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1 2 3 Introdução: O papel da audição na terapia fonoaudiológica A audição é um sistema sensorial extremamente complexo e primordial para a aquisição e desenvolvimento da linguagem oral e escrita. Esse sistema é dividido em audição periférica, que tem o objetivo de amplificar a onda sonora e transformá-la em sinal elétrico e a audição central que irá analisar e interpretar a informação sonora. Esses dois sistemas precisam estar íntegros para que o indivíduo detecte, identifique e reconheça os sons que fazem parte do seu dia a dia, assim como, localizar o som, conseguir compreender a fala em situações de escuta em ambiente ruidoso, perceber pequenas variações do tempo que distinguem fonemas e reconhecer as informações que entrem pela orelha direta e esquerda. É extremamente importante que todo paciente que compareça ao consultório fonoaudiólogo realize a avaliação audiológica básica incluindo a meatoscopia, a audiometria comportamental, testes de fala e a imitanciometria com pesquisa de reflexos acústicos para investigar se a criança apresenta algum tipo de perda auditiva, seja por um comprometimento condutivo (orelha externa ou média) ou sensorioneural (cóclea/nervo auditivo). 4 A criança com sistema motor adequado consegue realizar audiometria comportamental condicionada a partir de 5 meses e assim conseguimos saber os limiares auditivos no teste padrão ouro da Audiologia (Joint Commitee on Infant Hearing, 2019). Lembre-se que a avaliação audiológica infantil é composta de exames que os resultados precisam ser comparados entre si para verificar estruturas diferentes do sistema auditivo periférico e que não se resume apenas nas medidas objetivas como os exames de emissões otoacústicas e o potencial evocado auditivo de tronco encefálico (PEATE). Quando é detectada algum tipo de perda auditiva na criança, há o processo de reabilitação auditiva com dispositivos eletrônicos indicado para o caso. Entretanto, esses dispositivos auxiliarão no acesso aos sons, porém é necessária a terapia fonoaudióloga para estimulação das habilidades auditivas. É comum encontrarmos na clínica fonoaudiológica inúmeras atividades com estimulações visuais, porém a inserção de atividades auditivas é de extrema importância para à aquisição e desenvolvimento de linguagem, seja por atividades somente auditivas ou por atividades auditivas-visuais para a integração desses dois sistemas sensoriais e assim haja unificação da informação, pois pacientes normo-ouvintes podem apresentar dificuldades para processar alguns sons que podem prejudicar a evolução clínica da terapia fonoaudiólogica. 5 1. Processamento auditivo na clínica fonoaudiológica O processamento auditivo define-se como a eficácia e a eficiência que o sistema nervoso auditivo central analisa e interpreta a informação auditiva com mecanismos neurobiológicos que subjazem as habilidades auditivas para compreensão da informação sonora (American Speech Language Hearing Association - ASHA, 2005). Baseado nas descrições da ASHA (1996), Pires (2020) tentou explicar as habilidades auditivas de forma mais simplificadas, sendo essas: • Detecção: habilidade de reconhecer quando há ausência ou presença de som. • Localização sonora: habilidade auditiva para identificar a origem do som em relação à fonte sonora. • Discriminação auditiva: habilidade auditiva para reconhecer se os sons são iguais ou diferentes. • Reconhecimento de padrão auditivo: habilidade auditiva para reconhecer o que escutou por meio da associação de conceitos e significados. • Aspectos temporais da audição: habilidades auditivas para a percepção de mudanças no som ao longo do tempo, como por exemplo, distinguir auditivamente sílabas /pa/ de /ba/ que se diferenciam por pequenas mudanças acústicas temporais. • Performance auditiva com sinais acústicos competitivos: habilidade auditiva para identificar um som que é diferente de outros que são apresentados ao mesmo tempo, como por 6 exemplo identificar o som do violino de uma música no meio outros sons de instrumentos. • Performance auditiva com sinais acústicos degradados: habilidade auditiva para reconhecer quando partes do som não estão completas, como por exemplo tirar a sílaba /cho/ da palavra chocolate, nossa audição consegue realizar o fechamento e reconhecer a palavra mesmo quando faltam partes. Esses conceitos definidos pela ASHA (1996) são importantes para que o fonoaudiólogo saiba compreender o que deve ter nas estratégias que visam a estimulação das habilidades auditivas, porém alguns conceitos precisam ser melhor esclarecidos como as habilidades que envolvem os aspectos temporais do som, ou seja, o processamento temporal. 