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Marco Evangelista Direito CIVIL

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1 
 
 
2 
 
 
Marco Evangelista 
 
 
Direito 
CIVIL 
sem 
estresse! 
3.a edição 
 
Manaus 
2013 
 
 
 
 
3 
 
 
Copyright 2013 © ArkiUltra 
 
O conteúdo desta obra é de responsabilidade do autor, 
proprietário do direito autoral. 
Capa: Sérgio Bemfica 
Ilustrações: Marco Evangelista 
_______________________________________________ 
Evangelista, Marco 
Direito Civil sem estresse! – 3.a edição 
Evangelista – Manaus: 2013 
ISBN 
1. Direito civil 2. Direito civil – Brasil 
I. Título 
CDD-347 
______________________________________________ 
 
Índice para catálogo sistemático: 
1. Direito civil 347 
2. Direito privado 347 
 
www.EvangeBlog.com 
www.ArkiUltra.com 
www.marcoevangelista.com.br 
 
 
http://www.evangeblog.com/
http://www.arkiultra.com/
http://www.marcoevangelista.com.br/
4 
 
Aos Evangelistas: 
Antonio 
Zená 
Marcus 
Mariana 
Marcus Filho 
Marina 
Manuela 
 
Sou grato a 
João Freire da Cunha Filho (i.m.) 
Paulo Ferraz (i.m) e Regina Ferraz 
 
Pelo apoio dado ao meu início de carreira na advocacia, em 1998. 
 
 
“Ele não sabia que era impossível, 
foi lá e fez”. 
(anônimo) 
 
5 
 
 
APRESENTAÇÃO DA TERCEIRA EDIÇÃO 
Desde a segunda edição, muitas mudanças ocorreram; algumas drásticas e 
quase inimagináveis, como a possibilidade do divórcio imediato. 
Não houve um só dia sequer sem que eu fosse perguntado sobre quando 
haveria uma nova edição desta obra. 
Soube que o “Sem estresse!” figurava dentre os livros mais emprestados nas 
bibliotecas, incluindo as faculdades onde eu nem ministro aulas. Tudo isso me deu 
a certeza de que eu acertei o alvo: escrever um livro de direito livre de “frescuras 
retóricas”. 
Não temos nem nunca tivemos a pretensão de sermos o melhor ou maior livro 
de direito civil; de saída, temos consciência de nossas limitações cognitivas quanto 
à matéria, mas, já que não tenho o maior ou o melhor livro, teria que ter um 
diferente; foi o que fiz. 
Nesta obra o leitor terá a impressão de que está sentado comigo em uma mesa 
de bar, conversando informalmente sobre os assuntos aqui tratados, sem firulas ou 
sem demonstrações desnecessárias de erudição. 
Costumo dizer aos meus alunos nas faculdades para nunca se prenderem a um 
autor só. Um doutrinador, seja quem for, não tem a verdade; muito menos no 
direito. 
Digo aos alunos para lerem no mínimo três livros sobre cada matéria e que 
formem seu conhecimento pela média do que leem; só assim o direito mantém-se 
em movimento. Todo conhecimento “macaqueado” é burro. 
Atualizei alguns capítulos, reescrevi outros e elaborei alguns novos. 
A forma dos capítulos mudou; todavia, quanto ao conteúdo, a maior mudança 
está no direito de família, que inclusive triplicou de tamanho na nova edição. Ao 
final da obra colocamos uma lista com todos os prazos do Código Civil, compilada 
por nós, para estudo. 
Agora temos um blog (www.EvangeBlog.com) onde podemos postar 
atualizações imediatas; e esta edição é a primeira a ser publicada em formato 
eletrônico, esperando ver no mundo virtual a grande aceitação que teve nas 
livrarias físicas. 
 
APRESENTAÇÃO DA PRIMEIRA EDIÇÃO (2006) 
 
 Esta obra nasceu em sala de aula. 
 Os gráficos que se encontram nesta obra são repetições daqueles criados e 
utilizados por mim ao longo de aulas em cursos superiores e em cursinhos 
preparatórios. 
http://www.evangeblog.com/
6 
 
 Os textos são "transcrições" de aulas e dicas que ministrei, igualmente, nas 
classes. 
 Despojados de maiores pretensões, nosso desejo é levar ao leitor o 
conhecimento básico do direito civil brasileiro, o qual esquematizamos e 
explicamos com macetes, gráficos e desenhos elaborados por nós. 
 Esperamos que o leitor assimile o conhecimento aqui transmitido ou fixe 
os que já possui, pois, se "recordar é viver", na área jurídica "recordar é 
sobreviver"! 
Resolvemos quebrar a sisudez tão normalmente vista nos textos jurídicos, 
tornando o direito civil simplificado até onde se faça possível. 
Elucidaremos o texto frio da lei, tornando-o dinâmico para melhor 
compreensão. Não temos pretensão de deitar doutrina ou impor institutos, embora 
não nos olvidemos de marcar nossa opinião em matérias polêmicas que, com o 
advento do Novo Código Civil Brasileiro, apenas começaram. 
Esta obra já nasce sob o espírito do Novo Código Civil, razão pela qual não 
nos prendemos a institutos do código revogado, exceto quando ainda vigentes por 
disposição expressa no novel codex. 
 Estamos abertos a críticas e a sugestões; e desde já agrademos aos alunos 
que, por meio de questionamentos sempre pertinentes, apresentados em sala de 
aula, forçaram-nos, também, a melhorar mais e mais. Aliás, esse é o objetivo deste 
livro: ajudá-lo a melhorar. 
Recomendamos ao leitor manter o código civil à mão durante a leitura da 
obra; e lembramos que dados adicionais podem ser encontramos em nosso site: 
www.marcoevangelista.com.br 
 Boa leitura! 
 
 
http://www.marcoevangelista.com.br/
7 
 
Sumário 
0 TÓPICOS INICIAIS .............................................................................................. 15 
0.1 DIREITO ............................................................................................... 15 
0.1.1 DIVISÃO DIDÁTICA DO DIREITO .................................................... 16 
0.2 CONCEITO E CONTEÚDO DO DIREITO CIVIL ....................................... 18 
0.3 DIREITO CIVIL E RELAÇÕES JURÍDICAS .............................................. 19 
0.4 PRINCÍPIOS DO DIREITO CIVIL ............................................................ 19 
0.5 FONTES DO DIREITO CIVIL .................................................................. 21 
0.6 LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO (LINDB) . 23 
0.6.1 A LEI .............................................................................................. 24 
0.6.2 EFICÁCIA DA LEI NO TEMPO ........................................................ 27 
0.6.3 EFICÁCIA DA LEI NO ESPAÇO ...................................................... 28 
0.6.4 CONFLITOS DE LEI ...................................................................... 28 
0.6.5 ESTRUTURA DA LEI ..................................................................... 29 
0.6.6 O CÓDIGO CIVIL – SUA HISTÓRIA E CRÍTICAS .............................. 30 
0.7 RELAÇÕES JURÍDICAS......................................................................... 31 
0.8 “ESQUEMA” DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO ....................................... 32 
1 TEORIA GERAL ................................................................................................. 35 
1.1 PESSOAS ............................................................................................. 35 
1.1.2 CONCEITO DE “PESSOA” .............................................................. 35 
1.1.3 PESSOA NATURAL ........................................................................ 35 
1.1.4 PESSOA JURÍDICA .................................................................. 68 
1.2 BENS ................................................................................................. 82 
1.2.1 NOÇÃO DE PATRIMÔNIO ..................................................... 82 
1.2.2 CONCEITO DE “BENS” .......................................................... 82 
1.2.3 CLASSIFICAÇÃO .................................................................... 83 
1.2.4 BEM DE FAMÍLIA .......................................................................... 94 
1.2.5 REGISTRO CIVIL .......................................................................... 95 
1.3 FATOS JURÍDICOS ............................................................................... 96 
1.3.1 ATOS E NEGÓCIOS JURÍDICOS ................................................... 100 
8 
 
1.3.2 O TEMPO COMO FATO JURÍDICO .............................................. 123 
1.3.3 PROVAS DOS FATOS JURÍDICOS ..............................................129 
2 OBRIGAÇÕES ................................................................................................... 145 
2.1 TEORIA GERAL .................................................................................. 145 
2.2 ELEMENTOS DAS OBRIGAÇÕES ........................................................ 146 
2.2.1 OBRIGAÇÃO CIVIL E OBRIGAÇÃO NATURAL ............................... 148 
2.3 FONTES DE OBRIGAÇÕES ................................................................. 149 
2.4 CLASSIFICAÇÃO ................................................................................ 149 
2.4.1 CLASSIFICAÇÃO BÁSICA ............................................................. 150 
2.4.2 CLASSIFICAÇÃO QUANTO À ATIVIDADE ..................................... 150 
2.4.3 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO OBJETO ....................................... 153 
2.4.4 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AOS SUJEITOS .................................. 154 
2.4.5 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO ELEMENTO ACIDENTAL ............... 162 
2.4.6 CLASSIFICAÇÃO QUANTO À FINALIDADE ................................... 162 
2.4.7 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TEMPO DE CUMPRIMENTO ......... 162 
2.5 TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES .................................................... 163 
2.5.1 CESSÃO DE CRÉDITO ................................................................. 163 
2.5.2 ASSUNÇÃO DE DÍVIDA ................................................................ 165 
2.6 EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES ........................................................... 166 
2.6.1 EXTINÇÃO DIRETA (PAGAMENTO) .............................................. 167 
2.6.2 EXTINÇÃO INDIRETA DAS OBRIGAÇÕES .................................... 174 
2.7 INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES ............................................. 182 
2.7.1 INADIMPLEMENTO RELATIVO (MORA) ....................................... 182 
2.7.3 INADIMPLEMENTO ABSOLUTO .................................................. 185 
2.8 CLÁUSULA PENAL ............................................................................ 187 
2.9 ARRAS (OU SINAL) ........................................................................... 187 
2.10 PAGAMENTO INDEVIDO .................................................................. 188 
2.11 CONCURSO DE CREDORES ........................................................... 189 
2.12 ENRIQUECIMENTO ILÍCITO ............................................................. 189 
3 CONTRATOS ................................................................................................... 192 
9 
 
3.1 TEORIA GERAL DOS CONTRATOS ................................................... 192 
3.1.2 PRINCÍPIOS CONTRATUAIS ....................................................... 193 
3.1.3 ELEMENTOS DOS CONTRATOS ................................................. 197 
3.1.4 FORMAÇÃO DOS CONTRATOS .................................................. 197 
3.1.5 LUGAR DO CONTRATO .............................................................. 199 
3.1.6 CONTRATOS ENVOLVENDO TERCEIROS .................................. 200 
3.1.7 CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS ........................................... 201 
3.1.8 EXTINÇÃO DOS CONTRATOS .................................................... 205 
3.1.9 EVICÇÃO .................................................................................... 206 
3.1.10 VÍCIOS REDIBITÓRIOS ............................................................. 208 
3.1.11 ELABORAÇÃO DE INSTRUMENTOS CONTRATUAIS ................. 210 
3.1.12 INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS ....................................... 210 
3.2 CONTRATOS EM ESPÉCIE ................................................................ 212 
3.2.1 COMPRA E VENDA ..................................................................... 212 
3.2.2 TROCA OU PERMUTA ................................................................ 215 
3.2.3 CONTRATO ESTIMATÓRIO ........................................................ 217 
3.2.4 DOAÇÃO .................................................................................... 217 
3.2.5 LOCAÇÃO .................................................................................. 221 
3.2.6 MÚTUO ...................................................................................... 226 
3.2.7 COMODATO ............................................................................... 226 
3.2.8 PRESTAÇÃO DE SERVIÇO ......................................................... 227 
3.2.9 EMPREITADA ............................................................................. 229 
3.2.10 DEPÓSITO ................................................................................ 230 
3.2.11 MANDATO ................................................................................ 232 
3.2.12 COMISSÃO ............................................................................... 236 
3.2.13 AGÊNCIA E DISTRIBUIÇÃO ...................................................... 237 
3.2.14 CORRETAGEM ......................................................................... 237 
3.2.15 TRANSPORTE .......................................................................... 238 
3.2.16 SEGURO .................................................................................. 241 
3.2.17 CONSTITUIÇÃO DE RENDA ...................................................... 245 
3.2.18 JOGO E APOSTA ...................................................................... 246 
3.2.19 FIANÇA..................................................................................... 247 
3.2.20 TRANSAÇÃO ............................................................................ 249 
3.2.21 ARBITRAGEM ........................................................................... 249 
3.3 ATOS UNILATERAIS .......................................................................... 250 
3.3.1 PROMESSA DE RECOMPENSA .................................................. 250 
10 
 
3.3.2 GESTÃO DE NEGÓCIO ............................................................... 250 
3.3.3 TÍTULO AO PORTADOR .............................................................. 251 
4 RESPONSABILIDADE CIVIL ............................................................................. 253 
4.1 TEORIA GERAL .................................................................................. 253 
4.1.1 FUNÇÕES DA RESPONSABILIDADE CIVIL ................................... 253 
4.1.2 FONTES GERADORAS DO DEVER DE INDENIZAR ....................... 254 
4.1.3 CLASSIFICAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL ....................... 255 
4.1.4 ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL ............................. 256 
4.2 DEFESAS DE RESPONSABILIDADE CIVIL ......................................... 264 
4.2.1 DEFESAS DIRETAS .................................................................... 264 
4.2.2 DEFESAS INDIRETAS (EXCLUDENTES) ..................................... 265 
4.3 ALGUMAS RESPONSABILIZAÇÕES CIVIS ......................................... 275 
4.3.1 RESPONSABILIDADE DECORRENTE DAS RELAÇÕES DE 
CONSUMO ........................................................................................... 275 
4.3.2 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO .................................... 277 
4.3.3 DANO ESTÉTICO ........................................................................ 280 
4.3.4 RESPONSABILIDADE CIVIL PROFISSIONAL ............................... 281 
4.3.5 RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA .......................................... 281 
4.3.6 RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL ..................................... 282 
4.3.7 DANO NUCLEAR ........................................................................ 284 
4.3.8 RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATOS TERRORISTAS .............. 285 
4.4 RESPONSABILIDADE POR ATO DE TERCEIRO OU FATO DA COISA . 286 
4.4.1 DIREITO DE REGRESSO ............................................................ 288 
4.5 AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS ................................................... 288 
4.6 LIQUIDAÇÃO DO DANO .....................................................................288 
4.6.1 ALGUMAS TARIFAÇÕES E PARÂMETROS LEGAIS PARA A 
RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL ................................................................ 289 
4.7 EXECUÇÃO DA REPONSABILIDADE CIVIL ........................................ 292 
4.8 REPARAÇÃO CIVIL PARA PLURALIDADE DE VÍTIMAS ...................... 293 
4.9 AÇÃO CIVIL EX DELICTO .................................................................. 295 
4.10 RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS JURÍDICAS................... 296 
11 
 
4.11 RESPONSABILIDADE CIVIL EM LEIS ESPECIAIS ............................. 297 
5 DIREITOS REAIS (coisas) ................................................................................ 299 
5.1 TEORIA GERAL ................................................................................. 300 
5.2 POSSE .............................................................................................. 300 
5.2.1 TEORIAS DA POSSE .................................................................. 301 
5.2.2 CLASSIFICAÇÃO DA POSSE ...................................................... 302 
5.2.3 AQUISIÇÃO DA POSSE .............................................................. 303 
5.2.4 EFEITOS DA POSSE ................................................................... 303 
5.2.5 PROTEÇÃO DA POSSE .............................................................. 304 
5.2.6 PERDA DA POSSE ..................................................................... 305 
5.3 DIREITOS REAIS ............................................................................... 306 
5.3.1 CLASSIFICAÇÃO ........................................................................ 307 
5.3.2 PRINCÍPIOS DOS DIREITOS REAIS ............................................ 308 
5.3.3 PROPRIEDADE........................................................................... 309 
5.3.3 ENFITEUSE ................................................................................ 330 
5.3.4 SUPERFÍCIE ............................................................................... 331 
5.3.5 USUFRUTO ................................................................................ 332 
5.3.6 USO ............................................................................................. 334 
5.3.7 HABITAÇÃO ................................................................................. 335 
5.3.8 CONCESSÃO (de uso e de moradia) ............................................ 335 
5.3.9 SERVIDÃO ................................................................................. 336 
5.3.10 DIREITOS REAIS DE GARANTIA ............................................... 337 
5.3.11 PROMESSA DE COMPRA E VENDA .......................................... 351 
5.4 DIREITOS DE VIZINHANÇA ............................................................... 351 
5.5 CONDOMÍNIO ................................................................................... 354 
5.5.1 CONDOMÍNIO ORDINÁRIO ......................................................... 355 
5.5.2 CONDOMÍNIO EDILÍCIO .............................................................. 356 
5.6 TUTELA JUDICIAL DOS DIREITOS DAS COISAS ................................ 360 
6 FAMÍLIA ............................................................................................................. 363 
6.1 TEORIA GERAL .................................................................................. 364 
6.1.1 ASPECTOS INICIAIS .................................................................... 364 
6.1.2 TIPOS DE FAMÍLIA ....................................................................... 365 
12 
 
6.2 DIREITO CONVIVENCIAL .................................................................. 366 
6.2.1 CASAMENTO ............................................................................... 366 
6.2.2 UNIÃO ESTÁVEL ........................................................................ 388 
6.2.3 OUTRAS ESPÉCIES DE UNIÃO ................................................... 396 
6.3 DIREITO PARENTAL .......................................................................... 398 
6.3.1 PARENTESCO ............................................................................ 398 
6.3.2 FILIAÇÃO ................................................................................... 402 
6.3.3 PODER FAMILIAR ....................................................................... 413 
6.4 DIREITO ASSISTENCIAL ................................................................... 416 
6.4.1 ALIMENTOS ............................................................................... 416 
6.4.2 TUTELA ...................................................................................... 421 
6.4.3 CURATELA ................................................................................. 422 
6.4.4 GUARDA .................................................................................... 423 
7 SUCESSÕES ..................................................................................................... 425 
7.1 ABERTURA DA SUCESSÃO ................................................................ 426 
7.2 HERDEIROS NECESSÁRIOS............................................................... 426 
7.3 ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA ................................................. 427 
7.3.1 SUCESSÃO DOS DESCENDENTES .............................................. 428 
7.3.2 SUCESSÃO DOS ASCENDENTES ................................................ 429 
7.3.3 SUCESSÃO DO CÔNJUGE ........................................................... 429 
7.3.4 SUCESSÃO DOS COLATERAIS .................................................... 431 
7.4 DIREITO DE REPRESENTAÇÃO .......................................................... 431 
7.5 OS EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO ......................................................... 432 
7.5.1 INDIGNIDADE .............................................................................. 433 
7.5.2 DESERDAÇÃO ............................................................................. 434 
7.6 SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA ............................................................ 435 
7.6.1 QUEM PODE TESTAR .................................................................. 435 
7.6.2 FORMAS DE TESTAMENTO ......................................................... 436 
7.6.3 SUBSTITUIÇÃO TESTAMENTÁRIA ............................................... 437 
7.6.4 QUEM NÃO RECEBE POR TESTAMENTO ................................... 439 
7.6.5 ELABORAÇÃO DO TESTAMENTO ............................................... 439 
7.6.6 REVOGAÇÃO E ROMPIMENTO DO TESTAMENTO ..................... 440 
13 
 
7.7 SUCESSÃO DO COMPANHEIRO ......................................................... 441 
7.8 INVENTÁRIO ....................................................................................... 442 
7.8.1 SONEGADOS ................................................................................... 442 
7.9 PARTILHA ........................................................................................... 443 
7.10 ACEITAÇÃO E RENÚNCIA DA HERANÇA .......................................... 445 
7.11 LEGADO ........................................................................................... 445 
7.12 HERANÇA JACENTE E VACANTE ..................................................... 448 
7.13 EXECUÇÃO DO TESTAMENTO ......................................................... 449 
BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................... 451 
ABREVIATURAS E SIGLAS ................................................................................. 453 
“Making Of” ............................................................................................................ 455 
O AUTOR: ....................................................................................................... 456 
Apêndice - PRAZOS DO CÓDIGO CIVIL ..............................................................458 
 
 
14 
 
0 
Tópicos 
Iniciais 
 
Sim! É um capítulo “zero” mesmo! Qual é o problema? ☺ 
15 
 
 
0 TÓPICOS INICIAIS 
Podemos ir diretamente ao assunto e mergulhar nos meandros do Direito Civil, 
certo? Errado! Algum conhecimento prévio se faz necessário antes chegarmos à 
zona-alvo. É por isso que esse capítulo é o “zero”; é quase um resumão de 
“Introdução ao Estudo do Direito”; acredite: o estudo dos institutos formadores da 
ciência jurídica é realmente necessário. 
 
0.1 DIREITO 
O direito, como tudo o que emana da sociedade, muda sempre, o que o torna 
impossível de ser totalmente aprendido por qualquer pessoa, o que não significa 
dizer que não possamos aprendê-lo o suficiente para o que desejamos (para nossa 
vida, para advocacia, para concurso público etc.). 
Em sua conceituação, “direito” é uma das palavras com maior número de 
acepções que se conhece. Você certamente já ouviu: “Tenho direito à liberdade!"; 
“Vou procurar meus direitos!”; “Isso fere o direito!”; “Vou cursar Faculdade de 
Direito!”. Assim, o direito pode significar conjunto de normas, ou o poder de fazer 
algo, ou a faculdade de exigir algo, ou a denominação da ciência jurídica. Um 
conceito simples, que deve ser guardado como carta na manga, é “Direito é o 
conjunto de regras que regulam a vida em sociedade”. Embora esteja incompleto, 
tal conceito não pode ser enquadrado como incorreto, seja por qualquer ângulo que 
se tome a acepção da palavra. 
Portanto direito é conjunto de regras, quer escrita, quer não. Em verdade, tudo 
é regulado por regras. O universo tem suas próprias regras, as “leis físicas” (como a 
lei da gravidade). As regras que nos interessam são as que regulam a vida, mas 
apenas a vida em sociedade, ou seja, a vida em que, no local onde ela se 
desenvolve, existe mais de um indivíduo. Por isso se costuma dizer que onde há 
sociedade, existe o direito. 
O homem tem, sabe-se lá por quê, a estranha vontade de submeter seu 
semelhante a algo; a vontade – oculta ou não – de colocar seus próprios interesses 
acima dos interesses de seu par. Logo já imaginou o inferno que haveria caso não 
existisse um conjunto de regras que colocasse “cada um no seu lugar”? A vida seria 
um inferno! Justamente para que não ocorra tal caos, é que existe o direito, assim 
cada um sabe até onde pode ir; e sabe que, ao menos em tese, está protegido dessa 
“vontade predatória” do seu semelhante. 
No que toca à etimologia, a palavra direito vem do latim directum, que também 
deu origem ao português "directo". Directum, por sua vez, era o particípio passado 
do verbo dirigere, que significa "dirigir" ou "alinhar". Em todas as línguas 
ocidentais, a palavra que designa o direito tem conexão com uma dessas duas 
http://pt.wikipedia.org/wiki/Latim
16 
 
etimologias: right, em inglês, recht, em alemão, diritto, em italiano, derecho, em 
espanhol e droit, em francês; e, em russo, pravo.1 
Essas regras, em que se baseia o direito, são sinônimos de normas. 
Norma é um preceito de conduta (faça/não faça) seguido de sanção (que é um 
castigo, uma reprimenda, expressa na forma “sob pena de...”, “senão...”, “caso 
contrário....”). É a sanção que diferencia uma norma de um mandamento comum. É 
a sanção que nos faz cumprir a norma; serve para incutir no destinatário um medo 
quanto ao não cumprimento da norma; e, quando tal sanção é aplicada, serve de 
exemplo aos súditos para que não incorram em igual comportamento. 
A palavra origina-se do latim norma, que significa “régua”, “esquadro”. Logo 
denota algo que guia uma exatidão. Uma norma é dita jurídica quando a sanção 
contida na norma pode ser imposta pelo Poder Judiciário. Quando a sanção, grave 
ou não, for imposta por outros entes que não provenientes exclusivamente do Poder 
Judiciário, temos uma norma não jurídica. 
Certa vez fui entrevistado em um programa de TV e me perguntaram o que é 
direito; além de responder o que escrevi acima, também reproduzi o dogma de 
Miguel Reale: “É a união de fato, valor e norma.”; misturando filosofia e história 
do direito, poderia também ter respondido o mantra do direito romano, consolidado 
por Ulpiano: “Direito é viver honestamente; não causar dano a outrem; e dar a cada 
um o que lhe é devido.” (honeste vivere; neminem laedere; suum cuique tribuere). 
 
0.1.1 DIVISÃO DIDÁTICA DO DIREITO 
O Direito é um todo unitário. É um instituto uno. Os termos “direito civil”, 
“direito penal” e outros existem apenas para fins de estudo. Para tal finalidade, 
didática, o direito se divide em vários ramos, que se dividem em vários sub-ramos, 
e assim por diante. 
A primeira grande divisão didática do direito é a que divide este em ramo do 
direito público e do direito privado. 
 
1 http://pt.wikipedia.org/wiki/Direito ; neste site encontramos que o termo "direito" foi introduzido com 
o sentido atual já na Idade Média, aproximadamente no século IV. A palavra usada pelos romanos 
era ius. Quanto a esta, os filólogos não se entendem. Para alguns, ius se relacionaria com iussum, 
particípio passado do verbo iubere, que quer dizer mandar, ordenar. Para outros, ius estaria ligado a 
iustum, aquilo que é justo, tendo seu radical no védico yos, significando aquilo que é bom. 
http://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_russa
http://pt.wikipedia.org/wiki/Filologia
17 
 
 
Figura 1 - Direito Público e Privado 
O direito público trata das relações jurídicas em que um dos polos da relação é 
o Estado, no uso de seu poder de império2. É uma relação vertical, com superior e 
subalterno, na qual o superior é o Estado, e o subalterno é o administrado, o 
particular, o súdito do Estado. Como exemplo de ramos do direito público, 
podemos citar o Direito Constitucional, Direito Penal, Direito Tributário, Direito 
Previdenciário, dentre outros. O direito privado trata das relações entre iguais, 
entre pessoas que não apresentam nenhuma ascensão sobre a outra, daí dizermos 
que no direito privado as relações são horizontais, pois todos os sujeitos são 
tratados em pé de igualdade. Nas relações de direito privado, o Estado pode 
participar, mas com igualdade em relação ao polo oposto. Como exemplo de ramos 
do direito privado, citamos o Direito do Trabalho, Direito Empresarial e, como 
exemplo clássico do direito privado, o Direito Civil. 
 
Figura 2 - Estado (para fins didáticos, aqui) 
A um conjunto determinado de regras, chamamos “regime”; assim, podemos 
dizer que tal caso está enquadrado no regime público, no regime de direito privado 
etc. 
Fico incomodado quando, ao ler qualquer livro “moderno” de direito, deparo 
com a new wave de que “não mais existe direito público e privado”, que todo o 
direito privado está permeado de regras públicas e tal. Ora, isso é óbvio! O que não 
 
2 “Poder de império” é a prerrogativa do Estado de fazer valer o interesse público sobre os interesses 
privados, podendo inclusive causar danos aos particulares em nome do interesse público. 
18 
 
fica óbvio é o erro de tais autores: não diferem a divisão de aplicação da 
divisão didática. 
Quanto à aplicação, não existe qualquer divisão entre direito público e privado 
NEM entre qualquer ramo de direito. Por isso o direito tributário precisa do direito 
civil para qualificar alguns fatos geradores; o direito civil precisa do direito 
empresarial, e assim por diante. Nessa acepção, definitivamente, o direito é um 
uno, um todo indivisível. 
Mas, no quesito didático, como explicamos no início do tópico, a divisão não 
só existe, mas também é necessária. Costumo comparar ao estudo do corpo 
humano na faculdade de medicina. Como a “aplicação” é uma só, mas, para ser 
estudada, existe Anatomia I (cabeça), Anatomia II (membros), Anatomia III (tórax) 
e Anatomia III (abdômen). Ah, e dizemos “direito público/privado” para diminuir 
palavras, mas o correto é dizermos RAMO do direitopúblico, RAMO do direito 
privado. 
 
0.2 CONCEITO E CONTEÚDO DO DIREITO CIVIL 
Em algum momento em que se começou a se dividir didaticamente o direito, 
este era apenas “público” e “privado”. Nada mais. O direito privado, portanto, era o 
que regia as relações dentre iguais. Com o tempo, o direito privado foi se 
especializando, gerando outros ramos específicos a partir dele. Assim, do direito 
privado surgiu o direito comercial (depois tendo o nome trocado para empresarial), 
o direito do trabalho e o direito do consumidor – restando ao direito civil, portanto, 
tratar do direito privado não regulado em outros ramos de direito. 
Assim, em sala, conceituamos o direito civil como “o ramo do direito privado 
que regula as relações jurídicas privadas não reguladas por outros ramos do 
direito”. 
Sim, o direito civil é residual mesmo; trata de tudo o que for direito privado, 
e não for estudado por outro ramo. Isso não significa que é um “resto”; ao 
contrário, é bastante abrangente, o que aumenta ainda mais sua importância. 
Penso que a discussão sobre patrimonialização/despatrimonialização, 
constituição ou não do direito civil é pertinente, mas em um momento no qual já se 
conhece a matéria, podendo-se navegar nela com desenvoltura. Acho atécnico e 
cruel tratar de tal assunto quando o aluno ou o leitor ainda está se iniciando na 
matéria. Assim, a título de melhor didática, é sim necessária a divisão entre ramo 
de direito público e privado. O fato é que, como na economia e na história, digo 
que também vige a teoria dos ciclos: acham o direito civil muito patrimonial, então 
gritam para constitucionalizá-lo, até que décadas depois alguém vai achá-lo 
constitucional demais, e bradarão para patrimonializá-lo. 
O direito civil é o mais presente e importante em nossa vida, sem qualquer 
resquício de tendência. Desde as aulas de Civil I, já escuto perguntas sobre família 
19 
 
e sucessões; quando toco em casamento e união estável, então, um terço da sala 
tem perguntas sobre! É a prova de que não se pode separar o direito civil da própria 
vida; já se disse (Miguel Reale) que o Código Civil é a “Constituição das pessoas 
comuns”. Então, seja como estudante, seja como “simples” ser humano, aprenda-o! 
 
Figura 3 - O Código Civil regula toda a sua existência 
 
0.3 DIREITO CIVIL E RELAÇÕES JURÍDICAS 
Tudo no direito civil gira em torno das relações jurídicas. O conceito de 
“relação jurídica” não é difícil. Quando queremos colher uma vantagem ou uma 
utilidade de algo ou de alguém, temos um “interesse”. Quando duas (ou mais) 
pessoas entregam algum sacrifício, abstenção (algo ruim) em troca da satisfação de 
algum interesse (algo bom), temos o conceito de relação. 
“Relação”, portanto, significa “troca de interesses”. Desde que temos a 
cognição formada, lá pela primeira infância, vivemos em relação, com a família, 
com a comunidade, com a escola etc. 
Existem dois tipos de relação, a jurídica e a não jurídica. A “relação não 
jurídica” (também chamada de comum) é aquela em que, se um componente 
descumprir sua parte do acordo, o Poder Judiciário nada poderá fazer para forçar o 
cumprimento ou para punir essa pessoa. Exemplo de relação comum: amizade, 
coleguismo e namoro. Note que, se um amigo trair a confiança do outro, não existe 
ação judicial apta a punir esse mau amigo ou forçá-lo a manter-se confiável. 
Mas pense em uma compra e venda, aluguel, contrato de trabalho: são relações. 
Mas aqui o componente que descumprir sua parte no acordo será forçado ou 
sancionado pelo Poder Judiciário. Assim, uma relação é chamada de “jurídica” 
quando o Poder Judiciário possui algum meio (mediante ação) para forçar o 
cumprimento ou para punir quem descumpriu. 
 
0.4 PRINCÍPIOS DO DIREITO CIVIL 
Princípios são as bases fundamentais sobre as quais se erguem todos os 
conceitos e normas de um instituto. São as diretrizes básicas de uma ciência. Os 
princípios se direcionam ao legislador, orientando a elaboração da norma; ao 
20 
 
julgador, facilitando a hermenêutica das normas; à administração e ao povo em 
geral, como parâmetros de melhor aplicação das normas. O Direito Civil possui 
Princípios Fundamentais; todos os outros princípios eventualmente indicados por 
outros autores decorrem destes. São eles: Princípio da “Circulação de Riquezas”, 
da “Boa-Fé”, da “Função Social”, do “Equilíbrio” e da “Autonomia da Vontade”. 
Princípio da Circulação de Riquezas – O Estado Brasileiro dá a todos os seus 
habitantes a possibilidade de auferir riquezas. Desde que o faça licitamente, não 
existe limite ao montante de riqueza que um indivíduo possa amealhar em nosso 
país. A riqueza (no sentido de patrimônio economicamente valorado), quando em 
circulação, faz nascerem outras riquezas, razão pela qual o ordenamento jurídico 
prestigia a troca de riquezas de mão em mão. Daí o dirigismo legal em simplificar a 
abertura de empresas, a locação de bens e os contratos em geral – passa a ser uma 
garantia ao cidadão de que o Estado interferirá o mínimo necessário para manter a 
justiça social no giro econômico. 
Princípio da Boa-Fé – Não é dado a nenhum sujeito enganar seu semelhante. 
A boa-fé pode ser subjetiva (ou seja, estado de inocência, estado de desconhecer a 
existência de qualquer mácula nas relações jurídicas) ou objetiva (situação em que 
o sujeito deve atuar no sentido de informar, colaborar e diligenciar diretamente 
para a manutenção da transparência nas relações jurídicas). A boa-fé subjetiva deve 
ser inerente a todas as relações jurídicas e sempre se a presume3. E a boa-fé 
objetiva informa os deveres das partes quanto à interpretação dos negócios, quanto 
à contratação e quanto à execução dos negócios. A boa-fé traz deveres principais e 
deveres anexos, o que significa a imposição de conduta honesta e leal nas 
negociações. O código nos traz várias aplicações obrigatórias do dever de boa-fé, a 
saber: boa-fé nos negócios (113), em todos os atos civis (187), na escolha da coisa 
incerta (243), nos contratos (422), na ilicitude que representa sua inobservância 
(927). 
Princípio da Função Social – O individualismo é limitado pelo interesse de 
toda a sociedade. Uma vez que o homem é um animal gregário, ou seja, não vive 
isolado, deve abrir mão de uma parcela de seus interesses particulares para 
prestigiar o interesse do todo, da sociedade. A essa observância do interesse de 
outros indivíduos da sociedade chamamos de Função Social. Nenhuma – 
absolutamente nenhuma – relação jurídica pode existir se trouxer prejuízo à 
sociedade em que está inserida. Logo o todo limita o particular. 
Princípio do Equilíbrio – Todos devem ganhar em uma relação jurídica. Não 
é dado a nenhuma pessoa enriquecer-se em detrimento de outra, ainda que esta 
“vítima” consinta em tal fato, visto que existe um princípio do equilíbrio 
informando a vida civil. 
 
3 Trataremos sobre “presunção” ao estudar as provas no direito civil, em tópico próprio nesta obra. 
21 
 
Princípio da Autonomia da Vontade – O Estado deve interferir nas 
transações privadas o mínimo necessário para a garantia dos demais princípios. Os 
particulares têm a liberdade de fazer e de transacionar tudo o que não é proibido. 
Estabeleçamos aqui uma diferença entre o justo, o princípio e a regra. 
O justo nasce da própria consciência. O simples fato da existência da razão, o 
“sapiens”, já faz nascer a ideia de certo e de errado. Essa ideia do justo, quando 
segmentada, nos traz a ideia de princípio; um modo de se comportar para se atingir 
esse princípio chama-se regra. 
Assim... 
▪ O sentimento inato de que viver é bom, importante e valioso para o 
outro tanto quanto o é para você é um instituto justo. 
▪ Admitir, portanto, que todos têm direito à vida é um princípio. 
▪ E obedecer ao mandamento de “não matar” é seguir uma regra. 
 
0.5 FONTES DO DIREITO CIVIL 
“Fonte” é origem; não há muito oque conceituar aqui. Como “do nada, nada 
surge”, o que origina o direito civil? 
Os locais e os pontos que geram direito são chamados de fontes materiais: O 
Estado (mormente o Poder Legislativo), o povo, a história etc... ; os canais 
reconhecidos pelo direito como aptos a gerarem regras são chamados de fontes 
formais. Costumo dizer em sala que “fonte material é de onde; e fonte formal é do 
que”. 
São fontes formais a lei, os princípios, a doutrina etc. Tais fontes se dividem 
em fontes diretas e indiretas. 
A fonte direta (ou principal, ou imediata) é a lei, sendo todas as outras tratadas 
como fontes indiretas (ou secundárias, mediatas etc.). 
Em países onde vige a civil law (países de colonização europeia, exceto países 
colonizados pela Grã-Bretanha), a lei é a principal fonte normativa. Em países de 
common law (Grã-Bretanha e países por ela majoritariamente colonizados), o 
costume e a jurisprudência são as fontes diretas. 
No Brasil (tudo tem que ser mais complicado aqui?), temos um sistema misto 
(civil e common law), visto que jurisprudência, agora, desde que seja súmula 
vinculante, é norma. Trataremos do estudo da lei em capítulo próprio e deixaremos 
o estudo da súmula vinculante para os professores de direito constitucional. 
Tratemos sobre as fontes indiretas – que são usadas, segundo a teoria clássica, 
para suprir a lacuna da lei, para que não haja sentença non liquet, ou seja, que não 
decida o caso, quando o mérito o exigir. 
Costumes são preceitos de conduta seguidos por todos com consciência de 
obrigatoriedade (opinio necessitatis). Logo costume tem um elemento objetivo, que 
é o comportamento; e um elemento subjetivo, que é a consciência de 
22 
 
obrigatoriedade daquele comportamento. O exemplo clássico de costume é a 
“fila” (embora existam leis sobre tempo máximo de fila e sobre atendimento 
prioritário nela, não existe lei determinando que, onde há um servidor para atender 
a mais de um servido, um deva esperar depois do outro!); experimente furar uma 
fila, e a “sanção” virá. O que diferencia costume de hábito é que, neste, não há 
consciência de obrigatoriedade, não há “medo” de alguma sanção social. Um 
costume pode ser secundum legem quando acompanha a lei; pode ser contra legem 
quando contraria a própria lei (por exemplo: ultrapassar sinal vermelho de 
madrugada, com medo de assalto) ou praeter legem quando não existe lei 
normatizando o fato. Um exemplo de costume sendo protegido pela norma é 
encontrado no Artigo 326 do Código, o qual determina que os pesos e as medidas 
praticados em um lugar serão o parâmetro para os pagamentos de obrigações. O 
termo “bons costumes” indica padrões médios de moralidade de uma sociedade. 
Em verdade, o advento de positivar em lei os usos e os costumes não é novo; o 
Código Comercial (Lei n.º 556, de 25 de junho de 1850!), que ainda se encontra em 
vigor quanto à parte do seu comércio marítimo, já trazia: “Art. 750 – Todos os 
casos de abalroação serão decididos, na menor dilação possível, por peritos, que 
julgarão qual dos navios foi o causador do dano, conformando-se com as 
disposições do regulamento do porto e com os usos e as práticas do lugar. No caso 
dos árbitros declararem que não podem julgar com segurança qual navio foi 
culpado, sofrerá cada um o dano que tiver recebido”. 
Princípios Gerais do Direito são institutos que alicerçam o ordenamento 
jurídico. Os princípios informam o legislador, quando da elaboração das leis; 
informam o juiz, quando do julgamento; e devem informar qualquer aplicador ou 
destinatário da lei, quando existe qualquer dúvida quanto à prática desta. 
A Analogia, segundo a LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito 
Brasileiro), seria fonte de direito, mas não o é; é método de integração de norma, 
ou seja, é forma de “tapar buraco” do ordenamento no qual não existe norma para 
tal. Dá-se a analogia quando o caso a ser julgado (sem lei para tal) guarda 
similitude com caso normatizado; nesse caso, utiliza-se a lei do caso normatizado 
para o caso semelhante, não normatizado. Elencamos analogia aqui porque não é 
raro ser considerado correto enquadrar “analogia” como fonte, em algumas provas. 
A analogia diferencia-se da interpretação analógica porque, nesta, a própria lei 
manda ao intérprete completá-la segundo uma orientação da própria lei. No direito 
civil pode existir analogia, em tese, para qualquer situação; no direito penal não se 
aplica analogia para prejudicar o réu. No direito administrativo e no tributário, a 
analogia também encontra suas limitações de uso. Assim, o Artigo 128 do Código 
Penal permite o aborto em caso de estupro. Mas costumo colocar a seguinte 
hipótese, criada por mim, em sala: “E se a mulher for imobilizada, vestida, e 
alguém, mediante uma seringa, injetar material genético em seu ovário?”. Houve 
23 
 
estupro? Não! Mas haverá uma gravidez consentida? Não! – É o caso típico, 
pensamos, de aplicação da analogia para se realizar o “aborto permitido”, praticado 
por médico. 
Doutrina é o conjunto de estudos desenvolvidos por jurisconsultos e 
publicados; tem a grande virtude de deitar soluções para situações nem de longe 
enfrentadas sequer pelo Judiciário, ainda. Entendemos só haver doutrina com 
publicação do texto; ao contrário do que possam pensar, não se precisa ter título ou 
ter nome de peso para ser doutrinador; basta resolver um problema jurídico 
segundo a lógica do direito e tornar tal solução acessível à consulta do público. A 
doutrina se torna especialmente importante pela sua rapidez de elaboração (em 
comparação às outras fontes). Uma ótima fonte de doutrina são os enunciados das 
jornadas de Direito Civil, eventos promovidos pelo Conselho da Justiça Federal, 
com o intuito de, mediante discussões de estudiosos, resolver lacunas e 
anacronismos do “novo” Código. Já ocorreram cinco. Concordamos com quase 
todos os enunciados; alguns dizem alguns absurdos que me pergunto como 
chegaram a conclusões tão malucas! Leia, por exemplo, essa monstruosidade: 
“Enunciado 286 – Art. 52: Os direitos da personalidade são direitos inerentes e 
essenciais à pessoa humana, decorrentes de sua dignidade, não sendo as pessoas 
jurídicas titulares de tais direitos”. Aqui e ali encontramos esses delírios, mas 99% 
dos enunciados são dignos de estudo e de aplicação. 
Jurisprudência é o conjunto de julgamentos reiterados por órgãos legitimados 
para tal. Existe uma polêmica sobre ser necessária certa estabilidade nas 
orientações dos julgamentos para que “surja” uma jurisprudência. Somos de 
opinião de que, onde não há julgamento, UM julgamento já é jurisprudência; e, 
com o nascimento, por meio da EC 45 da súmula vinculante, pôs-se pá de cal nessa 
discussão, visto que basta uma súmula vinculante para gerar efeitos em todo o País, 
quando gerada segundo os preceitos daquela emenda. Lembramos que a 
jurisprudência na forma de súmula vinculante já é norma primária, desde a Emenda 
Constitucional 45/2004. 
Brocardos são ditados e máximas tradicionais do mundo jurídico que, se não 
obrigam, orientam algumas situações em que não existe nenhuma das outras fontes 
tratando. Exemplo de brocardos: “O que abunda não prejudica”; “in dubio pro 
reo”; “quem pode o mais pode o menos”, “primeiro no tempo, melhor no direito” 
etc. 
 
0.6 LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO (LINDB) 
A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (“LINDB”, Decreto-Lei 
4.657, de 4 de setembro de 1942) nos ensina sobre obrigatoriedade, integração e 
ciclo de existência da lei. Costumo dizer em sala de aula que o primeiro artigo do 
texto da LINDB deveria ser o seu terceiro, que trata da obrigatoriedade do 
24 
 
conhecimento das leis4; é um enunciado utópico que alega que ninguém pode 
alegar ignorância da lei para deixar de cumpri-la; é o que chamamos de “presunção 
absoluta do conhecimento das leis”. O artigo quarto trata de “tapagem de buracos” 
no ordenamentojurídico quando da aplicação concreta da lei, a saber, mandando o 
juiz aplicar a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito5. É óbvio que 
não existe ordenamento legal perfeito. Ele sempre estará atrasado em relação aos 
fatos. Existem países onde o juiz pode deixar de julgar por não existir lei; são 
sentenças chamadas non liquet; no Brasil, tal não ocorre, pois o juiz deve julgar o 
caso existindo lei ou não. É o artigo quarto que determina os meios de integração 
(suprimento de lacunas) da lei. O artigo quinto da LINDB normatiza sobre 
hermenêutica, temperando a aplicação da lei. Manda que o juiz, em última análise, 
deve adequar a interpretação da lei ao caso concreto, e jamais o contrário, visto que 
enuncia que o julgador deve atender aos fins sociais aos quais a lei se destina. 
A interpretação da lei pode ser gramatical (sentido literal da escrita), 
sistemática (contextual), histórica (de acordo com o momento do nascimento da 
norma) ou teleológica (leva em conta a finalidade da norma). De acordo com a 
extensão da interpretação, esta pode ser declarativa (quando se prende aos exatos 
termos da norma), extensiva (quando a norma disse menos do que desejava o 
legislador) ou restritiva (quando o legislador em verdade quis dizer menos do que 
expressou na norma). 
O sexto artigo da LINDB trata da intocabilidade de alguns efeitos de leis 
revogadas. Esses casos serão tratados nesta obra ao estudarmos sobre o ciclo de 
existência das leis. 
A partir do artigo sétimo, a LINDB traz regras de Direito Internacional, matéria 
fora do objeto de estudo desta obra. 
 
0.6.1 A LEI 
“Lei” é um conceito que possui várias acepções. Enquanto instrumento formal, 
significa norma geral e abstrata oriunda do órgão competente para emiti-la; nessa 
acepção, “lei” incorpora todas as espécies normativas originadas pelo Estado, a 
saber, Constituição, Lei Complementar, Lei Ordinária, Decreto-Lei, Decreto 
Legislativo, Lei Delegada etc. Outra acepção, que não será utilizada nesta obra, 
mas igualmente correta, considera o sentido estritamente técnico da palavra “lei” 
(“lei em sentido estrito”) e considera como tal somente Lei Complementar, Lei 
Ordinária e Lei Delegada. Para uma resposta simples, afirme que “lei” é norma 
jurídica geral e abstrata emanada do Estado”. 
 
4 Em sala de aula, costumamos, ao explicar este artigo, repetir o bordão: “Se ignorância de lei alegar 
/ No Judiciário você vai se ferrar!” 
5 Trataremos sobre tais institutos ao estudar as fontes do direito civil. 
25 
 
Discorrendo um pouco sobre a diferença entre “lei” e “norma”, temos que a lei 
se origina do Estado; origina-se positivamente, ou seja, é posta, é expressa na 
forma escrita, após um procedimento. “Norma”, como já conceituado, é preceito de 
conduta seguido de sanção, seja ou não emanada do Estado. A lei pode ou não 
conter uma norma (já que existem leis meramente explicativas). Os costumes são 
normas jurídicas, mas não são leis. 
Teçamos algo sobre a tríade “codificação/consolidação/estatutos”: A forma 
mais rudimentar de se organizar determinada legislação é por meio de 
consolidação, que nada mais é do que a justaposição das leis, mudando-se somente 
a numeração dos artigos, para que fiquem em sequência. Quando no conjunto de 
normas uma passa a se relacionar com as outras, fazendo nascer um sistema, temos 
um código – um conjunto sistematizado de normas. Leis codificadas são mais 
fáceis de serem aplicadas, ensinadas e aprendidas, pois pertencem a um mesmo 
sistema, o do referido código. Mas, como nem todas as normas são codificadas, tais 
textos extracódigos chamamos de leis esparsas, que formam a legislação esparsa. 
As leis esparsas que tratam de assuntos constantes nos códigos são chamadas de 
leis extravagantes. As leis esparsas que tratam de assuntos não regulados pelos 
códigos são chamadas de leis especiais. O sistema não codificado é formado 
apenas por leis especiais, sem códigos; tem a vantagem de, em sendo menos 
engessado, haver mais normas escritas para maior número de situações, já que leis 
menores tramitam, em tese, mais rapidamente; e um sistema assim está mais 
sintonizado com seu tempo, já que os dogmas se prendem a leis menores. 
Modernamente observamos a profusão de “estatutos”, que são, como costumo dizer 
em sala de aula, “microcódigos”, pois tratam de determinado assunto, agregando 
um caráter principiológico e axiológico (leia-se valorativo) sobre tal assunto. 
0.6.1.1 CICLO DE EXISTÊNCIA DA LEI 
A lei possui um ciclo que, no direito civil, inicia-se com a publicação. 
Lembramos que, para outros ramos do direito, a lei não se inicia necessariamente 
na publicação, visto que o Direito Constitucional, ao estudar o processo 
legislativo6, entende que essa é uma fase da vida da lei anterior à publicação; e 
reconhece a existência da lei a partir da promulgação. 
A publicação é ato pelo qual se dá ao povo o conhecimento da existência de 
uma nova lei. 
 
6 O Processo Legislativo, objeto de estudo do Direito Constitucional, é um procedimento com as 
seguintes fases: alguém legitimado para tal apresenta um Projeto de Lei, que será discutido e votado 
no Congresso Nacional (nas duas casas, chamadas aqui de “casa iniciadora” e “casa revisora”, o 
Projeto de Lei é submetido à sanção ou ao veto do Presidente da República; caso seja sancionado, 
o projeto seguirá para a publicação; caso seja vetado, o projeto voltará ao Poder Legislativo para 
apreciação do veto que, se mantido, implicará o arquivamento do projeto; e, se derrubado, fará o 
projeto seguir para a publicação. 
26 
 
Pode a lei obrigar imediatamente ou não. A obrigatoriedade da lei chama-se 
“vigência” ou “vigor”. A obrigatoriedade será imediata se constar em seu texto 
“esta lei entrará em vigor na data de sua publicação” ou algo parecido. 
Mas pode acontecer de seguir-se à publicação um período e um tempo em que 
a lei ainda não obriga, embora já exista. Tal período é utilizado para que se estude a 
lei e para que o próprio Estado operacionalize a aplicação da lei. Esse período 
chama-se vacatio legis, “vacância da lei”, “vacância legal” ou “período de 
vacância”. Só ao fim desse período tal lei obrigará. Um exemplo é o do próprio 
Código Civil, a Lei n.o 10.406, de 10 de janeiro de 2002, publicada em 11/1/2002, 
que traz em seu Artigo 2.044: “Este Código entrará em vigor 1 (um) ano após a sua 
publicação”. Esse artigo, que descreve a vacatio legis, chamado de “Cláusula de 
vigência”, fez que o novo código civil entrasse em vigor em 11 de janeiro de 2003. 
Pode ser que não conste no texto legal uma cláusula de vigência, nem 
estipulando algum tempo, nem afirmando que vigerá imediatamente. Nesse caso, 
usa-se a “cláusula geral de vigência”, prevista no Artigo primeiro da LINDB, que 
determina que o texto será obrigatório após 45 dias de publicado e, em três meses, 
devrá estar vigente. 
Assim, é importante saber que só se recorre ao Artigo primeiro da LINDB se 
uma lei tiver vacatio legis e se tal vacatio não constar no texto. Além disso, a Lei 
Complementar 95/98 (Lei que trata sobre redação de leis) determina que nenhuma 
lei deve ser redigida sem cláusula de vigência expressa. 
 
