Prévia do material em texto
TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM W30Vn0Nll 3 01X31 W39VnONH 3 01X31 W30VD0NI1 3 01X31 W30Vn0N!l 3 01X31 W39VnONIl 3 01X31 TEXTO E LINGUAGEM C oleção d irig ida por Maquira O sakabe, Maria Laura M ayrink-Sabinson c Raquel Salck Fiad A coleção destina-se principalmente a professores do ensino médio, na área de língua e literatura. As obras pretendem contribuir para a atuação na sala de aula, trazendo resultados de pesquisas e propondo métodos muitas vezes inovadores, sempre com sólido embasamento teórico. CAPA Projeto gráfico Alexondre Martins Fontes Ilustração Rex Design REDAÇÃO E TEXTUALIDADE REDAÇÃO E TEXTUALIDADE* Maria da Graça Costa Vai martins Martins Fontes SUMÁRIO A p re se n ta ç ã o ................................................................ VII PRIM EIRA PARTE PRESSUPOSTOS CAPITULO J Texto e tex tualidade ................................................ 3 CAPITULO 2 Como ava lia r a tex tualidade? .............................. 17 SEGUNDA PARTE RELATO DE UMA ANÁLISE CAPITULO 3 As condições de produção ..................................... 43 CAPITULO 4 A coerência, a coesão e a informatividade: breve es tudo quantita tivo ................................ 53 CAPITULO 5 A coerência, a coesão e a informatividade: análise qualitativa ................................................ 59 CAPITULO 6 Uma visão global do c o r p u s .................................. 111 Conclusão ..................................................................... 121 Noias .............................................................................. 129 B ib lio g ra fia ................................................................... 131 * Copyright O 1991. I jvm n a M anm \ Fkmtt% FAttofa lida .. Sâo M/wfe /* i/n /j presente edição. 1T ed ição / v y / 3 ! edição 2006 2! tiragem 2009 iV rpan^ã*) do original Múuricto Buhhítzar Leal Revi w s gráficas Edunnio Angelo Batista Mau r im t tUilthnzar Leal P rodução gráfica GrrnIJo Abes l>ados Internacionais ck ( aUfci&v*’ na Pubbcaçáo (C IP» iC áfm ra Brasüdna do 1 j \ ru . SP. Braâl) Comi Vai. Mana da Gi as,a Kedaçãn e textualiiladc / M ana da (Jraça C m ta Vai. - 3* ed SAn Paulo M anias Fontes. 2006. - (Tcxio c linguagem» ISBN 85-336-2*40-2 I Português - Redação 2. K edaçjo flaleratunO 1 Titulo. II Sér»e 06 8407 __________________________________________ CDI>-X0 H índices p u ra catalogo sistem ático: I RedaçAo Liicratura S0 K 2 . Texto : ProduçJko : R ctom a 808 Todos os direitos desta edição para a lingua iwrtuguesa re senados à IJvraria Martins Fontes Editora lida. Rua Ctmxelheiro Ramalho. 330 01325 OPO Sá o Paulo SP Rrasil Tel <li) 3241.3677 Fax {11) 3105.6993 C-rnail: infot&maninsforucseditora.tom.hr hnp:/M*ww.murimsfonteseditora.< om.br APRESENTAÇÃO A lingüística textual, desenvolvida sob re tudo na E u ro p a a p a r t i r do final da década de 60, tem se ded icado a e s tu d a r a n a tu re z a do texto e os fa to res envolvidos em sua p ro d u ção e recepção. Es sa teoria, na m edida em q u e b u sc a esc la recer o q u e é e co m o se produz u m texto, m erece se r co nhecida e con s id e rad a p o r quem se in teressa pe lo t rab a lh o com a exp ressão e sc r i ta na escola. Este livro p rocura condensar algumas das no ções mais relevantes da teoria e relacioná-las com os resu ltados de um a análise de cem redações ela b o ra d a s po r cand ida tos ao cu rso de Letras da UFMG no ves t ibu la r de 1983, na tentativa de e s tabe lecer um diagnóstico e lev an ta r a lgum as s u gestões p a r a o ensino esco la r de red ação 1. PRIMEIRA PARTE PRESSUPOSTOS CA PITULO I T E X T O E T E X T U A L ID A D E 1. O q u e é t e x t o Para se com preender melhor o fenômeno da produção de textos escritos, im porta entender previamente o que caracteriza o texto, escrito ou oral, unidade lingüística comunicativa básica, já que o que as pessoas têm para dizer umas às o u tras não são palavras nem frases isoladas, são textos. Pode-se definir texto ou discurso como ocor rência lingüística falada ou escrita, de qualquer extensão, do tada de unidade sociocomunicativa, sem ântica e formal. Antes de mais nada, um texto c uma uni dade de linguagem em uso2, cum prindo uma função identificável num dado jogo de a tuação 3 a) o pragmático, que tem a ver com seu f un cionamento enquanto atuação informacio- nal e comunicativa; b)o semãntico-conceitual, de que depende sua coerência; c) o lormal, que diz respeito à sua coesão. 2. O que é textualidade Chama-se textualidade ao conjunto de carac terísticas que fazem com que um texto seja um texto, e não apenas uma seqüência de frases. Beaugrande e Dressler (1983) apontam sete fato res responsáveis pela textualidade de urn discur so qualquer: a coerência e a coesão, que se rela cionam com o material conceituai e lingüístico do texto, e a intencionalidade, a aceitabilidade, a situacionalida.de, a informatividade e a intertex- malidade, que têm a ver com os fatores pragmá ticos envolvidos no processo sociocomunicativo. 2.1. Coerência e coesão A coerência resulta da configuração que as sumem os conceitos e relações subjacentes à su perfície textual. É considerada o fator fundamen tal da textualidade, porque c responsável pelo sentido do texto. Envolve não so aspectos lógicos e semânticos, mas também cognitivos, na medi da em que depende do partilhar de conhecimen tos entre os interlocutores. Um discursoé aceito como coerente quando 5 apresen ta um a configuração conceituai com pa tível com o conhecim ento dc m undo do reccbe- dor. Essa questão é fundamental. 0 texto não sig nifica exclusivam ente por si mesmo. Seu senti do é cons tru ído não só pelo p ro d u to r com o tam bém pelo reccbedor, que precisa de te r os conhe cimentos necessários à sua in terpretação . O pro d u to r do d iscurso não ignora essa par t ic ipação do in te r locu to r e con ta com ela. É fácil verificar que grande parte dos conhecimentos necessários à com preensão dos textos Aão vem explícita, mas fica dependente da capacidade de pressuposição e inferência do recebedor. Assim, a coerência do texto deriva de sua ló gica in terna , resu ltan te dos significados que sua rede de conceitos e relações põe em jogo, mas tam bém da com patib ilidade en tre essa rede con ceituai — o m undo textual — e o conhecim ento de m undo dc quem processa o discurso. A coesão é a m anifestação lingüística da coe rência; advém da m aneira como os conceitos e re lações sub jacen tes são expressos na superfície textual. Responsável pela unidade formal do tex to, constrói-se a través de m ecanism os g ram a t i cais c lexicais. E n tre os prim eiros estão os p ronom es ana- fóricos, os artigos, a elipse, a concordância, a cor relação en tre os tem pos verbais, as conjunções, por exemplo. Todos esses recursos expressam re lações não só en tre os elem entos no in te r io r de um a frase, mas também entre frases e seqüências dc frases den tro de um texto. Já a coesão lexical se faz pela re iteração, pe la substitu ição e pela associação. A re ite ração se 6 dá pela simples repetição de um item léxico e tam bém por processos como a nominalização (ex.: a re tomada, a través de u m substan tivo cognato, da idéia expressa por um verbo, como em adiar/adia mento ou promover/promoção). A substitu ição in clui a sinonímia, a antonímia, a hiponímia (quando o term o substi tu ído rep resen ta u m a parte ou umelem ento e o su b s t i tu id o r rep resen ta o todo ou a classe — ex.: carroça/veículo), e a h iperoním ia (quando o te rm o substi tu ído represen ta o todo ou a classe e o substitu idor um a parte ou um elemen to — ex.: objeto/caneta). Finalmente, a associação é o processo que perm ite relacionar itens do voca bulário pertinentes a um mesmo esquema cogniti vo (por exemplo, se falam os aniversário, podemos em seguida m enc ionar bolo, velinha, presentes, e esses termos serão interpretados como alusivos ao m esmo evento). A coerência e a coesão têm cm com um a ca racterís tica de p rom over a inter-relação sem ân tica en tre os e lem entos do discurso, responden do pelo que se pode ch am ar de conectividade tex tua l8. A coerência diz respeito ao nexo en tre os conceitos c a coesão, à expressão desse nexo no plano lingüístico. È im portan te reg is tra r que o nexo é indispensável para que u m a seqüência de frases possa ser reconhecida como texto. En tretanto , esse nexo nem sem pre precisa e s ta r ex plícito na superfíc ie do texto por um m ecanismo de coesão gram atica l. Vejamos um exemplo: (1 )0 Pedro vai buscar as bebidas. A Sandra tem que ficar com os meninos. A Tereza a r ru m a a casa. Hoje eu vou p rec isar da a juda de to do mundo. 7 Unia íala como (1) é perfe itamente aceitável, tem coerência, Iaz sentido. E n tre tan to não ap re senta m arcadores sintáticos específicos que de notem sua coesão. 0 nexo entre as frases se cons trói não no nível gramatical, mas no nível semán- tico-cognitivo. Por ou tro lado, um a seqücncia de frases in terligadas por marcadores lingüísticos de coesão que não correspondessem a relações efetivas es tabe lec idas na e s t ru tu r a lógico-semântico- cognitiva subjacente não seria um texto. É pos sível forjar artificialmente' um exemplo para ilus t ra r (normalmente, a com petência textual intui tiva impede que as pessoas produzam seqüências desse tipo): (2) No rádio toca um rock. O rock é um rit mo moderno. O coração também tem rit mo. Ele é um músculo oco composto de duas aurículas e dois ventrículos. Em (2), a presença dc recursos coesivos in- terfrasais (a recorrência de item lexical assi nalada por artigo definido, o ar t icu lador tam bém e o pronom e anafórico ele) não é suficien te para garan ti r textualidade à seqüência, já que ela não funciona como um todo significativo coe rente. Entre tanto , é inegável a utilidade dos meca nismos dc coesão como fatores da eficiência do discurso. Alem de to r n a r a superfície textual es tável e econômica, na medida em que fornecem possibilidades variadas de se promover a conti nuidade e a progressão do texto, também perm i 8 tem a explicitação de relações que, implícitas, po deriam ser de difícil interpretação, sobretudo na escrita. Nas seqüências (3) e (4) abaixo, por exemplo, o nexo é facilmente recobrável pelo leitor, embora não manifesto na superfície: (3) A máquina parou. Está faltando energia elétrica. (4)Choveu. O chão está molhado. O mesmo não acontece, porem, com as frases de (5a) a (51). Nesses casos, se a relação pretendi da não vier expressa, o recebedor poderá a tribuir ao enunciado sentido diferente do que o autor que ria, sobretudo se, não se tratando de produção oral, não for possível depreender as intenções do produtor através da entonação. Veja-se: (5a) Paulo saiu. João chegou. (5b) Paulo saiu assim que João chegou. (5c) Paulo saiu, mas João chegou. (5d) Paulo saiu, porque João chegou. (5e) Paulo saiu, apesar de João ter chegado. (5f )Sc Paulo saiu, João deve ter chegado. Casos similares a (3) e (4) foram estudados por Isenberg (1968), que os interpretou como pos sibilidades de "textualização" entre frases assin- délicas. O prim eiro exemplifica a textualização por "conexão causai" (a máquina parou porque está faltando energia clétrica) e o segundo, por "interpretação diagnostica" (pode-se verificar que choveu pelo fato de o chão e s ta r molhado). 9 Ao contrário , os exemplos (5b-f), inspirados em Garcia (1977: 18-20, 262-264), não podem dis pensar a conjunção, porque o nexo conceituai e n tre as informações é, digamos, mais frouxo e, por tanto, de processamento não imediato. Há diferen tes possibilidades de articulação e, por isso, a o p ção por um a delas precisa ser explícita. Além disso, os recursos coesivos, quando pre sentes, devem obedecer a padrões prévios, caso contrário seu em prego será percebido como " in fração textual”9, tornando “ irregular" a seqüên cia em que ocorrem . Alguns dos princípios que orientam o em prego desses recursos serão lem brados mais adiante. Resumindo o que foi dito, o fundamental para a textualidade é a relação coerente entre as idéias. A explicitação dessa relação através de recursos coesivos é útil, m as nem sem pre obrigatória . E n tretanto, uma vez presentes, esses recursos devem ser usados de acordo com regras específicas, sob pena de reduzir a aceitabilidade do texto. 2.2. Os fatores p ragm áticos da textualidade Entre os cinco fatores pragmáticos estudados por Beaugrande e Dressler (1983), os dois p r im ei ros se referem aos protagonistas do ato de c o m u nicação: a intencional idade e a aceitabilidade. A intencionalidade concerne ao em penho do produtor em cons tru ir um discurso coerente, coe so e capaz de sa tisfazer os objetivos que tem em mente num a determ inada situação comunicativa. A meta pode ser inform ar, ou impressionar, ou 10 ala rm ar , ou convencer, ou pedir, ou ofender, ctc., e é ela que vai o r ien tar a confecção do texto. Em ou tras palavras, a intcncionalidade diz respeito ao valor ilocutório do discurso, elemen to da m aior importância no jogo de atuação co municativa. O outro lado da moeda c a aceitabilidade, que concerne à expectativa do recebedor dc que o con junto de ocorrências com que se defronta seja um texto coerente, coeso, útil c relevante, capaz de levá-lo a ad qu ir ir conhecim entos ou a cooperar com o.s objetivos do produtor. Grice (1975, 1978)10 estabelece máximas con- versacionais, que seriam es tra tég ias norm alm en te adotadas pelos produtores para alcançar a acei tabilidade do recebedor. Tais es tra tég ias se refe rem à necessidade de cooperação (no sentido de o p ro d u to r responder aos in teresses dc seu inter locutor) c à qualidade (autenticidade), quan tida de (informatividade), pertinência e relevância das informações, bem como à m ane ira como essas in formações são apresentadas (precisão, clareza, o r denação, concisão, ctc). Mas é possível que, deliberadam ente , o pro d u to r queira ap resen ta r um texto que desrespei te alguma(s) dessas máximas. Tal intenção, reco nhecida pelo recebedor, ganhará função significa tiva c resu ltará em efeito de sentido im portante no jogo interativo. É o que-Grice cham a de “ im- plicatura conversacional”: o recebedor prefere su por que a infração aos princípios conversacionais seja intencional e tenha alguma significação do que sim plesm ente aceitar que seu in terlocu tor possa produzir um discurso impertinente e sem sentido. 11 Charollcs (1978:38) afirma que, em geral, o rc- ccbedor dá um "crédito de coercncia" ao produ tor: supõe que seu discurso seja coerente e se em penha em captar essa coerência, recobrindo lacu nas. fazendo deduções, enfim, colocando a servi ço da compreensão do texto todo conhecimento de que dispõe. Assim, a comunicação se efetiva quando se es tabelece um contrato de cooperação entre os in terlocutores, de tal modo que as eventuais falhas do produtor são percebidas como significativas (as vezes, o sentido do texto çstá na suaaparente fal ta de sentido — cf. a piada), ou são cobertas pela tolerância do recebedor. A margem de tolerância e tanto maior quanto mais conhecido é o assunto e mais informal ê a situação. O produtor sabe da existência dessa tolerabil idade e conta com ela, assim como conta a capacidade de pressuposição e inferência do recebedor. Essa “cumplicidade" do recebedor para com o texto é que possibilita que a produção não seja tarefa excessivamente di fícil e tensa e, assim, viabiliza o jogo comunicativo. O terceiro fator de textualidade, segundo Beaugrandc e Dresslcr (1983), é a situacionalida- de, que diz respeito aos elementos responsáveis pela pertinência e relevância do texto quanto ao contexto em que ocorre. E a adequação do texto a situação sociocomunicativa. O contexto pode, realmente, del in ir o senti do do discurso e, normalmente, orienta tanto a produção quanto a recepção. Em determinadas circunstâncias, um texto menos coeso e aparen temente menos claro pode funcionar melhor, ser mais adequado do que outro de configuração mais completa. Se n e m de exemplo as inscrições lacó- 12 nicas das p lacas de trânsito, m a is ap ro p r iad as à s i tuação específ ica cm que são u sadas do que um longo texto explicativo ou persuas ivo que os mo to r is ta s seq u e r tivessem tem po de ler. A con junção dos três fa to res já mencionados resu l ta n u m a série de conseqüências p a ra a prá tica com unicativa. Em p r im e iro lugar, é im p o r tan te p a ra o pro d u to r saber com que conhecimentos do recebedor clc pode co n ta r c que, portan to , não p rec isa ex p lic ita r no seu discurso. Esses conhecim entos po dem adv ir do contexto imediato ou podem pree- x is t ir ao a to comunicativo. Assim, um a inform a ção apa ren tem en te absu rda com o o exemplo a se guir, ex tra ído de Elias (1981: 45), fa rá sentido pa ra quem souber que Maria sofre de problemas gás tr icos de fundo nervoso e que passa mal sem pre que come tensa, p reocupada com o horário: (6) M aria teve um a ind iges tão em b o ra o re lógio es tivesse es trag ad o . Daí vem a noção de coerência pragmática, ou seja, a necessidade de o texto se r reconhecido pe lo recebedoi com o um em prego norm al da lingua gem num d e te rm in ad o contexto . O u tra conseqüênc ia da con jugação desses três fa to res de tex tualidade é a existência dos di versos tipos de d iscurso . A p rax e acab a p o r e s ta belecer que, n u m a dada c i rcu n s tân c ia , tendo-sc em m en te d e te rm in a d a in ten ção ilocucional, deve-se c o m p o r o texto dessa ou daque la m ane i ra. Assim, há convenções que regem o func iona m en to da linguagem na in te ração social e que de te rm inam , especif icam ente , qual o tipo p a r t ic u 13 la r de d isc u rso ad eq u ad o a cada ato co m u n ica t i vo. Essa ques tão é da m aio r im portânc ia para quem traba lha com o ensino de redação, pois vem dai o la to de que a tex tualidade de cada tipo de d iscu rso envolve e lem entos diferentes. O que c qua lidade num texto a rgum en ta iivo form al po derá se r defeito num poema, ou n um a es tó r ia de suspense, ou n u m a conversa de botequim , por exemplo. O in te resse do recebedor pelo texto vai de pender do grau de in form aliv idade de que o u lt i mo é po r tador . Esse é mais um fa to r de tex tua li dade apon tado por B eaugrande e D ress lc r (1983) e diz respeito á m edida na qual as oco rrênc ias de um texto são e sp e ra d a s ou não, conhecidas ou não, no plano conceituai e no formal. O corre que um d iscu rso menos previsível é m ais in fo rm ati vo, porque a sua recepção, e m b o ra m ais t rab a lhosa, resu lta m ais in teressan te , m ais envolven te. E n tre tan to , se o texto sc m o s t ra r in te iram e n te inusitado, te n d e rá a ser re je i tado pelo recebe dor, que não consegu irá processá-lo. Assim, o ideal é o texto se m a n te r num nível m ediano de informatividade, no qual se a l te rnam ocorrências de p rocessam ento imediato, que falam do conhe cido, com ocorrências de processam ento mais t ra balhoso, que trazem a novidade. P ara mim, o texto com bom índice de infor- matividade p rec isa a inda a te n d e r a o u t ro req u i sito: a suficiência de dados. Isso significa que o texto tem que a p re s e n ta r todas as inform ações necessárias para que seja co m p reen d id o com o sentido que o p ro d u to r p re tende . Não é possível nem desejável que o d iscu rso explicite todas as 14 informações necessárias ao seu processamento, mas c preciso que ele deixe inequívocos todos os dados necessários à sua compreensão aos quais o recebedor não conseguirá chegar sozinho. Bcaugrande e Drcssler (1983) lalam ainda de um outro componente de textualidade: a intertcx- tua!idade, que concerne aos fatores que fazem a utilização dc um texto dependente do conhecimen to de outro(s) texto(s). De fato, "um discurso não vem ao mundo numa inocente solitude, mas contrói-se através de um já-dito em relação ao qual ele toma posição”11. Inúmeros textos só fazem sentido quando entendidos em relação a outros textos, que funcionam como seu contexto. Isso é verdade tanto para a fala coloquial, em que se re tomam conversas anteriores, quanto para os pro nunciamentos políticos ou o noticiário dos jornais, que requerem o conhecimento de discursos e no tícias já divulgadas, que são tomados como pon to de partida ou são respondidos. Há aqui uma questão interessante que não é mencionada pelos autores. É que o mais freqüen te interlocutor de todos os textos, invocado e res pondido consciente ou inconscientemente, é o dis curso anônimo do senso comum, da voz geral cor rente. Assim, avaliar a intertextualidade, em sen- tido lato, pode significar analisar a presença des sa fala subliminar, de todos e de ninguém, nos tex tos estudados12. Por ou tro lado, como esse dis curso é de conhecimento geral, pode-se também considerá-lo como informação previsível e avaliar sua presença como elemento que faz baixar o grau de informatividade. Foi essa a minha opção na análise de redações que apresento adiante. 15 Relacionando os conceitos dc texto e textua lidade, poder-se-ia dizer, cm princípio, que a uni dade textual se constrói, no aspecto sociocomu- nicativo, através dos fatores pragmáticos (inten- cionalidade, aceitabilidade, situacionalidade, in formatividade e intertextualidade); no aspecto se mântico, através da coerência; e, no aspecto for mal, através da coesão. É possível, no entanto, repensar esse a rran jo, se se considerar que a informatividade e a in- tertextualidade dizem respeito, também, à maté ria conceituai do discursô, na medida em que li dam com conhecimentos partilhados pelos inter locutores. Ao mesmo tempo que contribuem pa ra a eficiência pragmática do texto, conferindo- lhe interesse e relevância, esses dois fatores tam bém se colocam como constitutivos da unidade lógico-semântico-cognitiva do discurso, ao lado da coerência. Assim, poder-se-ia situá-los a cava leiro, parte no plano sociocomunicativo, parte no plano semântico-conceitual. Foi dessa maneira que os considerei neste trabalho. 16 CAPÍTULO 2 COMO AVALIAR A TEXTUALIDADE? 