7 O processamento temporal é a base do processamento auditivo, especificamente no que diz respeito à percepção de fala, pois muitas características da informação auditiva sofrem influência do tempo (Shinn, 2003). Sendo essas as habilidades: • Ordenação temporal: é uma habilidade auditiva que está relacionada ao processamento de múltiplos estímulos de acordo com a sua ordem de ocorrência no tempo. Essa habilidade permite que um indivíduo discrimine e ordene a forma correta de ocorrência dos sons (Shinn, 2003). Também pode ser descrita como a habilidade de reconhecer, identificar e sequenciar padrões auditivos envolve a capacidade perceptual e os processos cognitivos. Para um indivíduo realizar uma atividade relacionada à ordenação temporal os hemisférios direito e esquerda precisam trabalhar de forma fisiológica integrada e assim existem duas etapas para aplicação de atividades: a imitação do som em que há participação maior do hemisfério direito e nomeação do som que tem participação de estruturas como o corpo caloso e hemisfério esquerdo. (Pinheiro e Musiek, 1985). Por uma questão de maturação das vias auditivas centrais, crianças pequenas podem não conseguir realizar essas atividades de ordenação temporal, porém esse assunto será melhor explicado nos próximos itens desse E-book. 8 • Resolução temporal: refere-se a uma habilidade auditiva para detectar mudanças nos estímulos em decorrência do tempo, como a percepção de gaps (intervalos de silêncio) no meio de um ruído ou entre dois estímulos (Eggermont, 2015). Essa habilidade auditiva é de extrema importância para a discriminação de fonemas com traços semelhantes. Indivíduos com transtorno do processamento auditivo necessitam de maiores gaps ou intervalos de tempo para detectar estímulos. Esses indivíduos podem apresentar dificuldades em processar os elementos da fala que são apresentados de forma rápida, pois a fala, quando é apresentada rapidamente, apresenta menores gaps. Sendo assim, a habilidade de resolução temporal ineficiente pode dificultar a detecção de menores gaps, o que pode inibir a percepção do som no momento do inicial e final (Bamiou et al., 2006). • Mascaramento temporal: Se refere ao mascaramento que ocorre quando o sinal e o ruído mascarador não se sobrepõe em relação ao tempo. Essa habilidade auditiva se subdivide em duas categorias: O backward masking (não tem tradução) ocorre quando o ruído mascarador segue o sinal e o forward masking (não tem tradução) que ocorre quando o ruído mascarador precede o sinal (Shinn, 2014). Escutamos falar muito pouco sobre o mascaramento temporal aqui no Brasil e não temos até o presente momento um teste 9 específico que avalie essa habilidade. Vamos colocar em termos práticos o que seria o mascaramento temporal no nosso dia a dia. Na palavra /estar/, temos a fricativa /s/ que antecede a plosiva /t/e em dificuldades auditivas relacionadas ao mascaramento temporal o som do /s/ poderia se sobrepor ao som do /t/ e assim o indivíduo perder partes da informação auditiva. Alguns estudos internacionais nos mostram que crianças com transtornos de linguagem podem apresentar dificuldades relacionadas ao mascaramento temporal. No desenho abaixo fica um pouco mais fácil entender o que seria o mascaramento temporal. Agora é a vez de deixar mais claro os conceitos relacionados às habilidades auditivas de fechamento e figura-fundo para maiores esclarecimentos em relação a terapia dessas habilidades. • Fechamento auditivo: essa habilidade auditiva está relacionada com a percepção de fala degradada, ou seja, uma fala que foi modificada, seja por corte de frequência, distorção, compressão, com reverberação ou quando está degradada pela presença de ruído no ambiente. O sistema auditivo nervoso central tem a capacidade de fazer o reconhecimento 10 do som mesmo quando partes forma omitidas com a degradação do estímulo. Um exemplo de fechamento visual é quando recebemos um email em que a pessoa esqueceu de escrever uma sílaba errada dentro de uma palavra, mas pelo contexto conseguimos compreender a mensagem. Com a audição ocorre de forma semelhante. • Figura-fundo: É a habilidade auditiva de focar a atenção em um estímulo auditivo, enquanto os outros estímulos auditivos do cenário são ignorados, como a focar a atenção na fala do professor em sala de aula enquanto há barulho de outros falantes no mesmo ambiente, ou ruídos de ventilador e ar condicionado. Fazemos diariamente a figura-fundo com sons verbais ou não verbais, assim como utilizamos a participação das duas orelhas trabalhando em conjunto ou de forma separadas e assim