0.6.1.2 REVOGAÇÃO 
Uma lei não obriga para sempre. Uma lei, um dia, “morre”. A “morte” da lei 
chama-se “revogação”. Revogação é o término da vigência de uma lei. No Brasil, 
uma lei perde vigência por um dos dois motivos: a própria lei determina seu 
término (são as chamadas leis autorrevogáveis) ou, o que é mais comum, outra lei a 
revoga. A lei revogadora, para que opere tal efeito, precisa ser de hierarquia igual 
ou superior à lei revogada. Essa revogação operada por outra lei pode ocorrer de 
forma expressa ou tácita. 
Na revogação expressa, um dispositivo da norma (“cláusula revocatória”) 
expressamente enuncia que tal lei, ou parte dela, está revogadaa partir do início da 
vigência da nova lei. A LC 95/987, em seu Artigo nono, determina que “quando 
necessária a cláusula de revogação, esta deverá indicar expressamente as leis ou 
disposições legais revogadas”. Ora, imagine uma lei, como o Novo Código Civil, 
que revogou total ou parcialmente mais de 20 leis diferentes. Qual legislador se 
dará o trabalho de nomear uma a uma as normas revogadas? Nenhum! Tanto que o 
próprio código novo não o fez! 
 
7 Esta lei trata sobre técnica de elaboração de leis. 
27 
 
A revogação é tácita quando a lei nova não contempla, em seu texto, 
dispositivo revogando a lei anterior, mas regula a mesma matéria de lei anterior, 
porém de forma diversa; ou, por haver incompatibilidade entre a lei nova e a lei 
antiga, esta última “morre”. 
A revogação pode ser ainda total ou parcial (a lei inteira ou apenas dispositivos 
dela); a revogação total chama-se ab-rogação, e a revogação parcial chama-se 
derrogação8. O Novo Código Civil Brasileiro ab-rogou o antigo e derrogou o 
Código Comercial, como se nota pela redação do Artigo 2.045 do codex: 
“Revogam-se a Lei n.o 3.071, de 1.o de janeiro de 1916; o Código Civil e a Parte 
Primeira do Código Comercial, Lei n.o 556, de 25 de junho de 1850”. 
 
0.6.2 EFICÁCIA DA LEI NO TEMPO 
Uma lei, enquanto vige, produz efeitos. Uma vez que a lei é revogada, o que 
ocorre com os efeitos produzidos pela lei revogada? “Morre tudo”? Não. Até para 
que se preserve a estabilidade das relações jurídicas (chamamos a isso “segurança 
jurídica”), uma lei nova mantém incólumes três institutos: ato jurídico perfeito, 
direito adquirido e coisa julgada. 
Ato jurídico perfeito é o ato praticado e de acordo com a lei de seu tempo. Se 
era legal no tempo em que foi praticado, tal ato continuará a ser legal, ainda que lei 
futura mude as condições iniciais para que tal ato seja, agora, praticado. Ou seja, é 
a manutenção da legalidade dos efeitos de um ato cuja prática era legal quando foi 
praticado. 
Direito adquirido é uma opção já possível de ser exercida conforme 
determinada condição exigida em lei. Então o “direito adquirido”, em verdade, é a 
possibilidade de exercer uma opção já adquirida segundo determinada lei. Difere-
se da “expectativa de direito”, uma vez que esta não pode ser exigida, visto que não 
se incorporou ao conjunto de direitos do indivíduo. 
Coisa julgada é a causa judicial da qual não caiba mais recurso. Por três 
motivos: porque a parte se resignou, aceitando a decisão, decidindo não recorrer; 
porque já se esgotaram todos os recursos possíveis para o caso; porque tais 
recursos não foram ajuizados (perda de prazo) ou conhecidos para julgamento 
(falta de regularidade formal, como o não pagamento das custas devidas para o 
recurso, por exemplo); ou ainda porque a parte sucumbente (“a que perdeu”) 
simplesmente resignou-se, ou seja, decidiu não mais recorrer, conformando-se com 
a decisão. 
 
 
8 Memorize o mnemônico TOAPADE , onde: TOtal = Ab-rogação e PArcial = DErrogação 
28 
 
0.6.2.1 REPRISTINAÇÃO 
Muita atenção a esta palavra: “repristinação”. É que se torna comum confundir-
se “repristinação” e “efeito repristinatório”. O parágrafo terceiro do Artigo 
segundo da LINDB determina que “Salvo disposição em contrário, a lei 
revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência.” A 
questão é: existe ou não a repristinação no Brasil? O instituto significa “retorno à 
vigência de uma lei revogada, pela revogação da lei revogadora". Mas a LINDB é 
dúbia quanto à existência ou não do instituto no Brasil. Bem, o que não existe no 
Brasil é a repristinação automática (ou implícita, ou tácita), podendo, sim, haver 
o “efeito repristinatório”, também chamado de repristinação expressa ou 
explícita. 
O efeito repristinatório ocorre em duas situações: quando uma lei nova 
expressamente determina que lei antiga, ou parte dela, volte a viger; e, quando uma 
lei é declarada inconstitucional, pode o STF determinar que a lei atingida pela 
recém-inconstitucional lei volte ou não a viger. O problema fica grave quando a 
doutrina começa a se debater. Para parte da doutrina, sequer existe efeito 
repristinatório do Brasil, pois, se uma lei volta a viger por lei nova, se estão tão 
somente cumprindo uma lei nova, a lei antiga continua revogada; o seu conteúdo é 
que voltou à vigência; e, se lei é inconstitucional, não chegou, validamente, a 
existir, nunca tendo revogado, portanto, de fato, alguma outra lei (o que o STF 
modula são os efeitos da vigência da lei inconstitucional; não sua existência ou 
validade). Mas a pergunta permanece: há ou não repristinação no Brasil? Como 
entendemos que repristinação é a volta automática (e não provocada) de lei já 
revogada, simplesmente NÃO existe tal instituto em nosso país. 
 
0.6.3 EFICÁCIA DA LEI NO ESPAÇO 
Em regra, a lei brasileira vige no território brasileiro; é a regra da 
territorialidade. Por exceção temos a ultraterritorialidade e intraterritorialidade. 
Ultraterritorialidade (ou extraterritorialidade) é o fenômeno em que a lei brasileira 
tem vigência em território estrangeiro. Intraterritorialidade é a situação na qual lei 
estrangeira vige no território brasileiro. Alguns exemplos de intraterritorialidade 
são encontrados na LINDB, como a sucessão de estrangeiros no Brasil, institutos 
de direito de família e regência de obrigações constituídas em território estrangeiro. 
 
0.6.4 CONFLITOS DE LEI 
O sistema jurídico é um todo unitário, no qual suas peças devem funcionar 
perfeitamente; ainda assim, nada impede que haja conflito pelo fato de existir mais 
de uma norma a regular o mesmo aspecto de um mesmo fato. Norma surge a partir 
de nomos, reta. “Antinomia” é a existência de mais de uma lei regulando um 
mesmo fato. Os casos de antinomia são resolvidos pelos seguintes critérios: 
29 
 
“critério hierárquico”, em que a lei superior prevalece sobre a lei inferior; o critério 
da “especialidade” (ou da “amplitude”), em que a lei especial prevalece sobre a lei 
geral. E o critério “cronológico”, em que a lei posterior prevalece sobre a lei 
anterior. Ainda assim a resolução da antinomia não é pacífica. Quando se chocam 
os princípios da especialização e os cronológicos, há doutrinador que sustente que 
um e outro método devem preponderar sobre o outro. Entendemos que o critério da 
especialidade deve sempre preponderar. Em tempo: a falta de lei chama-se 
“anomia”. 
 
0.6.5 ESTRUTURA DA LEI 
Existe uma regra para a redação das leis. A grafia da lei inicia-se pela epígrafe, 
que indica a espécie normativa, o número e a data da lei; logo depois haverá a 
ementa, que é a indicação do que será tratado na lei. O preâmbulo indica a origem 
da lei e o fundamento do poder para a emissão daquela norma. Segundo a Lei 
Complementar 95, de 26 de fevereiro de 1998 (é esta a norma que regulamenta a 
redação das leis), cada lei deve ter um único objeto. São comuns armadilhas de 
esconder normas em leis que não tratam daquele assunto específico; é a famosa “... 
e dá outras disposições”. Embora o Art. 9.º da LC 95/98 enuncie que “a cláusula de 
revogação deverá enumerar, expressamente, as leis ou as disposições legais 
revogadas”, às vezes isso é impossível, principalmente em leis tributárias, nas quais 
uma lei se refere a dezenas; quando não a centenas de outras leis. 
A estrutura do texto geral da lei é: Parte Livro  Título  Capítulo Seção 
 Subseção. Deixamos claro que o leitor só encontrará todas essas divisões em 
grandes leis, e tal sequência só é fielmente seguida em leis pós-1998. São as 
divisões da lei. 
Temos, então, as unidades normativas. Inicialmente em artigos9, que se 
desdobrarão em parágrafos ou em incisos; os parágrafos em incisos, os incisos em 
alíneas, e as alíneas em itens. Os artigos são enumerados em ordinais até o nono, e 
em cardinais dodez adiante. 
Os parágrafos são representados pelo sinal gráfico “§”, seguido de numeração 
ordinal até o nono; e cardinal a partir de dez. Aliás, outra leseira tipicamente 
brasileira: O símbolo “§” se chama section; isso mesmo! “Seção” em inglês! (o 
símbolo é a junção de duas letrinhas “S”, uma em cima da outra). É um símbolo 
anglo-saxônico para indicar “seção” de uma lei; e aqui é usado como... 
“parágrafo”! Aliás, quando só existe um parágrafo em um artigo, o correto é usar a 
expressão “parágrafo único" (por extenso, e não como usamos até 
inadvertidamente no cotidiano: “§ ún.”). 
 
9 O artigo segue ordinal até o nono; e cardinal a partir deste. 
30 
 
A lei é estruturada em disposições preliminares, em disposições gerais e em 
disposições finais e/ou transitórias; essas últimas disposições são necessárias para 
reger os fatos cujos efeitos transitam entre uma lei antiga e uma nova. 
 
0.6.6 O CÓDIGO CIVIL – SUA HISTÓRIA E CRÍTICAS 
Nossa legislação civil foi, inicialmente, portuguesa, óbvio; até depois da 
Independência, continuou a sê-lo, já que internalizamos, na emancipação, 
arcabouço normativo naquele momento existente. E não tínhamos código, já que a 
legislação civil portuguesa estava espalhada em vários diplomas (Ordenações 
Afonsinas, Manuelinas e Filipinas). Continuamos a não ter, no Império, um código 
civil, mas não faltaram tentativas, a saber: Projetos de Teixeira de Freitas (1859), 
Nabuco de Araújo (1872), Felício dos Santos (1881) e Coelho Rodrigues (1893); 
mas o que vingou foi o Projeto de Clóvis Beviláqua, entregue para discussão em 
1899, sendo aprovado e publicado em 1916, para entrar em vigência a partir de 1.º 
de janeiro de 1917, só então ocorrendo a revogação da lei civil vigente 
(Ordenações Filipinas). O nosso primeiro código, portanto, já nascia “velho” até 
para a sua época; tanto que já a Lei 3.274, de 25/1/1919, fez diversas modificações 
no Código, seguidas por tantas outras. E, logo na metade do século XX, 
reconheceu-se a necessidade de um novo código, visto que o Código de 1916 foi 
escrito sob a influência do ambiente do século anterior, não contemplando muitas 
das novas situações de fato existentes. Em 1963 tivemos o primeiro projeto de um 
novo código, apresentado por Orlando Gomes e Caio Mário. 
Em 1969, sob a coordenação de Miguel Reale, começou a ser escrito o projeto 
do nosso atual código, juntamente com os juristas Arruda Alvim, Sílvio 
Marcondes, Herbert Chamon, Clóvis do Couto e Silva e Torquato Castro. O projeto 
foi concluído em 1972, seguindo para votação na Câmara dos Deputados em 1975, 
ficando lá até 1984, quando então foi encaminhado ao Senado, onde permaneceu 
até 1998; retornou à Câmara, sendo aprovado definitivamente em 2001. Foi 
promulgado em 10 de janeiro de 2002, sendo publicado no dia seguinte, entrando 
em vigor 11 de janeiro de 2003. 
Talvez pelo fato de ser fruto do trabalho de muitas pessoas (Miguel Reale foi o 
relator, mas não o único autor!), entendo que o Código Civil Brasileiro sofre com 
quatro grandes defeitos: 
É anacrônico – Nosso CCB revela uma sociedade que não mais existe; uma 
sociedade dos anos 60. Talvez a extensão do texto tenha gerado preguiça em sua 
atualização durante sua tramitação no Legislativo (26 anos!); a impressão que se 
tem é que um terço do texto está fora do tempo. 
É lacunoso – Ok! Toda a lei o é... mas precisava ser tanto?! Biodireito? 
Nascituro? União homoafetiva? Sucessão na união estável (que não gere dúvidas)? 
Esqueça! A doutrina e a jurisprudência que se virem para regular... 
31 
 
É copiado – É chamado de “novo” em contraposição ao “antigo”, mas, de 
novo tem quase nada; o pecado maior é que, ao invés de o legislador escrever um 
Código realmente novo, simplesmente tomou o texto do Código de 1916 e saiu 
“atualizando” o texto aqui e ali; resultado: já não basta o primeiro defeito (ser 
anacrônico), ainda é uma cópia reciclada do que já existia. 
É enrolado – Responsabilidade civil é tratada lá pelo Artigo 186, depois lá 
pelo 402, depois voa lá para o 927. Pow, legislador! Não dava para ser menos 
complicado, não? E os livros dos “Fatos jurídicos” (Arts. 104 a 232) então? 
Existem livros e livros só para tentar “explicar” aquilo ali. A coisa é tão maluca 
que o CCB trata sobre validade dos negócios jurídicos (ao tratar dos defeitos); 
depois trata sobre eficácia; e depois.... volta a tratar sobre validade novamente! 
Dava para ser mais linear, não? 
Ah! Lembre-se de que, embora ele seja nominado de “Código de 2002”, em 
verdade só vigeu a partir de 2003, pois tivemos um ano de vacatio legis. Assim, em 
2002, tínhamos dois CCBs! Um ainda vigendo e outro já publicado, esperando 
viger. 
 
0.7 RELAÇÕES JURÍDICAS 
O conceito de relação jurídica não é difícil; apenas precisamos construir um 
raciocínio até seu entendimento, partindo da noção de “interesse”, que é o que 
temos quando queremos colher uma vantagem ou uma utilidade de algo ou de 
alguém. Quando duas ou mais pessoas entregam algum sacrifício, abstenção (algo 
ruim) em troca da satisfação de algum interesse (algo bom), temos o conceito 
de relação. “Relação”, portanto, significa “troca de interesses”. Desde que temos a 
cognição formada, lá pela primeira infância, vivemos em relação. Com a família, 
com a comunidade, com a escola etc. 
Na etimologia, a palavra “relação” vem de relatio, cuja origem é relatus, 
particípio passado de referre, formado este verbo de ferre, levar ou trazer, mais a 
partícula re (significando repetição), o que dá ao verbo referre o sentido de levar 
ou trazer de novo; e à palavra “relação” o sentido de ida e volta, de reciprocidade.10 
Existem dois tipos de relação, a jurídica e a não jurídica. A relação não 
jurídica (também chamada de comum) é aquela em que, se um componente 
descumprir sua parte do acordo, o Poder Judiciário nada poderá fazer para forçar o 
cumprimento ou para punir essa pessoa; exemplo de relação comum: amizade, 
coleguismo e namoro. Note que, se um amigo trair a confiança do outro, não existe 
ação judicial apta a punir esse mau amigo ou forçá-lo a manter-se confiável. 
 
10 BERMUDES, Sergio. Introdução ao processo civil. 2.a ed. revisada e atualizada. Rio de Janeiro: 
Ed. Forense. 1996. p. 75. 
 
32 
 
Mas pense em uma compra e venda, aluguel, contrato de trabalho: são relações. 
Mas aqui o componente que descumprir sua parte no acordo será forçado ou 
sancionado pelo Poder Judiciário. 
Assim, uma relação é chamada de jurídica quando o Poder Judiciário possui 
algum meio (mediante ação) para forçar o cumprimento ou para punir quem 
descumpriu. 
As relações jurídicas são formadas por sujeitos e objetos. Sujeitos são os seres 
que atuam na relação jurídica existente. Objetos representam aquilo sobre o que 
recai a relação jurídica. 
 
0.8 “ESQUEMA” DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO 
Já aprendemos o que é uma “relação jurídica” e que é formada por sujeito e 
objeto. Os sujeitos das relações jurídicas são as pessoas. Os objetos, direta ou 
indiretamente, são bens (pois, mesmo quando o objeto é atividade, se descumprida, 
termina em perdas e em danos, o que resultará em bem). 
Mas, para que haja as relações jurídicas, precisamos de um método, de uma 
maneira, um modus-operandi. Pois bem! A maneira como se são as relações 
jurídicas são os “Fatos Jurídicos”. 
Temos, pois, sinteticamente: QUEM desenvolve as relações jurídicas – são as 
PESSOAS; O QUE é objeto das relações jurídicas – são os BENS; COMO se dão 
as relações jurídicas – são os FATOS JURÍDICOS. 
 
Figura 4 - Quem, o que, como? 
As pessoas e os bens são chamados de elementos estáticos das relações 
jurídicas, pois, por si sós, nada fazem acontecer no mundo jurídico. Já o elemento 
“Fatos Jurídicos” é dinâmico, pois são tais fatos fazem que as relações ocorram, 
fazem que as pessoas se relacionem e movimentem osbens; daí por que dizemos 
que são os fatos que movimentam as pessoas e os bens. A propósito, a parte geral 
do nosso Código Civil é justamente dividida em... Pessoas, Bens e Fatos Jurídicos! 
33 
 
O Código contém, em seus diversos livros, os mandamentos que regem a nossa 
vida desde antes do nosso nascimento; e continua regulando os atos existentes após 
a nossa morte, senão vejamos: desde a concepção o Código Civil já tutela os 
direitos da personalidade. Do nascimento com vida à morte, o Código regula os 
negócios jurídicos por nós praticados, com as obrigações, os contratos; regula 
também nossas relações com as coisas. Em algum momento de nossas vidas, 
normalmente, casamo-nos. Este ato é regulado pelo direito de família. E, após a 
nossa morte, as relações jurídicas envolvendo os sucessores de nosso patrimônio 
serão reguladas pelo direito das sucessões. 
O Código Civil possui duas partes: na Parte Geral, trata dos elementos das 
relações jurídicas (pessoas, bens e fatos jurídicos). Na Parte Especial, encontramos 
algumas relações jurídicas específicas. 
Assim foi montado o nosso Código Civil: na Parte Geral, Livro das Pessoas, 
dos Bens e dos Fatos Jurídicos. 
A Parte Geral é de importância primordial no estudo do direito civil brasileiro, 
visto que todos os demais assuntos jurídicos, nessa esfera, necessariamente 
dependem do conhecimento da teoria geral do direito civil: Pessoas, Bens e Fatos 
Jurídicos; isso é básico para o entendimento da Parte Especial do Código Civil 
Brasileiro, fruto da labuta de vários juristas, sob a coordenação de Miguel Reale11, 
que começou a ser escrito em 1969, entrando em votação em 1976, arrastando-se 
pelo Poder Legislativo até 2002. 
Na Parte Especial, temos o Livro do Direito das Obrigações, da Empresa, das 
Coisas, de Família, das Sucessões e um último, chamado Livro Complementar. 
Temos uma peculiaridade em nosso Código; se formalmente temos um único 
Código, materialmente temos dois: um Código Civil e um Código Empresarial. 
Este último fora enxertado no Livro II da Parte Especial (“Da Empresa”); bem 
poderia estar em lei própria, mas, seguindo inspiração italiana, o legislador optou 
por deixá-lo inserido no Código Civil. 
O Código Civil se alinha ao Direito Romano-Germânico, com influências ainda 
das Ordenações Filipinas, Encíclicas Papais, Código Alemão (chamado de “BGB”) 
e até dogmas religiosos. 
Deixamos claro que o direito civil é composto pelo Código Civil e pelas leis 
extravagantes (que se referem às normas já codificadas) e pelas leis especiais (que 
tratam de temas civis, mas não inseridos no Código), além das regras 
constitucionais que, em verdade, são as primeiras e mais importantes a nortear o 
direito civil. 
 
 
11 Miguel Reale, um dos papas do direito brasileiro, nasceu em São Bento do Sapucaí, em 6 de 
novembro de 1910, e faleceu em São Paulo, em 14 de abril de 2006 (Fonte: http://pt.wikipedia.org) 
http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A3o_Bento_do_Sapuca%C3%AD
http://pt.wikipedia.org/wiki/6_de_novembro
http://pt.wikipedia.org/wiki/6_de_novembro
http://pt.wikipedia.org/wiki/1910
http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A3o_Paulo_%28cidade%29
http://pt.wikipedia.org/wiki/14_de_abril
http://pt.wikipedia.org/wiki/2006
34 
 
1 
Teoria 
Geral 
 
35 
 
 
 
1 TEORIA GERAL 
Após estudarmos a localização do direito civil entre os ramos (didáticos!) do 
direito, adentremo-nos agora no estudo da nossa matéria-objeto: o Direito Civil; e 
vamos fazê-lo seguindo a sua principal lei infraconstitucional: o Código Civil (Lei 
10.406, de 10 de janeiro de 2002). 
Demos o nome de “Teoria Geral” ao capítulo que tratará sobre a Parte Geral do 
Código. 
A Parte Geral é de importância primordial no estudo do direito civil brasileiro, 
visto que todos os demais assuntos jurídicos, nessa esfera, necessariamente 
dependem do conhecimento da teoria geral do direito civil: Pessoas, Bens e Fatos 
Jurídicos; isso é básico para o entendimento da Parte Especial do Código. 
 
1.1 PESSOAS 
Embora o ser humano esteja localizado no centro do direito, descobriremos 
que, no direito civil, os humanos são “apenas” uma das duas espécies de pessoas. 
Passemos ao estudo dos atores do mundo jurídico. 
 
1.1.2 CONCEITO DE “PESSOA” 
Tudo o que existe no universo é chamado de “ente”. Quando um ente pode ter 
direitos e/ou obrigações, passa a se chamar “pessoa”. Pessoas são, portanto, os 
sujeitos de direitos e de obrigações. São os elementos ativos das relações jurídicas; 
são os atores. A essa característica (ter aptidão para ter direitos e obrigações) 
chamamos “personalidade”. 
As pessoas, no direito brasileiro, se dividem em pessoas naturais e pessoas 
jurídicas. Pessoas naturais são as existentes a partir de gametas humanos, e as 
pessoas jurídicas são entes não humanos, criados pela mente humana. Estudaremos 
cada uma a seguir. 
 
1.1.3 PESSOA NATURAL 
É a pessoa gerada, concebida a partir de gametas humanos masculino e 
feminino, daí o nome de “natural”. É chamada de “pessoa física” por outros ramos 
do direito, já que possui existência tangível, corpórea. Ao estudarmos a “pessoa 
natural”, aproveitaremos o ensejo de desenvolver o estudo sobre personalidade e 
seus institutos afins. Vários são os elementos de identificação da pessoa natural: 
nome, estado civil, domicílio. Como já estudamos, é o atributo da “personalidade” 
que torna um ser humano uma pessoa. O próximo capítulo trata sobre a 
personalidade da pessoa natural. 
 
36 
 
1.1.3.1 PERSONALIDADE 
É a personalidade que distingue as pessoas dos demais entes. Ocorre que a 
palavra “personalidade” no direito não é utilizada como o é nos termos do 
dicionário ou na psicologia. Para o direito, personalidade é a aptidão para se ter 
direitos e obrigações. Para o direito, o que nos distingue dos animais irracionais é a 
personalidade. Não é a razão ou a capacidade de pensar. 
É de triste memória que, até quase fim do século retrasado, os escravos não 
eram dotados de personalidade. Um dos requisitos até 1888 para que um ser 
humano tivesse personalidade era ser “livre”. Ou seja, personalidade é um atributo 
dado pelo direito, por meio de lei, não pela natureza. Então, isso significa que, se 
uma lei brasileira atribuir personalidade aos animais irracionais (incluindo insetos e 
vegetais), estes passarão a ser pessoa? Exato! 
A personalidade possui vários atributos: atributos visuais, auditivos e 
imateriais. Tais atributos são tutelados pelos direitos da personalidade, que serão 
estudados em tópico próprio desta obra. 
Apresentamos alguns motivos pelos quais um nascituro (ser humano já 
concebido, mas ainda não nascido) é pessoa. Embora ainda haja alguma resistência 
a tal ideia, lembramos que algo que hoje é óbvio um dia foi absurdo; e as 
discussões sobre o que era absurdo fizeram mudar algum paradigma; depois a 
mudança foi aceita, até se tornar óbvia. E depois nos perguntamos como pôde o 
atual óbvio já ter sido considerado absurdo um dia. Nascituro (mórula, blástula, 
embrião, feto) possui personalidade jurídica, já que “personalidade” é a aptidão 
para ter direitos e obrigações”; e são direitos do nascituro: receber doação, receber 
herança, reconhecimento de sua paternidade, ter a vida protegida; bem, se 
“pessoa” é o ente apto a ter direitos e obrigações, e a própria lei confere direitos ao 
nascituro, pela conclusão lógico-matemática, nascituro só não seria pessoa se o 
conceito de pessoa fosse mudado; o Pacto de San José da Costa Rica, ratificado 
pelo Brasil, enuncia que “todo ser humano é pessoa”; então, para se afirmar que 
feto não é pessoa, precisamos mudar também o conceito de “ser humano”; o 
referido pacto (em verdade, uma “Convenção Americana sobre Direitos 
Humanos”), de 1969, foi internalizado no Brasil por meio do Decreto Legislativo 
n.o 27, de 26 de maio de 1992; embora o Artigo segundo do CCB enuncie em seu 
início que“a personalidade começa com o nascimento com vida”, a continuação da 
leitura do próprio Artigo grita “mas a lei põe a salvo, desde a concepção, 
os direitos do nascituro”. Bem! Ou há direitos ou não; se houver direito, haverá 
personalidade. 
No Código Penal, o aborto consta como “Crimes contra a pessoa”; e, antes que 
você diga que a vítima do aborto é a mãe, lembre que uma das modalidades de 
aborto é justamente o “provocado pela gestante”; e não se pune autolesão (exceto 
37 
 
para fraudar seguro!), certo? Ou seja, a pessoa protegida pelo Código Penal, nesse 
caso, é o próprio nascituro! 
Ah! E para os legalistas de plantão que batem o pé (de vez em quando há 
algum nas minhas aulas também) dizendo “mas o Artigo segundo do CCB diz que 
a ‘personalidade começa com o nascimento com vida!’”, bem! Lei por lei, leia o 
que escrevi acima sobre o Código Penal. Se o CCB diz isso no início do Artigo 
segundo, o CP textualmente o chama de pessoa; e, como as duas leis são Leis 
Ordinárias, sem hierarquia entre elas, far-se-ia prevalecer, em última análise, o 
Código Penal, visto que este tutela a vida (no caso do aborto), em contraposição ao 
Código Civil, que basicamente tutela o patrimônio. 
Hans Kelsen já aceitava, no início do século passado, que personalidade é um 
“feixe” de direitos e de obrigações, haja ou não um sujeito. 
Lembramos que, uma vez que ainda é dominante o entendimento de existência 
de personalidade única e que “surge com o nascimento com vida e termina com a 
morte”, no caso de provas de concurso em que não haja o vocábulo “formal” ou 
“material” atrelado à “personalidade”, deve o examinando responder, por óbvio, 
com base na teoria da personalidade única. 
 
1.1.3.1.1 INÍCIO E FIM DA PERSONALIDADE 
Nas pessoas naturais, a personalidade formal inicia-se com o início de geração 
humana viável. No caso de gravidez natural, a personalidade formal inicia-se no 
exato momento em que passa a existir possibilidade de existência de gestação. Foi 
essa a conclusão do SFT na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.o 3510 (ADI 
3510), mediante a qual ficou decidido que embriões in vitro podem ser destruídos, 
mas não são pessoas ainda; ou seja, uma vez implantados são, para o direito, 
pessoas. Para alguns, tal possibilidade se dá com a nidação, que é o acoplamento 
do óvulo fecundado na parede uterina. Mas não podemos esquecer que pode 
ocorrer uma gravidez tubária, que é uma das espécies de gravidez extrauterina. 
E, no caso da geração in vitro, existe personalidade? Nossa posição, até por 
coerência com o nosso conceito exposto há pouco, é que, assim como não poderá 
haver a geração humana, ao menos até o presente, fora do corpo humano, com a 
implantação do embrião no corpo humano para viabilidade da gravidez, não existe 
personalidade. Deixamos claro, que no caso da geração in vitro, vários outros 
conceitos que não jurídicos são discutidos quando se determina a existência da 
personalidade, a saber: religião e ética médica. O Enunciado 1 da 1.a Jornada de 
Direito Civil (1JDC) nos diz que “a proteção que o Código defere ao nascituro 
alcança o natimorto no que concerne aos direitos da personalidade, tais como 
nome, imagem e sepultura”. 
38 
 
O tema permanecerá por longo tempo ainda em aberto; e, ainda quando houver 
uma sedimentação formal sobre a questão, as discussões sobre tal instituto nem por 
isso cessarão, visto que chegam a extrapolar o mundo jurídico. 
A personalidade do nascituro é chamada de “personalidade formal”. 
O que normalmente se conhece classicamente como “personalidade”, em 
verdade, é a Personalidade Material, ou seja, personalidade atrelada a um substrato, 
a saber, um ente físico, uma matéria e, no caso de ser humano, nascido com vida. A 
personalidade formal existe e pode ser provada; os tribunais decidem 
diuturnamente com base nela. 
 
Figura 5 - Personalidade formal e material 
Uma vez que ocorra o nascimento com vida do ser humano, tem início a 
personalidade material. Em verdade, a personalidade até então existente ganha 
matéria, ou seja, um ser com existência autônoma, daí a personalidade transmudar-
se para “Personalidade Material”. E continuará sendo personalidade material até o 
momento da morte. 
O “nascimento com vida” ocorre com o funcionamento autônomo do aparelho 
cardiorrespiratório. Uma única respiração autônoma do recém-nascido basta para 
caracterizá-lo como nascido com vida. Em verdade, basta uma inspiração, que é o 
movimento voluntário (respiração é o ciclo inspiração-expiração). 
Entendemos que a personalidade material termina com a morte. Uma vez que 
alguns direitos da personalidade permanecem existentes mesmo após a morte do 
corpo da pessoa humana, concluímos que, após a morte, o ente humano continua 
com uma personalidade formal (tanto que a lei tutela a honra dos mortos); dessa 
feita, eterna. 
O fim da personalidade da pessoa jurídica, como aprenderemos futuramente 
neste livro, se dá com a extinção desta, mais especialmente com o cancelamento de 
seu registro. 
 
1.1.3.1.1 TEORIAS QUE TENTAM DETERMINAR O INÍCIO DA PERSONALIDADE 
39 
 
Existem basicamente duas teorias que tentam explicar o momento em que a 
personalidade tem início: a concepcionista, que enuncia que a personalidade se 
inicia a partir da concepção; e a natalista, em que a personalidade iniciaria com o 
nascimento com vida. Não concordamos nem com uma, nem com outra. Tais 
teorias furam por se referirem somente à personalidade material; e esta já não inicia 
com a concepção, mas sim com a viabilidade da gestação. 
 
1.1.3.2 CAPACIDADE 
“Uma coisa é ter; outra coisa é usar o que se tem”. Essa frase resume o conceito 
de capacidade. Se todas as pessoas possuem personalidade (a ideia de pessoa e 
personalidade, no direito, estão diretamente ligadas), nem todas possuem 
capacidade, pois “Capacidade” é a aptidão para exercer os direitos e as obrigações 
que se possui. É a capacidade que confere a alguém o poder de exigir um direito 
que lhe cabe e a aptidão de ser cobrado no cumprimento dos deveres que lhe são 
exigíveis. 
A capacidade é instável, ou seja, não surge com o nascimento e não se 
extingue, necessariamente, só com a morte; ou seja, nascemos sem a capacidade, e 
podemos perdê-la antes da morte. Alguém pode continuar sendo pessoa e tornar-se 
incapaz em alguma idade. Ou seja, a capacidade possui “graus”. 
A aferição do grau de capacidade depende de dois parâmetros: o parâmetro 
cronológico e o parâmetro condição individual da pessoa. 
De acordo com o parâmetro cronológico, de zero aos 16 anos incompletos, o 
ser humano é incapaz; dos 16 aos 18 incompletos, o ser humano é relativamente 
capaz; e a partir dos 18 anos o homem é plenamente capaz. 
Mas não basta o parâmetro cronológico para se aferir a capacidade de alguém, 
pois um homem pode ter 30 anos e, ainda assim, ser incapaz. Tudo por conta do 
segundo parâmetro de aferição de capacidade, a saber, a “condição pessoal do 
indivíduo”. Essas condições dizem respeito à possibilidade de, conscientemente, 
possuir vontade e poder manifestá-la. 
O parâmetro cronológico de aferição de capacidade está presente nos Arts. 3.a 
I; 4.a, I e 5.a, caput; e o parâmetro de condição pessoal do indivíduo para aferir sua 
capacidade está presente nos Arts. 3.a II e III; e 4.a, II a IV. 
40 
 
 
Figura 6 - Capacidade 
 
1.1.3.2.1 GRAUS DA CAPACIDADE DA PESSOA NATURAL 
São os seguintes os “graus” ou “níveis” de capacidade12: incapacidade, 
capacidade relativa e capacidade plena (ou absoluta). Se capacidade plena é o 
poder da pessoa de exercer TODOS os seus direitos e as suas obrigações, 
“incapacidade” é a ausência de tal poder. Os incapazes por condição pessoal são os 
portadores de enfermidade ou de deficiência mental em grau tal que não lhes dê 
discernimento. 
 
Figura 7 - Condição mental 
A deficiência mental é resultado de uma má formação do cérebro. A doença 
mental é algo que se acopla a umcérebro perfeito; tanto que pode haver cura ou 
tratamento. E o desenvolvimento mental incompleto (ou desenvolvimento 
retardado) é um cérebro perfeito até onde se desenvolveu, mas não completando 
 
12 Muito cuidado com a palavra “capacidade”, pois pode esta se referir ao gênero ou à espécie, ou 
seja, ao grau “capacidade plena”, 
41 
 
sua formação. Temos no Brasil, inclusive, uma definição legal de deficiência 
mental, segundo a letra do Decreto n.º 3.298, de 20 de dezembro de 1999: 
“Art. 3.o Para os efeitos deste Decreto, considera-se: I – deficiência – toda perda 
ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica 
que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão 
considerado normal para o ser humano; Art. 4.o É considerada pessoa portadora de 
deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias: (...) IV – deficiência mental 
– funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação 
antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades 
adaptativas, tais como: a) comunicação, b) cuidado pessoal, c) habilidades sociais, 
d) utilização dos recursos da comunidade, e) saúde e segurança, f) habilidades 
acadêmicas, g) lazer, e h) trabalho”. 
Podemos ficar incapazes a qualquer tempo, mas a declaração de incapacidade 
superveniente nunca é automática; dá-se por meio de uma ação chamada de 
“Interdição”; tal interdição pode ser promovida pelo pai, mãe, tutor, cônjuge ou 
algum parente próximo ou em caso de anomalia psíquica; ou não havendo/não 
podendo nenhuma das pessoas indicadas pedir interdição, o órgão do Ministério 
Público pode fazê-lo. 
 
Figura 8 - Excepcional, sem desenvolvimento mental completo 
A curatela dos interditos é regulada, quanto ao procedimento de instituição, 
pelos Artigos 1.177 a 1.186; o interditando deve comparecer a um juízo, e o juiz e 
o perito o examinarão quanto às faculdades mentais, interrogando-o 
minuciosamente acerca de sua vida, negócios, bens e do mais que lhe parecer 
necessário para ajuizar do seu estado mental; tais perguntas e respostas são 
transcritas para os autos, para análise; ou seja, é de muita dificuldade se obter 
interdição de alguém; não são caprichos de família que levarão a tal decisão 
drástica. A interdição é sempre temporária e cessará assim que terminar a causa 
que a determinou. A prova de que tal “incapacidade” é meramente formal é o 
enunciado 138 da Terceira Jornada de Direito Civil (3JDC): “A vontade dos 
absolutamente incapazes, na hipótese do inc. I do Art. 3.o, é juridicamente relevante 
na concretização de situações existenciais a eles concernentes, desde que 
demonstrem discernimento bastante para tanto”. Uma vez decretada a interdição, 
42 
 
não há que se falar em “intervalos lúcidos”, ou seja, todos os atos praticados pelo 
interditado são qualificados como atos de alguém incapaz ou relativamente capaz, a 
depender da interdição. Genericamente, o desprovido de suas plenas faculdades 
mentais é chamado de “amental”. 
 
Figura 9 - Amental 
É considerada incapaz ainda qualquer pessoa, mesmo que maior e mentalmente 
sã, mas que não possa expressar sua vontade (como no estado de coma, por 
exemplo). 
 
Figura 10 - Impossibilitado de manifestar vontade 
43 
 
Ao contrário do que possa parecer, “capacidade relativa” não significa meia-
capacidade! Capacidade, na prática, em verdade, é como gravidez: ou existe ou não 
existe! Mas como assim? Mas o termo não é “Capacidade Relativa”? Bem, em 
verdade existem direitos e deveres que podem e que não podem ser exercidos pelo 
sujeito em questão. Os relativamente capazes (por questão de idade) podem votar, 
propor ação popular, fazer testamento e reconhecer filho. E não pode o 
relativamente capaz alegar tal condição para eximir-se de obrigação que contraiu 
mentindo a idade. 
O que é “relativo” é que alguns atos podem, outros não; e alguns desses atos 
que podem ser exercidos precisam de uma formalidade diferenciada para tal. 
São relativamente capazes os ébrios habituais (alcoólatras), e os toxicômanos 
(adictos). 
 
Figura 11 - Ébrio habitual 
44 
 
 
Figura 12 - Toxicômano 
 
Os pródigos, ou seja, aqueles que dissipam sua riqueza sem noção de limite, 
podendo se levar à própria ruína financeira, são considerados relativamente 
capazes, independentemente da idade. Os portadores de enfermidade ou deficiência 
mental são considerados relativamente capazes, se tiverem algum, mas não total 
discernimento. 
 
Figura 13 - Pródigo 
É comum, na fala dos profanos13, a confusão entre os termos “enfermidade 
mental”, “deficiência” e “retardamento”. São desígnios distintos, a saber: 
Enfermidade Mental – O cérebro é perfeito, completou todos os estágios de sua 
formação física, mas nele se agrega uma anomalia. A enfermidade é um plus ruim 
 
13 Profano é aquele que não conhece o direito; é o leigo. Segunda o Dicionário Houaiss, “Profano” 
também é “indivíduo que não é iniciado em certos conhecimentos” 
(http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm?verbete=profano&stype=k&x=9&y=6); 
Edmond Mezguer, jurista alemão, já utilizava o termo “profano” para designar os não iniciados na 
ciência jurídica. 
http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm?verbete=profano&stype=k&x=9&y=6
45 
 
em algo sadio; tanto isso é verdadeiro que pode ser curado em alguns casos, ao 
contrário da Deficiência e do Retardo, em que há adaptação à vida normal, mas não 
cura. Na deficiência mental o cérebro é imperfeito; há uma má formação. O 
cérebro chegou ao último estágio de formação, mas se formou imperfeito (se não 
completou a formação, dizemos que há um retardamento mental); já no 
desenvolvimento mental incompleto, ou retardamento mental, o cérebro não 
terminou o procedimento de geração completa; até onde gerou, foi perfeito, mas 
não completou o processo. Por isso nada impede que alguém tenha retardamento 
mental juntamente com enfermidade e/ou deficiência mental. 
Em estado de capacidade plena, alguém pode exercer, diretamente, todos os 
seus direitos, e ser cobrado por suas obrigações; por exclusão, são capazes todos 
aqueles que não são incapazes ou relativamente capazes. 
Atenção: é importante não misturarmos a capacidade civil com a capacidade 
penal ou previdenciária! Conforme o Enunciado 3 da 1JDC (já entendeu a sigla, 
né? “Primeira Jornada de Direito Civil”), “a redução do limite etário para a 
definição da capacidade civil aos 18 anos não altera o disposto no Art. 16, I, da Lei 
n.o 8.213/91, que regula específica situação de dependência econômica para fins 
previdenciários e outras situações similares de proteção, previstas em legislação 
especial.” – Ou seja não confundir “capacidade” com “imputabilidade”. 
A capacidade do índio é regulada pelo “Estatuto do Índio” (Lei n.º 6.001/73); o 
conceito de “índio” nos é trazido pelo inciso um do terceiro Artigo do Estatuto, ao 
afirmar que é índio “todo indivíduo de origem e ascendência pré-colombiana que 
se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico cujas 
características culturais o distinguem da sociedade nacional”. O Artigo oitavo do 
Estatuto nos diz que os índios “não integrados à comunhão nacional” (é um 
eufemismo para índios não integrados à sociedade dita “civilizada”) têm seus atos 
jurídicos nulos (o Estatuto deixa claro que não são nulos tais atos quando “o índio 
revele consciência e conhecimento do ato praticado, desde que não lhe seja 
prejudicial, e da extensão dos seus efeitos”), só dando validade a estes quando 
praticados por índios sob a tutela da União, por meio de órgão próprio, que, 
atualmente, é a FUNAI – Fundação Nacional do Índio (Artigo sétimo, parágrafo 
segundo da referida norma). A capacidade plena dos índios virá com a 
emancipação destes, sempre por via judicial, uma vez atendidos os requisitos doArtigo nono do Estatuto (idade mínima de 21 anos – que entendemos ser 18 anos 
desde janeiro de 2003 pelo advento no novo CCB; conhecimento da língua 
portuguesa; habilitação para o exercício de atividade útil, na comunhão nacional; e 
razoável compreensão dos usos e dos costumes da comunhão nacional). Ou seja: o 
grau de capacidade do índio, além de levar em conta idade e condição mental, 
considera igualmente sua “integração” à sociedade dita “civilizada”. 
46 
 
 
Figura 14 - Índio 
Terminando essa nossa primeira conversa sobre capacidade, informamos que a 
doutrina costuma chamar a “personalidade” também de “capacidade de direito, de 
aquisição ou de gozo”; e a “capacidade” de “capacidade de fato, de ação ou de 
exercício” – daí a aparentemente estranha expressão do Artigo primeiro do Código: 
“Todos são capazes de direitos e obrigações na ordem civil” – nesse sentido, essa 
“capacidade” do texto é a “de direito”, ou seja, de “personalidade”. 
 
1.1.3.2.2 SUPRIMENTO DE CAPACIDADE 
Os absolutamente incapazes são representados, ao passo que os relativamente 
capazes são assistidos. É assim que conseguem “praticar” os atos da vida civil. 
Agir em nome do incapaz é o que chamamos de “suprimento de incapacidade”. 
Esta pode ocorrer na forma natural ou na forma civil. 
O suprimento natural de capacidade, sendo o incapaz ou relativamente capaz 
menor, é dado pelos pais, qualquer deles. Quando for necessária a atuação de todos 
os pais para determinado ato, a lei será expressa quanto a isso. 
Pode ocorrer de os pais estarem mortos, não localizados ou, naquele momento, 
impossibilitados de agir em nome dos filhos, por qualquer motivo. Surge, então, o 
suprimento civil da capacidade, que poderá ser tutela, curatela ou guarda. 
Embora afeto ao direito de família, a tutela e a curatela serão agora 
abordadas por representarem formas de suprimento de capacidade na ausência dos 
pais. 
Sempre que houver incapacidade por motivo cronológico suprido por 
outrem que não os pais (por falecimento ou destituição de pátrio poder, por 
exemplo), entrará em campo o instituto da tutela. 
 O suprimento de capacidade decorrente de estado pessoal do indivíduo 
(causas mentais) chama-se curatela. É cabível curatela também para o nascituro e 
para o pródigo. O curador pratica em nome do curatelado os atos da vida civil. 
47 
 
 Se a tutela e a curatela são situações estáveis, a situação provisória 
enquanto não se decide por tutela ou curatela chama-se guarda. Não confundir 
essa aguarda aqui, suprimento de capacidade, com a guarda de filhos em divórcio, 
que é um instituto diverso, ainda que com o mesmo nome. 
 
1.1.3.2.3 EMANCIPAÇÃO 
Uma vez que as condições pessoais permitam, os efeitos da capacidade plena 
podem ser antecipados antes de o sujeito contar com 18 anos de idade. Tal 
operação chama-se Emancipação. É erro comum dizer-se que “emancipação” é 
“antecipação da maioridade”. Ora! O que pode emancipar maioridade ou é uma 
máquina do tempo ou uma mudança na lei. A Emancipação antecipa os efeitos da 
capacidade plena! A emancipação pode ser voluntária, legal ou judicial. 
A emancipação voluntária (ou convencional, ou ainda consensual) é aquela 
promovida pelos pais do emancipando, ou na falta do outro. O emancipando deve 
contar com 16 anos completos para ser emancipado dessa forma. É movida em via 
administrativa: elabora-se uma escritura pública de emancipação e averba-se o 
documento no registro de nascimento do emancipando. Assim, diz-se “voluntária” 
por depender da vontade dos pais, não do emancipando! 
A emancipação legal ocorre no momento em que se implementa uma das 
condições existentes nos incisos II a V do parágrafo único do Artigo quinto do 
codex. 
São as seguintes as causas de emancipação legal: “pelo casamento”, afinal já 
demonstraria o menor senso enorme de responsabilidade para gerar uma nova 
família, sendo-lhe cabível o poder de não mais depender de outrem para a prática 
dos atos da vida civil; e lembramos que é o ato de casar, e não o de permanecer 
casado, que gera a emancipação; assim, um casal que se divorcie ainda menores de 
idade continuará emancipado. Ocorre emancipação “pelo exercício de emprego 
público efetivo”, o que significa já ser portador da confiança do Estado para 
determinada função, o que o habilita, por via de consequência, a praticar já os atos 
da vida civil. A “colação de grau em curso de ensino superior” indica já nível 
mental compatível com a capacidade plena; lembramos que, com o surgimento de 
cursos superiores com duração de dois anos, não é impossível que haja menores 
formados em curso superior, nem que isso seja a poucos dias da maioridade; 
também “estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de 
emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos 
tenha economia própria” denota independência de vida em relação aos seus pais, 
não mais justificando que necessite destes (ou de tutores) para nortear sua vida 
civil. 
48 
 
 
Figura 15 – Casamento 
 
Figura 16 - Colação de grau em curso superior 
 
Figura 17 - Emprego público efetivo 
49 
 
 
Figura 18 - Economia própria 
Em havendo divergência entre os pais na emancipação voluntária, ou em caso 
de negativa de efeitos da emancipação legal (por falta de documento 
comprobatório em algum caso), o Estado-Juiz poderá dirimir o conflito 
emancipando o sujeito à baila, por meio da emancipação judicial, ou seja, aquela 
promovida por sentença. 
Importante é saber que o instituto da “capacidade” tem efeitos exclusivamente 
civis; assim nunca confundir com “imputabilidade”. Um ser plenamente capaz aos 
17 anos (porque foi emancipado) continua inimputável penalmente; e não pode 
dirigir, por exemplo. 
 
 
1.1.3.2.4 LEGITIMIDADE 
Para a prática de atos da vida civil, não basta personalidade e capacidade; 
precisa-se, igualmente, da legitimidade, ou seja, da aptidão para a prática daquele 
determinado ato da vida civil. Sim! Mesmo as pessoas plenamente capazes não 
possuem aptidão para realizar TODOS os atos da vida civil: imagine que você 
encontra a pessoa da sua vida; ambos são maiores, capazes, solteiros e se 
apaixonam. Querem casar. Podem casar? NÃO! Porque, nesse nosso exemplo, essa 
pessoa é filha dos mesmos pais que os seus (entendeu, né?). Ou seja, não poderão 
casar, visto que a lei não admite casamento entre irmãos. Logo você não possui 
legitimidade para casar com essa pessoa. Chama-se também “impedimento” à 
ilegitimidade. 
 
1.1.3.2.5 REPRESENTAÇÃO 
Sempre que alguém não puder ou não quiser praticar pessoalmente 
determinado ato jurídico, praticá-lo-á por meio de outra pessoa, um representante. 
A representação pode ser legal ou convencional. A representação legal, advinda 
da lei, é a que permite ao incapaz ou ao relativamente capaz praticar determinado 
ato; é o caso dos pais, tutores e curadores em relação aos filhos, tutelados e 
curatelados. A representação convencional advém da vontade das partes. Imagine 
que você não quer ou não pode estar em determinado ato; para tanto, você designa 
alguém para, em seu nome, praticar determinado ato; é a representação 
50 
 
convencional. Tal representação dá-se mediante contrato de mandato e, para que o 
representante pratique o ato, utiliza-se de um instrumento desse contrato, chamado 
“procuração”. É o procurador que deve provar sua qualidade e a extensão dos 
poderes que possui, com quem tratar. 
Daí dizermos que o representante é um longa-manus do representado. 
Advertimos ao leitor para ter cuidado com a expressão “representante legal”, que, 
como foi notado, admite diversas acepções. “Representante legal” pode ser o termo 
genérico do que são espécies os pais, tutores, curadores e procuradores em geral; 
como pode restringir-se somente a pai, tutor ou curador. O ato do representante é 
imputado ao representado. 
Veja o desenho da representação no tópico do contrato de mandato.Eu mesmo colei grau por procuração, em julho de 2008, no curso de 
administração. Eu estava cursando o Doutorado na Argentina enquanto, em 
Manaus, colava grau. Costumo dizer que por meio da representação podemos nos 
tornar “onipresentes”. 
 