1. Questões preliminares Um dos pontos-chave da lingüística textual é a discussão sobre o que faz de um texto um tex to, isto é, em que consiste a essência de um tex to, que propriedade distingue textos de não- textos. A essa discussão grande número de estu dos recentes responde apontando a coerência co mo fator fundamental da textualidade e, em fun ção dessa resposta, tenta esclarecer o que ée de que é feita a coerência de um texto. A conceitua- ção teórica, que busca estabelecer em que nível se situa e com que elementos lida a coerência, se mostra, muitas vezes, fruto da análise empírica, empenhada em descobrir que características usualmente apresentam os textos coerentes. Es 17 sas características são chamadas por alguns dc condições ou requisitos de coerência, porque, se um texto coerente tem qualidades específicas que o distinguem dos incoerentes, pode-se afirmar que, para ser coerente, um texto precisa apresen tar tais qualidades. Assim, a observação empíri ca possibilita a descrição, que, por sua vez, per mite a formulação de critérios para a análise textual. Neste trabalho, tomo como ponto de parti da a descrição fornecida por estudiosos da ques tão e utilizo como instriimcnto critérios de ava liação que considerei adequados ao modelo teó rico adotado. Para avaliar a coerência e a coesão das redações do corpus, tomei como base as cha madas "meta-regras” formuladas por Charollcs (1978) e, para os demais fatores de textualidade, orientei-me pelo que propõem Beaugrandc e Dressler (1983). Antes de apresentar e discutir os critérios de avaliação adotados, é preciso deixar claros alguns pontos. Primeiro quero registrar que a intenção aqui não é, de maneira alguma, prescritiva. Não se está aqui fornecendo mais uma receita, ou uma nova lista de macetes, à qual as redações escolares de vam se conformar para obter boas notas e se apro ximar do modelo que garante aprovação no vesti bular. 0 que se pretende é, a partir de um quadro de características identificadas em textos que "fun cionam’', construir um quadro adequado para bali zar a avaliação do funcionamento de outros textos. Em segundo lugar, quero delimitar a aplica bilidade dos critérios a serem adotados. Confor- 18 % me acertadamente observa Widdowson (1981: 56), a aceitabilidade de um texto se prende à sua iden tificação como “um emprego normal da língua". Ora, em situações diferentes, são diferentes as ex pectativas quanto ao que seja “normal" e aceitá vel. Assim, os critérios aplicáveis ao corpus des ta pesquisa podem não ser adequados para o ju l gamento da textualidade de discursos de outro tipo c construídos com outros objetivos. 0$ tex tos por mim analisados, por exigência da natu reza e do programa do concurso vestibular, se re vestem de peculiaridades que não sc podem dei xar de levar cm conta: são textos escritos, for mais, de função referencial dominante, compos tos de introdução, desenvolvimento e conclusão, através dos quais os candidatos buscam demons tra r sua habilidade de expor idéias c argumen tar em torno de determinado problema. Os requi sitos a que esse tipo específico de texto deve res ponder para angariar aceitabilidade são ce rta mente impraticáveis para uma conversa descon traída. um poema ou um romance, por exemplo. Resta ainda uma observação a fazer, quanto á organização dada ao grupo de fatores levados em conta no julgamento das redações. Como to das elas loram produzidas sob as mesmas condi ções (o vestibular) e não me era possível ter acesso a cada produtor individualmente, examinei em bloco a interferência dos fatores pragmáticos em sua textualidade. Quero dizer: a intencional ida- de, a aceitabilidade e a situacionalidade não fo ram analisadas cm cada redação particular; foi feita uma análise desses três fatores para o con junto das redações. Por outro lado, ampliei o con- 19 ccito de informatividade, dc modo a incluir nele a suficiência de dados c a intertextualidade (já que os textos requeridos para a interpretação do texto “X" constituem informações prévias necessárias ao texto "X"). Assim, entendendo a informativi dade, bem como a coerência e a coesão como fa tores centrados no texto, concernentes a elemen tos constitu tivos do texto, avaliei a presença e o funcionamento desses três com ponentes da tex tualidade em cada redação do corpus. f 2. Critérios p a ra a análise da coerência e da coesão Entendida a coerência como a configuração conceituai subjacente e responsável pelo sentido do texto, e a coesão como sua expressão no pla no lingüístico, é preciso esm iuçar essas noções, para perceber de que são feitos esses fatores e como se apresen tam ou deixam de se ap resen tar em produções lingüísticas reais tais como as re dações dos alunos na escola. É in teressante a proposta do lingüista fran cês Charolles (1978), porque parte exatamente da análise de redações de es tudan tes da escola ele m entar e do ensino médio. Nessa tentativa de ex plicitar o s is tem a implícito de regras referentes à composição e à in te rp re tação de textos, que constitui a com petência textual presente em to do falante, o a u to r se vale também das interven ções feitas pelos professores, de modo a perce ber o fenômeno em seus dois m om entos funda mentais — a p rodução e a recepção. 20 Para Charolles (1978), um texto coerente e coeso satisfaz a qua tro requisitos: a repetição, a progressão, a não-contradição e a relação. Vou chamá-los, aqui, dc continuidade, progressão, não- con tradição e articulação. 2.1. A continuidade A continuidade diz respeito à necessária re tomada de elementos no decorrer do discurso. Tem a ver com sua unidade, pois um dos fatores que fazem com que se perceba um texto como um todo único c a permanência, em seu desenvolvi mento, dc elementos constantes. Uma seqüência que trate a cada passo de um assunto diferente certam ente não será aceita como texto. Quanto à coerência, esse requisito se mani festa pela retomada de conceitos, de idéias. Quan to à coesão, pelo em prego de recursos lingüísti cos específicos, tais como a repetição de palavras, o uso de artigos definidos ou pronomes dem ons trativos para determ inar entidades já menciona das, o uso de pronomes anafóricos e de outros ter mos vicários (como os pró-verbos s e r e fazer e os pró-advérbios lá, ali, então, etc.), a elipse de te r mos facilmente recobráveis, en tre outros me canismos. O emprego desses m ecanism os de coesão obedece a regras específicas, como já disse. Por exemplo, os pronomes anafóricos devem concor da r em gênero e núm ero com o term o que subs tituem. Assim, uma seqüência como a que se se gue conterá um a infração textual, se ocorrer em 21 d isc u rso e sc r i to formal, cm cu ja recepção a ex pecta tiva é de respeito ao d ia le to pad rão : (7) O m en o r abandonado p re o cu p a a popula ção das g ran d es c idades p o rq u e a m arg i na l idade ac ab a os levando ao crime. O u tra exigência cabível q u an to a esse tipo de d iscu rso é que só podem r e c o b ra r p o r pronom e elem entos exp ressos na superfíc ie textual. 0 a lu no a u to r da f rase abaixo infringiu essa exigência ao p re fe r i r a ex p ressão Areação h u m a n a ” a “rea ção do h o m e m ” , porque sua opção acabou dei xando sem an teced en te exp resso o p ro n o m e que vem em seguida: (8) Pode-se def in ir conhecim ento com o a rea ção h u m a n a ao meio que o ce rca . Um caso m u ito freqüen te de “desvio de coe são", no d izer de El ias (1981: 59-60), é aquele em que o em prego do p ronom e an a fó r ico c r ia a m b i güidade, p o rq u e h á mais de u m te rm o que pode lhe se rv ir de an teceden te . A seqüênc ia abaixo exemplifica o problem a: (9) Ana es tava conversando com Teresa e Ro sa chegou. Aí ela con tou que e s tá nam o rando João. Assim, a v a l ia r a co n t inu idade de um texto c verificar, no p la n o conceituai, se há elem entos que p e rc o r re m todo o seu desenvolvimento, confcrindo-lhe unidade; e, no plano lingüístico,I 22 se esses elementos são retomados conveniente mente pelos recursos adequados. Não cabe aqui lazer o levantamento e a descrição de todas as regras que governam o emprego desses recursos, mas posso afirm ar que elas fazem parte da gra mática intuitiva de todo falante, que é capaz não so de empregá-los naturalmente como de reconhe cer as eventuais falhas no seu uso (tendo em vis ta, é claro, as contingências pragmáticas da atua ção comunicativa). Na análise das redações do corpus, conside rei a continuidade requisito da coerência e obser vei se os recursos lingüísticos que servem à ex pressão desse requisito foram empregados de mo do a favorecer a coesão textual. 2.2. A progressão Para Charolles (1978), a progressão, contra partida da repetição ou continuidade, é a segun da condição de coerência e coesão. O texto deve retom ar seus elementos conceituais e formais, mas não pode se limitar a essa repetição. É pre ciso que apresente novas informações a propósi to dos elementos retomados. São esses acrésci mos semânticos que fazem o sentido do texto pro gredir e que, afinal, o justificam. No plano da coerência, pcrcebe-se a progres são pela soma de idéias novas às que já vinham sendo tratadas» No plano da coesão, a língua dis põe de mecanismos especiais para manifestar as relações entre o dado e o novo13. Por exemplo, o dado, que costuma coincidir com o tópico, em 23 geral c retomado anaforicamente e aparece no ini cio de frases ou mesmo parágrafos ou seqüências de frases. Já a informação nova com freqüência se expressa pelo comentário e figura no final das frases. A progressão pode se fazer pelo acrésci mo de novos comentários a um mesmo tópico, ou pela transformação dos comentários em novos tó picos. A mudança dc tópico deve se apresentar inequívoca para o recebedor, sob pena de causar dificuldades de compreensão, visto que a tendên cia mais comum é interpretar as anáforas de uma passagem como referentes ao tópico dessa pas sagem. O texto que não deixa claro, a cada pas so, de que está tratando pode levar o recebedor a um processamento indevido que, na melhor das hipóteses, precisará ser refeito. Há. no português, construções, palavras e locuções que servem pa ra destacar de maneira especial o tópico de uma passagem, colocando-o em posição de foco: quan to a, a respeito de, no que se refere a; ser Sn que X, é que, até, mesmo, o próprio, etc. A progressão foi considerada como condi ção de coerência na análise das redações. Para lelamente, foi observado se essa condição foi bem expressa, através dos recursos disponíveis no português, de maneira a dar ao texto mais coesão. 2.3. A não-contradição O terceiro requisito proposto por Charollcs (1978) é o da não-contradição, que deve ser observado tanto no âmbito interno quanto no 24 âm bito das relações do texto com o mundo a que se refere. Para se r in ternam ente coerente, o texto p re cisa, cm p r im eiro lugar, respeitar princípios ló gicos elem entares. Não pode, por exemplo, afir m ar A e o con trá r io dc A. Suas ocorrências não podem se contradizer, têm que se r compatíveis entre si, não só no que trazem explícito como tam bém no que delas se pode concluir por pressupo sição ou inferência. Por ou tro lado, para ser coerente, o texto não pode contradizer o mundo a que se refere. O m un do textual tem que scr compatível com o mundo que o texto representa. Assim, um discurso refe rente ao m undo real não pode deixar de conside ra r algumas pressuposições básicas que integram a m an e ira com um de pensar esse mundo c que subjazem à com unicação textual: as causas têm efeitos; os objetos têm identidade, peso e massa; dois corpos não podem ocupar, ao mesmo tem po, o m esm o lugar no espaço, etc. A exigência de não-contradição se aplica não só ao plano conceituai (da coerência), mas tam bém ao plano da expressão (da coesão). Por exem plo, a través do em prego dos tempos e aspectos verbais, o texto ins taura um sis tem a próprio de situação dos fatos a que alude, tomando por re ferência o mom ento da com unicação ou um mo m ento de term inado pelo texto mesmo. A moda lidade é o u tro elemento do s is tem a de funciona m ento discursivo. Trata-se da a t i tude do p rodu to r tanto em relação ao conteúdo proposicional c ao valor de verdade dc seu enunciado quanto em relação ao próprio recebedor. Essa atitude se 25 manifesta lingüisticamcnte pelo emprego dos mo dos verbais e de itens específicos, com o os ver bos modais, alguns advérb ios (talvez, certam en te) c os cham ados verbos ilocutórios (achar, acei tar, considerar, admitir, exigir, deplorar, declarar, negar, etc.). As contradições relativas a esses dois elementos do que Charolles (1978: 23) chama “re gime enuncia tivo", a menos que intencionais e vi sando a efeitos estilísticos, podem causa r em ba raço ou es tranheza ao reccbedor. A configuração do m undo textual pode se ex p ressa r lingüisticamente a través do emprego de verbos, expressões e construções “criadores de m u n d o ”, no dizer de Charolles (1978: 28): sonhar, imaginar, pensar, acreditar, gostar (no condicio nal, gostaria que\, no caso de, na lupotese de; se ja..., (az. de conta que, era um a vez. etc. A não ser que objetivando efeitos intencionais específicos, o emprego contraditório desses recursos também pode aca rre ta r d is tú rb ios à in te rp re tação do dis curso, na m edida em que co n tra r ia as expectati vas do reccbedor. Um problem a concernen te à exigência da não-contradição, ao qual Charolles (1978) não faz referência, consiste no que eu chamei de constra- dição Icxico-semántica. Trata-se de inadequação muito 1 requente nas redações escolares e que diz respeito ao uso do vocabulário: muitas vezes o sig- nificante em pregado não condiz com o significa do pretendido ou cabível no texto. Tal con trad i ção resulta do desconhecimento, por parle do usuário , do vocábulo a que recorreu . Um exem plo elucidativo é o de um vestibulando que recla mava, em sua redação, contra "o desvelo das auto- 26 i idades pelo menor abandonado". Casos desse ti po situam-se, a meu ver, na região limítrofe cn- t re a coesão e a coerência, porque, embora sc ma nifestem no nível da expressão, concernem à vei- culação de conceitos e têm implicações sobre a e s t ru tu ra lógico-semântica do texto. Nas redações do corpus, a não-contradição in terna e externa foi tomada como condição dc coe rência. Quanto à coesão, foi verificado se os re cursos lingüísticos empregados serviram ao bom funcionamento discursivo, tornando o todo tex tual livre de contradição. 2.4. A articulação O quarto e último requisito de coerência pro posto por Charollcs (1978) é a relação, que eu cha mo aqui de articulação. O autor, considerando va go o te rm o relação, p ro c u ra delimitá-lo, rebatizando-o dc congruência e estabelecendo que dois latos serão congruentes quando um for uma causa, condição ou conseqüência pertinente do outro. Neste trabalho, o termo articulação não co brirá apenas essas três relações. Com ele estarei me referindo á m aneira como os fatos e concei tos apresentados no texto se encadeiam, como se organizam, que papéis exercem uns com relação aos outros, que valores assum em uns em relação aos outros. Avaliar a articulação das idéias de um texto, para mim, significa verificar se elas têm a ver umas com as outras e que tipo específico de relação sc estabelece entre elas (além das rc- 27 lações de con t inu idade , p ro g ressão e não- con trad içâo , já cobertas pelas o u tra s condições de coerência). São dois aspectos a se rem verifi cados: a presença e a pertinência das relações en tre os fatose conceitos ap resen tados . O texto po de ap resen ta r fatos c conceitos rclacionáveis sem es tab e lece r ligações en tre eles, ou pode es tabe lecer relações não per t inen tes e n t re os fatos e conceitos que den o ta (porque não são rc lacioná veis, ou porque se re lac ionam de o u tro modo). E ssas relações, como vimos, não precisam ser necessariam ente explicitadas por mecanismos lingüísticos formais. Podem perfe itam ente se es tabelecer ap en as no plano lógico-scmântico- conceitual (o da coerência). Entre tan to , há recur sos específicos para sua expressão formal, no pla no da coesão. E n tre eles podem-sc m en c io n a r os mecanismos de junção (tradicionalm ente cham a dos de conjunção), os articuladores lógicos do dis cu rso (expressões como por exem plo, dessa for ma, por outro lado, etc.) e os recu rsos lingüísti cos que perm item estabelecer relações temporais en tre os e lem entos do texto (a o rdem linear de ap resen tação desses elementos, as conjunções tem pora is , a lguns advérbios e expressões de va lor adverbial, os num era is o rd ina is e a lguns ad jetivos, com o anterior, posterior, subseqüente). Na análise das redações foram avaliadas a presença e a pertinência da articulação como con dição de coerência e foi observado se, q u an d o ne cessários, os m ecanism os lingüísticos que expli c itam as relações en tre os e lem entos tex tua is cs- tavam presen tes e foram ad eq u ad am en te em pre gados, con tr ibu indo para a coesão do discurso. 28 2.5. P a ra e n c e r r a r Aceita a proposta de Charolles (1978) — com a ressalva feita quanto à sua não-uni versai idade —, avaliar a coerência de um texto denotativo, es crito e formal, será verificar se, no plano lógico-scmântico-cognitivo, ele tem continuidade e progressão, não se contradiz nem contradiz o mundo a que se refere e apresenta os fatos e con ceitos a que alude relacionados de acordo com as relações geralmente reconhecidas entre eles no mundo referido no texto. Avaliar a coesão se rá verificar se os mecanismos lingüísticos utili zados no texto servem à manifestação da conti nuidade, da progressão, da não-contradição e da articulação. Dado o grande número de marcadores lin güísticos de coesão e dada a tremenda complexi dade que envolveria a tarefa de formular restri ções pertinentes e exaustivas com relação ao em prego de cada um, meu julgamento das redações, sobretudo neste particular, vai se basear na in tuição e no bom senso. Será considerada infra ção textual a ocorrência que acarre ta r em bara ços à leitura, tendo em mente as expectativas re sultantes do tipo de texto analisado. A esse propósito, é bom lembrar o papel de terminante dos fatores pragmáticos na comuni cação efetiva. 0 contexto e a imagem do interlo cutor podem autorizar lacunas na configuração textual não possíveis noutras circunstâncias. É relevante o fato de o produtor contar com os co nhecimentos prévios do recebedor e com sua ca pacidade de pressuposição e inferência. 29 Daí advem uma conseqüência importante pa ra o trabalho com redação na escola. São freqüen tes, por exemplo, os casos de aparente incoerên cia resultante da não-explicitação de fatos ou de relações entre fatos do mundo representado no texto. Se o professor consegue reconhecer esse mundo e refazer os cios ausentes, percebe o sen tido do texto e pode apontar ao aluno o problema e a forma de saná-lo. Esse tipo dc intervenção, de ve ficar claro, não obedece a imperativos cogniti vos, uma vez que o sentido do texto foi captado, mas obedece ao que Charolles (1978: 37) chama de " razões ílc deonlologia discursiva superior”. Em outras palavras, o que funcionaria na comunica ção real c vetado na redação escolar em virtude da preocupação do professor de ensinar a redigir. Charolles (1978: 37) tem essa pr eocupação co mo legítima e a justifica pelo fato de o professor considerar que nem todo leitor será capaz de reali zar a mesma operação por ele efetuada para recu perar o sentido do texto e julgar-se, então, na obri gação de apontar o problema ao aluno, por enten der que todo discurso, se não for imediatamente coerente e coeso, deve, pelo menos, ter o sentido facilmente recobrável por qualquer recebedor. Pa ra mim, tal atitude será pertinente sc explicitada pelo professor e se levar em conta, também, o tipo textual e as intenções do aluno produtor do texto. 3. Critérios para a análise da informatividade A informatividade é entendida pelos estudio sos como a capacidade do texto dc acrescentar ao 30 conhecimento do recebedor informações novas e inesperadas. Neste trabalho, esse termo c en tendido como a capacidade que tem um texto de efetivamente inform ar seu recebedor. Não c to mado apenas como sinônimo de originalidade, m as ganha o u tra acepção. Por um lado, no que tange à necessidade de imprevisibilidade, o conceito foi ampliado e pas sou a abranger o aspecto mais geral do fator in- lertextualidade, na medida em que se tomou co mo informação conhecida e previsível a voz do senso comum, da ideologia dominante, presente nas redações estudadas. Por ou tro lado, o termo passou a recobrir a exigência do que se chamou suficiência de dados, na medida em que se consi derou que, para ser informativo, o texto, além de se m ostra r relativamente imprevisível, precisa apresen tar todos os elementos necessários à sua compreensão, explícitos ou inferíveis das infor mações explícitas. Para avaliar a imprevisibilidade, Beaugran- de e Dressler (1978: 140-141) propõem uma esca la de três ordens, aplicável (e efetivamente apli cada) pelo falante comum. Na primeira ordem os autores enquadram as ocorrências de elevada previsibilidade e, conseqüentemente, baixa infor matividade, como os clichês e estereótipos, as fra ses feitas, as afirmações sobre o óbvio. Os textos que não ultrapassam esse patamar, ainda que do tados de coerência e coesão, resultam pragmati- camente ineficientes, porque desprovidos de in teresse. Na segunda ordem ficam as ocorrências em que o original c o previsível se equilibram, an gariando boa aceitabilidade, porquanto apresen 31 tam novidade sem provocar es tranhe/a . São dc terceira ordem as ocorrências que, aparentem en te pelo menos, não figuram no leque de a l te rna tivas possíveis c que, por isso mesmo, desorien tam, ainda que temporariamente, o reccbedor. Postulam os au tores que, na comunicação efeti va, o processam ento dos textos se faz através do alçamento para a segunda ordem das ocorrências de baixa informatividade c do rebaixamento, tam bém para essa ordem mediana, daquelas que pro vocam estranheza, de modo a atribuir sentido tan to a um as quan to a outras . Assim, no todo tex tual, o óbvio ganhará razão de ser c o inusitado se explicará, passando a ter, um e outro, rendi mento eficaz dentro do texto. O discurso em que esse processamento, cm um a ou outra direção, não for possível, tenderá a se r rejeitado: no p r i meiro caso, porque sc m ostra rá pouco informa tivo e desinteressante; no segundo caso, porque se m ostra rá difícil de ser entendido, impene trável. De outra parte, avaliar a suficiência dc dados é examinar sc o texto fornece ao reccbedor os ele mentos indispensáveis a um a in terpretação que corresponda ás intenções do produtor, sem se mostrar, por isso, redundante ou rebarbativo. Os dados cuja explicitação é necessária são aqueles que não podem ser tomados como dc domínio prévio do recebedor nem podem ser deduzidos a partir dos conhecimentos que o texto ativa. Assim, avaliar a informatividade significa, para mim, m ed ir o sucesso do texto em levar co nhecimento ao recebedor, configurando-se como ato de comunicação efetivo. Esse sucesso depen- 32 de, em parte, da capacidade do discurso de acres cen ta r alguma coisa à experiência do recebedor, 1 1 0 plano conceituai ou no plano da expressão (im- previsibilidade). De ou tra parte, resu lta do equi líbrio en tre o que o texto oferece e o que confia ã partic ipação de quem o in terpreta (suficiência de dados). Um texto informativo pode não ser de pro cessam ento imediato e dem andar algum esforço de interpretação. Em contrapart ida , é um texto que se mostra apto a engajar o recebedor, a con qu is ta r a adesão dele, viabilizando, assim, o es tabelecimento dc uma relação comunicativa ver dadeira. Um texto com baixo poder informativo, que não fornccc os elementos indispensáveis a uma in terpretação livre dc ambigüidades, ou que se limita a repetir coisas que nada somam à expe riência do recebedor, tem corno efeito desorientá- lo ou irritá-lo, ou simplesmente não a lcançar sua atenção. Tende a se r rejeitado. Mesmo que não chegue a ser tomado como não-texto, é avaliado como produção de má qualidade, com a qual não vale a pena perder tempo. Em suma, mesmo pa ra textos coerentes e coesos, um baixo poder in formativo tem como correlata uma baixa eficiên cia pragmática. 