entramos em um conceito chamado escuta dicótica. A escuta dicótica caracteriza-se quando diferentes estímulos auditivos são apresentados de forma simultânea, cada um em uma orelha. As duas orelhas podem trabalhar juntas para integrar a informação, sendo chamada 11 de integração binaural ou de formas separadas, chamada de separação binaural e assim a atenção ao estímulo auditivo é direcionada somente para a orelha esquerda ou direita. O sistema nervoso auditivo central precisa estar íntegro para o desenvolvimento de habilidades de linguagem e cognição, porém é importante enfatizar que memória e atenção fazem parte de um sistema superior cognitivo de ordem maior e que essas habilidades não de origem auditiva, porém podemos estar utilizando partes do sistema cognitivo para estimulação e reabilitação das habilidades auditivas (ASHA, 2005). • Memória auditiva: Consiste na habilidade de armazenar informação auditiva de curto prazo de forma crescente, com estímulos verbais ou não verbais. Um exemplo de atividade com memória auditiva é brincadeiras como “fui à feira”. Comprei banana, comprei banana e maçã, comprei banana, maça e uva. 12 • Atenção auditiva: Consiste na habilidade de direcionar a atenção para um estímulo auditivo específico que pode ser concomitantemente com um ato motor. Por exemplo, ao escutar uma música o paciente deverá levantar a mão quando escutar a palavra “coração”. 13 2- Fisiologia da audição central e idade sugerida para estimulação das habilidades auditivas. O sistema auditivo periférico está pronto ao nascimento, porém determinadas estruturas que compõe o sistema nervoso auditivo central, que depende de experiências auditivas para se desenvolver estarão próximas a de um adulto por volta de doze anos (Moore e Guan, 2001) O processo de maturação das vias auditivas centrais é caudo- rostral, ou seja, do tronco encefálico em direção a estruturas superiores como córtex auditivo e corpo caloso e cada habilidade auditiva corresponde às janelas de desenvolvimento, assim como as habilidades de linguagem e cognição se desenvolvem em estágios de desenvolvimento da criança. Na fonoaudiologia trabalhamos com intervenção precoce em relação à aquisição e desenvolvimento da linguagem, assim como a detecção precoce de perdas auditivas, porém deve-se ter em mente que a criança tem determinados períodos de desenvolvimento das habilidades auditivas e alguma vezes não conseguir executar determinada tarefa pode ser por não estar apto de forma auditiva fisiológica ou falta de capacidade cognitiva e linguística para responder a determinados comandos, sendo assim nesse E-BOOK 14 vamos falar um pouco sobre quais habilidades auditivas podem ser estimuladas por faixa etária. Todos os documentos relacionados às boas práticas clínicas sobre processamento auditivo, como da ASHA, Academia Americana de Audiologia e Sociedade Britânica de Audiologia recomendam a realização do exame de processamento auditivo a partir de sete anos por todas as questões maturacionais auditivas e capacidade de compressão sobre os testes que são aplicados na bateria de avaliação. Sendo assim, um diagnóstico de transtorno do processamento auditivo é somente a partir de sete anos, porém algumas habilidades auditivas podem ser estimuladas antes dessa idade, principalmente em crianças com atraso de desenvolvimento ou que apresentam queixas relacionadas a audição. • A detecção, discriminação e identificação auditiva são habilidades básicas e que devem fazer parte da terapia fonoaudiológica. De acordo com Eggermont (2014) as habilidades auditivas de detecção e discriminação auditiva estão presentes no bebê por volta de seis meses. O bebê é capaz de discriminar a voz da mãe de outras vozes do ambiente. Identificar sons depende da experimentação sonora da criança, porém é uma habilidade auditiva que pode ser estimulada na primeira infância. • A localização sonora é uma habilidade auditiva que está presente em bebês a partir de três meses em relação à lateralidade e se desenvolve para outros ângulos e direções até 24 meses. No livro de Northern e Downs (2005) sobre audição infantil é possível observar as etapas esperadas de desenvolvimento da localização sonora da criança até os 24 meses, como lateralizar para os lados, para cima e para baixo. A habilidade auditiva de localização sonora faz parte do nosso dia a dia até como forma de sobrevivência e deve pode ser estimulada na terapia fonoaudiológica com instrumentos de 15 diferentes faixas de frequência (sons graves, médios e agudos), objetos com seu determinado som (como talheres, caixa de fósforo, molho de chaves, e à viva voz em diferentes ângulos, como