1.1.3.2.6 ESTADO CIVIL 
A posição que alguém ocupa em relação à liberdade perante a disposição de 
seus bens chama-se “estado civil”. Pode parecer estranho, já que nos acostumamos 
a ligar “estado civil” a alguma relação afetiva. Ocorre que, a depender do estado 
civil, alguém pode ver diminuída sua possibilidade de disposição autônoma de seus 
bens. Se alguém é solteiro, pode dispor livremente de seus bens, mas, se alguém é 
casado, já não terá a mesma liberdade, dependendo da outorga do outro cônjuge 
para transacionar seus bens. O motivo pelo qual precisamos saber o estado civil da 
pessoa com quem transacionamos civilmente é que o cônjuge tem interesse em 
alguns negócios, mormente quando envolver imóveis; daí, quando alguém se 
declara, em um negócio, “casado”, está afirmando que terceiro, além dos 
negociantes, pode precisar anuir no negócio. 
Os estados civis reconhecidos expressamente por lei são solteiro, casado, 
separado judicialmente, divorciado, em união estável e viúvo. No capítulo referente 
a direito de família, trataremos pormenorizadamente sobre cada um desses estados 
civis. 
Permanece em zona cinzenta ser a “união estável” um estado civil ou não. 
Entendemos que sim, visto que o novo Código trouxe regime de bens para tal 
situação de fato; deve tal estado ser grafado “convivente” ou “em união estável”, 
mas que fique claro que nossa opinião ainda é minoritária. 
 
1.1.3.2.7 NOME 
Nome é o sinal distintivo da personalidade. Uma personalidade é distinguida da 
outra por vários aspectos, como o visual (imagem), o auditivo (como a voz), mas o 
51 
 
principal sinal distintivo da personalidade é o nome. Todas as pessoas devem 
possuir um nome. É um direito e um dever subjetivo. Tem natureza jurídica14 de 
direito da personalidade. “Nome”, em verdade, é um conjunto de palavras 
chamadas partículas; algumas partículas do nome são obrigatórias; outras, 
facultativas. 
 
1.1.3.2.7.1 PARTÍCULAS DO NOME 
Imaginemos o seguinte nome: “Dom Lázaro João Barqueiro da Silva Souza 
Júnior”; são as seguintes as partículas desse nome tomado por nós como exemplo: 
Axiônimo (Dom), prenome (Lázaro João), nome do meio (Barqueiro), 
sobrenome (da Silva Souza) e agnome (Júnior). 
As únicas partículas obrigatórias do nome são o prenome e o sobrenome. O 
prenome pode ser simples ou composto; no nosso exemplo, temos um prenome 
composto: “Lázaro João”. Em caso de gêmeos, os prenomes não podem ser iguais. 
O sobrenome, também chamado de “apelido de família” ou “patronímico”, é o 
sinal distintivo do tronco ancestral de onde provém a pessoa natural (tronco natural 
ou civil, decorrente de adoção). Ao contrário do que os profanos pensam, não 
existe a obrigatoriedade de o sobrenome ser o do pai. Pode ser o do pai, o da mãe, 
ou os dos dois. O sobrenome também pode ser simples ou composto. Quaisquer 
partículas existentes entre prenome e sobrenome, ou entre palavras de prenomes 
compostos, são chamados de nomes do meio. A partícula, facultativa, que 
antecede ao prenome, é chamada de axiônimo. (Ex.: Dom, Doutor, etc., quando 
assentados no registro civil). A partícula, também facultativa, que sucede ao 
sobrenome, e é utilizada, normalmente, para diferenciar o nome, quando é igual às 
dos ancestrais, é chamada de agnome. (Ex.: Júnior, Neto, Bisneto, Segundo, Filho, 
etc.). 
 
1.1.3.2.7.2 MUDANÇA DO NOME 
Em regra, o nome é imutável. Pode ser mudado em algumas situações. As 
causas de mudança do nome podem ser Voluntárias ou Legais (também chamadas 
obrigatórias ou necessárias). 
 
1.1.3.2.7.2.1 CAUSAS VOLUNTÁRIAS DE MUDANÇA DE NOME 
 
14 Natureza jurídica é a qualificação de um instituto que o faz inserir-se num regime normativo 
determinado. Dependendo da natureza jurídica do instituto, este ou aquele conjunto de normas será 
aplicado ao caso. Logo, ao perguntarmos a natureza jurídica de algo, estamos perguntando, em 
verdade, “Para o direito, o que isso representa?”. 
 
52 
 
Por exceção e em casos determinados, o nome pode ser mudado, inteiro ou em 
parte. A mudança voluntária pode ser imotivada ou motivada. A mudança 
voluntária imotivada pode ocorrer no primeiro ano, após a maioridade, conforme 
o Artigo 56 da Lei de Registros Públicos (LRP). Aqui se pode mudar o prenome, 
visto que a lei especifica que “os apelidos de família não podem ser mudados”. 
Ora! Se a lei textualmente diz o que não pode ser mudado, é porque o restante 
pode! 
Após o primeiro ano de maioridade, a mudança precisa ser motivada, sendo as 
seguintes as motivações possíveis: 
Acréscimo de Apelidos15 Públicos Notórios – nos termos do Artigo 58 da 
LRP, como “Xuxa”, “Lula”, “Maguila” etc., apelido, codinome, pseudônimo, 
alcunha e hipocorístico são a mesma coisa. Segundo encontramos no livro de 
Eliana Maltini16, “apelido hipocorístico” é designação atribuída a uma pessoa como 
modo de demonstração de carinho: Bel para Isabel, Nando para Fernando, 
Mundico e Mundinho para Raimundo, Chico para Francisco, Quico para Frederico, 
Tião para Sebastião etc. Nesse caso, a mudança é para adicionar tais apelidos, 
normalmente como partícula de “nome do meio”. 
Mudança de estado civil – Aqui falamos em mudança da partícula sobrenome. 
Casamento, divórcio e viuvez são situações que permitem a mudança do 
sobrenome. Tal mudança é facultativa e pode ser operada por qualquer dos 
nubentes, ou por ambos, acrescendo ao seu sobrenome o do outro. A perda do 
sobrenome do outro só dar-se em caso de culpa na separação do casal, mas, ainda 
assim, se o culpado comprovar que a mudança do nome ao estado anterior trará 
prejuízo à sua identificação, grande diferença entre seu nome e o da prole comum, 
ou qualquer dano grave, poderá manter o nome do ex-cônjuge. Pode-se mudar o 
nome também na união estável, desde que o outro convivente concorde com a 
mudança. (Artigo 57, §2.o, LRP). 
Desconforto objetivo – No caso de ridículo, o proprietário do nome pode 
mudá-lo, e a mudança aqui pode ser de qualquer partícula do nome ou, inclusive, 
do nome inteiro! Nos termos do Artigo 57 da LRP, desconforto subjetivo é aquele 
de você em relação ao seu próprio nome; esse não autoriza a mudança. O 
desconforto precisa ser tal que, em tese, qualquer pessoa se acharia desconfortável 
com aquele sobrenome. É operado por via judicial, e precisa-se convencer o 
magistrado e, para melhor resultado, membro do Ministério Público, que será 
ouvido no processo. 
Retificação de erros gráficos – Para alguns doutrinadores, a retificação não é 
mudança, uma vez que implica verdadeira mudança para uma nova grafia; não 
 
15 A palavra apelido tanto quer dizer sobrenome (conforme a LRP) quanto pseudônimo! 
16 CAPEZ , Fernando (coord.); MALTINI, Eliana Raposo. Direito Civil – Parte Geral (perguntas e 
respostas). Ed. Saraiva. São Paulo, 2007, p.47 
53 
 
deixa de ser, formalmente, uma mudança, razão pela qual a incluímos como causa 
aqui. 
Mudança de sexo – A Resolução CFM n.º 1.652/2002 autoriza, no Brasil, a 
cirurgia para mudança de sexo (transgenitalismo) e determina que “a seleção dos 
pacientes para cirurgia de transgenitalismo obedecerá à avaliação de equipe 
multidisciplinar constituída por médico psiquiatra, cirurgião, endocrinologista, 
psicólogo e assistente social”. A transformação de homem em mulher chama-se 
“neocolpovulvoplastia”; e o inverso, “neofaloplastia”. E os Tribunais têm aceitado 
a mudança de nome (e inclusive de gênero, no Registro Civil) após a realização de 
tais cirurgias, conforme dois julgamentos abaixo: 
NOME – Registro civil – Modificação de prenome masculino para feminino – 
Pretensão manifestada por transexualque se submeteu à cirurgia de mudança de 
sexo – Admissibilidade, ainda que não se admita a existência de erro no registro – 
Circunstância que expõe o requerente ao ridículo – Interpretação do Art. 55, par. 
ún., c/c o Art. 109 da Lei 6.515/73 (TJSP) – RT 790/155. 
REGISTRO CIVIL – Alteração do estado sexual no assento de nascimento – 
Admissibilidade – Pretensão de transexual primário, submetido à cirurgia de 
mudança de sexo, que teve seu pedido de alteração de prenome deferido – 
Requerente que– após a intervenção cirúrgica– passou a ter as principais 
características morfológicas de uma mulher (TJSP) – RT 801/195. 
Tal mudança de nome também é embasada pelo enunciado 276 da 4JDC. “O 
Art. 13 do Código Civil, ao permitir a disposição do próprio corpo por exigência 
médica, autoriza as cirurgias de transgenitalização, em conformidade com os 
procedimentos estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina, e a consequente 
alteração do prenome e do sexo no Registro Civil”. 
Testemunha sob proteção voluntária – O Artigo 9.º da Lei de Proteção à 
Testemunha17 enuncia que, “em casos excepcionais, e considerando as 
características e a gravidade da coação ou da ameaça, poderá o conselho 
deliberativo encaminhar requerimento da pessoa protegida ao juiz competente para 
registros públicos objetivando a alteração de nome completo”. É possível, nesse 
caso, inclusive haver mudança de nome dos filhos menores também. Tal mudança 
perdurará até a cessação da coação ou da ameaça que deu causa à proteção. Nota-se 
que o nome só é compulsoriamente mudado caso o conselho deliberativo assim o 
determine, motivo pelo qual alocamos tal espécie de mudança em causa obrigatória 
de mudança de nome. 
 
17 Lei n.º 9.807, de 13 de julho de 1999, que “estabelece normas para a organização e a manutenção 
de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas; institui o Programa 
Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas” (sic Ementa da Lei) 
 
54 
 
“Nome social” – Alguns estados-membros e municípios permitem que seus 
servidores adotem “nome social” em suas identificações funcionais. É o nome 
adequado a pessoas que mudam seu fenótipo para o sexo oposto, mas não fizeram 
cirurgia de transgenitalização. 
 
1.1.2.3.7.2.2 CAUSAS OBRIGATÓRIAS DE MUDANÇA DE NOME 
Adoção – A lei determina que o adotado terá seu nome trocado; o sobrenome 
obrigatoriamente será o dos novos pais, e existe a possibilidade da mudança do 
prenome do adotado, conforme o Artigo 47, parágrafo quinto, do ECA – o detalhe 
importante é que dependerá de aprovação do adotado se este contar com 12 anos ou 
mais. Inclusive, conforme enunciado 273 da 4JDC, “deverá ser averbado o 
cancelamento do registro originário de nascimento do adotado, lavrando-se novo 
registro. Sendo unilateral a adoção e sempre que se preserve o vínculo originário 
com um dos genitores, deverá ser averbada a substituição do nome do pai ou da 
mãe natural pelo nome do pai ou da mãe adotivos”. Já é um início de interpretação. 
Mudança de filiação – Nos casos de ações investigativas ou negatórias de 
paternidade/maternidade que resultam em mudança na filiação, e desde que se 
conheçam os verdadeiros pais, a lei determina a mudança do sobrenome dos filhos 
para o sobrenome dos pais biológicos, nos termos dos Artigos 1609 a 1615 do 
Código. Ressalte-se que pode inclusive ocorrer mudança de nome “por tabela”, no 
caso de haver mudança do nome dos pais, o que refletirá em mudança do nome dos 
filhos. 
Testemunha sob proteção compulsória – Vale aqui o que dissemos sobre a 
Lei de Proteção à Testemunha. Uma vez que o ingresso em tal programa é 
facultativo, mas também pode ser compulsório, temos que, nesse caso, há uma 
forma obrigatória de mudança de nome. 
 
1.1.3.2.7.3 PROTEÇÃO AO NOME 
O uso do nome é livre, com uma proibição e uma restrição. 
Quanto à proibição, o nome não pode ser utilizado por outrem em publicações 
que tragam desprezo público ao titular do nome, ainda que quem o utiliza não 
tenha intenção de causar tal infortúnio – essa locução é perigosíssima, pois a noção 
do que seja “desprezo público” é dada pela suposta vítima; não por quem usou o 
nome desta. A restrição é que o nome só pode ser usado por propaganda com 
autorização do seu titular. A palavra “propaganda”, aqui, deve ser entendida como 
“uso que traga lucro para alguém”. Quanto ao limite do que seja identificável como 
uso do nome em publicidade, o enunciado 278 da 4JDC é claro ao dizer que 
“Art.18. A publicidade que venha a divulgar, sem autorização, qualidades inerentes 
a determinada pessoa, ainda que sem mencionar seu nome, mas sendo capaz de 
identificá-la, constitui violação a direito da personalidade”. 
55 
 
 
1.1.3.2.8 DOMICÍLIO 
Domicílio é a sede jurídica de uma pessoa. Assim como é dado a qualquer 
pessoa processar outrem (Artigo 5.º XXXV da CF), igualmente é proibido a 
qualquer pessoa furtar-se a ser encontrado. Ou seja, todos nós temos que ter uma 
localização geográfica. Domicílio é onde a pessoa pode ser encontrada para tratar 
de todas as consequências dos seus atos, quer boas, quer más. Segundo o nosso 
ordenamento jurídico, não há pessoa sem domicílio. Trataremos nesta obra apenas 
do domicílio civil, que se diferencia um pouco do domicílio tributário e do 
eleitoral, afetos àquelas esferas didáticas do direito. 
 
1.1.3.2.8.1 ESPÉCIES DE DOMICÍLIO 
Lembramos que estamos no âmbito do domicílio civil. Este se divide em 
domicílio da pessoa natural e da pessoa jurídica. Este último será estudado no 
momento de explanação sobre aquele outro tipo de pessoa. Fiquemos aqui, 
portanto, no domicílio da pessoa natural. 
Este pode ser voluntário (subdividindo-se em único, plúrimo e eventual), 
profissional, legal (ou necessário), contratual e diplomático. 
O domicílio voluntário é aquele escolhido pela pessoa. Local de repouso 
é, para o direito, “moradia”. Repouso no mesmo local sempre gera o conceito de 
“residência”; assim, residência é a moradia estável. A residência com vontade de 
definitividade é o domicílio. Assim, alguém que vai morar cinco anos em um local 
para cursar faculdade está residindo, mas não está domiciliado. Se alguém tiver 
mais de uma residência, terá domicílio plúrimo ou múltiplo. Caso alguém não 
tenha residência física, onde for encontrado será considerado seu domicílio (é o 
caso do mendigo, andarilho, nômade, cigano etc.). 
O domicílio profissional é imponível a alguém para as relações jurídicas que 
versem sobre seu trabalho. 
O domicílio legal ou necessário não é escolhido pela própria pessoa; é 
escolhido pelo Estado, indicado por meio da lei. Está previsto no Artigo 52 do 
CCB. É o caso do domicílio do incapaz, do preso, do marítimo, do militar e dos 
servidores públicos. Costumamos usar, em sala de aula, o mnemônico ISMIMPRE 
(desenhamos uma imagem de um rapaz com a palavra “ismimpre” escrita na 
barriga, tendo na mão uma bandeira com o número 76) – ISMIMPRE = Incapaz, 
Servidor, MIlitar , Marítimo e PREso. 
56 
 
 
Figura 19 - IsMiMPre 
O incapaz terá o mesmo domicílio de seu responsável; o servidor público terá o 
domicílio na repartição onde trabalha, para que possa ser mais facilmente 
localizável (ser servidor público exige maior responsabilidade e comprometimento, 
na visão da lei). O militar do Exército terá domicílio onde servir; o domicílio da 
Marinha e o da Aeronáutica serão a sede do comando. O Marítimo terá domicílio 
no lugar de matrícula (registro) da embarcação; e o preso será domiciliado onde 
cumpre pena. Se a lei usou a palavra “pena”, entendemos que se trata somente do 
preso definitivo, já apenado. 
O domicílio mais complexo é o do diplomata, visto que tem um tipo especial 
de domicílio, a que chamamos“escalonado”: mais de um domicílio, mas com uma 
ordem de precedência entre eles; está previsto no Artigo 77 do Código. 
Basicamente, o domicílio dodiplomata é o local onde está atuando, mas pode ser 
que o diplomata queira esquivar-se da jurisdição Brasileira, utilizando o aparato do 
país em que atua (é isso que significa “alegar extraterritorialidade”!); ao fazer isso, 
surgem dois novos domicílios (por isso dizemos “escalonado”); cabendo ao 
demandante escolher entre o Distrito Federal (é óbvio que há de se indicar ONDE, 
no DF, o diplomata está lotado; com 99% de certeza, será o Ministério das 
Relações Exteriores) e, caso fique mais cômodo para o demandante, o logradouro, 
no Brasil, no qual por último habitou (residência), antes de sua partida para o 
exterior. 
As pessoas podem determinar um domicílio contratual, que é o foro de 
julgamento das questões conflituosas porventura emanadas daquele contrato entre 
elas, fazendo surgir a “cláusula de foro” ou “foro de eleição”. 
Por último (mas não menos importante) lembramos que o domicílio tem 
proteção constitucional, consoante o Artigo 5.o, inciso XI; no Art. 150 do Código 
Penal; e nos Artigos 94, parágrafos 2.o e 3.o, e 98, todos do Código de Processo 
Civil. 
 
57 
 
1.1.3.2.8.2 MUDANÇA DE DOMICÍLIO 
Existem duas formas de se mudar o domicílio: forma expressa ou forma tácita. 
A forma expressa, de rara ocorrência (embora, para as pessoas jurídicas, seja a 
forma devida, unicamente), ocorre quando a pessoa avisa ao município de saída 
sobre estar deixando-o e avisar ao município de chegada sobre sua instalação neste. 
A forma tácita, tão comum que até parece ser a única forma existente, ocorre 
quando a pessoa simplesmente se muda, ficando claro pelas aparências (levando 
todos os seus bens móveis, por exemplo) que está efetivamente deixando um 
município e transferindo-se para outro. 
 
1.1.3.2.9 DIREITOS DA PERSONALIDADE 
Os “Direitos da Personalidade” são a aplicação, na esfera cível, dos “Direitos 
Fundamentais” da Constituição e dos “Direitos Humanos”, os chamados interesses 
difusos. São prerrogativas inerentes ao ser humano, que este possui pelo simples 
fato de existir. Assim, não importa se estamos tratando de uma freira carmelita ou 
de um fascínora homicida: um e outro gozam de tais direitos. Segundo 
pensamentos filosóficos, o homem é a união dos elementos Corpo-Mente-Espírito. 
Esses três elementos “contaminaram” o pensamento jurídico, de forma que os 
direitos da personalidade se dividem em três grupos, cada grupo tutelando um dos 
elementos expostos: o direito à integridade física tutela o CORPO; o direito à 
integridade psíquica tutela a MENTE; o direito à integridade moral tutela o 
ESPÍRITO. 
Assim, os direitos da personalidade se agrupam em “Integridade Física”, 
“Integridade Psíquica” e “Integridade Moral”. Estudemo-los. 
 
1.1.3.2.9.1 INTEGRIDADE FÍSICA 
O direito à integridade física é a prerrogativa de todo ser humano de manter 
incólume a higidez e a coerência formal de seu corpo, de poder movimentá-lo e de 
dar-lhe destino. 
O grupo de direito à integridade física inclui vida, liberdade e corpo. 
Direito à vida é o direito de morrermos por uma causa natural, e não 
provocada. Logo direito à vida não é, como pode parecer, “direito de permanecer 
vivo”, visto que todos nós morreremos. Direito à vida é a garantia de que 
morreremos de senilidade mesmo, e não por ato de outrem. É o mais importante 
direito do ser humano, mas ainda assim possui várias limitações, como a pena de 
morte para o caso de guerra declarada18 e no caso de abortamento19 permitido pelo 
direito. 
 
18 Segundo o Código de Processo Penal Militar, a pena de morte será aplicada por meio de 
fuzilamento. 
58 
 
Os abortamentos permitidos são sempre praticados por médico. São três; dois 
estão em lei; no caso, no Artigo 128 do Código Penal. O primeiro é o “aborto 
terapêutico” – também chamado de “necessário”; pela lei, é o praticado para 
salvar a mãe. A ideia é que a lei não deve, no confronto extremo, privilegiar uma 
nova vida que não se saberá viável em relação a uma vida já consolidada e com 
uma história já percorrida. Detalhe: não exige a lei vontade da gestante, o que nos 
leva a concluir que deverá (e não somente “poderá”) ser praticado, inclusive, contra 
a vontade da mãe – admitir o contrário seria legalizar a eutanásia, tecnicamente, já 
que a mãe estaria abdicando da própria vida. Em nossa opinião, esse abortamento 
será legal mesmo que praticado por qualquer pessoa, não somente por médico, já 
que quem o praticar estará em “estado de necessidade de terceiro”, ou seja, atuando 
em prol da vida da mãe. O segundo é o “Aborto sentimental”, que é o aborto para 
eliminar gravidez resultante de estupro; a mens legis aqui foi ajudar a apagar da 
mente e da alma da mãe as terríveis lembranças do fato. 
A jurisprudência permite o “Aborto de feto anencefálico” – Em decisões 
incidentais se tem permitido o aborto de feto sem cérebro. Os argumentos 
principais são dois: inviabilidade de vida pós-parto, o que geraria um desgaste 
físico inútil à gestante, gerando algo inviável; ou o fato de que, sem cérebro, não 
estaria sendo gerada, tecnicamente, uma pessoa, já que sequer teria 
autoconsciência. 
Nesse último caso, o STF, nos casos em que lá chegaram, permitiu o aborto. 
Mas falta ainda uma decisão definitiva. Parece que a espera chegou ao fim. Na 
manhã de 23 de março de 2012, surgiria a notícia: a insegurança quanto ao aborto 
de anencefálico chegará ao fim, pois, em 11 abril desse ano, seria, definitivamente, 
julgada tal permissão. 
Detalhe: já li doutrinadores afirmando que o certo é “abortamento”; pois 
“aborto” seria o produto do abortamento, ou seja, o feto já sem vida. 
E ainda se permite a retirada da vida nos casos extremos de legítima defesa, 
estado e necessidade, exercício regular de direito e caos, que serão estudados no 
capítulo referente à Responsabilidade Civil. 
Temos ainda direito ao corpo, seja este vivo, seja morto. Corpo é o suporte 
físico da personalidade material. 
No que toca ao direito ao próprio corpo vivo, é direito de fazermos com o corpo o 
que bem entendermos; até lesioná-lo, desde que não haja perda de membro, sentido 
ou função (lembramos que brinco, piercing e tatuagem são lesões!). A lei proíbe a 
aplicação de tratamento médico ou cirúrgico com risco de morte, sem 
consentimento do paciente. Mas lembramos que o médico está isento de tal 
proibição quando o paciente estiver em iminente risco de vida! (Art. 146, §3.o, I do 
 
19 Embora coloquialmente usemos a palavra “aborto”, lembramos que aborto é o produto do ato 
chamado abortamento. 
59 
 
Código Penal). O Artigo 13 do CCB nos diz que, para alguém diminuir de forma 
permanente sua integridade física, precisa de exigência médica. O Enunciado 6 da 
1JDC afirma que tal “exigência médica” do Artigo 13 refere-se tanto ao bem-estar 
físico quanto ao bem-estar psíquico do disponente, e o Enunciado 403 da 5JDC nos 
diz que "O Direito à inviolabilidade de consciência e de crença, previsto no art. 5º, 
VI, da Constituição Federal, aplica-se também à pessoa que se nega a tratamento 
médico, inclusive transfusão de sangue, com ou sem risco de morte, em razão do 
tratamento ou da falta dele, desde que observados os seguintes critérios: a) 
capacidade civil plena, excluído o suprimento pelo representante ou assistente; b) 
manifestação de vontade livre, consciente e informada; e c) oposição que diga 
respeito exclusivamente à própria pessoa do declarante." 
Podemos dispor gratuitamente do próprio corpo, com finalidade científica ou 
altruística. A lei não nos diz qual “altruísmo” seria esse. No que tange à doação de 
órgão, só nos é permitido doar, em vida, órgãos dúplices ou autorregeneráveis. À 
exceção desses, a retirada somente pode ocorrer após a morte. A doação de órgãos 
após a morte depende de autorização do cônjuge ou deoutro parente em linha reta, 
ou colateral, até o segundo grau, ainda que o morto tivesse manifestado tal vontade 
em vida (é o chamado sistema de “Consenso Afirmativo”). O enunciado 277 da 
4JDC entendeu que, “ao afirmar a validade da disposição gratuita do próprio corpo, 
com objetivo científico ou altruístico, para depois da morte, determinou que a 
manifestação expressa do doador de órgãos em vida prevalece sobre a vontade dos 
familiares, portanto a aplicação do Art. 4.º da Lei n.o 9.434/97 ficou restrita à 
hipótese de silêncio do potencial doador”. Complicado isso, pois a execução 
forçada da vontade do doador não ofenderia a dignidade dos seus entes vivos? 
Lembramos que no Brasil não é permitida a transferência onerosa de órgãos. 
Somente doação! Daí por que não pode existir “barriga de aluguel”; legalmente, 
somente pode haver “empréstimo de barriga”. Igualmente não pode haver, segundo 
a letra fria da lei, a “venda de cabelo”, embora saibamos que esse é um crime 
amplamente praticado e tolerado. 
O direito ao próprio corpo inclui o direito ao próprio corpo vivo e ao próprio 
corpo morto, visto que nos é dada a possibilidade de não só doar nossos órgãos, 
mas também de doar o nosso próprio cadáver! 
Como último (mas não menos importante) direito à integridade física, temos o 
“direito à liberdade”, que é o direito de “ir, vir e ficar” – Assim, permanecer onde a 
lei o permite é também o exercício de direito à liberdade. A liberdade do ser 
humano pode ser restringida ou cerceada validamente, quando aplicado o devido 
processo legal. 
 
1.1.3.2.9.2 INTEGRIDADE PSÍQUICA 
60 
 
Esse grupo de direitos da personalidade abrange o direito à criação, à liberdade 
de manifestação e de pensamento. Em países como o nosso, não se costuma 
valorizar tais direitos que, em países totalitários, ainda estão sendo almeijados. 
O promotor Mário Ypiranga, com a usual lucidez de palavras, nos diz20: 
“Respeitar a liberdade de expressão, permitindo-se a exposição de ideias, 
conceitos, opiniões, doutrinas e críticas, traduz-se em respeito à democracia. O 
direito à exposição de ideias é sublime, devendo ser respeitado, assim como o 
direito à própria vida. Essa liberdade de manifestação do pensamento, no entanto, 
não autoriza a mentira, o boato, a maledicência”. 
Assim, o abuso do direito de expressão, como o de qualquer direito, pode levar 
a sanções na ordem administrativa, civil e penal. A sanção civil chama-se 
“responsabilidade civil” e será estudada em momento oportuno nesta obra. 
A lei permite ao jornalista o “sigilo da fonte”, que, longe de parecer qualquer 
imunidade, apelas lhe retira a obrigatoriedade de indicar a origem de sua 
informação, mas, em esta lesionando alguém, responderá ele, o jornalista, como 
sendo a origem da informação. 
 
1.1.3.2.9.3 INTEGRIDADE MORAL 
Inclui os valores de uma pessoa: imagem, identidade, intimidade, vida privada, 
som, moral e honra. Esse grupo de direitos protege a imagem, o som (voz – Art. 
5.o, XXVIII da CF), a intimidade e a vida privada. No que toca a esses dois 
últimos, lembramos que “Intimidade” é o segredo; e “Vida Privada” é o espaço 
físico dado a cada ser humano como sendo inviolavelmente seu. Sobre intimidade, 
o Enunciado 404 da 5JDC diz que "A tutela da privacidade da pessoa humana 
compreende os controles espacial, contextual e temporal dos próprios dados, sendo 
necessário seu expresso consentimento para tratamento de informações que versem 
especialmente o estado de saúde, a condição sexual, a origem racial ou étnica, as 
convicções religiosas, filosóficas e políticas." 
Quanto ao Direito à Honra, precisamos, para entendê-lo, traçar uma ideia, 
prévia, de “moral”. Moral é o conjunto de valores de uma pessoa. Todos os valores 
de uma pessoa (amizade, lealdade, respeito, religião, pudor etc.) são chamados de 
“moral” da pessoa. Ocorre que todos nós elegemos alguns desses valores como 
mais importantes e os colocamos no topo da nossa moral. Ao conjunto dos valores 
mais importantes de uma pessoa, chamamos de “honra”. 
Identidade é o conjunto de características que tornam cada pessoa um ser único 
no universo. É formada por vários outros direitos, a saber: nome, imagem, som. 
 
20 MONTEIRO NETO, Mário Ypiranga. Crônicas de um país chamado Brasil. Ed. da Universidade 
Federal do Amazonas – Edua. Manaus, 2003, p.115 
 
61 
 
No caso da imagem, esta se divide em Imagem-Retrato e Imagem-Atributo. 
Imagem-Retrato é a forma plástica de nossa personalidade (sim! É possível ver 
nossa personalidade! Olhe-se no espelho!); e Imagem-Atributo é o conjunto de 
características não plásticas que individualizam a pessoa, como a boa fama, 
respeitabilidade pública etc. É também chamada de “reputação”, pois a palavra 
putare em latim equivale a “imaginar” (expressões como “credor putativo” ou 
“legítima defesa putativa” se referem a fatos não ocorridos, mas que foram 
imaginados), daí dizermos que “reputação é o que pensam (imaginam) que somos”. 
O enunciado 279 da 4JDC nos dá um norte: “Art.20. A proteção à imagem 
deve ser ponderada com outros interesses constitucionalmente tutelados, 
especialmente em face do direito de amplo acesso à informação e da liberdade de 
imprensa. Em caso de colisão, levar-se-á em conta a notoriedade do retratado e dos 
fatos abordados, bem como a veracidade destes e, ainda, as características de sua 
utilização (comercial, informativa, biográfica), privilegiando-se medidas que não 
restrinjam a divulgação de informações”. 
 
1.1.3.2.9.4 CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE 
Os direitos da personalidade gozam de alguns atributos: são absolutos, 
intransmissíveis, irrenunciáveis, inquantificáveis monetariamente, perpétuos, 
imprescritíveis, limitáveis e gerais. 
Os direitos da personalidade valem contra todos; nesse sentido, podemos dizer 
que eles são absolutos. Cuidado com essa palavra “absoluto”, pois é traiçoeira e 
possui mais de um sentido. No primeiro sentido, um direito é absoluto quando não 
pode sofrer espécie alguma de limitação, sendo plenamente exercitável em 
qualquer situação que se imagine. O direito até hoje não sabe se existe direito 
absoluto, visto que até o direito à vida pode sofrer limitações (como no caso da 
pena de morte em guerra declarada ou nos casos de aborto permitido). No segundo 
sentido, um direito pode ser relativo ou absoluto. É relativo se só for oponível e 
cobrável pela outra pessoa determinada (ou outras pessoas, desde que 
determináveis). Assim, a fidelidade no casamento é relativa, pois um cônjuge só 
pode cobrar fidelidade conjugal do outro e de mais ninguém. Os contratos são 
relativos, pois “fazem lei entre as partes”, e só entre elas. Um direito, aqui, é 
chamado de absoluto quando pode ser oponível erga omnes. O direito de 
propriedade, nesse sentido, é absoluto, pois nenhuma outra pessoa do universo 
pode atentar ilegalmente contra sua propriedade; você pode defendê-la contra 
todos. Sob essa acepção, os direitos da personalidade são absolutos, pois você pode 
defender sua integridade física, psíquica e moral contra ataque de qualquer outra 
pessoa. 
São intransmissíveis; podem até ser cedidos para uso de terceiros (como no 
caso de direito de imagem), mas não são transferíveis de forma definitiva a 
62 
 
ninguém, seja de forma gratuita, seja de maneira onerosa, voluntária ou 
involuntária; são irrenunciáveis, podendo até não serem exercidos, mas 
permanecem à disposição do titular para o exercício; são inquantificáveis 
monetariamente, daí por que são, também, impenhoráveis; são perpétuos, já que 
duram ad eternum; são imprescritíveis, pois, mesmo que o titular nunca utilize tais 
direitos, não os perderá; são limitáveis, pois podem sofrer limitações temporárias e 
determinadas, como nos deixa claro o enunciado 4 da 1JDC; e o enunciado 139 da 
3JDC também toca no assunto: “Art. 11: Os direitos da personalidadepodem sofrer 
limitações, ainda que não especificamente previstas em lei, não podendo ser 
exercidos com abuso de direito de seu titular, contrariamente à boa-fé objetiva e 
aos bons costumes; e são gerais, visto que todas as pessoas os possuem 
(lembramos que até os nascituros e as pessoas jurídicas os possuem). 
 
1.1.3.2.9.5 TUTELA DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE 
A palavra “tutela”, aqui, é usada no significado de “proteção” – não 
significando o “suprimento de capacidade” que estudamos há pouco. “Tutela” são 
os meios judiciais para se garantirem os direitos da personalidade. É cabível 
às pessoas vivas e mortas, já que, como afirmamos, somos partidários da teoria da 
“personalidade formal”, em que a personalidade subsiste até após a morte do 
sujeito. 
Uma vez que um ou mais dos direitos da personalidade sofrem lesão ou ameaça 
de lesão, cabe a invocação de tutela. 
O Artigo 12, caput, do CCB nos diz que a tutela pode ser prévia ou posterior: 
“Pode-se exigir que cesse a ameaça ou a lesão a direito da personalidade e reclamar 
perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”. Entendamos que 
a “cessação da ameaça” é ensejadora do requerimento de tutela prévia, “ou a lesão” 
posterior. Existe, portanto, a tutela prévia que visa a impedir que ocorra a lesão, e a 
tutela posterior que opera a cessação, a punição e a reparação da lesão já ocorrida. 
No que toca à vítima sendo uma pessoa viva, ela, e somente ela, pode defender 
tal direito, seja diretamente, seja por representante. 
No que toca à defesa de direito da personalidade do morto, o Artigo 12, 
parágrafo único, do CCB permite que os colaterais (tios, sobrinhos, irmãos) 
defendam a honra do seu ente falecido perante o Judiciário; diz o Artigo “qualquer 
parente...” – A questão é: inclui os afins? Afins são as pessoas que se tornam 
parentes (daí o termo “parentesco por afinidade”) pelo casamento – sogro, sogra, 
enteado, cunhado. Não adianta ler várias vezes: a redação do Artigo não ajuda: 
“Art. 12. (...) Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para 
requerer a medida prevista neste Artigo o cônjuge sobrevivente, 
ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau.” (no capítulo 
sobre direito de família ensinamos a contar os graus de parentesco). 
63 
 
Tudo depende do que está incluso no “qualquer”; pela semântica gramatical, 
qualquer parente é o natural ou por afinidade (e nisso incluiria o cunhado e a 
sogra); pela hermenêutica restritiva, trata-se de um “silêncio eloquente” no qual, se 
a lei quisesse ter incluído os afins, tê-lo-ia feito expressamente, o que excluiria os 
afins de exercitar a defesa em tela. Até dentre os que entendem incluir no Artigo os 
afins, há divergência: afirmam alguns que somente os afins em linha reta (sogro e 
sogra) poderiam defender a honra do morto; outros, entre os quais eu me incluo, 
afirmam que pode ser qualquer afim (assim, até os cunhados estariam legitimados a 
tal defesa). 
Já no que toca à tutela à integridade moral e psíquica dos mortos ou ausentes, a 
lei exclui os afins e foi clara quanto ao fato de que podem ser manejados, conforme 
o parágrafo único do Artigo 20, o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. 
Lembramos que esse rol dos Artigos 12 e 20 inclui também o companheiro, 
como nos informa também o enunciado 275 da 4JDC: “O rol dos legitimados de 
que tratam os Arts. 12, parágrafo único, e 20, parágrafo único, do Código Civil 
também compreende o companheiro”. 
 
1.1.3.2.9.5.1 TUTELA PRÉVIA 
Imagine que você toma conhecimento de que na edição do jornal de terça-feira 
da semana que vem será veiculada uma matéria falsa e difamatória sobre você. E 
então? Vai esperar ser veiculada? Esperar ter a imagem arranhada? Até provar que 
“cabelo não dá em ovo”, que “jacaré não é golfinho” e que “19 não são 20”, sua 
imagem-atributo e sua honra subjetiva já terão ido para o espaço! 
Justamente para casos como esse, existem mecanismos de tutela prévia de 
direitos da personalidade. Em qualquer ação pode ser pedida uma antecipação de 
tutela que proteja o autor da ação contra a ocorrência de determinado dano cuja 
ocorrência iminente se consiga provar. 
Sempre que a ameaça de ofensa de direito provier de alguma autoridade 
pública, existe o Mandado de Segurança (MS) Preventivo, cuja liminar manda que 
não se venha a praticar o ato. O MS, embora rápido, tem como principal óbice a ser 
transposto a matéria probatória, visto que essa ação exige prova pré-constituída, ou 
seja, não existe dilação probatória; ou apresenta a prova exauriente, ou não 
consegue a medida. 
A ameaça ao direito à liberdade é protegida pelo Habeas Corpus preventivo, 
cujo resultado é um Salvo Conduto contra determinada ofensa por determinado 
motivo. 
Qualquer outro direito de personalidade pode ser tutelado judicialmente de 
forma prévia, mediante obtenção de uma liminar mandamental para que não se 
pratique tal ato, sob pena de alguma reprimenda (geralmente pecuniária). Se tal 
reprimenda for multa ou multa diária, não pode ser tão pequena que o transgressor 
64 
 
em potencial a ignore, nem muito grande para que a suposta vítima não passe a 
preferir a ocorrência do dano para ganhar um “prêmio de loteria”. 
 
1.1.3.2.9.5.2 TUTELA POSTERIOR 
Ocorrido o dano, uma diferenciação precisa ser empreendida: no caso das 
ofensas instantâneas, há de se requerer a reparação do dano causado, seja por 
compensação, seja por indenização21 e/ou retratação. Caso haja ainda subsistência 
do dano, há de ser pedido o fim da prática danosa, por tutela específica/inibitória, 
que é a imposição de multa diária ou qualquer outra medida de coerção sobre o 
agente que pratica o dano para que o deixe de fazer. 
Caso o dano seja causado por autoridade pública, urge o Mandado de 
Segurança como medida hábil, desde que haja prova pré-constituída sobre a 
Conduta, o Dano e o Nexo Causal do fato. Igualmente é cabível o “HC” para o 
caso de ofensa à liberdade. 
Finda a prática danosa, ingressa-se com a ação de reparação de dano; 
lembrando que é possível e desejável, exceto nos casos de MS e HC, o ajuizamento 
de ação ordinária com pedido de antecipação de tutela para a cessação do dano. 
 
1.1.3.2.10 MORTE 
Morte é o fim da personalidade material. Para os adeptos da teoria da 
personalidade única, morte é tão somente “o fim da personalidade” – de qualquer 
forma, “morte” é um conceito jurídico; não biológico. Nada mais errado do que 
afirmar que a morte “é o fim da vida”; não para o direito! Existem casos, como na 
morte presumida, em que o sujeito pode estar biologicamente vivo, e juridicamente 
morto, como aprenderemos no momento oportuno. 
A morte provoca consequências patrimoniais, obrigacionais, contratuais, 
matrimoniais e sucessórias. 
No mundo jurídico a morte pode ser real ou presumida. 
 
21 A diferença entre compensação e indenização é explanada em nosso estudo sobre 
Responsabilidade Civil. 
65 
 
 
Figura 20 - Morte 
Morte Real é morte com cadáver. É contestada e atestada. Ocorre com término 
de atividade cardiorrespiratória do ser humano. Deixamos claro que a parada 
temporária de tais funções não representa, por óbvio, morte. O laudo médico é 
documento hábil à comprovação de tal morte. 
É importante ser lembrado que, para fins de transplante (e somente para tal 
fim!), o momento da morte é o término da atividade encefálica; é que a Lei n.º 
9.434, de 4 de fevereiro de 1997, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e 
partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento, diz textualmente: 
“Art. 3.º A retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano 
destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de 
morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das 
equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicose 
tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina.” 
(grifamos) 
Morte presumida é a situação em que não se sabe se alguém está morto, mas a 
lei permite que haja as consequências da morte do sujeito em tela. Assim, por 
questão de segurança jurídica, ou seja, para que haja uma estabilidade nas relações 
jurídicas, a lei permite que a morte, em determinadas situações, seja presumida, 
artificialmente “fabricada”, em três casos: 
A lei presume a morte de quem foi visto, pela última vez, em grave risco de 
vida, como no caso do corpo não encontrado de quem estava em uma aeronave que 
caiu. Logo depois do acidente, pode-se ingressar com Ação de Justificação para, 
mediante sentença, declarar-se a morte da vítima. 
A lei também presume a morte de quem é feito prisioneiro em guerra 
declarada, e não seja encontrado por pelo menos dois anos após o término desta, 
66 
 
cessadas as buscas. Note que aqui existe um prazo mínimo para a declaração 
judicial de morte. 
Nas situações acima, temos o elemento “risco” associado ao desaparecimento. 
Mas se alguém “foi comprar cigarros e nunca mais voltou?” – o risco, em 
princípio, inexiste. A lei presume a morte do sujeito que se encontra ausente por no 
mínimo dez anos (contados do início do processo de ausência). Estudaremos a 
ausência em tópico próprio, devido ao seu detalhamento legal. 
Quando dois sujeitos (ligados por qualquer relação jurídica em que importe a 
ordem do momento da morte entre eles para transferência de patrimônio) morrem 
sem se poder precisar qual morreu primeiro, a lei presume, para gerar estabilidade 
jurídica, que morreram simultaneamente. Tal fenômeno tem o nome de 
COMORIÊNCIA, e os sujeitos mortos “simultaneamente” são chamados de 
COMORIENTES. 
Se “A” morre antes de “B”, “A” é premoriente a “B”; se “A” morre depois de 
“B”, “A” é posmoriente a “B”; se morrem juntos, são comorientes. 
 
1.1.3.2.10.1 AUSÊNCIA 
A ausência, situação em que alguém simplesmente desaparece, é tratada como 
morte presumida. No código antigo, os ausentes eram tratados como incapazes. Em 
verdade, a morte presumida é uma tranquilidade para os que ficam, visto que a 
incerteza da vida (melhor seria: “incerteza quanto à ocorrência da morte”) de um 
ente gera desconforto de toda a ordem: familiar, social e patrimonial. Uma “morte 
sem cadáver” tornaria alguém “viúvo de cônjuge vivo” como era chamado, ou seja, 
ficaria com sua vida familiar empatada, porque não poderia casar-se, já que estava 
“casada” com o ausente; nem estava claro se já havia a transferência ou não de 
herança. 
O procedimento de ausência é trifásico: curadoria de bens do ausente, sucessão 
provisória e sucessão definitiva. 
 
Figura 21 - Ausência 
67 
 
Assim que alguém desaparecer sem deixar procurador ou, deixando, este não 
queira ou não possa gerir o patrimônio do desaparecido, terá início o procedimento, 
com sua primeira fase, a saber, a “curadoria dos bens de ausente” (ou curadoria de 
ausente), em que será pedido ao juiz que nomeie um curador para tais bens; haverá 
a arrecadação dos bens e a expedição de edital conclamando o desaparecido a 
retornar. Esse curador será o cônjuge, se não estava separado de fato há menos de 
dois anos, ou os pais ou descendentes; na falta ou impossibilidade deles, o juiz 
nomeia um em quem confie. Caso ninguém questione tal fato, a arrecadação dos 
bens do desaparecido poderá ser promovida pelo Ministério Público. 
Tem início a fase de “sucessão provisória”, que começa com a declaração de 
ausência. Tal pedido pode ser formulado pelo cônjuge, herdeiro, credor, ou 
qualquer pessoa que tenha direitos nos bens do desaparecido e precise saber o 
estado deste para exercer ou não tais direitos. Nessa fase, faz-se a transmissão da 
posse dos bens para os prováveis herdeiros, mas a propriedade continua na 
titularidade do ausente. Uma vez que não se sabe o momento em que o ausente vai 
retornar; aliás, não se sabe nem se ele vai retornar, os bens podem ser convertidos 
em imóveis e em títulos, para que não se desvalorizem. Os prováveis herdeiros 
podem ingressar (tecnicamente: imitir-se) na posse dos bens, desde que prestem 
garantia (já que vão utilizar o bem, a lei diligenciou para que, na eventual volta do 
ausente, este não encontre seus bens desvalorizados ou deteriorados, daí a 
exigência da garantia). Uma vez imitidos na posse, tais pessoas ficam 
processualmente responsáveis por esses bens. O cônjuge, o descendente ou o 
ascendente não precisam prestar tal garantia para a imissão na posse. Se tais bens 
gerarem frutos, somente metade destes pode ser aproveitada pelos usuários dos 
bens, porque metade dos frutos deve ser depositada e capitalizada (gerar juros) em 
nome do ausente. Os bens deixados pelo ausente não podem ser vendidos, mas, 
caso ameacem perder-se ou deteriorar-se, o juiz pode autorizar a venda deles. 
Se o ausente aparecer, ou se ficar provada a sua existência com vida, a questão 
é descobrir se a ausência deste foi justa ou injusta. Se foi uma ausência 
injustificada ou por vontade do ausente (por pirraça mesmo, ou qualquer outro 
motivo fútil ou torpe), ele perderá aquela metade dos frutos que estavam guardados 
e os rendimentos destes. Mas, se a ausência foi justificada, os bens, os frutos e os 
rendimentos lhe serão entregues, e aqueles que se imitiram nos bens os entregarão 
livres ao ex-ausente. 
Passados dez anos, no mínimo, da abertura da sucessão provisória e 
continuando sem haver notícia do ausente, faz-se a abertura da sucessão definitiva 
(ou permanente), igualmente por sentença. 
Nessa mesma sentença já pode ser declarada a morte presumida do ausente, o 
que gerará um registro de óbito. Teremos, literalmente, alguém juridicamente 
morto, mas fisicamente talvez não. Tal instituto serve para dar estabilidade às 
68 
 
relações jurídicas. Se o ausente deixou cônjuge, este agora é considerado viúvo e 
pode casar novamente. Mas, a qualquer momento que se prove que o ausente tem 
mais de oitenta anos e se encontra desaparecido há mais de cinco anos, pode-se 
acelerar tal fase, assim como é claro que, se a qualquer momento ficar provada a 
morte natural22 do ausente, a ausência perde seu objeto, e passa-se, direto, à 
sucessão definitiva. 
 Na sucessão definitiva, faz-se o levantamento (devolução) das cauções 
depositadas para as imissões na posse. 
Caso o ausente, nessa fase de sucessão definitiva, apareça, ele receberá os bens 
do jeito que estiverem, ou o preço destas, se foram vendidos (o que sobrar deles, 
em verdade), ou os bens que foram substituídos por tais bens (idem, o que restar 
deles). 
Após dez anos da abertura da sucessão definitiva, no caso de o ausente 
“continuar ausente”, nada mais receberá ainda que apareça. Ocorrerá como no 
filme “Náufrago”... O ausente terá que começar sua vida do “zero” absoluto. É 
dado ao ausente, obviamente, anular o registro de óbito e continuar com seus 
documentos civis, mas, quanto às questões patrimoniais e de família, terá que 
construir uma nova vida. Caso não haja herdeiros, ou não sejam estes conhecidos, 
os bens do ausente serão dados ao município. Pode-se ver que a “morte” de um 
ausente é um “parto”, de tão difícil! 
 
1.1.4 PESSOA JURÍDICA 
Os entes conhecidos como pessoas jurídicas (PJs) são produtos da evolução 
humana; aliás, é um instituto que surgiu à medida que as relações jurídicas se 
tornaram mais complexas; estamos cercados de pessoas jurídicas onde quer que 
estejamos, nem que seja por estarmos utilizando um objeto fabricado por uma 
delas, por exemplo. 
 
1.1.4.1 CONCEITO DE PESSOA JURÍDICA 
Não é de fácil o entendimento e a internalização da ideia de “Pessoa Jurídica”. 
Enquanto pessoa natural surge de gametas humanos masculinos e femininos, as 
Pessoas Jurídicas são entes criados! (costumamos explicar em sala que pessoa 
natural nasce de gametas, e pessoa jurídica “nasce” de “neurônios”...). 
 
1.1.4.2 APLICAÇÃOQual é a utilidade, afinal, da existência de uma PJ? 
 
22 A qualquer momento, pode-se fazer necessária em juízo a prova da morte do ausente, o que se 
dá por “ação de justificação”, e está regulada pelo Código de Processo Civil, nos Artigos 861 a 866. 
69 
 
O homem é um animal gregário, ou seja, não vive sozinho; vive em “bando”, 
em grupo, em sociedade. Já nasce em um grupo, chamado família, e se insere em 
diversos outros, de forma voluntária ou não, ao longo da vida. 
Imagine um grupo de pessoas que transacionem a entrega de um bem. No ato 
da entrega do bem, das duas uma: ou uma das pessoas naturais entregaria o bem a 
uma das pessoas naturais do outro grupo, ou todas as pessoas naturais do primeiro 
grupo, unidas, entregariam o bem ao segundo grupo, que receberiam o bem, 
igualmente unidas. 
O que existe de errado nas situações expostas acima? 
No primeiro caso, não teríamos um grupo entregando algo ao outro grupo; 
teríamos, sim, uma pessoa natural entregando algo a outra pessoa natural e; no 
segundo caso, haveria algo sem sentido: todos do grupo segurando o bem para que 
fique claro que é o grupo, e não só uma das pessoas que está transacionando; seria 
uma confusão geral. 
Para resolver situações como essas, é que o homem criou a ideia de Pessoa 
Jurídica; assim, tornou-se possível que os grupos, como entes próprios (e não mais 
como pessoas naturais!), transacionassem os bens; e aí, no caso de nosso exemplo, 
se uma pessoa natural de um grupo entregasse algo à pessoa natural de outro grupo, 
seria, sim, a entrega do bem de um grupo ao outro; o ordenamento jurídico assim 
permitiria que fosse. 
Resumindo: foi a existência do instituto Pessoa Jurídica que permitiu aos 
grupos sociais deixar de transacionar como “grupos” e passar a ter relações 
jurídicas com verdadeiras novas Pessoas, independentemente dos homens que 
formam tais grupos. 
A regulamentação surgiu a posteriori. É essa a razão da existência de teorias 
que procuram explicar juridicamente a existência da Pessoa Jurídica. 
 