4. A subjetividade da avaliação Segundo Hallidaye Hasan(1978: 25), "texture is really a more-or-less affair" A mim parece que a natureza do texto é melhor compreendida se se 33 abre mão do rigor c da exatidão tecnicista e se dá espaço p a ra a intuição e o bom senso. Os c r i té r io s adotados neste trabalho p a ra o julgamento das redações são, inegavelmente, flui dos c subjetivos. Não vejo como fugir disso. A coe rência, a coesão e a informatividade estão em es treita dependência dos conhecimentos par t i lha dos pelos interlocutores. O que faz sentido para um recebedor pode parecer absurdo para outro; o nexo en t re os elementos textuais pode ser fa cilmente percebido por um, através das relações lógico-semàntico-cognitivas implícitas, e pe rm a necer irrecobrável para outro, sc não for expresso lingüisticamente; o que c “ba t ido” para um po de ser abso lu ta novidade para outro. Em ou tras palavras, o que estou dizendo é que a textualidade de uma produção lingüística qualquer depende, em grande parte, do recebe dor (seus conhecim entos prévios, sua capacida de dc pressuposição e inferência, sua adesão ao discurso) e do contexto (o que é texto num a s i tua ção pode não o ser em outra, e vice-versa). Como, então, fixar cr i té r ios rígidos e objetivos p a ra de m arcar os limites da textual idade: daqui p a ra lá, texto; daqui p a ra cá, não-texto? (!) T en ta r fazê-lo seria ignorar ou falsear as relações que de fato se estabelecem no processo de interação com u nicativa. Por isso neste trabalho não foi ado tada qual quer tabela objetiva para m edir a textualidade das redações do corpus. O julgamento, ainda que balizado pelos critérios já definidos, passou pe la subjetividade de minha percepção com o leito ra. Não há como evitar. Não vejo com o ca lcu lar 34 objetivam ente a d im ensão da gravidade de um a talha relativa, por exemplo, à condição de não contradição com o mundo real. Fazé-lo correspon deria a pretender a existência dc verdades inques tionáveis das quais se pudesse m ed ir num erica mente o afastamento; significaria adm itir um a única possibilidade de leitura do real; seria igno rar a participação do recebedor na construção do sentido do texto; seria desprezar todos os elemen tos pragmáticos que interferem decisivamente na textualidade. A necessidade de p reestabelecer parâm etros para o r ien ta r a avaliação técnica de um texto po de ser a tend ida através da definição de critérios qualitativos (e não quantitativos) que busquem cap ta r e s is tem atizar as condições na tu ra is de aceitabilidade dos discursos. Assim, acred ito que um ju lgam ento que p re tenda respe i ta r a natureza do objeto avaliado e percebê-lo na sua to ta lidade pode se pe rgun ta r o seguinte; d ada a situação com unicativa, as ca racterís t icas e as disposições dos interlocutores e o tipo textual efetivo, essa produção lingüísti ca se m ostra aceitável? Tem continuidade? Apre senta progressão? Mostra-se não-contraditória e bem ar t icu lada? Faz uso adequado dos recursos coesivos que servem à expressão dessas qualida des? É suficientemente c lara e explícita na a p re sentação das inform ações? Com porta um m íni mo de novidade que possibilite reconhecê-la co mo m anifestação personalizada e capaz dc a t ra i r a atenção dc um recebedor médio? As respostas a essas p erg u n tas não são redu- tíveis à exatidão de valores quantitativos. Antes, 35 passam inapelavelmente pela intuição e o bom senso, aplicados com na tu ra l idade pelo falante com um na com unicação cotidiana. São questões que têm a ver com a competência textual, que de te rm ina a capacidade das pessoas dc produzir e in te rp re ta r textos. A preocupação dc julgar com objetividade as redações escolares tem resu ltado cm esquem as de correção e a tr ibu ição de notas através dos quais se t i ram pontos por desrespeito às regras do dialeto padrão ou por desobediência às con venções relativas ao uso da escrita , como a o r to grafia c a pontuação. Q uer dizer: o ju lgam ento acaba privilegiando os aspectos mais superficiais do texto escrito, que nada têm a ver com sua es sência, isto é, sua textualidade, mas que são os únicos suscetíveis dc mensuração objetiva. A mim parece que o ensino de redação só te ria a ganhar se se p rocurasse respe i ta r na cscola o que acon tece na vida. A interação com unicativa cie verda de é um processo essencialm ente intersubjetivo: são pessoas que p roduzem /in te rp re tam textos, e e n t ram nesse jogo com toda a sua individua lidade. 5. A necessidade de um a avaliação global Um texto é um a unidade dc sentido, na qual os elementos significam uns em relação aos ou tros e em relação ao todo. O significado de cada um isolado pode não coincidir com o sentido que assum e cm relação ao conjunto, ou pode não scr relevante para esse sentido global. Decorre que 36 as ocorrências dc um texto não devem ser anali sadas per si, mas o texto deve ser percebido c in terpre tado integralmente, cada elemento sendo avaliado em função do todo. Por isso, os critérios cie julgamento aqui definidos conduzem a um exa me global do texto. No plano da coerência, não há como avaliar fragmentos: a continuidade, a progressão, a não- contradição e a articulação só podem ser perce bidas quando se analisa a redação por inteiro, examinando-se as relações do texto com seu te ma e as relações das par tes entre si e com o to do. O não-cumprimento de uma dessas condições num a determ inada passagem vai com prom eter todo o conjunto. A ordem, aqui, é macrocs- trutural. O plano da coesão, linear, m icroestrutural, oferece possibilidade cie percepção individuali zada das ocorrências: um pronome anafórico em pregado de maneira ambígua, uma conjunção que estabelece relações incabíveis, etc. Entretanto, o que importa é considerar o efeito dessas ocorrên cias no conjunto, é avaliar se os recursos lingüís ticos utilizados servem ou não à conexão das idéias, sc o texto como um todo se mostra coeso ou desconexo. Não interessa, também, ju lgar a informati vidade de cada seqüência, examinando, como quer a teoria física da informação, a probabili dade de ocorrência dos seus integrantes. O que conta é verificar se, em sua realização global, o texto equilibrou satisfatoriamente o explícito e o implícito, o previsível e o inesperado, de modo a seconstituir num todo informativo c atraente. 37 Além da inconveniência de uma análise frag mentária de cada componente textual considera do, há a Improcedência de um exame dos três co mo fatores absolutamente estanques. O que se de preende da conceituaçào estabelecida e dos cri térios esboçados é que eles são faces imbricadas de mesmo corpo. O que afeta um deles, em ge ral, tem implicação sobre os outros também. Sua separação só se obtém artificialmente, para aten der á necessidade dc análise (“dividir para domi nar"). Vejamos: a coesão é a manifestação lingüís tica da coerência e, assim, a ela está inquestio navelmente associada; a informatividade se aplica tanto sobre uma quanto sobre a outra e, mais que isso, localizada no terreno cognitivo, guarda pon tos de interseção com a coerência. Há problemas de difícil delimitação que se espraiam por mais de uma área. Por exemplo: até que ponto um a la cuna na configuração conceituai do texto é pro blema de informatividade (insuficiência de dados) ou de coerência (falta de articulação)? Ou. ainda, em que medida a rup tu ra com modelos cogniti vos usuais representa ganho para a informativi dade (imprevisibilidade) ou perda para a coerên cia (contradição entre o mundo textual e o m un do real)? Problemas semelhantes podem ser apon tados também no que respeita à coesão: qual o limite entre um arran jo sintático inusitado, que favorece a originalidade, e uma infração, que pre judica a coesão textual? Em razão do que foi apresentado, o que me preocupou na análise das redações foi identifi car com a maior nitidez possível os problemas 38 existentes, com a finalidade de tentar comprccn- der as reais dificuldades que eles representam. Assim, foi mais importante para mim perccbcr todas as ramificações e implicações de um mes mo problema do que buscar, artificialmente, isolá-lo do conjunto em que figura para identificá- lo c computá-lo como ocorrência individual. O ob jetivo foi perceber cada texto como um todo c che gar a um julgamento mais legítimo, mais próxi mo do que se passa dc fato no proccsso comuni cativo. Um julgamento que não se funda em pa râmetros rígidos, mas na realidade que o texto propõe; porem, um julgamento com inevitável margem dc subjetividade. 39 SEGUNDA PARTE RELATO DE UMA ANALISE CAPITULO 3 AS C O N D IÇ Õ E S DE PRODUÇÃO Antes de passar à análise da coerência, coe são e informatividade das redações estudadas, é preciso deter a atenção sobre as condições de pro dução desses discursos, o que significa avaliar o papel dos fatores pragmáticos (situacionalidade, intencional idade e aceitabilidade) sobre a textua lidade desses textos específicos. I. As contingências histórico-políticas As redações que compõem o corpus foram produzidas no vestibular/UFMG realizado em ja neiro de 1983. Nessa época o Brasil vivia o início do proces so de redemocratização. No âmbito federal, ea- 43 minhava para o fim o último governo de um a fa se de 21 anos de au to ri ta r ism o. No âm bito es ta dual, tom avam posse os governadores eleitos di re tam ente em novem bro de 1982, depois de lon go período cm que esses cargos e ram preenchi dos por escolha pessoal e exclusiva do prim eiro m anda tá r io do país. A anistia política fora con quistada, já se p renunciava a Nova República e a cam panha pelas eleições diretas para presiden te começava a g an h a r as ruas. Economicam ente, no entanto , o Brasil en frentava u m a crise cujos reflexos mais dolorosos e ram a recessão e o desemprego. Essas dificul dades não e ram exclusivamente nacionais. Afe tavam, naquele momento, até os Estados Unidos c os países ricos da Europa. Aqui, a s i tuação sc mostrava particularmente grave c, em função dis so, caracterizava-se com nitidez um processo de ac irram en to da violência, sobre tudo nos centros urbanos. A população via-se, então, dup lam ente ameaçada, pelo desemprego e pela insegurança. Todos esses co m p o n en te s do con tex to histórico-político-social são im portan tes porque integram o conjunto de conhecim entos e vivên cias par ti lhados pelos p rodu to res dos textos, os candidatos ao vestibular, e pelos seus recebedo- res compulsórios, os examinadores. Esses dados assum em p a r t icu la r relevância quando se sabe que o tema proposto para a redação foi violên cia social, assun to d ire tam en te dependente des sas contingências históricas. Não seria possível um a avaliação consistente da coerência ex terna e da inform atividade das redações sem levar em conta esse quadro político-cconômico-social. 44 2. O c o n te x to im ed ia to : o v e s t ib u la r As redações analisadas fizeram parte da pro va de Língua Portuguesa e L itera tura Brasileira, aplicada na segunda e tapa do vestibular, de ca rá te r classificatório. Todas as provas dessa e ta pa foram compostas de questões abertas; as ques tões de múltipla escolha se lim itaram à primei ra etapa, eliminatória. É fundam ental o fato de se t ra ta r de prova de vestibular, situação fortemente impregnada de carga ideológica, que lhe a tr ibui o papel mágico dc porta dc felicidade: u l t rap assa r esse umbral significa ob ter garantia absoluta de sucesso pro fissional e financeiro. O exame ganhou a dimen são de um rito de passagem, através do qual o jo vem adolescente atinge a categoria de adulto res ponsável, socialmente integrado e bem-sucedido. Em função desse mito, o concurso se realiza sob grande tensão c é, em geral, muito competi tivo. Em 1983, na UFMG, foram selecionados pa ra a segunda etapa, para todos os cursos, dois pre tendentes para cada vaga. N um a situação como essa, o candidato tem consciência de que seu de sempenho c decisivo e realiza um grande esfor ço dc auto-superação. Não bas ta fazer boas pro vas, é preciso fazer provas m elhores que as dos concorrentes, pois a segunda etapa é classifi- catória. Outra conseqüência do mito em que se trans formou o vestibular é a ncurotizante preparação a que se submetem os candidatos. A realidade atual é que praticamente todo o ensino, desde o 1? grau, se orienta pela filosofia adm itida c pelo 45 modelo de provas adotado no vestibular. No 2? grau a situação se agrava e o último ano imedia tamente anterior ao exame é, de modo geral, de dicado a ele de maneira intensa e exclusiva. Há, então, nos colégios e nos cursinhos preparatórios, a preocupação de, além de dotar os alunos dos co nhecimentos e habilidades necessários a quem se destina a um curso universitário, fornecer-lhes os truques c macetes considerados indispensáveis a um bom êxito nas provas. No caso em loco, a preparação específica se orienta por parâmetros previamente delimitados. Sabe-se que, além da redação, o candidato deve rá responder a questões discursivas nas quais o seu desempenho lingüístico, em termos de "cor reção gramatical", também estará em julgamen to. Isso significa que, normalmente, os competi dores se submetem a um intenso treinamento pa ra obter o domínio da língua padrão na modali dade escrita. O próprio programa do concurso ves tibular estabelece os critérios de avaliação e, quan to à redação, estipula que tipo de texto os candi datos deverão elaborar: O que sc espera em termos de reda- çào são habilidades de exposição de idéias e de argumentação em tomo dc de terminado problema. O tema será, pois, de tal natureza que conduza o candida to a demonstrar tais habilidades. Revela desempenho satisTatório do candidato em expressão escrita um tex to com as seguintes características: — organização adequada cm torno de uma idéia central; — estruturação das idéias de tal ma neira que se identifique uma introdução. um desenvolvimento c uma conclusão; 46 — divisão adequada das idéias cm parágrafos, c, em cada parágrafo, divisão adequada das idéias cm períodos; — ordenação lógica e coerente das idéias, com uso apropriado das partículas de transição e palavra de referência; — expressão das idéias com clareza e concisão, sem pormenores ex cessivos, redundâncias, palavras e expressões desnecessárias; — uso de vocabulário exato, preciso e adequado; — uso conveniente dos processos de coordenação e da subordinação de idéias; — adequação da modalidade de lín gua usada ao tratamento escolhi do para o tema; — uso adequado e correto dos sinais de pontuação; — uso correto das estruturas da lín gua escrita (morfologia e sintaxe); — correção ortográfica. (MEC/UFMG. Normas gerais. Pro gramas das provas de Língua Portugue sa e Literatura Brasileira íl ? e 2? etapas). Guia dc. inscrição do vestibular 1983, p. 7) Quanto à relação entre intencional idade e si- tuacionalidade, o que se pode supor é que o forte desejo de ser aprovado e a competitividade do con curso levarão o vestibulando a se empenhar para produzir um texto de acordo c o n as exigências do programa. 3. Os produtores dos textos A p a r t i r de um Questionário de Informações Sócio-econômicas elaborado pelo MEC e aplicado 47 a todos os inscritos no vestibular UFMG/1983, foi possível delinear o perfil da amostra de cem can didatos ao curso de Letras cujas redações anali sei. Seus integrantes, em sua maioria indivíduos com idade entre 17 e 22 anos, trabalhavam e con tribuíam para a renda familiar na ocasião do con curso. A maior parte deles provém de famílias em que o pai e a mãe têm nível médio de escolarida de, o pai é profissional dc nível médio c a mãe é dona-de-casa. No 2? grau, a maioria deles estudou em escola particular, duran te o dia, fazendo cur so regular (c não supletivo ou madureza), e não freqüentou cursinho. Foi possível também confrontar esse perfil com o do universo dos concorrentes à UFMG na segunda etapa do vestibular (6.914 candidatos) e constatar que os dois grupos apresentavam carac terísticas sócio-econômicas equivalentes, à exce ção de dois fatores: a participação na renda fami liar e a freqüência a cursinho. A maioria dos ves- tibulandos UFMG/1983 (segunda etapa) não traba lhava na época do exame e freqüentou algum cur so pré-vestibular. As circunstâncias específicas do vestibular co locavam cm situação equivalente os produtores dos textos analisados (bem como todo o conjunto de candidatos que chegaram a fazer a redação). Todos eles já haviam concluído o 2? grau e, no ves tibular, já haviam sido aprovados nas provas da etapa eliminatória, ou seja, já haviam passado por uma dupla seleção. A particularidade de os integrantes da amos tra serem concorrentes ao curso de Letras susci ta a hipótese de que eles tenham em comum o pen dor e o gosto pelo tra to com a linguagem, carac 48 te rís tica que os distinguiria dos demais candida tos. Tal hipótese não encontrou respaldo num in d icador quantitativo levantado: as notas das re dações. A questão de redação valeu 12 (doze) pontos, sendo a nota média, portanto, 6 (seis). Nos dois grupos, a média aritmética das notas ficou em tor no de 6 (seis) e a moda, também para os dois g ru pos, foi 6 (seis). Os pontos aqui levantados para a caracteri zação da am ostra serão retomados na conclusão, porque eles é que dão a medida da sua represen- tatividade c, por conseguinte, do alcance das pos síveis generalizações a serem postuladas. 4. Implicações do contexto pragmático Como já disse, as circunstâncias históricas do momento de produção das redações têm particu lar im portância no caso em exame, em razão do assunto proposto como tema, d iretam ente vincu lado à realidade circundante. Tal fato determinou que, afinal, o material cognitivo com que os ves- tibulandos trabalharam em seus textos fosse fun dam entalm ente o mesmo, o que não ocorreria se a proposta dc redação ensejasse a criação de um texto com base cm vivências pessoais. Outros elementos condicionantcs decorrem do fato de os textos integrarem uma prova de ves tibular. A situação comunicativa é absolutam en te artificial. O produtor do texto não é dono do seu assunto, nem da forma do seu discurso. Vê- se na contingência de discorrer sobre o tema que lhe for imposto, nos moldes preestabelecidos pelo 49 program a do concurso. O recebedor é ignorado, porem compulsório. Não se trata de um a pessoa a quem o produtor queira dizer alguma coisa, mas, pelo contrário, trata-se de um desconhecido que, caneta vermelha em punho, poderá barrar-lhe a entrada na universidade. A relação que se estabe lece en tre os interlocutores, em razão dos luga res que ocupam, é uma relação de poder, em que o produtor se submete ao que ele imagina sei a vontade do recebedor. Esse jogo de representações mentais, no entanto, sc processa de form a distor cida, porque os protagonistas de lato não se co nhecem e se baseiam cm suposições estereotipa das sobre a figura do outro. Mais um artificialis- mo resulta do próprio objetivo do pretenso ato de comunicação. A intenção nào é dizer alguma coi sa, mas demonstrar que se tem o domínio de uma modalidade do código c. com isso, angaria r apro vação no concurso. Nesse caso, às vezes, pode ser mais conveniente se esconder do que se mostrar, dizer não o que realmente se teria a dizer, mas ape nas o dizível, o considerado adequado para a cir cunstância. Assim, os objetivos do produtor, as sociados àquilo que ele imagina ser a expectativa do recebedor, vão exigir um severo direcionamen to da situação no sentido da conquista da meta planejada. Noutros termos, intencional idade, acei tabilidade e situacionalidade vão se conjugar pa ra exigir a auto-superação do candidato com vis tas à produção de um texto o mais próximo pos sível do padrão considerado desejável. As contingências apontadas autorizam algu mas expectativas. O curso a que sc destinam os candidatos, sua prévia seleção e suposta cuidado sa preparação, a importância social c a competi- 50 lividade do curso conduzem à hipótese dc que ti re em mãos um elenco de produções lingüísticas com alto padrão de textualidade. Por outro lado, fatores correlatos levam a esperar baixo grau dc informatividade nas redações: todas elas inte gram a m esm a prova, tra tam do mesmo tema, proposto no mesmo momento. Foram elaboradas por pessoas sujeitas às mesmas condições histó ricas e culturais, pertencentes, em sua maioria, a m esm a classe social e à mesma faixa etária, su postamente com a mesma habilitação e aptidão, que provavelmente se subm eteram a uma prepa ração de tendência despersonali/an te e que pre sumivelmente procuraram cum prir as exigências do programa. Os fatores que sugerem a segunda hipótese pesaram mais que aqueles que dão origem à pri meira. De início, um indicador disso foi a d istri buição de freqüência das notas de redação, que revelou um a concentração em torno de 6 (seis), tanto para a amostra analisada quanto para o uni verso dos vestibulandos UFMG/1983 (segunda eta pa). A análise qualitativa das redações vai confir m ar essa suposição. SI C A P I T U L O 4 A C O E R Ê N C I A . A C O E S Ã O E A I N F O R M A T I V I D A D E : B R E V E E S T U D O Q U A N T I T A T I V O A análise quantitativa não constitui o foco dc interesse deste trabalho. Os núm eros que ap re sento rap idam ente aqui têm apenas a função de possibilitar uma visão panorâmica do que foi apu rado no exame do corpus e, assim, m arca r um ponto de pa r t id a para a análise qualitativa. Computando quantas redações apresentaram uma ou mais infrações a cada condição conside rada, obtive os resultados constantes da Tabela 1 a seguir. 