a chamar ou fornecer comandos à criança em diferentes de frente, de costas, à direita, a esquerda e em distâncias diferentes. Acreditamos que as habilidades auditivas básicas descritas por Boothroyd (1986) como detecção, discriminação, identificação e compreensão auditiva, sendo essa quando a criança entende o que significa o estímulo auditivo deve estar presente na terapia de linguagem para auxiliar no decorrer da fonoterapia. • Percepção de fala degradada: A partir dos cinco anos a criança começa a compreender melhor a fala na presença no ruído ou quando há outro tipo de degradação, como reverberação por exemplo. De seis meses a cinco anos há uma grande janela para percepção auditiva geral. O volume cerebral aumenta por volta de 25% entre o nascimento e os quatro anos, o que aumenta a expansão do néo-córtex auditivo e a densidade neuronal dobra de tamanho entre do momento do nascimento até os seis anos e nesse período há aquisição dos traços característicos da língua materna. 16 As habilidades perceptuais auditivas continuam para degradação de fala e percepção de fala no ruído melhoram gradualmente até os doze anos (Eggermont, 2014). Não encontramos na literatura a estimulação das habilidades auditivas que envolvem o processamentotemporal e a escuta dicótica antes da idade indicada para diagnóstico (sete anos). Lembramos que as habilidades auditivas não dependem apenas de estruturas neurais, mas da capacidade de compreensão que envolvem outros sistemas mentais além do auditivo. O que temos descrito em relação ao amadurecimento de estruturas corticais auditivas e corpo caloso (sendo que existe participação dessas estruturas na escuta dicótica e nas habilidades auditivas que subjazem do processamento temporal) é que ocorrem de forma mais tardia, podendo chegar até doze anos (Eggermont, 2014). Por tanto, recomendamos que a estimulação de tais habilidades auditivas sejam realizadas a partir de sete anos ou adaptadas para crianças mais novas levando em consideração as particularidades da idade e desenvolvimento auditivo. 17 3.Utilização das atividades do E-book Esse E-book foi desenvolvido para auxiliar na clínica fonoaudiológica e pode ser utilizado na terapia de pacientes com dificuldades relacionadas à linguagem, transtorno do processamento auditivo, treinamento auditivo acusticamente controlado e terapia de usuários de dispositivos eletrônicos, como AASI e implante coclear. Antes de utilizar as atividades desse material em pacientes com AASI e implante coclear é importante verificar se o paciente tem acesso aos sons, ou seja, se o paciente tem audibilidade suficiente para realizar as tarefas atividades propostas. Em usuários de AASI é importante utilizar as medidas objetivas para verificação e validação com testes comportamentais, assim como em pacientes com implante coclear. Em usuários de AASI verifique sempre antes da terapia se as pilhas não estão acabando e se estão ligados. Em usuários de implante coclear verifique em se o processador de fala está carregado e o programa em uso para descrever no relatório a evolução clínica para o fonoaudiólogo que realiza os mapeamentos auditivos. As atividades podem ser realizadas com ou sem fones nos pacientes usuários de dispositivos eletrônicos. Em casos de uso de fones, sugerimos fones maiores que os utilizados de forma convencional. Verifique sempre o conforto do paciente nas condições adequadas. 18 Os áudio e fichas visuais presentes nesse material estão sem modificações e com modificações para quem não tem o audiômetro para controle acústico das atividades, como os textos com ruído e a as frases com reverberação. A ASHA (2005) nos diz que para a eficácia de um treinamento auditivo devemos incluir atividades mais auditivas, porém também devemos incluir atividades que misturem linguagem, cognição e audição e assim as atividades propostas por nós foram elaboradas com base nessas recomendações. Nas folhas de protocolos estão descritas o nome da atividade, instruções, faixa etária indicada, habilidade auditiva a ser estimulada que pode ser realizada de acordo com a criatividade do terapeuta, além das sugestões presentes nesse E-book 3.1 – Atividades de detecção auditiva A detecção consiste na habilidade auditiva de identificar se há presença ou ausência de som e deve-se sempre fazer parte da terapia de pacientes usuários de dispositivos eletrônicos em intensidades altas, médias e baixas. Essa habilidade também pode ser utilizada em crianças mais novas normo-ouvintes como uma preparação para a consciência do som. Na atividade “Mariana e seu papagaio” escolhemos frequências de 500 a 4.000Hz por abranger o espectro da fala, em que toda vez que o paciente escutar o “apito” com o áudio gravado deve-se colocar a comida feita de pedaços de papel no pote de ração. Você pode realizar essa atividade sem ou com ruído de fundo (que pode ser no audiômetro ou no celular ou computador) para aumentar o nível de dificuldade e pode ser realizada com ou sem fones. 