1.1.4.3 TEORIAS DA PESSOA JURÍDICA 
Tais teorias dividem-se em dois grupos: o grupo das Teorias Negativistas, que 
negam a existência das Pessoas Jurídicas; tais teorias hoje estão ultrapassadas. 
O outro grupo é o das Teorias Afirmativistas, que aceitam e enunciam a 
existência das Pessoas Jurídicas, mas por motivos diferentes. Eis as mais 
importantes teorias desse grupo: 
Teoria da Realidade Fática – Para esta teoria, a Pessoa Jurídica é uma 
situação de fato, em que o direito apenas regulamenta. 
Teoria da Realidade Jurídica – Para esta teoria, o direito não apenas 
regulamenta uma situação fática; o direito CRIA mesmo a Pessoa Jurídica. 
Teoria da Realidade Técnica – Esta teoria, utilizada no Brasil, enuncia que a 
Pessoa Jurídica é uma situação de fato, mas que só ingressa no mundo jurídico 
como entidade autônoma por conta do reconhecimento de tal realidade pelo direito. 
70 
 
Ou seja, é uma espécie de “teoria eclética ou mista” das Pessoas Jurídicas e, a 
nosso ver, mais coerente dentre todas as outras teorias. 
 
1.1.4.4 CLASSIFICAÇÃO 
Enquanto só exista uma espécie de pessoa natural (aliás, é até ilegal discriminar 
pessoas físicas quanto à natureza), existem várias espécies de pessoas jurídicas 
(PJ). 
 
Figura 22 - Espécies de PJ 
Nos termos da lei, a PJ pode ser de direito público, ou seja, regidas por regras 
de direito público, tendo o Estado como um dos polos das relações jurídicas. Essas 
PJs de direito público podem ser externas e internas. PJs externas são os Estados 
estrangeiros (países, principados, reinos), ou Organizações Internacionais (ONU, 
UNESCO, OIT, OTAN etc.). PJ de direito público interno são as Pessoas Políticas 
(ou seja, pessoas com competência legislativa, a saber: União, Estados-Membros, 
Municípios e o Distrito Federal), as autarquias, as fundações públicas. 
As empresas públicas e as sociedades de economia mista são entes híbridos, 
com caracteres de PJ de direitos públicos e privados; tais entes possuem “o pior de 
dois mundos”, por terem todas as obrigações de pessoas jurídicas de direito 
privado, com as exigências administrativas de PJ de direito público. 
São civilmente responsáveis pelos atos de seus agentes, como estudaremos no 
capítulo sobre responsabilidade civil. 
As pessoas jurídicas de direito privado são de três espécies quanto à natureza, 
a saber: sociedades, associações e fundações. Sociedades são PJs formadas por 
pessoas com finalidade lucrativa; Associações são a união de pessoas para 
finalidades não lucrativas; Fundações são patrimônios afetados (destinados) a um 
fim específico. No fim de 2003, a Lei 10.825/03 desdobrou a associação em mais 
duas espécies novas de Pessoas Jurídicas: as Organizações Religiosas e os 
Partidos Políticos, que, uma vez que tratam de união de pessoas para atuação não 
lucrativas, nada mais são do que espécies de associação mesmo, mas, devido à 
especialização de suas atividades, lhes foram conferidos incisos próprios no Artigo 
71 
 
44 do Código. Recentemente, tivemos o advento da EIRELI (Empresa Individual 
de Responsabilidade Limitada), que será explicada no tópico próprio. 
Diz o enunciado 144 da 2JDC que “Art. 44: A relação das pessoas jurídicas de 
Direito Privado, constante do Art. 44, incs. I a V, do Código Civil, não é 
exaustiva.” E, segundo Eliana Maltini23, as pessoas jurídicas de direito privado se 
dividem em “corporações” (universitas personarum) e “fundações” (universitas 
bonorum). As corporações seriam união de pessoas; e as fundações, acervos 
patrimoniais. 
 
1.1.4.4.1 SOCIEDADES 
O termo “Sociedade”, como utilizado na parte geral do Código, é união de 
pessoas para desempenho de atividades com fins econômicos. Quando o Código 
usa a palavra “econômico”, não se refere às Ciências Econômicas, visto que 
atividade econômica qualquer Pessoa Natural ou Jurídica desempenha; quer dizer 
“lucrativa” mesmo. Assim, temos como exemplo de sociedades as Limitadas, as 
Sociedades Anônimas, as Comanditas Simples, e assim por diante. 
Para aprofundar o estudo das sociedades, escrevemos a obra “Direito 
Empresarial imprescindível!”, que trata especificamente sobre o assunto. O ato 
constitutivo de uma sociedade é um Contrato Social (como em uma limitada) ou 
um Estatuto (como no caso das S/As); tais sociedades são chamadas, 
respectivamente, de contratuais e estatutárias. 
As sociedades podem ser “de pessoas” ou “de capital”, a depender se o que 
importa à PJ é a identidade do sócio (como nas limitadas) ou apenas seu dinheiro 
(como nas Sociedades Anônimas ou nas Comanditas por Ações). 
Muito cuidado, pois temos um “monstrinho” na legislação brasileira! Embora o 
conceito clássico de sociedade, como estudamos, seja união de pessoas que 
empreendem esforço e recursos partilhando o resultado, excepcionalmente, existe 
situação em que apenas UMA pessoa pode ser uma sociedade, com – pasme! – 
uma “sociedade unipessoal!). Ocorre quando, por algum motivo, um dos sócios 
(quando há dois, por exemplo) se torna incapaz, morre ou se torna ausente. 
Tecnicamente, seria impossível haver sociedade com apenas uma pessoa; mas, para 
preservar a estabilidade econômica, a lei permite que haja a sociedade (com uma 
pessoa!) por ainda 180 dias (Art. 1.033, IV do Código Civil). 
 
1.1.4.4.2 ASSOCIAÇÕES 
 
23 CAPEZ , Fernando (coord.); MALTINI, Eliana Raposo. Direito Civil – Parte Geral (perguntas e 
respostas). Ed. Saraiva. São Paulo, 2007, p. 54 
72 
 
A união de pessoas para a obtenção de interesse comum, sem finalidade 
lucrativa, chama-se associação. Tal interesse poderá ser externo (benemerência) ou 
interno (fortalecimento de alguma causa dos associados ou da classe). 
Cuidado com esse termo “finalidade não lucrativa”, pois existe lucro em uma 
associação (se não houver, ela quebra!); o que não existe é odirecionamento de tais 
lucros para o patrimônio dos associados, mas sim reinvestimentos do superávit na 
própria associação. 
As associações têm a função de congregar pessoas para fortalecer 
reivindicações, para unir colegas, para direcionar interesses etc. 
O ato constitutivo da associação é um Estatuto. Os integrantes dessa pessoa 
jurídica chamam-se associados, e podem ser de categorias diversas, mas, em cada 
categoria, é vedada a diferença entre direitos e obrigações. 
A leitura seca da lei pode levar ao equívoco de se acreditar que é vedado haver 
associados com diferentes direitos e obrigações. Pode sim! O que não pode haver é 
tal diferença dentro de uma mesma categoria de associados. 
Um exemplo clássico é o dos clubes, onde encontramos associados “remidos” e 
associados “contribuintes”, os quais, respectivamente, estão isentos de taxas de 
conservação e de outros contribuem com tal. 
A qualidade de sócio é personalíssima. O que importa é a pessoa do associado; 
por tal razão, não há transmissão da qualidade de associado para herdeiros. 
Para que haja uma ordem mínima nessa união de pessoas, a lei garante que 
cada associado possa livremente desempenhar suas funções. 
Qualquer associado pode ser excluído, havendo justa causa. “Justa Causa” é ato 
que coloque em risco a própria existência da sociedade. Só sabemos se a causa é 
justa ou não no caso concreto. 
Pode ser que uma associação não considere o incêndio da sede causada por um 
associado uma justa causa, visto que a associação pode se reunir em outro lugar, 
mas pode considerar justa causa a destruição dolosa de disquetes (ou, 
modernamente, um pendrive) contendo informações vitais para o funcionamento da 
associação. Cada caso é um caso. 
Para que se dê tal exclusão, faz-se necessária uma Assembleia Geral reunida 
para tal fim, ou seja, nenhum associado nem o associado imputado podem ser 
“flagrados” em uma assembleia associativa qualquer. Deve ser concedida ao 
imputado ampla defesa, e deve haver possibilidade de recurso da decisão da 
assembleia. 
Nessas normas para exclusão de associado nocivo vislumbramos os princípios 
constitucionais e radiais do “devido processo legal”, “ampla defesa e contraditório” 
e “duplo grau de jurisdição”. 
O órgão máximo de deliberação (tomada de decisões) da associação é a 
Assembleia; periodicamente se realiza a chamada Assembleia Geral Ordinária, e 
73 
 
aquelas promovidas para deliberação sobre determinada finalidade específica (por 
exemplo, exclusão de associado perturbador) chamam-se Assembleia Geral 
Extraordinária. 
Existe um “direito de revolução” nas associações. Dissidências e discordâncias 
sempre haverá quando o que se trata é diversidade de opinião. Geralmente, tudo se 
resolve com simples questão de maioria, mas, no que toca à associação, a lei é clara 
quanto à possibilidade até de uma minoria mudar o todo. É que a lei garante 
(Artigo 60 do Código Civil) a 20% dos associados o poder de convocar uma 
Assembleia Geral; e esta, como órgão máximo de decisão do ente, pode mudar 
qualquer coisa; sim: qualquer coisa! Diz a Lei: “Art. 60 – A convocação dos órgãos 
deliberativos far-se-á na forma do estatuto, garantindo a 1∕5 (um quinto) dos 
associados o direito de promovê-la”. É óbvio que esse quinto dos associados não 
tem o poder de votar por todos; não é isso! É o de convocar a Assembleia. Pode ser 
até que, em tal evento, saiam vencidos, mas, convenhamos, se tiveram articulação 
para convocarem a assembleia, é muito provável que tenham tal articulação, 
também, para se fazerem presentes em peso (eles, os discordantes) na assembleia 
para, aí sim, mudarem o que desejarem. 
É algo, portanto, a que todo dirigente de associação precisa estar atento: pode 
ser alvo de uma revolução, ou de um “golpe branco” dentro de sua própria 
entidade. 
A extinção da associação pode se dar por forma convencional (voluntária) ou 
forçada (involuntária); e, em qualquer caso, é dado aos associados se restituírem 
dos bens e valores colocados à disposição da associação, quando possível. O que 
sobejar deverá ser transferido a outra associação com finalidade semelhante, no 
município. Caso neste não haja, pode ser no Estado; e, por fim, caso neste não 
exista, na União. 
Partidos políticos e sociedades religiosas também são associações no que toca à 
sua natureza; tanto isso é verdadeiro (a natureza associativa dessas entidades) que o 
enunciado 142 da 3JDC diz: “Art. 44: Os partidos políticos, os sindicatos e as 
associações religiosas possuem natureza associativa, aplicando-se-lhes o Código 
Civil”. 
 
1.1.4.4.3 FUNDAÇÕES 
Uma fundação é um patrimônio afetado a um determinado fim. Não é formado 
pela união de pessoas, mas sim pela destinação de um conjunto de bens a uma 
finalidade. 
É difícil para o profano aceitar essa ideia, mas é isso mesmo: “Fundação” é um 
conjunto de bens com personalidade! 
Ao contrário das sociedades e das associações, que podem ter seu ato 
constitutivo lavrado em um instrumento particular (em tese, até em “papel de pão” 
74 
 
mesmo), as fundações precisam, para ser instituídas, de escritura pública ou de 
testamento. 
Escritura Pública é o documento lavrado por tabelião; sua lavratura é regulada 
pela Lei de Registros Públicos. Testamento é o documento em que alguém 
manifesta suas disposições de última vontade; para que o testamento gere efeitos, é 
necessária a morte do testador. 
A finalidade da fundação, além de lícita (óbvio!), precisa ser uma das quatro: 
religiosos, morais, culturais ou assistenciais24. Eu sempre disse em sala que 
qualquer finalidade lícita não lucrativa poderia ser objeto de uma fundação, 
bastando encaixar na finalidade "moral". Nem a propósito, o Enunciado 8 da 1JDC 
nos diz que "a constituição de fundação para fins científicos, educacionais ou de 
promoção do meio ambiente está compreendida no Código Civil, art. 62, parágrafo 
único." 
As fundações são mais controladas pelo Estado do que as sociedades e as 
associações. A lei incumbe ao Ministério Público exercer tal controle, que se dá, 
inclusive, desde a instituição dessa Pessoa Jurídica. 
Quanto qual órgão do Ministério Público será o competente para a fiscalização, 
acreditamos que tal resposta deve-se, também, à origem dos recursos utilizados na 
fundação. Assim, uma fundação de direito privado que utiliza verba federal pode 
ser fiscalizada pelo MPF. 
A formação da fundação possui quatro fases25: 1.a) Fase de dotação ou 
instituição; 2.a) fase da elaboração do estatuto ; 3.a) fase da aprovação dos 
estatutos; e 4.a) fase do registro. 
A instituição da fundação deve conter a discriminação dos bens destinados a 
ela. Caso tais bens se mostrem insuficientes para a finalidade a que se destinam, 
serão os bens destinados a outra fundação com igual finalidade. Essa regra garante, 
ou tenta garantir, que não haverá fundação “de fachada”. Uma vez instituída a 
fundação, é obrigatória a transferência da propriedade dos bens para a novel Pessoa 
Jurídica. 
A elaboração do estatuto pode ser feita de forma direta, quando o próprio 
instituidor o elabora, ou de forma fiduciária26, quando é elaborado por alguém 
indicado pelo instituidor. 
O instituidor deve indicar quem lavrará o estatuto da fundação; e, caso tal 
pessoa se recuse, o Ministério Público terá legitimidade para tal. 
A organização e a fiscalização das fundações têm seu procedimento regulado 
pelos Artigos 1.199 a 1.204 do Código de Processo Civil. 
 
24 Memorize a palavra CRAM – Cultural, Religiosa, Assistencial ou Moral 
25 GONÇALVES, apud Capez e Maltini 
26 No direito civil, sempre que há uma relação de confiança, dizemos que há uma relação fiduciária, 
ou de fidúcia, que vem do latim fides, que significava fé, crédito, confiança. 
75 
 
A fundação terá um órgão de gerência que, por 2/3 dos votos, pode alterar o 
estatuto, contanto que não mude a finalidade daFundação. 
Entendemos que tal regra está incorreta, pois nada deveria impedir a mudança 
de finalidade desde que a nova finalidade fosse o “CRAM”. Qualquer alteração 
estatutária deve ter a “bênção” do Ministério Público. 
A extinção da Fundação se dá de forma voluntária ou involuntária: 
voluntariamente ocorrerá a extinção se o órgão responsável por sua administração 
assim o determinar; a extinção forçada da fundação se dá quando o objeto desta se 
mostra ilícito, impossível, inútil, ou ocorre o término do prazo previsto para a sua 
existência. 
Em qualquer dos casos de extinção, os bens serão destinados a outra fundação. 
Deve ficar ressaltado, portanto, que, ao instituir uma fundação, o instituidor, 
quando vivo, abre mão dos bens a ela destinados, uma vez que, em caso de 
extinção desta, a lei não prevê a restituição dos bens ao instituidor; é mais uma 
salutar regra que impede a criação de fundações simuladas. 
 
1.1.4.4.4 ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS 
Organizações Religiosas são uniões de pessoas que congregam visando à busca 
de elevação e de perfeição espiritual conforme o ensinamento de alguma Entidade 
Superior. Tal ente superior muda de nome a depender da religião em que é 
buscado. 
O catolicismo foi a religião oficial do Brasil até a Constituição de 1891. Até 
aquela data, a Igreja (Católica) era parte do próprio Estado, havendo inclusive o 
instituto do padroado e do beneplácito como crivos das bulas papais, para vigerem 
no Brasil. 
Quando a igreja saiu do Estado, este se tornou laico, ou seja, sem religião 
oficial, e assim continua sendo na nossa Constituição atual, embora esta seja teísta 
(visto que há o nome de um deus, “Deus”, no preâmbulo da Constituição). Mas o 
envolvimento Estado/religião para no preâmbulo da Constituição, já que a lei torna 
livre a criação, a organização, a estruturação e o funcionamento das organizações 
religiosas, quaisquer que sejam. 
Não pode o poder público negar registro ou reconhecimento a qualquer 
organização religiosa desde que suas práticas religiosas não firam alguma lei. 
Assim, não é ilícita uma prática religiosa que sacrifique animais, desde que não 
sejam animais ameaçados de extinção, por exemplo. 
 
1.1.4.4.5 PARTIDOS POLÍTICOS 
Os partidos políticos são regidos pela Lei 9.096, de 19 de setembro de 1995; 
têm a finalidade de legítima e democraticamente tomarem o poder para geri-lo de 
acordo com as leis e com seu estatuto. 
76 
 
É vedado aos partidos exigir uso de uniformes para seus membros, bem como 
ter qualquer caráter militar. 
Quanto à sua constituição, tão logo tenha seu ato constitutivo registrado (no 
Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas da capital federal), devem obter 
registro junto ao Tribunal Superior Eleitoral para que possam participar de eleição, 
ter acesso a horário gratuito e ter regularidade financeira. 
Todo partido político deve ter caráter nacional, e para seu registro é exigido um 
mínimo de 101 membros com domicílio eleitoral em pelo menos um terço dos 
estados-membros; deve também ter um apoiamento mínimo, nos termos da citada 
lei. 
 
1.1.4.4.6 As “EIRELI” 
A EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, no 
Artigo 980-A do Código Civil) surge quando um empresário individual é tratado 
sob égide das normas da Sociedade Limitada. Com um capital mínimo de 100 
salários-mínimos, o empresário pode tornar-se ou adequar-se aqui. Em caso de 
malogro no negócio, o que terá a perder é o patrimônio aportado ao negócio, e não 
seu patrimônio pessoal. 
 
1.1.4.5 CICLO DE EXISTÊNCIA DAS PESSOAS JURÍDICAS 
Como qualquer ente, as PJs têm início e fim. Tecnicamente, diz-se que as PJs 
têm constituição e extinção (em analogia ao “nascimento” e à “morte”, aplicados às 
pessoas naturais). 
Discorramos sobre o ciclo vital de uma Pessoa Jurídica: 
O início legal da pessoa jurídica se dá por lei, pelo registro, ou por “autorização 
+ registro”. 
As Pessoas Políticas e as Autarquias são criadas por Lei, e esta é o seu ato 
constitutivo. (Ato Constitutivo é o documento-gênese da pessoa jurídica; é a 
materialização da vontade de sua criação). 
As demais pessoas jurídicas iniciam sua existência legal com o registro de seus 
atos constitutivos no órgão competente. 
Algumas pessoas jurídicas dependem de autorização do Poder Público para 
existirem; nesse caso, tal autorização integra os requisitos para o seu início, de 
forma que não basta apenas o registro para existirem legalmente; faz-se necessário 
o permissivo formal do Estado. É por essa razão que o registro, para as pessoas 
naturais, tem natureza declaratória, pois, mesmo sem registro, a pessoa natural 
existe, ao passo que para a Pessoa Jurídica o registro é constitutivo, pois é o 
registro que faz existir a pessoa jurídica! 
Exceto para as pessoas políticas, as Pessoas Jurídicas podem, no interregno de 
três anos a contar do registro de seu ato, ter declarada a nulidade de sua criação. 
77 
 
Os requisitos para que uma pessoa jurídica exista são três: 1-Vontade humana; 
2-Licitude de finalidade e 3-Forma prescrita em lei. Uma vez publicado o registro 
da Pessoa Jurídica, inicia-se o prazo de três anos para que seja apontada alguma 
irregularidade em sua constituição. 
 
1.1.4.5.2 FIM DA PESSOA JURÍDICA 
Tratemos sobre a extinção das Pessoas Jurídicas. 
As PJs se extinguem por quatro grupos de motivos: motivos convencionais, 
motivos automáticos (ou, como consta no texto da lei, “de pleno direito”), motivos 
judiciais e motivos administrativos. 
Os motivos convencionais, como o nome indica, são frutos de acordo entre os 
próprios membros formadores. A qualquer momento podem os membros deliberar 
sobre a extinção da PJ, sendo tal decisão causa suficiente para deflagrar o 
procedimento de extinção. 
Os motivos automáticos são de duas ordens: Internos e Externos. Os motivos 
automáticos internos são todos aqueles previstos no ato constitutivo e que venham 
a ocorrer; podem ser uma condição ou um termo. Assim, um Contrato Social pode 
prever que a sociedade se extinguirá no caso de falecimento de qualquer dos 
sócios; ou, no caso de termo, temos o caso das sociedades com determinado prazo 
de existência, visto que um Estatuto pode prever que a Associação durará quinze 
anos, por exemplo. Os motivos automáticos externos estão no mundo puramente 
dos fatos que forçam o fim da PJ, como no caso de impossibilidade de objeto: 
imagine que uma Sociedade tem como objeto social a manutenção de determinado 
edifício. Imagine que por qualquer infortúnio o edifício venha a ruir; teremos uma 
extinção automática por causa externa. Também como causa externa, mas 
decorrente de lei, temos, para o caso das sociedades, a falta de pluralidade de 
sócios por mais 180 dias. 
Os motivos judiciais são basicamente de três ordens: declaração de falência ou 
insolvência da PJ, anulação de ato constitutivo, ou por sentença nos demais casos 
em que a extinção é levada à seara judicial para discussão. Assim, uma causa 
automática, quando questionada em juízo, deixa de ser “automática” e passa a ser 
“judicial”. 
Os motivos administrativos provêm da administração pública, podendo ser de 
duas ordens: Atos Gerais ou Ato Específico. Atos gerais são as determinações que 
geram efeitos em toda uma atividade, como no caso do fato do príncipe, em que a 
administração pública passa a não mais permitir determinada atividade em um 
município por exemplo. Os atos específicos são aqueles direcionados a certa e 
individualizada PJ. 
A extinção das PJs tem três fases; o Código trata de tais fases a partir do Artigo 
1.102; especificamente tal procedimento é aplicável, nos termos da lei, às 
78 
 
Sociedades; ocorre que é, latu sensu, o mesmo procedimento de extinção de 
qualquer pessoa jurídica. As fases são Dissolução, Liquidação e Cancelamento. 
Nomeia-se um liquidante, que será o condutor administrativo da extinção da 
PJ. De plano será feita a averbação do ato extintivo,seja qual for, no registro da PJ. 
Após amealhar documentos e balanços da PJ, deve o liquidante ultimar os negócios 
pendentes (negócios no sentido do Direito Civil; não apenas no sentido 
empresarial). 
Deve então proceder à realização do ativo e do passivo da PJ, que é a pior fase 
na prática. Significa cobrar os créditos e pagar os débitos; é geralmente quando 
toda extinção de PJ emperra. Durante todo o procedimento, deve o liquidante dar 
ampla publicidade dos seus atos aos membros e aos demais interessados na 
sociedade. Tal publicidade ocorre por meio de reuniões ou de assembleias. 
Após encerrada a liquidação, a PJ (que ainda existe!) está apta à terceira fase de 
extinção, que comporta um único ato, que é o cancelamento do registro da Pessoa 
Jurídica. Só então se considerará a PJ extinta. 
 
1.1.4.6 ADMINISTRAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA 
Conversemos um pouco sobre a administração da pessoa jurídica, que pode ser 
individual, conjunta ou colegiada. A administração individual contém uma 
vontade, apenas. 
A administração colegiada contém várias vontades, e guiará(ão) o rumo da 
pessoa jurídica aquela(s) vontade(s) que alcançar maioria de votos no órgão 
colegiado. A administração conjunta possui apenas uma vontade, mas emanada de 
mais de uma pessoa, que aquiesce em apenas uma determinação. Aqui não existe 
votação; existe acordo em que se procura uma vontade acordada por todos os 
administradores, conjuntamente. A lei determina que, na falta de administrador, o 
juiz pode suprir tal falta. Qualquer decisão coletiva pode ser anulada no prazo de 
três anos no caso de, em sua deliberação, ter ocorrido erro, dolo, simulação ou 
fraude. Trataremos de pormenores sobre tais defeitos quando estudarmos, nesta 
obra, os “vícios dos negócios jurídicos”. 
Algo que percebo é que os conceitos de “administração” para o direito e para a 
ciência administrativa são bem diferentes. Para a ciência da Administração, esta é 
conceituada como “o direcionamento de pessoas e bens para a consecução de 
objetivos determinados”. 
Já para o direito, temos dois sentidos desse termo: um interno e um externo. 
No sentido interno, é o mesmo da ciência própria, trazendo inclusive as três 
funções básicas da administração, que são deveres de diligência (cuidado com o 
quando agir e como se deve agir), de lealdade (não trair confiança e não agir em 
conflito de interesse) e de informação (na forma ativa: comunicar o que deva ser 
comunicado; e na forma passiva: não sonegar informação quando requerida e com 
79 
 
possibilidade de divulgação). Pode ser individual, coletiva (várias vontades, com a 
vontade determinante aferida por votação) ou conjunta (várias vontades, de vários 
administradores, de forma que a vontade determinante é alcançada por 
argumentações, convencimentos e articulações). Caso momentaneamente a 
sociedade fique acéfala, ou em litígio dentro da administração, o juiz nomeará 
administrador substituto. 
Mas existe outro sentido da palavra “administração”: o externo. No sentido 
externo, significa representar a sociedade perante terceiros. Nos termos dos 
Artigos 116 e 47 do CCB, o ato do administrador obriga à sociedade: “Art. 47. 
Obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de 
seus poderes definidos no ato constitutivo”. Assim, no sentido externo, o 
administrador atua como se toda a organização fosse. 
 
1.1.4.7 DOMICÍLIO DA PESSOA JURÍDICA 
As pessoas políticas possuem como domicílio as suas capitais no caso da União 
e dos estados-membros. No caso dos municípios, o domicílio será a sede da 
administração. Note que o Código não enunciou que é a prefeitura! Se em 
determinado município o prefeito deslocar a administração municipal para a sua 
residência, nesta funcionará, também, o domicílio do município. 
No caso das pessoas jurídicas de direito privado, o domicílio é onde elegerem 
ou onde funcionarem as suas administrações. Em caso de pluralidade de 
estabelecimentos, cada um deles terá um domicílio. 
Uma pessoa jurídica estrangeira, com instituição no Brasil (uma salinha que 
seja), terá nesse local o seu domicílio no País. 
Lembramos que uma PJ também pode ter domicílio contratual (foro de 
eleição), onde as partes elegem determinado local para discussão das questões 
envolvendo determinado negócio jurídico. 
 
1.1.4.8 DIREITOS DA PERSONALIDADE DA PESSOA JURÍDICA 
O Artigo 52 do Código é claro ao atribuir às pessoas jurídicas direitos da 
personalidade; nem poderia ser diferente. Tal expressão legal coloca uma pá de cal 
em outrora infindável discussão sobre existência de tais direitos a esse tipo de 
pessoa. 
Lembramos que nem todos os direitos da personalidade são atribuíveis à pessoa 
jurídica; por exemplo, não é cabível às pessoas jurídicas o “direito à liberdade”. 
A nosso ver, erram gravemente os doutos estudiosos da Quarta Jornada de 
Direito Civil do CJF, ao afirmarem, no Enunciado 52, que “os direitos da 
personalidade são direitos inerentes e essenciais à pessoa humana, decorrentes de 
sua dignidade, não sendo as pessoas jurídicas titulares de tais direitos.” Ora, o erro 
80 
 
técnico está em ligarem a palavra “pessoa” à “pessoa humana” quando, como já 
estudamos, pode esta ser também uma PJ. 
 
1.1.4.9 DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA 
Uma vez que um dos requisitos para a existência das Pessoas Jurídicas é a 
liceidade (ou licitude) de finalidade, há de existir no ordenamento jurídico um 
mecanismo de coibir o mau uso das pessoas jurídicas. 
Tal mecanismo, originado do direito norte-americano, chama-se 
Desconsideração da Pessoa Jurídica e permite que a consequência patrimonial de 
atos ilícitos recaia não apenas sobre o patrimônio da sociedade, mas também sobre 
o patrimônio dos sócios e dos administradores. 
Não é qualquer prejuízo que será suportado pelos patrimônios dos sócios e dos 
administradores, mas tão somente aqueles advindos de atos tipificados em lei, 
conforme também afirma o Enunciado 7 da 1JDC, o qual indica que deve tal 
despersonalização atingir o patrimônio dos sócios ou dos administradores que em 
tal ato houverem incorrido. 
Os principais casos de desconsideração da personalidade jurídica são 
encontrados no Artigo 50 do Código Civil, no Artigo 28 do Código do 
Consumidor; no Artigo 4.o da Lei de Crimes Ambientais; no Artigo 18 da Lei 
Antitruste (Lei 8.884/94); nos Artigos 117 e 158 da Lei das S/As (Lei 6.404/76); no 
parágrafo segundo do Artigo segundo da CLT; e nos Artigos 134, VII e 135, III do 
CTN. 
Assim, podemos afirmar que existem várias espécies de desconsideração da 
Pessoa Jurídica. Existe a despersonalização civil, consumerista, ambiental, 
antitruste e tributária – a depender da lei que a rege; (há quem afirme haver 
também a trabalhista, mas, pela CLT, esta apenas é remetida à execução tributária, 
sendo esta aplicável àquela, em verdade); divide-se ainda em direta e indireta (ou 
invertida) – a depender se a despersonalização ocorre por dívida da própria PJ, 
recaindo a execução sobre os bens dos sócios; ou se existe para se “naturalizar” o 
bem da PJ, ou seja, caso se executem bens da PJ por dívida pessoal do sócio; 
divide-se, também, em voluntária e involuntária – a depender se foi requerida por 
um ente externo à PJ, contra esta, ou se foi requerida pela própria PJ! 
Aliás, até o nome do instituto, é múltiplo: “Desconsideração da pessoa jurídica 
(ou da personalidade jurídica)”; “Disregard doctrine”; “Disregard of legal 
entity”; “Piercing the corporate veil” e “Lifting the corporate veil”. 
(E pasme! Tais nomes em inglês são utilizados em decisões brasileiras!) 
Em geral, os atos que permitem o atingimento do patrimônio dos sócios e dos 
administradores são os atos eivados de dolo, com vontade de causar dano a outrem, 
ou oriundos de má administração da sociedade. 
81 
 
Em atenção ao princípio da boa-fé, não podem os responsáveis por tais atos 
dolosos se esconderem atrás de umanorma legal para garantir a própria 
impunidade (uma das consequências do princípio da boa-fé é o enunciado de que 
ninguém pode beneficiar-se da própria torpeza). 
Um importante ponto a ser discutido é a desconsideração “inversa”. 
Diz o enunciado 283 da 3JDC que “é cabível a desconsideração da 
personalidade jurídica denominada “inversa” para alcançar bens de sócio que se 
valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a 
terceiros”. Aqui, os bens da pessoa jurídica respondem por ato ilícito do sócio. 
Sim, tal possibilidade existe, conforme a seguinte decisão do TJ/SC27: 
 
“Desconsideração da personalidade jurídica denominada ‘inversa’. Art. 50 do 
CC/2002 e Enunciado n.o 283 da IV Jornada de Direito Civil do CJF. O 
interlocutório que desconsidera inversamente a personalidade jurídica de 
sociedade comercial, fazendo que a empresa responda com seu patrimônio pela 
dívida pessoal do sócio, está circunscrito aos pressupostos do Art. 50 do atual 
Código Civil, cabendo ao juiz, fundamentadamente, apontar as razões do seu 
convencimento, seja pelo acolhimento, seja pela rejeição do pedido, sob pena de 
vulneração aos Arts. 93, IX, da CRFB, e 165, do CPC, dispositivos que transmitem 
a necessidade de motivação nas decisões judiciais, ainda que concisa, sob pena de 
nulidade. Conheça, também, o Enunciado n.o 283 da IV Jornada de Direito Civil 
do CJF, que autoriza a desconsideração da personalidade jurídica "inversa": É 
cabível a desconsideração da personalidade jurídica denominada “inversa” para 
alcançar bens de sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens 
pessoais, com prejuízo a terceiros. (Agravo de instrumento n.o 2005.031945-4, de 
Canoinhas, SC)”. 
 
Ainda segundo o enunciado 285 da 4JDC, “Art. 50. A teoria da 
desconsideração, prevista no Art. 50 do Código Civil, pode ser invocada pela 
pessoa jurídica em seu favor”, ou seja, os demais sócios podem deliberar que o 
patrimônio de outro determinado sócio responda pelo ato ilícito causado por este, 
por meio da pessoa jurídica. 
 
1.1.4.10 O “Terceiro Setor” 
É uma espécie de instituição sem fim lucrativo. Esse “terceiro setor” é um 
conceito moderno para algo que existe desde épocas idas, seja como resultado da 
bondade humana, seja por purainoperância do Estado. 
O primeiro setor da economia é o setor público; deve usar dinheiro público 
para a consecução do interesse público, ou seja, o bem comum (a pura doutrina do 
“wellfare state”, Estado-Providência). 
 
27 http://mjcatalan.blogspot.com/2007/07/teoria-da-penetrao-inversa-ou-s-avessas.html 
82 
 
O segundo setor da economia é o setor privado. Aqui, as economias privadas 
são utilizadas para resultados lucrativos particulares. Nada há nada de errado nisso, 
desde que gerada honestamente. 
O terceiro setor, então, é o mix dos dois setores acima: é a instituição que 
utiliza recurso privado para consecução de finalidade pública. 
O terceiro setor é assim chamado nas ciências econômicas, tendo outra 
designação no direito: OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse 
Público) e, na mídia, é chamado de ONG (Organização Não Governamental). Uma 
ONG pode ou não obter o status de uma OSCIP; se obtiver, poderá receber 
doações via imposto de renda de outras pessoas. Celebra convênios com entes 
públicos; a lei de regência das OSCIPs é a Lei 9.790, de 23 de março de 1999. 
 
 
1.2 BENS 
O advento da “pinça” fez que alguns animais passassem a utilizar objetos para 
algumas utilidades, mormente os primatas e os humanos. O uso de tais objetos 
pelos primatas não é regulado, mas por parte dos humanos, sim. 
Nosso Código Civil trata dos bens em duas oportunidades: classifica-os em sua 
Parte Geral e regula a atuação dos humanos sobre os bens na Parte Especial. 
Podemos inferir que os bens são um dos objetos das relações jurídicas (estas 
recaem sobre um comportamento – atividade ou inatividade – ou sobre bens) – em 
verdade, mesmo quando envolvem somente atividade, seu descumprimento resulta 
em perdas e em danos, o que pode resultar em dinheiro, que é bem. Daí não ser 
incorreto afirmarmos que os bens são verdadeiramente os objetos das relações 
jurídicas (aquilo sobre o que recaem as relações jurídicas; aquilo sobre o que os 
sujeitos atuam), seja de forma direta (imediata), seja indireta (mediata). Para que 
entendamos a ideia de “bem”, partamos inicialmente da ideia de patrimônio. 
 
1.2.1 NOÇÃO DE PATRIMÔNIO 
Socorrendo-nos das ciências contábeis, afirmamos que patrimônio é o 
“conjunto de bens, direitos e obrigações de uma pessoa”. Ao conjunto de 
componentes tutelados juridicamente pertencentes a uma pessoa, chamamos de 
“patrimônio”. É tão importante que existe um ramo do Direito Civil para regulá-lo 
no pós-morte do seu dono, o Direito das Sucessões; e é a maior fonte de conflitos 
da humanidade. Em sua parte positiva, contém os bens (o outro componente da 
parte positiva são os “direitos”). Logo todo bem pertence a um patrimônio, mas 
este não é apenas formado por bens. 
1.2.2 CONCEITO DE “BENS” 
Tudo o que existe no universo é chamado de “Ente”. Um ente se divide em 
pessoa e coisa. Será pessoa caso tenha personalidade (aptidão para ter direitos e 
83 
 
obrigações); e será coisa caso não tenha personalidade (ok! Algo que não seja 
pessoa, mas formado por pessoas não será uma coisa, mas sim um “ente 
despersonalizado”, que terá personalidade processual (como o condomínio ou uma 
sociedade não personalizada, estudada em direito empresarial) e não será 
necessariamente coisa. Mas, como é formada por pessoas, não foge à regra de 
divisão “pessoas/coisas”. 
Dentre as coisas, algumas são úteis, outra não. Uma coisa útil (que satisfaça 
alguma necessidade humana) é chamada de “bem”. Assim, todo bem é coisa, mas 
nem toda coisa é bem (lembro que tal definição não é unânime, mas é bem 
difundida e é aquela com a qual nos alinhamos!). 
Bem! Se é assim, porque o Código Civil (CCB) optou por, na sua parte especial 
(Art. 1.196), chamar de “direito das coisas”, e não de “direito dos bens”? 
A resposta é simples: algo pode ser bem para um e não ser para outro (o ponto 
de vista, subjetivo, enquadrará o ente a partir de uma noção individual de utilidade) 
– mas será coisa para todos. Assim, um batom para um homem é uma coisa; para a 
mulher é um bem, mas, como todo bem é coisa, será coisa para os dois, 
necessariamente. Para que o direito não regule o batom para a mulher, mas o deixe 
sem regulamentação para o homem, preferiu a lei, sabiamente, chamar de “direito 
das coisas” (que valerá para todos), e não “direito dos bens”, o que regularia o 
batom para a mulher, mas não para o homem. 
Lembramos que coisa ou bem não têm direitos. Quando o CCB se refere a 
“direito das coisas”, quer dizer “direito das relações entre pessoas envolvendo 
coisas como objeto desta relação”. 
Como dissemos há pouco, existe uma controvérsia doutrinária sobre o conceito 
de bens, mormente quando à diferenciação entre “bens” e “coisas”, vejamos: 
Para outra teoria, seguida por respeitadas vozes, enunciam que os objetos, que 
não sejam pessoas, reconhecidos pelo direito, são bens. E os bens corpóreos são 
chamados de “coisas”. Para uma terceira teoria, ainda, um bem é uma coisa tornada 
objeto de relações jurídicas; assim, ainda que uma coisa se torne útil, se não for 
transacionada juridicamente, não é um bem. Não nos filiamos a nenhuma das duas 
últimas teorias explanadas. 
 
1.2.3 CLASSIFICAÇÃO 
Agora que sabemos o que é “bem”, vamos classificá-lo. 
Classificar significar utilizar as peculiaridades semelhantes de um conjunto de 
elementos para agrupá-los segundo tais características, podendo assim aplicar os 
regimes jurídicos próprios a cada grupo. Os bens podem ser classificados conforme 
se considerem em si mesmos, um em relação ao outro, quanto à titularidade e 
quanto à comerciabilidade.84 
 
São os seguintes os quatro grupos de classificação: na classificação dos “Bens 
Considerados em Si Mesmos”, podem os bens ser corpóreos ou incorpóreos; 
móveis ou imóveis; fungíveis ou infungíveis; consumíveis ou inconsumíveis; 
divisíveis ou indivisíveis; singulares ou coletivos; na classificação dos “Bens 
Reciprocamente Considerados”, podem os bens ser principais ou acessórios; na 
classificação dos bens quanto à “Titularidade”, os bens podem ser particulares ou 
públicos; e na classificação quanto à “Comerciabilidade”, podem os bens ser 
comercializáveis ou fora do comércio. 
 
1.2.3.1 BENS CONSIDERADOS EM SI MESMOS 
Nesta classificação, toma-se somente o bem sem relação com qualquer outro; 
“isola-se” o bem, levando em conta somente suas características próprias. 
Podem ser corpóreos ou incorpóreos, móveis ou imóveis, fungíveis ou 
infungíveis, consumíveis ou inconsumíveis, divisíveis ou indivisíveis, singulares ou 
coletivos. 
Corpóreos são os bens que sugestionam os sentidos. Tais bens possuem forma, 
ou gosto, ou cheiro, ou temperatura que podem ser percebidos pelo homem. O 
senso profano nos induz a pensar que corpóreo é só o que “possui corpo” no 
sentido de altura, largura e profundidade; isso não é verdade. Um gás é um bem 
corpóreo, por exemplo. 
Incorpóreos são os bens que não sugestionam os sentidos, daí também serem 
chamados “ideais”. São exemplos de bens incorpóreos: marcas, patentes e direitos 
atorais. 
Bens móveis precisam de uma explicação prévia: inicialmente, deixemos claro 
que a divisão de bens entre móveis e imóveis é uma divisão no plano jurídico, visto 
que, no mundo físico, não existe bem imóvel ou, como aprendemos no colégio, um 
bem pode ser móvel ou imóvel dependendo do referencial de observação. Nada no 
cosmo é imóvel. 
Mas, no mundo jurídico, um bem é considerado móvel de acordo com um dos 
seguintes critérios: Móvel por sua própria natureza, ou Móvel Natural – É 
aquele que pode ser movimentado de um local para outro sem perda de sua 
destinação econômica, de sua substância, ou de sua identidade. É a quase totalidade 
dos bens móveis existentes no mundo. Os móveis dotados de movimento próprio 
(aquele seu cachorro de estimação) são chamados de semoventes; Móvel por 
determinação legal, ou Móvel Legal – São aqueles bens que fisicamente não 
importam se são móveis ou imóveis. A lei diz que são móveis, e pronto! O 
exemplo clássico é o das energias com valor econômico (energia elétrica, sinal de 
TV a cabo, sinal de telefonia etc.). A finalidade prática dessa equiparação é a 
possibilidade que a lei expressamente dá a tais bens para que possam figurar como 
objeto de relações jurídicas e possam ser objeto de tutela penal. Já notaram que o 
85 
 
crime de furto (Artigo 155 do Código Penal) tem como tipo penal “Subtração de 
coisa alheia móvel”? Pois é! Eis a tipificação penal do “gato”...; e Móvel por 
antecipação – São os bens que “nascem” para serem móveis, mas, para isso, 
passam por um estágio em que são fisicamente bens imóveis. O exemplo clássico 
são as árvores plantadas para serem matérias-primas de indústria de papel. 
Bens Imóveis são subdivididos em Imóvel por sua própria natureza, ou 
Imóvel Natural – Basicamente é o solo e tudo o que lhe é acrescido. São bens que 
não podem ser movimentados de um local para outro sem perda de sua destinação 
econômica, de sua substância, ou de sua identidade. Lembramos ao leitor que, no 
mundo físico, absolutamente NADA é imóvel. O que torna um bem juridicamente 
imóvel é a incapacidade de manter sua coerência formal quando movimentado. 
Sempre que eu explico sobre imóvel natural, uma pergunta clássica surge de 
alguém da sala: “Professor, e aquelas casas que são transportadas inteiras de um 
lugar para outro? São o quê?” O que importa para se classificar um bem 
considerado em si mesmo não é como ele está, mas sim o que ele É. Assim, uma 
casa inteira em transporte é tão imóvel quanto se estivesse presa às pilastras da 
fundação. Em algum momento um prefeito resolveu plantar palmeira imperial em 
Manaus e as trouxe inteira, de balsa. Pois bem. Enquanto estavam transportando as 
palmeiras, elas eram imóveis, igualmente. 
Assim como o próprio imóvel enquanto transportado não deixa de ser imóvel; 
igualmente, partes desse imóvel continuam imóveis mesmo quando 
temporariamente deslocadas. 
Assim, imagine que a porta de um prédio é retirada para que seja envernizada. 
Enquanto a porta está na marcenaria, em reforma, ainda assim ela É um imóvel. 
O Código Civil é claro: “Art. 81. Não perdem o caráter de imóveis: I – as 
edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem 
removidas para outro local; II – os materiais provisoriamente separados de um 
prédio, para nele se reempregarem”. O segredo é não tentar encontrar no direito 
lógica da física, visto que o direito tem sua própria lógica; Imóvel por 
determinação legal, ou Imóvel Legal – São aqueles bens que fisicamente não 
importam se são móveis ou imóveis. A lei diz que são imóveis. Amém! A 
finalidade prática dessa equiparação é o encaixe de tais bens ao regime dos bens 
imóveis. Ao tratarmos sobre Direitos Reais, o leitor saberá, em pormenores, as 
peculiaridades de tal regime (um exemplo de consequência do regime imobiliário é 
a obrigatoriedade de registro público para caracterizar a propriedade). 
Fungíveis são bens plenamente substituíveis por outros de igual gênero, que 
não desagradarão dos sujeitos neles interessados. Em verdade, desde que seja O 
QUE e QUANTO de acordo com o que os sujeitos desejam, não existe problema 
algum. Por exemplo, imagine que você está no supermercado e quer comprar um 
quilo de arroz marca X. Você se posiciona da gôndola onde existem vários sacos 
86 
 
contendo um quilo do referido arroz. Qual saco você escolhe? Pois é! Em tese, 
qualquer saco do arroz da dita marca satisfará seu desejo de consumo, não é 
mesmo? Bens fungíveis são identificados por “O QUE” e “QUANTO”. Mas jamais 
por “QUAL”. Há de se ter cuidado com a confusão existente entre os termos “bem 
fungíveis x bens sub-rogados”; ambos evocam a ideia de “troca", mas a 
semelhança para por aí. Um bem fungível, como dissemos, é coisa sem identidade, 
algo que possa sertransacionado “quanto do que” ou, como está no Código Civil, 
“indicado pelo gênero e quantidade”. É o caso de “mil reais”: não importa se são 
dez notas de cem, vinte notas de cinquenta ou cem notas de dez; continuará a ser o 
mesmo bem: cem reais. Bens sub-rogados, que surgem às vezes no texto do 
Código: “Art. 39. Regressando o ausente nos dez anos seguintes à abertura da 
sucessão definitiva, ou algum de seus descendentes ou ascendentes, aquele ou estes 
haverão só os bens existentes no estado em que se acharem, os sub-rogados em seu 
lugar, ou o preço que os herdeiros e demais interessados houverem recebido pelos 
bens alienados depois daquele tempo”; “Art. 1.446. Os animais da mesma espécie, 
comprados para substituir os mortos, ficam sub-rogados no penhor”; “Art. 1.668. 
São excluídos da comunhão: I – os bens doados ou herdados com a cláusula de 
incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar”. Significam bens que foram 
comprados com valores obtidos a partir da venda de outros bens. Assim, se alguém 
possui um carro, vende-o e compra quatro motos, essas quatro motos são sub-
rogadas do carro vendido. Assim não existe relação de identidade qualquer entre 
fungibilidade e sub-rogação. 
Infungíveis são bens insubstituíveis; bens únicos no universo. Imagine você 
acessando um site de leilões em que um dos objetos vendidos é um livro de Rui 
Barbosa, autografado pelo próprio. Você compra o livro, mas é surpreendido no 
outro dia com um e-mail em que o vendedor explica que não mais possui o livro, 
mas pergunta se pode repor a remessa com outro livro, novo, edição atual e, 
obviamente, sem o autógrafo do autor. Você aceitaria? Por que não? Por que você 
não comprouum título da obra do mestre apenas? Você comprou uma peça 
histórica, de colecionador, sem igual. Deu para notar o que é um bem infungível? 
Mas nem precisamos ir tão longe; um exemplo clássico de bem infungível é o seu 
automóvel; tem até placa individual, não é? Em tese, qualquer bem individualizado 
para alguém, ainda que o valor seja puramente sentimental, é um bem único no 
universo e, como tal, infungível. Atenção: é importante lembrar que a ideia de 
fungível ou infungível leva em consideração o sujeito que se interessa pelo referido 
bem. A qualificação é subjetiva. O que é infungível para alguém pode ser fungível 
para outra pessoa. Alguém pode adquirir uma dúzia de aparelhos telefônicos 
antigos para retirar peças para reparo de outros aparelhos; tais aparelhos serão 
fungíveis. Mas um daqueles aparelhos antigos, adquirido por outra pessoa, em um 
antiquário ou museu, será, para o adquirente, um bem infungível. A relevância de 
87 
 
tal classificação é que, em sendo o bem fungível ou infungível, seu empréstimo 
será um mútuo ou um comodato (respectivamente); as compensações de dívidas 
com tais bens podem ou não ocorrer (respectivamente) e, em tese, os bens imóveis 
são sempre infungíveis; dizemos em tese porque um imóvel, sob o ângulo de uma 
construtora, incorporadora ou imobiliária, pode ser tomado como bem fungível. 
Consumíveis são bens que se destroem quando são utilizados. Deixamos claro 
que a palavra “destruição” é no sentido jurídico da palavra (identidade-substância-
destinação econômica). Por exemplo, a tinta de parede é consumível: uma vez 
aplicada à parede, não mais pode ser utilizada para a mesma finalidade; mas 
perceba que ela não se “destruiu”, tanto que está lá, na parede! E é importante 
lembrar que, no mundo físico, NADA é indestrutível, Lavouisier já enunciava que 
“tudo se transforma”. Um bem comprado para revenda se consome quando esta 
ocorre. 
Inconsumíveis são bens que não se destroem na sua utilização; apenas se 
desgastam. Um exemplo clássico é o automóvel. Um automóvel não se destrói no 
uso, mas se desgasta com os usos sucessivos. Mas são considerados bem não 
consumíveis por permitirem indefinidos usos. Atenção: igualmente importante é 
lembrar que as ideias de consumíveis ou não consumíveis estão diretamente ligadas 
à finalidade para a qual se considera o bem. Por exemplo: uma revendedora de 
automóveis adquire automóveis para quê? Para rodar, não é mesmo? É claro que 
não! Adquire-os para vender. Pois bem, no momento da venda, tais bens foram 
“utilizados” e “destruídos”, visto que não podem vender o mesmo automóvel duas 
vezes, obviamente. Assim, os automóveis, para a revendedora, são bens 
consumíveis. Uma das importâncias de se classificar os bens como consumíveis ou 
inconsumíveis é para o instituto do usufruto, que só recai sobre bem inconsumível. 
O usufruto que recai em bem consumível é chamado de usufruto impróprio ou 
quase-usufruto. 
No que toca aos bens divisíveis e indivisíveis, melhor entendermos, de 
antemão, o que significa a indivisibilidade. 
A indivisibilidade pode ser de três espécies: natural, legal ou convencional. A 
indivisibilidade natural ou física é aquela que decorre da própria natureza (daí 
também ser chamada de “indivisibilidade pela própria natureza”); é aquela em que, 
se o bem for dividido, perde-se sua essência, sua identidade, ou sua destinação 
econômica. Assim, um boi dividido ao meio não é mais boi; é carne bovina. Uma 
árvore dividida ao meio não é mais árvore; é madeira. Um automóvel dividido ao 
meio não é mais automóvel; é sucata. Que fique claro que, no mundo das ciências 
físicas, TUDO é divisível, daí, quando falamos em indivisibilidade física, usamos o 
parâmetro identidade-essência-utilidade da coisa, que fica destruída ou modificada. 
A indivisibilidade legal é a que decorre da lei; e não adianta muito tentarmos 
encontrar lógica, visto que é uma indivisibilidade ideal, no mundo jurídico. Assim, 
88 
 
a herança é indivisível até a partilha. A massa falida é indivisível até a liquidação 
desta; as debêntures emitidas por uma Sociedade Anônima formam um todo 
indivisível. São exemplos de indivisibilidade legal. Indivisibilidade convencional é 
a que decorre de decisão das partes. Assim, dois contratantes podem tornar um lote 
de terra indivisível para fins de compra e venda, podem tornar indivisível uma 
determinada safra comprada, ou qualquer grupo de bens que fisicamente ou 
legalmente seriam até perfeitamente divisíveis, mas a vontade das partes 
simplesmente a afasta. Uma vez desvendada a indivisibilidade, é-nos suficiente 
saber que o que não for indivisível por qualquer dos três motivos expostos é 
divisível – a divisibilidade é por exclusão, ou seja, a ela não se opõem as partes, a 
lei; e a coisa dividida não perde sua identidade, substância ou prejuízo em sua 
destinação. 
Tratando sobre bens singulares e coletivos, podemos afirmar que bens 
singulares podem ser tomados à unidade para negócios jurídicos; são considerados 
individualmente, ao passo que os bens coletivos (ou universais), que são 
compostos por várias unidades físicas em sua formação, só podem ser tomados 
para negócio conjuntamente, como um todo unitário; é o caso da herança, espólio, 
biblioteca, frota, safra, e assim por diante. As universalidades são chamadas de “de 
fato” e “de direito”. Universalidade de fato é o conjunto de coisas materiais 
singulares, simples ou compostas reunidas em coletividade pela vontade da pessoa. 
É o que conhecemos como bens coletivos no colégio, mas com um componente a 
mais: o desejo de destiná-los a finalidade específica; e Universalidade de direito é 
o conjunto de coisas (materiais ou imateriais) corpóreas ou incorpóreas que têm seu 
caráter coletivo, mas a que a lei atribui caráter unitário, como um patrimônio, uma 
herança, uma massa falida, bem como direitos e obrigações.28 
 