53 TABELA 1 INFRAÇÕES AS CONDIÇÕES DC TEXTUALIDADE CONSIDERADAS Fatores Condições % de Redaçócs com Infração C ontinuidade 32 Progressão 30 Coerência Não-con trad ição in te rn a 33 externa 64 A rticulação presença 56 pertinência 56 C ontinuidade 60 Coesão P rogressão 12 \à o -c o n trad ição 51 A rticulação 36 Suficiência de dados 65 Inform atividade Im previsib ilidade 87 A Tabela 1 m o s tra que a in fo rm ativ idade foi o fa to r cm re lação ao qual houve m a io r núm ero dc redações com problem as: 87% de las fe riram a condição de imprevisibilidade e 65%, a de su fi ciência de dados. Em segundo lugar vem a coerência. Assina lo que os aspec tos que têm a ver com a o rgan iza ção conceituai in terna do texto, à exceçào da con dição de articu lação interna ("presença"), se apre sentam falhos num percen tual re la t ivam ente bai xo de redações (cm to rno dc 30%). J á as condi ções de não-contradição externa c dc pertinência da articulação estabelecida se m o s t ra ra m proble m áticas c m m ais da m etade dos textos. A coesão foi o fa to r que sc ap re se n to u defi ciente num percentual m en o r dc redações. O em prego dc recursos lingüísticos que deno tam a pro- 54 gr es são (a estruturação de frases e parágrafos em função das relações entre dado e novo e entre tó- d í c o e comentário, o uso de mecanismos de cria ção de foco) sc mostrou inadequado num percen- :ual pouco signif icativo de redações (12%). Os me canismos de junção e os articuladores do discur so, que servem à inter-relação das idéias do tex to, foram mal empregados em 36% das redações. O alto índice de redações com problemas quanto à condição de não-contradição (51%) se explica em função do grande núm ero de falhas na área léxico-semântica: em 43% das redações foram constatadas impropriedades vocabulares que configuravam contradição entre o significan- te empregado e o significado cabível. Em 8% fo ram encontrados problemas concernentes ao uso de tempos e modos verbais, que redundam em contradições no regime enunciativo do texto. Os recursos lingüísticos que expressam a continuidade tiveram utilização inadequada em 60% das redações. Esse percentual, em desacor do com os 32% de redações afetadas por proble mas de continuidade no plano da coerência, exi ge um esclarecimento. Esse desacordo significa que, em m uitos casos, a re tom ada de elementos era feita sem problemas no plano conceituai, mas se apresentava mal expressada na superfície do texto. Era possível perceber com nitidez que elemento estava sendo retomado, a retomada e ra pertinente, mas não havia, por exemplo, con cordância en tre o pronome e seu antecedente, ou entre o verbo e o sujeito elíptico. Os pronomes anafóricos e a elipse, aliás, foram os mecanis mos de expressão da continuidade que apare 55 ceram mal em pregados com m aior freqüência no cor pus. A T abe la 2 a segu ir re su m e e to rna de fácil v isualização o que foi dito nos ú lt im os p a rág ra fos a p ro p ó s i to do em prego dos recursos de coe são: TABELA 2 1 \ FRAÇÕES RELATIVAS AO EMPREGO ÜH RECURSOS COESIVOS Condiçóes M ecanismos de coesão % de Redações com Problemas Continuidade Pronom es anafóricos Elipse substitu ição por zero concordância com sujeito elíptico D eterm inação por artigo deíinido Recorrência lexical Substitu ição lexical 32 02 10 06 04 06 TOTAL 60 Progressão Relações en ire dado e novo Relações en tre tópico e com entário Mecanismos de criação dc foco 02 09 01 TOTAL 12 N'áo-contradiçáo Tempos e modos verbais Compat ibilidade léxico-semântica 08 43 TOTAL 51 Articulação Mecanismos der junção e articuladores 36 TOTAL 36 É de in te resse re ssa l ta r que, indiv idualm en te, os itens que se a p re se n ta ram problem áticos em m aior núm ero de redações foram: o em prego 56 do vocabulário (43% dos textos com casos de con tradição léxico-semântica); o uso de mecanismos de junção e articu ladores do discurso (36% dos textos com problemas); o uso de pronomes ana- (o ricos (32% das redações com problemas de falta de concordância, ambigüidade, etc.). Os outros itens constantes da Tabela mostram índices pou co ou nada significativos, o mais alto deles a tin gindo apenas 10%. Esse levantamento é impor tante como diagnóstico e sugere um a nova área de trabalho no cuidado com o aspecto formal da redação. 57 CAPÍTULO 5 A C O E R Ê N C I A . A C O E S Ã O E \ I \ TF O R M A T I V I D A D E : A N Á L I S E Q U A L I T A T I V A Neste estudo qualitativo pretendo demons t r a r quais foram os problemas constatados nos textos e que interpretação eles receberam. Para tanto, vou transcrever14 e analisar algumas re dações em que essas dificuldade aparecem bem caracterizadas e são representativas do que ocor reu com freqüência no corpus. A intenção é apresentar exemplos caracterís ticos de infração a cada condição de textualida- dc fixada. Como não foi possível encontrar tex tos cu jo único problema fosse uma falha bem de lineada com relação a uni determinado requisi to, decidi apresentar a análise integral da reda ção escolhida para ilustrar o não-cumprimento de cada condição, destacando as dificuldades eon- 59 cernentes à realização cio requisito em 1'oco, mas não ignorando as eventuais falhas relativas a ou tras condições. Posto que o corpus me oferecia mais de um texto com ocorrência típica e inte ressante de infração relativa a cada condição, ou me oferecia textos com manifestações diferentes do mesmo problema, julguei pertinen te traze r à m ostra mais de um a redação, em alguns casos. 1. Em foco: p roblem as relativos à coerência e à coesão 1.1. Falha na realização do requis ito de continuidade REDAÇÃO N? 41 O homem como fruto do meio O homem é produto do meio social cm que vive. Somos todos iguais e não nascemos com o destino traçado para fa zer o bem ou o mau. O desemprego, pode ser considera do a principal causa de tanta violência. A falta de condições do indivíduo em ali mentar a si próprio e sua família. Portanto é coerente dizer, mais em prego, menos criminalidade. Um empre go com salário, que no mínimo supris se o que é considerado de primeira ne cessidade, porque os sub-empregos, es ses, não resolvem o problema. Trabalho não seria a solução, mas teria que ser a primeira providência a ser tomada. 60 Existem vários outros fatores que influenciam no problema como por exemplo, a educação, a falta de carinho, essas crianças simplesmente nascem, como que por acaso, e são jogadas no mundo, tomando-se assim pessoas re voltadas c agressivas. A solução é alongo prazo, é cuidan do das crianças, mostrando a elas a es cala de valores que deve ser seguida. E isso vai depender de uma cons cientização de todos nós. A descontinuidade é f lagrante nesse texto, mas aparece aí associada à desarticulação. E não são esses os únicos problemas. Vejamos a análise. A e s t ru tu ra formal da redação corresponde á organização do texto dissertativo e atende, pois, às exigências do programa: um parágrafo in tro dutório, qua tro dc desenvolvimento e dois reser vados à conclusão. De início, um núm ero tão grande de parágrafos num texto relativamente pe queno faz suspe ita r de um a certa fragmentação. O título e a prim eira frase lançam uma idéia que não se rá mais re tom ada explicitam ente na redação e que só à custa de algum esforço do rc- cebedor pode ser relacionada com os fatos e con ceitos expostos. Não é imediataa com preensão de que ap on ta r o desemprego (...), a educação e a falta de carinho como responsáveis, respectiva mente, pela criminalidade e pela revolta e agres sividade das pessoas co rresponda a dem onstra r que o homem é fru to do meio. É difícil também, à prim eira leitura, descobrir em que c como a se gunda frase da introdução pode se ligar à primei ra. Na verdade, quem acred ita que o meio de te r mina a personalidade e o comportamento das pes 61 soas não pode scr fatalista, não pode acreditar em destino. Mas, no caso cm foco, essa relação tem que ser processada pelo leitor, o texto não lhe fornece sequer um a ajuda. E, mesmo depois dc algumas leituras, continua difícil para mim en tender o que tem a ver o fato de sermos todos iguais com a idéia dc que o hom em è produto do meio. Reconheço, então, até aqui, no plano da coe rência interna, falhas relativas à condição de con tinuidade e à de articulação. Considero que es ses problemas dizem respeito mais à coerência que à coesão, na medida em que não se resolve riam pelo simples acréscimo de um ou ou tro re curso coesivo. Para saná-los seria necessário ex plicitar conceitos c relações, elementos integran tes da m acroes tru tu ra lógico-semântico-cogniti- va, isto é, da coerência. Vêm a seguir, na redação, três parágrafos in terligados entre si, girando em torno da idéia dc que o desemprego é causador da violência. A rup tura entre a in trodução c esse trecho é chocante para o leitor, que, estupefato, se pergunta: que desemprego? que violência? o que tem isso a ver com o meio social, a igualdade entre os homens e a não-p redes ti nação? Aí, a descontinuidade se m ostra também no plano da coesão. Na expressão tanta violência tc- mos, ou um determinante endofórico sem cor re ferente, ou um determ inante exofórico. Não há meio dc recobrar, no texto, o seu antecedente. O intensificador remete, em prim eira instância, à situação específica de produção do texto (o tema proposto para a redação, que, afinal, não integra 62 o texto), e, em segunda instância, ao contexto his tórico do m omento (a exacerbação dc\ violcncia no Brasil). Mas não remete a nenhum elemento do próprio texto. Outro problema de coesão apare ce na frase seguinte, que pretende ser uma frase nominal, com predicado elíptico. Entretanto, es se recurso não foi bem aplicado, de modo que o que resulta p a ra o leitor é a impressão de incom- p le tude da sentença. A passagem para o terceiro parágrafo traz no vos tipos de problema. A afirm ação de que o de semprego é a principal causa de tanla violência é seguida imediatamente da conclusão de que mais emprego implica menos criminalidade. Ou seja, os valores dos termos da prim eira proposição sim plesmente foram invertidos. A equação foi m ult i plicada por ( 1): -em prego= + violência —>+emprcgo= -violência Nenhum argum ento foi apresentado para comprovar ou justificar a relação estabelecida en tre os dois latos. 0 raciocínio é circular, tautoló- gico, e constitui uma infração localizada à condi ção de progressão. Além disso, traz problemas tam bém à área da informalividade, com respeito à suficiência de dados e a imprevisibilidade. A idéia de que desemprego gera criminalidade é tão corriqueira, tão previsível, tão de todos, que o pro d u to r do texto a toma por verdade inquestioná vel, que dispensa comprovação. Observe-se que o emprego do articu lador lógico portanto não im pediu a falha na e s t ru tu ra conceituai. O ou tro parágrafo infringe a condição de não- contradição interna, na medida em que nega ser o trabalho a solução, depois de o texto ter apon 63 tado a falta de traba lho como a princ ipa l causa da violência. E ssa contradição decorre da não- explicitação de conceitos e relações (desarticula ção e insuficiência de dados): o texto n ào forne ce os elementos necessários para sc com preen der por que o trabalho nào seria solução e que pro videncias deveriam ser tomadas. O parágrafo seguinte trata de ou tra questão, cuja relação ind ire ta com o título e a in trodução tem que ser, como disse, mediada pelo recebedor. A continuidade é aí p rejudicada tam bém no ní vel da coesão, p o r duas ocorrências: a) a palavra problema, em pregada como pró-forma nominal, sem referente claro (problema = o homem ser I ru- to do meio?/problcma = violência?/problema incapacidade do indivíduo de sup rir suas necessi dades?); b) um pronome anafórico sem anteceden te expresso na superfíc ie textual (essas crianças). Alem disso, há um a ocorrência que configura con tradição léxico-semântica: educação e falia de ca rinho não podem ser tomadas equivalentem ente como fatores que influenciam no problema por que educação não é problema, devia ser solução... A conclusão do texto se aplica apenas ao pa rágrafo im ediatam ente an te r io r e não à integri dade da redação. Ou seja, as idéias lançadas na introdução e na prim eira parte do desenvolvimen to são esquecidas, não ganham seqüência, não são levadas a termo. Vê-se, então, que, nessa redação, o problem a da descontinuidade é m acroes tru tu - ral, perpassa todo o texto. Há ainda, na conclusão, falhas q u an to aos dois aspectos da informatividade. O u tra vez são lançadas idéias es tereo tipadas sem d iscussão 64 nem esclarecimentos. O leitor cuidadoso fica sem respostas: que escala cie valores? por que deve ser seg u id a ? o que se en tende por conscientização? com o c por que a solução depende da conscienti zação de todos nó s? Uma últim a observação: a redação 41, com problem as na realização da coerência, da coesão c da inform atividade que degradam seu padrão dc textualidade, não ap resen ta desvios significa tivos da norm a culta e t raz poucas falhas no to can te ã utilização do código escri to (ortografia e pontuação). 1.2. Falha na realização do requ is i to de progressão REDAÇÃO N? 93 Violência Social A sociedade em desarmonia A cada dia que passa a violência so cial aumenta. A sociedade não consegue viver em harmonia. O que acontece com as pessoas, é que elas não conseguem chegar a um re sultado comum. A agressão, tanto físi ca, como moral é mais uma rotina de nossos dias. As constantes guerras, são imagens de total falta de conscientiza ção com a vida do próximo. A desarmonia entre os povos acar retará conseqüências trágicas sem qual quer benefício. As pessoas são egoístas só pensam em si mesmas, não se preo cupam com seu semelhante. No mundo dc hoje há poucas pessoas que lutam por dias melhores. 65 Sendo assim, a tendência é o aumen to da violência com resultados irrepará veis. As pessoas se afastam umas das ou tras a cada momento. Vivem assim em plena desarmonia. Esta redação exemplifica t ip icam ente o pro blem a da falta de progressão no âm b ito textual. A rigor, co m p o r ta um a única idéia, ex p ressa no títu lo e repe tida e p a ra f ra sead a em todos os pa rágrafos: a d esa rm on ia da sociedade atual. A in trodução declara que há violência e não h á harm onia . O pr im eiro p a rág ra fo do que de veria se r o desenvolvim ento p a ra f ra se ia a de c la ração de que não há h a rm o n ia (as pessoas não conseguem chegar a u m resultado com um ) e a p re se n ta exem plos de violência (a agressão tanto física com o moral e as constantes guer ras). O p a rág ra fo seguinte re tom a a q u es tão da desarm onia , p a ra dizer que ela acarretará con seqüências trágicas sem qualquer benefício, mas não esc larece q ua is são essas conseqüênc ias ou esses benefícios. Ê re tom ado tam bém um a rg u m ento lançado no parág rafo a n te r io r e que se m o s t ra como ca u sa ou explicação para a violên cia e a desarm onia : as pessoas são egoístas (...), não se preocupam com o sem elhante (...) lu tam por dias melhores. Daí o p ro d u to r do texto in fere que a violência vai au m en ta r , com resul tados irreparáveis ( = conseqüências trágicas) c que as pessoas vivem em plena desarmonia. To do o con teúdo sem ântico dessa redação pode se r expresso n u m a frase: na sociedade atual há violência e desarm onia , porque as pessoas são egoístas. 66 Alem de se rep e t i r in te rn am en te , as poucas idéias que o tex to traz não são mais que rep e l i dos e d esgas tados lugares-com uns. E ai tam bém apa rece , com o c o r re la ta do em p reg o de clichê, a au sên c ia de reflexão so b re o p rob lem a, a não- apresen tação de explicação ou esclarecim ento so bre as a f irm ações feitas, o que im pede o leitor de ir um m il ím e tro a lém das dec la rações s u p e r ficiais e pouco significativas do texto. 1 lã um a sé rie do que Pécora (1983: 77) ch a m a de “vácuos se mânticos", à e sp e ra de significação: v ive re m har m o n ia , resultado c o m u m , falta de conscien tiza ção, conseqüências trágicas, benefício, dias m elho res, resultados irreparáveis. A redação fere, assim, as condições de sufic iência de dados e de impre- visibilidade. Do ponto de v is ta sem ân tico e cog nitivo, esse texto não a p re s e n ta e lem entos que ju s t if iq u em su a existência. No plano da expressão , a redação se com põe de poucas frases, cu r ta s , todas elas na o rd em di reta, independentes ou coo rdenadas e n t re si. To das as p roposições são co locadas no m esm o p la no, a ss inde t icam en te , não há en tre e las seq u e r um a relação de subordinação . São usados apenas dois a r t icu lad o res , quase iguais, com o m esm o sen t id o c a m e sm a função de in t ro d u z ir as p re tensas conclusões — sendo assim e assim. N ão há nada que se p o ssa c h a m a r de infração, m as a es- t r u lu r a in form acional, r e c u rso de coesão re la t i vo às técnicas de a r r a n jo das in form ações segun do sua novidade ou relevância , é m onótona, p o r que repete se m p re o e sq u em a mais com um , não m arcado , com exceção ap e n a s da p r im e ira f rase do segundo paictgrafo, em que se em p reg a um 67 m ecanism o c r ia d o r de foco (o que acontece... e... que). Os períodos cu r to s e não ligados p o r conec tores resultam num texto fragmentado, cujas fra ses não se engatam . As relações dc sentido não progridem , com o dir ia M arcuschi (1983), não se desenvolvem, pois o único vínculo en t re as p ro posições é a re ite ração lexical pura c sim ples ou a paráfrase. Neste texto, a fragilidade coesiva es pelha as falhas na coerência e na informatividade. Entre tan to , a redação é certinha, cum pre com as exigências do p rogram a do concurso. Exi be um a introdução, dois parágrafos de "desen volvimento" e um a pseudoconclusão, devidamen te in troduzida por um sendo assim. Não há des vios da morfo-sintaxe padrão, a ortografia oficial é respeitada, os únicos e r ro s concernem à pon tuação: duas vírgulas que sobram e uma que falta. 1.3. Falha na realização do requ is i to de nào-contradição REDAÇÃO NV 49 Violência Social A violência social tem acentuado no decorrer dos tempos, devido a vários fa tores como: o desemprego, o analfabe tismo c* a discriminação social. A primeira causa que conduz vários indivíduos a violência é o desemprego, constante cm nossos dias e que sem te rem condição de trabalho, ficam angus tiados, deprimidos e partem pai a o as salto, seqüestro, com armas, ferindo 68 homens inocentes e vítimas da revolta d o s v io len to s . Já a segunda, impede a valorização de várias pessoas dentro da sociedade, distanciando homens da nossa cultura e informação, tornando-os rudes, agres sivos e levando-os a violentarem pes soas. tanto fisicamente como moralmen te. Por último, a discriminação social leva à separação de classes, tornando prejudicados os humildes, sem chance de integração social, que assumem pa péis secundários e muitas vezes despre zíveis. 0 Povo sente na carne e nasce um clima de rivalidade acentuada, que acar reta o ódio e conseqüentemente, leva ao crime. Portanto, se levarmos em conside ração estas três causas citadas acima, observaremos que são fortes e levam o homem ao desespero. Devemos superá- las, através da conscientização dos pro blemas, resolução dos mesmos, acaban do com as limitações sociais e fazendo justiça à massa popular. Esta redação, como a seguinte, identifica vio lência social com criminalidade urbana, em bora tal identificação não venha explícita. Só a p a r t i r dessa delim itação de sentido é que é possível en tender por que os l atorcs mencionados são lidos como causa, c não como efeito, da violência so cial. Este texto busca explicar um fenômeno so cial indicando os motivos que levam indivíduos a se to rnarem criminosos, c se m an tem coeren te nessa contradição, que é fru to de um a análise apressada e superficial do tema, problema detec tado tam bém na redação que se segue. 