19 Essa atividade também pode ser utilizada como a habilidade de atenção auditiva. Selecione uma lista de palavras e toda vez que o paciente escutar com a letra /m/, por exemplo, deve dar comida ao papagaio de Mariana. 3.2 – Atividades de discriminação auditiva Selecionamos para essas atividades estímulos auditivos linguísticos e não linguísticos para que o paciente diferencie se os sons são iguais ou diferentes. Em relação aos estímulos linguísticos utilizamos a lista de sílabas proposta por Cristofolini (2008) como o teste de discriminação perceptual. Deixamos os áudios sem e com expansão e amplificação no tempo, essa medida foi proposta por Tallal (1975) com base em estudos perceptuais auditivos em pacientes com transtorno de desenvolvimento de linguagem (TDL) para facilitar a discriminação auditiva. Os estímulos não linguísticos são relacionados à frequência, duração do estímulo e intervalo inter-estímulo como nível de dificuldade. O nível 1 corresponde a estímulos apresentados de forma mais devagar e o nível 2 a estímulos apresentados com menores intervalos inter-estímulos, o que deixa a atividade mais desafiante para os pacientes. As frequências escolhidas para essas atividades foram 500 e 1000 Hz devido aos resíduos auditivos de pacientes que apresentam perda auditiva em rampa e que podem não ter memória auditiva suficiente para sons mais agudos. Essas atividades podem ser realizadas tanto no audiômetro quando no celular ou computador. 3.3- Atividades de reconhecimento auditivo Reconhecer o som é uma habilidade auditiva que exige a participação de sistemas mentais superiores, como acesso 20 lexical das palavras da língua nativa que incluem categorias semânticas. Certifique que o seu paciente tenha vocabulário suficiente para realizar as atividades que podem ser feitas com ou sem ruído de fundo conforme descrito na atividade de detecção auditiva. 3.4 - Atividades de fechamento auditivo Nas atividades propostas utilizamos frases com reverberação que correspondem à fala degradada e textos com diferentes tipos de ruído de fundo. Deixamos livre os áudios tanto com modificações, quanto sem modificações. Para quem quiser utilizar o texto no audiômetro sugerimos variar a relação sinal/ruído do audiômetro em cada parágrafo dos textos e fazer perguntas de interpretação de texto para os pacientes (deixamos algumas sugestões). Os textos foram selecionados conforme as séries iniciais, assim como também selecionados o texto “Na famosa feira livre” que foi proposta por Cristofolini (2008) e tem pares mínimos balanceados foneticamente. As frases também podem ser utilizadas com e sem reverberação com variação da relação sinal/ruído. Sugere-se utilizar os princípios da escuta monótica no audiômetro. Deixamos o apoio visual de cada figura que corresponde as frases para apoio visual nessa atividade, porém também pode ser realizada somente de forma auditiva. 3.4 - Atividades que envolvem o processamento temporal As atividades que serão descritas a seguir podem ser realizadas no audiômetro de forma binaural ou somente com o uso de computador, tablet, celular com ou sem fone. Tudo depende do desempenho do paciente e planejamento terapêutico. 21 • Ordenação temporal: Utilizamos parâmetros semelhantes das atividades de discriminação auditiva como frequência, duração e intervalos inter-estímulos com três tons. O nível 1 corresponde sempre à atividade mais lenta em relação a esses parâmetros, o nível 2 ao nível médio e o nível 3 ao mais rápido. Os parâmentros de intervalos inter-estimulos utilizados foram 1 segundo, 500 milissegundos e 200 milisegundos. Sugerimos começar pelas atividades de frequência e posteriormente as atividades com duração na forma de imitação (hum hum him) e assim seguir para nomeação (som fino e som grosso) devido à transferência inter- hemisférica e associação de som e símbolo, segundo a teoria que envolve a ordenação temporal. Caso o paciente tenha dificuldades relacionadas à memória ou tenha dificuldades relacionados a ordenar três tons, sugerimos realizar a ordenação temporalcom as atividades de discriminação auditiva com dois tons. É importante ao mudar de nível de dificuldade das atividades de ordenação temporal usar a base dos 30 a 70% de acertos, ou seja, se o paciente não consegue passar de 30% de acertos é necessário escolher uma atividade mais fácil que as propostas nesse material e caso o paciente avance e tenha 70% de acertos nos níveis de dificuldades são utilizadas as estratégias mais difíceis. 