1.2.3.2 BENS RECIPROCAMENTE CONSIDERADOS 
Nesta classificação, toma-se somente um bem em relação a outro bem. Ou seja, 
dependendo do outro bem ao qual se compare, a classificação desse bem pode 
mudar. 
Aqui se classifica um bem em Principal ou Acessório. Bem Principal é o bem que 
existe por si só, não dependendo de nenhum outro, tendo destino próprio. Bem 
Acessório é o bem cuja existência nos faz concluir que existe um bem principal. 
Seu destino segue o do bem principal. O titular da relação jurídica que contém a 
coisa principal detém também a acessória. São espécies de bem acessório os frutos, 
as benfeitorias, os produtos e as pertenças. 
Os frutos são utilidades geradas pela coisa, os quais podem ser retirados sem 
que esta perca sua substância. Possuem duas classificações: quando à natureza e 
 
28 In www.advocaciaassociada.com.br/informacoes.asp?IdSiteAdv=2803&action=exibir&idinfo=1783 
89 
 
quanto ao tempo. Quanto à natureza dos frutos, estes podem ser naturais, quando 
não precisam de ingerência humana para serem gerados pela coisa; industriais (ou 
artificiais), quando dependem de atuação humana para existirem; e civis, que são 
rendimentos e demais utilidades legais decorrentes da atuação de terceiros que não 
são titulares da coisa; por exemplo, juros e aluguéis. 
Quando ao tempo, o fruto pode ser pendente, quando ainda se encontra ligado 
à coisa principal, ou seja, não foi ainda destacado; percipiendo é o fruto que já 
devia ter sido colhido, e não o foi; fruto percebido é o fruto já destacado da coisa; 
consumido é o fruto que já foi utilizado segundo sua identidade; e estante é fruto 
já colhido e armazenado. Existem ainda os frutos “colhidos por antecipação”, que 
são simplesmente os que são separados da coisa antes do momento adequado. 
90 
 
 
Figura 23 - Frutos quanto ao momento 
91 
 
Produtos são utilidades geradas pela coisa cuja retirada importa em destruição 
da própria coisa, não se renovando. Por exemplo: petróleo edemais recursos 
naturais não renováveis. 
Benfeitorias são obras executadas na/sobre a coisa; dividem-se em benfeitorias 
necessárias, úteis e voluptuárias. Benfeitorias necessárias são obras de 
conservação da coisa; garantem a própria coerência formal desta. Benfeitorias úteis 
são as que trazem maior conforto e funcionalidade no uso da coisa; e Benfeitorias 
voluptuárias são as que aformoseiam a coisa, tornando-a mais bonita e suntuosa. 
Atenção: uma obra só é benfeitoria quando se acresce a ela outra já existente. 
Quando se constrói onde nenhuma obra anterior existe, temos uma acessão! 
Quanto aos efeitos das benfeitorias, explicamos que, sempre que um possuidor 
precise ser desapossado, pode reter o bem até ser indenizado pelas benfeitorias 
necessárias. As benfeitorias úteis são igualmente indenizáveis, mas não dão direito 
à retenção. As benfeitorias voluptuárias não geram direito à indenização nem à 
retenção. Se o possuidor puder levá-las consigo, pode fazê-lo, mas, se não 
conseguir removê-las, perdê-las-á. Por ato da entrega, o locador pode reter a coisa 
até receber o pagamento do que gastou com benfeitorias necessárias, sempre; e das 
úteis se, quanto a estas, houve disposição no contrato. 
Os Artigos que tratam sobre benfeitorias, 1216 e 1220, visam garantir ao 
possuidor que sai da coisa uma indenização pelas despesas de produção dos frutos 
(Art. 1.216) e das benfeitorias necessárias (Art. 1.220). A vontade da lei foi até 
nobre: vedar o enriquecimento ilícito do proprietário. A besteira do legislador foi 
ter garantido a aplicação desses artigos ao possuidor de má-fé. Estranho! O cara 
invade o imóvel e, ao sair (à força, né?), ainda vai ser indenizado? Ok! ok! E o 
papo de vedação ao enriquecimento ilícito? Bem! Invasor tem que indenizar; e 
pode acontecer de ele ter consigo nenhum patrimônio para operar tal reparação, 
assim se deixa claro na lei que o possuidor de má-fé tem direito a NENHUMA 
indenização; garante-se ao proprietário, pelo menos, um mínimo de “indenização” 
ainda que nada reste ao invasor. O legislador quis garantir um princípio; acabou 
protegendo pilantra! 
P.S.: Eu sei que o correto gramaticalmente seria “não tem direito a nenhuma 
indenização”, mas, pelas regras de raciocínio lógico, a negação da negação é uma 
afirmação, então acho que escrevi correto e que errada está a gramática, nesse caso. 
Como o blog é meu... 
Alguns outros efeitos das benfeitorias são os seguintes: em um condomínio, se 
houver benfeitorias indivisíveis e se não houver acordo dos condôminos (no 
sentido de nenhum condômino desejá-las, visto que, no conflito de mais de uma 
vontade, a lei dá prevalência ao condômino com benfeitorias mais valiosas) quanto 
à divisão destas, a lei determina que sejam vendidas e que seu valor seja repartido 
entre os condôminos; no direito de família, onde houver o regime de comunhão 
92 
 
parcial, não se excluem as benfeitorias de cada cônjuge na massa patrimonial do 
casal; e, nas sucessões, excluem-se da partilha as benfeitorias acrescidas em bens 
doados antes da morte do de cujus. 
Pertenças são bens acessórios não agregados fisicamente à coisa, mas que 
existem para servi-la e integrá-la de modo duradouro. Têm autonomia física em 
relação à coisa, portanto. Essa figura foi trazida pelo novo Código. A ideia mais 
próxima de pertença existente no Código antigo era a de “bem imóvel por acessão 
intelectual” e se referia à atual ideia de pertença, mas somente quando o bem 
principal fosse imóvel. 
As pertenças só seguem o bem principal se assim constar no contrato; no 
silêncio deste, a transmissão do bem não inclui as suas pertenças. 
É o caso do macaco e da chave de roda em relação ao carro; o extintor de 
incêndio dependurado na parede do prédio, e assim por diante. Podem ser 
livremente destacados e não se irão desnaturar por isso, mas têm a função de 
auxiliar o uso de outro bem. 
Na égide do Código antigo, as pertenças de imóvel eram chamadas de “imóvel 
por acessão intelectual”; hoje, entendem os doutos, conforme o Enunciado 11 da 
1JDC, “não persiste no novo sistema legislativo a categoria dos bens imóveis por 
acessão intelectual”. 
É corriqueira a confusão entre dois institutos: “Pertença” x “Imóvel por acessão 
intelectual”. Um bem móvel que exista em função de um imóvel é chamado de 
“imóvel por acessão intelectual”, já que, mesmo sendo um bem autônomo, nosso 
cérebro liga (acede) ao imóvel aquele móvel. É o exemplo clássico do extintor de 
incêndio, que, embora sendo um bem móvel, destacável, fisicamente separado do 
imóvel, nossa mente o transforma em parte integrante do imóvel. 
Ocorre que o Código Civil de 2002 trouxe a figura das “pertenças: “Art. 93 – 
São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de 
modo duradouro, ao uso, ao serviço o ao aformoseamento de outro”. 
Estava montada a discussão: ainda continuam a existir os bens “imóveis por 
acessão intelectual”? O imóvel por acessão intelectual é um móvel servindo a um 
imóvel. Quando um móvel serve a um móvel, é pertença. Mas nossa posição é que 
as pertenças incluem os imóveis por acessão intelectual, por dois motivos: 1) ser 
mais abrangente; e 2) não haver incompatibilidade desta tese com a redação do 
Artigo 93 do CCB. Tentando resolver a questão, o Enunciado 11 da 5JDC diz que 
"Não persiste no novo sistema legislativo a categoria dos bens imóveis por acessão 
intelectual, não obstante a expressão ´tudo quanto se lhe incorporar natural ou 
artificialmente´, constante da parte final do art. 79 do Código Civil." - Mas como 
pode ser pedido em alguma prova, fazemos questão de explanar o conceito. 
 
 
93 
 
1.2.3.3 BENS QUANTO À TITULARIDADE 
Quanto à titularidade, um bem pode ser público ou particular. 
Bem públicos, em verdade, já constituem uma classificação do terceiro grupo, 
que leva em conta a titularidade do bem, que pode ser particular ou público. 
Bens particulares são definidos por exclusão: o que não é bem público é bem 
particular. Por essa razão, passaremos a explicar, portanto, apenas o que sejam bens 
públicos: Existem bens públicos de diversas espécies; apenas alguns deles são 
disciplinados pelo Código Civil. Lembramos que existem outros bem públicos que 
não constam no rol do Artigo 98 do codex, mas tal classificação é mais afeta ao 
direito administrativo. Os bens públicos podem ser classificados como Bens de Uso 
Comum do Povo; Bens de Uso Especial e Bens Dominicais. Os bens de uso 
comum do povo são aqueles que qualquer particular pode utilizar; podem ser de 
uso remunerado ou não. Bens de Uso especial são aqueles de utilização privativa 
da Administração Pública. É possível a qualquer do povo adentrar até algumas 
dependências dos bens de uso especial, mas não na sua totalidade. Exemplo: 
fórum, delegacia e repartições públicas em geral. Um particular pode adentrar uma 
repartição no setor de informações, mas não pode ingressar livremente nos 
gabinetes das autoridades e em áreas de trabalho privativas dos servidores. Os bens 
públicos sem destinação específica são chamados de dominicais (ou dominiais). 
O Enunciado 287 da 4JDC dá uma interpretação extensiva: "O critério da 
classificação de bens indicado no art. 98 do Código Civil não exaure a enumeração 
dos bens públicos, podendo ainda ser classificado como tal o bem pertencente a 
pessoa jurídica de direito privado que esteja afetado à prestação de serviços 
públicos." 
As chamadas terras devolutas nada mais são do que terras sem registro, mas 
que pertencem à União, em princípio. São assim chamadas porque todo o território 
nacional, um dia, já foi dado a alguém, por meio das capitanias hereditárias; e 
depois foram devolvidas ao Estado (na época, Portugal). Daí serem chamadas de 
devolutas. Os bens públicos são inusucapíveis, visto que permitir tal forma de 
aquisição de propriedade seria privar toda uma coletividade, e não uma pessoa 
específica, de uso,efetivo ou potencial, daquele bem. 
Alguns bens públicos podem ser alienados, desde que por meio de 
procedimento legal específico, que inclui a desafetação do bem; e somente podem 
ser alienados os bens dominicais. Ou seja, enquanto um bem público tiver 
finalidade específica, não pode ser alienado. 
 
1.2.3.4 BENS QUANTO À COMERCIABILIDADE 
Aqui, igualmente, estamos tratando de uma classificação de um grupo 
específico, a saber, da classificação quanto à comerciabilidade do bem, que pode 
ser “Comercializável” ou “Fora do Comércio”. 
94 
 
Determina-se por exclusão: o que não está “fora do comércio” é 
comercializável. Devido a isso, iremos tratar apenas sobre os bens fora do 
comércio, que são os que não podem se movimentar juridicamente de um titular 
para outro, pois possuem inalienabilidade. Podem ser inalienáveis por natureza 
(Sol, Lua, direitos da personalidade...); legalmente inalienáveis (alguns bens 
públicos, bem de família, de índios...) e inalienáveis por vontade das partes (os 
doados com cláusula de inalienabilidade). 
Ou seja, por três razões um bem se torna fora do comércio: ou por ser 
naturalmente imprecificável (não se pode avaliá-lo economicamente, ou até o é, 
mas é intransacionável onerosamente), ou a lei proíbe a comercialização, ou as 
partes simplesmente o convencionaram como tal. O corpo humano é um 
bem imprecificável. Pode ser doado, mas não pode ser vendido. Um bem público é 
até precificável, mas por força de lei não é comercializável. Uma doação com 
cláusula de incomunicabilidade é precificável, é naturalmente comercializável, mas 
a convenção proíbe a comercialização. 
Assim, todos os bens que licitamente possam ser precificados e transacionados 
onerosamente são chamados de bens “comercializáveis”. 
 
1.2.4 BEM DE FAMÍLIA 
Inspirado na motivação do Homestead Act estadunidense (1839) de garantir ao 
cidadão ao menos o abrigo como mínimo existencial, no Brasil existe o instituto do 
“bem de família”, que pretende proteger a dignidade da pessoa humana, por meio 
da impenhorabilidade de um conjunto mínimo de bens necessários à vida com 
dignidade. 
O bem de família pode ser classificado em duas espécies: voluntário e legal. O 
bem de família voluntário, mais antigo em nossa legislação, começa a ser 
disciplinado no Artigo 1.711 do Código Civil. Como o nome diz, é instituído pela 
vontade do casal ou de entidade familiar, em bens que correspondam a, no 
máximo, um terço do patrimônio líquido (patrimônio livre de dívidas) dos 
proprietários. 
Deve ser registrado. A inscrição do bem de família está disciplinada nos 
Artigos 260 a 265 da Lei de Registros Públicos. Inicia-se com a lavratura de uma 
Escritura Pública. Dever-se-á seguir o registro desta; o oficial de registro 
determinará a publicação em jornal de grande circulação e no Diário Oficial da 
intenção. Haverá 30 dias de espera para eventual impugnação. Em não havendo, 
encontra-se instituído o bem. Se houver reclamação, suspende-se o procedimento. 
Caso se insista judicialmente, o reclamante ganhará o direito de executar o bem. 
A impenhorabilidade desse instituto não abrange dívidas passadas, obrigações 
tributárias referentes ao bem e despesas condominiais; tal bem só é alienável com 
95 
 
autorização dos proprietários e, havendo incapaz residindo no imóvel, far-se-á com 
autorização do Ministério Público. 
Com relação ao bem de família legal, a lei de regência é a 8.009/90; independe 
de inscrição voluntária em cartório. Institui bem de família em “imóvel residencial 
próprio do casal, ou da entidade familiar”, compreendendo também “a construção, 
as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, 
inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que 
quitados”; e possui uma série de exceções: dívidas trabalhistas e previdenciárias 
dos trabalhadores domésticos da residência; débitos de financiamento do imóvel; 
pensão alimentícia; tributos do imóvel e taxas condominiais; hipoteca; adquirido 
para o produto e o crime; indenização ou perdimento – por sentença penal; e fiança 
locatícia. 
Desde outubro de 2008, pela Súmula 364 do STJ – são “famílias” também as 
pessoas solteiras, separadas e viúvas, o que corrobora que a proteção do “bem de 
família” é para a pessoa, o indivíduo (dignidade da pessoa humana), e não 
necessariamente para a família. Tal Súmula consolidou também a existência da 
“família unipessoal”, por mais estranho que possa parecer inicialmente. 
Quanto às vantagens e desvantagens: o bem de família voluntário possui 
menos exceções (somente duas), mas é mais burocrático e semi-inalienável, 
enquanto que o bem de família legal é automático e alienável, mas possui várias 
(nove, pelo menos) exceções à impenhorabilidade. 
Caso haja promessa de compra e venda, para aquisição de bem de família, 
também tal direito é impenhorável, conforme o enunciado 325 da 4JDC: “É 
impenhorável, nos termos da Lei n.o 8.009/90, o direito real de aquisição do 
devedor fiduciante”. 
 
1.2.5 REGISTRO CIVIL 
A Lei de Registros Públicos (Lei n.º 6.015, de 31 de dezembro de 1973) dispõe, 
em seu primeiro Artigo, que o registro é o procedimento que confere autenticidade, 
segurança e eficácia aos atos jurídicos. Autenticidade, pois, é a garantia de 
origem; é a prova cabal de que tal ato realmente emanou de tal pessoa; Segurança 
é a garantia da estabilidade das relações jurídicas, por meio de atributo da 
publicidade dos registros; assim, em tese, qualquer indivíduo tem acesso a qualquer 
ato registrado. Quem pratica um ato sob crivo dos registros públicos goza da 
segurança de que ninguém poderá alegar ignorância do ato que o referido indivíduo 
praticou, gerando, assim, “tranquilidade” em sociedade no que tange aos atos 
registrados; e Eficácia é a prova de que o ato está apto a gerar todos os efeitos 
conferidos por lei. É também o atributo que confere perfeição ao ato (lembre-se de 
que uma das incolumidades dos atos jurídicos é exatamente a sua perfeição, ou 
seja, ser praticado de acordo com a lei vigente em sua época!). 
96 
 
O Oficial de Registros goza de fé pública, ou seja, o que ele afirmar não está 
sendo afirmado pela sua pessoa natural, mas sim afirmado pelo próprio Estado! 
São os seguintes os registros públicos: Pessoas Naturais, Pessoas Jurídicas, 
Títulos e Documentos e Imóveis. Os atos atinentes às Pessoas Naturais que devem 
ser levados a registro são nascimento, casamento, separação, óbito, emancipação, 
filiação, interdição, ausência, opção de nacionalidade, adoção e alteração de nome. 
Os atos de Pessoas Jurídicas, tais como início, extinção e modificação, devem ser 
registrados no cartório de Pessoas Jurídicas. Os atos referentes a documentos em 
que se deseja ou se imponha publicidade, tais como contrato de locação, fiança, 
garantias diversas, compra e venda, cessão de crédito etc., são registrados nos 
Cartórios de Títulos e Documentos. Os atos que envolvam Direitos Reais29 sobre 
imóveis devem ser registrados no registro de imóveis. 
Leis esparsas ainda instituem os cartórios de Protesto de Títulos e Letras e os 
Cartórios Marítimos. O termo “registro”, em verdade, é uma designação genérica 
do que são espécies: a inscrição, a averbação, o cancelamento e a anotação. 
Inscrição é o assentamento do ato no livro registral. No caso de imóvel, a inscrição 
é chamada de Matrícula. Averbação é qualquer modificação do ato assentado; é 
lançada à margem do assentamento e daí o motivo de ser chamada averbação. 
Cancelamento é o “registro” da extinção do motivo que originou o ato; e Anotação 
são notas remissivas entre diversos registros que tenham relação entre si. O registro 
(termo genérico), em verdade, é um procedimento composto pelos seguintes atos: 
Prenotação (ou protocolo), Análise do ato quanto à forma e à legalidade, pelo 
cartorário, e Registro propriamente dito (que, como visto alhures, pode ser 
inscrição, averbação,cancelamento ou anotação). 
Teçamos umas palavras sobre a análise de legalidade empreendida pelo 
cartorário: caso o oficial de registro entenda que o título levado a registro esteja 
desconforme com as normas legais, deve este, se provocado, “suscitar dúvida” ao 
juiz. O “princípio da instância” determina que, para que o oficial de registro suscite 
dúvidas ao juiz, deve ser provocado pelo interessado, nem que seja de forma 
verbal. (Arts. 13 e 198 da LRP). Esse julgamento, embora realizado pelo juiz, não 
tem natureza jurisdicional, mas sim administrativa, porque o cartório está 
subordinado ao Tribunal de Justiça, agindo por delegação concedida; e age o juiz 
aqui não como Estado-juiz, mas sim como superior hierárquico do cartório. 
 
1.3 FATOS JURÍDICOS 
Já estudamos os elementos estáticos das relações jurídicas, a saber, as 
“Pessoas” e os “Bens”. Estudaremos agora aquele que é responsável pelo 
 
29 Trataremos sobre Direitos Reais em capítulo próprio, nesta obra. São exemplos de direitos reais: 
propriedade, hipoteca, enfiteuse etc. 
97 
 
movimento das relações. Trata-se dos “Fatos Jurídicos”. O elemento dinâmico, o 
elemento que faz acontecerem as relações, o “COMO”; o elemento que define a 
maneira pela qual as pessoas se relacionarão umas com as outras, utilizando ou não 
os bens nessas relações. 
 
Figura 24 - Fato e negócio jurídico 
“Fatos” são acontecimentos; aqui o conceito é do dicionário; a acepção da 
palavra aqui é do mundo profano mesmo. Qualquer evento, seja advindo da 
natureza, seja do homem, é um fato, o qual pode ou não interessar ao direito. Se o 
fato interessar, dizemos que se trata de um “Fato Jurídico”. Quando dizemos que 
um fato interessa ao direito? Quando suas consequências criam, modificam ou 
extinguem direitos e/ou relações jurídicas. São fatos relevantes ao mundo jurídico. 
Exemplo: nascimento, morte, casamento, compra e venda etc. Ocorre que a maioria 
dos fatos do universo não interessa ao direito. Aliás, já pensou o inferno que seria 
se todos os fatos do mundo tivessem consequências jurídicas? Para a nossa sorte, 
os fatos jurídicos, em verdade, representam uma parcela mínima dos 
acontecimentos no globo. 
Quando um fato é irrelevante para o direito (voo de um passarinho, quebra de 
onda na praia, queda de folha das árvores etc.), diz-se que são Fatos Comuns, que 
são os objetos de estudo do direito; são estudados por outras ciências. Atenção: se 
você notou nossos exemplos de fatos comuns, assumimos que eles não tiveram 
qualquer consequência maior. Imagine que o “voo do passarinho” se dá em direção 
à turbina de um avião em voo (dramático esse exemplo...) e venha causar um 
acidente aéreo... nesse caso, o fato não será comum; será jurídico! Imagine que a 
98 
 
onda que quebrou na praia era um... tsunami (ou uma onda como a do filme 
“Poseidon”)! Nesse caso, devido aos bens juridicamente tutelados que tal onda 
atingiu, não teremos um fato comum, mas sim um fato jurídico, e assim por diante. 
O que queremos deixar claro é que, para o fato ser considerado comum ou 
jurídico, precisa ser considerada a sua consequência, e não apenas o fato em si 
mesmo. Os fatos jurídicos (fatos relevantes para o direito) se subdividem em Fatos 
Naturais e Fatos Humanos; tal divisão leva em conta a causa do fato: se fora 
causado pela natureza, sem intervenção direta do homem, temos o fato jurídico 
natural. Caso o fato jurídico tenha intervenção humana em sua causa direta, temos 
o chamado fato jurídico humano. Os fatos jurídicos naturais se subdividem em 
fatos naturais ORDINÁRIOS e fatos jurídicos naturais EXTRAORDINÁRIOS. 
O fato jurídico natural pode ser corriqueiro; e, embora possa causar até danos, 
ninguém se assusta quando isso ocorre, visto que é de senso comum essa 
possibilidade. Exemplo: durante uma tempestade, é aceitável, até esperado, que 
caiam raios; em chuvas intensas, ninguém se assusta com alagações de ruas etc. 
Mas existem fatos jurídicos naturais que não ocorrem normalmente, a exemplo 
de tornados (no Brasil), geada (na Região Norte e no Nordeste), tsunamis, 
terremotos, quedas de meteoros etc. Esses fatos, caso gerem consequências nas 
relações jurídicas, são chamados de fatos jurídicos naturais extraordinários, por não 
serem normais, corriqueiros, esperados pelas pessoas do local onde ocorrem.30 
Um exemplo real: dia primeiro de outubro de 2010, estava eu ministrando aula 
na turma de quinto período vespertino (responsabilidade civil), em uma das 
faculdades em que ministro quando, em meio a um temporal, ouvimos pedrinhas 
atingindo as janelas da sala. Naquela noite, soubemos que havia chovido granizo 
em Manaus. Chuva de granizo! Em Manaus! – desde então, esse é o melhor 
exemplo de fato jurídico natural extraordinário que possa existir, em plenos 36 
graus à sombra de Manaus... Choveu gelo! 
Os fatos jurídicos naturais extraordinários ainda se subdividem em caso fortuito 
e força-maior. Tais institutos serão por nós estudados ao tratarmos sobre 
Responsabilidade Civil. 
Os fatos jurídicos humanos, ou seja, os que dependem de atuação humana 
direta para a sua existência, se dividem em fatos jurídicos humanos LÍCITOS e 
ILÍCITOS. 
Costumo explicar em sala que lícito é “inconceituável”. E é mesmo! O máximo 
que podemos afirmar é que é uma ideia excludente, ou seja, que lícito é tudo aquilo 
que não é ilícito. 
Agora, o ilícito, esse sim, pode ser conceituável. Ilícito é tudo aquilo que 
ofende a um dos seguintes institutos: o justo, o legal, a moral e o costume. O 
 
30 Notem que a expectativa de referência é a do local onde o fato ocorre! Se é um local, é corriqueira 
a ocorrência de tornados; tal fato não é considerado extraordinário. 
99 
 
“justo” é perfeitamente identificável, mas é quase impossível explicá-lo com 
palavras. É o sentimento de estabilidade, de que o mundo está em ordem, e 
sentimos paz interior quanto a isso. É algo ligado à origem do Direito Natural. 
O legal é aquilo que está na lei, positivado pelo Estado em normas escritas. Sua 
finalidade é regular as relações segundo o justo embora saibamos que nem sempre 
tal acontece; e o costume é aquilo que seguimos com uma consciência inata de 
obrigatoriedade; um comportamento repetido sob medo de sanção social. A moral é 
o nível de pudor de uma sociedade – sim! A “moral” a que nos referimos é a moral 
média da sociedade, e não a moral individual – esta é infinitamente variável. 
Lembro que a ideia que trouxe aqui é a do direito privado, em que “tudo o que não 
é proibido é permitido” (Artigo quinto, inciso dois, da Constituição); é que, no 
direito administrativo, dá para afirmar, corretamente, que lícito é tudo aquilo 
expressamente permitido, pois naquela esfera só se torna lícita a conduta declarada 
na lei como tal. 
A regra é a liberdade de atuação; as exceções são as proibições. Vale aqui a 
inversão quanto ao direito administrativo, exposto no parágrafo anterior. Os fatos 
jurídicos humanos ilícitos se dividem ainda em ilícitos dolosos e culposos, que 
serão estudados no tópico “responsabilidade civil”. 
Os fatos jurídicos humanos lícitos se subdividem ainda em “ATOS jurídicos” e 
“NEGÓCIOS jurídicos”. 
Sempre que o ser humano pratica um fato jurídico lícito “obrigado” pela lei, 
dizemos que está praticando um Ato Jurídico. Existem práticas que 
empreendemos “somente” porque somos obrigados pelo Estado; algo como tirar 
RG, pagar tributo, registrar nascimentos e óbitos, ser mesário em eleição etc. Logo 
dizemos que Atos Jurídicos são atuações humanas nas quais não existe liberdade de 
escolha entre praticar ou não o ato. 
Existem, no entanto, atuações humanas em que há liberdade entre praticar ou 
não o ato; e, na prática do ato, existe liberdade quanto ao conteúdo e quanto à 
consequência da atuação. Tais atuações, verdadeiros motores do mundo moderno, 
sãochamadas “Negócios Jurídicos”. 
Uma vez que nosso Código determina que as normas dos Atos Jurídicos são as 
mesmas aplicáveis aos negócios jurídicos, ao estudarmos estes, estamos estudando 
aqueles. 
Os “atos-fatos jurídicos”, figuras puramente doutrinárias e acadêmicas, são 
aquelas ações humanas sem intenção, lícitas (senão seriam atos ilícitos culposos) e 
que geram consequências jurídicas. Exemplo: achado natural de um tesouro por 
pessoa privada de discernimento31. 
 
 
31 O exemplo é de Murilo Schieri Costa Neves. 
100 
 
1.3.1 ATOS E NEGÓCIOS JURÍDICOS 
Essa confusão entre “ato” e “negócio” jurídico sempre surge logo no início das 
conversas sobre “fatos jurídicos”. Posso garantir que tal imbróglio é só aparente; 
com a apreensão de um detalhezinho, tudo fica fácil. Vamos por partes: 
Já aprendemos o que é fato jurídico humano lícito; e este se divide em ato e 
negócio. Mas existe outra classificação que, embora não mude o conteúdo do que 
dissemos, altera um pouco a nomenclatura. Dissemos que um Fato Jurídico 
Humano pode ser um ATO ou um NEGÓCIO. Mas, segundo doutrina mais antiga, 
o fato jurídico humano é chamado de ATO, que se divide em ATO STRITO 
SENSU e NEGÓCIO. Então, esteja atento para a palavra “ato”, que tanto pode 
significar “fato jurídico humano”, como modernamente é dito, quanto pode ser o 
gênero de atuação humana. 
Uma vez que o Artigo 185 do CCB igualou (ainda bem!) as regras para “ato” e 
“negócio”, é importante que se saiba que, ao tratarmos de um instituto, estamos 
igualmente já nos referindo ao outro. 
 
1.3.1.1 CLASSIFICAÇÃO 
Uma vez que a classificação dos negócios jurídicos se assemelha muito à 
classificação dos contratos, remetemos o leitor à classificação daqueles, quando 
traçaremos as linhas necessárias. 
 
1.3.1.2 PLANOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS 
Os negócios (jurídicos), para serem entendidos, precisam ser analisados. A 
análise dos negócios jurídicos compreende três planos. A palavra “plano” aqui quer 
dizer estágio. Significa uma “fase” de análise, em que se passa à análise de um 
estágio (plano) após o estudo do estágio anterior. 
101 
 
 
Figura 25 - Planos dos negócios jurídicos 
Para que o negócio jurídico goze de plena proteção judicial, precisa de 
PERFEIÇÃO. É a perfeição que torna o negócio “bom”, ou seja, exigível perante o 
Poder Judiciário em caso de descumprimento. Para que um negócio jurídico seja 
perfeito, precisa, necessariamente, passar pelos três planos de análise; precisa 
vencer os três estágios. Se passar incólume pelos três planos de análise, dizemos 
que o negócio está perfeito. Tais estágios (ou planos) são três: existência, validade 
e eficácia. A escada mostrada no desenho foi desenhada por mim, mas criada por 
Pontes de Miranda. 
Um negócio que atingiu todas as exigências de existência, validade e eficácia 
diz-se perfeito. De onde surgiu essa expressão “Negócio perfeito”? É que a 
LINDB traz a expressão “ato jurídico perfeito”, em seu Artigo sexto, que é aquele 
que já reuniu todas as exigências segundo a lei de sua época. O Artigo 185 do CCB 
igualou as regras de “ato” e “negócio”; assim, o termo legal “ato jurídico perfeito” 
é igualmente indicador de “negócio jurídico perfeito”. Obs.: outra versão para a 
semelhança do “ato jurídico perfeito” do Artigo sexto da LINDB (Lei de 
Introdução às Normas do Direito Brasileiro) é o fato de, para uma classificação 
mais antiga, o fato jurídico humano já ser tratado, genericamente, como “ato”. 
102 
 
 
Figura 26 - Planos dos negócios jurídicos (detalhado) 
1.3.1.2.1 PLANO DE EXISTÊNCIA 
Aqui, o negócio “ou é ou não é”. Ou existe ou não existe. É tudo ou nada. Caso 
um negócio seja inexistente, nem se continua a análise nos outros planos; “acaba” 
aqui a discussão sobre o negócio sob análise. O Código Civil não tratou de plano 
de existência com tais palavras diretamente. Sim! Convenhamos! Se não existe, 
como pode ser objeto de regulamentação legal? Em verdade, existem até grandes 
doutrinadores que não consideram esse plano de análise. Entendemos que há um 
plano de existência; tanto que para um ato inexistente ajuíza-se uma “Ação 
declaratória de inexistência de ato jurídico”. 
O negócio jurídico não é um todo indivisível. É formado por partes integrantes. 
Existe uma controvérsia entre os doutrinadores sobre a quantidade de partes 
que integram os negócios jurídicos: três, quatro ou cinco partes. Segundo a nossa 
lógica, são QUATRO os elementos dos negócios jurídicos, a saber: Sujeito, Objeto, 
Declaração e Forma. 
Sujeito – Sem esse elemento, sequer se cogita a existência dos outros. Uma vez 
que o leitor já sabe que os sujeitos são o “QUEM” dos negócios jurídicos, são os 
atores, podemos dizer que o sujeito é o elemento mais importante dos negócios 
103 
 
jurídicos. Os sujeitos dos negócios jurídicos são as pessoas, seja natural, seja 
jurídica. 
Objeto – É aquilo sobre o que recaem os negócios jurídicos. TODO negócio 
jurídico é sobre um objeto! Ao tratarmos sobre Direito das Obrigações, o leitor 
descobrirá que tal objeto ora é uma coisa, ora é um comportamento. O objeto 
precisa ser lícito, possível e determinado ou determinável. Objeto lícito é aquele 
que não ofende nem o direito nem a moral (e a moral inclui os bons costumes). A 
possibilidade pode ser de três espécies: possibilidade física e possibilidade jurídica. 
Possibilidade física significa ser exequível segundo as leis na natureza; e 
possibilidade jurídica é o estado do que não ofende a lei escrita. Difere-se a 
possibilidade jurídica da licitude pelo fato de esta açambarcar direito e moral; é 
bem mais amplo que possibilidade jurídica, que se detém à não colisão com a lei 
escrita. O objeto precisa ser determinado, ou seja, identificado; ou ao menos 
determinável, ou seja, há de haver elementos no negócio que levem à identificação 
da coisa, ainda que em momento futuro. Ao estudarmos sobre os requisitos do 
objeto em sala de aula, usamos o macetinho: “Para se descobrir se algo pode ser 
objeto de negócio jurídico, fazemos a pergunta: – Isso pode ser objeto de negócio 
jurídico? Se a resposta for: “Sim, eLiPoDe!”, é porque o é, visto que, se “eLiPoDe” 
ser objeto de negócio jurídico, é porque ele é LÍcito, POssível e 
DEterminado(vel).” 
Declaração – É a manifestação da vontade do sujeito. É a transmissão do 
pensamento volitivo dos atores dos negócios. Não pode ser feita sob reserva 
mental. A reserva mental é uma diferença entre o que é manifestado e o que é 
realmente querido pela pessoa. Uma vez que “Declaração” é uma manifestação de 
vontade, e na reserva mental a vontade não é manifestada, em princípio, seria 
causa de ausência de declaração, o que resultaria em inexistência do negócio/ato 
em que figura. Mas, aqui, o Código não seguiu a teoria linear, tirando o foco do 
manifestante e colocando no receptor da manifestação da vontade. A reserva 
mental desconhecida da outra parte faz que exista negócio; aqui a lei tutela a boa-fé 
do receptor da manifestação. Mas, se o outro sabia da reserva mental do seu 
interlocutor, temos caso de inexistência de negócio, por falta de declaração. Não 
sabemos se essa é a melhor solução, mas é a que encontramos no Artigo 110 do 
Código Civil Brasileiro. Sabemos que a reserva mental se refere à existência por 
dois motivos: pela palavra “subsiste” presente no texto do Artigo e porque ela está 
prevista no Capítulo I do Livro III do CCB (Arts. 104 a 114), que trata justamente 
sobre o Plano de Existência dos negócios jurídicos. 
104 
 
 
Figura 27 - Reserva mental 
Forma – É a maneira pela qual a declaração é emitida; é a aparência externa da 
manifestação dos sujeitos. Os negócios podem ser informais (que podem ser 
realizados por qualquer meio lícito) ou formais, que se subdividem em forma única 
(que tem uma única forma prescrita), pilórico (que possui mais de uma forma 
possível).32 As espécies deformalidades são formalidade ad solemnitatem, quando 
a formalidade é condição de validade do negócio; e formalidade ad probationem 
tantum, quando a solenidade integra a própria substância do ato. Os negócios 
solenes são, no mínimo, lavrados por tabelião ou por oficial de registro. Os 
negócios não solenes ocorrem quando, embora formais, possam ser materializados 
por instrumento particular. 
Alguns doutrinadores se inclinam a considerar apenas três elementos. Em 
verdade é tudo uma questão de forma, de como se “arrumam” os elementos. Assim, 
pode-se dizer que o primeiro elemento é a “Declaração do Sujeito”, e a quantidade 
de elementos cai de quatro para três; assim como se pode considerar que a “forma” 
é, de fato, mera qualificação da declaração. Ou seja: na essência, são quatro 
elementos mesmo. 
 Aos elementos específicos de determinado negócio jurídico, chamamos de 
“elementos categoriais”; por exemplo, para a existência do casamento, é 
imprescindível a diversidade de sexos33. 
São os seguintes os Artigos da parte geral que tratam sobre os quatro elementos 
dos negócios jurídicos: quanto ao “agente”, temos os Artigos 104, I; 105; referente 
ao “objeto”; temos os Artigos 104, II; e 106; no que toca à “declaração”, os Artigos 
107, 110, 111, 112, 113 e 114; e, no que toca à “forma”, os Artigos 104, III; 108 e 
109. 
 
32 O contrato de empreitada tem que ser por escrito; é por isso alguns doutrinadores afirmam que 
esse contrato tem forma “genérica”. 
33 NEVES, Murilo Sechieri, apud Capez e Maltini 
105 
 
No momento do negócio, o objeto pode até nem existir; é o caso da venda de 
safra que sequer foi planada ainda, ou a compra de produção futura de fábrica. 
Sempre que alguém fizer negócio que beneficie somente ao outro, a interpretação 
desse negócio, se gerar dúvida, será contra o beneficiário. Na dúvida entre o que 
foi escrito e o que foi desejado, vale o que foi desejado (lembramos que, no caso do 
CDC, é o contrário! No confronto entre o desejado e o que está escrito, vale o que 
está escrito!). 
Se uma parte firmar negócio não o querendo, e se a outra parte sabia que a 
primeira não quis o negócio, tal ato é inexistente. A palavra usada pela lei é 
“reserva mental”. A reserva mental é um “gap” entre o que é declarado e o que é 
realmente querido pela pessoa. A reserva mental desconhecida da outra parte é 
irrelevante para o direito e faz que exista negócio, mas, se o outro sabia da reserva 
mental do seu interlocutor, temos caso de inexistência de negócio por falta de 
declaração, visto que a “declaração a que nos referimos deve ser livre”. 
E, se uma parte fizer negócio com relativamente capaz, não pode depois querer 
alegar essa incapacidade relativa do outro para eximir-se de cumprir sua parte no 
negócio. 
É importante ter cuidado com o Artigo 104 do CCB, pois, sozinho, ele indica 
DOIS planos dos negócios jurídicos. É a dicção do dispositivo: “Art. 104. A 
validade do negócio jurídico requer: I – agente capaz; II – objeto lícito, possível, 
determinado ou determinável; III – forma prescrita ou não defesa em lei”. A 
primeira palavra de cada inciso não se refere à validade, mas sim à existência! À 
primeira lida, parece que o Artigo se refere à validade. Não é verdade! 
A “validade” é o requisito presente em cada inciso a partir da segunda 
palavra de cada período! Sério! Assim, o 104 precisa ser lido: 
“A EXISTÊNCIA do negócio jurídico requer: I – AGENTE...; II – OBJETO...; III 
– FORMA...”; e, no mesmo Artigo, a outra informação se faz presente: 
“A VALIDADE do negócio jurídico requer: I – agente CAPAZ; II –
 objeto LÍCITO, POSSÍVEL, DETERMINADO OU DETERMINÁVEL; III –
 forma PRESCRITA OU NÃO DEFESA EM LEI.” Ou seja, a capacidade, a 
licitude, a possibilidade, a determinabilidade, a prescrição de forma não é questão 
de existência, mas sim de validade. Sim, é verdade que tal entendimento não é 
unanimidade, mas é dominante. 
106 
 
 
Figura 28 - Existe negócio? 
 
1.3.1.2.2 PLANO DE VALIDADE 
Uma vez que o negócio existe, perquire-se agora se ele está livre de defeitos. 
Tal análise se faz no plano da validade. 
O que é um defeito? No mundo das relações jurídicas, defeito é uma situação 
que não permite que o negócio jurídico atinja o plano de eficácia, ou seja, é uma 
mácula que se encontra no plano de validade. Para um negócio jurídico ser 
defeituoso, é porque ele existe, mas é inválido. Se um defeito não tiver conserto, 
dizemos que aquele torna o negócio NULO; e, se o defeito for passível de 
conserto, dizemos que o negócio é ANULÁVEL34. Logo nulidade e anulabilidade 
nada mais são do que graus de consequências de eventuais defeitos de um negócio. 
A Nulidade também é chamada de nulidade absoluta, que é um defeito 
insanável. Ocorre em três situações: negócio celebrado com incapaz, ato simulado 
ou qualquer ato proibido em que a lei não diga qual é a sanção; e a 
anulabilidade também é chamada de nulidade relativa. O negócio anulável ocorre 
em três casos: quando se dá negócio com relativamente capaz; quando se pratica 
negócio com um dos seis defeitos (erro, dolo, coação, perigo, lesão e fraude contra 
credores); e nos casos em que a lei expressamente indica que é anulável. 
Algumas diferenças entre os dois institutos: a nulidade é irratificável, é de 
ordem pública, é ex tunc, seu reconhecimento é de ofício e não tem prazo; a ação 
cabível é “declaratória de nulidade”; a anulabilidade é ratificável, é de ordem 
privada, tem efeito ex nunc, não é reconhecível de ofício e tem prazo para arguição; 
a ação cabível é a “de anulação” ou “anulatória”. 
 
1.3.1.2.2.1 ANULABILIDADE 
 
34 A anulabilidade é também chamada de “nulidade relativa”, ao passo que a nulidade também é 
conhecida como “nulidade absoluta”. 
107 
 
O Artigo 104 do CCB contém, simultaneamente, casos de nulidade e de 
anulabilidade (como já explicamos); rememoremos: “Art. 104. A validade do 
negócio jurídico requer: I – agente capaz; II – objeto lícito, possível, determinado 
ou determinável; III – forma prescrita ou não defesa em lei.” Decompondo o 
Artigo, temos que agente, objeto e forma são requisitos de existência; são 
requisitos de validade a capacidade do agente, a licitude, a possibilidade e a 
determinabilidade do objeto, e adequação ou não proibição da forma35. 
Ou seja: se não houver agente, o negócio é inexistente; se o agente não for 
capaz, o negócio é inválido. Se não houver objeto, o negócio é inexistente; se o 
objeto for ilícito, impossível ou indeterminável, o negócio é inválido. Se o negócio 
não contiver uma forma, é inexistente; se tal forma não for a prescrita ou for 
proibida, temos a invalidade do negócio. 
Umas rápidas palavras merece a questão da invalidade por incapacidade do 
agente: se o agente for relativamente capaz, o negócio é anulável (Art. 171, I). 
Mas, se o agente for absolutamente incapaz, o negócio é nulo (Art. 166, I). Se um 
menor dolosamente mentir sobre sua idade para convencer que é maior, não pode, 
depois, querer anular o negócio por falta de idade hábil, claro! 
São alguns casos de anulabilidade da Parte Especial do CCB: negócio 
jurídico que o representante, no seu interesse ou por conta de outrem, celebrar 
consigo mesmo. (Art.117); negócio concluído pelo representante em conflito de 
interesses com o representado, se tal fato era ou devia ser do conhecimento de 
quem com aquele tratou. (Art.119); negócio jurídico contraído com/por agente 
relativamente capaz. (Art. 171, I); venda de ascendente a descendente, salvo com 
consentimento expresso dos outros descendentes e do cônjuge do alienante. (Art. 
486); troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes, sem 
consentimento dos outros descendentes e do cônjuge do alienante. (Art. 533, II); 
casamento de quem ainda não possui a idade ou, ainda com esta, sem a autorização 
de seu representantelegal; com vício de vontade, com incapacidade de manifestar a 
vontade; realizado por procurador já havendo revogação do mandato e ainda não 
havendo coabitação entre os cônjuges; e celebrado por autoridade incompetente. 
(Art. 1.550, incisos I a VI); casamento realizado sob coação36 37. (Art. 1.558); e 
disposições de testamento inquinadas de erro, dolo ou coação38. (Art. 1.909). 
 
35 É importante sabermos que, no que tange à forma diversa da prescrita em lei, ou forma proibida, 
teremos nulidade. Art. 166, IV e VII 
36 Entendemos que tal norma é desnecessária, pois a coação já é, genericamente, um caso de 
anulabilidade. 
37 Foi o caso do casamento do Ujuara, no filme “O homem que desafiou o Diabo”. 
38 Uma vez que testamento é negócio jurídico, entendemos também que tal norma é apenas uma 
redundância, visto que tais casos de anulabilidade deste Artigo já se encontram, genericamente, na 
parte geral do CCB. 
108 
 
 
1.3.1.2.2.2 NULIDADE 
No caso da nulidade, nosso Código diz que o negócio jurídico é nulo por quatro 
motivos: 1 – Contiver simulação; 2 – Estiver enquadrado no Artigo 166 do CCB; 3 
– Estiver indicado como tal na Parte Especial do CCB; e 4 – Qualquer outra lei 
indicá-lo como nulo. 
Negócio jurídico simulado será estudado quando tratamos sobre os defeitos dos 
negócios jurídicos. 
Já os casos do Artigo 166 do CCB são os que seguem, textualmente: “I – 
celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II – for ilícito, impossível ou 
indeterminável o seu objeto; III – o motivo determinante, comum a ambas as 
partes, for ilícito; IV – não revestir a forma prescrita em lei; V – for preterida 
alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI – tiver por 
objetivo fraudar lei imperativa; VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou 
proibir-lhe a prática, sem cominar sanção”. O leitor já percebeu que o inciso V é 
uma redundância, visto que “solenidade” é, simplesmente, uma espécie de forma; 
logo o conteúdo do inciso V está inteiramente contido no inciso IV. 
Dentre os casos de nulidade expressos na Parte Especial do CCB, podemos 
indicar: contrato de compra e venda em que se deixa ao arbítrio exclusivo de uma 
das partes a fixação do preço (Art. 489); contrato para garantia de risco proveniente 
de ato doloso do segurado, do beneficiário ou de representante de um ou de outro 
(Art. 762); título ao portador emitido sem autorização de lei especial (Art. 907); 
endosso parcial em título de crédito (Parágrafo único do Artigo 912); registro civil 
de casamento religioso, quando, antes de sua realização, qualquer dos nubentes 
casou civilmente com outra pessoa (Art. 1.516); casamento contraído por doente 
mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil; ou contraído por 
pessoas sãs que infringiram algum impedimento (Art. 1.548, I e II); pacto 
antenupcial se não for feito por escritura pública (Art. 1.653); e fideicomissos além 
do segundo grau. (Art. 1.959) 
Note que a lei trata como nulidade vários casos de inexistência, reforçando a 
ideia de que o “plano de existência” é apenas doutrinário. 
 
1.3.1.2.2.2.3 DEFEITOS (OU VÍCIOS) DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS 
E quais são os defeitos dos negócios jurídicos? São vários possíveis, mas o 
nosso Código Civil tratou de sete39, em especial: erro, dolo, coação, estado de 
 
39 Em nossas aulas, costumamos comparar os vícios do negócio jurídico a um diabinho. Esse 
diabinho é chamado de Esidocopelef. Pelo processo mnemônico, encontramos os vícios dos 
negócios jurídicos no nome do capetinha, a saber: Erro, SImulação, DOlo, COação. Estado de 
PErigo, Estado de LEsão e Fraude contra credores. 
109 
 
perigo, estado de lesão, fraude contra credores e simulação. Basta lembrar do 
capetinha dos negócios jurídicos, o “Esidocopelef”. 
 