69 A contradição sc manifesta, também, numa série de ocorrências localizadas. A prim eira de las e o anacronism o presente logo na primeira frase, a qual, en tre outros fatores, toma um pro blema conjuntural do momento da produção do texto — o desemprego — como causa do agrava mento da violência social no decorrer dos tempos. O utra contradição aparccc no terceiro pará grafo. Ao explicar por que considera o analfabe tismo causa da violência, o produtor do texto faz uma afirmação incompatível com o que geralmen te se observa no m undo real: que os analfabetos são rudes e agressivos c violentam física e m oral mente as pessoas. No parágrafo seguinte, localizo ou tra inver são entre causa e conseqüência (a discriminação leva à separação de classes) e uma contradição léxico-semântica na frase que diz os humildes, sem chance de integração social, assumem papéis secundários, muitas vezes desprezíveis. Ora, quem assum e um papel num a comunidade, ainda que esse papel seja secundário ou desprezível, está in tegrado nessa comunidade. A conclusão, além do simplismo da propos ta de solução, lalha quanto à suficiência de da dos, na medida em que não fornece os elemen tos necessários para sc entender como superar as causas citadas, resolver os problemas, acabar com as limitações e jazer justiça à massa popular, tu do isso simplesmente através da conscientização. Esse bloco de "noções confusas" e "provas de ca ráter moral" (cf. Pécora, 1983: 76-78) em nada con tribui para o equacionamento da questão. De passagem, chamo a atenção para um pro blema de continuidade, no nível microcstrutural, 70 manifesto no m au emprego dc recurso coesivo in- tcrfrásico. Trata-sc da elipse mal aplicada do ter mo vários indivíduos, objeto direto dc conduz, no segundo parágrafo. Esse termo é recuperado clip- licamente, a través da concordância verbal, cm uma seqücncia dc orações já d istanciadas dele, das quais a p r im eira tende a se r in te rpre tada co mo oração adjetiva referente ao term o desempre go, candidato a antecedente mais viável, em ra zão da proximidade. Merece destaque a perfeita es tru turação for mal desse texto, que m ascara a sua fragilidade conceituai. Na introdução, o produtor indica três causas da violência social; tra ta de cada um a de las em um parágrafo do desenvolvimento, em pre gando com pertinência os mecanismos de coesão, e, em seguida, as retoma na conclusão, onde u ti liza,também com adequação, o a r t ic u la d o r lógi co poriunio. Q uan to à correção, há apenas falhas sem im portância, referentes à pontuação c ao emprego dc maiúsculas. REDAÇÃO N? 45 Violência Social A violência social c gerada pelo pro- pio sistema. Ela existe a um longo tem po e acentuou-se nos últimos tempos de vido ao crescimento desordenado das grandes cidades. O êxodo rural vem aumentando ca da vez mais c formando um crescimen to desordenado das áreas urbanas. Es tas pessoas não encontrando meios dc sobrevivência adequado, passam a viver 71 cm favelas. Nelas não existindo condi ções humanas como: higiene, escolas, hospitais, alimentação adequada, assis tência social, habitação, ira gerar uma serie de danos para esta população, co mo por exemplo o menor abandonado, que automaticamente sera um marginal para sociedade. Esta população carente, ira lutar pela sobrevivência, lançando mão de coi sas ilegais como: trafico de drogas, rou- bous, contrabando, enfim uma série de coisas que levam a violência social. Pes soas que se desesperam com a falta de dinheiro, e como não conseguem arran jar emprego, partem logo para o lado do roubo. O capitalismo centraliza o podei nas mãos de uma minoria, que controla lôdo o sistema, não havendo uma boa distribuição de renda, havera uma dis pu ta que gera em briga de classes. Um pais para controlar este proble ma teria que investir em cima da educa ção destes menores, emprego a estas pes soas, e se possivel fazer um controle de natalidade, enfim dar condições huma nas para tòda esta população carente. A redação n? 45 exibe oco rrênc ia s significa tivas, porque m uito reco rren tes no corpus , dc um tipo de con trad ição externa. Trata-se da g en e ra lização indevida de afirmações que não podem ser estendidas, de m a n e ira im ediata e simplista, a to dos os indivíduos q u e se encon tram sob d e te rm i nadas condições. É a ap licação irre fle tida de um es te reó tipo c o r re n te c per igosam en te fa lseador de realidade. Primeiro cia condena toda criança como m ar ginal nocivo à soc iedade e incrim ina toda a popu- 72 iação carente como culpada de irá fico de drogas, roubos e contrabando. Em seguida, afirma, pe- remploriamente, que as pessoas que não conse guem arranjar emprego partem logo para o lado do roubo. Essa radicalização não c compatível com a realidade. Há uma grave distorção em iden tificar toda a população pobre, em sua maioria trabalhadora e sacrificada, com uma minoria de marginais e criminosos. Uma dessas afirmações da redação, além de contradizer a realidade, se mostra ambígua, di fícil de entender: o menor abandonado será um dano para a população favelada ou para o resto da sociedade? Será que cie, sendo um dano para esta população, se transformará automaticamen te num marginal para a sociedade? Como? Esse menor abandonado é uma decorrência da falta de escolas, do mesmo modo que endemias como a verminose seriam decorrentes da falta de higie ne, hospitais, alimentação adequada? Assim, as crianças, tanto quanto as doenças, constituiriam danos para os favelados? Faltam elementos que possibilitem respostas a essas perguntas. Faltam informações, esclare cimentos quanto a determinados conceitos, e falta relação entre os conceitos apresentados. Com isso o texto fere também os requisitos de suficiência de dados e de articulação. Essas falhas no nível lógico-semântico-cognitivo se refletem na super fície textual, na forma de um período sintatica- mente mal estruturado, cujo sujeito é uma ora ção causai reduzida de gerúndio. É curioso como, apesar dessa zona de turbu lência, a redação guarda alguma coerência no 73 âmbito global. À origem da violência c atribuída ao propio sistema, depois identificado com o ca pitalismo, centralizador de poder e riqueza e ge rador da briga de classes. O crescimento desorde nado das grandes cidades é apontado como cau sa imediata do acirramento recente da violência urbana c, cm seguida, é explicado pelo êxodo ru ral c a formação de favelas, consideradas autên ticos viveiros de delinqüentes: os menores aban donados e os adultos desempregados. A conclu são, então, aponta maneiras de remediar a situa ção: quanto aos menores, educá-los, se não for possível evitar que eles nasçam; quanto aos adul tos, dar-lhes emprego. Quer dizer: a conclusão propõe eliminar os danos e suas causas (a falta dc condições humanas). A transformação do propio sistema, apontado como causa geradora da violência, é uma hipótese sequer cogitada. A substituição do capitalismo por um regime mais igualitário nem sequer é aventa da. A consideração dessa possibilidade, ainda que para demonstrar sua inviabilidade ou inutilidade, viria satisfazer à lógica interna do texto e daria mais consistência à argumentação. Tal como está, o raciocínio parece truncado, não acabado. Apesar das falhas na estrutura lógico-semân- tico-cognitiva, na superfície a redação se mostra, em linhas gerais, certinha e organizada. Seu úni co problema formal significativo c a má es tru tu ração de um período do segundo parágrafo. 74 1.4. Falha na realização do requisito de articulação REDAÇÀO N? 7 Violência Social A violência em nosso pais esta a ca da dia que passa se acentuando mais, is- lo devido a diversos fatores podemos ci tar o fator economico a gananeia do ho mem pelo dinheiro, o desemprego dos pais, a falta de moradias, alimentação e educação impedem o de criar seus fi lhos dignamente dai a grande violência da sociedade o menor abandonado, que sozinho sem ter uma mão firme que o conduza pela vida, parte para o crime o roubo na tentativa de sobreviver. A falta de terra para nossos indioscontri buindo assim para extinção da especie. A matança sem controle de nossos ani mais, a poluição de nossas aguas pelas industrias e a destruição de nossas ma las em nome de um progresso uma tec nologia importada a custo do sacrifício economico financeiro de nosso povo. O homem se esqueceu dos fatores bási cos para sua sobrevivência em socieda de, a alimentação o trabalho e educação que cada dia que passa se torna mais di- ficil, a sua historia é o oxigênio que 6 fa tor principal para sobrevivência de qual quer ser, tudo isto pelo dinheiro pela maquina que o apaixona tornando o ce go para necessidades primarias da vida. O homem caminha para sua própria destruição. Essa redação beira os limites do não-texto. Seu processo de elaboração parece ser o da as sociação livre, as idéias são jogadas no papel sem 75 a preocupação dc sc cstabclecer qualquer co rre lação en tre cias. Todas elas, é verdade, têm a ver, algum modo, com a questão da violência, mas es sa ligação não c explicitada. Falta uma rede que as articule, um a h ie rarqu ia que as organize. Ele mentos de peso c am plitude diferentes são colo cados no mesmo plano, não se distinguem cau sas, sintomas ou conseqüências. Por exemplo, al guns elementos arrolados como responsáveis pelo agravam ento da violência, como o desemprego dos pais e a falta de moradia, alimentação e edu cação, são decorrentes do que o texto designa ge nericamente como fator econômico, mas essa re lação não é estabelecida. Outras manifestações de violência, sem vín culo direto com os problem as urbanos menciona dos, são incluídas no rol das ações hum anas que a redação condena. Refiro-me à falta de terras pa ra os nossos índios (tidos como integrantes não da espécie humana, m as de outra espécie em extin ção?) e à destruição da natureza [animais, águas e maias). A inclusão se faz através de frases nomi nais que exprimem, na superfície, a desconexão que existe na e s tru tu ra conceituai subjacente. Há na tessitura doraciocíniodescontinuida- des e lacunas que só podem ser reconstituídas pe lo leitor à custa de algum esforço. Um exemplo é a menção ao oxigênio, qualificado com o fator principal para sobrevivência de qualquer ser e identificado com a história do homem, num a pas sagem que fala dos fatores básicos para a sobre vivência em sociedade, dos quais o h o m em se es queceu. A única possibilidade de processamento dessa ocorrência de "terceira ordem ” é, como di 76 r iam B eaugrande c D ressler (1983: 144), seu " r e ba ixam en to" para um a ordem m ediana de infor matividade, a través da sua vinculação com o fe nômeno da destruição de nossas malas aludido no parág ra fo an terior. Esse jo r ro caótico dc idéias, relacionáveis en tre si e com o tema, m as não a r t icu ladas dc fato pelo p ro d u to r do texto, é caso típico de infração ao p rim eiro aspccto da condição de articulação: a p resença efetiva das relações. A única pista d a da ao leitor com o possibilidade de nexo en tre os vários fatos a rro lados é a lacônica frase final: o h o m em cam inha para sua própria destruição. No plano da coeseto, a e s t ru tu ra do texto lem bra uma longa enum eração, com frases nominais e sem mecanismos de junção interoracional, que corresponde à desart icu lação apontada no plano da coerência. Ressalto que essa é um a das poucas redações do corpus que não atendem à exigência do progra ma do vestibular referente à organização do texto em introdução, desenvolvimento e conclusão. Ê, também, um a das poucas que carregam cm alta incidência de erros formais, em diferentes níveis, desde a ortografia e a pontuação até a construção de cadeias anafóricas interfrasais, passando pela morfo-sintaxe e a es tru tu ração de períodos. REDAÇÀO N? 74 Violência Social O que gera a violência? A falta de amor: a ganância; a luta pelo poder: a 77 pobreza, os desgostos, traumas; a falta de alfabetização ou seria as más condi ções do ser humano de sobreviver? O homem caminha em busca de paz e a cada dia ele geme, chora e teme por saber que a violência cada vez mais se agrava. O mundo caminha para um caos. a frieza em que as relações humanas per sistem em viver, dá para se ter uma idéia que não é só nosso pais que sofre deste mal. A violência está alastrando-se como uma epidemia onde o futuro de todos é incerto e doloroso. Ao amanhecer abrimos o jornal e o que mais nos fascina são os crimes: mu lheres vítimas de seus maridos; estru- pos, mortes, desastres c suicídios. E de paramos diante destes quadros frios e incalculistas. Agimos mal? Erro só nos so! A violência e um crime social, amea ça nossa sociedade, onde fazemos par te dela, onde vivemos e é por certo a quem devemos lutar e proteger! Ela nào é só um problema de governantes, au toridades policiais, da Igreja ou de Deus; é um problema nosso, de nossos filhos ou de animais (restos de homens alienis- tas) de uma tremenda catástrofe em que vivemos ao lado dela a cada instante... Embora menos grave que a n? 7, a redação 74 também constitui caso típico dc infração ao requisito de presença de articulação entre latos c conceitos. A introdução tem a mesma constitui ção de saco de gatos que comanda a composição anterior. O produtor do texto enum era alguns fa tos que podem ser relacionados à violência, sem sc p reocuparem ordená-los ou m ostra r os possí 78 veis nexos ex is ten tes en tre eles. Por exemplo: o que seriam a pobreza e a falta de alfabetização se n ão com ponen tes das m á s condições do ser h u m a n o de sobrev iver? As idéias lançadas na in tro d u çã o não são re tomadas nem discutidas du ran te o texto. O segun do p a rág ra fo fala dc u m a rea lidade que é, em si, con trad itó r ia (a busca de paz versus o agravamen to da violência), mas não lida bem com essa con tradição, porque não a expressa a trav és dos co nec to res in te rf ra sa is adequados. O terce iro p a rág ra fo a lude a um fato que não é re lac ionado a nenhum a ocorrência an te r io r ou pos te r io r (a frie za das relações h u m a n a s no âm b ito in te rnac io nal). Há, ainda, falhas q u an to ao requ is i to de su ficiência de dados, c a ra c te r iz ad as pela ausência de delimitação do sentido de conceitos difusos co m o falta de amor, desgostos, traumas, m ás con dições do ser h u m a n o de sobreviver, frieza das re lações hum anas , e pela falta de explicação p a ra o papel a eles a tr ib u íd o com o lon tes ou m an ifes tações da violência. O qu in to p a rág ra fo co m p o r ta um a excmpli- ficação do que é violência p a ra o p ro d u to r do tex to e anuncia a conclusão, a través de contradições léxico-semânticas. Como en tender , p o r exemplo, quadros frios e incalculistas? P a ra que a passa gem faça sentido, é p rec iso t r a d u z i r deparamos p o r “param os" ou “ ficamos paralizados" e en ten d e r como “om issão" a ação sugerida pela pergun ta que se segue: A gim os mal? Erro só nossol Es se é o único meio dc re lac ionar ao texto a con clusão, que q u e r dem o n s tra r que a violência é um p rob lem a da responsab il idade de todos os c ida 79 dãos, e não só de governantes, autoridades poli ciais, da Igreja, ou de Deus. P erm anecem fora da rede de re lac io n am en to s plausíveis, co n f ig u ran do au sên c ia de a r t icu lação , os an im ais (restos de h o m en s alienistas) de um a trem enda catástrofe. À falta de re lac ionam en to en tre os fa tos e conceitos denotados corresponde, nessa redação, a ausência de m ecan ism os de junção. Não há um só conec to r que faça a ligação dos vár ios p a r á grafos en tre si. Além disso, a falta de c lareza quan to às relações e n t re indivíduo e sociedade, m encionadas na conclusão , t ran sp a re c e no e m prego inadequado dos relativos da p r im e ira f ra se deste p a rág ra fo e na am bigü idade dos anafó- ricos dessa frase e da última. Tais falhas c o n tra s tam com a a p a re n te boa o rganização da redação que respe i ta o m odelo fixado p a ra textos disser- t ativos. Deixo aqui um a an o tação q u an to ao esforço que textos com o este e o a n te r io r (redação 7) ex i gem do le itor que p re te n d a in terpre tá-los . Sem a cum plic idade benevolente do receb ed o r não se constró i o seu sentido. REDAÇÃO NV 3 Violência Social A violência social está muito presen te na nossa sociedade. Como exemplo nós podemos c itar a morte de Sete- quedas e as condições precárias dos m a nicômios. O assassinato de Sete-quedas não foi unia escolha popular. E quando os 80 direitos de qualquer pessoa são viola dos, ocorre violência social. O progresso écaracterística de paí ses desenvolvidos, mas para que ele te nha sucesso ê preciso que seja bem pla nejado. Com a morte de Scte-quedas, o Brasil ganhará divisas e ltaipu será a maior usina hidrelétrica do mundo. Mas por outro lado a natureza brasileira fi cará seriamente abalada. Muitas espé cies de peixes podem se extinguir, isso porque o fenômeno da piracema que ocorre no mês de agosto, quando os car dumes de peixes vão para as cabeceiras do rio para desova, não poderá mais ocorrer. As condições precárias em que se apresentam os manicômios brasileiros é uma violência social paraos pacientes. As condições higiênicas são péssimas, geralmente os manicômios abrigam o dobro de pessoas que comportam, a as sistência médica quase sempre não tem e os pacientes tomam grandes quantida des de remédios sem controle médico. Desta forma os pacientes nunca se curam. Portanto quando o país souber da grande importância em escolher,as vio lências sociais terminaram. Para fa lar de violência social o p rodutor do texto toma dois aspectos de rem ota vinculação com o assunto e nenhum vínculo entre si: a m or te de Sete-quedas e as condições precárias dos m a nicômios. A possível relação dos fatos apontados com o tema não é efetivamente estabelecida. O au to r da redação forja uma ligação indireta en tre o assassinato de Seie-Quedas e a violência so cial através da mediação da ausência de escolha popular como base para a decisão governamen 81 tal de afogar, no lago de Itaipu, o Salto de Sele Quedas. Não se lembra, por exemplo, de alegar que a des tru ição da Natureza é uma am eaça pe rigosa para a sociedade humana, e não apenas pa ra as espécies animais. Por sua vez, a dimensão social da p recariedade dos manicômios, proble ma de saúde pública, também não é lembrada pe lo p ro d u to r do texto, que a restringe ao âmbito interno das instituições, como violência contra os pacientes. Assim, o que se tem na redação são "provas" apenas rem ota e artificialmente rclacio- náveis com o assun to em foco: a am eaça de ex tinção dos peixes pela não-ocorrência da pirace- ma c a dificuldade dc cura dos doentes in terna dos nos hospícios. Essa redação é um exemplo ti- pico de falha quanto à pertinência na articulação de fatos e conceitos. Na tentativa de desenvolver seus a rgum en tos, o au to r da redação incorre ainda em tauto- logias e impropriedades. É tautologia fa la r no progresso de sucesso dos países desenvolvidos. É im próprio fa lar em morte e assassinato de Sete- quedas sem p re s ta r ao leitor m aiores esclareci mentos (infração à exigência de suficiência dc da dos). Um recebedor que não detenha as inform a ções prévias necessárias pode in te rp re ta r Seie- quedas como o nome de algum herói popu la r as sassinado. Nesse texto, a conclusão não decorre, abso lutamente, do desenvolvimento das idéias ap re sentadas. Antes, parece um artifício descoberto pelo p rodutor para se safar da dificuldade de fe char convenientemente a redação, justificando a inclusão de elementos tão discrepantes. Não há 82 nada, no texto ou fora dele, que perm ita inferir que bas ta s a b e r que c im p o r tan te esco lher para se e l im in a r a violência social. Se essa dedução se vincula, p o r recorrência lexical, ao pretexto u sa do p a r a qua lif icar o assassinato de Sete-quedas com o violência social, não m antém com o segun do a rg u m e n to sequer um a ligação superficial e longínqua. É curioso como o p ro du to r do texto tenta es conder a efetiva desarticulação entre os argum en tos que utiliza sob a m áscara de uma es tru tu ra for mal canônica, superficialmente perfeita: na intro dução, apresen ta o tema e anuncia os dois aspec tos sob os quais irá abordá-lo; no desenvolvimento, reserva dois parágrafos distintos, para tra ta r cada vez dc um argumento; na conclusão, devidamente p recedida do a r t icu lador lógico portanto, retom a um a idéia do desenvolvimento e faz uma projeção relativa à possibilidade de solução do problema. Tudo certo e arrumadinho, m as sem sentido. 2. E m foco: problemas relativos à informatividade 2.1. Falha na realização do requisito de suficiência de dados REDAÇÃO N? 85 Violência Social A violência social vem sendo pra ti cada no mundo inteiro, em todas as clas ses da sociedade. 83 É uma luta pelo poder e pela sobre vivência. Uns matam e roubam para so breviver, conseguir urn pedaço de pão e ter com que se alimentarem, outros praticam a violência apenas com o ob jetivo de enriquecerem ainda mais e do minar a elasse mais fraca. Há rivalidades até entre famílias, fi lhos matando pais para tomar o que lhes pertence, irmãos brigando entre si. Brigas por posses de terras, causan do guerras entre países como ocorreu há pouco tempo e continua acontecendo. Por qualquer motivo se pratica a violência, uma simples discussão, ciú mes, um lugar em fila de ônibus, etc. Ninguém respeita o próximo, qualquer coisa, por menor que seja, serve de mo tivo para acabar em violência c basta an darmos uns minutos pelas ruas, para en contrarmos vários exemplos. Assim como ha os que praticam a violência pelo poder e pela sobrevivên cia, há também muitos que a praticam por prazer, por querer m ostrar que po de mais que o outro. Uma ocorrência típica do problem a dc que estou me ocupando se localiza no quar to parágra fo dessa redação: brigas por posse dc terras, cau sando guerras entre países como ocorreu há pou co tempo e continua ocorrendo. Nada há no tex to que informe de que terras, de que guerras , de que países e de que tempo se está falando. Que força pode te r um a rg u m en to com o es se, que não esclarece a que está se referindo? Em vez de con tr ibu ir para a persuasão do leitor, es se argum ento tem o efeito de reduzir a eficiên cia pragmática do texto, pois a impressão que dei xa é que o a u to r da redação não pôde fornecer 84 dados mais completos em função de sua ignorân cia. Ora, quem ignora o assun to de q ue fala não m erccc crédito , não faz ju s à cooperação do in terlocutor. Não tem aceitabilidade. No entanto, no vestibular, o b te r a aprovação do recebedor é fundamental.. . A falha ap resen tad a não é ocorrência isola da e excepcional no texto. Pelo contrário , apenas i lus tra o tom escapis ta que perpassa toda a re dação. O fio co n d u to r do texto é a tenta tiva de defi nir e exem plif icar o que seja a violência social, para d em o n s tra r que ela vem sendo praticada no m u n d o inteiro em todas as classes sociais. O re sultado, no en tan to , é um a noção obscura e con trad itó ria , em virtude da abrangência p re tend i da e da variedade e indefinição dos exemplos. Tanto é violência social o en r iquec im ento ilícito quan to a d ispu ta por um lugar na fila do ônibus; tan to as g u erras in ternacionais quan to as rivali dades familiares. Os motivos que a desencadeiam vão desde a legítima luta pela sobrevivência até o anseio de poder e riqueza, passando pelo c iú me e pela mais cruel vaidade (a dos que a prati cam por prazer, por quererem mostrar que podem m ais que o outro). Assim, fica difícil reconhecer e s i tu a r o c a rá te r social do fenômeno e (ica difí cil com por um conceito nítido e coerente do te r mo em questão. Se a violência é p ra t icada pelos que têm o objetivo de enriquecerem ainda mais e d o m in a ra classe mais fraca, essa classe, ob r i gada a m a ta r p a ra ro u b a r um pedaço de pão (!), não se ria \ i i im a , em vez dc agente, da violência social? 