminação em geral é de primeira ordem em relação à concentração do fármaco, o nível de fármaco circulante diminui exponencialmente com o tempo (Figura 1.22). (Nota: a t½ não depende da dose do fár- maco administrado.) 2. Injeções IV múltiplas. Quando um fármaco é administrado repeti- damente a intervalos regulares, a concentração plasmática aumenta até alcançar um estado de equilíbrio (Figura 1.23). Como a maioria dos fármacos é administrada a intervalos mais curtos do que cinco meias-vidas e é eliminada exponencialmente com o tempo, algum fármaco da primeira dose permanece no organismo no momento em que a segunda dose é administrada, assim como algum fármaco da segunda dose permanece no momento da terceira dose, e assim por diante. Portanto, o fármaco acumula até que, dentro do intervalo de tempo, a velocidade de perda do fármaco (conduzida pela eleva- da concentração plasmática) equilibra exatamente a velocidade de administração do fármaco – isto é, até que um estado de equilíbrio seja alcançado. a. Efeitos da frequência de dosagem. A concentração plasmáti- ca do fármaco oscila em torno de uma média. Doses menores e intervalos mais curtos diminuem a amplitude das ondas de con- centração do fármaco. Contudo, a concentração de equilíbrio do fármaco e a velocidade na qual o equilíbrio é alcançado não são afetadas pela frequência de dosagem. A t1 2 não depende da quantidade da dose de fármaco administrada. 50 mg injetados 100 mg injetados Co nc en tra çã o pl as m át ic a do fá rm ac o (un ida de s a rb itr ári as ) Injeção do fármaco t1/2 0 50 100 Figura 1.22 Efeito da dose de uma injeção IV simples nos níveis plasmáticos de um fármaco. 0 1 2 3 0 1 2 3 Dias Qu an tid ad e de fá rm ac o no o rg an is m o (un ida de s a rb itr ári as ) Injeção de duas unidades do fármaco uma vez por dia Injeção rápida do fármaco A B C Infusão contínua de duas unidades de fármaco por dia Injeção de uma unidade do fármaco duas vezes ao dia Figura 1.23 Concentração plasmática prevista para um fármaco administrado por infusão (A), duas injeções diárias (B) ou uma injeção diária (C). O modelo considera a rápida homoge- neização em um compartimento corporal simples e uma t½ de 12 horas. 22 Richard Finkel, Luigi X. Cubeddu, Michelle A. Clark b. Exemplos de obtenção de equilíbrio usando diferentes regi- mes de dosagens. A curva B da Figura 1.23 mostra a quantida- de de fármaco no organismo quando 1 g é administrado por via IV para um paciente, e a dose é repetida a intervalos de tempo que correspondem à meia-vida do fármaco. Ao final do primeiro pe- ríodo de dosagem, permanece 0,5 unidade de fármaco da primei- ra dose quando a segunda é administrada. Ao final do segundo intervalo de dosagem, 0,75 unidade continuará presente quando a terceira dose for administrada. A quantidade mínima de fárma- co durante o intervalo de dosagem aumenta progressivamente e se aproxima do valor de 1 unidade, enquanto o valor máximo alcança progressivamente 2 unidades logo após a administração. Por isso, no estado de equilíbrio, 1 unidade de fármaco é perdida durante o intervalo de dosagem, o que coincide exatamente com a quantidade de fármaco que está sendo administrada; ou seja, a velocidade de fármaco “entrando” é igual a que está “saindo”. Como no caso da infusão IV, 90% do valor de equilíbrio são alcan- çados em 3,3 vezes t½. 3. Fármacos administrados por via oral. A maioria dos fármacos que são administrados em pacientes externos é indicada por via oral em regimes de dose fixa/intervalo fixo – por exemplo, uma dose espe- cífica tomada uma, duas ou três vezes diariamente. Ao contrário da injeção IV, a administração oral pode ser lenta, e a concentração plas- mática do fármaco é influenciada tanto pela velocidade de absorção quanto pela velocidade de eliminação do fármaco (Figura 1.24). Essa inter-relação pode ser expressa como: Css = (D)(F ) 1 (ke)(Vd) T em que D é a dose, F = a fração absorvida (biodisponibilidade), (T) = o intervalo de dosagem, Css = concentração de equilíbrio do fármaco, kE = constante de velocidade de primeira ordem para a eliminação e Vd = volume de distribuição. 10 20 Tempo (h)C on ce nt ra çã o pl as m át ic a do fá rm ac o (un ida de s a rb itr ári as ) 0 0,5 1,0 1,5 2,0 30 40 50 60 70 A administração oral repetida de um fármaco resulta em oscilações nas concentrações plasmáticas, as quais são influenciadas tanto pela velocidade de absorção do fármaco como pela sua velocidade de eliminação. 0 DOSE FIXA REPETIDA Dose simples do fármaco administrada por via oral resulta em um pico único na concentração plasmática, seguido de um declínio contínuo nos níveis do fármaco. DOSE SIMPLES FIXA Figura 1.24 Concentrações plasmáticas previstas para um fármaco obtidas por repetidas adminis- trações orais. Farmacologia Ilustrada 23 Questões para Estudo Escolha a resposta correta. 1.1 Qual das seguintes afirmativas está correta? A. Bases fracas são absorvidas eficientemente através das células epiteliais do estômago. B. A coadministração de atropina acelera a absorção de um segundo fármaco. C. Fármacos que apresentam Vd elevado podem ser efi- cientemente removidos do plasma por diálise. D. Emoções estressantes podem retardar a absorção de fármacos. E. Se o Vd de um fármaco é pequeno, a maior parte do fármaco está no espaço extraplasmático. 1.2 Qual das seguintes afirmativas é VERDADEIRA para um fármaco cuja eliminação do plasma segue uma cinética de primeira ordem? A. A meia-vida do fármaco é proporcional à concentração do fármaco no plasma. B. A quantidade eliminada por unidade de tempo é cons- tante. C. A velocidade de eliminação é proporcional à concentra- ção no plasma. D. A eliminação envolve reação enzimática com velocidade limitada operando na sua velocidade máxima (Vm). E. O lançamento da concentração de fármaco contra o tempo é uma linha reta. 1.3 Um