Figura 29 - ESiDoCoPeLeF 
Tais defeitos se dividem em dois grupos: 
Vícios de Consentimento – São os que decorrem de uma não conformidade 
entre o que o agente desejou e o que praticou. Aqui o agente quer uma coisa e 
pratica outra, ou pratica algo sem nada querer. São cinco os vícios de 
consentimento: erro, dolo, coação, estado de perigo e estado de lesão. 
Vícios Sociais – São aqueles em que o agente sabe muito bem o que queria e 
praticou o ato exatamente como queria, mas com a finalidade de lesar outrem, de 
trazer deliberado prejuízo a alguém. São dois os vícios sociais: fraude contra 
credores e simulação. 
Dentre os sete efeitos acima, apenas UM não possui remédio (ou seja, torna o 
negócio nulo quando surge): é a Simulação. Os outros seis defeitos tornam o 
negócio anulável quando o maculam, ou seja, ainda dá para consertar. 
Tratemos dos vícios dos negócios jurídicos um a um. 
 
1.3.1.2.2.2.3.1 ERRO 
“Erro” é a falsa percepção da realidade. Quem erra faz algo achando que está 
fazendo outra coisa. Um negócio realizado sob erro é anulável. O erro é sempre 
espontâneo, ou seja, o agente “se engana sozinho”. 
Não é qualquer erro que invalida o negócio; somente o chamado “Erro 
Substancial”. Diz-se substancial o erro que recai sobre a natureza do negócio (error 
in negotio), objeto (error in corpore rei) ou pessoa (error in persona), ou na 
interpretação do próprio negócio (error juris). 
110 
 
Erro acidental, que não anula o ato, incide sobre qualidades secundárias ou 
acessórias do objeto ou pessoa. 
Erro inescusável, ou seja, o erro bisonho, aquele que com um mínimo de 
diligência não ocorreria. Para se aferir o que seja “erro inescusável”, duas correntes 
se digladiam na doutrina: a que enuncia que o parâmetro é o homem médio e a que 
indica que o parâmetro é o caso concreto, levando-se em conta o nível de 
entendimento da pessoa que errou. Esposamos esta segunda corrente, como 
homenagem à busca da realidade real, sempre que possível. 
Erro de cálculo (quase a totalidade dos erros envolvendo números!) não 
invalida o negócio; apenas autoriza a retificação da declaração de vontade. O 
motivo não precisa ser declarado pelas partes negociantes, mas, se for declarado, 
vincula o negócio e gera um núcleo onde pode incidir o erro. Uma espécie de erro é 
a ignorância, conceituada como a ausência de percepção da realidade; é tratada da 
mesma espécie que o erro. 
 
Figura 30 - Erro 
 
1.3.1.2.2.2.3.2 DOLO 
É o engano causado/induzido por outrem. O dolo é um erro não espontâneo, ou 
seja, alguém induziu o agente ao erro, por meio de um ardil, um estratagema. Para 
que haja dolo, essa indução precisa ser consciente, ou seja, há de haver a vontade 
de enganar, por parte do indutor ao erro. 
O dolo que invalida o negócio é o dolo quando à essência do negócio, aquele 
que, se não existisse, a vítima não teria feito o negócio. Dolo periférico, que se 
restringe a um detalhe do negócio e que, mesmo se o agente soubesse, ainda assim 
faria o negócio, não o invalida. 
Para se caracterizar o dolo, obviamente se faz necessário que uma das partes 
tenha ciência da malícia (tal ciência é inerente ao próprio conceito de “dolo”!), 
senão teremos um erro bilateral, que até invalida o negócio, mas por erro, e não por 
dolo, ou seja, não fica caracterizada a má-fé. 
111 
 
Uma situação a ser aprendida é o caso do dolo de terceiro. Nesse instituto, 
temos três pessoas envolvidas: um terceiro, que é o autor do dolo, uma vítima, que 
sofre a consequência do dolo, e um beneficiário, que lucra com tal defeito. 
Se o beneficiário tinha conhecimento do dolo causado pelo terceiro, o negócio 
pode ser anulado, e a vítima ainda faz jus a perdas e danos; mas, se o beneficiário 
estava “inocente na parada”, ou seja, não sabia do dolo causado pelo terceiro, o 
negócio não se anulará (a menos que ele próprio assim o queira), mas a vítima 
receberá perdas e danos igualmente. 
Caso esse terceiro seja um representante do beneficiado com o dolo, 
igualmente temos duas soluções possíveis. Se esse terceiro era umrepresentante 
legal40, o representado só responderá até o montante em que ganhou com o dolo do 
representante; assim, se o representante enganou terceiro e, por meio de tal ardil, 
obteve mil reais de ganho, entregou apenas trezentos reais ao representado, 
significa que, caso o representado seja demandado, só arcará até o montante de 
trezentos reais. 
Mas, se o representante era convencional, o representado (beneficiado) 
responderá em solidariedade com o representante pela totalidade do dano causado à 
vítima. 
Na lei existe a figura da omissão dolosa, colocando óbice ao ditado “eu não 
minto; omito!”. Para a lei, omissão maliciosa equivale a dolo mesmo. 
O dolo a invalidar o negócio jurídico é o dolus malus, ou dolo próprio, que é o 
dolo com vontade de enganar (costumamos dizer em sala de aula que é o “dolo-
dolo” mesmo!). O dolus bonus é a enganação na qual a pessoa enganada “sabe” 
que está sendo “enganada”. Parece incrível, porém é verdade; e isso é aceito 
socialmente. Quer um exemplo? Quando foi a última vez em que você esteve 
naquela lanchonete... viu a foto daquele sanduíche suculento lá na parede (até com 
retroiluminação!), pediu o dito sanduíche e, quando olhou para ele ali na bandeja, 
ele era sem graça... meio chocho... diferente daquela foto que estava lá na parede e 
que enchia o apetite... Pois é! Você acabou de ser “vítima” do dolus bonus. Mas, 
como você sabe que aquela foto estava mesmo incrementada para atrair o 
consumo, nem liga. (e come logo o sanduíche que comprou, antes que esfrie!). 
 
40 Ao estudarmos mais adiante sobre “representação”, discorreremos sobre a diferença entre 
representante legal e convencional. 
112 
 
 
Figura 31 - Dolo 
 
Figura 32 - Dolo de terceiro 
 
1.3.1.2.2.2.3.3 COAÇÃO 
Coação é a ameaça dirigida à prática de um ato. Ato praticado sob coação é ato 
anulável, visto que quem o praticou não tinha a vontade livre no momento da 
prática. 
A coação diferencia-se do erro e do dolo, uma vez que, nestes, a diferença entre 
o ato pensado e praticado não é percebida pelo agente. Já na coação, a diferença é 
percebida; o agente sabe que não pratica o que realmente quer, mas o faz assim 
mesmo, pois está sob ameaça, ou seja, sob promessa de prática de um mal injusto, 
perpetrada por outrem (o coator), cuja consequência seja sofrida pelo agente 
(coacto). 
A coação pode ser física ou moral. A coação física, em verdade, torna o ato 
inexistente, visto que de fato foi o coator que o praticou. A verdadeira coação para 
fins de invalidade é a coação moral, ou seja, o coator não tem contato físico direto 
com o coacto, mas lhe promete um mal injusto e insuportável. 
113 
 
Além de tornar o ato anulável, a coação pode tipificar crime de 
constrangimento ilegal. 
 
Figura 33 - Coação 
1.3.1.2.2.2.3.4 ESTADO DE PERIGO 
Ocorre Estado de Perigo quando alguém se aproveita de uma desventura alheia 
para tirar vantagem. E a vítima pratica um ato para salvar-se. A diferença do 
Estado de Perigo para a ameaça é que nesta o mal é criado pelo coator, ao passo 
que, no Estado de Perigo, o agente de má-fé se beneficia de um mal já existente ou 
eminente para tirar vantagem. 
O exemplo clássico que costumamos utilizar, que, embora absurdo, é de clareza 
solar, é a situação na qual alguém de posses está se afogando, e alguém de bote se 
aproxima afirmando: “Se você assinar uma nota promissória de R$ 100.000,00 
para mim, salvo você!”; o rico se afogando fala “Eu assino qualquer coisa!”. O 
homem do bote então (não nos pergunte como) faz que o rico assine o título e 
depois o salva. Pois bem. Essa Nota Promissória foi assinada sob Estado de Perigo 
e é anulável. 
 
Figura 34 - Estado de perigo 
114 
 
 
1.3.1.2.2.2.3.5 ESTADO DE LESÃO 
No Estado de Lesão, a vítima realiza negócio ruinoso por estar em grave risco 
de dano patrimonial (não pessoal!). Também há estado de lesão quando alguém se 
aproveita da inexperiência, da ingenuidade alheia, para auferir vantagem. 
Diferencia-se da coação por não haver promessa de prática de mal. 
Diferencia-se do dolo pelo fato de o aproveitador não enganar a vítima (é até 
sincero, já que a vítima é ingênua e não vai entender mesmo ou precisa aquiescer 
com o ato). 
Diferencia-se do Estado de Perigo por não haver, obrigatoriamente, um risco 
físico de vida ou de segurança à vítima ou de alguém que lhe é próximo. 
Embora o estado de lesão leve à anulabilidade do contrato, o enunciado 149 do 
3JDC nos informa que, “em atenção ao princípio da conservação dos contratos, a 
verificação da lesão deverá conduzir, sempre que possível, à revisão judicial do 
negócio jurídico, e não à sua anulação, sendo dever do magistrado incitar os 
contratantes a seguir as regras do Art. 157, § 2.º, do Código Civil de 2002”; o 
enunciado 150 da 3JDC nos diz que “a lesão de que trata o Art. 157 do Código 
Civil não exige dolo de aproveitamento” – Ou seja, não necessariamente precisa 
haver o animus de tirar vantagem alheia, podendo a lesão ser analisada puramente 
sob a ótica da vítima. 
Muito perigoso é o enunciado 290 da 4JDC, que informa como único 
componente capaz de indicar a lesão à desproporção entre as prestações: “Art. 157. 
A lesão acarretará a anulação do negócio jurídico quando verificada, na formação 
deste, a desproporção manifesta entre as prestações assumidas pelas partes, não se 
presumindo a premente necessidade ou a inexperiência do lesado”. 
115 
 
 
Figura 35 - Estado de lesão 
 
1.3.1.2.2.2.3.6 FRAUDE CONTRA CREDORES 
Aqui ocorre um ato consciente de alguém, ou o conluio de mais de uma pessoa, 
para fraudar uma ou várias pessoas. É o exemplo do devedor que transfere seus 
bens para que seus credores nada consigam, em eventual execução. Tem um 
elemento objetivo (realização do ato) e um elemento subjetivo (dolo contra 
terceiros). 
A lei presume que exista tal fraude em algumas situações, como transmissão 
gratuita de bens (que é para ficar sem bens para satisfazer execução...), a remissão 
de dívida (que é para, não recebendo de quem lhe deve, ficar sem dinheiro para 
pagar a quem deve), a realização de contratos onerosos (até porque já está afogado 
em dívidas, então que primeiro satisfaça estas para então...), efetue pagamento 
antecipado de dívidas (porque aí estará privilegiando alguns credores, seus amigos, 
em detrimento de outros; talvez até forjando dívidas com tais amigos para ter o que 
lhe resta de dinheiro em boa guarda...). 
Existe uma ordem de créditos a serem pagos em insolvência e em falência. 
Caso o insolvente faça algum credor seu “subir” na ordem de preferência 
creditória, estará também em presunção de fraude contra credores. 
Os credores quirografários têm legitimidade para demandarem pela anulação 
do negócio, por meio de “ação revocatória”, também chamada de “ação pauliana” 
(os credores com garantia também podem manejar tal ação caso a garantia se 
mostre insuficiente); e o que for obtido de restituição patrimonial não será entregue 
ao demandante, mas sim retornará ao conjunto de bens do devedor, para ser rateado 
116 
 
entre todos os credores. Entende o enunciado 292, da 4JDC, que, “para os efeitos 
do Art. 158, § 2.º, a anterioridade do crédito é determinada pela causa que lhe dá 
origem, independentemente de seu reconhecimento por decisão judicial”. 
Explicando melhor o que é “credor quirografário”: embora haja uma extensa 
divisão de classes de credores, estes se agrupam em dois: credores COM garantia, 
credores SEM garantia. Os credores que possuem garantia as têm de forma legal ou 
contratual. 
São exemplo de credores com garantia legal: os trabalhistas e os tributários. 
Credores com garantia real ou pessoal são exemplos dos de garantia contratual. E 
aqui surge o nosso personagem: os credores quirografários; são aqueles que... não 
possuem garantia! Isso mesmo! Nada possuem para assegurar que receberão algo, a 
não ser a fé,a esperança, a confiança e, também, a sorte. São chamados 
“quirografários”, pois tudo o que existe (teoricamente) para provar juridicamente a 
dívida é algo assinado (“quiro” = mão ; “graphos” = grafia/escrita). 
Não confundir “fraude contra credores” com “fraude à execução”, pois quanto 
à natureza, a fraude contra credores é um vício de negócio jurídico, ao passo que a 
fraude à execução é ato atentatório à dignidade da Justiça. 
No que toca à necessidade de ação, a fraude contra credores depende de ação 
pauliana para ser decretada, ao passo que a fraude à execução pode ser reconhecida 
na própria ação de execução já existente. No que se refere à consequência do 
reconhecimento, a fraude contra credores leva à anulação do negócio, enquanto na 
fraude contra credores há mera ineficácia do ato perante o processo de execução. 
Por fim, quanto à má-fé do adquirente, na fraude contra credores, esta é presumida 
(consilium fraudis), enquanto, na fraude à execução, sequer precisa existir má-fé 
para que se considere um ato fraudatório à execução. 
 
Figura 36 - Fraude contra credores 
 
117 
 
1.3.1.2.2.2.3.7 SIMULAÇÃO 
Ocorre a simulação quando se encobre um ato por meio da prática de um ato 
diferente, ou quando se faz a aparência de prática de um ato em que, em verdade, 
nenhum ato houve. Costumamos utilizar o seguinte exemplo clássico. Mircléubio é 
esposo de Chifronésia. Mircléubio tem um relacionamento extraconjugal com sua 
amante Patrícia. 
Mircléubio quer dar um carro a Patrícia, mas Chifronésia, iniciada em ciências 
jurídicas, sabe que a doação à concubina pode ser anulada (Artigo 550 do Código). 
Mircléubio, então, compra um automóvel, faz uma doação para Ualdo, seu amigo, 
que o doa a Patrícia. Então, caso não se prove o ardil, Chifronésia não terá como 
anular a “doação”. No exemplo citado, houve uma simulação, porque, de fato, 
Mircléubio doou um automóvel a Patrícia, mas, no mundo jurídico, fez-se parecer 
que tal doação fora feita por Ualdo. 
Na simulação há um conluio, uma declaração bilateral; é um ajuste que 
maqueia uma situação de fato para prejudicar terceiros. “São duas pessoas com 
‘espírito de porco’ ludibriando um ‘Mané’”. 
A lei presume que existe simulação em qualquer ato que transmita direitos a 
pessoas diversas do real (como no nosso exemplo); atos que emitam declaração 
mentirosa; atos que declarem valor a menor; ou lançamento de data anterior ou 
posterior ao dia verdadeiro em documentos (antedatar ou pós-datar documento). 
A simulação em que se cria negócio fictício para se auferir vantagem chama-se 
“simulação absoluta”; e a simulação que se perpetra visando encobrir ato/negócio 
ilícito chama-se “simulação relativa” ou “dissimulação”. 
A doutrina nos traz o conceito de uma simulação que não objetiva causar danos 
a terceiros, chamada de “simulação inocente”; ocorre que, segundo o enunciado 
152 da 3JDC, “toda simulação, inclusive a inocente, é invalidante”. 
Assim, existe uma diferença entre “simulação”, em que se aparenta o que não 
existe, e “dissimulação”, onde se omite um ato verdadeiro. 
118 
 
 
Figura 37 - Simulação 
 
1.3.1.2.2.2.4 VALIDAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO 
Aprendemos que um ato defeituoso é nulo ou anulável. Um ato nulo não tem 
conserto; a qualquer momento poderá ser desfeito. O negócio anulável pode ser 
consertado, podendo ficar “purificado”. Mas como se dá tal conserto? 
Isso é possível por meio da convalidação, que pode acontecer de duas formas 
diferentes: decurso do prazo ou confirmação. Explico como cada um funciona: 
1 – Decurso do tempo – É a forma mais simples e demorada de convalidar os 
atos jurídicos. Os atos anuláveis possuem prazos para serem arguidos como tal (por 
meio de “ação de anulação” ou “anulatória”); ficando a vítima silente em tal prazo, 
aceita o ato como bom. O prazo geral para pedir desfazimento (anular) de ato 
anulável é de quatro anos (Art. 178 do CCB) para erro, dolo, coação, estado de 
perigo, de lesão e fraude contra credores; a) o prazo ditado por lei para a 
anulabilidade em questão, quando indicado; ou c) Se não for o caso “a” e não 
constar prazo especial para o caso específico, será de dois anos tal prazo. 
 
2 – Confirmação – Como nome diz, é refazer (com = encontro) e (firma – 
assinatura). É algo como “reassinar” o acordo; pode-se dar na forma expressa ou 
tácita: 
a) Na confirmação expressa, as partes simplesmente refazem o acordo, da 
mesma forma que deveriam ter feito, mas, dessa vez, sem o defeito que o atacava. 
b) Na confirmação tácita, a vítima ”perdoa”, cumprindo espontaneamente e 
de bom grado o que se obrigou, mesmo já ciente do defeito que havia. 
119 
 
E assim um ato/negócio anulável se torna válido. Não significa que está 
perfeito ainda, pois, para isso, devemos ainda aferir sua eficácia. 
 
1.3.1.2.1.3 PLANO DE EFICÁCIA 
É a aptidão para produzir efeitos. Um negócio pode existir, pode ser válido, 
mas, enquanto não satisfizer as exigências do Plano de Eficácia, nada produzirá no 
mundo concreto, no mundo dos fatos; um negócio ineficaz se mantém em estado 
latente até possuir suas existências satisfeitas. 
O plano de eficácia possui três barreiras: Condição, Termo e Encargo. 
Antes de incursionarmos no estudo do plano de eficácia, que fique claro que 
um negócio jurídico não necessariamente deve estar submetido a condição, termo 
ou encargo. Negócio em que não encontramos nenhuma dessas barreiras é 
chamado de negócio puro. Os negócios válidos puros já estão perfeitos, ou seja, já 
gozam de total proteção legal para a sua exequibilidade. 
 
Figura 38 - Eficácia dos negócios jurídicos 
 
1.3.1.2.1.3.1 CONDIÇÃO 
É a submissão de um negócio a um evento futuro e incerto. Aqui, vale o “se”. 
Exemplo: ganharei R$ 50.000,00 se acertar a combinação da Loteria Federal. Veja 
que não se sabe se eu vou acertar, mas, SE eu acertar, farei jus ao prêmio; eis um 
típico negócio condicional. A condição pode ser RESOLUTIVA ou 
SUSPENSIVA. 
Na condição resolutiva, o agente já goza de todos os efeitos desde o momento 
da origem do negócio e, caso ocorra o evento futuro, o negócio deixará de produzir 
efeitos. 
Por exemplo: alguém fornece mercadoria para uma loja enquanto a cotação do 
dólar ficar abaixo dos R$ 3,00. Veja que, caso (“SE”) a cotação do dólar 
ultrapassar os três reais, o fornecimento cessará. 
Na condição suspensiva, nenhum efeito o negócio gera no momento de sua 
origem; somente caso (“SE”) ocorra um evento é que o negócio passará a gerar 
efeitos; como exemplo, citamos o jogo de Loteria que ilustrou o início do tópico. 
http://www.dji.com.br/civil/condicao.htm
http://www.dji.com.br/civil/termo.htm
120 
 
Note que, no momento do jogo, nenhum direito de recepção de prêmio cabia ao 
jogador, mas, caso (“SE”) lograsse êxito no sorteio dos prognósticos, receberia o 
prêmio. 
O Artigo 129 é uma vacina “antipilantra”. É que existe a possibilidade de 
malícia, do tipo: pode ser que o filho de Carlos cole em todas as provas e, por isso, 
nunca tire notas abaixo de nove, o que resultará em recebimento da mesada sempre 
e sempre; ou seja, recebeu maliciosamente a mesada. Ou pode ser que José receba 
o prêmio da Loteria, tendo viciado a roleta do sorteio das dezenas. Para isso existe 
o Artigo 129, que é a “cura”. Diz tal Artigo: “Art. 129. Reputa-se verificada, 
quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo implemento for maliciosamente 
obstado pela parte a quem desfavorecer, considerando-se, ao contrário, não 
verificada a condição maliciosamente levada a efeito por aquele a quem 
aproveita o seu implemento.” Ou seja: se o filho de Carlos tirou notas altas 
colando, e Carlos tiver como provar isso, pode parar de pagar a mesada prometida, 
pois a condição resolutiva foi obstada com malícia, isto é, não seguiu a ordem 
natural das coisas; e, se José fraudou a roleta da Caixa Econômica para ganhar o 
prêmio, e a Caixa tiver com provar isso, não está obrigada a lhe entregaro prêmio; 
simples assim! 
A lei proíbe condição puramente potestativa, impossível, ilícita, 
incompreensível ou contraditória. Condição puramente potestativa é aquela cujo 
evento futuro e incerto depende unicamente da vontade de uma das partes (a 
simplesmente potestativa, que é aquela não totalmente dependente da vontade de 
uma das partes, pode!). 
Condição ilícita é aquela cujo evento se dá contra a lei, ou a moral, ou os bons 
costumes: “Entrego esse imóvel a você, se você se casar com o meu filho”. 
Condição incompreensível é aquela ininteligível; imagine algo como “Esse 
automóvel será seu quando uma peça equinocial transpassar a fronteira do que é 
possível se chamar, no mundo dos chicletes, de cosmicamente irrelevante”; O leitor 
entendeu? Nem nós. Condição contraditória é aquela que anula sua própria 
utilidade: “Doo uma casa para você morar, mas você não pode entrar nela, Ok?”. 
A parte a quem favoreça a ocorrência da condição já pode, desde o negócio 
jurídico, exercer atos de conservação sobre o bem ou o direito objeto do negócio 
que, no futuro, será, ou provavelmente será, seu. 
 
1.3.1.2.1.3.2 TERMO 
É a submissão de um negócio a um evento futuro e certo, ou seja, não se 
discute se o evento ocorrerá ou não; já se sabe que sim; a questão é QUANDO 
ocorrerá. O termo pode ser INICIAL e FINAL. Termo inicial é o momento em 
que o negócio começa a produzir efeitos; por exemplo: cláusula testamentária 
enunciando que, quando o herdeiro completar 22 anos, receberá tal bem. 
121 
 
Termo final é o momento em que o negócio jurídico deixa de produzir efeitos. 
Como exemplo corriqueiro, temos a obrigatoriedade de pagamento de pensão 
alimentícia do pai para os filhos até, em tese, o fim do curso universitário destes. O 
termo inicial é chamado também de “termo suspensivo” ou dies a quo; e o termo 
final também é chamado de “termo extintivo” ou dies ad quem. O lapso de tempo 
que medeia um termo inicial e um termo final chama-se prazo. 
Na contagem dos prazos, exclui-se o dia do início e inclui-se o dia final; caso o 
início ou o fim recaiam em feriado ou dia não útil, deverá ser o efeito de tal dia 
prorrogado para o primeiro dia útil seguinte. “Meado” é o dia 15 do mês. Prazos 
em horas são contados minuto a minuto; exemplo: caso o oficial de justiça cite, às 
nove horas da manhã, um executado para pagar ou nomear bem à penhora no prazo 
de 24 horas, o prazo expirará às nove horas da manhã do dia seguinte. 
Os prazos em meses ou anos terminam no mesmo “número do dia” em que 
começaram; por exemplo: um prazo de 3 meses a partir do dia 20 de abril 
terminará em 20 de julho, não importando o número de dias que medeiam tais dias, 
não necessitando ser, necessariamente, 90 dias. 
Detalhe: pelo Artigo 135 do CCB, o “Artigo antipilantra” (aquele 129 do 
CCB), também pode ser aplicado em caso de termo suspensivo (inicial) ou 
resolutivo (final), também. 
 
Figura 39 - Termo inicial e final 
 
1.3.1.2.1.3.3 ENCARGO (ou MODO) 
O encargo (ou modo) é uma maneira obrigatória pela qual o negócio deve ser 
praticado para que surta efeitos. É uma obrigação atrelada ao objeto do negócio, 
cuja eficácia deste depende do cumprimento dessa obrigação. O encargo 
122 
 
impossível ou ilícito é tido como não escrito (exemplo de encargo imoral: Dar-lhe-
ei este carro desde que você namore o meu filho e se case com ele”. Exemplo de 
encargo ilícito: Dar-lhe-ei este automóvel, mas quero que você o utilize sempre que 
quisermos praticar assaltos”). 
 
1.3.1.2.1.3.4 CASOS LEGAIS DE INEFICÁCIA 
Existem alguns casos de ineficácia expressos no Código e em leis esparsas, por 
exemplo: há ineficácia nos documentos redigidos em língua estrangeira enquanto 
não traduzidos para o português (Art.224); na quitação dada nos títulos de crédito 
(que é a entrega deste ao devedor) se o credor provar, em 60 dias, que em verdade 
não houve pagamento (Art. 324, Parágrafo único); na quitação de obrigação 
resultante de dação em pagamento, se o credor for evicto da coisa recebida (Art. 
359); na promessa unilateral de contrato, se o credor não manifestar-se no prazo 
esperado (Art.466); na resilição, em que, no contrato, tenha havido investimentos 
consideráveis para a sua execução, e não tenha ainda transcorrido prazo compatível 
com a natureza e vulto de tais investimentos (Art.473); na compra e venda de coisa 
futura de forma que, sem ser contrato aleatório, a coisa não veio a existir (Art.483); 
na compra e venda cujo preço fora colocado ao arbítrio de terceiro, se esse terceiro 
negar-se a fixá-lo e se os contratantes não acordarem em indicar outra pessoa para 
determinar o preço (Art.485); nos atos praticados por quem não tenha mandato ou 
o tenha com poderes insuficientes; se a pessoa em cujo nome tais atos foram 
praticados não o ratificar (Art.682); na imposição de condição ou termo imposto 
para o reconhecimento de filho (Art.1.613); no pacto antenupcial, se não lhe seguir 
o casamento (Art. 1.653); e no legado de coisa certa de forma que, no momento da 
abertura da sucessão, a coisa não pertença ao testador (1.912). 
 
Figura 40 - Fluxograma - Existência, validade e eficácia 
 
123 
 
1.3.1.3 ATOS ILÍCITOS 
São atos contrários ao ordenamento jurídico, causando dano (prejuízo 
econômico, ou que viole boa-fé, ou os bons costumes) a outrem. Pode-se dar até 
pelo excesso de uso de direito. Estudaremos mais detalhadamente o ato ilícito ao 
tratarmos de Responsabilidade Civil, que é sua principal, mas não única 
consequência, visto que um ato ilícito pode gerar como resposta: reparação do 
dano, mudança de estado civil, anulação do ato e até prisão civil, no caso de 
inadimplemento injustificado de dívida alimentícia. 
 
1.3.2 O TEMPO COMO FATO JURÍDICO 
O tempo é um fato jurídico natural. A passagem do tempo traz consequência 
para tudo e todos e, inclusive, para o direito. Dentre os fenômenos causados pelo 
tempo, temos o advento do termo, da prescrição e da decadência. Conceituamos 
tempo como “a sucessão contínua dos fatos”. O tempo já foi tratado por nós 
quando estudamos sobre o plano de eficácia dos negócios jurídicos. Tratemos 
agora sobre a prescrição e a decadência. 
1.3.2.1 PRESCRIÇÃO 
Ninguém pode estar eternamente submetido a outrem. 
Sempre que temos uma relação jurídica, temos uma relação em que, caso 
qualquer dos sujeitos envolvidos não cumpra o combinado, o Estado, por meio do 
Poder Judiciário, conserta a situação, restabelecendo a justiça da relação ofendida. 
O professor J.L. Franco Júnior nos diz41 que “a proteção judiciária é um dos mais 
importantes alicerces do Estado Democrático, à medida que salvaguarda os demais 
direitos dos cidadãos contra atos atentatórios”. Ocorre que, quando há ofensa a um 
bem jurídico, o Estado não pode ficar, também, eternamente à disposição do 
ofendido para que este o chame a resolver o conflito. Ao lapso de tempo que o 
sujeito dispõe para chamar o Estado a resolver, por meio da Justiça, o conflito 
nascido chamamos de prescrição. 
Uma vez perpetrada a ofensa, surge para a “vítima” uma pretensão, que é o 
poder de exigir que o Estado “tome suas dores” e, por meio de um comando 
judicial, lhe traga o remédio para a ofensa. O término dessa pretensão chama-se 
prescrição. Portanto prescrição é o fim da duração da pretensão. 
Usamos aqui as palavras do professor e Doutor em Direito Aldemiro Dantas, 
que nos ensina42: “Assim, suponha-se que A deva pagar certa quantia a B, tendo 
sido acertado entre ambos que o pagamento seria feito no dia 31 de janeiro. Nesse 
 
41 Franco Júnior. J L. A condição da ação. Ed. do autor. Manaus, 2005, p.38 
42 Dantas Jr., Aldemiro. Noções básicas de Direito e Processo do Trabalho. Ed. Sênior. Manaus, 
2007, p. 17 
124 
 
caso, enquanto não se escoar o dia 31 de janeiro, o direito de B (quanto ao 
recebimento da prestação devida por A) ainda não terá sido violado, e por isso nãose poderá falar em surgimento da pretensão, assim como não terá começado a fluir 
o lapso prescricional”. 
Assim é a dicção do Artigo 189: “Violado o direito, nasce para o titular a 
pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os Arts. 205 
e 206”. 
Cuidado com o vocábulo “nasce” escrito no Artigo! A 1JDC deu uma 
interpretação interessante ao termo, ao afirmar que (enunciado 14): “1) o início do 
prazo prescricional ocorre com o surgimento da pretensão, que decorre da 
exigibilidade do direito subjetivo; 2) o Art. 189 diz respeito a casos em que a 
pretensão nasce imediatamente após a violação do direito absoluto ou da obrigação 
de não fazer”. 
A prescrição não é determinada pelas partes; está sempre expressa em lei. 
Sempre que nenhum dispositivo indicar a prescrição para algo específico, entenda-
se que é de 10 (dez) anos (por força do Artigo 205 do CCB). 
O Artigo 206 do Código Civil traz algumas prescrições. Assim como os 
demais prazos existentes no Código, o apêndice desta obra traz o tempo de 
prescrição presente no codex. No caso das obrigações, a prescrição não as extingue; 
apenas as transforma em obrigações naturais, como veremos no estudo de Direito 
das Obrigações. 
A prescrição contém dois requisitos: transcurso do tempo e inércia do titular. A 
prescrição deve ser conhecida de ofício43 pelo Juiz, ainda que a parte interessada 
não a alegue. É o que nos diz o parágrafo quinto do Artigo 219 do CPC: “O juiz 
pronunciará, de ofício, a prescrição”. Tal reconhecimento automático é novo, já 
que, até 2006, estava em vigor o Artigo 194 do CCB44, que foi revogado pela Lei 
11.280/06. 
Pode haver renúncia à prescrição, ou seja, é dado à parte “permitir” à outra que 
lhe demande em juízo ainda que a destempo, mas só pode renunciar APÓS o 
decurso de prazo da prescrição. Caso uma pretensão possa ser utilizada não para 
atacar, mas sim para se defender em juízo, o prazo para o manejo de tal interesse é 
o mesmo destinado à prescrição para tal. 
Existem algumas pretensões que JAMAIS prescrevem; são as pretensões 
atinentes aos Direitos da personalidade, ao Estado civil das pessoas, à investigação 
de paternidade, à interdição e à arguição de nulidades absolutas. 
 
43 Diz-se "de ofício" a atividade do juiz que independe de pedido para ser exercitada. 
44 Dizia o Artigo revogado: “O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se 
favorecer a absolutamente incapaz”. 
 
125 
 
Um detalhe: pretensões imprescritíveis também são irrenunciáveis, já que 
qualquer renúncia só pode ocorre após a prescrição; por dois motivos: um teórico e 
um prático. O motivo teórico é que tais pretensões são de ordem pública, agem em 
favor de toda a sociedade, e não apenas do interessado imediato; e o motivo prático 
é que só é dado renunciar prescrição após o decurso desta; se a pretensão NUNCA 
prescreve... (entendeu, né?!). 
Atenção! Tudo o que tratamos aqui se refere à prescrição mais comum (e para 
alguns a única existente!), chamada Prescrição Extintiva. Isso porque se 
consagrou pelo uso dizer-se que o usucapião é uma “Prescrição Aquisitiva”. 
Estudaremos essa “segunda espécie” de prescrição ao tratarmos de usucapião, em 
Direitos Reais. 
 
Figura 41 - Prescrição 
 
1.3.2.1.2 MODIFICAÇÃO DE CONTAGEM DO PRAZO 
Quando a lei expressa “cinco anos”, não significa necessariamente que, no 
calendário, aquilo corresponda a cinco anos mesmo, podendo até durar uma 
geração inteira no mundo real; e, na lei, continuará sendo “cinco anos”. Isso ocorre 
porque uma coisa é o prazo; outra coisa é a contagem do prazo. Explicando: 
embora o tempo não pare de fluir, a contagem do tempo, para o direito, é passível 
de modificações, chamadas de suspensão, interrupção e impedimento. 
A contagem é chamada de linear quando segue o calendário: um ano da 
contagem corresponde a um ano civil. O maior exemplo de contagem linear é a 
idade; se tenho trinta anos de idade, tenho 30 anos vividos segundo a contagem 
civil dos dias. 
A contagem não linear ocorre quando o tempo e o modo da contagem não 
seguem o calendário. É uma contagem que não ocorre, portanto, segundo as leis da 
física, mas segundo as leis do direito. É o caso do prazo prescricional, que pode 
sofrer modificações (suspensão, interrupção e impedimento). 
126 
 
 
1.3.2.1.2.1 SUSPENSÃO 
Suspensão é o fenômeno mediante o qual, durante determinado tempo, a 
contagem do prazo prescricional seja “congelada”; assim, ao término da suspensão, 
a contagem volta a correr, pelo tempo que lhe resta, ou seja, a partir do exato 
tempo em que deixou de ser contado antes de a suspensão ocorrer. 
Imaginemos um prazo prescricional de dez anos. Se no quinto ano sobreveio 
uma causa suspensiva que dure outros dez anos, nesse tempo não haverá contagem 
daquele prazo prescricional. Ao fim desse congelamento, ou seja, ao fim da 
suspensão, volta-se a contar o prazo prescricional, pelos cinco anos restantes (não 
estava no quinto ano quando foi suspenso, ou seja, “congelado”?). 
As causas suspensivas de prescrição estão escritas nos Artigos 197, 198 e 199 
do Código. 
Aliás, o leitor já notou a “viagem” interessante dos Artigos 197 a 199? Leia o 
“caput” deles e responda: não bem poderiam ser um artigo só? Fica a impressão 
tosca de que alguém estava digitando o 197 enquanto alguém ditava. Assim que 
passou para o próximo artigo, depois de numerá-lo (em 1969, não havia MS-Word 
ainda...), o que estava aditando disse: “Peraí! Há mais uns casos aqui!”; e o 
datilógrafo mandou: “Ah! Agora já passei para o próximo! Mas vou incluir nesse 
novo Artigo 197”; e aí incluiu os outros casos. Assim que terminou de datilografar 
o Artigo 197, ouviu: “Ih! Esqueci mais esses aqui!”; o datilógrafo (estressado): 
“Ah! Já fechei o Artigo! Vou colocar nesse próximo Artigo 198. Manda aí! 
É óbvio que essa história é uma ficção; a viagem foi nossa (?). Mas que ficou 
estranha a redação do código nessa questão, ficou! 
Mas, voltando ao que interessa, a prescrição fica suspensa entre os cônjuges, 
enquanto durar a sociedade conjugal45; entre ascendente e descendente, enquanto 
houver poder familiar46; entre tutores/curadores e tutelados/curatelados; contra 
incapazes ; contra os ausentes do País em serviço público; entre os que estiverem 
servindo nas forças armadas, durante guerra; enquanto houver pendência de 
condição suspensiva; enquanto não se vencer o prazo; e enquanto estiver pendente 
ação de evicção47. 
Diz o enunciado 156 da 3JDC que a prescrição é congelada desde a sentença de 
ausência; entendemos que esta deve ser suspensa desde o desaparecimento, até para 
 
45 Em muito boa hora veio o Enunciado 296 da 4JDC para nos informar que “Não corre a prescrição 
entre os companheiros, na constância da união estável”. 
46 E se houver adoção? Continua suspensa a prescrição em relação aos pais biológicos? 
Entendemos que sim. As causas penais de suspensão do poder familiar trazem efeitos civis? 
Entendemos, igualmente, que sim. 
47 Evicção é perda judicial da coisa, que fora tomada por outrem que tinha direito sobre ela. 
Trataremos disso no estudo do contrato de compra e venda. 
127 
 
dar máxima efetividade à vontade do legislador; e o Enunciado 296 da 4JDC dá 
uma interpretação extensiva à causa de suspensão: "Não corre a prescrição entre os 
companheiros, na constância da união estável." 
 
 
1.3.2.1.2.2 INTERRUPÇÃO 
A interrupção representa um corte na contagem do prazo prescricional fazendo 
que o tempo da prescrição seja “zerado”, ou seja, passe a ser contado novamente, 
de seu início. A interrupção da prescrição só pode ocorrer uma única vez. Já 
pensou o inferno que seria para a parte contrária se pudesse a prescrição ser 
interrompida diversas vezes? Esta jamais se daria então, na prática, não é? 
Interrompe prazo prescricional o despacho de citação,ainda que emanado de 
juiz incompetente: o protesto; a apresentação de título em inventário ou concurso 
de credores (leia-se insolvência, execução coletiva e falência); ato judicial de 
constituição em mora48 ou qualquer ato do devedor reconhecendo direito do credor, 
que até tal momento não o foi. 
 
1.3.2.1.2.3 IMPEDIMENTO 
Se uma violação ocorrer na constância de causa de suspensão, haverá 
impedimento. 
Imaginemos que, durante uma situação em que haja suspensão de prescrição, 
ocorra uma violação de direito: o esposo contrai uma dívida para com a esposa. 
Nesse caso, a violação do direito (não pagamento da dívida) ocorreu já dentro de 
uma circunstância ditada em lei como causa suspensiva (constância da união 
matrimonial). 
Começará o prazo de pretensão a correr? Não! 
Como tal violação “já nasce suspensa”, diz-se que está “impedida”. 
Assim, sempre que ocorrer uma violação “no início do prazo”, este, em 
verdade, sequer começará a correr, daí a suspensão ou a interrupção, quando ocorre 
no início do prazo, ser chamada não de suspensão, mas sim de IMPEDIMENTO. 
 
1.3.2.2 DECADÊNCIA 
Para entendermos o que vem a ser uma decadência, precisamos fincar o 
entendimento de "Direito Potestativo". Dois tipos de poder existem: o de fato e o 
de direito. 
Para os romanos o poder de fato era chamado de potentia; e o poder de direito 
era chamado de potestas. 
Qual é a diferença? Já explico exemplificando: 
 
48 Estudaremos a finalidade de constituição em mora ao estudarmos Direito das Obrigações 
128 
 
Se você paga um tributo, abre mão de parte do seu patrimônio em cumprimento 
a uma ordem (lei) de um ente superior (Estado), faz algo contra sua vontade em 
atendimento a uma determinação; como o veículo de tal mandamento é a lei, 
dizemos que o Estado possui um poder de direito, uma força coativa que deriva 
do ordenamento jurídico. 
Agora, imagine que alguém é assaltado e, sob a mira de um revólver, entrega 
seu patrimônio a um meliante. Há alguma lei que determine a essa vítima que 
entregue algo ao assaltante? Não! Logo não há ali uma relação de poder de direito. 
Mas, ainda assim, a vítima irá entregar a carteira e o relógio ao assaltante. Por quê? 
Porque este tem poder de fato sobre a vítima. 
Assim, o significado de “direito potestativo” é a possibilidade de interferir na 
esfera jurídica de outro indivíduo, sem experimentar resistência; ou, como digo em 
sala, é poder de, sozinho, modificar ou extinguir uma relação jurídica, cabendo ao 
outro, simplesmente, aceitar a decisão. 
O exemplo clássico é o direito de divórcio: basta um querer para que um casal 
se divorcie (para haver casamento, precisou das duas vontades – não havia direito 
potestativo –, mas, para finalizar o casamento, basta UMA vontade – isso é 
exemplo de direito potestativo). 
Existem direitos potestativos com prazo e sem prazo. Em havendo prazo, o fim 
deste é chamado de “decadência”. 
A decadência, ao contrário da prescrição, tanto pode estar expressa em lei 
quanto pode ser convencionada pelas partes (lembra aquele prazo de garantia49 do 
seu carro ou da sua TV? É prazo decadencial; e é um exemplo de decadência 
nascida da vontade dos contratantes); são chamadas respectivamente de legal e 
convencional (esta última é também chamada de contratual, voluntária ou 
negocial). 
A decadência legal é reconhecível de ofício pelo juiz, ao passo que a 
decadência convencional nunca o é; caso não seja alegada pela parte a quem 
aproveita, ocorrerá a preclusão, que é a perda de oportunidade de exercício de um 
ato dentro do processo judicial. Decadência pode ser alegada em qualquer grau 
ordinário de jurisdição. Grau ordinário é aquele em que não se exige pré-
questionamento para sua análise. Lembramos que a decadência convencional pode 
ser renunciada. 
 
1.3.2.2.1 CAUSAS IMPEDITIVAS E SUSPENSIVAS 
A regra básica e clássica é que a decadência não se interrompe nem se 
suspende, exceto se a lei expressamente indicar algum caso. Até a concepção deste 
livro, existem dois casos nos quais a decadência pode ser suspensa: a decadência 
 
49 Referimo-nos aqui à garantia contratual de fábrica ou cominada com a loja 
129 
 
que corre contra o consumidor, no âmbito das relações de consumo, por 
reclamação deste ao fornecedor, e a decadência tributária, por ato da autoridade 
fazendária em face do contribuinte. Futuramente podem existir outros casos, visto 
que o Código escancarou as portas para tal. 
Quanto às causas impeditivas, vale aqui o que escrevemos sobre o 
impedimento da contagem do prazo prescricional; nada mais é do que uma 
suspensão que ocorre no momento zero do prazo decadencial. 
Os prazos de decadência legal estão espalhados pelo Código (principalmente na 
Parte Especial deste, onde inclusive, prepondera!), ocorrendo um sem-número de 
casos. 
 
1.3.2.3 DIREITO INTERTEMPORAL 
Como se conta o prazo que se encontra fluindo na mudança do antigo para o 
atual Código? 
Tomemos como exemplo a prescrição da responsabilidade civil, que no Código 
antigo era de 20 anos, e o Novo Código o reduziu para três anos. 
Imagine que um dano foi causado em 20 de maio de 1991; pela contagem do 
Código antigo, a prescrição dessa pretensão se dará em 20 de maio de 2011. 
A regra funciona assim: se já passou da metade, vale a lei velha; se ainda não 
chegou à metade, vale a lei nova (Artigo 2.028 do Código). Nesse caso, toma-se 
como marco regulatório o dia 11 de janeiro de 2003, pois foi nessa data que entrou 
em vigor o novo Código. Se nessa data já haviam transcorrido mais de dez anos do 
fato danoso, segue-se a contagem da prescrição do Código antigo, a saber, 20 anos. 
Se em 11/1/2003 ainda não haviam decorrido dez anos do dano, valerá o prazo do 
novo Código. 
Mas poderia surgir uma questão: caso o dano se tenha dado em 2 de abril de 
1993; nota-se que em 11/1/2003 não se passaram ainda dez anos, ou seja, passa a 
valer o novo prazo, que é de três anos. Mas... nesse caso, a prescrição encerra-se de 
imediato, ou pior, retroagiu para 2 de abril de 1996? É claro que não! A 
intocabilidade dos atos jurídicos perfeitos bem como o próprio bom senso nos 
informam que o novo prazo terá sua contagem iniciada A PARTIR da vigência do 
novo Código, ou seja, a prescrição da pretensão do fato citado será em 11 de 
janeiro de 2006! 
Todos os novos fatos danosos ocorridos de zero hora de 11 de janeiro de 2003 
adiante terão como prescrição os três anos da nova lei. 
 
1.3.3 PROVAS DOS FATOS JURÍDICOS 
“Prova” é, basicamente, a demonstração da ocorrência de um fato. 
130 
 
No que tange à prova judicial, já se disse que “a força da decisão do juiz está 
nas provas que a sustentam, pois sua convicção é embasada no conhecimento dos 
fatos, confirmados pelas provas trazidas aos autos”.50 
Em sendo uma ação judicial resultado de um conflito de interesses, visando 
resolvê-lo, jamais seria possível seu correto julgamento caso não existissem 
elementos que comprovassem as alegações das partes. 
O juiz conhece o direito, mas não conhece os fatos. 
Logo cabe às partes demonstrar ao magistrado a existência desses fatos, pois o 
correto julgamento não só se estriba no direito, mas também, principalmente, na 
aplicação desse direito ao caso concreto; entendendo o caso concreto como uma 
sucessão de fatos a serem objetos da aplicação da justiça, há de haver elementos 
que bastem para demonstrar a veracidade de tais fatos ao juízo. 
É nesse contexto probatório que as provas atendem a tão nobre finalidade. São 
elas que trazem até o juízo os fatos que ocorram em tempo e lugar diverso. O 
presente livro pretende tecer breves comentários sobre temas atinentes às provas no 
Direito Civil, com algumas críticas a eles pertinentes. 
 
1.3.3.1 INTRODUÇÃO 
O “calcanhar de Aquiles” de toda demanda em juízo é, quase sempre, a prova. 
Provar é fazer nascer em alguéma certeza sobre a existência de um fato. Logo 
só se prova um fato, e somente um fato positivo. 
A prova do fato negativo é muito controvertida na doutrina, havendo desde que 
os que afirmam que não pode existir prova de fato negativo até os que a admitem 
plenamente. O fato é que ninguém pode afirmar que Maria não esteve na sala; o 
máximo que conseguem afirmar é que não viram Maria na sala, mas não que ela 
não esteve lá. 
A prova positiva de algo que torna impossível a ocorrência de outro chama-se 
“álibi”; assim, se Maria provar que no momento em questão estava em outro local 
(agora sim, um fato positivo), ficará certo que ela não esteve no local em tela, pela 
impossibilidade da onipresença. 
A prova pode ser extrajudicial ou judicial, a depender de sua origem; a prova 
judicial é infinitamente mais robusta pelo fato de ser produzida sob o crivo do 
contraditório. 
Não é difícil encontrarmos, até no mundo profano, o brocardo “A prova cabe a 
quem alega”. E é isso mesmo! 
Na esfera penal, é o Estado ou o querelante que possuem a incumbência de 
comprovar a tipicidade, a antijuridicidade e a culpabilidade do réu, mas, no cível, 
 
50 SOUZA, Lourival de Jesus Serejo – Artigo "As provas ilícitas e as questões de direito de família", 
in Revista Brasileira de Direito de Família 
131 
 
cada parte precisa provar o que alegar; não somente o autor da ação, mas também o 
réu. 
Aliás, melhor andaríamos se disséssemos que deve provar aquele a quem a 
prova interessa, visto que o Artigo 333 do CPC é bem claro quanto a isso quando 
diz: “O ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; 
ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito 
do autor”. 
Os fatos jurídicos ocorridos no estrangeiro devem ser provados segundo as leis 
admitidas nesse país, exceto quanto às provas proibidas no Brasil; é o que nos diz o 
Artigo 13 da LIND. 
As ferramentas pelas quais se convence algo se chamam Meio de Prova. 
Os meios de prova são disciplinados por vários diplomas legais, devendo ser 
estudados em conjunto, visto que a legislação civil muito ajuda a esfera penal, e 
vice-versa, no que tange às provas. 
 
1.3.3.2 MEIOS DE PROVA 
Ao estudarmos os meios de prova em juízo, costumamos invocar a ideia de um 
sapo. Esse sapinho tem um nome: “Codoteprepe”, que é o barulho do coaxar do 
sapo, provando para a rã que quer namorá-la. O nome do sapinho advém do 
barulho do coaxar do sapo: codoteprepe... codoteprepe... codoteprepe... 
É o nome do sapinho que nos informa os meios de prova constantes no Código: 
COnfissão, DOcumento, TEstemunha, PREsunção e PErícia. 
 
Figura 42 - CoDoTePrePe 
 
1.3.3.2.1 CONFISSÃO 
A confissão é a rainha das provas, na esfera cível. 
132 
 
Ainda que respeitadas vozes bradem o contrário, no cível vige a verdade formal 
mesmo, ou seja, aquela circunscrita aos autos, a verdade do papel; isso porque 
estamos no ramo do direito privado, em que se discutem obrigações e patrimônios; 
a discussão no mais das vezes é econômica. Daí por que basta a confissão para 
estar plenamente provado algo. 
Confissão é a admissão de um fato desfavorável ao confitente e favorável à 
parte adversária. É o reconhecimento de um fato que desfavorece quem o faz. 
A confissão pode ser judicial ou extrajudicial, a depender do ambiente em que 
é realizada: dentro ou fora de uma demanda, perante autoridade judicial 
competente. 
Assim, confissão realizada fora do fórum, mas em uma inspeção judicial, é 
uma confissão judicial; e confissão realizada em juízo, perante juiz, mas que não 
está em audiência (imagine uma confissão para o juiz no restaurante do fórum...), 
não é confissão judicial, visto que não estavam discutindo a demanda; nem a 
autoridade estava competente para tomar a confissão. Qualquer autuação de tal 
“confissão”, em verdade, equivale a uma prova testemunhal do juiz, que deve 
afastar-se do julgamento, passando os autos ao substituto legal e, aí sim, 
testemunhar sobre a “confissão” de que teve notícia. 
Pode ser expressa, tácita ou presumida. A confissão expressa é dessumida de 
declaração do confitente, seja de que forma for: verbal, gestual, por escrito etc. 
A confissão tácita é aquela decorrente do silêncio do confitente após lhe ser 
oportunizado prazo para declaração diversa. 
A confissão presumida ocorre quando o confitente, embora não emita 
declaração alguma, age como se houvesse confessado. É chamada também de 
confissão ficta; e é um dos efeitos da revelia. 
Confissão pode ser realizada pela própria parte, ou por mandatário com poderes 
especiais (cláusula et extra no instrumento do mandato). 
Só podem ser objetos de confissão fatos atinentes a bens disponíveis, visto que 
valores indisponíveis são insuscetíveis de confissão. Igualmente só pode confessar 
aquele que deve suportar as consequências da confissão, ou seja, aquele que pode 
dispor de seu patrimônio. Pessoas casadas não podem confessar sobre 
questões envolvendo imóveis, sem a confissão de seu cônjuge, ou seja, confessar 
podem, mas tal não terá efeito, justamente por essa “confessando” sobre algo que 
não apenas lhe pertence. É bem verdade que confissão sobre imóveis excluídos da 
massa comum ser válida, pelo fato de ser o confitente o único a dispor de tais bens. 
Quem confessa não pode “desconfessar”, voltar atrás, ou, tecnicamente, 
revogar a confissão, mas, como fato jurídico que é, a confissão pode ser anulada se 
foi fruto de um erro de fato, ou seja, se adveio de impressão errada sobre uma 
situação fática, ou coação, ou seja, se foi obtida sob ameaça. A confissão é 
indivisível; assim, não pode a parte contrária alegar em seu favor apenas “meia-
133 
 
confissão” do outro, ou seja, acatar a parte que o beneficia e rechaçar a parte que 
lhe traria algum prejuízo. Ou acata por inteiro, ou não a acata. 
 