85 T ransparece , nesse texto, a superficialidade da reflexão, explicável pelas contingências da si tuação de p rodução e que sc manifesta, com o se viu, não apenas pela não-explicitação de dados ne cessários (que brigas, que terras, que guerras?), mas também pela não-construção de uma rede de relações que a r t icu le e organize todos os fatos mencionados. No entanto, m ais um a vez, tem-se um a reda ção certinha e feita de modo a a tender as exigên cias do modelo de com posição estabelecido pa ra os textos dissertativos. REDAÇÃO N? 26 Violência Social Atualmente, um dos grandes proble mas que afetam a vida de uma socieda de, é a violência nela inccrida. Violên cia essa que devido a vários fatores, se gundo sociólogos, psicólogos e outros estudantes das ciências humanas, será praticamente impossível de ser elimina da. A dificuldade na solução deste pro blema. está na complexidade do mesmo. Várias são as suas causas e para cada uma sc faz necessária uma medida es pecial, medidas essas quemuitas vezes são impossíveis de serem colocadas em prática. A violência pode ser gerada pela própria sociedade, por crises econômi cas, por um problema mental do indiví duo. pelo grande numero de adeptos ao uso de drogas, e por uma enorme série dc outros fatores. Devido as perspectivas quase que inexistentes em uma solução a curto ou 86 médio prazo para a questão da \ iolên- cia, o melhor a fazer, é se precaver pa ra não se tornar mais uma vítima de um dos problemas mais sérios da nossa so ciedade. A sonegação de informações é o que me incomoda nesse texto. A in trodução e o primei ro parágrafo m anifestam de modo especial es sa falha, pois c r iam no leitor expectativas que não são satisfeitas: quais são os vários fatores e as várias causas da violência? a que medidas especiais se refere o au to r? por que elas são im possíveis de serem colocadas em prática? afinal, cm quo consiste a complexidade desse proble ma e por que ele é praticamente impossível de ser e l im inado? O segundo parágrafo, ao invés de remover a instabilidade da comunicação, satisfazendo a cu riosidade do leitor, ap resen ta uma seqüência de explicações vagas e desconexas, nenhum a delas re tom ada e especificada depois: a própria socie dade, crises econômicas, u m problema mental do indivíduo, o grande núm ero de adeptos ao uso de drogas. Essa seqüência é encerrada de um a lor- ma que aum enta a f rus tração do recebedor, ao invés dc resolvê-la: uma enorme série de outros fatores (grifo meu). A conclusão não vem para esclarecer mas pa ra escapulir. Retorna à idéia duas vezes expres sa. mas não desenvolvida, da quase impossibili dade de solução para a violência social, sem fun dam entar ou just if icar essa descrença no futuro. E recomenda a cada um se precaver para não se tornar mais um a vítima (...), o que não é um a 87 solução, mas um a escapatória. A proposta é fu gir do problema, como o au to r fugiu do tema... Para mim, esse é um texto que taz que di/.t mas não diz. Quanto aos aspectos mais superficiais, ap re senta desvios no que tange à morfo-sintaxe pa drão e às regras de ortografia e pontuação. Sua e s tru tu ra formal aparente , no entanto, segue o molde ortodoxo de dissertação, compondo-se das três partes tradicionais. 2.2. Falha na realização do requisito de iniprevisibilidade 2.2.1. Considerações preliminares A exigência de iniprevisibilidade não é, nem poderia ser, absoluta. As contingências histórico- sociais inviabilizam, de certa forma, a originali dade total. Segundo Pêcheux (1969: 16), as c ir cunstâncias condicionam, efetivamente, a produ ção dos discursos. Eu não pretendia, ao avaliar redações (citas no Brasil, em 1983, sobre violên cia social, encontrar textos que não aludissem aos elementos corriqueiros da nossa realidade da épo ca (e de hoje também), como os assaltos, o me nor abandonado, a pobreza do povo, a injusta dis tribuição social da riqueza, o desemprego. Esses elementos c que integram nossa experiência. Eles é que constituem o material cognitivo com o qual trabalhamos na produção de nossos textos; eles 88 e quo com põem os modelos de conhecimento com os quais processam os os textos que recebemos. E n tre tan to , c sempre possível a elaboração pessoal desse m ateria l cognitivo comum. Por is so, com o estava lidando com falas de indivíduos, considerei razoável espera r m aneiras diferentes de in te rp re ta r e valorizar os componentes da rea lidade. Mas nào foi isso o que encontrei. Grande parte das redações traz um grau elevado de p re visibilidade, nào só porque se compõe de a rg u mentos reco rren tes e de es tereó tipos relacioná- veis ao tem a (referentes a amor, paz, unidade na cional, etc.), mas, principalmente, porque a p re senta um a única leitura de mundo. Poderia incluir aqui um núm ero bem m aior de redações, mas isso seria duplam ente desneces sário. Em primeiro lugar, porque a recorrência de algum as idéias já está com provada pelas re dações t ran sc r i ta s até agora a propósito de o u tros problem as. Em segundo lugar, porque a re p rodução de mais algumas redações não tra r ia novidade, seria apenas redundante . Basta, então, que eu ap resen te alguns exem plos típicos, que dão conta de grande par te dos textos in tegrantes do corpus. O mesmo a rca b o u ço formal e conceituai, com poucas variações p re visíveis, pode ser reconhecido em pelo menos 45 das cem redações analisadas. Quase a metade dos candidatos in tegran tres da am ostra escreveram o m esm o texto. Os ou tros 55 textos não sc a p re sentam inteiramente originais, mas acrescentam elementos a esse esquema ou a rran jam dc manei ra diferente os elementos que o compõem. 89 O molde é o seguinte: a) na introdução, declara-se que a violência social c um prob lem a do m undo todo, muito dis cutido, e/ou que se m ostra muito acen tuado nos dias de hoje; b) 1 1 0 desenvolvimento, exemplifica-sc o agra vamento da violência falando da falta de seguran ça nas cidades (assaltos, roubos, estupros, pivetes, trombadinhas) c apontam-se suas causas sociais (o êxodo rural, o desemprego, a marginalização, as favelas) e/ou m ora is (o egoísmo e a ganância do hom em , a falta de am or ao próx im o ); c) na conclusão, apregoa-se a necessidade de conscientização e humanização das pessoas, ou apontam-se objetivamente medidas a serem to m adas pelo governo e pela classe dom inante (em prego, escola e habitação para todos), ou profeti/.a- se que não há solução para o problema. As redações transcritas a seguir i lus tram al gumas variantes do modelo. São, em geral, tex tos com razoável correção gramatical e que obe decem ao padrão dc e s tru tu ração formal es tabe lecido p a ra a dissertação. 2.2.2. Análise de a lgum as redações REDAÇÃO N? 2 Violência Social Violência c um tema muito discuti do. Atualmente, um dos grandes proble mas dos brasileiros é a violência social Pesquisadores, psicólogos, educadores têm procurado um meio eficaz para so lucionar o problema, que se agrava, a ca da dia que passa. 90 0 maior índice de ocorrência es tá localizado entre os pobres. As pes soas pobres geralmente são muito ca rentes de amor, de carinho, de com preensão, são marginalizadas e a so ciedade os recrimina e os maltrata. Então eles usam a violência como fuga da sociedade, dos problemas c dc si mesmos. A violência também está entre os ri cos e poderosos, que na sua ânsia de ri queza e poder, usam a violência como forma de obter o desejado. Enfim, a violência social está no mundo inteiro, presente na maioria das pessoas, que a usam como fuga oi\ desejo de algo. Espera-se uma so lução para, pelo menos, diminuir o índice de violência na nossa sociedade. Para uma solução acertada, é preciso de uma conscientização de todas as classes sociais no sentido de m ostrar que a violência não c a única saída pa ra os problemas. A redação n? 2 exemplifica bem o modelo. In clui na in trodução d u as das t rês form as de a p re sentação do assunto mais recorrentes — a violên cia é u m tema m uito discutido (...) que se agrava a cada dia que passa. No desenvolvimento, mes cla a explicação social (as pessoas pobres [.. J m ar ginalizadas, que usam a violência como saída para seus problemas) com a explicação moral (os ri cos e poderosos com sua ânsia de riqueza e p o der). E, na conclusão, condiciona o fim do p ro blema a um a conscientização de todas as classes. Parar para pensar e se conscientizar foi a suges tão oferecida por 19% das redações como fórm u la mágica p a ra e lim inar a violência social. 91 REDAÇÃO N? 1 I Violência Social A sociedadeatual está muito mar ginalizada. Há tanta violência no mun do, tantas guerras, desavenças, tudo por ambição, egoísmo. A marginalização é total. Todos sc agridem, se matam na luta pela sobre vivência, a procura de um mundo me lhor, de uma vida mais calma, só que es tão fazendo o contrário, causando mais guerras e mais desunião. A fome e a miséria são umas das causas da nossa marginalização, fazen do com quo os homens se matam pela sobrevivência. É o "pão nosso de cada dia". Os analfabetos, os deficientes físi cos ou mentais e principalmente o "me nor abandonado", todos eles e mais ou tros estão por aí a procura de uma mão, de um coração aberto e só encontram portas fechadas não permitindo que ele vavam. Na época em que vivemos, todos nós precisamos é de paz, amor e não o que está acontecendo. 0 homem está sc tor nando cada vez mais escravo do seu egoísmo, do seu ódio e de sua ambição, e s tá acabando com o am or, nào deixando-o florescer em seu coração. Só o amor constrói. Vamos! Plante uma flor e a faça germinar em seu co ração criando verdadeiras, fortes e fér teis raízes. O texto 11 é exemplo da abordagem lírica c pueril do tema, muito íreqüente entre as redações analisadas. In troduz o assunto apon tando a ge neralização da violência no mundo, descnvolve- o contrapondo o ideal (um m u n d o melhor, uma 92 vida mais calma) à realidade social (a fome , a m i séria, o m enor abandonado) e conclui afirmando que só o am or constrói e que, portanto, a manei ra de o homem encontrar paz, amor e acabar com seu egoísmo, seu ódio, sua ambição é plantar uma f lore fazê-la germinar em seu coração. Correspon de a uma análise simplista da realidade, fruto da não-penetração nos problemas e da generalização ap ressada15. Há 22 redações no corpus que terminam ex pressando sua crença na força do amor como úni ca possibilidade de solução para os males sociais. Vale a pena observar que, apesar do seu bai xo teor informativo (no que se refere aos dois as pectos considerados neste trabalho), a redação é coerente em sua ingenuidade, atendendo aos qua tro requisitos aqui adotados, é coesa, e, além dis so, atende aos padrões escolares (paragrafação adequada e correção gramatical). REDAÇÃO N? 59 Violência Social Hoje o que mais se vê é a violência social, ocorrendo em toda parte do mundo. Os homens destroem a si mesmos. Não há um só país, onde não exista as saltos. estupro ou violentação. N inguém mais tem o direito dc sair às ruas, sem a preocupação de ser violado por um trombadinha ou mesmo por um assal tante mais “eficiente". A cada dia que se passa mais aumentam os índices de criminalidade. A culpa não é somente dos marginais. A culpa está em cada um dc nós, porque não aceitamos as pessoas 93 como elas são e sim recriminamos, jul gamos, criticamos. O ser humano preci sa dc proteção e carinho. Ao invés de condenar, devemos fazer alguma coisa para diminuir esse índice de violência social que sofremos todos os dias. Nós mesmos somos as vítimas e nem assim tomamos uma providência, ajudando es sas criminosos livres a se reintegrarem em nossa socieCade e não ignorando-os. Devemos educar corretamente as nossas crianças, para çue no futuro eles sejam pessoas honestas e seguras. A violência social tem seu gráfico elevado por nosso egoísmo, que tapamos os olhos para tudo o que está acontecen do, deixando a cargo da polícia esse gra ve problema. Nós podemos ajudar, não fazendo surgir nóvos criminosos, mas fazendo com que estas pessoas que se sentem inúteis e caem nesta vida dc vio lência, vejam que podem fazer algo mais correto e útil para elas c para todos nós. Em 53% dos textos estudados há a lgum a ex plicação de cunho moral para a violência. 0 fe nômeno é a tr ibu ído à corrupção da sociedade e à degradação espiritual dos homens. 30% das re dações mencionam com o causas do p roblem a o egoísmo, a ganância e a ambição humanas c 23%, como a redação 59, se configuram como verda deiros atos de contrição: a culpa está em cada um de nós, porque não aceitamos as pessoas como elas são e sim recriminamos, julgamos, criticamos. As disparidades sociais são reduzidas ao plano in dividual e explicadas pelo fato de cada pessoa re je ita r os que não pertencem à sua classe. A solu ção fica, então, na dependência da conversão de cada ser humano. A redação 59 propõe que aju- 94 dem os os cr im inosos livres a se re in tegrarem em nossa sociedade, que eduquem os corretamente as nossas crianças, que acabem os com nosso egoís mo. Como o u tro s casos já vistos, esse texto e coe ren te em su a ingenuidade. Condicionar o fim do problema à nossa capacidade de a judar os neces sitados condiz com a in te rp re tação de que a vio lência social existe em razão da nossa falta de am o r ao próximo. REDAÇÃO NV 21 Violência Social Um dos problemas que mais aflige ao homem moderno é a violência social. Atingindo-o fisicamente e espiritualmen te, a violência social vem causando sé rias conseqüências, dentre delas, o me nor abandonado. O menor abandonado é vítima da violência de todas as classes sociais, des de a classe baixa que enconsequênte- mente visam apenas o prazer, até a clas se alta que pensam apenas em aumen tar o seu fundo monetário e jamais em ajudar o próximo necessitado de dinhei ro e amor. E como fruto desse egoísmo surgem os menores abandonados que sem nenhum apoio e dinheiro se desses- peram, tornando assim marginais que consequentemente irão buscar na vio lência uma opção de vida, pois fora is so que receberão e aprenderão com a so ciedade, e talvez, até pensam ser isso o certo. E assim fecha um ciclo e começa o outro sucessivamente, pois não há for ças c coragem para cortá-lo, o homem prefere fechar os olhos e ver um "céu es curo. porém estrelado". 95 O texto 21 representa o grupo dos pessimis tas, integrado por dezessete das cem redações do corpus. Diante da mesma realidade (a violência social como um cios problemas que mais afligem ao ho m em moderno\ o menor abandonado), propõe a mesma explicação moralista (a classe alta que pensam apenas em aumentar o seu fundo mone tário e jamais em ajudar o próximo necessitado de dinheiro e amor), mas não acredita cm solu ção. Pelo contrário, enxerga um "ciclo vicioso” que o homem não tem côragem para romper. REDAÇÃO N° 15 Violência Social A violência c um dos temas mais constantes de nossa sociedade atual. Devido ao progresso, as cidades ti veram um crescimento acelerado, oca sionado pela vinda de pessoas do meio rural, ã procura de melhores condições de vida. Com este surto populacional, as pes soas, desacreditadas na cidade grande, procuram de todos os meios manter a sua sobrevivência, amontoando-se em favelas, subúrbios, etc., enfim, vivendo na penúria. Marginalizadas como ficam, sem ne nhuma condição de trabalho, de estudo, de vida em si, passam a roubar, a ma tar. desrespeitando de todos os meios, o ser humano e a comunidade. Portanto, cr.be ao governo e a socie dade, de evitar que a violência perdure, incentivando e criando mais escolas ac- ccssíveis. trabalho paia todos, cultura e lazer, enfim, meios mais propícios 96 para a vida em comunidade, porque o ser humano é portador dos direitos de liberdade e igualdade. Essa redação parti lha com ou tras 16 a posi ção prática e objetiva diante da questão. Se u vio lência é u m dos temas mais constantes cie nossa sociedade atual c se deve ao êxodo ru ra l e à m ar ginalização das pessoas na cidade grande, o que as obriga a m o ra r cm favelas, na penúria, e a rou bar e matar pa ra sobreviver, a solução previsível é o governo proporcionar escolas (...), trabalhopa ra todos, cultura e lazer. Tudo é apresentado co- mo tão simples e tão óbvio quo, ao final da le itu ra de textos com o esse, fica-se com a impressão de que o problem a só não foi a inda resolvido por m á vontade e desinteresse das autoridades públi cas. 3. Textos com bom padrão de textualidade 3.1. Considerações prelim inares Para não se r tendenciosa ou parcial, tenho que ap on ta r a existência dc textos de boa quali dade no corpus. Aproximadamente 10% das re dações analisadas se mostraram com bom padrão de textualidade, do ponto de vista dos três fato res avaliados. São produções que se m ostram compatíveis com a realidade a que se referem e que exibem unidade, logicidade e boa articulação 97 dos argum entos que apresentam. Em bora nào ab solutam ente originais, são textos que dão ao lei tor a im pressão de que tinham algo a dizer. Tex tos que revelam, da parte do produtor, uma lei tura pessoal do mundo, um posicionamento cons ciente c mais consistente diante da p rob lem áti ca abordada, ce r tam en te não forjado às pressas para cu m p rir a obrigação de ju n ta r 120 palavras sobre um tem a complexo, mas fru to de um a re flexão an te r io r já am adurecida. Por isso mesmo, são textos que merecem o respeito mesmo do lei tor discordante . * 3.2. Análise de a lgum as redações REDAÇÃO N° 61 Violência Social O homem dc hoje vive sob o signo da violência. O medo é o sentimento que mais nos acompanha. Se hã medo, algu ma coisa nos ameaça e põe em risco nos sa segurança. Que coisa é essa? Se se fi zesse uma pesquisa, ficaria flagrante que a preocupação primeira dos indiví duos é sua segurança pessoal. Estamos constantemente sob o risco de ter nos sa casa assaltada, a filha violentada ou o carro roubado. O que há por trás disso? Toda violência tem um agente e um paciente, o que a pratica e o que a so fre. Será? Ficaria fácil sc pudéssemos explicar o mundo pela ótica maniqueís- ta, o violento c o violentado, o bom e o mau, o vilão e o mocinho, mas o mundo é mais complexo. Não podemos esque 98 cer que existem pessoas que foram es vaziadas dc qualquer espécie de poder, político, econômico ou social. Pessoas que, como hoje, no sistema capitalista em crise, nâo encontram nem a quem vender o que lhes resta, sua força dc tra balho. Mais violento que o marginal quo matou um engenheiro, ê a injusta estru tura social pousada na propriedade pri vada na existência de uma classe explo radora e outra explorada, na desigual dade de chances. O marginal apenas de volve ã sociedade a violência que ela lhe praticou. Essa redação traz um a interpretação diferen te p a ra o problem a do desem prego c da m arg i nalidade, tão recorrente no corpus. Uma interpre tação que dá aos latos a devida d im ensão social e busca o significado deles na e s t ru tu ra sócio- econòmica. Mesmo quem não concorde com a ideologia subjacente, tem que ad m it i r que aí es tá um texto consistente, coerente c coeso. Aí es tá a fala de um indivíduo capaz dc o lh a r o m u n do com olhos críticos. O au to r introduz o problema apontando o m e do e a preocupação com a segurança pessoal co mo sen tim entos generalizados nos dias de boje em v ir tude da p resença da violência en tre nós. Há cau te la nas afirm ações que faz — se se f izes se um a pesquisa , ficaria flagrante (...) — e prudên cia nas suas generalizações — estam os constan tem ente sob o risco de (...) A art icu lação en tre o p r im eiro e o segundo parágrafo se íaz através da pergunta O que há por trás disso? lançada no final do primeiro. Vem, en tão, a análise, que começa por desca r ta r a respos 99 ta ingênua da percepção m aniqueís ta (de um Ia do, os culpados; do outro, as vítimas inocentes), p a ra , cm seguida, lem brando a complexidade do problema, propor uma explicação mais consisten te. Os argum entos apresen tados são pertinentes e relevantes. A recessão e o desemprego, elemen tos con jun tu ra is da econom ia na época, são in te rp re tados como in tegrantes de um a crise em que os despossuídos não têm a quem vender (...) sua Iorça de trabalho. A p a r t i r dessa colocação, é cabível a avaliação final de que a e s t ru tu ra eco nômica da sociedade é mais in justa que os pró prios marginais. A exemplificação utilizada é in teressante porque retoma e esclarece quem são o vilão e o mocinho, na ótica maniqueísta: o mar ginal, isto é, a classe excluída das relações sociais e o engenheiro, represen tan te da classe média ameaçada e atemorizada. Em suma, o texto é do tado de coerência in- terna — há continuidade, progressão, não- contradição e a r t icu lação dos argum entos ap re sentados; e externa — os a rgum entos ap resen ta dos são compatíveis com a realidade que se pre tende ana lisa r e as relações estabelecidas entre eles correspondem a relações que se podem re conhecer como pertinentes nessa realidade. Além disso, em bora não traba lhando com m aterial in teiramente novo, a análise do problema é m arca da pela pessoalidade, no plano conceituai como no da expressão. Por exemplo, o produtor em pre ga, com adequação, noções como ótica maniqueís- ta e força de trabalho, dem onstrando que não es tá só repetindo expressões em moda nas conver sas intelectuais, m as que sabe do que^e por que 100 está falando. Por o u tro lado, foge da simples e desgastada reco rrênc ia de palavras com o assal- io, estupro , roubo e assassinato, p re fe rindo tipi- licar situações que as traduzem: o risco cie ter nos sa casa assaltada, a filha violentada, o carro rou bado', o marginal que matou o engenheiro. Curiosamente, essa boa dissertação não apre senta, no plano formal, a tradicional divisão em três partes. O para le lo en tre esse texto e tantos outros vistos, form alm ente perfeitos e frágeis de conteúdo, sugere que a paragrafação de acordo com o modelo usual não c condição necessária nem suficiente p a ra a boa qualidade dc um dis cu rso dissertativo. REDAÇÃO N?