22 • Resolução temporal: Propusemos atividades com percepção de gap que variam de 1 segundo até 50 milissegundos no pink noise que tem uma faixa mais curta de frequência que o white noise e o no restaurant noise. Deixamos um apoio visual de placa para toda vez que o paciente escutar o gap sinalizar para o fonoaudiólogo. Atividades com percepção auditiva de gaps são muito importantes para contribuir com a percepção auditiva de pausas entre palavras e fonemas que se distinguem por traços acústicos mínimos como os fonemas surdos e sonoros. • Mascaramento temporal: Apesar de não termos até o momento testes que avaliem o mascaramento temporal é importante estimular essa habilidade auditiva. Utilizamos o white e restaurant noise com base no forward masking explicado nesse E-book. O paciente deve levantar a placa da atividade de resolução temporal ou a mão toda vez que escutar o tom de 500 Hz. As atividades que envolvem o processamento temporal são importantes para dar base às características acústicas dos estímulos de fala em relação ao tempo, por isso sugere-se a aplicação dessas atividades na terapia de crianças com transtornos de linguagem associada à terapia de linguagem como mais uma ferramenta para o auxiliar no processo de reabilitação. 3.5 Atividades de Figura-Fundo: Deixamos como atividades estímulos linguísticos e não linguísticos com apoio visual que podem ser estimuladas com fones ou sem fones (de forma livre no consultório ou campo sonoro), tanto no audiômetro, quanto no computador. Ao utilizar as atividades com escuta dicótica com estímulos linguísticos sugerimos começar pelas atividades com duas palavras, para assim poder realizar a atividade com quatro palavras, tanto na etapa de integração binaural (o paciente terá que falar ou apontar respostas referentes às duas orelhas) ou separação binaural (o paciente terá que apontar ou falar respostas referentes somente à orelha direita ou esquerda). Recomendamos para quem for utilizar as atividades no audiômetro deixar a intensidade compatível com atividades de escuta dicótica. 23 3.6 Atividades de memória auditiva: Podem ser utilizadas com a gravação presente nesse material ou à viva-voz. O importante é obedecer às ordens propostas. Você pode pedir para o paciente formar frases, histórias e fazer perguntas relacionados ao tema da atividade, como por exemplo: Coloque o tomate e o queijo na pizza. Qual o legume presente nessa frase? Quais os tipos de queijo você conhece? Conte uma história com o tomate e outros legumes. Pergunte ao paciente qual o segundo ingrediente colocado na pizza? Qual era verde? Essa atividade também pode ser realizada no audiômetro ou em terapia fonoaudiológica e se quiser deixá-la mais difícil selecione uma música ou um ruído de fundo. Considerações finais Cada paciente é único, assim como o planejamento terapêutico que deve ser interpretado em cada situação e da mesma forma com as atividades aqui descritas. Elaboramos esse material, pois acreditamos que atividades auditivas não são formulas mágicas que resolvem todas as dificuldades do paciente, porém auxiliarão no processo de reabilitação da comunicação. Esperamos que esse material lúdico venha contribuir com a sua prática clínica. 24 Referências: American Speech-Language-Hearing Association. (Central) Auditory Processing Disorders: The Role of the Audiologist. Rockville, MD: American Speech-Language-Hearing Association; 1996. American Speech-Language-Hearing Association. (Central) Auditory Processing Disorders: The Role of the Audiologist. Rockville, MD: American Speech-Language-Hearing Association; 2005. Bamiou DE, Musiek FE, Stow I, Stevens J, Cipolotti L, Brown MM, Luxon LM. Auditory temporal processing deficits in patients with insular stroke. Neurology. 2006; 3(67): 614-619. Bootthroyd, A., Speech acoustics and perception. Austin: Pro-ed, 1986 Cristofolini C. Trocas ortográficas: uma interpretação a partir de análises acústicas. [dissertação]. Programa de Pós-Graduação em Linguística; 2008. Eggermont J. Development of the Central Auditory Nervous System. In: Handbookof central auditory processing disorder. Plural Publishing, Inc. 2014. Eggermont JJ. Auditory temporal processing and its disorders. Oxford University press; 2015. Joint Committee On Infant Hearing (JCIH). Position statement: principles and guidelines for early hearing detection and intervention programs. 2019. Moore, JK e Guan Y.L. 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