1.3.3.2.2 DOCUMENTO 
Documento é uma peça física que condensa o pensamento de alguém ou 
comprova a existência de um fato. 
O documento pode ser público ou particular. Documento público é aquele 
produzido por um agente público no exercício da função pública; à exceção deste, 
todos os outros são documentos particulares. 
Documentos particulares provam a autenticidade da declaração do signatário; 
são aptos a gerar obrigações para este; mas a cessão dessa obrigação só gera efeitos 
perante terceiros após o registro do documento de cessão. Documentos particulares 
têm o seu conteúdo provado por quaisquer outras provas legais, na ausência do 
documento. 
Escritura pública é documento público lavrado por tabelião, que é um agente 
do Estado. Daí o teor das escrituras públicas serem declarações emanadas do 
próprio Estado, e por isso gozam de fé pública. 
As escrituras públicas são lavradas de acordo com o Artigo 215 do Código e 
com a Lei 7.433, de 18/12/85. São escritas pelo tabelião, que deve estar na 
presença das pessoas interessadas no ato, ou seus procuradores. O tabelião deve 
certificar-se da identidade dos participantes do ato, podendo usar inclusive 
testemunhas para tal; deve ouvir a declaração dos interessados (que pode ser em 
língua estrangeira, se o tabelião conhecer o idioma, ou por meio de tradutor) e fazer 
constar na escritura o cumprimento de qualquer exigência fiscal que o interesse 
demandar. 
As pessoas, em documentos particulares ou públicos, devem ser qualificadas de 
acordo com o Artigo 215, inciso III51, a saber: nome, nacionalidade, estado civil, 
profissão, domicílio, residência e, se casada, a pessoa qualificanda, o regime de 
bens do casamento, podendo constar ainda o nome do cônjuge do qualificando e a 
filiação, se interessar ao ato. 
Fotografias, filmes, gravações magnéticas e eletrônicas de áudio e vídeo são 
aptos a comprovarem fatos desde que não haja impugnação da parte interessada 
contrária. Se houver impugnação, far-se-á necessária a prova pericialpara dirimir a 
questão. 
Documentos em língua estrangeira devem ser traduzidos para o português 
brasileiro para gerar efeitos legais. A lei não especificou sobre a necessidade de 
tradução simples ou juramentada. Para o caso de julgamentos cíveis, entendemos 
 
51 Embora tal dispositivo se refira à qualificação dos participantes do ato de escritura pública, é 
cabível também para os documentos particulares. 
134 
 
até que a tradução pode ser dispensada se o juiz conhecer o idioma do documento, 
mas nossa posição é minoritária. A corrente majoritária enuncia que, devido à 
publicidade do processo, deve qualquer documento apresentado estar em língua 
portuguesa, ainda que o juiz conheça o idioma original deste. Entendemos ser 
obrigatória a tradução juramentada para efeitos de Registros Públicos, sobre os 
quais a própria lei é expressa. 
As provas fotográficas, fonográficas e cinematográficas, sejam óticas, sejam 
eletrônicas, só provam se a parte contrária não as impugnar. Em havendo 
impugnação, far-se-á perícia no documento apresentado para dirimir a dúvida. 
A lei processual admite que qualquer pessoa se recuse a apresentar documentos 
para provar algo se forem íntimos e estritamente particulares, quando a 
apresentação deles trouxer qualquer desonra a alguém, ou lhe cause perigo de, 
contra si, ser proposta alguma ação penal. 
A parte pode também se recusar a apresentar documentos caso estes divulguem 
fatos em relação aos quais deva guardar segredo, por dever pessoal ou profissional, 
bem como por qualquer motivo grave que o juiz entenda justificável. 
Caso o juiz ordene a exibição de documento a alguém e esta pessoa se recuse a 
apresentá-lo, o Artigo 359 do CPC autoriza ao juiz tomar a recusa como confissão 
de quem não quis apresentar o documento. 
Situação interessante é a autenticação de cópia pelos cartórios. Existe ainda um 
“dogma profano” de que cópia autenticada tem força probante de original. Nada 
mais errado, visto que o Código determina que cópias autenticadas só provam 
enquanto não forem contestadas. Ora, se tal valor probante é o mesmo que cópias 
não autenticadas; fica a pergunta: ainda se autentica cópia em cartório por quê? 
Mera exigência burocrática do destinatário do documento; só pode! 
As certidões são documentos em que um agente certifica (daí o termo 
“certidão”) acerca da existência ou do teor de algum ato oficial. É prova plena da 
existência do ato. Assim, o registro de nascimento não é a certidão (como pensam 
os profanos); esta é a prova do assentamento do nascimento em livro próprio, que é 
o verdadeiro registro. 
A presunção legal é de que o documento assinado prova sua origem autêntica a 
partir do signatário (lembramos que documentos antedatados ou pós-datados são 
tratados como simulados pelo Código e são considerados nulos!); e, para tais 
documentos surtirem efeitos perante terceiros, devem ser registrados no Registro 
de Títulos e Documentos. 
Sempre que alguém praticar um ato por meio de outrem, teremos neste último a 
figura do procurador; e deve portar instrumento de mesma natureza que se faça 
necessário para a prática de ato. Assim, para a compra de imóvel de valor superior 
a 30 salários-mínimos realizada por meio de procurador, este deve ter procuração, 
também, lavrada em cartório. 
135 
 
Documento particular pode ser substituído, como prova, por quaisquer outros 
meios de prova. 
Por falar em cópia (tipo “xérox”), lembramos que existem documentos, como 
os Títulos de Crédito, que possuem regime jurídico próprio; e em tal regime vige o 
princípio da cartularidade, em que, para que o documento surta efeitos, até entre as 
próprias partes, deve estar em original; cópia autenticada por vinte cartórios não 
basta para suprir a falta de tais títulos. Daí por que quem paga duplicata e recebe 
como quitação uma cópia desta legalmente nada pagou, pois a lei exige a 
circulação e a devolução do título em original. 
O Código escreveu sobre o telegrama. Ora! O texto do Código é de 1969/1976, 
época em que o telegrama era o meio mais rápido de comunicação documental 
(logo substituído pelo telex e depois pelo fax; mais tarde, pelo e-mail). Por falar em 
e-mail, a lei nada dispõe sobre seu valor probatório. Lembramos que o e-mail é 
uma informação virtual, que precisa ser impresso para estar apto a ser prova 
documental. E, em não havendo impugnação de seu conteúdo, faz prova plena. 
Os livros empresariais, quando regulares, provam a favor ou contra o 
empresário e, se escritos com defeitos, provam somente contra ele. 
No que toca aos “documentos eletrônicos”, são, em verdade, físicos! Tentemos 
convencer o leitor: as informações constantes nos documentos “eletrônicos”, ao 
invés de serem tinta e papel, são bits e bytes fixados em um suporte magnético. O 
que é eletrônico não é o documento em si, mas sim tão somente a forma de 
interpretação dos dados (“zeros” e “uns”) fixados fisicamente em um suporte (chip, 
disco, tarja magnética etc.). Assim, entendemos ser absolutamente incorreto tratar 
tais documentos como “virtuais” ou “fisicamente inexistentes” como já andamos 
lendo por aí. 
Com tal visão, cai por terra também a discussão vazia sobre ser o e-mail meio 
válido de prova ou não; ora! A única diferença do e-mail para um papel 
datilografado é o suporte. Nada mais! Quanto à assinatura eletrônica, trataremos 
em tópico próprio, a seguir. 
Existe, igualmente, uma assinatura eletrônica; é que o Brasil tem um sistema 
certificador eletrônico. É um sistema de chave pública. Tal entidade delega o poder 
de certificar a outras entidades, que funcionam como cartórios autenticadores. 
Tentarei explicar de forma simplificada o sistema de autenticação de assinatura 
eletrônica: 
O usuário João obtém, junto a uma dessas entidades delegadas, um arquivo que 
contém um código, que será sua assinatura eletrônica. João assina digitalmente seis 
documentos anexando tal arquivo nos documentos que quiser autenticar, pois o 
arquivo está gravado em um chip de um cartão que João terá consigo, ou em um 
aparelhinho chamado “token” (eu tenho um; externamente parece um pendrive 
136 
 
comum); tais continentes do arquivo certificador são fornecidos pela entidade 
certificadora. 
Para João conseguir anexar seu arquivo de assinatura em qualquer documento, 
precisa utilizar uma senha, que só ele conhece (nem a entidade certificadora tem 
acesso a tal senha). 
Qualquer pessoa que receba o documento assinado digitalmente por João terá 
como saber a real procedência do documento, pois poderá checar, junto à entidade 
certificadora, se realmente João é o titular daquele arquivo autenticador anexado; 
em havendo resposta positiva (a transação do receptor do documento com a 
entidade certificadora é automática e dura fração de segundo), confirmada a 
autenticidade e a origem do arquivo, estará provado que o documento fora 
proveniente de João. 
Os Enunciados 297 e 298 tratam sobre o tema: "O documento eletrônico tem 
valor probante, desde que seja apto a conservar a integridade de seu conteúdo e 
idôneo a apontar sua autoria, independentemente da tecnologia empregada.", e "Os 
arquivos eletrônicos incluem-se no conceito de “reproduções eletrônicas de fatos 
ou de coisas” do art. 225 do Código Civil, aos quais deve ser aplicado o regime 
jurídico da prova documental." 
 
1.3.3.2.3 TESTEMUNHA 
Testemunha é alguém que declara que tem ciência sobre um fato. A depender 
de como tal ciência ocorreu, temos as testemunhas oculares, auditivas, presenciais 
etc. As testemunhas que assinam os instrumentos junto com o declarante são 
chamadas de testemunhas instrumentárias. As testemunhas que assinam em ocasião 
em que o declarante se recusa a assinar chamam-se testemunhas fedatárias. 
Testemunha referida é aquela, indicada por outra testemunha, como tendo 
conhecimento dos fatos. Testemunhas judiciais são as que prestamdepoimento em 
juízo. Em princípio, qualquer pessoa é obrigada a testemunhar. Mas a lei traz duas 
exceções: são as pessoas impedidas de testemunhar e aquelas que não estão 
obrigadas a prestar testemunho. 
Estão impedidas de testemunhar, a menos que só elas conheçam os fatos: 
Aqueles em que não se possa acreditar por motivos mentais, visto que a 
sanidade mental deve existir em, no mínimo, dois momentos: no momento em que 
a testemunha tomar ciência do fato e no momento em que proferirá a declaração 
sobre o que sabe. Qualquer insanidade em algum dos dois momentos torna a 
testemunha impedida e, nesse caso, ainda que tal pessoa seja a única a saber sobre 
o fato, não pode sua declaração ter força probante, por motivos óbvios. 
Estão impedidas de testemunhar, também, as pessoas privadas do sentido cujo 
conhecimento do fato o exige para ter ciência dele. Assim, um cego não pode ser 
testemunha ocular de nada; e um surdo não pode ser testemunha auditiva. 
137 
 
A lei impede de testemunhar os que, presumivelmente, teriam sua declaração 
viciada por sentimentos desfavoráveis ou desfavoráveis ao interessado no litígio. 
Daí ser proibido o testemunho de alguém interessado no litígio52, ou que seja 
grande amigo ou inimigo do interessado53. Na prática, a situação é crivada de 
subjetivismo. Prova de interesse no litígio até é possível, fácil às vezes, mas prova 
de amizade ou inimizade... 
Não podem testemunhar os cônjuges, parentes em linha reta (ascendentes e 
descendentes), colaterais, até o terceiro grau de alguma das partes em litígio, seja o 
parentesco natural, seja o civil, por consanguinidade ou afinidade. A lei proíbe 
prova testemunhal de menores de 16 anos. Tal proibição é absurda! Os 
adolescentes já possuem responsabilidade penal nos termos do ECA, podendo 
responder por falso testemunho, ainda que com pena (digo, medida 
socioeducativa...) diferenciada. 
As pessoas que gozam de liberdade de testemunhar ou não são os profissionais, 
os ministros religiosos e as demais pessoas que se obrigam a guardar segredo sobre 
o que lhes for confidenciado; e as que, com seu testemunho, possam cair em 
desonra ou sofrer prejuízo judicial ou material, ou causar tais danos a parente de 
até quarto grau (a lei fala em “parente em grau sucessível”) ou algum amigo seu. 
Que valha o subjetivismo para se descobrir o que é “amigo” mesmo... 
A lei processual trata como suspeitas as testemunhas condenadas por crime de 
falso testemunho com sentença transitada em julgado. É uma proibição indevida, 
visto que a reabilitação criminal tem como função declarar por meio do Estado que 
o ex-condenado nada mais deve à sociedade. Já não bastava o estigma social que 
acompanha um ex-condenado! Só faltava a própria lei invalidar a declaração estatal 
de reabilitação do ex-condenado! 
Outra “bomba jurídica” é tomar como suspeito o testemunho de pessoa que (in 
verbis), “por seus costumes, não for digna de fé”. Ora, se existem até julgadores 
com maus costumes, nem por isso “perdem” (ao menos legalmente) a 
credibilidade, quanto menos se deve inferir tal julgamento subjetivo às 
testemunhas; até porque tal juízo de valor muda conforme o referencial de quem 
observa. 
A prova testemunhal pode ser exclusiva ou subsidiária. Só se prova por 
testemunhas os negócios em que o interesse amontar até dez salários-mínimos; 
mas, como prova subsidiária, a prova testemunhal pode ser manejada sempre. Pode 
ser usada inclusive como complemento de início de prova escrita; ou onde, 
existindo prova escrita, a parte ainda não teve acesso a ela, podendo usar a 
testemunha para fundamentar a alegação de que existe tal ou qual documento. 
 
52 Aí incluído o que intervém em nome de uma parte, tutor, curador ou representante legal da parte. 
53 A lei fala em “o amigo ou o inimigo capital das partes”. 
138 
 
Fatos que só podem ser provados por perícia ou documento não podem ser 
provados por testemunha (imagine como seria uma prova testemunhal em 
investigação de paternidade...). 
Algumas pessoas gozam de privilégio (não são prerrogativas de cargo, como 
querem fazer crer alguns...) de prestarem testemunho na própria residência ou no 
local onde trabalham, a saber: o presidente e o vice-presidente da República; o 
presidente do Senado e o da Câmara dos Deputados; os ministros de Estado; os 
ministros do STF e dos Tribunais Superiores e do TCU; o procurador-geral da 
República; os senadores, os deputados federais, os governadores, os deputados 
estaduais, os juízes dos Tribunais de segunda instância e os conselheiros dos 
Tribunais de Contas e, ainda, os embaixadores de países que deem tal privilégio 
recíproco aos embaixadores brasileiros neles atuantes. 
No processo, as testemunhas são inquiridas separadamente e de forma que uma 
não ouça as declarações da outra, para se garantir a fidedignidade do que for 
afirmado, sem influência ou sem interferência de um testemunho em outro. 
Testemunha que se cala, mente ou omite a verdade incorre no crime de “falso 
testemunho”, previsto no Artigo 342 do Código Penal, com reclusão de um a três 
anos54. Mas, se a testemunha retratar-se antes da sentença, fica isenta de pena, já 
que aí teremos um crime impossível, pois sua declaração (ou a falta dela) não 
gerará efeitos na sentença. 
O Código de Processo Civil autoriza à testemunha que peça reembolso pelas 
despesas que teve para testemunhar em juízo, devendo ser pagas pela parte que 
indicou a testemunha, na audiência ou em até três dias. 
 
1.3.3.2.4 PRESUNÇÃO 
A presunção é fruto do desejo de se obter estabilidade nas relações jurídicas. 
Serve para transformar em verdade jurídica algo que sequer se sabe se é verdadeiro 
no mundo dos fatos. Assim, se alguém é citado, e não contesta a ação ou não 
comparece em juízo, presume-se que são verdadeiros os fatos contra ele alegados. 
Note que não se sabe se são verdadeiros ou não... mas, para que não subsista a 
dúvida, a lei “diz” que são verdadeiros, e pronto! Para isso, então, serve a 
presunção, para dar certeza a algo em que não se sabe se, realmente, ela existe. 
Mas o ordenamento jurídico entende que é melhor uma certeza “fabricada” que 
traga alguma tranquilidade do que uma incerteza que gere mais conflitos. 
A presunção pode ser legal ou comum (esta, também chamada de “factual”). 
A presunção comum decorre dos fatos, das máximas de experiência. Assim, se 
na hora do acidente estava chovendo, presume-se que o asfalto estava molhado. 
 
54 Pode chegar a quatro anos se o testemunho é em processo penal ou em processo civil tendo 
como parte um ente público. 
139 
 
A presunção legal (que, como o nome diz, decorre de lei55) pode ser de duas 
espécies. Caso se permita ser ilidida por prova em contrário, diz-se que a presunção 
é relativa (ou juris tantum). Caso não seja admitida prova em contrário, diz-se que 
a presunção é absoluta (ou jure et juris). 
Um exemplo de presunção relativa é a de que, em havendo anotação na carteira 
de trabalho de alguém, este é empregado de quem anotou a carteira. 
Um exemplo de presunção absoluta é a de que todos conhecem a lei, todos 
leem o Diário Oficial e todos conhecem o que é registrado em cartório. 
Outro exemplo de presunção absoluta ocorre na inseminação artificial 
heteróloga com a autorização do marido (ou do companheiro). Não haverá o que 
discutir depois; será filho do autorizante. 
Costumo dizer em sala que presunção legal “é uma mentira que a lei diz que é 
verdade para que a vida seja possível”. É uma forma direta de dizer aquilo que a 
doutrina ameniza. Já que o direito existe para gerar estabilidade, gerar paz social, 
algumas situações existem em que a “mentira necessária” se faz presente. Para isso 
existe a presunção legal. É o caso do Artigo terceiro da LINDB (Lei de Introdução 
às Normas do Direito Brasileiro), onde está enunciado quetodos conhecem a lei. 
Embora seja mentira (impossível de acontecer na prática, inclusive), seria um 
inferno se assim não fosse tipificado, pois qualquer pessoa descumpriria a lei 
alegando (sem mentir) que a desconhece. 
Ora (outro exemplo)! Acreditar que todos conhecem tudo o que é registrado em 
cartório (registro público) é também uma piada das mais infames; mas assim 
também a lei o determina como verdadeiro! Assim, é no registro público de 
imóveis que consta quem é o proprietário de cada palmo de terra; ninguém pode 
dizer, portanto, que desconhece quem é o dono de tal imóvel. Uma vez que a 
propriedade tem absolutismo (pode ser defendida contra todos), é a publicidade 
(registro) que assim possibilita tal respeito e, se não o houver, a respectiva defesa. 
Falando simplesmente, é “verdadeiro” que todos os dias, ao sairmos de casa, lemos 
todos os Diários Oficiais (da União, Estado e Município) e ainda passamos em 
todos os cartórios de registro (de pessoas, imóveis, títulos e documentos) para 
tomarmos conhecimento de tudo o que foi registrado no dia anterior. Entendeu? 
Essas e outras presunções legais são chamadas de absolutas, pois não admitem 
prova em contrário. Existe a presunção legal relativa, em que a própria lei admite 
que se prove o contrário (que não é o caso tratado neste post). Ou seja, uma das 
maiores certezas do direito (a presunção legal) é, em verdade, uma mentira. 
 
55 A “comoriência”, já estudada neste livro, é uma espécie de presunção legal. 
140 
 
Não se admite presunção comum do que não pode ser provado por 
testemunha56. Assim, compra de imóvel de valor superior a 30 salários-mínimos 
(que exige escritura pública como prova) não se presume. 
 
1.3.3.2.5 PERÍCIA 
Perícia é prova técnica que demonstra a veracidade de um fato de acordo com 
as leis de determinada ciência. Pode ser judicial ou extrajudicial, a depender do 
ambiente onde é realizada. Abrange exames, vistorias e inspeções. 
Uma perícia extrajudicial pode transformar-se em judicial, desde que 
submetida ao crivo do contraditório. Aliás, é na seara judicial que tal prova 
encontra sua especial aplicabilidade, motivo pelo qual é nessa espécie de perícia 
que nos deteremos nesta obra. 
Um julgamento demanda conhecimentos técnicos que nem sempre são 
acessíveis ao julgador. Para decidir com base em tais conhecimentos, faz-se 
necessária uma manifestação técnica de alguém detentor do tecnicismo adequado, 
ou seja, da “carga cognitiva”. 
A prova que oferece manifestação sobre algo para o qual se demanda 
conhecimento especializado chama-se perícia, que é um exame, uma vistoria ou 
uma avaliação realizada por quem possui lastro cognitivo para dizer se algo “é ou 
não é”, de acordo com a técnica. 
É desejável que os peritos tenham formação na área de conhecimento, na qual 
haja curso superior para tal. Mas que fique claro que isso não é uma exigência 
legal! Aliás, a lei não exige nenhum tipo de certificação para alguém ser perito; 
apenas que tenha o conhecimento técnico necessário, por interpretação do 
parágrafo primeiro do Artigo 159 do Código de Processo Penal57, que pode 
tranquilamente ser utilizado para os demais ramos do direito. E, utilizando o 
princípio de que “quem pode o mais pode o menos”, se até para perícia médico-
legal pode ser admitido o laudo de leigos, mormente para matérias mais simples; e, 
nestas, por interpretação sistemática, não há a necessidade de dois peritos do juízo, 
mas apenas um. 
Uma prova pericial em juízo pode comportar até três peritos: um perito 
nomeado pelo juízo, de confiança deste, e que deve ter tanta isenção e neutralidade 
na causa quanto o magistrado; e dois peritos chamados de “assistentes técnicos”, 
nomeados pelas partes, e de quem não se poderá opor suspeição, por serem de 
confiança das partes mesmo. 
 
56 A redação deste Artigo é assim: “Art. 230. As presunções, que não as legais, não se admitem nos 
casos em que a lei exclui a prova testemunhal”. 
57 É o texto do dispositivo: “Não havendo peritos oficiais, o exame será feito por duas pessoas 
idôneas, escolhidas de preferência entre as que tiverem habilitação técnica”. 
141 
 
A perícia judicial se baseia em respostas a quesitos, que são questões a serem 
respondidas objetivamente pelo perito no resultado do seu trabalho, chamado 
laudo, que poderá ser escrito ou mesmo verbal. 
O juiz não está obrigado a fazer produzir prova pericial; só o fará se o entender 
necessário, visto que, se as partes apresentarem pareceres técnicos ou documentos 
suficientes a se provar o que desejam, pode o magistrado não determinar perícia. 
O perito tem poder de ouvir as partes e as testemunhas. Não fica claro na lei se 
uma testemunha que mente para o perito incorre em crime de falso testemunho, 
havendo bons motivos para afirmarmos que sim e que não. 
Incorre em falso testemunho, devido à inobservância de corroborar com o juízo 
para a busca da verdade; e, uma vez que o perito existe para suprir um 
conhecimento técnico ausente do magistrado no julgamento do caso, é uma 
extensão deste nos limites da tomada de dados suficientes para a perícia, o que 
faria incorrer a testemunha silente ou mentirosa, sim, no crime de falso 
testemunho. 
Por outro lado, a testemunha que responde ao perito extrajudicialmente não 
está compromissada nos termos da lei, o que seria uma brecha para se afastar o 
crime de falso testemunho perante o perito. Não concordamos com essa tese. 
Achamos que testemunha tem o dever de não calar e dizer a verdade em qualquer 
momento da instrução processual, e não apenas na audiência de instrução. 
Ressalte-se que o laudo do perito não vincula o julgamento da matéria 
probatória, ou seja, o juiz não está preso ao conteúdo do laudo, podendo até decidir 
em contrário a este, desde que lastreado em outras provas que entenda melhor. 
Onde for determinada prova pericial médica e o periciado recusar-se a 
submeter-se ao exame, não é dado a este alegar, em seu favor, “falta de prova”. E o 
Código é expresso ao determinar que recusa à perícia médica, inclusive, supre a 
referida prova, de forma desfavorável àquele que se recusa à perícia. Essas novas 
disposições legais acabaram com a “esperteza” de indigitados pais que não se 
submetiam a exame de DNA alegando direito ao próprio corpo e depois alegavam 
que não eram pais... por falta de exame comprobatório de DNA! 
A perícia judicial demanda especial atenção, pois, mesmo quando conclusiva, 
pode apenas ainda gerar mais dúvida no deslinde da questão posta a juízo. 
Consideremos o seguinte exemplo: 
Em determinado processo, no qual foi requerida e deferida uma prova pericial, 
ocorreu que apenas umas das partes apresentou assistente técnico; haverá no 
processo, na prática, dois peritos. 
Ampliemos o exemplo com a seguinte situação: normalmente os laudos 
costumam iniciar com tópicos a respeito do curriculum do perito ou do assistente; 
qual juízo incidirá sobre o caso quando o laudo do perito e do único assistente 
142 
 
técnico apresentarem divergências e considerarem que o assistente técnico esteja 
bem mais qualificado tecnicamente que o perito? Teríamos um problema. 
Muito embora o laudo a ser considerado a priori seja o do perito do juízo, seria 
um julgamento temerário baseando-se somente nessa prova pericial. E, pior, ao 
cabo de todo o tempo despendido em sua produção, não somente não melhorou o 
convencimento do juiz, mas também se fez um elemento de confusão processual 
atinente a seu correto julgamento. 
Não nos esqueçamos de que o perito, na prática e no âmbito de sua atuação, 
funciona com poderes comparáveis ao do próprio juiz, mormente perante as partes, 
como é reconhecido até em julgamentos: “... pode o perito e os assistentes técnicos 
utilizar-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo 
informações, solicitando documentosque estejam em poder de parte ou em 
repartições públicas, bem como instruir o laudo com plantas, desenhos, fotografias 
e outras quaisquer peças58”. (Emb. Ac. Civ. 8-57, Paraná, Rel. Des. Segismundo 
Gradowski, Revista Jurídica, 34:593) 
 
1.3.3.3 ÔNUS DA PROVA 
É o Artigo 333 do CPC que nos informa que a prova cabe a quem alega. E isso 
vale para todos os envolvidos. Quem exige um direito deve prová-lo, e quem se 
defende igualmente deve provar. Essa é a regra. 
Mas, em algumas situações, como no Direito do Consumidor e no Direito 
Administrativo, encontramos a inversão do ônus da prova como instituto peculiar. 
Fazendo um paralelo com a Justiça do Trabalho, onde igualmente encontramos 
a mesma inversão em alguns casos, concluímos que ela é concedida normalmente 
quando se verifica a posição diferenciada nos polos de uma discussão posta em 
juízo, sempre quando um dos polos é hipossuficiente, seja técnica, seja 
economicamente59. 
Então, como corolário do princípio da isonomia, que consiste em tratar 
desigualmente os desiguais, concede-se o favor legis ao polo desafortunado. O 
fundamento é que, uma vez que a parte seja mais bem favorecida, terá melhores 
condições de produzir e de apresentar as provas que lhe sejam aplicáveis, o que já 
não é tão fácil à parte limitada. 
No entanto ocasiões se apresentam em que as partes, embora equilibradas em 
todos esses aspectos, encontram-se em desconformidade com a detenção da prova, 
como no caso em que a prova favorável a uma das partes se apresenta em poder da 
outra parte. 
 
58 Código de Processo Civil Brasileiro - Art. 429 
59 Nos casos do Estado, a inversão decorre do princípio da presunção de legitimidade dos atos 
administrativos. 
 
143 
 
Ora! Não pode a parte ficar prejudicada pela ausência de apresentação da prova 
que lhe seria favorável, muito embora, em princípio, fosse exclusivamente seu o 
ônus de apresentar suas provas; em tais circunstâncias, é o típico caso em que cabe 
a inversão do ônus da prova desvinculado do desnível dos litigantes, caso exista. 
 
144 
 
 
2 
Obrigações 
 
145 
 
 
2 OBRIGAÇÕES 
O mundo jurídico regula os compromissos que assumimos, os compromissos 
entre pessoas (ou “intersubjetivos”, no juridiquês). Essa situação de prometermos 
algo e alguém acreditar nisso, que – penso – só ocorre entre seres humanos, é um 
dever. Um dever, portanto, é algo que nos sentimos pressionados a cumprir, por ser 
originado de um compromisso. Um dever pode ter várias origens. 
Dever familiar (tomar a bênção), religioso (pagar o dízimo, não pecar), social 
(pedir licença e agradecer), comunitário (comparecer à reunião da associação do 
bairro), moral (cumprir o prometido), afetivo (não ser desleal ao cônjuge) etc. 
Alguns deveres são regulados pelo direito; outros não. Os deveres regulados 
pelo direito ganham mais um nome: obrigação. Assim, toda obrigação é um dever, 
mas nem todo dever é uma obrigação. 
Esse capítulo trata sobre esse instituto-base de vários expedientes (contratos, 
família e até outros ramos não civis, como os da área administrativa e da tributária) 
do direito: as obrigações. Vamos a elas. 
 
2.1 TEORIA GERAL 
Vários são os conceitos de “obrigação”. Pelo conceito geral, conforme já 
elucidamos na introdução do capítulo, é um dever, mas regulado pelo direito. Mas 
podemos, já dentro do próprio direito, encontrar um conceito técnico, que aqui vai: 
“Obrigação é o vínculo jurídico que une credor e devedor” ou, para os que 
preferem conceitos alongados, “Obrigação é o vínculo jurídico que une credor e 
devedor visando à satisfação de uma prestação deste para com aquele”. Se, ao dizer 
tudo isso ainda olharem para você com cara de paisagem, acrescente: “... com 
conteúdo apreciável economicamente” ou “com reflexo mediata ou imediatamente 
patrimonial”. 
Para mim e para a maioria, basta dizer que obrigação é o vínculo jurídico que 
une credor e devedor, e já está ótimo! Ufa! 
Para os romanos (o primeiro grande berço da codificação das obrigações), a 
obrigação era a união de um debitum (ou shuld como os germânicos chamaram 
depois), que é o dever de pagar que nasce no momento em que a obrigação é 
criada; e a obligatio (ou haftung), que é o dever secundário que só nasce quando o 
dever primário, de pagar, é descumprido; é a responsabilidade. 
Resumindo: à pressão pelo cumprimento chamamos debitum ou shoud; e à 
responsabilidade, obrigatio ou haftung, que é a consequência de tal desobediência. 
Houve um tempo em que tal consequência era pessoal, ou seja, o devedor 
inadimplente respondia com o próprio corpo, podendo ser escravizado, vendido ou 
morto pelo credor. Desde a lex poetelia papiria que a responsabilidade passou a ser 
patrimonial, ou seja, os bens do devedor respondem pelo inadimplemento – o 
146 
 
devedor que descumpriu o pacto entrega os bens “por bem” ou será forçado a tal 
pelo Poder Judiciário. 
Sim, nosso Código de Processo Civil traz a parte das “Execuções”, que são 
formas de coagir ou de punir o mau devedor. 
O resquício de execução pessoal ainda existe para o devedor de prestações 
alimentícias. Mas essa “execução” não é meio de pagamento da dívida, mas sim 
meio para que seja paga conforme ajustado, daí ser a prisão por dívidas chamada 
de execução indireta, pois apenas pressiona o devedor para que pague; tanto é 
verdade que, caso o devedor preso pague a dívida, é imediatamente solto. 
Cuidado! Temos uma pegadinha jurídica aqui (de pior gosto!). É que acabamos 
de tratar da obrigação clássica ou standard, aquela que tem débito e 
responsabilidade; justamente por isso é chamada de obrigação civil. Existe outro 
tipo de obrigação, aquela em que não encontramos a união simultânea do débito e 
da responsabilidade. São duas: 
A obrigação natural é aquela onde só existe o débito, sem a responsabilidade; 
ou seja: se descumprida, não pode ser exigida – Peraí! Qual valia tem uma 
obrigação que não pode ser exigida? Bastante! É que, se não pode ser exigida, tem 
ao menos dois grandes efeitos: valida qualquer negativa do credor-vítima a 
conceder qualquer outro crédito ao inadimplente (é por isso que, embora o nome 
fique limpo nos cadastros de inadimplentes cinco anos após a inscrição, a loja-
vítima não está obrigada a conceder crédito a esse cliente, por melhores que sejam 
suas referências) e não permitir que tal obrigação, se paga, tenha seu objeto exigido 
de volta, já que, afinal, era uma obrigação! É o caso da dívida prescrita. Por 
exemplo: você não mais está obrigado a pagar, mas, se o fizer, não pode pedir o 
que pagou. 
A outra obrigação “não standard” é uma (estranhíssima!) que só possui 
responsabilidade, sem haver o débito. É o que ocorre, por exemplo, com a figura do 
avalista ou do fiador. 
 
2.2 ELEMENTOS DAS OBRIGAÇÕES 
A obrigação é um instituto formado por quatro elementos. 
 
Figura 43 - Elementos das obrigações 
147 
 
Credor (ou sujeito ativo da obrigação) é a pessoa que tem o poder de exigir o 
cumprimento da obrigação; devedor (ou sujeito passivo) é a pessoa com a 
incumbência de cumprir a obrigação. Credor e devedor são chamados elementos 
subjetivos ou pessoais da obrigação, já que são pessoas. 
 
Figura 44 – Credor 
 
 
Figura 45 - Devedor 
Objeto é aquilo sobre o que recai a obrigação. Divide-se em direto e indireto. 
Alguém que não tinha o que fazer criou essa diferenciação entre objeto direto e 
indireto. Acredite: não serve para nada na prática, exceto quanto a ser cobrado em 
provas mesmo. Então, vamos à inutilidade acadêmica. O objeto direto é a atividade 
requerida pelo credor; é o dar, fazer ou não fazer. É o “verbo” da obrigação. O 
objeto indireto, ou mediato, é O QUE será dado, feito ou abstido. Assim, se José 
tem que entregar um carro a Carlos, o objeto direto é a entrega. O objeto indireto é 
o carro. Se Maria tem que lavar as roupas de Karla, a lavagem é o objeto direto, eas roupas tornadas limpas são o objeto indireto. O objeto indireto é também 
chamado de “bem da vida”. 
O comportamento (no direito das obrigações, os sujeitos transacionam 
comportamentos!) do devedor orientado em cumprir o objeto chama-se prestação. 
148 
 
Daí a doutrina separar o objeto entre objeto direto (comportamento) e objeto 
indireto (bem da vida a ser entregue, feito ou impedido). Esse objeto deverá ter os 
mesmos requisitos dos objetos dos negócios jurídicos, a saber: precisa ser lícito, 
possível, determinado ou ao menos determinável60. 
Além dos três elementos expostos, existe ainda um, chamado elemento 
imaterial (ou elemento sentimental, ou elemento ideal), que representa o vínculo 
psicológico existente entre credor e devedor. É por causa desse vínculo que o 
credor se sente com certo “poder” sobre o devedor, e daí advém a tranquilidade 
para poder cobrar o devedor; por outro lado, é o elemento sentimental que faz que 
o devedor se ache sob a sujeição do credor, que se sinta angustiado quando deve, e 
não paga. 
Existe uma divisão do objeto quanto a seu conteúdo, que são dois institutos: um 
débito e uma responsabilidade. Débito é que deve ser obtido pelo comportamento 
do devedor. Responsabilidade é a sanção pelo descumprimento do débito. 
Assim, entregar um carro sob pena de multa de 10% encerra tais componentes: a 
entrega do carro é o débito; a possibilidade de imposição de multa de 10% é a 
responsabilidade. Obrigação civil é a que contém débito e responsabilidade; é o 
padrão; quando, na tratativa, só há débito, temos uma obrigação natural; pode 
acontecer ainda de só haver uma responsabilidade, sem débito, como no caso do 
aval e da fiança (não existindo nome específico para esse tipo de obrigação, 
podemos chamá-la tão somente de obrigação sem débito). 
Lembramos que incapaz pode ser sujeito de obrigação. A responsabilidade 
precisa ter sujeito capaz em seu polo passivo para que possa ser operacionalizada, e 
nada impede que recaia em pessoa diferente da que está obrigada à prestação. 
Assim, um menor, até um nascituro, ou alguém com enfermidade mental, podem 
ser devedores de obrigação, mas, em caso de descumprimento, outrem será 
responsabilizado em seu lugar, como regra; um menor dono de uma propriedade 
pode ser devedor de IPTU, mas serão seus pais os sujeitos passivos da cobrança, 
em caso de inadimplemento. 
Detalhe: em caso de prática de infração, o próprio menor, mesmo incapaz, pode 
ser responsabilizado civilmente, como estudaremos no capítulo acerca de 
responsabilidade civil. 
 
2.2.1 OBRIGAÇÃO CIVIL E OBRIGAÇÃO NATURAL 
Existem situações em que o “débito” e a “responsabilidade” se separam em um 
objeto. As obrigações descumpridas geram a responsabilidade, que é a 
possibilidade de ser coagido pelo Estado, por meio do Poder Judiciário, a cumprir a 
obrigação. 
 
60 Remetemos o leitor ao estudo do objeto dos negócios jurídicos, estudados na “teoria geral”. 
149 
 
As obrigações naturais possuem débito, e não possuem responsabilidade. São 
também chamadas de obrigações imperfeitas ou incompletas. 
Se forem cumpridas, o devedor não pode pedir de volta o que pagou sob a 
desculpa de que “era obrigação natural”; diz-se que não gera “direito à repetição”; 
o credor pode retê-la; é a exceptio solutio retentio. 
O exemplo prático de obrigação natural é a dívida de jogo. Se você ganhar no 
jogo do bicho (uma contravenção tolerada), o banqueiro fica obrigado a lhe pagar o 
prêmio; mas, se ele não pagar, não existe ação que o force a fazer tal pagamento 
(como dissemos, é uma contravenção...). Mas, se ele pagar, o pagamento é bom, e 
o recebimento é legítimo. Não pode o banqueiro do jogo do bicho pedir de volta o 
prêmio que pagou. (Artigos 882 e 883 do Código Civil). Outros exemplos de 
obrigações naturais são as dívidas prescritas e os juros não estipulados. 
Existem também obrigações que só contêm responsabilidade, a exemplo da 
fiança! Olha só: o fiador, em princípio, não é obrigado a pagar nada; quem tem que 
pagar é o afiançado. Mas, se este não pagar, o fiador pode ser coagido pelo 
Judiciário a pagar, ou seja, nessa obrigação só existe para o fiador a 
responsabilidade, e não o débito, que cabe ao afiançado. 
A obrigação clássica, em que encontramos “débito” e “responsabilidade” 
unidos, é chamada de “obrigação civil”. 
 
2.3 FONTES DE OBRIGAÇÕES 
A obrigação nasce de lei ou nasce de um negócio jurídico, a saber, da vontade 
das partes. A lei é fonte das obrigações, inclusive quando enuncia a existência do 
ato ilícito como também gerador de obrigações, bastando lermos os Artigos 186 e 
927 do Código Civil. A lei, em verdade, não cria obrigações; apenas molda 
hipóteses que, se ocorrerem, redundarão em obrigação. Os atos negociais podem 
ser de diversas espécies, tais como testamento, casamento e contratos. 
 
2.4 CLASSIFICAÇÃO 
Visando efeitos didáticos e práticos, as obrigações são classificadas para que se 
encaixem em cada um dos sistemas jurídicos, no direito das obrigações. 
Antes de classificarmos um instituto, precisamos conhecer os critérios de 
classificação dele, que são a classificação básica, classificação quanto à atividade 
(ou modalidade), quanto ao objeto, quanto ao elemento acidental, e quanto à 
finalidade. Quanto à classificação básica, a obrigação pode ser simples ou 
complexa. Quanto à atividade, a obrigação pode ser de dar coisa certa, dar coisa 
incerta, de fazer e de não fazer. Na classificação quanto ao objeto, as obrigações 
podem ser cumulativas, alternativas, facultativas, divisíveis, indivisíveis, líquidas e 
ilíquidas. No que toca aos sujeitos, as obrigações podem ser fracionárias ou 
solidárias. Quanto ao elemento acidental, a obrigação pode ser condicional, “a 
150 
 
termo”, e modal; e, quanto à finalidade, a obrigação pode ser “de meio”, “de 
resultado” e “de garantia”. 
 
2.4.1 CLASSIFICAÇÃO BÁSICA 
Obrigação simples são aquelas em que encontramos UM credor, UM devedor, 
UM objeto e UM vínculo. Basta que em qualquer dos elementos haja mais de um 
ocupante para que tenhamos uma obrigação complexa (exemplo: dois devedores, 
um credor, um objeto; ou um devedor e um credor e três objetos etc.). As 
obrigações simples também são chamadas de singulares, e as obrigações 
complexas também são chamadas de compostas ou plurais. 
 
2.4.2 CLASSIFICAÇÃO QUANTO À ATIVIDADE 
Trata-se da primeira classificação das obrigações, chamada “quanto à 
atividade” ou “modalidade”; está regulada nos Artigos 233 a 251 do Código Civil. 
Para cada uma dessas modalidades, há um rol de consequências para cumprimento 
e descumprimento (com e sem culpa). 
De acordo com o comportamento transacionado na obrigação, surge essa 
classificação. Basicamente o comportamento transacionado pode ser positivo (fazer 
ou dar algo) ou negativo (não fazer algo). A obrigação positiva de dar se subdivide 
em dar coisa certa ou dar coisa incerta. 
Embora o Código especifique cada consequência para cada obrigação, 
podemos notar que três ocorrências se repetem; são as que sintetizo: se 
for cumprida, extingue-se (e todos ficam satisfeitos); se for cumprida com 
culpa, gera perdas e danos (é uma reparação+sanção); se for descumprida sem 
culpa, resolve a obrigação (desfaz-se a relação, restituindo-se ao estado inicial). 
Observações finais: “Perdas e danos” significa o que a vítima perdeu e o que 
deixou de ganhar (Art. 402); e “resolver” a obrigação significa “votar ao status quo 
ante”, ou seja, voltar ao estado anterior, à pré-obrigação. Na prática, é assim: caso 
o comprador tenha pagado algo adiantado, receberá de volta e não mais pagará 
nada. O vendedor, igualmente, nada mais deve entregar ao comprador. 
 
2.4.2.1 OBRIGAÇÃO DE DAR COISA CERTA 
A obrigação de dar é aquela cujo conteúdo é transferir, entregar ou restituir 
algo. “Dar coisa certa” é a entrega de coisa determinada, identificada, 
individualizada.Sabe-se QUAL objeto será entregue. 
Aqui surge a aplicação prática da ideia de bem infungível, ou seja, bem 
insubstituível, único no universo. 
Caso, em uma obrigação de dar coisa certa, o devedor entregue a coisa, a 
obrigação se extingue, pois houve pagamento. 
151 
 
Se a coisa não for entregue sem culpa do devedor, resolve-se a obrigação, ou 
seja, a obrigação se extingue, mas por absoluta impossibilidade. Nada mais o 
devedor terá que pagar. Caso tivesse havido pagamento anterior da coisa, o 
pagamento deveria ser restituído, visto que a resolução leva a situação dos fatos ao 
estado anterior à existência da obrigação. 
Mas pode ocorrer de a obrigação não ser cumprida por culpa do devedor 
(imagine que este, por descuido, faz a coisa perecer, por exemplo...); nesse caso, o 
devedor pagará ao credor o equivalente em dinheiro da coisa perdida, e ainda 
perdas e danos. 
 Pode acontecer que a coisa não se perca, mas seja deteriorada (por exemplo: o 
objeto é a entrega de um fusca 1980 íntegro, placa JJJ-0101; e este, ao ser entregue, 
está com a lataria amassada), nesse caso, duas situações se abrem. 
Se não houve culpa do devedor na deterioração da coisa, cabe ao credor 
escolher: ou aceita a coisa do jeito que está e abate no preço que pagou, ou resolve 
a obrigação, ou seja, recebe o dinheiro de volta e esquece o fusca... 
 Mas, se houve culpa do devedor na deterioração do bem, o credor receberá 
perdas e danos pela expectativa frustrada e, além das perdas e danos, terá ainda 
duas opções: receber a coisa do jeito que está; ou não querer mais a coisa (rejeitá-
la) e receber o equivalente em dinheiro. Ou seja, nesse caso, dois valores são 
devidos ao credor: P&D e a coisa deteriorada, ou P&D e o equivalente em dinheiro 
da coisa. É importante notar que, sempre que houver culpa do devedor, haverá 
pagamento de perdas e danos! 
Até a tradição, o dono da coisa goza do bônus e arca com o ônus. Assim, se um 
devedor precisa entregar em um ano uma égua, e esta fica prenha em tal tempo, 
duas situações ocorrerão caso haja nascimento com vida do cavalinho: caso no 
momento da entrega a égua esteja prenhe, pertence ao receptor (credor) a égua e o 
futuro cavalinho; mas, caso já tenha ocorrido o lançamento antes da entrega, o 
cavalinho pertencerá ao devedor. 
 
2.4.2.2 OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA 
É a entrega de algo identificado pelo gênero e pela quantidade, ou seja, sabe-se 
“O QUE de QUANTO” de algo que será entregue, mas não se sabe “qual” objeto 
será entregue. A ideia de coisa incerta está ligada à ideia de bem fungível, ou seja, 
bem substituível um pelo outro sem prejuízo de finalidade. 
A coisa a que se refere o objeto da obrigação só será incerta até o momento da 
escolha da coisa e da ciência desta à outra parte (tal ato de escolha e de 
comunicação chama-se “concentração do débito”). Convenhamos que, em algum 
momento, a coisa deverá se tornar certa! Senão como e por que se vai pagá-la? 
Antes da escolha não há que se falar em perda da coisa, pois o gênero nunca 
perece (genuns nunquam perit, ou genun non perit, segundo o brocardo latino). A 
152 
 
partir do momento em que a coisa se torna certa, o cumprimento (ou não) da 
obrigação será regido pelas regras já estudadas de “dar a coisa certa”. 
 
2.4.2.3 OBRIGAÇÃO DE FAZER 
As obrigações de fazer também são chamadas de “prestações de fato”. 
Podem ser personalíssimas (também chamadas de infungíveis, imateriais ou 
intuitu personae), ou impessoais (também chamadas de fungíveis, materiais ou não 
personalíssimas). 
Personalíssima é a obrigação que só pode ser cumprida por determinada pessoa 
e por nenhuma outra. Imagine que você contrata um show do Roberto Carlos; é 
aceitável que no dia do show ele não compareça e envie outra pessoa para cantar no 
lugar dele? Pois é! Essa é a obrigação personalíssima. 
Obrigação não personalíssima é aquela em que o que importa é o resultado do 
ato, não importando quem o pratique. Imagine que você contrata serviço de 
conservação (limpeza) ou vigilância em uma empresa. Interessa para você QUEM 
vai realizar as limpezas ou fazer a vigilância? Não! O que lhe interessa é o local 
limpo e vigiado. Daí tais obrigações de fazer serem chamadas de não 
personalíssimas. 
Tanto nas obrigações personalíssimas quanto nas não personalíssimas duas 
situações se assemelham: caso o devedor cumpra a obrigação, esta se extinguirá, já 
que houve pagamento. Caso não seja cumprida sem culpa do devedor, resolve-se a 
obrigação, e fica tudo como estava antes, ou seja, o devedor não cumpre, e o credor 
não paga e, se pagou, recebe o pagamento de volta. 
A diferença ocorre no caso de descumprimento. Caso o devedor não cumpra a 
obrigação personalíssima por culpa sua, deverá pagar perdas e danos ao credor, por 
causa do “furo” e da expectativa frustrada que causou. 
No caso da obrigação não personalíssima descumprida com culpa do devedor, 
pode o credor mandar que outra pessoa realize o ato, às custas do devedor (isso 
mesmo, outra pessoa faz, e o devedor culpado paga a conta! O procedimento para 
tal consta nos Artigos 634 a 637 do CPC); e, além disso, fica devendo ao credor o 
pagamento de perdas e danos, já que houve culpa. 
O que explicamos acima tem como base o Código Civil, que começou a ser 
escrito no início da década de 70. De lá para cá já houve avanço na lei processual 
civil, que aliás vive em constante reforma. 
E um dos avanços é o Artigo 461 do Código de Processo Civil, que prevê a 
tutela específica para a obrigação de fazer; e o Artigo 461-A, que tem como objeto 
a tutela para a obrigação de dar. No caso da obrigação de dar, o juiz pode 
determinar qualquer medida que conduza à satisfação da obrigação, inclusive multa 
diária; e, no caso de obrigação de dar coisa, é dado ao juiz determinar busca e 
apreensão da coisa. 
153 
 
Portanto os Artigos 233 a 251 do Código Civil precisam ser lidos 
conjuntamente com os Artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil. 
 
2.4.2.4 OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER 
Exemplo de obrigação de não fazer é a dos egressos daquele programa Big 
Brother Brasil: durante determinado tempo, não podem dar entrevista para 
nenhuma outra emissora de televisão, lembra? Ou a cláusula contratual que obrigue 
uma loja a não fazer concorrência com uma determinada empresa, ou ainda a 
cláusula da convenção condominial de não subir muro além de determinada altura 
para não tapar o Sol para o vizinho etc. 
As obrigações de não fazer, ou de abster-se, ou negativas, têm o seguinte 
mecanismo: caso o devedor cumpra a obrigação (ou seja, não faça o que não deve), 
extingue-se a obrigação, já que houve pagamento. Se o devedor descumpriu sem 
culpa, extingue-se a obrigação. 
O Artigo 250 do CCB foge, aparentemente, da lógica geral das obrigações; é 
que, por regra, uma obrigação descumprida sem culpa do devedor resolve-se. 
Ocorre que o Artigo 250 afirma que a obrigação de não fazer, se descumprida sem 
culpa, “extingue-se”, ao invés de resolver-se? Bem! É simples: não existe, 
tecnicamente, como se desfazer algo “irreversível”. Como se desfaz a revelação de 
um segredo? Devido a tal irreversibilidade, inexiste “resolução” de tal tipo de 
obrigação. 
Caso o devedor descumpra a obrigação por culpa sua, pode o credor exigir que 
o devedor desfaça o que fez (se for possível), ou contratar alguém para desfazer às 
custas do devedor (o procedimento para tal se encontra no Artigo 643 do CPC); e, 
como houve culpa, pagará perdas e danos ao credor. 
 