*77 Violência Social Pensadores de todas as épocas da história teceram múltiplas teorias sobre as possíveis causas da agressão do ho mem pelo homem. Alguns responsabili zaram a "natureza" humana, outros in vocaram a autoria de demônios para nossos atos violentos e, mais recente mente, alguns empenharam-se com fer vor em explicar a violência social a tra vés de fidipo ou da primeira infância. Hoje, sucumbiram todas as iniciativas "científicas" destes senhores, por um motivo simples: todas estas teorias bus cavam causas individuais para um fenô meno social, político. Surgiram, então, os que encontraram na estrutura da so ciedade as raízes da violência social. A estrutura de uma sociedade é de terminada, principalmente, pelo arca bouço econômico de seu funcionamen to. Todos os grandes grupos sociais, até 101 o início deste século, caracteriza ram-se pela divisão em classes da sociedade, distinguindo-sc o que possuía bens ge radores de riqueza daquele que possuía apenas sua força de trabalho. Esse sis tema onde a propriedade dos meios de produção é privilégio de um a minoria, gera, evidentemente, uma serie de con flitos. São classes com interesses dife rentes, inconciliáveis, e como conse qüência natural seus confrontos terão que ser violentos. No nosso mundo atual, esses con frontos são cada vez maiores e mais fre qüentes. Os milhares de palestinos es magados no Líbano, os cinqüenta salva dorenhos assassinados por dia na san grenta guerra civil que se trava hoje, os posseiros assassinados no norte do Bra sil pelos latifundiários, as manifestações e greves violentamente reprimidas: to dos estes quadros nos contam da socie dadeem que vivemos. O inicio do século m arcou o início também dc um a nova era na história da humanidade. As conquistas se sucedem, após o marco inicial dc 1917. O mundo começa, gradual e violentamente, a ca m inhar para uma sociedade sem pro priedade privada, sem classes, sem opressão, onde a violência fatalmente deixará de ser a marca registrada das re lações sociais para se tornar uma peça de museu, uma mancha escura na me mória do homem. A red aç ão 77 tem com o va lo r a fu n d a m e n ta ção consistente de um a posição n it idam ente ideo lógica. E m b o ra essa posição não seja in te iram en te original, o p r o d u to r do tex to se m o s t ra segu ro de suas idéias e as defende com convicção. O 102 le itor pode não se convencer da explicação m a r xista p a ra os conflitos sociais, não p rec isa p a s sa r a c re r na m a rc h a mundial p a ra o socialismo, mas tem que reconhecer nesse texto um a a rg u m entação conduzida com clareza c lógica, apo ia da no conhecim ento da História, cm le ituras e re flexões sobre as questões políticas, sociais e eco nôm icas que p re o cu p a m o nosso tem po (a r e d a ção foi feita em janeiro dc 1983, época em que não se podia se q u e r cogitar do adven to da peres- troika, em b o ra já tivesse sc in ic iado o p rocesso de ap rox im ação en tre a China c o Ocidente, mais ta rde in te rro m p id o pelos episódios da P raça da Paz Celestial de tnaio-junho dc 1989). De início, o texto mcnciona três ver ten tes de explicações p a ra a violência (uma filosófica, o u tra relig iosa e a terceira , psicanalít ica) e as d es c a r ta sob a alegação de que buscam no indivíduo as cau sas de um fenômeno social. E m b o ra as re ferências não sejam muito precisas (sobretudo no p r im e iro caso), elas são feitas dc m a n e ira a p e r m it i r que o le itor reconheça dc que o a u to r e s tá falando. Dando p rossegu im ento ao raciocínio, o tex to contrapõe a essas explicações a teoria marxista da lu ta de classes, considerando-a m ais ad e q u a da p o rq u e s i tu a na e s t ru tu ra social a raiz da vio lência. Vem em seguida um p a rá g ra fo de exem plos variados de m anifestações de violência ex plicáveis pelo conflito de interesses de classes an tagônicas. A conclusão , otimista, ap o s ta no fim da vio lência, com base na convicção dc que o m undo cam in h a p a ra o socialismo, reg im e cm que, não 103 havendo propriedade privada, não haverá m oti vo para confrontos sociais nem, portanto , lugar para a violência. Embora se reconheça aí a voz de um d iscur so com unista ortodoxo e, hoje, até m esm o u l tra passado, tem-se que adm itir a boa configuração deste texto. A coerência in te rna da redação é impecável. Há continuidade e progressão, as idéias não se contradizem e estão bem articuladas. Pode-se con testar sua com patibilidade co m a realidade e x terna: a explicação psicanalítica para a violência hum ana teria m esm o sucum bido? seria mesmo tão insatisfatória quanto o texto sugere? a Revo lução Russa de 1917 teria mesmo inaugurado uma nova era na história da hum anidade? o m un do es taria mesmo caminhando para um a socie dade sem propriedade privada? Entre tan to , tem- se que reconhecer aí um ponto de vista defendi do e respeitado por muitos (o que, aliás, torna o texto relativamente previsível). Mesmo não expressando um a m aneira de pensar inteiramente original, a redação apresenta m arcas de pessoal idade que lhe a tr ibuem grau aceitável de informatividade: são as teorias que busca, os exemplos que lembra, os conhecim en tos a que recorre e, principalmente, a es tra tégia dc fazer alusões não explícitas e completas a con ceitos e fatos, de modo a provocar a participação e o envolvimento do leitor. Trechos como Édipo ou a primeira infância e o marco inicial de 1917 não são dc processam ento autom ático e exigem do leitor o recurso a conhecimentos externos à redação. 104 Os m e c a n ism o s de coesão são b e m e m p re g a dos no texto. Veja-se, p o r exem plo , a re c o r rê n c ia lexical a n a tó r ic a e m m ú lt ip la s teorias/todas estas teorias (1? p a rág ra fo ) e e m seus confrontos/esses confrontos (2? e 3? parágrafos); a substitu ição ana- fò r ica em pensadores/a lguns, outros, alguns/estes senhores (1 ? parágrafo ); o fu n c io n a m en to coesivo de ex p re ssõ es c o m o esse s is tem a (2? p a rág ra fo ) e todos estes q u a d ro s (3? parágrafo) , q u e un if icam sob u m m esm o ró tu lo os e lem entos das passagens an te r io res . A red a ç ão flui n a tu ra lm e n te e com n a tu ra l id a d e p r e e n c h e o m o ld e can ô n ico — tem co m eço, meio e f im . N ão há os a r t ic u la d o re s p rev i síveis pa ra m a r c a r o início e a função de cada p a r te, m a s o l im ite e o e n c a d e a m e n to e n t r e cias são n í t id o s e c o n s t i tu íd o s no p lano conce itua i . A e s t r u t u r a te m á t ic a se m an ifes ta , no p lano form al, pe la sinalização c la ra do tópico de cad a passagem: no p r im e iro parágrafo , pensadores; no segundo pa- . rág ra fo , a es tru tu ra de u m a soc iedade ; no te rce i ro parágrafo , n o nosso m u n d o atual', no ú ltim o pa rág ra fo , o in íc io do século /nova era. Além de tu d o , o tex to é p e r f e i t a m e n te corre - to. N ão há um des lize na grafia , ou n a pon tuação , ou no e m p re g o d o d ia le to p a d rã o . E s te é u m te x to q u e a te n d e p le n a m e n te aos requ is i to s de tex tua l idade , configurando-se com o u m a p r o d u ç ã o l in g ü ís t ic a de b o a q u a l id ad e . redaçAo NV 10 Vida ou Violência Um deputado federal dos mais vo tados em Minas propôs que se distri- 105 buise armas a todos os cidadãos como lorma de combater a violência Seria brilhante sc o ao invcs de pro por armas ao povo, o nosso representan te na câmara sugerise que se estudase uma maneira de se dar casa, trabalho, saúde e bem estar às pessoas. “Violên cia gera violência’', ninguém comtesta c no caso da violência social poder-se- ia dizer que ela e o retrato desta nossa época, onde a propia vida e confundida com violência O cidadão hoje prá conseguir sobre viver ele tem que ser violento a toda ho ra e em lodp lugar: Ele tem que invadir um terreno; ele tem que furar as filas e tem que passar por cima dos outros As causas da violênçia social são fa- çeis de descobrir as soluções no momen to e que parecem distantes, pois enquan to os nossos políticos, que tem a missão de resolver os problemas sociais estive rem no nível do deputado das armas, ainda vai haver muita violência e menos vida. Essa redação foge do padrão conceituai que vigorou no corpus. Não identifica a violência com assaltos e estupros, não a considera decorrente do êxodo rural, da marginalização e do desem prego, nem propõe como solução a conscientiza ção c o am or ao próximo. A introdução, incisiva, se m ostra ap ta a sus citar no recebcdor a vontade de prosseguir na lei tura. Desde o início o produtor do texto se reve la bem informado c atento às questões sociais e políticas. No desenvolvimento, deixa t ranspare cer senso crítico e, mesmo, um certo senso de hu mor, na medida em que, por exemplo, utiliza com 106 iron ia o velho clichê: “ violência gera violência". A conclusão é compatível com o raciocínio expos to e m an tém o tom irônico que p erpassa toda a composição. É in te ressan te o b se rv a r as relações en tre o texto e seu título, que não reproduz simplesmenteo tem a dado, m as se adequa com m uita pert inên cia à a rgum en tação desenvolvida. O vcstibulan- do propõe vida (casa, trabalho, saúde e bem-estar), o deputado das arm as propõe violência. Por contra-sensos desse t ipo é que nesta nossa época (...) a própria vida é confundida com violência. E, se p reva lece r a opin ião do deputado, inevitavel m en te ainda vai haver m uita violência e m enos vida. Esse é o u tro texto que flui com n a tu ra l id a de. Sua boa e s t ru tu ra ç ã o não se p rende ao m o delo prescrito nas au las de d issertação (anunciar t rê s pontos na in trodução; t r a ta r dc cada u m em um parágrafo do desenvolvimento; co m eça r a conc lusão com a r t ic u lad o r típico explícito). As idéias se distribuem adequadam ente nos parágra fos, obedecendo a um a organização particu lar: a in tro d u ção a p re se n ta u m a p ro p o s ta instigante; os dois parág ra fos do desenvolvim ento tecem cons iderações cm to rn o dessa p roposta , b uscan do d e m o n s t ra r o q u an to ela rep resen ta um a po sição equivocada; a conclusão, com o m esm o in tu i to do desenvolvimento, en ce r ra o assun to ap o n tan d o as conseqüências nefas tas que a ado ção de tal p roposta t ra r ia . Além da na tu ra l idade , o texto é m arcado pe la coloquialidade, manifesta, por exemplo, no tom irôn ico e nas generalizações h iperbólicas do ler- 107 ceiro parágrafo, expressas num período cuja sin taxe é tipica de língua oral (cf. a topicalização dc o cidadão e a re tom ada desse termo pelo anafó- rico ele, repetido trcs vezes): O cidadão hoje prá conseguir sobreviver ele lern que ser violento a ioda hora e em todo lugar: Ele tem que invadir um terreno, ele tem que fu rar as filas e tem que passar por cima dos outros. Essas afirmações constituem, evidentemen te, exageros. Não podem ser tomadas ao pc da le tra, mas devem ser entendidas como força de ex pressão. É o tom descontraído do texto (apesar do poder-se-ia) que me faz avaliar esses exageros como recurso dc argum entação e não como fa lha quanto à exigência de não-contradição com o mundo real. Essa redação, inegavelmente de bom padrão de textual idade, coerente, coesa e, sobretudo, com bom índice de informatividade, apresenta erros de ortografia e pontuação que costum am assus tar os professores. Esse contraste merece um a re flexão. A ortografia e a pontuação nada tem a ver com a essência, a substância do texto, com o tex to em si. Têm a ver apenas com a m aneira de representá-lo através do código escrito. Se o tex to fosse lido cm voz alta, o ouvinte não percebe ria nele qualquer defeito. No entanto, esses as pectos, com freqüência, sc colocam como barre i ra intransponível para o professor avaliador. Diante de uma grafia em desacordo com as re gras, o professor não percebe mais nada, se re cusa a pene tra r no texto. Essa inversão no julga mento — a supcrvalorização da aparência c o des prezo à substância — vai encontrar seu corres 108 pondente do lado da produção. O a luno acaba por en te n d e r que, p a ra a escola, o m ais proveitoso é faze r um a redação certinha, a inda que frágil de conteúdo. 109 CAPITULO 6 U M A V I S À O G L O B A L D O C O R P U S Insp irando-m e na escala de três ordens p ro posta por B eaugrande e D ress le r (1983: 144-146) p a ra o ju lgam ento da informatividade, avaliei as cem redações do corpus seguindo um a escala ta m bém triádica. Classifiquei as redações como tex tos dc bom, m édio ou baixo padrão, ana lisando a realização dos fatores de textualidade aqui con siderados, segundo os cr ité r ios expostos. A fim de es tabe lece r um para le lo e n t re a m inha p roposta dc avaliação da tex tualidade e os p a râm e tro s usua lm ente de mais peso na a tr ibu ição de no tas escolares, elaborei um a t a bela dc que constam , além dos fa to res com que trabalhei, a e s t ru tu ra ç ã o formal, em term os de d is tr ibu ição física dos parágrafos , e a correção g ram atical. 111 Quanto à distribuição dos parágrafos, obser vei se os textos apresentavam, como par tes cons titutivas, um a introdução, um desenvolvimento e uma conclusão, já que era essa a exigência do program a do vestibular. Classifiquei com o de bom padrão aqueles que exibiam essa o rganiza ção formal; como de padrão mediano, aqueles em que se podem reconhecer essas três partes no ní vel conceituai, ap esa r de elas não se m ostra rem separadas no plano gráfico; como de baixo padrão aqueles cuja paragrafação não se m ostra com pa tível nem com o modelo u&ial nem com o conteú do semântico do próprio texto. No que tange à correção gramatical, utilizei- me das notas, relativas a esse quesito ob tidas pe las redações. No vestibular, foram reservados se te pontos p a ra a avaliação desse aspecto: a) dois para a es tru tu ração de períodos (sendo pe nalizada a falta de oração principal e de o r a ção subordinada necessária, a falta e o uso ina dequado de palavras de transição e de referên cia en tre parágrafos e orações, a falta de pa ralelismo s in tá tico ou semântico); b) dois pa ra a morfo-sintaxe (penalizados os ca sos de concordância , regência, colocação pre- nominal e emprego das formas verbais que não correspondessem à norm a padrão); c) u m para a pontuação (penalizados o em prego e a falta de vírgula e dois-pontos em desaco r do com as regras mais usuais, bem como a au sência de pontuação em final de período); d) dois para a o r tografia e a acen tuação (penali zadas as desobediências às regras oficiais). Como a análise da correção gram atical dos 112 textos não se incluía en tre as m etas deste t r a b a lho, não vi p roblem a em reco rre r às notas a t r i bu ídas por exam inadores tre inados na obediên cia de cr i té r ios p reviam ente estabelecidos p a ra a apuração de falhas objetivamente mensuráveis. Assim, classifiquei com o de bom pad rão as reda ções que som aram de 5 a 7 pontos; de padrão me diano, as que obtiveram 3 ou 4 pontos; de baixo padrão, as que ganharam de 0 a 2 pontos. Foi a seguinte a tabela resu ltan te dos proce d im entos dc classificação descritos: TABELA 3 AVALIAÇÃO GLOBAL 0 0 CORPUS Fatores dc avaliação D istribuição dos textos analisados % de textos de boin padrão % dc textos dc padrão m ediano *o dc textos dc baixo padrão Coerência 14 62 24 Coesão 25 65 10 Inform atividade 11 16 73 E stru tu ração form al 90 3 7 Correção gram atical 44 41 15 No que respeita à coerência, componente de cisivo da textualidade, encontrei apenas 14 reda ções dc bom nível. A maioria ficou na faixa in te rm ediár ia e quase um quarto da am ostra exi biu a lgum a fa lha grave com relação a esse fator. 113 No caso da coesão, a distribuição, nos extre mos, se inverte. A m aior parte (65%) se localiza também na faixa mediana, mas 25% das redações não trazem problema com prom etedor 1 1 0 uso dos recursos cocsivos, ao passo que só em 10% o em prego dos mecanismos de coesão se m ostra insa tisfatório. Quanto à informatividade, conform e se viu no estudo quantitativo, há um deslocam ento da concentração de textos para o p a tam ar mais bai xo da escala: 73% tem poder informativo insatis fatório, 16% se mostram não mais que aceitáveis e apenas I I % exibem boa qualidade quan to a es se aspecto. A es tru turação formal foi, dos fatores incluí dos nessa tabela, o q u e apresentou mais a lta fre qüência de redações na faixa superio r (85%) e mais baixa na faixa inferior (7%). Sob o aspecto da correção gramatical, as re dações se concentram,com dis tr ibu ição quase equivalente, nos patam ares mais altos (44% e 41%); apenas 15% dos textos ocupam a posição inferior. Que inferências sc podem t i ra r dessa tabela? A maioria dos textos tem padrão mediano de coerência e coesão. Quanto a esses fatores, tomando-se os percentuais relativos aos textos de funcionamento médio e bom, tem-se 76% para a coerência e 90% para a coesão. Entretanto, o mes mo cálculo resulta em apenas 27% para a infor- matividade. Já para a estruturação formal obtem- se 93% e, para a correção gramatical, 85%. Esses resultados indicam, em primeiro lugar, que os aspectos formais foram os que alcançaram 114 m e lh o r rea lização nas redações. São e levados os índices de textos em que a coesão (concernente à e s t ru tu r a dc superfície), a p a rag ra façã o e a cor- reção g ra m a t ic a l têm p a d rã o aceitável ou bom. Isso significa que a m a io r ia das red açõ es é do ti po certinho c a rrum ad inho , feito p a ra a te s ta r que o p rod u to r dom ina a língua padrão formal escrita c sabe o rgan iza r as idéias confo rm e o m odelo ca nônico de d isse r tação . Ou seja, naqu ilo que d e pendia do t re inam en to escolar, a m aio ria dos ves ti bu landos se sa iu bem. Em c o n t ra p a r t id a , a in fo rm ativ idade tem funcionam ento insatisfa tório num a porcentagem alta de redações (73%). A su b m issã o ao t re in a m en to te ria o cu p ad o o espaço da o r ig ina l idade e do con tro le efetivo do explíc ito c do implícito no texto? A prev is ib il idade é g rande . Como já m ostre i no cap ítu lo an te r io r , 45% dos textos são p ra t ic a m ente iguais. O índice de re co r rê n c ia dos a rg u m en tos tam b ém é alto. Por exemplo, 33% das re dações d ec la ra m que a v io lência c a ún ica fo rm a de sobrev ivência do pobre , obrigado a roubar e a m a ta r para comer, 31% m en c io n am o d esem prego com o cau sa da violência, sendo que 16% afirm am ou sugerem que todo desem pregado aca ba se to rn an d o assa l tan te ; 53% a t r ib u e m a vio lência à fa lta dc am or, à ganância , à am bição , ao egoísmo, enfim , à m a ld ad e hum ana; 19% reco m en d am com o so lução que os hom ens parem pa ra pensar e se consc ien tizem , ao passo que 22%, em ú lt im a instância , co n s id e ram que só o a m o r constrói. 115 O problema corrc la to à freqüência dc idéias anônimas e desgastadas, de estereótipos e clichês, é o que chamei dc insuficiência dc dados. É com preensível que quem reproduz idéias alheias e muito difundidas não veja a necessidade de explicá-las ou discuti-las. Daí a grande incidên cia dc conceitos vagos c noções im precisas nas redações (89% delas sequer esclarecem o que en- tedem por violência social, tema sobre o qual dis correm). É na tura l que quem se contenta em re petir o que apenas ouviu dizer não tenha outro recurso senão aludir superficialmente a fatos que não conhece d ire ito e que não pode identificar. Daí as referências nebulosas de que as terras e guerras da redação 85 são exemplo típico. A coerência merece considerações mais demo radas. 76% dos textos a realizam num padrão me diano ou bom. Na verdade, nenhum a redação se m ostra absolutam ente incoerente, nenhum a de las poderia ser considerada não-texto, apesar de 24% apresen tarem falhas que mc levaram a julgá- las com um nível insatisfatório de coerência. Para melhor compreensão do fenômeno, é in teressante re tom ar com entários feitos a propó sito da Tabela 1. Constatou-se ali que três aspec tos relativos à organização conceituai interna do texto (continuidade, progressão e não-contradição interna) se m o s tra ram problemáticos num per centual relativamente baixo de redações (em tor no de 30%), ao contrário dos aspectos concernen tes às relações en tre texto e realidade, que se apresentaram falhos em mais da metade das com posições analisadas (64% para a condição de não- contradição externa e 56% para a de pertinência 116 da a r t icu lação es tabelecida en tre fatos e concei tos). Quanto à organização interna, só o requisi to de p resença de art icu lação se m ostrou falho em percentual elevado de redações (56%, coinci dentemente). É preciso, ainda, lem b ra r a lguns resultados da Tabela 2. As falhas mais freqüentes quanto ao em p reg o de recursos coesivos foram a incom pa tibilidade léxico-semântica (43%) c a inadequa ção no uso de m ecanism os de junção (36%). Não interessa, no momento, cons ide ra r o percen tua l de 32% relativo ao em prego de pronom es anafó- ricos e que diz respeito, na m aioria dos casos, à d iscordância en tre pronom e e antecedente. A associação de todos os elem entos aqui apon tados conduz a um diagnóstico. A com posi ção in terna do texto não foi o m aior problema en co n trad o no corpus. A g rande dificuldade de tec tada se localiza no âm bito das relações en tre o texto e a realidade. Falando com mais precisão: a m a io r par le das redações, enquan to produções isoladas, ap resen tou qualidade razoável, ou se ja, t inha correção g ram atical, observava a para- g ra fação cons iderada adequada, exibia bom ín dice de coesão e, p rincipalm ente, e s tru tu rava-se sem ofensas m aiores à lógica, no plano concei tuai interno. E n tre tan to , a maioria dessas red a ções m ostrava falhas com prom etedoras , que de gradavam sua textual idade, quando se confron tavam suas af irm ações com a realidade c i rcu n dante: a) ou porque contrad iz iam o que se reco nhece como verdade nessa realidade; b) ou p o r que relacionavam fatos e conceitos de m aneira incompatível com as relações que eles norm al I 17 mente assumem no mundo real; ou porque não ultrapassavam as informações mais óbvias e re dundantes sobre essa realidade, não se m ostran do capazes de acrescentar conhecimentos ou tra zer interesse ao leitor. Resumindo, as redações, em sua maioria, apresentam um arcabouço formal e conceituai aceitável. Configuram-se como todos completos, dotados dc continuidade e progressão. Mantêm certa lógica interna e se organizam conforme o modelo previsto para dissertações, além dc exi birem nível satisfatório dfe correção gramatical. Entretanto, a impressão que se tem após sua lei tura é que sc tra ta dc maus textos, pobres, sim plistas, insípidos, quase todos iguais, muitos de les eivados de impropriedades. São textos que não agradam, não convencem, não entusiasmam. Essa avaliação que a mera intuição sugere, a pesquisa confirmou e precisou: o grande pro blema da maioria das redações não se localiza na superfície textual, nem mesmo nos aspectos lógico-semânticos da es tru tu ra subjacente, mas sim nos aspectos cognitivos que integram a ma- croestrutura e pesam na eficiência pragmática do discurso. As condições de textualidade que com maior freqüência tiveram realização insatisfatória no corpus foram aquelas mais d iretam ente relacio nadas com o conhecimento de mundo. A não- contradição externa externa e a pertinência da articulação entre fatos e conceitos denotados de pendem dc o estoque de conhecimentos apresen tados no texto ser compatível com aquilo que o recebedor reconhece como verdadeiro e pertinen 118 te no m undo real. Por sua vez, a imprevisibilida de e a suficiência de dados dependem de conhe cim entos ex tra texto do p ro d u to r porque são eles que vão lhe possibilitar medir e equilibrar no tex to o original e o previsível, bem com o o implíci to e o explícito. Até no p lano de coesão os recursos cujo em prego se m ostrou falho num percentual m aior de redações têm a ver com a com patib ilidadeen tre conhecim entos do p ro d u to r e do recebedor. A contradição léxico-semântica não se restringe aos limites da expressão lingüística de superfície, tem a ver com a m a c ro e s t ru tu ra conceituai. O mes mo o co rre com o em prego indevido de m ecanis mos de ju n ç ão e de a r t icu lado res , que es tabele ce re lações inaceitáveis en tre fatos e conceitos. Ê bom insis t ir aqui quan to à ponderação de que essas ocorrências se configuram com o falhas em função d as espccificidades do tipo textual. Num texto dissertativo escrito e fo rm al a precisão vo ca b u la r e a adequação na expressão dc relações ê exigência cabível; num o u tro tipo dc texto, po de não (i ser. As redações analisadas, na medida em que não ag radam o recebedor, podem ser considera das textos de fraca eficiência pragmática. São pro duções que logram se sa fa r da dificuldade de, de improviso, d isco rre r em 120 pa lav ras sobre um tema não escolhido, para um in terlocutor não de sejado, dem onstrando capacidade de organização das idéias e domínio aceitável da m odalidade es c r i ta da língua padrão. C um prem suas obr iga ções. Mas são todas m uito parec idas, não pos suem altas virtudes nem graves defeitos. Atendem 119 razoavelmente às exigências do programa do con curso, dc modo a não inviabilizar a aprovação do candidato — a nota da maioria delas é seis, a me tade dos pontos reservados para a redação, con forme se viu no capítulo 3. Entretanto, se não há como reprová-las, não há também como gostar delas. Ê verdade que, se o objetivo do produtor de cada uma delas não ia além da pretensão de não ser desclassificado no vestibular, esse intuito foi plenamente alcançado. As circunstâncias adver sas da situação de produção foram satisfatoria mente controladas e a aceitabilidade do recebc- dor desconhecido e compulsório, nos limites pre tendidos, loi alcançada. O problema é que não se tem aí o produto de uma verdadeira intenção co municativa, não se tem aí, como diria Pécora (1983), um texto capaz de instaurar uma legítima relação intersubjetiva dc significação. 120 CONCLUSÃO Através da pesquisa relatada, constatei, por um lado, que as deficiências responsáveis pela de gradação do nível de textualidade das cem reda ções analisadas se situam na e s tru tu ra lógico- semântico-cognitiva subjacente. As falhas que sc m ostraram mais relevantes, dos pontos de vista quantitativo e qualitativo, dizem respeito espe cificamente à informatividade c a dois requisitos de coerência (a não-contradição externa e a a r t i culação) c tem a ver, mais propriamente, com os aspectos cognitivos da m acroestru tu ra . Por ou tro lado, verifiquei que, no plano da superfície textual, foi satisfatório o desempenho dos integrantes da amostra. As redações, em ge ral, exibiram bom nível de coesão. Só tiveram fre qüência relativamente considerável as falhas re ferentes à adequação vocabular (43%), ao em pre go de mecanismos de junção e de articuladores (36%) e ao uso de pronomes anafóricos (32%), so bretudo no que sc refere à concordância entre o pronome e seu antecedente. 121 Alem disso, o exame de dois aspectos ex ter nos à substância do texto — a distribuição dos pa rágrafos e a correção gram atical — me levou a cons ta ta r que: a) a quase totalidade (90%) das re dações obedeceu ao modelo precstabelecido, compondo-se das três parles tradicionais previs tas para a dissertação; b) a grande maioria dos tex tos (85%) apresentou-se com nível mediano (41%) ou bom (44%) quan to à adequação gramatical. A leitura minuciosa de cada texto e a análise das no tas concernentes à correção id iom ática das reda ções deixaram claro que os problem as nessa área são irrelevantes, tanto em term os de quantidade quanto cm relação aos prejuízos que possam acar re ta r para a qualidade das produções. Essas re dações, se corrigidas ou passadas a limpo sem er ros gramaticais, não se to rn a r iam textos melho res, mais convincentes ou mais interessantes, não teriam o seu g rau de textual idade elevado. Em síntese, posso afirm ar que o desempenho dos vestibulandos cu jas redações estudei revela razoável sucesso na aprendizagem dos aspectos envolvidos na p rodução de texto que dependem de instrução e treinamento. Esse sucesso me pa rece mais relevante quando se considera que os integrantes da am ostra , em sua maioria, não se subm eteram à p reparação intensiva dos cursi- nhos nem puderam , à época do vestibular, dedi car seu tempo in te iram ente aos estudos, porque trabalhavam e contribuíam para a renda familiar (cf. capítulo 3). É significativo que estudantes que, em sua maioria, passaram apenas pelo ensino re gular, sem receber um tre inam ento especializa do, tenham dem onstrado domínio satisfatório da 122 x língua padrão escrita e do modelo formal usual mente adotado para textos dissertativos. A esco la ensinou e eles aprenderam a expor seu pensa mento em linguagem correia e organizado segun do um padrão convencional. Entretanto, apesar disso, as redações, em sua maioria, não constituem o que se pode chamar de bons textos. São peças que não agradam nem convencem, em razão de suas deficiências quan to à informatividade e à coerência. Neste ponto é interessante voltar os olhos para a composição da amostra novamente. Os produtores das reda ções tinham o 2? grau completo e já haviam pas sado por uma seleção no vestibular, pois tinham sido aprovados na primeira etapa, eliminatória, e estavam fazendo as provas da segunda etapa, classilicatória. É. significativo que sequer esse grupo selecionado tenha sido capaz de produzir textos de boa qualidade na hora do vestibular. Cabe, agora, indagar porque, nas redações analisadas, à boa utilização dos recursos formais não correspondeu uma configuração conceituai condizente. A contingência de escrever de improviso, so bre um tema imposto, para um recebedor temi do e desconhecido, pode explicar o baixo teor in formativo e a fragilidade da cocrcncia externa das redações. Sua alta previsibilidade tem a ver com o que Pêcheux (1969: 16) chama de “ invariantes semântico-retóricas” resultantes das condições de produção. O próprio tema proposto era pre visível e decorrente do contexto histórico-político; o contexto imediato — prova de vestibular — de 123 maneira alguma favorecia uma reflexão persona lizada que possibilitasse fugir do lugar-comum. A tensão e o nervosismo bloqueiam o surgimen to de idéias e, então, o melhor a fazer é trabalhar com as que primeiro vêm à cabeça, exatamente aquelas que estão na boca de todo mundo. Interferem ainda no processo de produção elementos anteriores ao seu desencadeamento, mas de peso marcante no seu desenrolar. Refiro- me à ação da família e da escola na história pes soal e na preparação específica do vestibulando. A ideologia dominante qifer fazer crer que há sempre um jeito certo de fazer as coisas: um jei to certo de enxergar e interpretar a realidade, um jeito certo de pensar. A partir daí buscam-se as receitas, as fórmulas, as fôrmas. Paralelamente, vem o medo de arriscar qual quer coisa diferente, fora do normal. Por várias vezes colhi o depoimento de calouros da Univer sidade, de áreas diversas (Letras, Engenharia, Computação) sobre a orientação recebida em co légios e cursinhos quanto à redação do vestibu lar. A recomendação é não dizer nada que possa comprometer, não ousar formular nenhuma opi nião individual que fuja do padrão; é mostrar-se neutro e comedido. Teme-se que a subjetividade na abordagem do tema seja considerada incapa cidade de dar tratamento racional e isento a uma questão, por isso recomenda-se a absoluta impes soalidade.Essa receita, como se viu, dá bons re sultados, em termos de aprovação no concurso. Enseja uma longa série de redações iguais, de no ta média e textual idade mediana... Não há saída: como ser interessante e convincente falando coi 124 ' sas que não vem de dentro, defendendo posições em que não se acredita? A alta incidência de falhas quan to á condição de suficiência de dados tam bém encon tra expli cação nas c ircunstâncias em que as redações fo ram elaboradas. Por mais previsível que fosse o tema, não havia possibilidade de u m a preparação efetiva p a ra escrever sobre ele na hora em que foi conhecido. Não havia como colher e analisar in formações específicas sobre o assunto . Não era possível trocar idéias com a pessoa do lado — um concorrente. Não havia tempo, nem tranqüilida de psicológica, para ap ro fundar a reflexão ou pa ra tentar recobrar dados perdidos na memória. Pe lo contrário , era preciso t ran s fo rm ar im ediata mente o material cognitivo disponível cm um a re dação cuja e s t ru tu ra formal estava previam ente determ inada, num exercício quase que au tom áti co de preenchimento de esquem as16. Essa limita ção e essa prcmência, típicas da s ituação de p ro va e freqüentes nas c ircunstâncias usuais de ela boração de redações escolares, não condi/em com o processo natural de produção de texto. Quem escreve, por gosto ou por profissão, escolhe seu assun to c sobre ele se informa, discute, pensa c repensa. Tem meios de am pliar e ap ro fu n d a r sua compreensão, tem tempo dc am ad u rece r suas idéias. No vestibular (c, geralmente, na escola) na da disso pode acontecer. Assim, a superficialida de dc conhecimentos, as alusões a fatos não ca racterizados, a imprecisão dc alguns conceitos c o recurso a “noções confusas", ca ren tes dc "es pecificidade semântica" (cf. Pécora, 1983: 76-77), enfim, os problem as identificados como insufi ciência de dados, que dctcctci nas redações, po- 125 dcm ter sua origem num literal e legitimo não ter o que dizer naquele momento. No âmbito da coerência, as falhas mais sig nificativas encontradas podem ser atribuídas, principalmente, à associação dos fatores aponta dos para explicar os problemas relativos à infor matividade. Muitos textos apresentaram interpre tações sobre a questão da violência social que me pareceram impertinentes ou incompatíveis com a realidade. A tensão psicológica e a pressa em compor um a opinião p a ra p reencher a folha dc prova certam ente a tuaram no sentido de dificul tar uma análise mais deticía e mais consistente. Além disso, se a recomendação explícita de pro fessores e manuais de redação é .ser objetivo e evi ta r vivências e posições pessoais, a solução é re correr aos estereótipos mais facilmente disponí veis, sem atinar para o quanto eles são preconcei tuosos e falseadores da realidade17. A essa orientação, reiterada duran te o perío do escolar, se alia a artificialidade das condições mais freqüentes de produção dc redação (escre ver sem se preparar, sobre um tem a imposto, pa ra um recebedor indesejado que não será leitor, mas juiz, dentro de um prazo cu r to c predeterm i nado, sem possibilidade de revisão e reelaboração do próprio texto). 0 resultado é uma concepção errônea, inadequada, do p róprio ato de escrcvcr. Produzir um texto, especificamente, um texto dis ser tativo, requer, antes do trabalho braçal dc en cher folhas dc papel, a construção dc uma opinião personalizada sobre o tema a s e r tratado. O pro cesso natural dc produção começa, na verdade, com a escolha pessoal do lema (escrevo sobre um assunto a respeito do qual tenho algo a dizer) e 126 - inclui a busca de informações, a discussão com pessoas interessadas, o debruçar-se sobre os da dos a fim de compor um a análise m adura e con sistente. O ato mecânico de escrever ê uma etapa posterior, embora não seja a ultima. Depois de es crever, vem o rever, o repensar, o reescrever, até que se considere o texto finalmente pronto. Evidentemente, isso não é possível numa pro va de vestibular. Mais im portan te do que ques tionar a validade da prova de redação no vesti bular, no entanto, é questionar o treinamento de senvolvido na escola com vistas a superação dessa prova. O perigo é que o superd im ensionam ento da im portância desse exam e acabe direcionando o ensino a te de I? grau. São em geral reproduzi das em sala de aula as m esm as condições inade quadas de e laboração que se têm duran te um a prova de concurso. Em geral não se enseja ao alu no a possibilidade de c o n s tru i r seus textos num processo natural , que lhe renda a familiaridade com a produção escrita , a descoberta dos p ró prios m étodos de cr iação e, enfim, o desenvolvi m ento da p rópria com petência textual intuitiva. Ao contrário , em geral, impõe-sc-lhe um ad e s tra m ento em pobreccdor que o leva a ac red ita r que escrever (ou, pelo menos, escrever para a escola) se reduz ao exercício enfadonho de preencher “30 linhas em 50 minutos", como diz Sami Mesera- ni, no único esforço de e n q u a d ra r num modelo prévio palavras e idéias que têm chance de ag ra d a r ao professor. Para m im , as redações ana lisadas neste t r a balho, em sua maioria certinhas e arrumaclinhas, mas desinteressantes e inconsistentes, são o fruto 127 inevitável das condições de produção a que foram su b m e tid o s seus au to res , não só na h o ra do ves tibu lar , mas, provavelm ente , na m a io r ia das ve zes em que e sc rev e ram na escola. Assim, o que essa análise sugere é que é hora de m u d a r a rota, cs tabclecer novos objetivos para o ensino da língua materna. No campo da redação, a asp iração não pode se res tr ing ir a poss ib il i ta r aos es tudan tes o dom ínio da m odalidade escrita d a língua culta e a fornecer-lhes modelos fixos dos d iferen tes tipos de discurso. Essas m etas vêm sendo perseguidas há tempds c esta pesquisa reve lou que, no caso da am o s tra analisada, tal missão foi cu m p rid a com sucesso. Mas, por o u t ro lado, a pesquisa dem onstrou tam bém algo que o simples bom senso já fazia prever: a correção id iom ática e a organização segundo um modelo não são sul i- c ientes para g a ra n t i r boa qualidade a u m texto. O g rau de textualidade de um a produção lingüística é decisivamente determ inado por sua coerência. O fator que tem peso p reponderan te em sua eficiên cia pragm ática é a informatividade. Esses com po nentes (como os defini neste trabalho) se localizam no plano lógico-semántico-cognitivo, e não no formal, que tem m erec ido a tenção p redom inan te n a escola. É hora, pois, dc a s su m ir nova á rea de trabalho, p a ra d a r con ta da globalidade do fenô m eno da interação com unicativa, considerando o texto em suas três d im ensões básicas: a formal, a conceituai e a pragm ática . T ra b a lh a r n e s sa á rea é, sim, ta re fa espec íf i c a do p rofesso r de po r tuguês , pos to q u e é bus c a r o desenvolvim ento pleno da co m p e tên c ia co m unicativa n a tu ra l do aluno. 128 NOTAS 1. Este liv ro é o resumo de dissertação apresentada ao curso de Pós-Graduação da Faculdade de Letras da UFMG para obtenção do grau de mestre em Língua Portuguesa. 2. Cf. Halliday e Hasan (1978: 1-2). 3. O conceito de texto aqui formulado segue, em linhas gerais, o pensamento de Schmidt (1978: 163-187). 4. Cf. Widdowson (1981: 56). 5. Cf. Pcchcux (1969: 16-23). 6. Cf. Gnerre (1985: 22). 7. Cf. Schmidt (1978: 60). 8. Cf. Mira Mateus ct alii (1983: 186). 9. Ci. Lang (1973) apud Conte (1977: 104-105). 10. Apud Beaugrandc c Dresslcr (1983: 118-123). 11. Maingueneau(1976: }9), apud Koch (1986: 40). 12. Para maior aprofundamento, ver Koch (1986) e Gui marães (1986). 13. Para maior aprofundamento, ver Liberato (1980). 14. A transcrição é integral e ipsis litteria. As redações são identificadas pela numeração, de I a 100. 15. Seria particularmente interessante um estudo da inlerlextualidade nesta redação. 16. A propósito, ver Lemos (1977). 17. A propósito, ver Almeida (1986). 129 BIBLIOGRAFIA 1 Almeida. Cuido dc. O professor que não ensina. São Pau lo. Summus, 1986. 2. Bastos, Lucia K. X. Coesão e coerência em narrativas es colares. Campinas. Unicamp, 1985. Col. Teses. 3. Beaugrande. Roberl-Alain de e Dresslcr, Wolfgang U. In Iroduction ro Texl Linguistics. 2? imp., Londres. Longman, 1983. 4. Charolles, Michel. "Introduction aux problêmes de la co- hcrence des texles”. Langue (rancaise. Paris, Laroussc, 38: 7-41, maio de 1978. 5. Conie, Maria-Elizabeth (org.) La linguislica tesmale. 13 ed., Milão, Feltrinelli Econômica, 1977. 6. Elias, Margarothe S. “Mecanismos sintálico-scmánticos da cocsão textual — contribuições lingüísticas ao ensino da redação”. In V Fncontro Nacional de Lingüística. Rio de Janeiro. PUC, outubro de 1981 (Anais...), vol. I, pp. 44-54. 7. Fávero, Leonor L. “A informatividade como elemento de textualidade”. Letras cie hoje. Porto Alegre, PLC-RS. 60: 13-20. junho de 1985. S ._____ . "Intcncionalidade e aceitabilidade como critérios dc textualidade”. In Fávero. Leonor L. e Paschoal. Mara $. Z. (orgs.) Lingüística textuaVTexto e leitura. São Paulo, EDUC. 1986 (Série Cadernos PUC. 22), pp. 31-37. 9. F ávero. Leonoi L. e Koch, Ingedore G. V. Lingüística tex tual: introdução. São Paulo, Cor tez, 1983. 10. Fulgêncio, Lúcia. "Exame da conceiluaçào de anáíora e das suas relações com as noções de dado/novo". En saios de lingüística. Belo Horizonte, FALE/UFMG, 5 (9): 71-93, dezembro de 1983. 131 11. Garcia, Othon M. Comunicação em prosa moderna. 6a ed., Rio dc Janeiro. Fundação Gctúlio Vargas, 1977. 12. Geraldi. J. Wanderley (org.). O texto na sala de aula: lei tura <& produção. 2‘? ed., Cascavel, ASSOESTE, 1985. 13. Gnerre, Maurizzio. Linguagem, escrita e poder. São Paulo, Martins Fontes, 1985. 14. Guimarães, Eduardo J. "Polifonia e tipologia textual”. In Fávero, Leonor L. c Paschoal, Mara S. Z. (org.). Lingüís tica textual/Texto e leitura. São Paulo, EDUC, 1986. (Sé rie Cadernos PUC, 22). pp. 3945. 15. Halliday, M. A. K. e Hasan. R. Cohesion in F.nglish. 2? imp., Londres, Longman, 1978. 16. Ilari, Rodolfo. "Uma nota sobre redação escolar”. In _____ A lingüística e o ensino da língua portuguesa. São Paulo, Martins Fontes, 1985* pp. 51-66. 17. Isenberg, Horst. "Riflessioni sulla teoria del testo”. In Conte, Maria-Elisabeth. La lingüística tesiuale. Milão, Fel- trinelli Economica, 1977, p p . '66-85. 18. Jakobson, Roman. Lingüística e comunicação. 6? ed., São Paulo, Cultrix, 1973. 19. Koch, Ingedorc G. V. "A situacionalidade como elemen to da textualidade”. Letras de hoje. Porto Alegre, PUC-RS, 60: 21-28. junho de 1985. 20 . _____ “A intertextualidade como fator da textualida- de”. In Fávero, Leonor L. e Paschoal, Mara S. Z. (orgs.). Lingüística textual/Texto e leitura. São Paulo, EDUC, 1986 (Série Cadernos PUC, 22), pp. 39-45. 21.Lang, Ewald. "Di alcunc difficollà nel postulare una 'grammatica del testo' ”. In Conte, Maria-Elizabeth (org.). La lingüística tesiuale. I ? ed., Milão, Fcltrinclli Economi ca, 1977. pp. 96-120. 22. Lemos, Cláudia I . G. "Redações no vestibular: algumas estratégias”. Cadernos de pesquisa. São Paulo, Fundação Carlos Chagas (23): 61-71, dezembro de 1977. 23. Libcralo, Yara G. Sobre a oposição dado/novo. Be lo Horizonte, FALE/UFMG, 1980 (dissertação de mes trado). 24. Marchuschi, Luiz Antônio. Lingüística de texto: o que é e como se faz. Recife, Universidade Federal de Pernam buco/Mestrado em Letras e Lingüística, 1983. 25. Mira Mateus, M. Helena et alii. Gramática da língua por tuguesa. Coimbra, Almedina, 1983. 26. Pêcheux, Michel. Analyse automatique du discou rs. Pa ris, Dunod, 1969. 27. Pécora, A. Alcir B. “Redações no vestibular: estudo do período — uma proposta pragmática". Cadernos dc Pes quisa. São Paulo, Fundação Carlos Chagas, (23): 29-36, de zembro de 1977. 28 . _______ Problemas de redação. São Paulo, Martins Fon tes, 1983. 29. Perini, Mário A. The Effect of Discourse Topics on lhe Interpreiation o f Anaphoras. Belo Horizonte, FALE/UFMG, 1982. (artigo apresentado no 6th AI LA Congress. Lund, Suécia, agosto de 1981). 30. Schmidt, Siegfried J. Lingüística c teoria do texto. São Paulo, Pioneira, 1978. 31. Widdowson, H. G. "Le discours”. I n _____ . Une appro- che com m unicative de l ’en$eignemeni des langues. Paris. Hatier-Crédif, 1981, cap. 2, pp. 32-68. 133 Títulos d a co leção Elementos de p e d a g o g ia da leitura E zcquid T tia Silva A redação na escola Ej»lè Fr.mclu A rgum entação e d iscurso politico Haquira Osakahe O espaço d a ora lidade na sa la de a u la Jânia M Ramos O processo de a lfa b e tização Claudia Maria M endes Gontijo Problem as de redação Alcir Pecon» O ap ren d iza d o d a leitura M an Kato A produção d ia ló gica do texto escrito Incz Sautchuk Educação: as falas dos sujeitos sociais Nadia Gaiofatto G onçalves V o ze s e silêncios de m eninos de rua Rosa Helena Blanco M achado Recontando histórias na escola Sandoval Nonato Gomes-Santos Portos de p assage m Jo ão W anderley ( leraldí Educação literária com o m etáfora social Cyana l.c*ahy-I)ios Introdução à lingüística textual Ingcdore G runfeld Villaça Koch O m odo heterogêneo de constituição da escrita M anoel Luiz Gonçalves Corrêa Interações nas práticas de letram ento Maria do Socorro Macedo A lingüística textual, desenvolvida sobretudo na Europa, a partir do final dos anos 60, se dedica a estudar os princípios constitutivos do texto e os fatores envolvidos em sua produção e recepção. Este livro procura condensar noções relevantes dessa teoria e aplicá-las à análise de redações de vestibular, na tentativa de estabelecer um diagnóstico e levantar sugestões para o trabalho com a expressão escrita na escola. Mano da Graça Costa Vai Formada em Letras e com doutorado em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais, atualmente é professora pesquisadora da mesma universidade. martins Martins Fontes