2.4.3 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO OBJETO 
Obrigações cumulativas são aquelas em que existe mais de um objeto, que 
devem sem cumpridos simultaneamente. Basta que não se entregue um dos objetos 
para que a obrigação não esteja cumprida. É o caso do devedor que deve entregar 
três vacas do credor, uma de cada raça. Se entregar apenas duas, não cumpriu a 
obrigação. 
As obrigações alternativas contêm mais de um objeto também, mas existe 
escolha sobrequal dos objetos cumprir; no silêncio da tratativa, cabe ao devedor a 
escolha. Vale aqui a partícula “OU”. OU entrega uma vaca, OU entrega um boi. As 
obrigações alternativas também são chamadas de disjuntivas, segundo alguns 
autores. 
As obrigações facultativas contêm apenas um objeto, mas desde o momento da 
contratação já consta um outro objeto que o substituirá caso seja impossível pagar 
154 
 
o objeto principal. Aqui não há cumulação nem escolha, mas sim uma ordem de 
preferência quanto aos objetos. 
As obrigações são chamadas de divisíveis ou indivisíveis a depender de tal 
qualidade do objeto. Que valham quanto à indivisibilidade as três formas estudadas 
quando do estudo dos bens indivisíveis (indivisibilidade natural, convencional ou 
legal)! 
As obrigações são líquidas quando já existe determinabilidade quanto ao seu 
objeto, inclusive com possibilidade de valoração em dinheiro; e é ilíquida quando 
ainda não se tem determinado o objeto da obrigação. 
 
2.4.4 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AOS SUJEITOS 
Só se analisa a obrigação quanto ao sujeito quando ocorre pluralidade de 
sujeitos, a saber, quando o polo ativo ou passivo, ou os dois, possuem mais de um 
sujeito. Basicamente, as obrigações podem ser, nessa classificação, fracionárias ou 
solidárias. 
Uma grande briga na doutrina é sobre o significado de “obrigação conjunta”. 
Alguns autores dizem que são aquelas que devem ser cumpridas por várias pessoas, 
mas ao mesmo tempo (como no caso de orquestra), ou obrigações com vários 
objetos, que devem ser entregues ao mesmo tempo, como nas obrigações 
cumulativas. 
Obrigações fracionárias e solidárias são espécies de obrigações “parciárias”, ou 
seja, aquelas em cujo direito e/ou dívida são parciais para cada um dos sujeitos. 
 
2.4.4.1 OBRIGAÇÕES FRACIONÁRIAS 
Neste tipo de obrigação, quase regra quando se trata de sucessões; cada sujeito 
é responsável somente por uma parte do objeto; existe a fracionariedade ativa, 
passiva e mista. 
Na fracionariedade ativa, encontramos mais de um credor, e apenas um 
devedor – cada credor só pode cobrar uma parte do objeto; assim, se A, B e C são 
credores fracionários do devedor, e o objeto de tal dívida é 900 reais, cada credor 
só pode cobrar, no máximo, 300 reais. 
Na fracionariedade passiva existe um único credor e mais de um devedor, 
cada um só devendo uma parte do objeto. Assim, se X, Y e Z são devedores 
fracionários de 1.500 reais, cada um só está obrigado a pagar 500 reais, nada mais. 
Na fracionariedade mista temos pluralidade de credores e de devedores. E cada 
credor só pode cobrar uma fração do objeto e, ainda assim, só na fração 
correspondente da dívida do devedor solidário. Se Z, B e C são credores solidários 
de X, Y e Z, com objeto de 600 reais, e A encontra Z na rua, só pode cobrar deste 
1/3 de 1/3 do objeto, ou seja, 66,66 reais, pois o credor só pode cobrar um terço 
(200), e cada devedor só é instado a pagar um terço disso (66,66). 
155 
 
 
2.4.4.2 OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS 
As obrigações solidárias são as mais comuns em que existe mais de uma pessoa 
em um dos polos da relação obrigacional. É uma obrigação chamada de “mística” 
pela série de peculiaridades que apresenta. 
Na solidariedade (vem de solidum, “sólido”), os sujeitos são tratados como se 
um só fossem. 
Uma dica inicial: para melhor estudar as obrigações solidárias, é interessante 
dividir os Artigos 264 a 285 em três grupos: 
O primeiro grupo são os artigos com regras comuns, visto que tratam sobre o 
instituto solidariedade; é formado pelos Artigos 264 a 266. 
O segundo grupo são os artigos que contêm “regras-espelho”, ou seja, o 
legislador exarou a mesma norma para a solidariedade ativa e passiva, mas, se sabe 
lá por quê, resolveu colocar um artigo para cada espécie de solidariedade, ao invés 
de unificar cada par de artigo. Assim, os Artigos 267, 269, 270, 272 e 273 
correspondem, para a solidariedade ativa, ao que os Artigos 275, 277, 276, 283 e 
281 apregoam, respectivamente, para a solidariedade passiva, e assim por diante. 
O terceiro grupo trata de regras exclusivas para cada uma das duas espécies de 
solidariedade, a saber: para a solidariedade ativa, os Artigos 268, 271 e 274; e, para 
a solidariedade passiva, os Artigos 278, 279, 280, 282 e 284. 
Tal divisão fica mais bem demonstrada no desenho abaixo, que sempre uso em 
sala de aula: 
156 
 
 
Figura 46 - Artigos da solidariedade, organizados 
Só existe solidariedade quando a lei determina ou as partes assim contrataram. 
No silêncio, e em havendo mais de uma pessoa em algum dos polos, a presunção é 
de que são fracionárias; nunca solidárias! 
 
2.4.4.2.1 SOLIDARIEDADE ATIVA 
Existe solidariedade ativa quando qualquer dos credores puder cobrar a dívida 
por inteiro. 
157 
 
Se alguém é devedor em uma dívida em que há solidariedade ativa por parte 
dos credores, a qualquer um destes o devedor poderá pagar; ele escolhe. Mas, se 
algum dos credores demandar esse devedor em juízo, somente a este credor o 
devedor deverá pagar. 
Qualquer dos credores que cobrar uma parte da dívida continua podendo cobrar 
o que restar. Se o devedor for cobrado por um dos devedores solidários, só pode 
defender-se com defesas pessoais impostas a esse credor individualmente, ou com 
alguma defesa imposta a todos. 
Imagine que A, B e C são credores solidários de D. Imagine que somente C 
resolve cobrar D (é possível, já que há solidariedade ativa!). Mas imagine que D é 
credor de C, por outra dívida, que em nada tem a haver com essa aí. Ora, assim que 
C for cobrar D, este pode dizer “Olha C, você está me cobrando mil reais, mas 
você me deve mil reais também, lembra? Então, dê-se por pago, e não vou lhe 
entregar dinheiro algum, ok?”. Pronto! A isso chamamos defesa pessoal ou, como 
consta na lei, “exceção pessoal”. 
Agora, se A for cobrar D, só resta a D pagar-lhe mesmo. D não pode alegar 
“Não vou lhe entregar nada, A; pois o C, seu amigo, deve a mim!”, visto que não é 
dado ao devedor cobrado por um credor solidário opor exceção pessoal cabível 
contra outro credor. 
Agora, se A, B e C também forem devedores de D, qualquer deles que for 
cobrar D poderá voltar de mãos abanando, já que D terá uma exceção geral: 
“Vocês três estão me devendo! Voltem!”; e exceções gerais podem ser opostas a 
qualquer dos credores. 
Caso haja pagamento de perdas e danos pelo devedor, os credores continuam 
solidários, ou seja, qualquer dos credores poderá cobrar os demais por inteiro. 
Assim, se o cocredor recebe a dívida total de novecentos reais, deve entregar 
trezentos reais a cada um dos dois outros cocredores. Deverá igualmente pagar 
trezentos para cada um se, ao invés de receber os novecentos reais, perdoar a sua 
parte (e receber só seiscentos); ou perdoar totalmente a dívida; nesse último caso, 
pagará aos outros dois cocredores a partir de seu próprio bolso. 
Nota-se que o Código protege aos credores, visto que, em caso de demanda 
entre um dos cocredores e o devedor comum, assim é o efeito da sentença: se o 
julgamento for contrário ao credor, os outros credores continuam podendo cobrar o 
devedor. Mas, se o credor obtiver uma sentença favorável, tal benefício se estende 
aos outros credores. Ou seja, os credores que não demandam o devedor em juízo 
“nunca perdem”. 
O julgamento só será contrário a todos os credores se o devedor provar exceção 
pessoal dele contra todos, seja contra cada um individualmente, seja contra todos 
em conjunto. 
 
158 
 
2.4.4.2.2 SOLIDARIEDADE PASSIVA 
Existe solidariedade passiva quando qualquer dos devedores puder ser cobrado 
pela totalidade da dívida. É a mais comum; ocorre em 99,9% de todos os contratos 
bancários onde existe mais de um devedor. 
Qualquer pagamento efetuado por um codevedor extingue a dívida até o 
montante do pagamento, podendo ser cobrado, depois, pelo restante desta. 
Se A, B e C, solidariamente, forem devedores de D, D pode cobrar o valor todode qualquer deles, de todos ou só de dois deles, à sua escolha. 
O credor pode separar um ou mais devedores da solidariedade; por exemplo, se 
D quiser, pode tornar a dívida solidária somente entre B e C, exonerando A da 
solidariedade, ou seja, tornando a parte de A fracionária. 
Qualquer dos devedores que pagar a dívida toda pode cobrar dos outros 
codevedores o montante cabível a cada um. 
Caso qualquer dos devedores solidários queira aumentar a dívida, agravando a 
situação de todo por tornar o débito maior, não pode fazê-lo sem aquiescência dos 
demais; é uma norma até óbvia, mas consta da lei. 
O devedor solidário cobrado só pode opor ao credor exceções (defesas) 
pessoais que sejam próprias ou comuns a todos os devedores. Não pode o devedor 
cobrado opor exceção pessoal pertencente a outro credor. 
Imagine que A, B e C são devedores solidários de D. 
Imagine que D resolve cobrar somente C (lembre-se que é possível, já que há 
solidariedade passiva!). Mas imagine que D também é devedor de C, por outra 
dívida, que em nada tem a ver com essa aí em tela. 
Ora, assim que D for cobrar C, este pode dizer: “Olha, D, você está me 
cobrando quinhentos reais, mas você me deve quinhentos reais também, lembra? 
Então, dê-se por pago, e não vou lhe entregar dinheiro algum, ok?”. Pronto! A isso 
chamamos defesa pessoal ou, como consta na lei, “exceção pessoal”. 
Agora, se D for cobrar A, só resta a A pagar-lhe mesmo! A não pode alegar: 
“Não vou lhe entregar nada, D, pois você está devendo a mesma quantia para o 
meu amigo C!”, pois não é dado ao devedor solidário cobrado opor exceção 
pessoal que favoreça outro devedor. 
Agora, se A, B e C, conjuntamente, também forem credores de D, qualquer 
deles que for cobrado por D poderá alegar a defesa, já que esta é uma exceção 
geral: “Você está devendo a nós três! Circulando!...”; e exceções gerais podem ser 
opostas por qualquer um dos devedores. 
Pode haver renúncia à solidariedade, ou seja, o credor pode fracionar a 
obrigação, se o desejar. Com a renúncia da solidariedade quanto a apenas um dos 
devedores solidários, o credor só poderá cobrar do beneficiado a sua quota na 
159 
 
dívida, permanecendo a solidariedade quanto aos demais devedores, abatida do 
débito a parte correspondente aos beneficiados pela renúncia.61 
Lembramos que “a renúncia à solidariedade diferencia-se da remissão62, em 
que o devedor fica inteiramente liberado do vínculo obrigacional, inclusive no que 
tange ao rateio da quota do eventual codevedor insolvente, nos termos do Art. 284” 
(Enunciado 350 da 4JDC). 
Não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor 
contra um ou alguns dos devedores; tal mandamento garante a liberdade do credor 
de demandar a quem bem entender. Ainda sobre renúncia da solidariedade, diz o 
enunciado 351 da 4JDC, sobre o Artigo 282, que “a renúncia à solidariedade em 
favor de determinado devedor afasta a hipótese de seu chamamento ao processo63”. 
Caso um dos devedores solidários obre com culpa (“pise o tomate, marque 
touca etc.”) e por causa disso a prestação não seja paga, assim será a consequência: 
todos os devedores continuarão obrigados pela prestação (é óbvio!), mas pelas 
perdas e pelos danos só responde o culpado. O Código não especificou se as perdas 
e os danos devem ser cobrados somente do devedor culpado ou se são cobrados de 
todos; e o culpado, em regresso, reembolsa ao(s) devedor(es) que pagá-los. Somos 
alinhados com a segunda posição; qualquer pensamento em contrário forçaria o 
credor a descobrir de quem foi a culpa para só então poder cobrar as P&D; até 
porque assim é o mecanismo dos juros de mora, ou seja, todos pagam e se 
reembolsam junto ao culpado. 
O devedor que paga a dívida toda pode reembolsar-se da parte que não lhe 
cabia do todo; deve cobrar por rateio; e, nesse rateio, contribuirão também os que 
foram liberados da solidariedade pelo credor. 
Caso algum dos devedores seja insolvente, sua parte igualmente será suportada 
por rateio, dentre os demais. 
Existem casos em que a dívida interessa a apenas um dos devedores. Por 
exemplo, imagine que José aluga uma casa para morar, mas o locador exige dois 
fiadores. Nesse caso, teremos três devedores solidários na obrigação (Carlos e os 
dois fiadores). Imagine que Carlos se torna inadimplente, e o credor cobra do 
primeiro fiador a dívida total. Nesse caso, como a dívida interessou somente a 
Carlos (o que os fiadores ganhariam pagando a dívida?), o interessado, no caso 
Carlos, deverá responder inteiramente por ela junto aos outros codevedores. 
Estudemos sobre obrigações solidárias transmitidas por herança. 
 
61 Enunciado 349 da 4JDC 
62 É o mesmo que perdão da dívida. 
63 O chamamento ao processo é uma intervenção de terceiro em que um codevedor, cobrado, pode 
fazer que os demais devedores entrem na lide para que a sentença lhes tenha efeito. 
160 
 
No caso de transmissão por herança, cada herdeiro, seja do credor, seja do 
devedor solidário, divide com os demais o que caberia ao credor ou o que o 
devedor teria a pagar. 
No caso de solidariedade ativa no valor de mil reais, em que um dos cocredores 
falece deixando dois herdeiros, cada um dos sucessores pode cobrar quinhentos 
reais do devedor do de cujus; assim como, no caso de solidariedade passiva cujo 
objeto sejam duzentos reais, e o devedor faleceu deixando quatro herdeiros, cada 
um só pode ser cobrado no montante máximo de cinquenta reais – esse é o nosso 
entendimento. 
Outro entendimento enuncia que, em havendo falecimento de um devedor 
solidário, há de existir divisão do débito que seria cabível cobrar do devedor de 
cujus, ou seja, a morte extinguiria a solidariedade passiva em relação ao que 
faleceu, e os herdeiros só poderiam ser cobrados, na proporção de seu quinhão 
hereditário, no montante dessa parte já fracionada da dívida, que seria exigível do 
de cujus. 
Convenhamos: de onde partiu a ideia de que a morte faz que a obrigação se 
torne fracionária em relação ao falecido? Por isso entendemos que as quotas-partes 
da herança devem ser “transportadas” para o objeto da dívida, e cada herdeiro 
poderá cobrar ou ser cobrado nesse objeto, na proporção do quinhão que lhe cabe 
na herança. 
É óbvio que, em qualquer das teorias que se tomem, o devedor só pagará até o 
montante que recebeu de herança, ou, como lemos no CCB, “só responderá nos 
limites das forças da herança64”. 
Por falar em “limites das forças da herança”, uma terceira interpretação pode 
surgir: cada devedor solidário pode ser cobrado pela dívida toda, mas só 
responderá até o quinhão que recebeu do de cujus. 
Tal divergência vem da redação imprecisa no que toca à herança de dívida 
solidária passiva, a saber: “Art. 276. Se um dos devedores solidários falecer 
deixando herdeiros, nenhum destes será obrigado a pagar senão a quota que 
corresponder ao seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível; mas 
todos reunidos serão considerados como um devedor solidário em relação aos 
demais devedores”. 
 
 
RESUMINDO: 
São as três regras gerais: 
1. Na solidariedade, cada sujeito é responsável pela dívida toda – seja no polo 
ativo e/ou passivo da obrigação (264); 
 
64 Ou, em latim, intra vires hereditatis. 
161 
 
2. Na dúvida, a obrigação é fracionária, pois a solidariedade não se presume: 
nasce da lei ou da vontade das partes (265); 
3. Pode ser solidária para alguns sujeitos, e fracionária para outros, e a 
solidariedade pode ser condicionada ou a termo (266); 
As “regras-espelho” são cinco: 
1. Cada credor solidário pode cobrar a dívida toda, e cada devedor solidário 
pode ser cobrado, igualmente, pelo todo. (artigos 267 e 275) 
2. Quem recebe parte do objeto de obrigação solidária, ou quem paga parte 
deste, pode cobrar o restante ou ser cobrado pelo que resta, ou seja: ainda 
que diminuídoem parte, o objeto continua solidário enquanto algo dele 
restar (artigos 269 e 277); 
3. O credor ou devedor que falece deixando herdeiros, deixa para este a cota-
parte do que lhe cabe na herança em relação ao objeto da obrigação, seja 
para cobrar ou ser cobrado (artigos 270 e 276); 
4. Aquele que recebe o objeto da obrigação solidária precisa entregar a cota-
parte dos outros – aquele que paga o objeto da obrigação solidária pode 
ressarcir-se junto aos codevedores, na cota-parte de cada um (artigos 272 e 
283); 
5. Nenhum credor solidário pode sofrer exceção pessoal (Ex.: “Não pago a 
você porque seu colega, cocredor, me deve”), e nenhum codevedor 
solidário pode impor a um credor solidário uma exceção cabível a outro 
codevedor (Ex.: “Não pago a você porque meu colega codevedor é seu 
credor em outra obrigação”) (artigos 273 e 281); 
As três regras especiais para o credor: 
1. Se um credor solidário cobrar judicialmente a dívida, só este pode dar 
quitação válida (268); 
2. Ainda que o objeto vire perdas e danos, estas continuarão solidárias (271); 
3. Se um dos credores for processado por algum devedor solidário, se perder 
perde sozinho, se ganhar, ganha para todos os credores, a menos que o 
motivo lhes ataque também (274); 
As cinco regras especiais para o devedor: 
1. Nenhum devedor pode agravar a dívida sem concordância dos outros 
codevedores (278); 
2. Direta ou indiretamente, só quem deu causa à mora ou inadimplemento 
responde pelas consequências disto. Se for algo diferente de dinheiro o que 
faltou, todos arcam com o principal, e só o culpado paga a consequência do 
excesso. Se o objeto for dinheiro, todos respondem pelo valor total 
(principal e consectários), e depois os inocentes se ressarcem junto ao 
culpado (artigos 279 e 280); 
162 
 
3. Os devedores, um ou vários, podem ser eximidos da solidariedade pelo 
credor (282); 
4. Se um dos devedores solidários não pagar, até o exonerado arca com a 
parte deste (284); 
5. Se só um credor tiver a ganhar com a dívida, só este ressarce ao codevedor 
que arcar com o pagamento (285). 
 
 
2.4.5 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO ELEMENTO ACIDENTAL 
A obrigação pode ser condicional quando sua exigibilidade está subordinada a 
um evento futuro e incerto; será uma obrigação a termo quando a sua exigibilidade 
submeter-se à ocorrência de um evento futuro e certo. E será uma obrigação com 
encargo ou modal quando, atrelada à exigibilidade, advier uma maneira especial de 
cumprimento ou o credor obrigar-se a algo, de forma suplementar, para fazer jus a 
exigir o cumprimento por parte do devedor. 
 
2.4.6 CLASSIFICAÇÃO QUANTO À FINALIDADE 
A obrigação será chamada “de meio” quando o objeto da obrigação de fazer for 
a aplicação de toda a diligência, técnica e conhecimento para a consecução de um 
resultado. Não é objeto do cumprimento a obtenção do resultado, embora este seja 
desejável. É o caso da obrigação assumida pelo advogado ou pelo médico, quando 
esses profissionais são contratados para diligenciar a vitória e a cura, mas, caso tais 
bons resultados não ocorram, o simples fato de os profissionais haverem aplicado a 
diligência, a técnica e o conhecimento para tal fim já os torna cumpridores da 
obrigação. 
A obrigação será “de resultado” quando o objeto for o atingimento de um 
estado final, um resultado, sem o qual não se dará o cumprimento da obrigação. É o 
caso do engenheiro e da maioria de atividades contratadas, como a construção de 
um muro em uma propriedade, por exemplo. As obrigações “de garantia” (também 
chamadas de “obrigações de segurança”) são sempre acessórias e servem para 
assegurar o cumprimento de outras obrigações. É o caso da obrigação de fiança e o 
aval. 
 
2.4.7 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TEMPO DE CUMPRIMENTO 
Quanto ao tempo de cumprimento, as obrigações podem ser instantâneas (ou 
momentâneas) – São aquelas em que o cumprimento é efetuado em um único ato 
ou tempo; Obrigações fracionadas – É aquela cujo objeto é “picado” em 
pagamentos separados; Obrigações diferidas – É aquela cujo adimplemento é 
deslocado para data posterior, como a venda faturada, com pagamento a prazo, de 
30 dias; Obrigações continuadas – São aquelas em que o cumprimento se estende 
163 
 
no tempo. O cumprimento dura relativo lapso de tempo; e, enquanto tal tempo flui, 
a obrigação é cumprida; por exemplo: a obrigação de o depositário manter a coisa 
em boa guarda; obrigações de trato sucessivo – São obrigações que “zeram ”a 
cada pagamento, a exemplo do pagamento de condomínio ou do aluguel por tempo 
indeterminado, em que o pagamento é para o mês vincendo. 
 
2.5 TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES 
Um dos princípios do direito civil é a circulação de riquezas. E uma das boas 
formas de circular riqueza é promovendo a transmissão das obrigações. Tal 
transmissão ocorre em uma das duas formas: cessão de crédito ou assunção de 
dívida; ambas são espécies das transferências de obrigações inter vivos. 
Pode haver a cessão de contrato (também chamada cessão de posição 
contratual), quando um complexo de direitos e dívidas de um sujeito é, 
concomitantemente, transferido. Assim, quando um consorciado cede seu contrato 
a outrem, está cedendo o direito de receber o bem, e o outro está assumindo a 
obrigação de solver os pagamentos do consórcio. 
 
2.5.1 CESSÃO DE CRÉDITO 
É o negócio jurídico em que um credor (cedente) cede seu crédito para outro 
credor (cessionário). 
O devedor não pode opor-se a tal cessão, mas deve obrigatoriamente ser 
notificado, até para que saiba a quem deve pagar. 
Não pode haver cessão de crédito onde a lei o proibir, se houver cláusula 
contratual vedando tal prática ou se a própria natureza da obrigação não o permitir 
(no caso das obrigações alimentícias, por exemplo; imagine o leitor avisando seu 
pai de que “Não é mais para pagar a pensão para mim; pague para o Luizinho, 
agora!” – seria um absurdo!). 
A cessão precisa ser operada pelo mesmo instrumento que a constituição da 
obrigação; por exemplo, caso a cessão seja de uso de imóvel no valor de 50 
salários-mínimos, precisará, necessariamente, ser por escritura pública. 
O crédito é cedido com todos os seus acessórios. Assim, se havia fiador e 
avalista para o crédito, estes seguirão garantindo a dívida (é lógico que as partes 
podem excluir os acessórios na cessão, em obediência ao princípio da autonomia 
da vontade). 
A cessão só gerará efeitos após ser notificada ao devedor. 
Nada impede que haja várias cessões do mesmo crédito, ou seja, cessões 
sucessivas, e a que gerará efeitos é que for recebida por último. Ainda que haja 
cessões posteriores, se o devedor não recebeu a notificação da última cessão, basta 
que pague (de boa-fé) ao credor atinente à última notificação, de sorte que pagará 
bem. 
164 
 
Tão logo receba a notificação, o devedor pode opor defesas pessoais que tem 
contra o cedente e contra o cessionário. Mas, tendo exceção pessoal contra o 
cessionário e não alegando, e caso haja nova cessão notificada do crédito, não pode 
mais o devedor alegá-la contra o cessionário anterior. Dança mesmo! 
A cessão pode ser “pró-soluto” (em que o cedente garante apenas a existência 
do crédito), ou “pró-solvendo”, quando o cedente garante também o pagamento do 
crédito. 
No caso de cessão onerosa, ou seja, aquela em que o cessionário “compra” o 
crédito, não está obrigado o cedente a pagar ao cessionário mais do que recebeu 
deste pelo pagamento do “crédito”. 
Crédito penhorado não pode ser mais transmitido, uma vez que agora há 
ingerência do Poder Judiciário na obrigação. 
Só para ilustrar, explicaremos como funciona o “desconto de títulos”, que é 
uma operação financeira de adiantamento de recebíveis, na qual se utiliza a cessão 
de crédito. Funciona assim: a empresa vende algo para receber posteriormente; em 
nosso exemplo, 30 dias depois; a empresa pode esperar até o dia do recebimento, 
mas ficará sem o capital de giro até lá. Se tiver fôlegopara isso, ok. Mas a empresa 
pode precisar do capital imediatamente para fazer novas compras; é então quando 
decide pelo desconto. 
Nessa operação, um banco ou uma factoring adianta hoje para a empresa o que 
ela só receberia daqui a 30 dias (no caso do nosso exemplo); o desconto é 
remunerado; tal remuneração é chamada de “taxa de desconto” Essa taxa, 
percentual, ficará para o agente que descontou o título (banco ou factoring), 
quando do pagamento deste pelo devedor. 
Assim, uma duplicata de dez mil reais vencerá daqui a trinta dias; a empresa 
precisa de dinheiro imediato mediante desconto e uma factoring, cuja taxa é 8%; A 
factoring adiantará para a empresa R$ 9.200,00; trinta dias depois o devedor pagará 
os dez mil à fectoring, que ficará com todo o dinheiro: R$ 9.200,00 que adiantou e 
os R$ 800,00, que é sua remuneração. Caso o devedor não pague o título, a 
factoring cobrará da empresa e dos sócios também, pois a factoring teve o cuidado 
de exigir que os sócios avalizassem tais títulos de forma que, na prática, ela não 
perderá nunca. 
165 
 
 
Figura 47 - Cessão de crédito 
 
2.5.2 ASSUNÇÃO DE DÍVIDA 
Ocorre assunção de dívida quando alguém assume a obrigação de outrem, 
substituindo-se na condição de devedor da obrigação. Pode haver assunção de um 
ou de mais devedores. Para que haja assunção, precisa haver consentimento 
expresso do credor. 
Ainda que o credor consinta na assunção, se ficar provado que na época da 
transmissão o novo devedor já era insolvente e o credor desconhecia tal infortúnio, 
restabelecer-se-á a relação obrigacional anterior. 
Assunção de dívida pode ser expromissória, quando o novo devedor faz 
acordo diretamente com o credor (às vezes até contrariando o devedor originário!). 
E pode ser também delegatária, quando o novo devedor está em comum acordo 
com o devedor anterior. 
O assuntor e o devedor original podem assinar prazo para o credor dizer se 
aceita ou não a assunção. A lei determina que o silêncio do devedor significa 
“não”. 
As garantias e os acessórios da dívida não são transmitidos com a assunção. Ou 
seja, aval e fiança precisam ser firmados novamente para que a dívida seja 
garantida após a transferência. 
Diz-nos o enunciado 352 da 4JDC que, “salvo expressa concordância dos 
terceiros, as garantias por eles prestadas se extinguem com a assunção de dívida; já 
as garantias prestadas pelo devedor primitivo somente são mantidas no caso em 
que este concorde com a assunção”. 
No caso de dívidas hipotecárias, caso seja assinado prazo, se o credor consentir 
na assunção e este quedar-se em silêncio por trinta dias, a lei entende que é “Sim, 
concordo!”. 
A assunção de dívida pode ser, ainda, liberatória ou cumulativa, a depender 
se o devedor originário fica desvinculado do pagamento da dívida, ou se ainda 
continua vinculado, juntamente com o assuntor. 
166 
 
 
Figura 48 - Assunção de dívida 
 
2.6 EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES 
Toda obrigação nasce para morrer, ao contrário de nós que, se pudéssemos, 
tornaríamos nossa vida eterna. Portanto obrigação é, necessariamente, vínculo 
transitório. 
Uma obrigação que não se extingue é um mal para a sociedade; gera estresse, 
ira, preocupação, desentendimentos. Daí por que se diz que obrigação boa é 
obrigação cumprida. Uma obrigação pode se extinguir de forma direta ou indireta. 
A forma direta de extinção das obrigações chama-se PAGAMENTO. O estudo 
do pagamento passa pelo estudo de seis institutos fundamentais (quem paga, quem 
recebe, como se paga, como se prova o pagamento, onde se paga e quando se 
paga). 
As formas indiretas de extinção das obrigações não possuem uma única 
designação, mas, em verdade, sete; pois são sete formas possíveis de, 
indiretamente, extinguir um vínculo obrigacional. 
Segundo outra classificação das extinções das obrigações, estas podem se dar 
de forma satisfatória ou não satisfarória. A extinção satisfatória (ou satisfativa) é 
aquela em que o credor recebe a prestação ou a vantagem equivalente, ou ainda 
concede perdão da dívida. Extinção não satisfatória (ou não satisfativa) ocorre 
quando algo torna a obrigação extinta, como prescrição, decadência, caducidade 
(no direito administrativo) etc. 
 
Figura 49 - Início e fim das obrigações 
167 
 
 
2.6.1 EXTINÇÃO DIRETA (PAGAMENTO) 
Dá-se pagamento quando a obrigação é cumprida nos exatos termos como fora 
instituída (lugar, tempo e modo previstos). É a melhor forma de extinção das 
obrigações, porque traz liberdade ao devedor e satisfação ao credor. 
Aquele que paga é chamado de solvens; e aquele que recebe o pagamento é 
chamado de accipiens. 
 
2.6.1.1 QUEM PAGA 
É importante saber quem tem legitimidade para, validamente, efetuar 
pagamento. 
Pode ser solvens o próprio devedor ou um terceiro. (em verdade, o devedor 
“deve” pagar, e o terceiro “pode” pagar). 
O terceiro pode ser um terceiro interessado ou não interessado. 
Terceiro interessado é aquele que pode sofrer consequência direta em caso de 
não pagamento da dívida. 
Imagine que Carlos é inquilino (locatário) de um imóvel, que pertence a Maria. 
Você mora alugado nessa casa e paga o aluguel para Carlos, ou seja, Carlos 
sublocou a casa a você. Imagine que você paga corretamente o aluguel, mas 
descobre que Carlos não paga pontualmente o aluguel dele (referente a esse 
imóvel) a Maria. 
Ora! Se Carlos não pagar a dívida dos aluguéis atrasados, Maria pedirá o 
despejo do imóvel; e quem está no imóvel?Você! Ou seja, Carlos não paga o 
aluguel dele, e será você quem vai “pagar o pato”! 
Nesse caso, se você pagar a Maria o valor que Carlos deve a ela (não porque 
você gosta de Carlos; você quer é permanecer no imóvel!), você será considerado 
Terceiro Interessado. 
E terceiro interessado que paga a dívida de alguém se sub-roga nos direitos do 
credor. Sub-rogar significa substituir, então o solvens interessado ficará “no lugar” 
do credor original e poderá cobrar tal dívida como se credor original fosse; ou seja, 
se a tal dívida tinha fiador, o solvens interessado poderá cobrar do fiador; se a 
dívida tinha avalista, o solvens interessado pode cobrar do avalista, enfim receberá 
o crédito com todos os acessórios destes. 
Por isso se diz que o pagamento feito por terceiro interessado tem dois efeitos, 
extintivo e translativo. O efeito extintivo se dá em relação ao credor que recebe o 
pagamento, e o efeito translativo é o que faz a pessoa que pagou tornar-se, por sub-
rogação, novo credor do devedor em lugar de quem pagou. 
Terceiro não interessado é aquele que paga mesmo sem a possibilidade de 
sofrer consequência caso o devedor original não pague. Esse terceiro não 
interessado pode pagar a dívida em nome próprio, ou em nome do devedor. 
168 
 
O que determina em nome de quem a dívida é paga é o nome que consta na 
quitação (ou do ato que lhe faça as vezes) como solvens. 
O terceiro não interessado que paga em nome próprio pode ressarcir-se do que 
pagou junto ao devedor. É o direito de reembolso, embora ele não se sub-rogue na 
posição do credor original, ou seja, não receba a dívida com os seus acessórios. 
Assim, se havia um fiador ou um avalista, ou ambos na dívida original, estes não 
poderão ser cobrados, já que não seguirão a dívida. Mas o terceiro não interessado 
fará jus à ação in rem verso para cobrar exatamente o que pagou do devedor 
originário. 
O terceiro não interessado que paga a dívida em nome do devedor não faz jus 
sequer a reembolso, ou seja, pagou porque quis; foi um presente; se quisesse cobrar 
o que cobrou, deveria ter pagado em nome próprio. 
O devedor pode impedir o pagamento, se tiver argumentos suficientes para que 
a dívida não seja paga (imagine que há uma dívida a ser compensada do credor 
para com este devedor, e este espera que irá invocar tal compensação). 
Se o terceiro pagou a dívida antes do vencimento, só pode cobrar o devedor 
original a partir do vencimento. 
Se o solvens der em pagamentoalgo fungível por engano, não pode pedi-lo de 
volta se o credor, com boa-fé, o consumiu, mesmo se quem “pagou” não tinha 
direito de dispor da coisa. 
 
 
2.6.1.2 QUEM RECEBE 
É importante saber a quem pagar, pois quem paga a quem não deveria paga 
mal; e “quem paga mal paga duas vezes”. É verdade! Um “pagamento” feito a 
quem não tinha chancela legal para receber equivale a um “não pagamento”, o que 
enseja ao credor cobrar judicialmente o que lhe deve, e não foi pago. 
O accipiens pode ser o próprio credor (situação mais comum), o seu 
representante (seja legal, seja judicial, seja convencional) ou para um terceiro. 
O pagamento a esse terceiro é válido se o próprio credor ratificar esse 
pagamento posteriormente; ou se ficar provado que reverteu em proveito do credor. 
Em homenagem à boa-fé, a lei contempla o pagamento feito a credor putativo, 
ou seja, a alguém que não seja credor, mas se apresente com tal e que dê ao 
devedor todos os motivos para, de forma legítima e inocente, pensar que o 
impostor de fato é o credor. 
Paga mal aquele que, sabendo que o credor teve o crédito penhorado, ainda 
paga para este ao invés de pagar em juízo ou a quem a ordem de penhora ordene. 
 
169 
 
2.6.1.3 COMO SE PAGA (Objeto do pagamento) 
O objeto do pagamento é aquilo que foi combinado! É claro! Mas, por mais 
redundante que tal assertiva o seja, o Código fez questão de dizer isso mesmo, para 
que o devedor não queira “dar uma de gaiato” e resolva impor ao credor objeto 
diverso do que fora contratado. 
Caso haja mais de uma prestação facultativamente constante do título da 
obrigação, não pode o devedor exigir que o credor receba parte de uma e parte de 
outra prestação, pois isso equivaleria à criação de uma terceira prestação, não 
prevista pelas partes. 
Questão importante é quando o pagamento é em dinheiro. A palavra “dinheiro” 
é ampla. Significa, para o direito civil, quantidade de moeda com disponibilidade 
imediata. O dinheiro pode ser físico, quando se corporifica em papel-moeda ou 
moeda metálica. Pode ser escritural, quando um documento lhe faz as vezes, 
podendo isso ocorrer por meio de um título de crédito ou transferência eletrônica 
de fundos (tal como cartão de débito ou transferência de fundos via Internet 
banking). Pelo princípio do nominalismo, o pagamento precisa ser expresso em 
valor nominal de moeda corrente. 
Nos casos dessas obrigações (em dinheiro), o objeto do pagamento pode ser 
“Valor Nominal”, “Escala Móvel” ou “Dívida de Valor”. 
Valor Nominal é a dívida expressa em valor monetário e que deve ser paga em 
moeda corrente. (Exemplo: R$ 23.170,00) – é a regra no direito brasileiro, como 
citamos no “princípio do nominalismo” há pouco. 
Escala Móvel é a dívida expressa por algum índice ou grandeza, a ser reduzida 
em moeda quando do momento do pagamento (Exemplo: 20 UFIRs). 
Dívida de Valor é aquela que pode ser paga em qualquer meio ou bem, desde 
que o seu montante seja o valor determinado (Exemplo: valor de dez mil reais, 
pagáveis em moeda, bens ou direitos em montante equivalente). 
 
2.6.1.4 COMO SE PROVA QUE PAGOU 
A prova do pagamento chama-se “quitação”; e quem recebe tem o dever de dar 
a quitação. Aliás, se não o der, o devedor pode reter o pagamento (aqui vale o “Não 
pago se você não me der quitação!”). 
Duas são basicamente as espécies de quitação: por meio de documento e por 
devolução. 
A quitação por documento, como o nome diz, ocorre com a geração de uma 
quitação, geralmente chamada “recibo”, o qual pode ter qualquer conteúdo que, por 
sua intelecção, leve à certeza de que houve pagamento, embora o caput do Artigo 
nos diga que deva conter o “valor e espécie da dívida, o nome do devedor ou de 
quem paga a dívida, o tempo e o lugar do pagamento e a assinatura do credor de ou 
seu representante”. 
170 
 
A quitação por devolução ocorre no caso dos Títulos de Crédito (duplicata, 
nota promissória, cheque etc.); nestes, a entrega do título ao devedor prova o 
pagamento, exceto se, em 60 dias da entrega, o credor provar que houve má-fé para 
o apossamento do título por parte do devedor. 
No caso de obrigações em que o pagamento se dá em quotas periódicas 
(parcelas ou mensalidades), a quitação dada à última, sem ressalvas, firma 
presunção de que as anteriores foram pagas. Daí por que muitas instituições não 
aceitam, por cautela, pagamento de prestações “salteadas”, mas sim somente na 
sequência dos vencimentos. 
Caso a obrigação contenha juros e, em havendo pagamento a menor, se o 
credor não ressalvar que os juros estão abertos, tais juros serão presumidos como 
pagos – é a velha regra do “acessório segue o principal”. 
As despesas com o pagamento da obrigação cabem ao devedor; é óbvio que o 
credor, dando causa a aumento de tais despesas, deverá arcar com elas, como 
determina nosso Código. 
A quitação pode ser presumida: é o que ocorre quando o credor pratica ato que 
dependeria da quitação para que este ocorresse; por exemplo, se o credor 
comprometer-se a só pintar o muro após o pagamento, o início da pintura presume 
que houve pagamento. 
 
2.6.1.5 ONDE SE PAGA 
O local do pagamento importa à obrigação, visto que integra o conceito de 
“pagar bem”. 
A obrigação que deve ser paga no domicílio do devedor; diz-se que é 
a quérable (a palavra é francesa) ou quesível. A obrigação que deva ser paga no 
domicílio do credor é dívida portable ou portável. No silêncio da tratativa, a 
obrigação deve ser paga no domicílio do devedor (é quesível); mas o contrato, a lei, 
ou os fatos podem deslocar o local do cumprimento para o domicílio do credor. 
Casa haja a convenção de mais de um local para pagamento, é o credor quem 
escolhe onde este se dará. 
Pode o devedor pagar em local diverso, se houver grave motivo para isso. Se 
você tivesse como prestação entregar algo na Indonésia no dia posterior à 
ocorrência do “tsunami”, você entregaria lá? Engraçado que a lei tenta beneficiar 
ao devedor, mas joga o ônus do mesmo local para este, visto que diz “sem prejuízo 
ao credor”. 
Todo pagamento costumeiramente realizado em determinado local 
(independentemente de no contrato inicial ter sido outro) firma obrigatoriedade 
desse local para tal ato (é o fenômeno do surrectio, no qual um ato passa a ser 
obrigatório por ter passado a ser praticado continuamente pelas partes). 
171 
 
 
Figura 50 - Lugar do pagamento 
 
2.6.1.6 QUANDO SE PAGA 
Por regra, a obrigação é exigível imediatamente (a vista!). Vencimento (ou 
seja, exigibilidade) em momento diverso somente quando expressamente previsto, 
ou seja, é a exceção. 
Existem alguns vencimentos tipificados em lei, quando o contrato for silente, a 
saber: no caso de empréstimo de dinheiro em que não conste vencimento, presume-
se ser esse prazo de 30 dias. Se for de comodato (empréstimo de coisa infungível), 
presume-se ser o tempo estritamente necessário à conclusão do ato para o qual a 
coisa servirá; no caso de locações prediais, no silêncio do contrato, entende-se que 
o vencimento é no sexto dia útil. 
Ainda que fixado o vencimento de uma dívida para data futura, haverá 
vencimento antecipado da obrigação, em caso de falência ou insolvência65 do 
devedor; caso o crédito seja penhorado por outro credor ou quando as garantias da 
dívida se mostrarem insuficientes, e o devedor, mesmo notificado, não reforçá-las. 
No caso das obrigações sujeitas a alguma condição, a implementação destas 
deve ser notificada ao devedor pelo credor para que só então a dívida se torne 
exigível – é condição para cobrança de tal dívida a comprovação de tal notificação. 
 
2.6.1.7 CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO 
O pagamento é um direito do devedor. Embora possa parecer estranha tal 
afirmação, lembramos que o débito é um poder do credor sobre o devedor; é uma 
 
65 A declaração de insolvência deve obedecer aos Artigos 761 e 762 do Código de Processo Civil, 
quanto ao procedimento.172 
 
“prisão” para este (aliás, esse é o efeito do elemento “vínculo” da obrigação) e, 
como tal, é direito subjetivo do devedor libertar-se de tal jugo. 
Para proteger tal direito, o de “obter a liberdade”, existe na lei um mecanismo 
chamado “consignação em pagamento” (ou pagamento em consignação, 
pagamento em juízo, depósito em juízo ou pagamento consignado), que consiste 
não em forçar o credor a receber, mas sim é um meio de o Estado prover a quitação 
da dívida e libertar o devedor. Tal procedimento é regido tanto pelo Código Civil 
quanto pelo Código de Processo Civil, em seus Artigos 890 a 900. 
É cabível a consignação do pagamento caso o credor não queira ou não possa 
receber, ou não queira dar quitação; ou nos casos em que não sabe o devedor a 
quem pagar, ou quando houver litígio quanto ao objeto. 
Discorreremos sobre uns exemplos dos dois últimos casos: não é raro ocorrer 
de determinadas propriedades à margem de rodovias receberem anualmente dois 
boletos de tributação: IPTU e ITR. O município mais próximo da propriedade 
entende que esta está em sua circunscrição e lança o IPTU, e a União entende que 
está em local de fato gerador de ITR. E agora? A quem pagar? 
No outro caso, imagine que um empregador que, ao depositar o salário de um 
empregado, recebe a visita de dois oficiais de justiça, cada um com mandado de 
penhora sobre o montante a ser pago66. E agora? Paga ao empregado ou ao juízo 
da execução cujo oficial chegou primeiro ao recinto? 
Para todas essas situações, existe a consignação em pagamento. 
É um procedimento bifásico – fase extrajudicial e judicial. A fase judicial só é 
cabível em caso de insucesso do resultado na fase extrajudicial (e, na prática, já se 
inicia na fase judicial, tendo os advogados, ao longo do tempo, ignorado a fase 
extrajudicial). 
Na fase extrajudicial, o devedor deve efetuar depósito bancário do valor que 
entende ser pago. Ato contínuo, expedirá carta com aviso de recebimento (AR)67 
ou qualquer meio hábil a comprovar o recebimento epistolar, assinando ao credor 
dez dias para que levante o depósito ou o recuse. Após o prazo assinado, em caso 
de silêncio do credor, entende-se que este aceitou o pagamento, e o AR servirá 
como quitação da dívida para todos os efeitos. Caso o devedor receba recusa 
expressa ao pagamento, deverá proceder ao devedor na fase judicial. 
Na fase judicial, o devedor ajuizará petição inicial em no máximo 30 dias da 
recusa recebida na fase extrajudicial, acostando a esta o recibo do depósito, o aviso 
de recebimento e a recusa do devedor. O juiz então mandará citar o credor para que 
em 15 dias receba o valor depositado (ou pratique o ato), ou conteste a ação. Caso 
 
66 Nesse nosso exemplo são dívidas alimentícias, que admitem a penhora do salário. 
67 Caso o credor deva receber o bem ou exercer alguma escolha, não haverá depósito bancário; 
apenas na referida carta ele assina o prazo para que o credor busque a coisa, mande receber ou 
exerça a escolha. 
173 
 
o réu se quede inerte, sofrerá os efeitos da revelia, e a sentença fará as vezes da 
quitação que até então nunca existiu. Caso o réu conteste, o juiz resolverá o 
conflito por sentença, gerando uma sentença de procedência ou improcedência. Em 
caso de procedência da ação, a sentença corporificará a quitação; em caso de 
improcedência, não haverá quitação. Em qualquer dos casos, a parte sucumbente68 
pagará as custas do processo e os honorários advocatícios. 
Caso a contestação se cinja à alegação de depósito insuficiente, é dado ao 
devedor prazo de dez dias para, querendo, complementar o depósito; e, em 
havendo recusa, é dado ao devedor reaver o valor depositado. Pode o devedor 
reaver o depositado também até o momento da manifestação do credor em aceitar 
ou não o depósito. Desde o momento no depósito, e julgado este procedente ou 
sendo aceito pelo credor, cessa para o devedor a obrigação de pagar juros ou de 
atualizar valor, a partir do dia do depósito. 
 
2.6.1.8 IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTO 
Situações existem, ao menos no plano teórico, em que é a lei que tem que 
determinar qual, dentre várias dívidas, deve ser quitada. 
Imagine que Mário é credor de José em várias dívidas. 
Certo dia, Mário verifica seu extrato bancário e percebe que José depositou um 
determinado valor em sua conta; fica sabendo que o valor é referente a pagamento 
de uma das dívidas, e não se sabe qual. Em nosso exemplo, José está atualmente 
incomunicável. A questão é: a qual dívida se referiu o pagamento efetuado por 
José? 
Para dirimir tal questão, a lei trouxe (precisas) regras de imputação (“imputar” 
significa “atribuir”) do pagamento para que se determine a qual dos débitos o 
pagamento se refere. 
Tais regras são um escalonamento no qual, superada uma regra, passa-se à 
outra, até se descobrir qual débito receberá a quitação ou esgotará o montante 
disponível para pagamento. 
 São seis regras: 
 1.a) O devedor escolhe qual das dívidas pagou. 
 2.a) O credor escolhe a qual dívida dará quitação. 
 3.a) O pagamento refere-se aos juros, somente. 
 4.a) Não mais havendo juros, o pagamento é do capital (valor principal). 
 5.a) O pagamento é da dívida com vencimento mais antigo. 
 6.a) Se todas tiverem o mesmo vencimento, é da dívida mais onerosa. 
No nosso exemplo, uma vez que nem Mário nem José escolheram a qual dívida 
o depósito se referia, nem havia juros a serem pagos, e todas tinham o mesmo 
 
68 “Sucumbência” significa perder o que foi pedido na ação ou contestação. 
174 
 
vencimento, nenhuma das cinco primeiras regras solucionaria a atribuição do 
pagamento. 
Mas uma das dívidas gerava maior encargo (era a mais onerosa, portanto) e 
traria mais prejuízo a José se não fosse paga, por ter taxa de juros mais alta, ou 
seja, era mais onerosa (em nosso caso! Pode ser que uma taxa menor torne a dívida 
mais onerosa, se o capital for mais alto). É essa dívida que receberá a quitação, 
portanto, segundo as regras. 
 
2.6.2 EXTINÇÃO INDIRETA DAS OBRIGAÇÕES 
Casos existem em que, embora sem haver pagamento, a obrigação se extingue; 
são sete os casos de extinção indireta (também chamada anormal ou mediata) das 
obrigações, a saber: dação em pagamento, sub-rogação, remissão, compensação, 
confusão, novação, transação e arbitragem. 
 
2.6.2.1 REMISSÃO 
Remissão é o perdão da dívida. Precisa da aceitação pelo devedor (visto que o 
perdão pode ser usado para oprimir ou para humilhar o devedor). Caso o credor dê 
quitação ou devolva o Título de Crédito, firma-se a prova de que perdoou a dívida. 
Caso uma dívida seja garantida por penhor (o famoso “prego”), a devolução do 
objeto empenhado (que estava “no prego”) não significa o perdão da dívida; apenas 
prova a dispensa da garantia. 
Caso haja mais de um devedor em uma obrigação, e um deles receber perdão, o 
credor só poderá cobrar dos outros o valor que contemple o desconto do que fora 
perdoado. 
Lembramos que “remissão”, do verbo remitir, é diferente de “remição”, do 
verbo remir, que é pagar/resgatar. 
 
Figura 51 - Remissão 
175 
 
 
2.6.2.2 COMPENSAÇÃO 
Imagine a seguinte cena: José deve mil reais a João. João deve mil reais a José. 
Os dois se encontram. José entrega mil reais a João, que lhe dá quitação da dívida. 
Ato contínuo, João entrega os mesmos mil reais a José, que dá a João a quitação da 
dívida. Há alguma lógica nisso? Também achamos que não. E o legislador 
tampouco viu alguma! Daí surgir o instituto da compensação, que permite a 
extinção da obrigação no caso no qual dois sujeitos são, mutuamente, credores e 
devedores um do outro. 
A compensação pode ser legal, convencional ou judicial. Dá-se a compensação 
legal quando se opera automaticamente; a convencional se opera pela vontade das 
partes envolvidas, e a compensação judicial é determinada pelo juiz, por sentença. 
Como exemplo de compensação

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